Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1087/16.0BELRA
Secção:CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
Data do Acordão:07/11/2018
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:CADERNO DE ENCARGOS, INTERPRETAÇÃO, LEGALIDADE ADMINISTRATIVA ESTRITA
Sumário:I – Na interpretação das cláusulas dos cadernos de encargos de procedimentos pré-contratuais, devem utilizar-se os critérios da normalidade e da experiência comum, aplicando-se tanto o artigo 9º do CC, como o artigo 236º/1 do CC.
II - Havendo uma imposição de legalidade administrativa estrita (vinculante, portanto) não relevam contra a aplicação de tal imposição os princípios gerais do favor procedimental, da estabilidade objetiva do procedimento, da transparência, da publicidade e o da igualdade e concorrência.
III - Sem prejuízo do princípio da constitucionalidade como consagrado no artigo 3º/3 da CRP.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO
S.... – P….., S.A., com sede no Lugar de R…, …, 2…-00.. Torres…, interpôs no T.A.C. de Leiria a presente ação administrativa de contencioso pré-contratual contra o INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA EDUCAÇÃO, I.P., com sede na Avenida 24 de Julho, n.º 134, 3.º/5, 1399-029 Lisboa.
São CONTRA-INTERESSADAS:
- ISS…..–….., LDA., com sede na Rua….., 4, r/c Direito, 2… ….e,
- S….., S.A., com sede na Rua…., 3…, 4…., Maia,
- O…. –…., LDA., com sede na Rua…, n.º 11 C, 1… Lisboa,
- S… PORTUGAL –…., S.A., com sede na Rua….., n.º 1-A, 2…. Amadora, - I….– F…., S.A., com sede na Avenida…, n.º 14 - C, ….A e C, 1… Lisboa, - H….– P…., LDA., com sede na Rua da…., n.º 75, ….2, 2…. Mem Martins e
- F…. – P….., LDA., com sede na Rua…., n.º 6, r/c…, 2… Amadora.
A pretensão formulada foi a seguinte:
a) Ser anulada a Decisão de Adjudicação, bem como o Relatório Final emitido pelo Júri do Procedimento em 22/07/2016 e, em conformidade, emitir decisão de adjudicação que coloque a Autora em primeiro lugar;
b) Subsidiariamente, e caso o Contrato de Fornecimento já tenha sido celebrado, ser o mesmo anulado, com as devidas consequências legais prescritas na alínea anterior;
c) Ser a entidade adjudicante condenada a indemnizar a Autora pelos prejuízos causados pela exclusão ilegal do concurso, colocando a Autora na situação em que estaria caso o Procedimento tivesse sido correctamente adjudicado à Autora, nos termos e para os efeitos do artigo 562.º do Código Civil”.
Após a discussão da causa, o T.A.C. decidiu absolver o réu e as c-i do pedido.
*
Inconformado com tal decisão, a autora S.... interpôs o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

a. A sentença a quo que “a Autora [ora Recorrente] nada alega quanto aos pretensos prejuízos que lhe foram causados”.
b. No entanto, valha a verdade, nada teria que alegar.

