Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2726/12.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/14/2021
Relator:ANA CRISTINA CARVALHO
Descritores:OPOSIÇÃO
REJEIÇÃO LIMINAR
PODER JURISDICIONAL
OMISSÃO DE ACTOS DA SECRETARIA
 RECLAMAÇÃO PARA O JUIZ
INCIDENTE ANÓMALO
CUSTAS
Sumário:I – Com a prolação de despacho que põe fim ao processo, como sucede com o despacho de rejeição liminar, esgota-se o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa.
II – Da omissão de actos da secretaria cabe reclamação para o juiz, a apresentar no prazo supletivo.
III – Constitui incidente anómalo, estranho ao desenvolvimento normal da acção, sujeito a tributação, um requerimento apresentado em processo de oposição à execução fiscal pedindo ao Tribunal que ordene o levantamento da penhora de créditos ou, em alternativa o cancelamento da penhora incidente sobre um bem imóvel, promovidos pelo órgão da execução fiscal, no âmbito do processo de execução fiscal que deu origem ao processo de oposição, por constituir matéria da competência do órgão da execução fiscal.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – Relatório

J..... (advogado em causa própria) não se conformando com o despacho proferido pelo Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa a fls. 91 a 94, no qual julgou verificado um incidente anómalo, com a consequente condenação do oponente em custas e ordenou o desentranhamento do requerimento que deu origem ao referido despacho «deixando cópia certificada em seu lugar, a fim de ser remetido ao Órgão de Execução Fiscal, para sua eventual apreciação e decisão, caso aí não tenha já sido suscitado pedido análogo», dele veio interpor o presente recurso.

Inconformado com o assim decidido, veio o Oponente apelar para este Tribunal Central Administrativo Sul apresentando, para o efeito, as suas alegações e formulando as seguintes conclusões:

«1- O tribunal recorrido decidiu o despacho de fls. 91-94 em erro sobre um pressuposto de facto: o esgotamento do poder jurisdicional nos autos;

2- O tribunal recorrido decidiu, em decisão transitada em julgado, o seguinte: "Determinamos sejam de novo praticados os atos para ser notificada a decisão proferida ao Requerente, passando a aceder ao exercício das faculdades processuais que entenda apropriadas";

3- Essa notificação, apesar de decidida judicialmente, com trânsito em julgado, nunca veio a ser feita;

4- Apesar de o declarar na comunicação do despacho de fls. 71-73, a Secretaria do Tribunal recorrido não juntou nessa comunicação qualquer cópia do despacho de indeferimento liminar;

5- Como consequência, o ora opoente permanece até hoje sem notificação do despacho liminar proferido nos autos, desconhecendo o seu conteúdo, e estando impedido de recorrer do mesmo e de exercer outras situações jurídicas que dele dependem;

6- Deste modo, o poder jurisdicional não se encontra esgotado nos autos, que permanecem abertos, e o tribunal a quo devida ter conhecido substancialmente do requerimento apresentado a 24 de Fevereiro (a fls. dos autos).

Termos em que se requer:

- Seja revogado o despacho de fls. 91-94;

- Seja ordenada a notificação ao opoente do despacho de indeferimento liminar da oposição, em cumprimento do despacho de fls. 71 a 73 dos autos;

- Promova-se a esta nova luz a apreciação do requerido em 24 de Fevereiro de 2014.»

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal Central emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. Considera que a notificação da decisão liminar não deixa de produzir os seus efeitos pelo facto de o expediente ter sido devolvido, considerando-se notificada no 3.º dia posterior ao do registo.

Que a repetição da notificação ordenada pelo juiz apenas se ficou a dever ao facto de, na data do despacho, ainda não constar dos autos a informação prestada pelos correios, que afasta qualquer irregularidade da notificação.

Quanto ao pedido de cancelamento das penhoras além de constituir questão nova que não tem cabimento no processo de oposição à execução por constituir questão da competência do órgão de Execução Fiscal, em primeira linha, já se tinha esgotado o poder jurisdicional do juiz.

Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.


