Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2715/22.3 BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 05/11/2023 |
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Relator: | LINA COSTA |
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Descritores: | IDLG AUTORIZAÇÃO RESIDÊNCIA PRESSUPOSTOS ARTIGO 109º DO CPTA |
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Sumário: | I. O A./recorrido formulou junto do Recorrente pedido de manifestação de interesse em obter autorização de residência ao abrigo do artigo 88º da Lei nº 23/2007, em 10.2.2022, ou seja, já na vigência das medidas excepcionais e temporais adoptadas no âmbito da pandemia por Covid-19, iniciadas com o Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, mormente com o disposto no seu artigo 16º [que entrou em vigor com efeitos iniciais reportados a 9.3.2020] e que ainda se mantêm por força do disposto no Decreto-Lei nº 90/2022, de 30 de Dezembro;
II. Ao abrigo deste regime jurídico excepcional, a permanência do Recorrido em território nacional, desde pelo menos Março de 2020, considera-se regular, pelo que em nada influi no exercício de direitos fundamentais que, enquanto equiparado a cidadão nacional, pode exercer, o facto de o Recorrente por razões que também se explicam por todos os condicionalismos a que a sua actuação esteve sujeita durante a pandemia, não ter decidido ainda o pedido que lhe dirigiu, manifestando interesse em obter autorização de residência para exercício de actividade profissional subordinada; III. Face ao que não estão verificados os pressupostos de que depende o uso do meio processual de intimação previsto no artigo 109º do CPTA, porquanto, por referência à data em que a acção foi instaurada, não se encontra demonstrada nem a urgência, nem a necessidade em obter uma decisão de mérito para assegurar o exercício dos direitos fundamentais à segurança, à identidade pessoal, à estabilidade no trabalho, à protecção na saúde, à família, alegados no pressuposto de que, sem a concessão da pretendida autorização de residência, se encontrava em situação ilegal e, por isso, impedido de exercer os exercer; IV. Considerando que, nos termos do disposto nos artigos 110º e 110º-A do CPTA, o despacho liminar que determinou a citação da aqui Recorrente para responder, constitui caso julgado formal no processo, a não verificação dos pressupostos exigidos no artigo 109º idem, determina a improcedência da acção e não a absolvição da instância por inidoneidade do meio processual. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Ministério da Administração Interna [MAI] devidamente identificado como entidade requerida nos autos de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias instaurada por I. A., inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão, proferida em 18.10.2022, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou I. improcedente a excepção dilatória de impropriedade do meio processual; II. procedente e, em consequência, intimou a Entidade requerida a, no prazo de 10 dias, proferir decisão acerca do pedido de autorização de residência apresentado pelo Requerente, ao abrigo do artigo 88º, nº 2 da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho. Nas respectivas alegações, o Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem: «1.ª - Os processos urgentes devem ser reservados para as situações de verdadeira urgência na obtenção de uma decisão sobre o mérito da causa (que coincidem com aquelas para as quais não é possível ou suficiente a utilização de um processo não urgente), e onde exista necessidade de uma proteção acrescida dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. 2.ª - Conforme resulta da lei e é pacifico na doutrina e jurisprudência dominante, a intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias é uma tutela subsidiária, configurada para ser acionada quando os restantes meios processuais não se mostram suficientes para acautelar a situação concreta, exigindo-se cumulativamente, para o uso desta forma processual - a urgente emissão de uma decisão de mérito visando a proteção de um direito, liberdade ou garantia, ou um direito fundamental de natureza análoga, nos termos do art.º 17.º da CRP e que não seja suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar ou o recurso a qualquer meio cautelar. 3.ª- A intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias carateriza-se, assim, nos termos do art.º 109º do CPTA, por dois vetores: a indispensabilidade, na perspetiva de ser necessário a prolação urgente de uma decisão de mérito, e a subsidiariedade, na perspetiva que só pode ser utilizado se não for possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar. 4.