c. À data da apresentação dos presentes autos a juízo, o procedimento encontrava-se numa fase embrionária, numa fase pré-contratual, pelo que o pedido principal era – e assim teria que ser – a anulação do ato de adjudicação.
d. Constatou-se, porém, em sede de audiência Prévia que o contrato de fornecimento já estava a ser executado pela entidade que venceu o concurso (a saber…..), razão pela qual apenas faz sentido propugnar pelo pedido de indemnização, agora, nos termos dos aludidos artigos 45.º e 45.º-A do CPTA.
e. Por sentença proferida em 27 de abril de 2018, o Tribunal de Primeira Instância absolveu a Entidade Demandada e as Contrainteressadas de todos os pedidos contra estas formulados, com fundamento na suposta legalidade da exclusão da proposta da Recorrente no âmbito do concurso para “Aquisição de Consumíveis de Casa de Banho”, ao abrigo do Acordo-Quadro celebrado pela Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública (“ESPAP”): o AQ-HL-2015 (o “Acordo-Quadro”).
f. A Recorrente não pode conformar-se com a Decisão “a quo”, pelo que pugna pela (justa) condenação da Entidade Demandada a “indemnizar a Autora pelos prejuízos causados pela exclusão ilegal do concurso, colocando a Autora na situação que estaria caso o Procedimento tivesse sido corretamente adjudicado à Autora, nos termos e para os efeitos do artigo 562º do Código Civil” (cfr. alínea c) do pedido constante na petição inicial).
g. A Decisão Recorrida contém dois erros grosseiros de julgamento e, consequentemente, de aplicação do Direito: O primeiro erro versa sobre a errada aplicação do artigo 70.º n.º 2 do CCP ao caso concreto, uma vez que a Recorrente apresentou um produto que ia de encontro às especificações expressamente plasmadas no Acordo-Quadro; e o segundo erro manifesta-se na violação de princípios estruturais do direito da contratação pública, que, com a Decisão “a quo”, se viram claramente lesados.
h. No essencial o objeto do presente recurso centra-se na errada interpretação que o Tribunal “a quo” faz do Anexo A1 do Acordo-Quadro da ESPAP, no que respeita às toalhas de mão zig-zag 2.
i. O procedimento concursal sub judice foi celebrado ao abrigo do Acordo-Quadro da ESPAP, acordo esse que determina as traves mestras que os concorrentes devem respeitar aquando da apresentação das suas propostas às diversas entidades adjudicantes vinculadas a este Acordo-Quadro.
j. Fazia parte integrante do Acordo-Quadro, o Anexo A1, no qual a ESPAP estabeleceu para as toalhas de papel de mão (zig zag 2) as dimensões 23 x 25 (±5%).
k. Parece-nos evidente que a tolerância de ±5% terá que ser aplicada sobre a área (i.e. sobre a multiplicação de 23 por 25) e não sobre o comprimento e largura, individualmente considerados, por um lado porque aparece na mesma linha das características (“Dimensão da Folha”- i.e. linha 4 das Toalhas de Papel de Mão da tabela do Anexo A1 ao Caderno de Encargos) e por outro lado, porque a referência à tolerância de 5% vem aposta imediatamente a seguir à operação de multiplicação.
l. O que a Recorrente pretende é que se faça Justiça e esta só se fará se se admitir (também) a interpretação da Recorrente, que desde 2015 sempre foi aceite pelas entidades adjudicantes vinculadas ao Acordo-Quadro (i.e. pelos diversos Ministérios).
m. O Tribunal estriba a sua decisão num argumento “por absurdo”, referindo que aceitar a tese da Recorrente “significaria deixar na disponibilidade dos concorrentes fornecer toalhas de qualquer largura ou comprimento”.
n. Este argumento não pode proceder. Em primeiro lugar, veja-se que as toalhas de mão têm determinada utilidade, (i.e. limpar as mãos dos seus utilizadores) e, como parece óbvio, as dimensões absurdamente sugeridas pelo Tribunal “a quo” (i.e. 57,5 cm de comprimento e 10 cm de largura) não formam uma toalha de mão, mas sim uma “tira” ou um “mini rolo”, o que desde logo faria excluir (legitimamente, diga-se) o produto por manifesta falta de aptidão para o uso.
o. Em segundo lugar, importa dizê-lo, o produto da Recorrente difere 3,5 mm (três milímetros e meio) da largura propugnada pela tese do Tribunal “a quo”.
p. Em terceiro lugar, é tecnicamente impossível fazer toalhas de mão com as medidas absurdas de 57,5x10 uma vez que as máquinas de papel de mão têm características próprias que permitem variar o comprimento, mas nunca a largura.