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II – Objecto do recurso

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Importa assim, decidir:

i) se o despacho recorrido incorreu em erro de julgamento ao considerar que se esgotou o poder jurisdicional, por pressupor a prévia notificação da decisão de rejeição liminar ao recorrente;

ii) se deve ser ordenada a notificação do despacho de indeferimento liminar da oposição ao recorrente;

iii) se o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar que o requerimento apresentado pelo recorrente em 24/2/2014, em que requeria «o cancelamento da penhora de de créditos F....., SA e devolvido o dinheiro ao oponente; - Em alternativa, e caso assim não se entenda, seja ordenado o cancelamento da penhora sobre ....., em Lisboa, de que o opoente é proprietário, permanecendo a penhora de créditos para garantia do pagamento da quantia exequenda.» constitui incidente anómalo sujeito a tributação;

iv) e se o tribunal a quo devia ter apreciado e decidido o aludido requerimento de 24/2/2014.


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III – Fundamentação

III. 1 – Dos factos

Para a decisão do recurso alinham-se as seguintes circunstâncias processuais:

1) O Recorrente apresentou, no Serviço de Finanças de Lisboa 11, petição inicial de oposição à execução fiscal que contra si havia sido instaurada com o n.º ..... pedindo que fosse declarada a compensação dos créditos respeitantes aos processos de execução fiscal n.º .....e .....e abatidos os mesmos na quantia exequenda, peticionando ainda a suspensão da instância até que houvesse decisão final, com trânsito em julgado nos processos de oposição deduzidos nos processos executivos identificados – cf. fls. 3 e 4 dos autos;

2) Em 25/10/2012 foi proferida decisão rejeitando liminarmente a petição de oposição «por manifesta improcedência dos fundamentos e impossibilidade de convolação», com fundamento no disposto no artigo 209.º, n.º 1 alínea b) do CPPT, uma vez que o Oponente «invoca eventuais créditos fiscais, que poderão resultar dos termos do cumprimento de sentenças que lhe venham a ser favoráveis em dois processos de oposição (…) quando exequível, sempre haveria de ser dirigido ao Órgão de Execução Fiscal» – cf. fls. 35 e sgs do suporte físico correspondendo ao registo sitaf n.º 000156347;

3) Na mesma decisão o pedido de suspensão foi indeferido por manifesta improcedência já que a compensação não constitui causa de suspensão do processo que sempre seria de dirigir a órgão de Execução Fiscal ocorrendo, quanto a tal pedido, erro na forma de processo – cf. fls.35 e sgs dos autos;

4) A decisão identificada nos pontos anteriores foi remetida ao Oponente mediante carta com registo postal n.º ....., dirigida à morada sita na .....Lisboa – cf. registo sitaf n.º 000156349;

5) O expediente postal referido no ponto anterior foi devolvido ao seu remetente e junto ao processo, nele constando a menção «objecto não reclamado» e «Não atendeu 13.15 Passei» constando outras duas palavras cuja letra é ilegível - cf. registo sitaf n.º 000156351 e 000156373;

6) Foi junto ao processo documento comprovativo da consulta à base de dados da Direcção Geral de Impostos, efectuada em 19/11/2012, confirmando que o domicílio fiscal do recorrente se mantinha na morada para a qual havia sido remetido o ofício identificado em 5) – cf. fls. 43 dos autos em suporte físico e registo sitaf n.º 000156352;

7) Foi dispensada a conta e, recolhidos os vistos finais, foram os autos remetidos ao Serviço de Finanças de Lisboa 11 para arquivo – cf. documentos de fls. 44 a 49 dos autos;

8) Em 5/08/2013 o Oponente apresentou um requerimento invocando que tinha tido conhecimento da prolação de decisão nestes autos através de deslocação ao Serviço de Finanças de Lisboa 11, na sequência de notificação de acto de penhora e marcação de venda no processo de execução fiscal, sem que lhe tenha sido comunicado o conteúdo da decisão final tomada nos autos, pedindo para ser notificado da mesma por ter sido cometido erro pelo Tribunal ao não remeter nova carta registada com aviso de recepção, conforme preceitua o artigo 39.º, n.º 5, do CPPT e nada ter sido feito «para que o oponente fosse notificado da decisão preliminar de rejeição da oposição bastando-se com a mera devolução pelos CTT da única carta enviada» sob pena de ficar privado do direito à notificação, ao recurso e da possibilidade de pagamento em prestações que foi deferido na execução – cf. fls. 54 a 59 do suporte físico dos autos;

