Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1598/13.9BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:09/30/2021
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:OPOSIÇÃO
REVERSÃO
EXCUSSÃO PRÉVIA
Sumário:I. – Se a Administração Tributária, após múltiplas diligências, realizadas durante largos meses, não logra identificar bens ou direitos na titularidade de uma devedora originária, é inatacável a conclusão, que fundamenta o despacho de reversão, de que os bens são insuficientes para solver a dívida exequenda.

II. – Se o Oponente, notificado do projeto de despacho de reversão, nada diz, invocando apenas posteriormente e em sede de Oposição, que a devedora originária é titular de um crédito e que o mesmo é suficiente para solver a dívida exequenda, é sobre si que recai o ónus de provar esse circunstancialismo de facto.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I - Relatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a oposição deduzida por D..., no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n° 31402012..., que contra si corre por reversão de dívidas provenientes de Imposto sobre o Valor acrescentado (IVA), Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e coimas, no valor global de € 3.739,87, de que era originária devedora a sociedade "D... - ARTES GRÁFICAS, LDA”.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formula as seguintes conclusões:

A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos identificados que julga procedente a oposição deduzida pelo oponente D... contra a execução fiscal n.° 31402012... e aps., com termos no Serviço de Finanças de Amadora 2, instaurada para cobrança de dívidas de Coimas e IVA, juros de mora e IRC, com dívida exequenda no montante de € 3.739,87.
B. A douta sentença fixa nas alíneas C) e D) da factualidade assente os seguintes factos:
“C) A partir de 2006, o estado de saúde do Oponente determinou o seu afastamento da empresa. – cf. depoimento das testemunhas”; “D) A partir dessa data, a direção da empresa foi assegurada por J...”., no entanto, divergimos de tal fixação da matéria de facto, por resultar dos autos e da prova nos mesmos produzida factualidade diversa.
C. No referente ao facto fixado na alínea D) do probatório da douta sentença, a atribuição pelo oponente a pessoa diversa da gerência de facto da empresa é alegação que não encontra sustentação na prova produzida nos autos, sendo que se demitiu o Tribunal a quo, com a inclusão do facto D) na factualidade assente, de prosseguir o seu poder-dever de descoberta da verdade material, e de afirmação do princípio do inquisitório ínsito no artigo 13.° do CPPT, pois que, face ao papel preponderante que é atribuído a J..., tendo requerido a Fazenda Pública ao Tribunal a quo fosse o oponente notificado no sentido de identificar devidamente J..., dever, aliás, que decorria já da sua mera inclusão no rol de testemunhas, foi tal requerimento indeferido com fundamento, como indicado na motivação da decisão de facto, no facto de se desconhecer o paradeiro da testemunha.
D. E tal juízo do Tribunal a quo padece de incongruências, porquanto o paradeiro da testemunha poderia ser determinado com base na sua devida identificação, e incorre claramente em défice instrutório, que aqui se invoca, uma vez que se demitiu o Tribunal de prosseguir as suas competências em sede de instrução dos autos e de apuramento da verdade material dos factos, materializadas na devida identificação de pessoa indicada como gestor da empresa, e na eventual determinação da sua audição como testemunha face às incongruências factuais que resultam relativamente à sua identificação, intervenção nos autos e aos pouco precisos depoimentos das testemunhas.
E. Por outro lado, deveria constar do probatório, de acordo com prova documental constante dos autos (doc. 10 da contestação), que o oponente era gerente de direito da sociedade devedora originária no período em apreço e percepcionou rendimentos da categoria A com retenção das contribuições para a segurança social pela taxa aplicável aos gerentes, facto que indicia a assunção de responsabilidades de gerência associadas a actos de gerência, o que resulta confirmado pelas declarações prestadas pela primeira testemunha.
F. Ainda, deveria constar do probatório, e conforme depoimentos das testemunhas, que o oponente tão só delegou funções em J..., que detinha poderes de coordenação e de supervisão, e que continuou durante tal período o oponente a receber rendimentos da empresa, exercendo poderes de direcção e reunindo com o senhor M... que lhe reportava os assuntos da empresa.
G. E mais deveria constar do probatório, não só o facto de ser o oponente gerente em 2012 da empresa D... ARTES GRÁFICAS LDA., mas também de ter constituído em 2012 a M...-ARTES GRÁFICAS LDA., identificada nos autos, e em 2007 a sociedade S..., (vide documento junto em sede de alegações apresentadas pela Fazenda Pública), facto de extrema relevância para os presentes autos, pois que o oponente alega não poder exercer a gerência por se encontrar incapacitado por motivos de doença, o que a douta sentença dá como provado no facto C) do probatório; contudo, precisamente em 2012, momento em que estaria alegadamente incapacitado para o fazer, constitui o oponente uma outra sociedade, da qual se assume gerente, quando o havia já feito com outra sociedade em 2007, da qual se mantém à data gerente.
H. Vejamos que o oponente não alega o não exercício da gerência, antes alega tal não exercício motivado por três precisas circunstâncias factuais - inactividade da empresa, exercício pontual da gerência por J... e estado incapacitante motivado por doença depressiva -, pelo que, o alegado não exercício da gerência tem de ser apreciado considerando conjuntamente todos os factos que, de acordo com a posição do oponente e a prova produzida nos autos, estariam na origem do seu alegado afastamento da gestão da empresa.
I. E em relação a quaisquer dos tais três factos alegados - i) inactividade da empresa, ii) exercício da gerência por J..., residente na Venezuela, e cá e iii) estado de doença do oponente impossibilitante do exercício de facto da gerência - supostamente fundamentadores do não exercício de facto da gerência, foi nos autos produzida prova da sua não correspondência à verdade, com consequente e necessária afirmação da gerência de facto exercida pelo oponente no período em apreço.
J. Ora, a inactividade da empresa é facto que não corresponde à realidade, pois que, a sociedade devedora originária declara operações tribuláveis com referência aos períodos de 2011/12T e de 2012/03T e é de tais operações que decorrem as dívidas em apreço nos autos; por outro lado, atribui a gerência a pessoa não identificada com o nome de J..., alegadamente residente na Venezuela - mas também residente em Portugal, de acordo com as testemunhas -, contudo, tal facto não é corroborado por qualquer adicional prova documental, e mais resulta infirmado da produção de prova testemunhal; ainda, o não exercício da gerência motivada por questões de incapacitante doença se não mostra devidamente comprovado documentalmente, por um lado, sendo que, ademais dos autos resulta produzida prova que contraria de forma irremediável tal alegação.
K. Assim, com base na comprovada gerência de direito, cabe, pois, ao julgador utilizar as diversas presunções judiciais ao seu alcance, nomeadamente as decorrentes das posições assumidas no processo, considerando as provas produzidas e as regras da experiência, para daí concluir pela gerência de facto; e dúvidas não restam, face a todos os factos referidos e prova produzida, que à gerência de direito comprovada corresponde a gerência de facto do oponente, mercê da actividade verificada da empresa, da constatação de que as alegadas liquidações mais não são do que fruto das declarações periódicas efectivamente entregues pela empresa e seu representante legal, sócio único (vide factos constantes das alíneas A), B) e E) do probatório da douta sentença) que assume os destinos da empresa, ainda que mandatando terceiro para o exercício de funções de supervisão que seguem o seu poder de direcção e de gestão, e que por essa via pratica necessariamente actos de gestão, e por eles recebe rendimentos da categoria A, na qualidade de gerente, conforme disposto nos artigos 255.° e 256.° do Código das Sociedades Comerciais.
L. Por outro lado, entendeu o Tribunal a quo não verificado, nos termos do n.° 2 do artigo 23.° da LGT e n.° 2 do artigo 153.° do CPPT, o requisito necessário à reversão e relativo à insuficiência de bens da devedora originária, no entanto, verificamos que no caso em apreço nos presentes autos não estamos perante uma insuficiência de bens da devedora originária, mas sim perante a inexistência de bens.
M. Está atestado nos autos de execução fiscal que funcionários se deslocaram à sede da devedora originária, tendo verificado a inexistência de bens penhoráveis da devedora originária (vide facto da alínea N) dos factos provados), mais constando de tal documento não terem sido localizados na área do serviço de finanças de Amadora 2, nem noutro local, bens penhoráveis da devedora originária, e que a devedora originária se encontrava já cessada em sede de IVA desde 31/12/2012, facto que deveria ser levado ao probatório.
N. E mais resulta da tramitação do processo de execução fiscal ter o órgão de execução fiscal empreendido diversos pedidos de penhora de créditos, de outros valores e rendimentos e de vencimentos e salários em momento anterior à operada reversão da execução fiscal contra o aqui recorrido, infrutíferos quanto à satisfação da dívida exequenda (vide doc. 23 da contestação), facto que deveria constar do probatório.
O. Assim, é afirmada pelo órgão de execução fiscal, conforme alínea O) dos factos provados, a inexistência de bens penhoráveis da devedora originária, em perfeita consonância com o que resulta do auto de diligências, sendo certo que, de acordo com os depoimentos das testemunhas a que a douta sentença atribui total credibilidade, aquando do auto da deslocação à sede da sociedade devedora originária já esta não estava a exercer a actividade, estando inclusivamente cessada para efeitos de IVA, pelo que, o raciocínio do Tribunal a quo de que exercendo a actividade seria detentora de máquinas, para além de meramente presuntivo e conclusivo, não tem aplicação nos presentes autos.
P. Por outro lado, e no referente ao facto constante da alínea G) dos factos assentes, do qual primacialmente emerge o juízo sufragado na douta sentença acerca da não verificação do fundamento da reversão referente à insuficiência dos bens penhoráveis, vejamos que estamos ali perante um mero requerimento de injunção, pelo que, o facto da alínea G) não é facto assente, pois para isso importaria determinar se veio tal requerimento a merecer força executiva e o desfecho da acção de injunção, com a consequente afectação dada pela sociedade devedora originária ao crédito recuperado, ou não, tudo isso factos omissos do probatório.
Q. Ainda, o requerimento em causa nos autos reporta-se a momento anterior à instauração da execução fiscal e não sabemos o estado de tal alegada dívida, e do processo de injunção, aquando da instauração do processo de execução fiscal, a 28/08/2012, nem aquando da reversão, em 15/07/2013, o que nos reconduz à consideração de que não consta dos autos qualquer prova da existência de tal crédito, ou que seja certo e líquido, concluindo-se pela insuficiência de bens da devedora originária para solver a dívida exequenda, pois o oponente não demonstrou com certeza a existência de bens no património da sociedade para satisfação das dívidas.
R. Sem prescindir, mesmo que tal prova resultasse dos autos, ainda assim não se constituiria como capaz de fundamentar o juízo do Tribunal a quo, na medida em que ao Tribunal incumbiria averiguar junto do órgão de execução fiscal da efectiva, ou não, penhora de tal crédito, por um lado, e por outro, averiguar da quantificação da dívida exequenda tendo por referência o universo de processos de execução fiscal a correr termos à data contra a sociedade devedora originária, para num segundo momento afirmar, ou não, da suficiência de bens penhoráveis.
S. Vejamos que a dívida exequenda nos presentes autos ascende ao valor de € 3.739,87 e a dívida exequenda no processo de execução fiscal subjacente aos autos de oposição n.° 1599/13.7BESNT e n.° 1592/13.0BESNT, com termos no TAF de Sintra, e cuja diligência de inquirição de testemunhas decorreu em simultâneo com os presentes autos, ascende aos montantes de € 20.614,37 e acrescido e de € 5.782,86 e acrescido, respectivamente - factos que deveriam constar do probatório, de que o Tribunal a quo tem conhecimento por via da realização da inquirição de testemunhas, e de tais factos sempre resultaria que o alegado crédito [cuja existência e estado se desconhece] se configuraria claramente insuficiente para a satisfação da dívida exequenda nos presentes autos.
T. Nestes termos, é entendimento da Fazenda Pública resultar do probatório e dos factos trazidos a juízo, conforme supra exposto, que o oponente exerceu a gerência de facto na sociedade no período pertinente para os autos, ademais resultando dos autos a demonstração da inexistência de bens penhoráveis da devedora originária enquanto pressuposto essencial à reversão da execução fiscal contra o oponente aqui recorrido.
U. E, quanto a tal segmento, ao decidir julgar procedente a presente oposição o Tribunal a quo fê-lo em erro de julgamento de facto, face ao défice instrutório em que incorre, às apontadas omissões/incorrecções referentes à factualidade assente e a uma errónea apreciação dos factos, com consequente violação do disposto no n.° 2 do artigo 153.° do CPPT e na alínea b) do n.° 1 do artigo 24.° da LGT, por estar demonstrada a inexistência de bens da devedora originária e a legitimidade do oponente, por via da responsabilidade subsidiária, no referente à execução fiscal subjacente aos presentes autos.
V. No referente às dívidas de coimas, em causa estão dois processos de execução fiscal cuja dívida exequenda subjacente é referente a coimas devidas no âmbito de processos de contraordenação decorrentes da entrega de declarações periódicas de IVA sem meio de pagamento - facto que deveria constar do probatório (vide docs. 6 e 9 e 10 da contestação), e a culpa do gerente de facto à data emerge do tributo com que nos confrontamos, IVA, pois que, liquidando o sujeito passivo o imposto nas suas operações tributáveis, se demitiu de o entregar ao Estado nos termos devidos, bem sabendo que estava obrigado a fazê-lo, não resultando dos autos que não tenha sido recebido.
W. Ainda: (i) não obstante as dificuldades alegadamente sentidas não se absteve o oponente aqui recorrido de continuar a actividade profissional no mesmo exacto ramo de negócio por via das Sociedades M...- Artes Gráficas Lda. e S.....; (ii) apresentou o oponente na qualidade de gerente da sociedade devedora originária pedido de pagamento em prestações da dívida exequenda em 29/10/2012, o qual foi incumprido por falta de pagamento, facto que deveria constar do probatório (vide doc. 23 da contestação); (iii) não existindo notícia de quaisquer medidas adoptadas pelo gerente no sentido de inverter a situação económica da sociedade - dessa omissão resultando configurada a culpa do gerente; (iv) sempre pagando os salários, em detrimento do pagamento de impostos, facto que deveria constar do probatório e que decorre do depoimento da segunda testemunha ouvida.
X. Assim, não observando o padrão do gerente criterioso e diligente, o oponente aqui recorrido configura-se como a origem do dano consubstanciado no incumprimento da dívida exequenda, pois perante a situação de insuficiência económica da sociedade para o pagamento das dívidas tributárias e coimas não diligenciou atempadamente no sentido de garantir o cumprimento dos créditos da empresa, aceitando, de forma directa e indirecta, tal resultado de sucessivo incumprimento.
Y. Pelo que, comprovada a culpa do oponente nos termos expostos, e conforme exigido pelo disposto no artigo 8.° do RGIT, no referente às dívidas de coimas, incorreu o Tribunal a quo em errónea apreciação dos factos pertinentes, com consequente erro na interpretação de aplicação do direito, configurando-se o oponente como parte legítima na execução.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deve ser revogada a douta sentença recorrida, julgando-se totalmente improdecente a oposição judicial deduzida, com as devidas consequências legais.
Sendo que, V. Exas. Decidindo, farão a Costumada Justiça.