ª- Cumpre, assim, ter em atenção que o meio normal de tutela dos direitos fundamentais consiste no recurso às ações administrativas, com a possibilidade, caso se verifique a necessidade de salvaguarda dos efeitos da ação principal, à tutela cautelar, e, caso a urgência da situação o justifique, ao respetivo decretamento provisório, nos termos do artigo 131.º do CPTA. 5.ª - A intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias só pode ser utilizada, assim, quando for seguro concluir que a propositura de uma ação administrativa cumulada com um pedido de tutela cautelar é incapaz de proporcionar a efetiva tutela do direito, liberdade ou garantia cuja ameaça se invoque. 6.ª - Ora, na Sentença a quo não está demonstrada a imprescindibilidade do recurso ao meio processual escolhido, não sendo provado nos autos, para além da simples alegação, que não seria possível, em tempo útil, o recurso alternativo à ação administrativa, com ou sem intervenção cautelar. 7.ª - Inequivocamente, ajuizou mal o douto Tribunal, ao considerar devidamente demonstrada a indispensabilidade da emissão urgente de uma decisão de fundo tendo em vista a protecção de um direito, liberdade ou garantia, e ainda assim olvidando o esgrimido supra in arts 44.º e 45.º. 8.ª - A apontada imprescindibilidade não pode dar-se por verificada, pois a situação em presença não reivindica uma urgência tal que seja merecedora de uma tutela que imponha a necessidade da célere emissão de uma decisão de mérito e que o art. 109.º, n.º 1, do CPTA exige. 9.ª - Só é legítimo a ele recorrer quando esteja em causa a lesão, ou a ameaça de lesão, de um direito, liberdade ou garantia (ou de um direito fundamental ou de natureza análoga) cuja proteção seja urgente. 10.ª - Neste contexto, não se alcança óbice para que esse Tribunal ad quem não soçobre o malogrado veredito. Pois se assim não ocorrer, a presente sede transformar-se-á doravante, numa espécie de instrumento de aceleração processual e num mecanismo perverso, através do qual os requerentes (autores) interessados, procurarão ultrapassar outros interessados com as mesmas pretensões, suprimindo fases e olvidando requisitos, obrigando a Administração a proferir uma decisão, em clara violação dos princípios nucleares da legalidade e da igualdade de tratamento dos administrados perante a lei. 11.ª - Nos presentes autos está em causa a concessão de autorização de residência ao abrigo do art. 88.º n.º 2 da Lei n.º 23/2007, de 4/7, logo, a pretensão relativamente à qual o recorrido invoca urgência, pode perfeitamente ser decidida provisoriamente através de providência cautelar – caso estejam reunidos os respetivos pressupostos – não se vislumbrando a imprescindibilidade de uma decisão urgente de mérito relativamente à mesma. Pois não resulta dos factos alegados a imprescindibilidade de uma tutela material definitiva imediata, mostrando-se possível ou suficiente para assegurar o exercício, em tempo útil, do direito, liberdade ou garantia invocado, a utilização de ação administrativa. 12.ª - Pois mesmo considerando os direitos invocados pelo recorrido com sendo direitos de natureza análoga aos direitos a que alude o n.º 5 do art. 20.º da CRP, os mesmos já estarão acutelados no seu n.º 1 (do art. 88.º), pelo que também a subsidiariedade da norma invocada preclude o uso da presente via processual. 13.ª - Acresce, e no que tange ao mérito, que é convicção do recorrente, que o Tribunal a quo não só decidiu ignorando a factualidade concreta, como outrossim, e cumulativamente, efectuou uma incorreta subsunção da mesma no direito, pois de outra forma jamais procederia a pretensão do autor. 14.ª - Veicule-se, que não existe inércia por parte do recorrente, como é afirmado na Sentença a quo, pois a inércia é do recorrido que, e antes de mais, pretendendo trabalhar em Portugal, deveria ter diligenciado no sentido de adquirir os documentos necessários para tal, designadamente o visto adequado, o que não aconteceu. 15.ª - Acresce, por outro lado, que também nenhuma das exigências decorrentes do art. 67.º do CPTA se verifica, porquanto ao recorrente não incumbe destarte o dever de emitir qualquer acto administrativo, tão pouco assiste ao recorrido o direito à sua arguição nos termos em que o faz, e muito menos neste contexto. 16.ª - Com a devida vénia, emerge ostensivo da Sentença sob recurso, que foi invertido o ónus de demonstração, facto que não pode deixar de sublevar, pois ainda que estivéssemos ao abrigo de um processo cautelar, tal não se mostraria viável, in casu. 17.ª - Em suma, o veredito proferido pelo TAC de Lisboa, ao considerar preenchidos os pressupostos da Intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, viola frontalmente o art. 109º do CPTA, os arts. 2.º, 53.º, 58.º/1 e 2, al. b), n.º 1, 59.º, 17.º in fine e 18.º todos da CRP. 18.