q. Em quarto lugar, importa referir que desde que o Acordo-Quadro está em vigor a Recorrente sempre apresentou a concurso as toalhas de mão em questão – desde logo porque é a Recorrente que as produz – e, é precisamente, com este produto que tem vindo a ganhar diversos concursos (cfr. Factos Provados n.º 18 a 23).
r. O presente Acordo-Quadro não sofreu nenhuma alteração no que respeita à característica “Dimensão da Folha”, pelo que a decisão agora tomada pela Entidade Demandada, é profundamente injusta e irrazoável.
s. O Tribunal “a quo” vem surpreendentemente referir que “não é sequer rigoroso afirmar, como pretende a Autora, que a Entidade Demandada e outras entidades adjudicantes têm adotado posição contrária à sustentada no procedimento aqui em discussão”.
t. Estamos aqui perante um erro grosseiro da Decisão Recorrida, e uma contradição evidente e insanável entre os factos provados e a Decisão. É que, como decorre dos Factos Provados, os referidos fornecimentos foram adjudicados à Recorrida (cfr. Factos Provados n.º 18 a 23), precisamente porque estas entidades adjudicantes tiverem uma posição contrária à sustentada no procedimento aqui em discussão.
u. Para comprovar a arbitrariedade da decisão de exclusão, que agora se sindica, importa referir que um dos elementos do júri do presente procedimento, o Dr……, integrou o júri da Unidade Ministerial de Compras do Ministério da Educação, em 2015 (como Presidente!), tendo decidido adjudicar o fornecimento à Autora (cfr. Facto Provado n.º 18).
v. Em face destes factos, é no mínimo caricato que o mesmo Acordo-Quadro suscite interpretações distintas, quando, por um lado, as características do produto se mantiveram inalteradas e, por outro lado, o produto apresentado pela Recorrente se manteve também inalterado.
w. Também estamos perante o erro de julgamento quando o Tribunal “a quo” refere na Decisão Recorrida que nos restantes Ministério (com exceção do Ministério da Justiça, que analisaremos adiante) “a questão que aqui nos ocupa não foi sequer suscitada e apreciada”.
x. Aceitar uma afirmação como esta é aceitar que as entidades adjudicantes não analisam as propostas apresentadas pelos concorrentes, adjudicando-as “de cruz”.
y. Queremos crer – e de outra forma não poderia ser – que, se a questão “não foi suscitada e apreciada nos procedimentos levados a cabo pelos Ministérios da Educação, das Finanças, da Administração Interna e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social”, como diz o Tribunal “a quo” e resulta dos Factos Provados n.º 18 e 23), significa, pois, que a Recorrente cumpria as especificações dos cadernos de encargos e, necessariamente, do Acordo-Quadro.
z. Assim, esta “nova” interpretação – que exclui a proposta da Recorrente – não poderá ser admitida, ou caso assim não se entenda, o que só por hipótese de raciocínio se concede, sempre terão que ser admitidas as duas interpretações, como de resto decidiu (e a nosso ver, bem!) o Ministério da Justiça - no âmbito do mesmo Acordo-Quadro (!) - no Relatório Final, que versou precisamente sobre a questão que agora nos ocupamos.
aa. Cumpre salientar também que, no procedimento concursal sub judice, não foi prestado nenhum esclarecimento quanto à questão de interpretação relativamente à aplicação da variação/tolerância definida para as medidas das toalhas de papel de mão e que pudesse ter sido levado em conta pelos concorrentes, em particular pela Recorrente.
bb. Neste sentido, importa trazer à colação os ensinamentos do Drs. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira que falam do princípio do favor do Procedimento (dos concorrentes e das propostas), o qual estabelece que a dúvida suscitada a propósito das peças do procedimento – e na ausência de qualquer esclarecimento sobre as mesmas – deverá pender a favor da Recorrente, admitindo-se a interpretação da Recorrente quanto à aplicação da variação à medida das toalhas de mão, ou, pelo menos, admitir as duas interpretações.
cc. Conclui-se, portanto, que a Recorrente fez uma correta interpretação das especificações técnicas do produto e nessa medida apresentou um produto que com elas se adequasse, pelo que o Tribunal “a quo” fez uma errada aplicação do artigo 70.º n.º 2 do CCP.
dd. A Decisão Recorrida, para além de ter violado o supracitado princípio do favor do procedimento, violou princípios ainda mais caros ao direito público, e que dispõem de consagração expressa e uma relevância marcada no direito da contratação pública. São eles (i) o princípio da estabilidade objetiva do procedimento; (ii) o princípio da transparência e da publicidade; (iii) o princípio da igualdade e da concorrência e (iv) os Princípios da prossecução do interesse público e da legalidade.