9) Após requisição do processo ao serviço de finanças, sobre o referido requerimento foi proferido despacho datado de 08/10/2013, concluindo que, do ponto de vista do processo, não existiu irregularidade no procedimento notificativo observado que seja imputável ao tribunal e que o regime previsto no artigo 39.º do CPPT se aplica aos procedimentos e não ao processo judicial como é o caso dos autos, sendo aplicável o artigo 254.º n.º 1 do CPC - cf. fls. 71 e sgs em suporte físico e registo sitaf n.º 000156366;

10) Mais foi determinado no referido despacho que fossem «de novo praticados os atos para ser notificada a decisão proferida ao Requerente, passando a aceder ao exercício das faculdades processuais que entenda apropriadas, admitindo-se como possível que, por algum acaso anómalo mas exterior ao processo, ele não haja tido acesso, na verdade, ao teor do que lhe era enviado na correspondência em causa, tal como invoca, e por isso não ter tido possibilidade de exercício das faculdades processuais que poderia ter exercido e não exerceu», dando-se conhecimento do despacho ao chefe da Estação dos Correios em causa para informar sobre os procedimentos seguidos na situação exposta e ao Órgão da execução - cf. fls. 71 a 73 em suporte físico e registo sitaf n.º 000156366;

11) O Tribunal Tributário de Lisboa remeteu ao recorrente um ofício datado de 14/10/2013, mediante carta registada, mencionado que o notifica do conteúdo do despacho de fls. 71-73, que consta dos pontos 9) e 10) da matéria de facto, bem como da sentença de fls. 35-38, mencionando ainda que era junta cópia dos referidos actos - cf. fls. 74 dos autos e registo sitaf n.º 000156367;

12) O ofício de notificação identificado no ponto anterior foi recebido pelo recorrente em Outubro de 2013 – cf. artigos 1.º e 4.º do requerimento apresentado em 14/2/2014 [a que corresponde o ponto 15) infra] a fls. 85 dos autos e registo sitaf n.º 000156377 e artigos 5.º do requerimento datado de 13/3/2014 a fls. 101 dos autos em suporte físico e registo sitaf n.º 00156390 [a que corresponde o ponto 18) infra] ;

13) Em resposta ao despacho identificado nos pontos 9) e 10) supra, através de ofício expedido a 22/10/2013, CTT Correios de Portugal, S.A informou que «o objecto postal registado n.º ..... esteve em distribuição no dia 2 de Novembro de 2012. No entanto como ninguém atendeu na morada indicada foi deixado aviso de entrega para que o destinatário procedesse ao levantamento do objecto postal na Estação de Correios que serve aquela morada (…) Decorrido o prazo para levantamento do referido objecto postal, sem que o destinatário tenha procedido ao levantamento do mesmo, este foi devolvido ao Remetente Tribunal Tributário de Lisboa) com a indicação de “não reclamado”» - cf. fls. 80 dos autos e registo sitaf n.º 000156373;

14) Em 14/02/2014 foi proferido despacho mantendo todos os actos praticado, «visto que na sequência da notificação da decisão de rejeição liminar o Requerente não veio expressar modo de reação a tal decisão» determinando que fossem, de novo, colhidos os vistos em correição - cf. fls. 82 dos autos e registo sitaf n.º 000156375;

15) Em 24/2/2014 o recorrente requereu ao tribunal «o cancelamento da penhora de créditos na F....., SA e devolvido o dinheiro ao oponente; - Em alternativa, e caso assim não se entenda, seja ordenado o cancelamento da penhora sobre ....., em Lisboa, de que o opoente é proprietário, permanecendo a penhora de créditos para garantia do pagamento da quantia exequenda.» invocando que, «no despacho proferido com data de 8 de Outubro de 2013 a fls. 71 e sgs dos presentes autos, o Tribunal decidiu “sem lugar a tributação, por ora” (fls. 73)» porém foi notificado da penhora de créditos, que considera constituir uma violação do decidido pelo tribunal «já para não falar dos direitos processuais do contribuinte, que até agora não pôde fazer valer» - cf. fls. 85 e sgs dos autos e registo sitaf n.º 000156377;