O Recorrido, devidamente notificado para o efeito, não apresentou contra-alegações.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


II – Fundamentação

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso, sendo as de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e na aplicação do direito, ao considerar procedente a oposição, com fundamento na falta de verificação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do oponente, ora Recorrido, por falta de demonstração da insuficiência dos bens penhoráveis.


II.1- Dos Factos

O Tribunal recorrido considerou como provada a seguinte factualidade:

A) Em 2005, foi constituída a sociedade da D... - ARTES GRÁFICAS, LDA., com o NIF ..., em que eram sócios, o ora Oponente, D..., C... e C..., cada um titular de uma quota no valor de € 1.667.
— cf. Certidão Permanente referente ao NIPC ..., consultada em 13 de Junho de 2013 - Ap. 11/20050321, a fls. 32 e 33 do PEF apenso
B) A sociedade D... — ARTES GRÁFICAS, LDA. vinculava-se pela assinatura de um gerente e a sua gerência ficou a cargo do ora Oponente e de C.... — cf. Certidão Permanente referente ao NIPC ..., consultada em 13 de Junho de 2013 - Ap. 11/20050321, a fls. 32 e 33 do PEF apenso
C) A partir de 2006, o estado de saúde do Oponente determinou o seu afastamento da empresa. - cf. depoimento das testemunhas
D) A partir dessa data, a direção da empresa foi assegurada por J.... - cf. depoimento das testemunhas
E) Em 10 de Agosto de 2008, C... renunciou à gerência da sociedade D... — ARTES GRÁFICAS, LDA. — cf. Certidão Permanente referente ao NIPC ..., consultada em 13 de Junho de 2013 - Ap. 22/20070820, a fls. 32 e 33 do PEF apenso
F) Em 30 de Maio de 2011, foi entregue Via Internet a Declaração Modelo 22 - IRC da sociedade D... — ARTES GRÁFICAS, LDA, referente a 2010, identificando como representante legal, o ora Oponente, com o NIF .... - cf. Doc. 19 junto pela Fazenda Pública - Comprovativo de Entrega de Declaração, a fls. 112
G) Em 11 de Outubro de 2011, foi conferida força executiva ao requerimento de injunção apresentado pela sociedade D... - ARTES GRÁFICAS, LDA.”, a fim de obter o pagamento da quantia de € 19.100,84, e acrescido, proveniente de contrato de compra e venda, devida pela sociedade I..., Lda. e J.... - Cf. Doc. 1, junto pelo Oponente - requerimento de Injunção, a fls. 21
H) Em 2012, foi constituída a sociedade da M...- ARTES GRÁFICAS, LDA., com o NIF ..., em que eram sócios, o ora Oponente, D..., C.... — cf. Doc. 16 a 18 juntos pela Fazenda Pública - impressões extraídas do Registo Integrado do Contribuinte, Atividade Empresarial e Informação Cadastral, de fls. 108 a 111
I) Em 2012, foram entregues as declarações periódicas de IVA referentes à sociedade D... — ARTES GRÁFICAS, LDA, apurando imposto a apurar ao Estado. - cf. Docs. 11 a 15 juntos pela Fazenda Pública - Comprovativo de Entrega de Declaração - via internet, a fls. 100 a 107
J) Em 11 de fevereiro de 2012, foi entregue Via Internet a Declaração Anual — IES, referente a 2010 da sociedade D... — ARTES GRÁFICAS, LDA, identificando como representante legal, o ora Oponente, com o NIF .... - cf. Doc. 20 junto pela Fazenda Pública - Comprovativo de Entrega de Declaração, a fls. 113
K) Em 28 de Agosto de 2012, foi instaurado o processo de execução fiscal n.° 3140201... e apensos, em que era executada a sociedade D... — ARTES GRÁFICAS, LDA., com o NIF ..., para cobrança de dívida tributária, no valor de € 49,65. — cf. Doc. 23 junto pela Fazenda Pública - Tramitação do Processo, a fls. 117
L) Em 29 de Outubro de 2012, o Oponente, "na qualidade de gerente de D... - ARTES GRÁFICAS, LDA., NIPC ...”, requereu o pagamento da dívida descrita na alínea anterior, em prestações. — cf. Doc. 21 junto pela Fazenda Pública - Comprovativo de entrega de documento, a fls. 114
M) Em 2012, a sociedade D... - ARTES GRÁFICAS, LDA. funcionava na Venda Nova, e além do mais, prestava serviços de impressão, cor, corte e encadernação e tinha computadores. — cf. depoimento das testemunhas
N) Em 14 de Junho de 2013, quatro funcionários do Serviço de Finanças de Amadora-2 deslocaram-se à sede da D... — ARTES GRÁFICAS, LDA., e verificaram que ali não existiam "bens suscetíveis de serem penhorados ou outros valores que possam garantir as dívidas”. - cf. Doc. 22 junto pela Fazenda Pública - Auto de Diligências, a fls. 116
O) Em 14 de Junho de 2013, o Serviço de Finanças de Amadora-2 elaborou o projeto de reversão, no âmbito do PEF n.° 31402012... e apensos, de cujo teor resulta:
"Em face das diligências que antecedem, verifica-se a inexistência ou a insuficiência de bens penhoráveis à executada D... ARTES GRAFICAS LDA, NIPC ..., (...). Não havendo bens da devedora originária, ora executada que respondem pelo pagamento da divida, estão pois verificadas as condições previstas nos termos do n°. 2 do art° 153.° do Código de Procedimento e processo Tributário (CPPT), para o chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários, de acordo com a legislação em vigor no momento do exercício do seu cargo e no momento de constituição de responsabilidade, revertendo assim contra estes a execução. (...)
1 - Relativamente ao facto tributário:
Verifica-se que o facto tributário ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea a) do n.° 1 do seu art.° 24.°, os gerentes e administradores serão subsidiariamente responsáveis pelas dívidas da sociedade, mediante prova de culpa a efectivar pela Administração Tributária. Como não dispõe este Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a referida prova, não é possível efectivar a responsabilidade latente.
A empresa iniciou a sua actividade 2005-04-01 e cessou para efeitos de IVA em 2012-12-31.
2 - Relativamente à obrigação de pagamento:
Verifica-se que a obrigação de pagamento ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea b) do n°. 1 do seu art.° 24.°, os gerentes e administradores que exerçam, ainda que somente de facto, funções de gestão em pessoas colectivas ou equiparadas, serão subsidiariamente responsáveis pelas dividas tributárias cujo prazo legal de pagamento tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Assim, em face da informação que antecede e considerando os momentos de constituição da responsabilidade subsidiária, ao conjugar estes com a legislação então vigente temos que é (são) solidariamente responsável (is) pelo pagamento das seguintes importâncias, cujas dívidas se encontram discriminadas:
- D..., NIF ...”. - cf. projecto de reversão a fls. 35 e 36 do PEF apenso

P) Em 15 de Julho de 2013, foi entregue em casa do Oponente uma carta denominada "Citação (Reversão)”, no âmbito do PEF n.° 31402012..., citando-o, na qualidade de responsável subsidiário, para pagamento de dívida tributária de que era devedora originária a sociedade D... - ARTES GRÁFICAS, LDA., com o NIF ..., no valor global de 3.739,87, assim apurada:
«Imagem no original»

- cf. Ofício n.° 004718, de 13-07-04, descrição de dívida e aviso de receção de fls. 41 a 44 do PEF apenso

Q) Da carta descrita na alínea anterior, constava, além do mais, o seguinte despacho:
«Imagem no original»

- cf. Ofício n° 004718, de 13-07-04, a fls. 43 do PEF apenso


Quanto a factos não provados, na sentença exarou-se o seguinte:

Não foram alegados outros factos com relevância para a decisão que mérito que importe registar como não provados.