ee. Admitir a posição vertida no documento ad-hoc, que foi junto pela Entidade Recorrida no seu Relatório Final, e fazer dele “lei”, é violar o princípio da estabilidade objetiva do procedimento. Este documento contem conteúdo inovatório, uma vez que vem fixar um entendimento que nunca antes tinha sido sufragado.
ff. Não é verdade que este documento se limitou “a concretizar o que daí já resultava desde o início do procedimento”.
gg. Salvo o devido respeito, é aqui que o Tribunal erra, pois que “o que desde o início do procedimento resultava” era precisamente o contrário: era a interpretação de que a variação de 5% se aplicava sobre a área e não sobre os lados da toalha individualmente.
hh. No que ao caso nos concerne, é indubitável que existe uma violação clara deste princípio, já que a Entidade Recorrida procedeu a uma alteração do sentido interpretativo de uma das cláusulas do Acordo-Quadro.
ii. Para além de ser lógico, aos olhos da Recorrente, que a tolerância de ±5 seja aplicada à área e não individualmente a cada uma das medidas (largura e comprimento da toalha), a verdade é que este entendimento tem vindo a ser corroborado pelos diversos Ministérios.
jj. É certo que as entidades adjudicante não estão vinculadas umas as outras, mas parece-nos também certo que deverá haver o mínimo de coerência entre estas, uma vez que todas estas se regem pelo mesmo Acordo-Quadro.
kk. Ora, e havendo esta discrepância, seria sempre – na dúvida – de aceitar as duas interpretações.
ll. Por sua vez, o princípio da transparência vem consagrado no número 4 do artigo 1.º do CCP e artigo 2.º da Diretiva 2004/18/CE, bem como, de forma conexa, o princípio da publicidade.
mm. A ratio deste princípio, à semelhança da anterior, é a de permitir que o concorrente saiba de antemão e com um determinado grau de certeza qual será o seu posicionamento na ordenação das propostas ou candidaturas. Ora, não foi o caso!
nn. Por sua vez, o princípio da publicidade, como se depreende, encontra-se intrinsecamente relacionado com o da transparência, já que a efetivação desta última passa pela realização do primeiro.
oo. Sublinhe-se que não existiu qualquer esclarecimento a jusante (i.e., ao nível do Acordo Quadro) ou no próprio procedimento concursal, que pudesse indiciar esse entendimento.
pp. Caso a Recorrente soubesse desta alteração de entendimento, poderia ter tentado ajustar o seu produto às novas exigências.
qq. A Decisão Recorrida erra novamente na aplicação deste princípio, uma vez que não “vê” a génese do problema: a ambiguidade da especificação em causa (originada pelo Relatório Final da Entidade Recorrida).
rr. O princípio da igualdade, a par do princípio da concorrência, assegura que os concursos são conduzidos de maneira sã, isenta e neutral.
ss. No caso em apreço é inegável que a conduta da Recorrida teve implicações graves na concorrência, desde logo porque, como já vimos, a Recorrente deixou de poder adequar a sua proposta à “nova” interpretação acolhida pela Recorrida.
tt. Por fim, há que invocar também o princípio do interesse público e da legalidade. Na verdade, é por força destes princípios que todas as entidades estaduais pautam o exercício das suas funções, nomeadamente a Recorrida.
uu. In casu, e atendendo a que a Recorrente cumpriu com todos as especificações técnicas exigidas no âmbito do Acordo-Quadro, como aliás já se encontra por de mais evidenciado, ocorreu também uma violação do princípio da prossecução do interesse público e da legalidade, já que a Recorrida decidiu adjudicar o concurso a um concorrente com uma proposta mais cara do que a da Recorrente.
vv. Dúvidas não subsistem de que também por aqui a decisão de exclusão da proposta da Recorrente é ilegal, por violar, de forma clamorosa, estes princípios.
ww. Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente e ser, em consequência, substituída a Sentença por outra que condene a Entidade Demandada/Recorrida a pagar uma indemnização correspondente aos prejuízos causados à Recorrente com a exclusão ilegal do procedimento, prejuízos esses que serão apurados nos termos do artigo 45.º e 45.º-A do CPTA.
*
O recorrido ENTIDADE PÚBLICA DEMANDADA contra-alegou, concluindo assim:

(Texto no Original)
*
Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.
*
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO:
Os recursos, sendo dirigidos contra a decisão do tribunal recorrido e respetivos fundamentos, têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso (cf. artigos 144º/2 e 146/4 do CPTA, artigos 5º, 608º/2, 635º/4/5, e 639º do CPC/2013, “ex vi” artigos 1º e 140º do CPTA), alegação que apenas pode incidir sobre as questões de facto e ou de direito que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas. Sem prejuízo das especificidades do contencioso administrativo (cf. artigos 73º/4, 141º/2/3, 143º e 146º/1/3 do CPTA).
Por outro lado, nos termos do artigo 149.º do CPTA, o tribunal “ad quem”, em sede de recurso de apelação, não se limita a cassar a decisão judicial recorrida, porquanto, ainda que a revogue ou a anule (isto no sentido muito amplo utilizado no CPC), deve decidir o objeto da causa apresentada ao tribunal “a quo”, conhecendo de facto e de direito, desde que se mostrem reunidos nos autos os pressupostos e condições legalmente exigidos para o efeito.
Assim, as questões a resolver neste recurso - contra a decisão recorrida – são as identificadas no ponto II.2, onde as apreciaremos.
*
II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – FACTOS PROVADOS
1) Por decisão do Ministro da Educação de 19.05.2016, foi autorizada a abertura do Procedimento n.º 02/AQ05-NCP/2016, tendo em vista a Aquisição de Consumíveis de Casa de Banho para o Instituto de Gestão Financeira da Educação, I.P., ao abrigo do Acordo Quadro n.º 5 celebrado pela Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I.P. – Lote 8, mais tendo sido autorizada a realização de despesa e aprovadas as minutas do convite e do caderno de encargos – fls. 44 a 46 processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
2) Do teor do convite referente ao procedimento mencionado em 1) extrai-se, designadamente, o seguinte:
“(…) I – Objeto do convite
1 – O presente procedimento tem por objeto a aquisição de consumíveis de casa de banho ao abrigo do Acordo Quadro n.º 5, ‘Lote 8- Fornecimento de consumíveis de casa de banho em todo o Território Nacional’, da eSPap, I.P., constantes do Anexo I do Caderno de Encargos.
2 – O presente procedimento insere-se no CPV 33760000-5 – Papel higiénico, lenços, toalhas de mão e guardanapos e 33772000-2 – Artigos de papel descartáveis a que se refere o Regulamento (CE) n.º 213/2008 da Comissão, de 28 de novembro de 2007, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, L 74.
II – Entidade Adjudicante
1 – A entidade pública adjudicante é o Estado Português, através do Instituto de Gestão Financeira da Educação, I.P.
(…)
IV – Procedimento de Aquisição
O presente convite é efetuado ao abrigo do ‘Acordo Quadro da eSPap, IP, n.º 05, relativo à aquisição de consumíveis de casa de banho, para o Lote 8, conforme previsto no artigo 259.º do Código dos Contratos Públicos, com as necessárias adaptações e em tudo o que não estiver especialmente regulado no Caderno de Encargos deste procedimento, será aplicado as disposições do Caderno de Encargos do Concurso Limitado por prévia qualificação para a celebração do Acordo Quadro de Higiene e Limpeza, que entrou em vigor a 11 de maio de 2015’.
(…)
VIII – Critério de Adjudicação
1 – O critério de adjudicação será o do mais baixo preço.
(…)
IX – Proposta e Documentos que a constituem
1 – A proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adquirente a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo, a qual deve ser obrigatoriamente instruída de acordo com o modelo constante do Anexo III e respetivo anexo III-I deste convite, disponibilizados na plataforma eletrónica.
2 – Para efeitos de apresentação da proposta, o concorrente deverá considerar os bens constantes no anexo III-I.
– Na proposta o concorrente deve integrar, obrigatoriamente, sob pena de exclusão, os seguintes elementos:
a) Referência do procedimento;
b) Nome do concorrente;
c) Preço de todos os itens do Anexo III;
d) Ficha técnica de cada um dos produtos com imagem obrigatória;
e) Prazo de entrega;
f) Pack de venda (Quantidade);
g) Condições de pagamento;
h) Prazo de validade da proposta;
i) Data e assinatura(s).
4 - No anexo III - I da proposta, o concorrente deve preencher, obrigatoriamente, sob pena de exclusão, todos os campos sombreados a amarelo e anexá-lo à proposta, no mesmo tipo de formato (Excel).
5 - Os campos (Nº metros/rolo nº folhas / maço - se aplicável, Marca e Modelo, Preço p/ o Estado (Euros s/IVA) em Algarismos) do Anexo III-I, devem ser preenchidos, de acordo com a informação disponível no Catálogo Nacional de Compras Públicas (CNCP), da eSPap, I.P., salientando-se que a falta de preenchimento ou a sua desconformidade com os artigos constantes no CNCP, será motivo de exclusão da proposta;
(…)
8 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
a) Declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do Anexo II deste convite;
b) Integra também a proposta quaisquer outros documentos que o concorrente considere relevantes para a apreciação da mesma;
c) No caso de se verificar que a proposta apresente um preço anormalmente baixo, nos termos do artigo 71.º do Código dos Contratos Públicos, deve o concorrente apresentar, obrigatoriamente, documento(s) onde preste esclarecimentos justificativos relativos aos elementos constitutivos da proposta que estão na origem do preço anormalmente baixo.
9 - Todos os Anexos constantes deste convite deverão ser preenchidos pelos concorrentes sem efetuar alterações à sua integridade, estrutura ou formato. (…)
– fls. 21-A a 43 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
3) Do caderno de encargos do Acordo Quadro n.º 5, melhor identificado no ponto 1), extrai-se, designadamente, o seguinte:
“(…) Artigo 25.º
Bens e serviços do acordo quadro
1 – Os seguintes consumíveis de casa de banho a fornecer no âmbito dos lotes 1 a 8 do presente acordo quadro devem cumprir os níveis de serviço definidos no presente caderno de encargos e anexo A.1:
a) Papel higiénico (…)
c) Toalhas de Papel de Mão:
i) Toalha de Mão Zig Zag 1;
ii) Toalha de Mão Zig Zag 2;
iii) Toalha de mão Rolo Horizontal;
iv) Toalha de mão Rolo Vertical;
(…)
ANEXO A.1
Especificações
Consumíveis de Casa de Banho – Lotes 1 a 8 e 17 a 24
(…)