16) Foram os autos com vista ao Ministério Público que emitiu parecer no sentido de se ter esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa por ter sido proferida sentença, sendo o pedido de cancelamento de penhora matéria alheia ao objecto dos presentes autos (findos) devendo ser indeferido – cf. fls. 90 dos autos;

17) Em 7/3/2014 foi proferido despacho, com o seguinte teor: «Seguramente notificado, na 2ª metade de outubro de 2013, do despacho de rejeição liminar nos autos proferido, quando estes autos tinham ido já, e pela segunda vez, a vistos finais, o Requerente, Executado no processo principal de que estes são dependência, veio a 24 de fevereiro de 2014, a fls.85-87, informar que nos autos principais houve lugar a uma penhora de créditos seus perante uma instituição seguradora, além de uma outra penhora já antes efetivada, de uma fração de um imóvel, mantendo-se por isso ambas vigentes agora no processo principal.

Em face disso requer seja ordenado o cancelamento da penhora de créditos e lhe seja devolvido o produto dessa penhora, ou em alternativa ordenado o levantamento da penhora do imóvel, mantendo-se a outra penhora como garantia de boa cobrança da dívida exequenda.

Para fazer um requerimento tal o Requerente invoca o nosso despacho de fls. 71-73, de 8 de outubro último, a final, onde ali se diz não haver lugar a custas «por ora».

Ouvido, o Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se em douto parecer no sentido de que nos autos foi proferida uma decisão que pôs termo ao processo, já transitada, pelo que se encontra esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa e, por outra parte, a matéria subjacente ao agora requerido é estranha ao processo, pelo que deverá ser o requerido indeferido.

Começando pelo princípio.

A invocação de que, no nosso despacho de fls.71-73, de 8 de outubro de 2013, não havia lugar a tributação, «por ora», referia-se, naturalmente à eventual tributação do incidente relacionado com as irregularidades que haviam sido invocadas acerca da notificação do despacho de rejeição liminar, incidente esse suscitado pelo ora novamente Requerente.

Feitas as diligências aí determinadas, em que se incluiu a notificação do Requerente do despacho de rejeição liminar, pese embora não tenha sido apurada irregularidade alguma, mas não tendo ele reagido àquele despacho de rejeição liminar, os atos que haviam sido praticados nos autos na sequência da notificação originária desse mesmo despacho mantiveram-se incólumes, naturalmente, dado esse circunstancialismo processual, pelo que também não houve justificação para condenação em custas desse incidente.

Assim, se aquando daquele despacho não houvera condenação em custas aquando da sua prolação, também a final não se entendeu dever ser a situação tributada, por sua inconcludência, como decorre do nosso despacho de fls.82, de 12 de fevereiro de 2014, não notificado ao Requerente por ser o aí tratado, consequentemente, uma decisão meramente interna e dirigida sobretudo à Secção e à sequência a dar ao processo em momentos que não contendem já com as partes.

Diga-se, por último, que a tributação própria dos autos já fora fixada no despacho liminar que lhes pusera termo, pelo que nada mais havia a determinar/levar a cabo - daí que tenham os autos corrido novamente os vistos finais.

Objeto dos autos.

Contudo, com ou sem tributação desse incidente, como é óbvio e surge manifesto, desde logo para o Requerente, que não reagiu ao despacho de rejeição liminar, tendo este transitado, óbvio se apresenta que a pretensão opositiva expressa na sua petição inicial, tal como salienta o Digno Magistrado do Ministério Público no seu douto parecer, está enquanto tal conhecida nos termos dessa rejeição e, com isso, findos estão estes autos e esgotado, a esse propósito, o poder jurisdicional.

Mérito do ora requerido.

Naquela sequência, a apresentação do requerimento ora em apreço traduz-se, no contexto processual descrito, num incidente manifestamente estranho e anómalo. E quer do ponto de vista do estádio dos presentes autos no momento em que é formulado, quer quanto ao seu teor, no contexto de uma oposição à execução, independentemente de ela estar pendente ou finda, como a presente está.