E quanto à Motivação da Decisão de Facto, consignou-se:

A decisão da matéria de facto assenta na análise dos documentos constantes dos autos e do PEF apenso, nomeadamente das informações oficiais e dos documentos juntos, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.
Nos presentes autos foram inquiridas as testemunhas arroladas pelo Oponente, ambas com conhecimento directo dos factos a que depuseram, por serem, à data dos factos, trabalhadoras da devedora originária. O seu depoimento foi relevante para a fixação dos factos descritos nas alíneas C), D) e M).
A..., é filha do Oponente e exerceu funções administrativas na empresa durante o período em que a mesma laborou.
Descreveu os problemas de saúde com que o pai se foi debatendo e o respectivo impacto na sua vida e na sua actividade profissional, afirmando que desde 2006 em diante, o pai nunca mais reuniu condições psicológicas para retomar a sua actividade profissional.
Mais explicou que numa fase de depressão profunda, em 2006, entregou a direcção da empresa a J..., seu “conhecido da área da parte gráfica”, tendo este, por indicação do Oponente transmitida aos trabalhadores, ficado “a tomar conta da empresa, dos trabalhos, dos clientes, ...”.

Quanto à actividade da empresa de 2006 em diante, esclareceu que havia um colega, E..., que fazia a gestão do trabalho entre os funcionários e que "fazia a ponte” entre estes e o J.... Reiterando que o pai nunca mais voltou à empresa e que foi o Sr. M... que manteve a gestão da empresa, até ao seu encerramento.
M..., exercia funções de técnica de pré-impressão na devedora originária, e confirmou que em 2006, lhes foi dada a indicação que, dali em diante, responderiam ao J....
Explicou que num dia de 2006, o Sr. D... disse que "a partir daquele momento, o Sr J... passava a mandar na empresa. (...) a supervisionar. Era como se fosse ele, para a gente o receber”, e que desde então nunca mais voltou à empresa.
Perguntada quanto à formalização de tal alteração, referiu que "não sei como é que as coisas foram feitas. Não era a minha função. Fazia o trabalho, recebia a remuneração, não tinha que saber mais nada”.
A respeito do mencionado J... que, apesar de arrolado como testemunha não foi inquirido por se desconhecer o seu paradeiro, a instâncias do Tribunal, e sem hesitações, ambas as testemunhas o descreveram fisicamente como sendo de meia estatura, forte e careca.
Tal descrição, pela sua espontaneidade e coincidência, convenceu o Tribunal da sua existência e participação na direcção da empresa, conforme haviam ambas descrito.
A respeito do património da sociedade, a que se refere a alínea M) do probatório, as testemunhas descreveram o local onde exerciam as suas funções e os meios de que dispunham para o efeito, tendo a testemunha F... feito referencia à existência de computadores, e referido que na empresa se realizavam tarefas de impressão, cor, corte e encadernação.
A respeito do local explicou que no 1° andar funcionava o atendimento ao público e a área financeira e na cave a zona de produção.


II.2 Do Direito

Alega a Recorrente que a sentença recorrida que julgou procedente a oposição judicial, incorreu em erro de julgamento na apreciação da matéria de facto e de direito, por a Autoridade Tributária e Aduaneira ter reunido indícios a seu ver suficientes para se concluir pela verificação dos pressupostos de que depende reversão, tendo demonstrado, nomeadamente, a insuficiência dos bens penhoráveis da devedora originária.

Anote-se desde já que as questões suscitadas pelo presente recurso e referente à mesma Recorrente, com matéria factual semelhante (tendo a inquirição de testemunhas ocorrido em simultâneo) e idênticas alegações e conclusões de recurso, apenas relativo a diferentes processos de execução fiscal (PEF), pronunciou-se já este Tribunal Central Administrativo nos recentes acórdãos proferido nos processos nº 1599/13.7BESNT e 1592/13.0BESNT relativamente ao mesmo Recorrido, disponíveis em www.dgsi.pt, e a cuja fundamentação aderimos sem qualquer reserva, e que seguiremos de perto, por não vermos razões para divergir, com as necessárias adaptações.

Na verdade, quando impugna a matéria de facto, a Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso [artigo 640º, n.º 1, alíneas a) a c) e n.º 2, alínea a) do CPC, aplicável ex vi artigo 281º CPPT], cabendo à Recorrente especificar:
a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas quanto aos indicados pontos da matéria de facto.

Desde já adiantaremos que a Recorrente cumpriu este programa, identificando os factos que entende terem sido mal julgados: quer por terem sido dados como provados quando o não deveriam ter sido, quer os que foram desconsiderados e considera serem relevantes à decisão, com indicação dos meios de prova que suportam esta sua pretensão de alteração do probatório.

Contudo, no que concerne à decisão da matéria de facto, a mesma não deverá conter formulações genéricas, de direito ou conclusivas. Na seleção dos factos, e na decisão sobre a matéria de facto deve o Juiz acolher apenas o facto cru, despido de conceitos de direito e de conclusões, afastando, pois, conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos.

A intervenção solicitada a este Tribunal de recurso, no que se refere à alteração da matéria de facto é, no essencial, de dois tipos. Por um lado, a Recorrente pede que sejam eliminados alguns pontos da matéria de facto que foram dados como provados; por outro, o aditamento à factualidade dada como provada de um conjunto de factos que enumera.

Vejamos, então:

Alega a Recorrente que o Tribunal a quo errou no julgamento de facto porquanto:

(i) A prova testemunhal e documental produzidas não permitem sustentar a factualidade dada como provada e vertida nas alíneas C) e D), antes resultando dessa prova - conjugada com os demais factos provados e devidamente ponderados os depoimentos e os documentos que os suportam - que devia ter sido dado como provado que o Oponente nunca deixou de exercer as funções de gerente de facto e de direito da devedora originária?

Na alínea C) dos factos provados diz a sentença recorrida: A partir de 2006, o estado de saúde do Oponente determinou o seu afastamento da empresa.

E na D) consta: A partir dessa data, a direção da empresa foi assegurada por J....

Esta factualidade foi dada como provada com base nos depoimentos das duas testemunhas ouvidas: A..., filha do Opoente, ora Recorrido, que trabalhava na empresa devedora originária e M..., que trabalhava na mesma empresa, cujos depoimentos ouvimos.

Tal como decidido no acórdão que chamamos à colação, cumpre salientar que algumas das expressões utilizadas nas alíneas em causa, são vagas e outras são conclusivas.

O termo afastamento, per se, não tem significado algum e o “afastamento” com relevância jurídica, ou seja, a não interferência ou influência na tomada de decisões reativas a administração ou gestão da empresa, terá que ser extraída de factos apurados, sendo que, o mero “afastamento físico” pode nem contender com a gestão empresarial

O mesmo se diga relativamente à apurada “direção da empresa assegurada por J...”, não acompanhada, no mínimo, de factos que permitam sustentar essa conclusão de direito.

Realçando o que vimos dizendo assume importância crucial, uma vez que são essas conclusões de facto e de direito – a extrair dos concretos factos apurados- que suportarão, a final, o julgamento do litígio apresentado em Tribunal, sendo que, aquela factualidade, nos temos em que ficou realizada, pelo menos no que respeita ao invocado não exercício de facto da gerência, contém em si uma valoração jurídica que representa, por si só, o sentido da solução final, devendo, pois, ser eliminada.

Mas uma segunda razão, que se prende com os depoimentos prestados, impõe a eliminação das alíneas C) e D) nos termos em que estão redigidas.

Em sede de fundamentação de facto, o Tribunal a quo resumiu o depoimento das testemunhas adiantando que foram inquiridas as testemunhas arroladas pelo Oponente, ambas com conhecimento direto dos factos a que depuseram, por serem, à data dos factos, trabalhadoras da devedora originária. O seu depoimento foi relevante para a fixação dos factos descritos nas alíneas C), D) e M):

A..., é filha do Oponente e exerceu funções administrativas na empresa durante o período em que a mesma laborou.
Descreveu os problemas de saúde com que o pai se foi debatendo e o respectivo impacto na sua vida e na sua actividade profissional, afirmando que desde 2006 em diante, o pai nunca mais reuniu condições psicológicas para retomar a sua actividade profissional.
Mais explicou que numa fase de depressão profunda, em 2006, entregou a direcção da empresa a J..., seu “conhecido da área da parte gráfica”, tendo este, por indicação do Oponente transmitida aos trabalhadores, ficado “a tomar conta da empresa, dos trabalhos, dos clientes, ...”.
Quanto à actividade da empresa de 2006 em diante, esclareceu que havia um colega, E..., que fazia a gestão do trabalho entre os funcionários e que "fazia a ponte” entre estes e o J.... Reiterando que o pai nunca mais voltou à empresa e que foi o Sr. M... que manteve a gestão da empresa, até ao seu encerramento.
M..., exercia funções de técnica de pré-impressão na devedora originária, e confirmou que em 2006, lhes foi dada a indicação que, dali em diante, responderiam ao J....
Explicou que num dia de 2006, o Sr. D... disse que "a partir daquele momento, o Sr J... passava a mandar na empresa. (...) a supervisionar. Era como se fosse ele, para a gente o receber”, e que desde então nunca mais voltou à empresa.
Perguntada quanto à formalização de tal alteração, referiu que "não sei como é que as coisas foram feitas. Não era a minha função. Fazia o trabalho, recebia a remuneração, não tinha que saber mais nada”.
A respeito do mencionado J... que, apesar de arrolado como testemunha não foi inquirido por se desconhecer o seu paradeiro, a instâncias do Tribunal, e sem hesitações, ambas as testemunhas o descreveram fisicamente como sendo de meia estatura, forte e careca.
Tal descrição, pela sua espontaneidade e coincidência, convenceu o Tribunal da sua existência e participação na direcção da empresa, conforme haviam ambas descrito.

Ora, ouvidos os depoimentos das testemunhas, entendemos que o julgador, para além de ter relevado o que disseram as testemunhas, devia igualmente ter ponderado e relevado o que aquelas não disseram e a influência que essa falta de respostas tem no julgamento, que há que fazer, quanto à credibilidade dos depoimentos. Ou seja, não tendo as testemunhas logrado responder a um conjunto de questões concretas que lhe foram colocadas, é importante valorar esse “desconhecimento”, aferir se é, ou não razoável, expectável, compreensível, atentas as relações existentes, no caso, familiares e funcionais, e o tempo de duração destas, se é normal o desconhecimento por parte de ambas das circunstâncias da vida real da sociedade sobre que foram questionadas. Só esta apreciação crítica permitirá, a final, declarar como provados ou não provados certos factos com base nesses depoimentos.