(Texto no Original)
(…)”
– docs. n.º 1 e 2 juntos aos autos com a petição inicial, para os quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
4) No âmbito do procedimento identificado em 1) foram apresentadas propostas pelas seguintes empresas: ISS….–…., Lda.; S……., S.A.; O…. –…., Lda.; S…. Portugal –…., S.A.; S.... –…., S.A.; I…. –…., S.A.; H….– ….e Limpeza, Lda.; F…. – Produtos…., Lda. – fls. 251-A do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
5) A proposta apresentada pela Autora integra, para além do mais, documento com as características do produto final relativa às Toalhas de Mão Maxi Renovagreen Zig-zag 160x20, dali constando, quanto a Dim. da folha aberta (C x L) (mm), a medida de 255 x 215 – fls. 151 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
6) O preço constante da proposta da Autora é de 984.891,97 EUR, acrescido de IVA no montante de 226.525,15 EUR, perfazendo o montante global de 1.211.417,12 EUR – fls. 159-160, 164-165 e 170-171 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
7) A proposta apresentada pela Contra-Interessada ….. integra, para além do mais, documento com as Especificações dos Produtos de Higiene – Toalhas de Papel de Mão relativo às Toalhas de Mão Zig Zag 2, dali constando como Dimensões da Folha cm 23 x 25 – fls. 98 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
8) O preço constante da proposta da Contra-Interessada ...... é de 1.005.135,81 EUR, acrescido de IVA, perfazendo o montante global de 1.236.317,05 EUR – fls. 105, 107 e 118-119 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
9) A proposta apresentada pela Contra-Interessada ...... integra, para além do mais, documento com as Especificações Técnicas dos Produtos de Higiene – Toalhas de Papel de Mão, do qual consta, designadamente, o seguinte:
(Texto no Original)