Com efeito, e relativamente à sua substantiva, essa anomalia é tanto mais impressiva quando do ponto de vista material o que é ex novo requerido neste processo findo consiste no levantamento de penhoras/prestação de garantia, algo perfeitamente estranho àquilo que motivara o processo opositivo e que, pelas razões que já haviam sido expostas no despacho de rejeição liminar, também do ponto de vista processual nunca teria cabimento no âmbito do objeto de um processo de oposição à execução. Uma vez mais (tal como as referidas no despacho de rejeição, que o Requerente parece ignorar), trata-se de matérias do poder de decisão, em primeira linha, do próprio Órgão de Execução Fiscal, relativamente ao que há meios específicos de reação, cfr. art.276°ss. do Código de Procedimento e Processo Tributário.

Decisão.

Em face do exposto e considerando que o requerido a fls.85-87, em 24 de fevereiro último, precisamente por sua estranheza e anomalia em relação a estes autos findos, não está a coberto do conteúdo temático sobre que se pronunciou o despacho de rejeição liminar, decidimos em relação à sua apresentação e conteúdo:

a) julgar verificado um incidente anómalo e escusado e, em consequência disso condenar o Requerente em custas, que se fixam numa Unidade de Conta e meia [1,5UC], nos termos do artº7°nºs 4 e 8 do Regulamento das Custas Processuais;

b) determinar o desentranhamento dos autos de fls.84-87, deixando cópia certificada em seu lugar, a fim de ser remetido ao Órgão de Execução Fiscal, para sua eventual apreciação e decisão, caso aí não tenha já sido suscitado pedido análogo. (…)» - cf. fls. 91 e sgs em suporte físico e registo sitaf n.º 000156383;

18) Notificado aquele despacho ao recorrente, em 13/3/2014 apresentou requerimento invocando que, apesar de o declarar na comunicação do despacho de fls. 71-73, a Secretaria do Tribunal recorrido não juntou nessa comunicação qualquer cópia do despacho de indeferimento liminar e por permanecendo até hoje sem notificação do despacho liminar proferido nos autos o poder jurisdicional não se encontra esgotado nos autos, requerendo a final, que «-Seja ordenada a notificação ao opoente do despacho de indeferimento liminar da oposição, em cumprimento do despacho de fls. 71 a 73 dos autos; - Promova-se a esta nova luz a apreciação do requerido em 24 de Fevereiro de 2014; - Revogue-se a condenação em custas pelo “incidente” a que se alude no despacho de fls. 91 a 94.» - cf. fls. 101 a 105 dos autos e registo sitaf n.º 000156390;

19) Em 17/03/2014 o recorrente interpôs o presente recurso – cf. fls. 114 a 122 dos autos;

19) Sobre o requerimento identificado no ponto 17 recaiu despacho datado de 24/6/2014 reiterando a inobservância de anomalias nos actos notificativos em causa no requerimento, designadamente daqueles relativos ao despacho de rejeição liminar, levados a cabo em cumprimento do despacho de fls. 71-73, de 8 de Outubro de 2013, e em face disso, «não havendo dúvida no processo» de que, com a notificação desse despacho de fls. 71-73, de 8 de outubro de 2013, o Requerente foi igualmente notificado da decisão de rejeição liminar conjuntamente com a daquele despacho, foi indeferida a realização de uma segunda notificação ao Requerente – cf. fls. 91 dos autos e registo sitaf n.º 000156398;

20) No mesmo despacho foi reiterada a pronuncia sobre o pedido de reapreciação do requerimento de 24/02/2014 identificado no ponto 14), no sentido de que a apresentação daquele requerimento neste processo, independentemente do seu estádio de tramitação/decisão constituía uma anomalia, «tanto mais impressiva quando do ponto de vista material o que é ex novo requerido [...] consiste no levantamento de penhoras/prestação de garantia, algo perfeitamente estranho àquilo que motivara o processo opositivo e que, pelas razões que já haviam sido expostas no despacho de rejeição liminar, também do ponto de vista processual nunca teria cabimento no âmbito do objeto de um processo de oposição à execução [...], trata-se de matérias do poder de decisão, em primeira linha, do próprio Órgão de Execução Fiscal, relativamente ao que há meios específicos de reação, cfr. art.276°ss. do Código de Procedimento e de Processo Tributário.» tendo sido indeferida a requerida revogação da condenação em custas determinada a final, no despacho de fls. 91-94 de 7/3/2014, condenando o requerente em custas do incidente em 2 Unidades de Conta – cf. fls. 137 a 139 dos autos;

21) No mesmo despacho foi admitido o recurso.