Neste contexto, assume especial relevância o facto de nenhuma das testemunhas ter avançado qualquer informação quanto a uma identificação acrescida de “J...” – tanto mais que, contrariamente ao aduzido na fundamentação, a testemunha M... teve notórias dificuldades, pelo menos iniciais, na própria descrição física da pessoa em causa, o que só pode encontrar justificação ou num estado de nervosismo ou no facto de ter contactado muitíssimo esporadicamente com a pessoa que conhece como “J...”. Porém, esta última hipótese temos que afastar já que a própria testemunha declarou que contactou com o “J...” ao longo de 6 anos.

Assume também relevo, no mesmo contexto, o facto de terem total desconhecimento das razões, mesmo que aparentes, pelas quais foi essa pessoa – J... - a assumir as referidas funções no desenvolvimento da atividade da devedora originária. E embora no caso da testemunha M..., atentas as funções que exercia e o modo (local) em que o fazia, pelo menos nos últimos anos (que descreveu como um armazém numa cave e que apenas algumas vezes se terá “cruzado” com o J...), ainda se pode configurar como plausível essa falta de conhecimento (subvalorizando que esse contacto terá ocorrido cerca de 6 anos), o mesmo já não podemos dizer quanto ao depoimento da filha do Oponente, a testemunha A..., que não facultou qualquer elemento que permitisse identifica-lo, explicar o porquê da sua intervenção pessoal e a razão pela qual tais funções lhe foram atribuídas pelo seu pai, gerente da empresa, desconhecimento que não se nos afigura credível, sobretudo desacompanhado de uma qualquer justificação capaz de o tornar plausível.

Acresce que, dos depoimentos em causa, também não extraímos com facilidade a conclusão de que o “afastamento” firmado na factualidade apurada - enquanto absoluta exclusão de todo e qualquer ato de gestão da devedora, sentido que a redação dada à alínea D) inculca – tenha sido afirmado categoricamente pelas testemunhas.

Aliás, não sabendo qualquer uma das testemunhas o modo pelo qual se dá a referida intervenção/substituição do Oponente pelo “J...”, isto é, que relação pessoal ou profissional existia ou passou a existir entre o Oponente e o “J..." é natural que também não soubessem, como declararam, se havia ou não reuniões entre ambos ou se as decisões que J... tomava, cingidas aos aspetos financeiros da empresa – ambas afirmaram que relativamente “à parte técnica”, J... não possuía conhecimentos que o habilitasse a intervir e quem era responsável era um outro funcionário, “Senhor E...” – eram o resultado de uma eventual articulação de J... com o Oponente.

Confirmativo do que vimos dizendo é o facto de a primeira testemunha, A..., a certa altura do seu depoimento mencionar a existência de uma “delegação de funções”, descrever claramente a intervenção de um outro funcionário e as funções que este desempenhava (“Tínhamos um colega que era o E..., que pronto, era um bocado a ponte entre mim e a outra minha colega e estava mais presente, tinha mais conhecimento das artes gráficas, que era o Senhor E..., e pronto eles entendiam-se, ele depois passava os trabalhos para nós e quando era preciso fazer os orçamentos explicava o que é que era preciso, tínhamos tabelas (…) e que J... ia lá algumas vezes”, “duas ou três vezes, vá lá, cinco, por mês” (…), no resto do tempo era “ o E... que orientava”).

Esta mesma testemunha –questionada sobre se “o seu pai de vez em quando ia lá à empresa para saber como é que as coisas estavam, fazia algum ponto da situação com este Senhor E... ou com este Senhor J... – respondeu claramente que “Fazia com eles, comigo não fazia qualquer ponto de situação”, o que, definitivamente, coloca em crise o que ficou consignado na alínea C) e, muito especialmente, a ideia ou conclusão decorrente da utilização no probatório do termo “afastamento”.

Por fim, não podemos deixar de atentar ainda numa outra parte do depoimento das testemunhas que coloca sérias dúvidas sobre a credibilidade ou relevância que deva ser dada ao depoimento de A.... Reportamo-nos, mais uma vez, ao desconhecimento de factos que, pelo menos no caso desta testemunha, filha do Oponente, não se compreende, como seja a constituição após 2006 (2007 e 2012), duas outras sociedades, nas quais o pai assumiu igualmente as funções de gerente.

Esta testemunha – centramo-nos no depoimento da filha do Oponente – também não soube adiantar qualquer esclarecimento ou avançar qualquer razão para o seu pai não ter formalizado - a ter existido - a sua substituição formal do cargo de gerente. Nem, ainda, como é que sem essa formalização nunca se verificaram quaisquer constrangimentos ou questões na gestão da devedora originária ao longo de 6 anos de atividade. Note-se que o Oponente era, pelo menos a partir de 2008 (até então havia ainda um outro sócio-gerente, pelo menos de direito), o único sócio gerente da devedora originária. Tudo, factos, que, quer pela sua relação pessoal quer pelas funções administrativas que desenvolvia, não podia ter deixado de enfrentar.

É importante frisar, atento o que acabamos de concluir, que a testemunha não declarou ter qualquer problema funcional ou pessoal com o pai, limitando-se a dizer que apenas o visitava ao fim de semana. E que durante o período de tempo considerado (2005/2006 a 2012), o Oponente teve intervenção na atividade da devedora originária, pelo menos pontualmente, como se constata de documentos constantes dos autos que, infra, sustentarão o aditamento ao probatório de diversa factualidade, devidamente compatibilizada com o afastamento físico do Oponente da empresa que ambas as testemunhas indubitavelmente confirmaram.

Em suma, porque as alíneas C) e D) encerram conceitos inócuos e/ou conclusivos e/ou valorações jurídicas e os depoimentos que suportam a factualidade aí vertida não foi devidamente valorada, este Tribunal de recurso, face aos depoimentos ouvidos e analisada crítica e conjugadamente toda a prova produzida, decide alterar a sua redação, a qual passará a ser a seguinte:

C) Desde 2003, mas de forma mais acentuada a partir de 2006, o Oponente passou a padecer de uma depressão psicológica, bem como de problemas cardíacos que determinaram, inclusive, a sua submissão a intervenção cirúrgica (depoimento das testemunhas A... e M...).

D) Em consequência do descrito em C), em data não concretamente apurada, mas seguramente no ano de 2006, o Oponente comunicou aos funcionários da devedora originária que a partir daquela data seria um Senhor, de nome J..., que ficaria “a supervisionar” e que o deviam tratar como “se fosse ele” (depoimento das testemunhas A... e M...).

(ii) Devia ter sido dado como provado que o Oponente constituiu em 2007 a empresa S... – ARTES GRÁFICAS, ENVERNIZAMENTO UV E PLASTIFICAÇÃO, LDA. e em 2012 a M...– ARTES GRÁFICAS, LDA”? - conclusões D) e G), das alegações de recurso

Quanto à constituição das sociedades M...– Artes Gráficas Lda.”, cujo aditamento se pretende, tendo em vista demonstrar a capacidade do Oponente, independentemente da depressão, para acompanhar a atividade de uma empresa e a gerir, há que relembrar a Recorrente que a maior parte desses factos já se encontram vertidos na alínea H) - como seja a data da constituição da sociedade, a identidade dos sócios e o seu objeto social. Ou seja, só não ficou expresso na mencionada alínea que nessa sociedade o Oponente, além de sócio, era o único sócio-gerente da referida sociedade.

Donde, considerando o contexto em que essa alegação foi feita e que o facto se encontra provado pelos documentos juntos com a contestação, é evidente que tal facto deve constar do probatório.

No que respeita à constituição, em 2007, da sociedade S..., Lda., em que o Oponente assume igualmente a qualidade de sócio e único gerente, este facto apenas foi trazido ao conhecimento do Tribunal no decurso da inquirição das testemunhas e a prova do mesmo (documento de fls. 229 – doc. nº 003659409 registado em 12-04-2019 às 14:14:11), apenas foi junta aos autos com as alegações finais.

Não tendo sido então adiantada qualquer justificação, designadamente quando é que teve conhecimento do facto ou a razão de apenas nessa data ter apresentado o referido documento, é evidente que a sua junção nunca seria de admitir nem, consequentemente, deve, nesta fase, este Tribunal de recurso relevar o facto e a prova a ele atinente.

Em conformidade, acorda-se em alterar a redação da alínea H) do probatório, que passará a ser a seguinte:

“I) Em 2012, foi constituída a sociedade da M...– ARTES GRÁFICAS, LDA., com o NIF 5..., em que eram sócios, o ora Opoente, D... e C..., assumido nesse título constitutivo a qualidade de único sócio gerente o Opoente (cf. fls. 42 a 45 de doc. nº 003659382 registado em 25-06-2014 às 19:36:48, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).”


(iii) Devia ter dado como provado que o Oponente recebia rendimentos da “D... Lda.”, por ter na sociedade, em sua substituição, J... a tratar dos “assuntos”? – conclusões E), F), J) e K), das alegações do recurso.

Alegou a ora Recorrente, no artigo 43º da contestação, que entre 2008 e 2011, o Opoente, ora Recorrido percebeu rendimentos da categoria A, sobre os quais incidiram retenções para a segurança social à taxa aplicável aos gerentes das sociedades.

Ora, estando em causa dívidas de coimas a invocação do recebimento desses rendimentos visava suportar a conclusão de que não correspondia à verdade que desde 2003 ou desde 2006, por força de uma depressão profunda, o Opoente, ora Recorrido, tivesse deixado de exercer as funções de gerente.

Assim, adita-se ao probatório a alínea R) com a seguinte redação:

“R) O Oponente desde, pelo menos, 2008 e até 2011 (inclusive), auferiu rendimentos da categoria A, sobre os quais foram efetuadas retenções para efeitos de contribuições para a segurança social a uma taxa equivalente à aplicada aos rendimentos exercidos pelos gerentes de sociedade, nessa qualidade – cf. fls. 33 de doc. nº 003659382 registado em 25-06-2014 às 19:36:48, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido”.


(iv) Devia ter sido dado como provado que não foram localizados na área do Serviço de Finanças de Amadora-2, nem noutro local, bens penhoráveis da devedora originária, que a devedora originária se encontrava já cessada em sede de IVA desde 2012.12.31, bem como provadas as demais diligências realizadas em momento anterior à operada reversão - pedidos de penhora de créditos, de outros valores e rendimentos e de vencimentos e salários - porque esses factos constam da tramitação do processo de execução fiscal ? – conclusões L), M) e O) das alegações do recurso.

Vejamos:

Na alínea N) dos factos provados consta: Em 14 de Junho de 2013, quatro funcionários do Serviço de Finanças de Amadora-2 deslocaram-se à sede da D... — ARTES GRÁFICAS, LDA., e verificaram que ali não existiam "bens suscetíveis de serem penhorados ou outros valores que possam garantir as dívidas”. - cf. Doc. 22 junto pela Fazenda Pública - Auto de Diligências, a fls. 116.