– fls. 80 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
10) O documento referido no ponto anterior é acompanhado, para além de outras, por imagem com a designação Toalhas de Mão Zig Zag 2 23x25 – fls. 70 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
11) O preço constante da proposta da Contra-Interessada ...... é de 1.113.411,42 EUR, acrescido de IVA no valor de 256.084,63 EUR, perfazendo o montante global de 1.369.496,05 EUR – fls. 62-6314, 82 e 88-89 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos
12) Em 03.06.2016 foi elaborado relatório preliminar de análise das propostas no âmbito do procedimento identificado no ponto 1), de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
(Texto no Original)


(…) – fls. 257 a 270 processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
13) A Autora pronunciou-se quanto ao relatório preliminar mencionado no ponto anterior em sede de audiência prévia, em pronúncia datada de 08.06.2016, tendo em vista, em síntese, a admissão da respetiva proposta e ordenação da mesma em primeiro lugar – fls. 273 a 292 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
14) Em 22.07.2016 foi elaborado relatório final de análise das propostas no âmbito do concurso limitado por prévia qualificação identificado no ponto 1), de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
(Texto no Original)


(…)” – fls. 297 a 344 do processo administrativo junto aos autos, para os quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
15) Foi junto ao relatório final a que se refere o ponto anterior, como Anexo III, documento com o seguinte teor:
“(…)
(Texto no Original)

(…)” – fls. 297 do processo administrativo junto aos autos, para os quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
16) Por despacho datado de 04.08.2016, do Ministro da Educação, foi proferida decisão de homologação do relatório final, adjudicação e aprovação da minuta de contrato – fls. 344 a 352 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidos;
17) O contrato celebrado entre a Entidade Demandada e a Contra-Interessada ...... previa que o mesmo cessaria os seus efeitos a 31.12.2016 – fls. 347 do processo administrativo junto aos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidas;
18) No âmbito do Procedimento n.º 07/AQ5/UMC-DSCP/2015, em que era entidade adjudicante o Ministério da Educação, foi elaborado relatório final em 21.09.2015, de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
(Texto no Original)

– doc. n.º 8 junto aos autos com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido;
19) No âmbito do Procedimento n.º 7/UMC/MF/2015, em que era entidade adjudicante o Ministério das Finanças, foi elaborado relatório final em 07.08.2015, de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
(Texto no Original)

– doc. n.º 10 junto aos autos com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido;
20) No âmbito do Procedimento n.º 21/DSUMC/2015, em que era entidade adjudicante o Ministério da Administração Interna, foi elaborado relatório final em 02.02.2016, de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
(Texto no Original)

– doc. n.º 13 junto aos autos com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido;
21) No âmbito do Procedimento n.º PAQ/09/2016/UMCMTSSS, em que era entidade adjudicante o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, foi elaborado relatório final em 22.03.2016, de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
(Texto no Original)

– doc. n.º 14 junto aos autos com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido;
22) No âmbito do Procedimento n.º PAQ/05/2016/UCMJ, em que era entidade adjudicante o Ministério da Justiça, foi elaborado 3.º relatório preliminar em 09.09.2016, de cujo teor se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
(Texto no Original)