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III.2 - Fundamentação de direito


O Recorrente identifica como objecto do recurso o despacho de fls. 91 a 94 dos autos de oposição à execução, datado de 7/3/2014, que consta do ponto 17) da matéria de facto assente pedindo a sua revogação.

Alega o recorrente, que o despacho recorrido incorreu em erro de julgamento ao considerar que se esgotou o poder jurisdicional, por pressupor a prévia notificação da decisão de rejeição liminar ao recorrente.

Importa antes de mais revisitar o circunstancialismo subjacente ao recurso para melhor compreensão o que está em causa.

Em 2/8/2012 o recorrente requereu ao tribunal a notificação do despacho de rejeição liminar, proferido nos autos em 25/10/2013 (notificação devolvida ao remetente com a indicação de não ter sido reclamada), invocando que no seu recetáculo postal não foi deixado qualquer aviso e que apenas tomou conhecimento da existência da decisão por se ter deslocado ao serviço de finanças para se esclarecer sobre o motivo da penhora de que foi, entretanto, notificado.

Na sequência desse requerimento, por despacho de 8/10/2013, foi ordenada a notificação da decisão bem como a realização de diligências tendentes ao esclarecimento das circunstâncias em que os serviços postais teriam operado com vista à entrega da notificação em causa ao destinatário.

No acto de notificação realizado pela unidade orgânica, datado de 14/10/2013, em cumprimento de tal despacho, fez-se menção de que a notificação tinha por objecto o despacho que deferia a pretensão do recorrente de ser notificado da decisão liminar, bem como da própria decisão de rejeição liminar, mencionando-se ainda que seguiam cópias dos dois actos com a identificação da numeração das páginas correspondentes à sua localização no processo.

Em 24/02/2014 veio o recorrente dirigir um requerimento ao processo (que constitui a primeira intervenção no processo depois da notificação datada de 14/10/2013) pedindo que fosse ordenado «o cancelamento da penhora de créditos na F....., SA e devolvido o dinheiro ao oponente» ou em alternativa, e caso assim não se entenda, que fosse ordenado o cancelamento da penhora de uma fracção, de que é proprietário, «permanecendo a penhora de créditos para garantia do pagamento da quantia exequenda», nada referindo expressamente sobre a omissão da notificação da decisão liminar.

O recorrente alegava que em despacho anterior o tribunal havia decidido, com trânsito em julgado, que não havia lugar a tributação e, em violação de tal decisão, a Administração Tributária havia procedido à penhora de créditos, cujo cancelamento pretendia, arrecadando assim a totalidade da dívida, concluindo com a expressão «já para não falar dos direitos processuais do contribuinte, que até agora não pôde fazer valer».

Foi sobre este requerimento que foi proferido o despacho recorrido, concluindo que o recorrente foi notificado da decisão liminar, que o poder jurisdicional se esgotou, indeferindo, a final, os pedidos relativos à penhora, determinando o desentranhamento do requerimento e sua remessa ao órgão da execução fiscal para sua eventual apreciação e decisão.

O recorrente insurge-se, desde logo, na primeira conclusão, contra a consideração feita no despacho recorrido, relativamente a ter-se esgotado o poder jurisdicional, por não ter sido notificado da decisão liminar.

Sobre esta questão, importa sublinhar que o recorrente deduziu oposição ao processo de execução fiscal cuja petição foi rejeitada liminarmente e que, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 666.º do CPC (regime que actualmente se encontra previsto no artigo 613.º do CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013 de 26/6), proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz, quanto à matéria da causa, sendo lícito ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença nos termos definidos nos artigos seguintes do referido código.

É a prolação da decisão que determina o momento em que se esgota o poder jurisdicional do juiz, quanto à matéria da causa, e não a sua notificação, donde se conclui que não assiste razão ao recorrente quando invoca que o poder jurisdicional não se extinguiu por não ter sido notificado da decisão. A questão da notificação da sentença contende com a sua oponibilidade às partes e não com a extinção do poder jurisdicional.