Todavia, em bom rigor, o que deve ficar a constar, tendo em conta o alegado pela Recorrente - demonstrar que não corresponde à realidade que apenas se tenham deslocado à sede da devedora originária e tenham omitido o dever de averiguação de bens penhoráveis da devedora - é o seguinte:

N) Entre outubro de 2012 e março de 2014, tendo em vista a penhora de bens capazes de assegurar o pagamento da dívida exequenda, a Administração Tributária realizou as seguintes diligências:
2012-10-25 - Pedido de Penhora de Outros Valores e Rendimentos n". 314020120000... (Registado)
2012-10-25 Mandado Penhora
2012-10-25 Pedido de Penhora de Créditos N°. 314020120000... (Registado)
2012-10-25 Pedido de pagamento em prestações – Art.º 196º do CPPT
2012-10-29 Associação do Plano de Pagamentos N°355 de 2012.
2012-10-29 Desassociação do Plano de Pagamentos Nº 355 de 2012.
2012-10-29 Emissão Notificação De deferimento do Plano Prestacional
2012-10-29 Pedido de Penhora de Outros Valores e Rendimentos N°. 31402012000... (Despachado)
2012-10-31 Pedido de Penhora de Créditos N“. 314020120000... (Despachado)
2012-11-05 Notificação Deferimento Plano Prestacional Entregue
2012-11-05 Pedido de Penhora de Outros Valores e Rendimentos N° 314020120000... (Notificação Emitida)
2012-11-25 - Pedido de Penhora de Créditos Nº 314020120000... (Notificação Emitida)
2012-11-07 Pedido do Penhora de Créditos N°. 314020120000... (Respondido)
2012-11-17 Pedido de Penhora de Outros Valores e Rendimentos N". 314020120000... (Notificação Entregue)
2012-12-05 Pedido de Penhora de Créditos N° 314020120000... (Notificação Entregue)
2012-12-05 Pedido de Penhora de Outros Valores e Rendimentos N“. 314020120000... (Respondido)
2012-12-26 Emissão Notificação Incumprimento Pagamento Prestações
2012-12-26 Pedido de Penhora de Outros Valores e Rendimentos N". 314020120000... (Registado)
2012-12-26 Mandado Penhora
2012-12-31 Pedido de Penhora de Créditos N°. 314020120000... (Registado)

(cf. fls. 51 de doc. nº 003659382 registado em 25-06-2014 às 19:36:48, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)

(v) Devia ter dado como provado – face ao teor do documento de fls. 30 a 31 de doc. nº 003659363 registado em 21-11-2013 às 14:28:53, que o requerimento de injunção não prosseguiu para execução por, segundo declaração prestada no processo de execução pelo próprio Oponente, a 11-11-2013, a executada não detinha bens penhoráveis? – conclusão P) das alegações do recurso jurisdicional;

Tal alegação, que também consta da contestação apresentada, visava, como se depreende claramente da leitura desta peça processual, demonstrar que a Fazenda Pública não ignorou a existência desse crédito e que só não prosseguiu com a sua cobrança quando dele tomou conhecimento por o próprio Opoente a ter informado que esse crédito era incobrável.

Atento o que fica exposto, tendo presente o teor do documento de fls. 31 do processo e que, por ora, apenas nos cumpre apurar factos, adita-se ao probatório uma alínea com a seguinte redação:

“S. A 13 de Novembro de 2013, o Opoente, através do seu Ilustre Mandatário, emitiu e enviou ao Chefe de Finanças de Amadora 2, que a recebeu, uma declaração com o seguinte teor:
“(…)
Executado D... (…)
Reversão D... Lda.
PEF 314020120... e aps (….)
Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças Amadora 2
Vem comunicar a V. Exa. que instaurou a Injunção a que foi atribuída força executiva – Proc. N.º 162344/11.8YIPRT
Porém, segundo apurou previamente a instaurar a execução para pagamento, o executado não possui bens penhoráveis pelo que o processo se tornaria de todo inútil e caro.
Daí não ter instaurado até à data a respetiva execução”
(cf. documento de fls. 31 de doc. nº 003659363 registado em 21-11-2013 às 14:28:53, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido)”.


(vi) Devia ter sido dado como provado que a dívida exequenda nos presentes autos ascende ao valor de € 3.739,87, nos autos de oposição n.º 1599/13.7BESNT ascende a € 20.614,37 e acrescido, e nos autos de oposição n.º 1592/13.0BESNT ascende ao montante de € 5.782,86? – conclusões S) das alegações de recurso jurisdicional.

Consideramos, salvo o devido respeito, que também nesta parte lhe assiste razão.

É verdade que o Tribunal tem, primacialmente, e em regra, que atentar ao objeto do seu processo, no caso, ao valor que no processo está em dívida, sendo, por isso, também em regra, por referência a esse valor ou dívida que o juízo de suficiência de bens deve ser realizado.

Estando, porém no mesmo Tribunal pendentes três processos com as mesmas partes, colocando-se em todos a mesma questão - suficiência de bens da sociedade para solver a dívida exequenda - e estando a resposta a essa questão dependente da apreciação do mesmo facto (alegada existência e relevância atribuída a um mesmo crédito na marcha de todos esses processos de execução) parece-nos admissível, segundo as várias soluções plausíveis de direito, que esta concreta factualidade seja vertida no probatório.

Assim, e uma vez que da alínea R) consta já o valor da dívida exequenda do um dos processos de execução, acorda-se em aditar uma nova alínea ao probatório com a seguinte factualidade:

“T. Correram termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob os n.ºs 1599/13.7BESNT e 1592/13.0BESNT, outras duas Oposições propostas pelo Opoente, ora Recorrido, na mesma qualidade de revertido, a execuções fiscais instauradas pelo Serviço de Finanças da Amadora 2, relativas a dívidas de IVA, IRC e Coimas, no valor, respetivamente, de € 20.614,37 e de € 5.782,86, tendo as sentenças aí proferidas sido objeto de recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul (cf. os processos identificados consultáveis no SITAF)”.


(vii) Devia ter sido dado como provado, atento o teor dos documentos n.ºs 6, 9 e 10, juntos com a contestação, que estão em causa dois processos de execução fiscal cuja dívida exequenda subjacente é referente a coimas devidas no âmbito de processos de contraordenação decorrentes da entrega de declaração periódica de IVA sem meio de pagamento? - conclusão V), das alegações do recurso;

Como alegado, não consta do probatório qualquer alínea em que tenha ficado vertido o objeto dos processos contraordenacionais que foram apensados, sendo que uma das questões que foi colocada pelo Opoente, ora Recorrido, foi, precisamente, a de inexistência de qualquer fundamento no despacho de reversão de que possa ser extraída a culpa que o artigo 8º do RGIT pressupõe.

Ora, o que a Fazenda Pública parece defender no seu articulado é que a alegação e prova da culpa resulta da própria certidão de dívida, isto é, é imanente à natureza do ilícito subjacente à contraordenação cometida pela devedora originária.

Atente-se que o que aqui nos importa não é saber se a Fazenda Pública tem razão nos argumentos de direito aduzidos. Ou seja, não curamos agora de saber se dessa certidão, por si só, resulta qualquer acrescida fundamentação para o despacho de reversão ou a prova do pressuposto culpa. O que é relevante para a decisão que ora tomamos são as ilações que do teor desse documento podem vir a ser extraídas na apreciação da questão jurídica colocada.

Nesta medida, consideramos pertinente que conste do probatório a identificação dos processos, principal e apensos, em que foi proferido o despacho de reversão que nestes autos se discute, sendo certo que a alínea k) apenas se reporta ao processo principal, sendo que, posteriormente a esse processo foram apensados, antes do despacho de reversão ser proferido, outros dois processos abrangidos pelo despacho de reversão.

Todavia, na alínea P) estão já identificados aqueles processos de execução fiscal apensados, instaurados para cobrança coerciva das dívidas de coimas, assim se concluindo que não lhe assiste razão.

(viii) Devia ter sido dado como provado que o Oponente, na qualidade de gerente da sociedade devedora originária, apresentou um pedido de pagamento em prestações da dívida exequenda em 2012.10.29, o qual foi incumprido por falta de pagamento, por o documento n.º 23 junto com a contestação o demonstrar? - conclusão W-(ii) das alegações do recurso;


Anote-se, desde já, que esse pedido de pagamento consta já como facto provado na alínea L) do probatório.

Fica, assim, para decidir, apenas o aditamento, nessa alínea, do alegado incumprimento do plano de pagamento prestacional, o qual é relevante para demonstrar – como foi o caso – a intervenção e diligência do Opoente na gestão da devedora originária, facto que, pela apontada razão e por estar comprovado documentalmente se considerar que seria de aditar, acaso não tivesse já sido levado aos factos provados e incluído já na nova redação dada à alínea N), como vimos supra.


(ix) Devia ter dado como provado que o Oponente, enquanto gerente, não adotou quaisquer medidas tendo em vista inverter a situação económica da sociedade, como sejam, a celebração de acordos de pagamento de obrigações vencidas, a viabilização de um plano de recuperação da empresa ou a sua apresentação oportuna à insolvência, a remodelação da empresa em termos de relações com clientes, fornecedores, trabalhadores? - conclusão W)-(iii) das alegações do recurso

A falta de fundamento nesta parte da impugnação é patente. Na primeira parte a pretensão não constitui facto, mas uma conclusão que este Tribunal terá que extrair, ou não, dos concretos factos apurados. Quanto à segunda parte, a prova positiva desse facto negativo não foi minimamente realizada, não devendo, com esse fundamento, ser aditada.

Não tem, pois, razão a Recorrente.



(x) Devia ter sido dado como provado que a devedora originária nunca deixou de pagar os salários aos seus funcionários? – conclusão W-(iv) das alegações de recurso

É manifesto que este Tribunal de recurso não pode acolher a pretensão recursiva neste ponto, quer porque essa factualidade não foi invocada por nenhuma das partes, nem suscitada, mesmo indiretamente, a propósito de qualquer uma das questões colocadas, quer porque esse facto apenas surgiu vagamente mencionado no âmbito da inquirição de uma das testemunhas – M... – centrado exclusivamente na sua situação funcional pessoal (ou seja, não foi colocada e muito menos respondida relativamente aos universo dos “trabalhadores” da empresa), para além de que a testemunha também declarou que no período de maior crise financeira por vezes o seu salário tinha sido pago com atraso.

Não tem, pois, a Recorrente razão quanto ao requerido aditamento aos factos provados


Estabilizada a matéria de facto, a questão que se coloca, agora, é a de saber se deve ser mantida na ordem jurídica a sentença recorrida.

Para a Recorrente, a resposta é negativa, defendendo que a prova produzida não pode ter deixado de criar dúvidas ao Tribunal a quo relativamente a dois aspetos fulcrais para decisão do litígio (também aqui recuperamos e acolhemos o que se decidiu no Acórdão que vimos citando):

“(…) O primeiro relacionado com a identificação da pessoa que efetivamente exerceu, em 2011 e 2012, a gerência de facto da devedora originária, designadamente sobre quem é J..., onde vivia, como surgiu na vida da empresa, que funções realmente aí desempenhou e durante que período de tempo. E, nessa medida, impunha-se que o Tribunal tivesse determinado as diligências necessárias para a sua inquirição como requerido pela Fazenda Pública em audiência de produção de prova, violando o referido indeferimento o preceituado no artigo 13.º do CPPT.