– doc. n.º 15 junto aos autos com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido;
23) Em 21.10.2016 foi proferido ato de adjudicação no âmbito do procedimento a que se refere o ponto anterior, de acordo com as propostas constantes de relatório final datado de 28.09.2016, de cujo teor decorre que durante o terceiro período de audiência prévia não foram apresentadas pronúncias pelos concorrentes, mantendo-se a proposta de adjudicação dos consumíveis de casa de banho à aqui Autora – fls. 559 a 599 dos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidas.
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II.2 – APRECIAÇÃO DO RECURSO
São as seguintes AS QUESTÕES A RESOLVER contra a decisão jurisdicional ora impugnada:
- Erro de direito quanto à interpretação-aplicação da exigência do anexo I do C.E. do acordo-quadro da ESPAP, quando refere que as dimensões das toalhas de papel de mãos deveriam ter as seguintes dimensões: 23cm x 25 cm com uma variação para mais ou menos de 5%.
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Considerada a factualidade dada por assente, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso.
Já identificámos a questão essencial.
À decisão impugnada adotada pelo R. a Recorrente-Autora apontou as mesmas ilegalidades que agora aponta à sentença do TAC: violação dos princípios do favor procedimental, da estabilidade objetiva do procedimento, da transparência, da publicidade, da igualdade e concorrência, da prossecução do interesse público e da legalidade. Tudo por causa do significado de “23 cm x 25 cm, com uma variação para mais ou menos de 5%”, relativamente às dimensões das toalhas de papel de mãos.
Como a A. apresentou na sua proposta toalhas com as medidas de 21,5 cm por 25,5 cm, o R., ao abrigo dos artigos 70º/2-b) (1) e 146º/2-o) (2) do CCP (em vigor), excluiu tal proposta, por esta desrespeitar os 23cm x 25 cm com uma variação admissível para mais ou menos 5%.
A A. entende que aquela variação admitida no C.E. se refere (ou pode referir também) à área resultante da multiplicação de 23 por 25. O ato administrativo impugnado entendeu que se refere aos 23 cm de um lado (comprimento) e aos 25 cm de outro lado (largura).
Cabe-nos, pois, aferir quem interpreta corretamente aquela exigência.
Na expressão “23 cm x 25 cm”, referente a um objeto com 4 lados, uma toalha de papel para mãos, está-se a dizer que dois lados têm 23 cm e outros dois lados têm 25 cm. O xis (x) quer dizer “por”, num sentido não multiplicador; isto é, um comprimento de x e uma largura de y.
Não se quer dizer, implicitamente e apenas, área, ou seja, multiplicar e atender apenas ao produto de tal multiplicação.
É o que resulta da normalidade, da experiência comum, aplicando aqui tanto o artigo 9º do CC, como o artigo 236º/1 do CC (A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.).
Não há ali ambiguidade, portanto.
Foi este o entendimento do TAC e do R. Com razão.
Portanto, 2 dos 4 lados deveriam ter 23 cm (com uma variação para mais ou menos de 5%) e os outros 2 deveriam ter 25 cm (com uma variação para mais ou menos de 5%).
Como a proposta da recorrente não cumpriu tal regra, violou o C.E.
Nestes termos, o princípio fundamental da legalidade administrativa (cf. artigos 266º/2 CRP e 3º/1 CPA) impunha e impõe a exclusão como foi decidido.
Em consequência de tal imposição de legalidade (vinculante, portante) não relevam, contra aquela interpretação do C.E., os princípios gerais invocados do favor procedimental, da estabilidade objetiva do procedimento (este claramente respeitado, aliás), da transparência (idem), da publicidade (este claramente respeitado, aliás) e o da igualdade e concorrência (idem).
Por outro lado, o relatório final não inovou em nada, apresentando apenas um documento com as operações matemáticas concretizadoras da citada regra do C.E. Aliás, a tese do relatório final é a que constava já do relatório preliminar.
Finalmente, cumpre referir que do facto de esta questão não ter sido expressamente colocada ou decidida noutros procedimentos pré-contratuais similares apenas quer dizer isso, isto é, uma simples omissão. Não quer dizer que noutros procedimentos pré-contratuais similares tenha sido expressamente aceite a tese interpretativa da ora recorrente.
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III - DECISÃO
Por tudo quanto vem de ser exposto e de harmonia com os poderes conferidos no artigo 202º da Constituição, acordam os juizes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente.
Registe-se e notifique-se.
Lisboa, 11-07-2018

Paulo H. Pereira Gouveia – Relator


Catarina Jarmela


Conceição Silvestre

(1) São excluídas as propostas cuja análise revele que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência

(2) No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º.