Tal não significa que o juiz esteja impedido de praticar actos de expediente conducentes ao processamento dos seus termos até ao arquivamento, actos que se inscrevem no poder-dever de o juiz se pronunciar todas as questões que se coloquem no processo, como sucede com as questões relativas à conta e ao recurso, entre outras, que não contendem com a matéria da causa, isto é, com a pronúncia sobre o objecto do processo.

É neste contexto que importa prosseguir na apreciação do recurso.

O recurso que nos vem submetido, contém dois segmentos. Um deles é dirigido à notificação da decisão liminar proferida nos autos, que o recorrente invoca não ter sido efectuada. O segundo segmento reporta-se à apreciação efectuada pelo tribunal a quo sobre o requerimento que o recorrente apresentou em 13/3/2014 relacionado com as garantias da cobrança no processo de execução.

A questão que agora se coloca é a de saber se, constando da notificação dirigida ao recorrente que seguia em anexo cópia do despacho e da decisão de rejeição liminar e, alegando o recorrente que a cópia da decisão liminar não seguiu em anexo, podia o juiz a quo considerar o recorrente notificado da decisão liminar como o fez no despacho recorrido.

Alega o Recorrente que, apesar de ordenado em despacho transitado em julgado que fossem «de novo praticados os atos para ser notificada a decisão proferida ao Requerente» a secretaria não juntou nessa comunicação qualquer cópia do despacho de indeferimento liminar e que, assim sendo, está impedido de recorrer da decisão de rejeição liminar «e de exercer outras situações jurídicas que dele dependem».

Analisando o requerimento dirigido ao Tribunal em 24/02/2014 (constante do ponto 15) que constitui, recorde-se, a primeira intervenção no processo após o envio do oficio de notificação em discussão) constatamos que o recorrente pedia que fosse ordenado «o cancelamento da penhora de créditos na F....., SA e devolvido o dinheiro ao oponente; - Em alternativa, e caso assim não se entenda, seja ordenado o cancelamento da penhora sobre 8.º andar esquerdo (…) de que o opoente é proprietário, permanecendo a penhora de créditos para garantia do pagamento da quantia exequenda» nada referindo expressamente sobre a omissão da notificação da decisão liminar.

O recorrente alegava que, em despacho anterior, aludindo ao despacho objecto de notificação, o tribunal havia decidido, com trânsito em julgado, que não havia lugar a tributação e em violação de tal decisão a Administração Tributária havia procedido à penhora de créditos, cujo cancelamento pretendia, arrecadando assim a totalidade da dívida, concluindo com a expressão «já para não falar dos direitos processuais do contribuinte, que até agora não pode fazer valer».

Percorrendo o requerimento observa-se que toda a argumentação (bem como os pedidos formulados a final), foi dirigida contra a actuação do Órgão da Execução Fiscal que o requerente considerou desconforme com o despacho judicial.

Pode aceitar-se que a referida expressão: «já para não falar dos direitos processuais do contribuinte, que até agora não pode fazer valer» constitua uma implícita reclamação do acto que o oponente considerava ter sido omitido pela secretaria, nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 161.º do CPC, na redacção anterior à Lei n.º 41/2013 de 26/6, regime que consta actualmente no n.º 5 do artigo 157.º do CPC, uma vez que o juiz não está vinculado à qualificação jurídica efectuada pelas partes (iura novit curia), conforme decorre do artigo 664.º do CPC, na sua redacção em vigor à data da proposição da acção (preceito que consta actualmente no artigo 5.º, n.º 3 do CPC), aplicável supletivamente por força do disposto no artigo 2.º, alínea e) do CPPT.

Contudo, relembrando a cronologia das ocorrências relevantes para a questão, a notificação em causa foi remetida ao recorrente em 14/10/2013 (ponto 11) do probatório) mencionando o envio de um despacho e de uma sentença. O referido ofício foi recebido pelo recorrente em Outubro de 2013, conforme confessa no seu requerimento dirigido ao tribunal em 24/02/2014 e reiterado em 13/03/2014, quatro meses depois, quando dispunha do prazo de 10 dias para reclamar da invocada omissão, pelo que, sempre seria de indeferir a pretensão por intempestividade, improcedendo as conclusões 4 e 5 do recurso.