O segundo conexionado com a alegada suficiência de bens da devedora originária para solver as suas dívidas tributárias, impondo-se, nesta parte, que o Tribunal tivesse averiguado da quantificação da quantia exequenda, tendo por referência o universo de processos de execução fiscal a correr termos contra a sociedade devedora originária, e só após decidir. Não o tendo feito, conclui, existe um défice instrutório que lhe é imputável e que este Tribunal de recurso deve reconhecer e colmatar.

Vejamos, então:

Na sentença recorrida o Tribunal a quo começou por apreciar o vício de ilegalidade do despacho de reversão na parte relativa às coimas e encargos, tendo concluído que, nesta parte procedia o vício de ilegitimidade arguido por aquele despacho não conter qualquer fundamento de direito e não terem resultado demonstrados quaisquer factos dos quais possa ser extraída a culpa do Oponente pela insuficiência de bens.

Em recurso, quanto a esta parte, a Fazenda Pública apenas alegou que a culpa do Oponente resultava da própria natureza do ilícito, ou seja, que o facto de a devedora originária não ter entregue ao Estado o imposto devido (IVA retido), era, por si só, suficiente para que se julgasse preenchido o pressuposto da responsabilidade dos gerentes à luz do artigo 8.º do RGIT.

Ainda que não exatamente pelos mesmos motivos aduzidos na sentença recorrida - que apenas parcialmente acompanhamos – não cremos que deva ser reconhecida razão à Recorrente por ser evidente que a Recorrente não logrou fazer a prova da culpa exigida pelo artigo 8.º do RGIT.

Vale o que deixámos adiantado para que se diga que não é determinante a questão da omissão de qualquer referência ao artigo 8.º do RGIT no despacho de reversão, quer porque esse vício de falta de fundamentação de direito nem sequer foi invocado pelo Oponente (e não é de conhecimento oficioso) quer por ser evidente do articulado de oposição que o Opoente compreendeu perfeitamente, pelo ato de citação e documentos anexos, que dívidas (valor, período e titulo ou imposto) lhe estavam a ser imputadas e a que título lhe estava a ser exigido o pagamento, em especial, qual o regime jurídico em que se fundava a exigência de pagamento do valor atinente a coimas e encargos.

É, aliás, notório o investimento realizado na argumentação aduzida contra essa exigência, quer na parte em que invoca a inconstitucionalidade do regime, quer na parte relativa à ausência de alegação e prova quanto à sua culpa, quer, por fim, no vincar de inexistência de qualquer presunção neste âmbito, argumentação que acompanhou de abundante e pertinentemente jurisprudência que convocou em abono da sua tese.

No mais, subscrevemos integralmente o julgamento realizado pelo Tribunal a quo quanto a esta parte da decisão, designadamente quanto à necessária distinção entre os regimes de responsabilidade subsidiária consagrados nos artigos 23.º e 24.º da LGT e 8.º do RGIT:

Quanto à questão da ilegitimidade, dispõe o artigo 204º n.º 1 alínea b) do CPPT, que a oposição pode ter como fundamento a “[i]legitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou, sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida.
Encontramo-nos, assim, perante uma ilegitimidade substantiva, assente na falta de responsabilidade do citado pelo pagamento da dívida exequenda (…) e “haverá que fazer uso de leis atinentes à prova de atos ou factos jurídicos que simultaneamente afetam o fundo ou substância do direito, repercutindo-se, assim, sobre a própria viabilidade deste, pertencendo, por isso, ao direito substancial.
(…)
- “tratando-se de uma dívida proveniente de coimas aplicadas à devedora originária, (…) , a responsabilização dos gerentes haveria de ser efectivada termos do artigo 8º do RGIT, porquanto o artigo 24º da LGT não é aplicável às dívidas desta natureza (…) que regula a reversão das dívidas de coimas cobradas coercivamente em processo de execução fiscal, e do qual decorre o seguinte:
“1 - Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis:
a) Pelas multas ou coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insuficiente para o seu pagamento;
b) Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento”.
(…)
Como resulta inequívoco do despacho de reversão (cf. alíneas P) e Q) da factualidade assente), a reversão assenta simplesmente no facto de se ter apurado a insuficiência de bens da devedora originária e se considerar que o Oponente era gerente no período em referência, e não ter provado que a falta de pagamento não lhe era imputável, nos termos dos invocados artigos 23º n.º 2 e 24º n.º 1 alínea b) da LGT.
E resulta igualmente inequívoco que a Administração Tributária nada alegou no despacho de reversão (nem tão pouco no despacho e informação que o antecederam), quanto à culpa do Oponente pela insuficiência patrimonial para pagar a coima.
Pelo que, quanto as dívidas provenientes de coimas e encargos, descritas na alínea R) da factualidade assente, haverá que concluir pela procedência do vício de ilegalidade da reversão, por ilegitimidade, arguido pelo Oponente.”

Em conclusão, considerando o quadro jurídico que sinteticamente ficou exposto e recuperando igualmente tudo quanto foi alegado pelo Opoente, afirmamos com segurança que a jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo está hoje consolidada no sentido de que a norma do artigo 8º nº 1 do RGIT não é inconstitucional quando interpretada no sentido de que consagra uma responsabilidade pelas coimas; que essa responsabilidade se efectiva pelo mecanismo da reversão da execução fiscal contra gerentes ou administradores da sociedade devedora originária; que o artigo 8º do RGIT não consagra qualquer presunção de culpa e que é sobre a Administração Tributária que recai o ónus de demonstrar a culpa do revertido pela insuficiência do património social da originária devedora.

E, sendo assim é a Administração Tributária que tem que alegar no ato de reversão, a culpa do gerente por essa insuficiência como pressuposto necessário da efetivação da sua responsabilidade subsidiária e provar os factos que invocou (artigos 74º da LGT e 342º do CC).

Ora, basta atentarmos nos factos apurados, concretamente na alínea Q) do probatório, para concluirmos que a redação aí constante é, nessa parte, manifestamente conclusiva ou, se preferirmos, não assume, em si mesma considerada, o suficiente recorte de facto capaz de fundar a alegação de culpa para efeitos de artigo 8.º do RGIT.

Acresce que, contrariamente ao que a Recorrente invoca neste recurso, a mera apresentação no processo da certidão de dívida ou a consideração do ilícito contraordenacional subjacente à dívida não supre a falta de alegação do despacho de reversão em matéria de culpa, sob pena de reconduzirmos este tipo de responsabilidade que apreciamos a uma responsabilidade meramente objetiva, quando, bem o sabemos, a responsabilidade consagrada no artigo 8.º do RGIT é marcadamente subjetivista.

Há, pois, que concluir, que andou bem o Tribunal a quo ao julgar procedente o vício de ilegitimidade (substantiva) do Oponente no que tange às dívidas por coimas e encargos.


Apreciemos, agora, a sentença recorrida na parte relativa à alegada falta de preenchimento dos pressupostos consagrados no artigo 153.º do CPPT.

Adiantamos que acompanhamos a sentença recorrida na parte em que afirma que, tendo sido invocada a falta de excussão prévia, e constituindo essa excussão um pressuposto de base para operar a reversão, se impõe, antes de mais, aferir se a Autoridade Tributária logrou demonstrar a insuficiência dos bens penhoráveis da sociedade devedora originária.

Também acompanhamos o julgado na síntese que faz das posições das partes tal como se mostram vertidas nos respetivos articulados, uma vez que é inquestionável que:

- O Oponente alegou que a Autoridade Tributária se “limitou a proceder à reversão sem apurar do estado da D.... Lda. e dos créditos desta”, que “teria sido suficiente que tivesse consultado a plataforma electrónica onde se encontrava disponível lista de processos judiciais para constatar que a devedora originária “em 11-10-2011 vira ser conferida força executiva à Injunção 162344/11.8yiprt para cobrança de 20.940 €uros à empresa I... Lda., e que dessas alegações o Oponente extraiu - e quis que o Tribunal extraísse - a conclusão de que “AT/Fazenda Nacional podia e pode cobrar 20.940,00 € e subrogar-se na posição da D... Lda. e “que a reversão contra o oponente tinha sido precipitada e inútil”;

- A Fazenda Pública contrapôs que “foram levadas a cabo diligências no sentido de proceder à penhora de créditos da devedora originária” e que, em “relação ao processo de Injunção n.º 162344/11.8YIPRT, no qual reclama a cobrança do valor de € 20.940,00 à empresa I..., Lda.,, esclareceu que, de acordo com documento junto pelo Oponente” aquela não detinha bens penhoráveis” e que “o sujeito passivo em questão apresenta dívidas perante a AT que ultrapassam largamente o crédito alegado pelo oponente”.

Por fim, também julgamos isento de reparo o quadro legal convocado para decidir a questão que se colocava, já que não existem dúvidas quanto a ser nos artigos 23.º, n.º 2 da LGT e 153.º do CPPT que se encontram consagradas as regras relativas aos pressupostos de reversão, prescrevendo-se aí que:

- O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende de se verificar uma inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores [alínea a) do artigo 153.º do CPPT] ou existir uma fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido [alínea b) do mesmo normativo citado];

- Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas sociedades, cooperativas e empresas públicas são subsidiariamente responsáveis em relação estas e solidariamente entre si pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para a sua satisfação [al. a) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT]; pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento [alínea b) do n.º 1 do mesmo preceito e diploma legal].

Com o que dissentimos é, por um lado, parcialmente, com a interpretação que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra faz desses normativos legais e, muito especialmente, com a aplicação que deles fez ao caso concreto em resultado da valoração do probatório, amplamente já alterado por este Tribunal de recurso.

Para que bem se compreenda a posição que entendemos tomar, recuperamos o julgamento que aqui transcrevemos na parte pertinente:

Ora, da interpretação conjugada dos aludidos preceitos legais resulta que é requisito da reversão contra responsáveis subsidiários a inexistência ou insuficiência fundada de bens do devedor originário, recaindo sobre a Autoridade Tributária o ónus da prova, como resulta do já invocado artigo 74º n.º 1 da LGT.
(...)
Compete, pois à Autoridade Tributária provar que, à data da reversão, inexistiam ou eram fundadamente insuficientes os bens da devedora originária.
E só no caso de ser feita essa prova passa a competir ao revertido a demonstração da existência de bens no património da sociedade devedora originária.
Enquadrada juridicamente a questão, Analisemos o caso concreto.
Conforme resulta da informação instrutora e do projeto de reversão descritos nas alíneas R) e S), no que respeita ao apuramento da situação patrimonial da devedora originária, a Autoridade Tributária limitou-se a enviar funcionários à sede da empresa que constataram apenas que ali não existiam “bens suscetíveis de serem penhorados ou outros valores que possam garantir as dívidas”, tendo prosseguido a reversão “em face das diligências que antecedem”.
Não resulta do PEF que tenham sido efetuadas consultas a sistemas informáticos de averiguação de bens, nem que tenha sido apurado qual o destino do imobilizado da empresa [nem tão pouco menção à sua (in)existência], sendo certo que, atenta a atividade da empresa esta seria, em principio, detentora de máquinas e equipamento técnico adequados à atividade gráfica e de impressão.
Com efeito, a mera menção à inexistência de bens suscetíveis de serem penhorados, constante do Auto de Diligências, mais não representa que um juízo conclusivo, não fazendo prova da concreta insuficiência dos bens.
E isto porque a Autoridade Tributária, por um lado, não discriminou, quais as diligências concretamente realizadas para apurar a existência, ou não, de bens penhoráveis, por outro não procedeu a qualquer enumeração dos bens encontrados e do seu valor, nem a justificação da sua impenhorabilidade (seria por mau estado? mau funcionamento? reduzido valor comercial?).
Na verdade, limitou-se a invocar, genérica e conclusivamente, as “diligências que antecedem”, as quais, por consulta ao PEF, se resumem a uma única diligência – a visita às instalações.
Acresce que, ao contrário do que consta no PEF, dos autos resulta que à data da instauração do PEF e da efetivação da reversão, a devedora originária era titular, pelo menos, de um título executivo idóneo para cobrança de € 19 100,84, ou seja, de uma quantia pecuniária suficiente para solver a dívida exequenda [como resulta da alínea G), N) e P) da factualidade assente].
Ora, como bem refere o Opoente, a pesquisa da Autoridade Tributária às bases de dados a que tem acesso, deveria ter identificado tal título executivo, e em função dos valores em confronto, procurado executá-lo a fim de liquidar a dívida exequenda, uma vez que o seu valor era suficiente para tal efeito.
Refira-se adicionalmente que, não obstante, segundo alega a Fazenda Pública no artigo 74° da sua contestação, o credor identificado naquele título executivo apresentar "dívidas perante a AT que ultrapassam largamente o crédito alegado pelo oponente”, desconhece-se se tal situação já se verificava em 2012 e 2013, aquando da instauração do PEF e da reversão (sendo que sempre se impunha a expressa menção a tal facto), e ainda assim, e considerando que tal título abrange uma empresa e um particular, se tal pagamento foi exigido ao devedor João Adalberto (identificado no título executivo descrito na alínea G) supra), e se este tinha ou não bens para responder por tal dívida.

Acresce que, admitindo-se que o “documento junto pelo Opoente” a que a Fazenda Pública se refere, é o requerimento apresentado pelo Oponente, ora Recorrido, em 13 de novembro de 2013, que consta dos autos, a fls. 31, sempre se dirá que tal informação prestada pelo Oponente em 2013, em nada reduz as obrigações da Autoridade Tributária e Aduaneira no âmbito da aferição dos bens da devedora originária, que eram devidas em momento anterior à prolação do despacho de reversão, ou seja, antes de Julho de 2013 [cf. alínea P) supra].

Assim, a informação prestada em novembro seguinte pelo Opoente não sA... a omissão verificada, persistindo as dívidas quanto à suscetibilidade de cobrança daquele crédito se, em devido tempo, a Autoridade Tributária e Aduaneira tivesse agido adequadamente.

A verdade é que a Autoridade Tributária não realizou, ou não o descreveu, quaisquer diligências tendentes à penhora daquele crédito, o qual, por si só seria suficiente para liquidar a totalidade da dívida exequenda.

(…) da conjugação da factualidade descrita, constata-se que as diligências tendentes ao apuramento do património da devedora originária foram insuficientes e incompletas, não permitindo concluir, por si só, no sentido constante do projecto de despacho de reversão, descrito na alínea O) da factualidade assente.

Na verdade, e conforme resulta do já citado Acórdão do STA proferido no processo nº 0167/11, e demais jurisprudências nele citada, “apenas haverá fundada insuficiência do património do originário devedor se do probatório for possível concluir que o valor dos seus bens (quantificado) é manifestamente insuficiente para satisfação da dívida exequenda e do acrescido, o que no caso dos autos não sucede por ausência de tal quantificação”. (…)
E a propósito da demonstração da inexistência/insuficiência dos bens penhoráveis convocamos o Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), quando conclui que “a AT não provou a inexistência de bens, porquanto foram penhorados bens à executada originária e na informação prestada (projecto de reversão) não se esclareceu o destino desses bens, não se tendo consignado expressamente se já se tinha dado destino aos bens penhorados e se à data da informação não existiam outros bens. Nem tão-pouco se pode confirmar a alegação de que os citados créditos penhorados já tenham sido absorvidos pela dívida exequenda inicial, dado que não se mostra apurado o valor da mesma.” (cf. Acórdão proferido no processo nº 00695/09.0BEPNF, em 2 de Março de 2017, …)
Aqui chegados, tudo visto e ponderado, resulta que a AT não comprovou a invocada fundada insuficiência dos bens penhoráveis, tendo inclusive “ignorado” a existência de um crédito que, à data, poderia ser idóneo para solver a dívida exequenda».

Não subscrevemos integralmente o juízo que ficou exposto por três ordens de razões.

A primeira decorre do facto de existir no julgamento efetuado, se bem o entendemos, alguma confusão entre o que deve constar do despacho de reversão e o que tem que ser provado pela Administração Tributária, sendo visível que o Tribunal vai oscilando ao longo do julgamento entre “a falta de fundamentação formal (alegação) do despacho de reversão” e a “falta de fundamentação substancial (prova) da verificação dos pressupostos”.

Daí que se nos afigure importante deixar já claro - sem prejuízo de se entender que o despacho de reversão, enquanto ato suscetível de afetar direitos e interesses legítimos dos particulares a que se dirige, tem, por imposição legal (124º do CPA e 77º da LGT) e constitucional (artigo 268º da CRP) que estar fundamentado – que a fundamentação formal do despacho de reversão, como o Supremo Tribunal Administrativo recorrentemente tem afirmado, se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser realizada.

Do que vimos expondo resulta, pois, que, para nós, a questão é, tão só, de fundamentação substancial, isto é, de prova ou não prova da insuficiência de bens à data da prolação do despacho de reversão, convocada pela Fazenda Pública como fundamento da reversão operada.

Pelo que, o juízo exteriorizado pela sentença naquela parte, por si só, não se mostra capaz de sustentar o julgamento realizado.

A segunda razão porque não concordamos integralmente com o julgado é porque, contrariamente ao que o Tribunal a quo afirma (um pouco desconformemente com os factos que deu como provados e, seguramente, com os que por nós foram aditados), resulta claríssimo que a Administração Tributária não se limitou a efetuar uma deslocação à sede da empresa antes de concluir que não existiam bens capazes de garantir o pagamento da dívida exequenda.

Na verdade, como resulta da alínea N), após ter instaurado a execução a 2 de Março de 2012 e citado a executada a 9 de Março de 2012, e imediatamente após ter decorrido o prazo de 30 dias que a devedora originária legalmente dispõe para reagir, isto é, a 18 de Abril de 2012, a Administração Tributária iniciou de imediato diligências tendo em vista a penhora de bens, as quais, salvo num curto período de tempo de interrupção decorrente do pedido de pagamento em prestações efetuado pelo Opoente em nome da devedora originária, prosseguiram durante quase 1 ano, incluindo-se aqui inúmeros pedidos de penhoras de vencimentos, quotas, créditos, outros valores e rendimentos e que culminaram na última diligência, realizada a 14 de Junho de 2014 com a deslocação à sede da devedora.

É no âmbito desta última diligência que é afirmado que aí, na sede, “não constam bens suscetíveis de serem penhorados ou outros valores que possam garantir a dívida”. E que também é afirmado que na área de Serviço de Finanças de Amadora-2 não foram localizados outros bens suscetíveis de serem penhorados, nem consta que os possuam em qualquer outro local.

E é apenas após essa última diligência que o processo aparece em preparação para reversão e o Oponente é citado na qualidade de revertido.

Não se olvida que o Tribunal a quo fez uma distinção entre “PEF” e documentos constantes dos autos.

Todavia, pese embora existissem fortes índicos de que o “PEF” – na parte apensa aos autos - não estava completo, o Tribunal não julgou necessário confirmar essa situação, certamente por ter entendido que a Administração Fiscal juntou com a contestação um conjunto de documentos – tramitação integral do PEF –, que não foram impugnados e que o Tribunal admitiu como fazendo parte integrante daquele, ou, pelo menos, que eram dotados de força probatória relevante, já que deles lançou mão para dar como provadas as diligências realizadas, que nós fizemos questão de transcrever para que ficasse bem identificada a amplitude da averiguação e diligências que pela Administração Fiscal foram concretizadas.

Donde, para além de não existir fundamento, pelas razões já apontadas, para se exigir que todas as diligências realizadas fiquem a constar do despacho de reversão, não há qualquer razão para as subvalorizar com o argumento de que não constam do “PEF”.

Acresce, ainda neste contexto, que não podemos subscrever o entendimento do Tribunal a quo de que do auto de diligências de 14 de junho de 2013 apenas consta um juízo conclusivo ou que lhe falte qualquer quantificação.

Note-se que, no referido auto, o que ficou expresso foi precisamente que não havia bens suscetíveis de serem penhorados ou outros valores, pelo que, se não existem bens também não há qualquer quantificação a fazer. A exigência de quantificação mencionada nos arestos convocados na sentença recorrida pelo Tribunal a quo, pressupõe, naturalmente, a existência de bens suscetíveis de quantificação, a existência de bens a que seja possível atribuir um valor. Porém, já carece de sentido invocar essa exigência nas situações em que, o que resulta do auto, o que aí se narra é que não existem bens no local – realidade ou inexistência essa à data da diligência que, de resto, que nem sequer foi questionada pelo Oponente, designadamente, como se impunha, alegando que esses bens existiam ou em que local se encontravam – fossem computadores, máquinas de corte ou outros.

A terceira razão que nos leva a não concordar integralmente com os fundamentos do julgado prende-se com a invocada existência de um crédito de que a devedora originária é titular.

Alegou o Oponente que a Administração Tributária podia e devia ter tido conhecimento desse crédito, se tivesse sido minimamente diligente, através do qual, sublinha, teria alcançado o valor monetário necessário ao pagamento da dívida, obviando, por inútil, que tivesse sido proferido despacho de reversão e citado nessa qualidade o Oponente.

O Tribunal a quo foi sensível a esta argumentação, a qual, se bem vemos, foi determinante no sentido do julgado.

Na verdade, diz-se na sentença que “ao contrário do que consta no PEF, dos autos resulta que à data da instauração do PEF e da efetivação da reversão, a devedora originária era titular, pelo menos, de um título executivo idóneo para cobrança de € 20.940, ou seja, de uma quantia pecuniária suficiente para solver a dívida exequenda. (como resulta das alíneas G), M) e R) da factualidade assente), pelo que a Administração Tributária devia-o ter identificado, procurado executá-lo, tanto mais que, atentos os valores em confronto, se conclui que o seu valor era suficiente para o efeito (solver a dívida exequenda).

Explica ainda a Meritíssima Juíza, para que não houvesse dúvidas quanto à irresponsabilidade do Oponente, que a alegação da Fazenda Pública de que o “credor identificado naquele título executivo não detinha bens penhoráveis e apresentava dívidas perante a Administração Tributária que ascendem a € 68.341,08”, não é pertinente. Quer porque se desconhece se essa situação já se verificava em 2012 e 2013, aquando da instauração do PEF e da reversão. Quer, porque, de todo o modo, se impunha a expressa menção a esse facto no despacho de reversão. Quer, por fim, porque, considerando que tal título abrange uma empresa e um particular, desconhece-se se esse pagamento foi exigido ao devedor João Adalberto (identificado no título executivo descrito na alínea G) supra), e se este tinha ou não bens para responder por tal dívida.

Por fim, remata o Tribunal dizendo que, ainda que se admita que o “documento junto pelo oponente” a que a Fazenda Pública se refere na sua contestação, é o requerimento apresentado pelo oponente em 13 de novembro de 2013, que consta dos autos, a fls. 31, sempre se dirá que tal informação prestada pelo Oponente em 2013, em nada reduz as obrigações da Autoridade Tributária e Aduaneira no âmbito da aferição dos bens da devedora originária, que eram devidas em momento anterior à prolação do despacho de reversão, ou seja, antes de julho de 2013 [cf. alínea O) supra], e uma vez que a informação prestada em novembro seguinte pelo Oponente não sana a omissão verificada, persiste a dúvida quanto à suscetibilidade de cobrança daquela crédito se, em devido tempo, a Autoridade Tributária e Aduaneira tivesse agido adequadamente.

Em suma, segundo o Tribunal a quo, porque a Autoridade Tributária não descreveu quaisquer diligências tendentes à penhora daquele crédito, o qual, por si só, seria suficiente para liquidar a totalidade da dívida exequenda, terá que se concluir que as diligências tendentes ao apuramento do património da devedora originária foram insuficientes e incompletas, não permitindo concluir, por si só, no sentido constante do projeto de despacho de reversão (descrito na alínea O) da factualidade assente), tendo, inclusive, “ignorado” a existência de um crédito que, à data, podia ser idóneo para solver a dívida exequenda.

Embora, como já dissemos, não concordemos integralmente com a argumentação da Meritíssima Juíza, é na existência deste crédito e, muito especialmente, no que relativamente a este ficou provado e não provado que se louva a nossa decisão de não revogar o julgamento de 1ª instância.

Explicitemos.

Constitui facto incontroverso que o crédito existe e que a Administração Tributária dele teve conhecimento.

E embora não seja correto afirmar-se, contrariamente ao que resulta da sentença recorrida, que a Administração Tributária o tenha ignorado, certo é que o Oponente alegou e provou nesta Oposição aquela existência e a Administração Tributária não logrou provar que daquela existência não resultava infirmada a conclusão que sustenta o despacho de fundamentação, ou seja, que os bens existentes na titularidade da devedora originária eram, à data do despacho de reversão insuficientes para solver a dívida.

Note-se, o que não está claro na sentença e deve ficar devidamente realçado, que este Tribunal Central deu como provado que o Oponente, a 13 de novembro de 2013, confirmou perante a Administração Fiscal que aquele crédito existia. E que, simultaneamente com a confirmação realizada, comunicou à Administração Tributária que tinha apurado, já após ter instaurado a Injunção e lhe ter sido conferida força de título executivo, que a “executada não possuía bens penhoráveis”, residindo nesse circunstancialismo a opção por não instaurar o processo (execução), o qual se traduziria num ato “de todo inútil e caro”.

Contra esta alegação invocou a Fazenda Pública na contestação três argumentos: o próprio Oponente comunicou que não havia bens na posse da Executada (Injunção); a Executada também tem dívidas perante a Administração Fiscal que ascendem a cerca de 68.341,08 euros, razão pela qual nessa situação não era admissível a sub-rogação.

Tudo, pois, para concluir que a sua atuação estava perfeitamente legitimada uma vez que o despacho de reversão não ficava posto em causa pela existência uma vez que a simples existência daquele crédito não conduzia a que ficasse infirmada a conclusão vertida no despacho de reversão de que os bens eram insuficientes para solver a dívida exequenda.

Não cremos, salvo o devido respeito, que lhe assista razão.

Começamos por salientar que, sem prejuízo da confiança e boa-fé que a Recorrente terá depositado na comunicação realizada pelo Oponente, só com a dedução da presente Oposição, mais de 1 ano após a prolação do despacho de reversão, é que a Fazenda Pública veio invocar a comunicação de existência desse crédito e a existência, por parte da sociedade de que a devedora originária é credora, de avultadas dívidas perante a Administração Fiscal.

Não é, porém, essa “tardia” invocação que nos pré-determina a não reconhecer razão à Recorrente. A nossa decisão assenta no facto de a Administração Tributária não ter logrado provar os factos que invocou.

Na verdade, da conjugação da factualidade por nós aditada com a factualidade que vinha fixada da 1ª instância, não podem subsistir dúvidas que a Administração Tributária realizou um vasto leque de diligências, durante quase 2 anos, no sentido de identificar bens suscetíveis de garantir o pagamento da dívida. E que, em resultado desse conjunto de diligências, concluiu, bem, não existirem bens no património da devedora originária para esse efeito.

Também resulta do probatório que o Opoente, notificado para efeitos de audição prévia e do projeto de reversão nada disse, uma vez que apenas em novembro de 2013, cerca de 6 meses após a notificação do projeto, do despacho de reversão e da sua citação como revertido, é que prestou a informação da existência do crédito emergente do processo de injunção.

Porém, como está bem de ver, o facto de não se ter pronunciado em sede de audição prévia, ou seja, do facto de nessa data não ter indicado a existência do titulo executivo e o correspondente crédito de que é titular a devedora originária não significa que o revertido não possa, em sede de Oposição, invocar a sua existência.

A diferença, entre um e outro momento, releva apenas em sede de ónus da prova: se o Oponente tivesse invocado a existência do crédito em sede de audição prévia, era à Administração Tributária que competia averiguar e atuar em conformidade, vertendo, após, no despacho de reversão (prosseguindo esta) as razões pelas quais o crédito não podia servir para a satisfação da quantia exequenda; sendo invocado apenas em sede de Oposição, e estando demonstrado nos autos que a Administração Tributária até à prolação do despacho de reversão (Junho de 2013) realizou as diligências possíveis para encontrar bens, é sobre o Oponente que recai o ónus de demonstrar que, não obstante essas diligências e conclusão de insuficiência, o crédito existia à data do despacho de reversão e era suficiente para solver a dívida exequenda.

Rigorosamente repartido o ónus probatório, facilmente se percebe porque concluímos que a Oposição procede com este fundamento. O Oponente provou que o crédito existia à data do despacho de reversão (e, aparentemente continua a existir, já que a Administração Tributária não põe em causa essa existência) e era suficiente, atento o seu valor, para solver a dívida exequenda. A Administração Tributária não logrou demonstrar que, independentemente da existência daquele crédito, permanecia intocável a conclusão de insuficiência de bens tendo em vista a satisfação da dívida, designadamente, não provou que não era possível, através dele, obter o pagamento da dívida, por não existirem bens no património de qualquer um dos Executados no processo de injunção.

Note-se, aliás, como realçou a sentença recorrida, que eram dois os devedores mencionados no título executivo, sendo que, quanto a um deles, não foi feita pela Administração Fiscal qualquer referência e, relativamente ao outro, que menciona, não logrou provar que o mesmo tivesse já nessa data (despacho de reversão), dívidas fiscais que ascendiam a mais € 68.000,00.

Em suma, tendo o Opoente, ora Recorrido, alegado e provado que à data a em que foi proferido o despacho de reversão a devedora originária era titular de um crédito em montante superior ao valor da dívida exequenda e não tendo a Administração Tributária logrado demonstrar que através desse crédito não lhe era possível obter a satisfação do pagamento da mesma dívida, é forçoso concluirmos que a Oposição, apenas com este fundamento, deve proceder.

Uma nota final se impõe ainda neste recurso atentos dois fundamentos nele invocados pela Recorrente.

Como ficou identificado na delimitação do objeto do recurso, alegou a Fazenda Pública que, subsistindo dúvidas quanto à suficiência de bens da devedora originária para solver as suas dívidas tributárias, incumbia ao Tribunal a quo averiguar da quantificação da quantia exequenda, tendo por referência o universo de processos de execução fiscal a correr termos contra a sociedade originária devedora. E que, só após esse juízo, lhe era legitimo decidir.

Tudo, para concluir que, não tendo o Tribunal a quo procedido nos mencionados termos, há nos autos um défice instrutório que lhe é imputável [conclusão R), das alegações do recurso jurisdicional].

Não se acolhe esta argumentação.

Este Tribunal Central Administrativo Sul está ciente que a Fazenda Pública requereu o aditamento ao probatório da pendência de três processos de Oposição, instaurados pelo nosso Opoente, na sequência de outros tantos despachos de reversão.

Este Tribunal de recurso deferiu essa pretensão pelas razões então explanadas.

Porém, para além de não subsistir qualquer dúvida quanto a não ter resultado provado nestes autos a insuficiência de bens, discorda-se totalmente que o julgador deva aferir da verificação dessa suficiência ou insuficiência de bens por referência ao valor de dívidas que estão a ser objeto de cobrança noutros processo de execução fiscal, uma vez que tais processos não estão apensados ao processo de execução a que esta oposição se dirige.

Quem esteve – ou devia ter estado - consciente da existência desses vários processos era a Administração Tributária que, em conformidade com o raciocínio neste recurso apresentado, ou apensava todos os processos e vertia neles a existência do crédito, demonstrando que este era manifestamente insuficiente para solver a dívida exequenda, ou, não sendo tal apensação legalmente admissível, diligenciava num desses processos pela execução do crédito em questão e invocava, nos demais, a sua insusceptibilidade para assegurar o pagamento dos valores aí em dívida.

Donde, independentemente das razões que determinaram a Administração Tributária a não concretizar qualquer uma das referidas opções, não pode é agora pretender que este Tribunal Central construa um novo regime procedimental e processual, que, objetivamente, é o que substancia a sua pretensão.

Em suma, a pretensão da Recorrente não se traduz, como pretende fazer crer, num “mero complemento de prova” que ao Tribunal a quo se impusesse realizar no exercício do princípio do inquisitório e do dever de descoberta da verdade material.

Nessa medida, pelas razões avançadas, se conclui carecer a sua alegação de qualquer fundamento legal.

É, pois, pelos fundamentos expostos, de julgar improcedente o recurso jurisdicional e, consequentemente, prejudicada a apreciação das demais questões nele suscitadas, uma vez que, qualquer que fosse a decisão que sobre elas viéssemos a proferir, a sentença recorrida, pela decisão que já tomamos quanto à questão A...lisada, sempre subsistiria.

Em face do exposto, será de negar provimento ao recurso e de manter a sentença recorrida, embora com a presente fundamentação


Sumário/Conclusões:

I. – Se a Administração Tributária, após múltiplas diligências, realizadas durante largos meses, não logra identificar bens ou direitos na titularidade de uma devedora originária, é inatacável a conclusão, que fundamenta o despacho de reversão, de que os bens são insuficientes para solver a dívida exequenda.
II. – Se o Oponente, notificado do projeto de despacho de reversão, nada diz, invocando apenas posteriormente e em sede de Oposição, que a devedora originária é titular de um crédito e que o mesmo é suficiente para solver a dívida exequenda, é sobre si que recai o ónus de provar esse circunstancialismo de facto.


III - Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso jurisdicional, em manter, com a presente fundamentação, a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, que decaiu.

[Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do DL nº10-A/2020, de 13 de março, o Relator atesta que os Juízes Adjuntos - Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores Vital Lopes e Luísa Soares - têm voto de conformidade.]

Lisboa, 30 de setembro de 2021

SUSANA BARRETO