Quanto à 6ª e última conclusão, alega o recorrente que não se esgotou o poder jurisdicional e que «o tribunal a quo devia ter conhecido substancialmente o requerimento apresentado a 24 de Fevereiro» de 2014.

Sobre a questão do esgotamento do poder jurisdicional quanto à matéria da causa já nos pronunciámos supra. Relativamente ao dever de apreciar e decidir o referido requerimento, importa ter presente que o recorrente requeria «o cancelamento da penhora de de créditos na F....., SA e devolvido o dinheiro ao oponente; - Em alternativa, e caso assim não se entenda, seja ordenado o cancelamento da penhora sobre 8.º andar esquerdo, da ....., em Lisboa, de que o opoente é proprietário, permanecendo a penhora de créditos para garantia do pagamento da quantia exequenda.»

Os pedidos formulados, conforme se deixou dito no despacho reclamado, constituem matéria da competência, em primeira linha, do órgão da execução, conforme resulta do artigo 217.º, 218.º, n.ºs 2 e 3 e 235.º, em conjugação com o disposto no artigo 188.º, n.º 193.º, n.º 1 e 215.º todos do CPPT.

Mesmo que o processo de oposição à execução estivesse a aguardar decisão final, os pedidos formulados no requerimento em causa sempre seriam estranhos ao objecto da causa, extravasando o seu objecto. Recorde-se que os fundamentos de oposição são os previstos taxativamente pelo legislador nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, neles não se incluindo o cancelamento dos actos de penhora, por constituir matéria da competência do órgão da execução fiscal, de cuja decisão cabe reclamação para o tribunal nos termos do disposto no artigo 276.º do CPPT, tal como foi decidido em 1ª instância.

Na medida em que o requerimento apresentado em 24/02/2014 contém pedidos estranhos ao objecto do processo de oposição à execução, constitui um incidente anómalo, sujeito a tributação, leia-se, custas, conforme decidiu o juiz a quo, nos termos do artigo 7.° n.ºs 4 e 8 do Regulamento das Custas Processuais..

Resulta do disposto n.º 8 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais que se consideram procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas. A decisão sob recurso ao qualificar como incidente anómalo um pedido para cujo conhecimento era competente o órgão de execução fiscal, e não constituindo fundamento de oposição à execução, decidiu de acordo e nos termos da citada disposição sendo de julgar improcedente a censura que lhe vem dirigida pelo recorrente.

Quanto ao desentranhamento dos autos do requerimento de 24 de Fevereiro, a fls. 84-87, determinado no despacho recorrido, constitui a consequência processual da apresentação de um requerimento anómalo, para cujo conhecimento é competente o órgão da execução fiscal.

Salienta-se que o juiz a quo, salvaguardado a tutela do interesse do recorrente, determinou o desentranhamento do requerimento, ficando cópia certificada nos autos, a fim de ser remetido ao Órgão de Execução Fiscal, para sua eventual apreciação e decisão, caso aí não tenha já sido suscitado pedido análogo. É de subscrever este julgamento, por ser o que mais se adequa à concretização no caso, dos princípios da colaboração, da economia processual e do princípio pro acione, na medida em que, não podendo aquela pretensão ser conhecida na acção de oposição, promoveu-se o seu aproveitamento com o envio ao órgão legalmente competente para o apreciar e decidir, nada havendo a censurar.

Pelo exposto, improcedem todas as conclusões de recurso, sendo de confirmar o despacho recorrido.

Vigorando o princípio da causalidade na determinação da responsabilidade pelas custas, conforme resulta do disposto no artigo 527.º do CPC, as custas recaem sobre quem lhe tiver dado causa.

No caso dos autos, a responsabilidade pelas custas deve ser imputada ao recorrente, em resultado do total decaimento do recurso.


V – DECISÃO

Termos em que, acordam, em conferência, os juízes que integram a 1ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em julgar o recurso totalmente improcedente mantendo-se o despacho recorrido.


Custas pelo recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 14 de Janeiro de 2021.



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(Ana Cristina Carvalho)

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(Ana Pinhol)

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(Isabel Fernandes)