ª - Outrossim num segundo momento, ao condenar o ora recorrente nos termos em que o fez, viola de forma taxativa os princípios da legalidade e da igualdade, face à factualidade que assumiu como provada, pelo que não só a violação do direito adjetivo, mas também do direito substantivo entre os quais, os art. 77.º e 88.º/2, da Lei 23/2007, dos arts. 58.º e 115.º e ss. do CPA), impõem que esse douto Tribunal ad quem se debruce sobre a mesma.». Requerendo, «Nestes termos, e nos mais de Direito, devem ser admitidas as presentes Alegações de recurso jurisdicional, e ser declarada nula a Sentença recorrida, pela verificação da exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual, ou à cautela, por não se verificarem os requisitos previstos no n.º 1 do art. 109.º do CPTA. Caso assim não ajuíze esse douto Tribunal ad quem, Impetra o recorrente, que no que tange ao mérito da presente lide igualmente se considere verificada a violação da lei e dos princípios constitucionais citados, anulando-se a douta sentença recorrida com as legais consequências.». Notificado para o efeito, o Recorrido não contra-alegou. O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido de conceder provimento ao recurso. Notificada as partes, o Recorrido pronunciou-se sobre o parecer que antecede, pugnando pela manutenção da sentença recorrida. Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. o nº 2 do artigo 36º do CPTA), o processo vem à Conferência para julgamento. As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se a sentença incorre em erro de julgamento por ter julgado improcedente a excepção da inadequação do meio processual, ou, se assim não se entender, por não se verificarem os requisitos previstos no nº 1 do artigo 109º do CPTA, ou ainda, no que respeita ao mérito da lide, por ignorar a factualidade assente e ter efectuado uma errada subsunção da mesma no direito. A sentença recorrida “[a]tento o pedido formulado pelo Requerente e conferidos os documentos juntos aos autos pelas partes, são considerados bastantes e com interesse para o conhecimento da questão prévia, os seguintes factos,”: «A. Em 10.2.2022 o Requerente apresentou junto dos serviços da Entidade Requerida, um documento identificado como “Manifestação de Interesse”, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 88.º, n.º 2 da Lei nº 23/2007, de 4 de julho, à qual foi atribuído o número 50956766, cfr documento 1 junto com o Requerimento Inicial, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; B. Com a manifestação de interesse referida em A) o Requerente juntou os documentos necessários à apreciação do seu pedido, cfr documento 1 junto com o Requerimento Inicial, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; C. Em 3.9.2022 deu entrada neste Tribunal Administrativo de Círculo a presente ação, cfr fls 1 do SITAF. * Inexistem outros factos com interesse para a decisão do mérito da causa. em face da prova produzida. * Motivação da decisão sobre a matéria de facto, Analisando criticamente a prova produzida cfr artigo 607.º nº 4 CPC, a convicção do Tribunal assentou na prova documental junta aos autos pelas partes, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório. Prova documental que não foi impugnada pelas partes e sobre os quais não existem indícios que ponham em causa a sua genuinidade. Da fundamentação de direito e sobre a questão da inidoneidade do meio, consta da sentença recorrida: Ainda que de contornos similares ao caso analisado e decidido por este Tribunal no referido acórdão de 15.2.2018, proc. nº 2482/17.2BELSB, a situação do Recorrido difere nos exactos termos em que configura a sua situação (i)legal no território português, na prova junta, nas normas legais e regulamentares aplicáveis e na decisão contida na sentença objecto de recurso [de intimação, enquanto naquele foi de rejeição liminar]. «Artigo 16.º 1 - [...].[...] 2 - O cartão de cidadão, certidões e certificados emitidos pelos serviços de registos e da identificação civil, carta de condução, documentos e vistos relativos à permanência em território nacional, bem como as licenças e autorizações cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor do presente decreto-lei ou nos 15 dias imediatamente anteriores são aceites, nos mesmos termos, até 31 de março de 2021. 3 - Os documentos referidos nos números anteriores continuam a ser aceites nos mesmos termos após 31 de março de 2021, desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respetiva renovação. 4 – O cartão de beneficiário familiar de ADSE (…). 5 - […]. 6 - […].» O Despacho nº 10944/2020, de 8 de Novembro, veio, na sequência da Resolução do Conselho de Ministros nº 92-A/2020, de 2 de Novembro, que declarou a situação de calamidade em todo o território nacional continental, até às 23:59 h do dia 19 de Novembro de 2020, sem prejuízo de eventuais prorrogações, alargar o âmbito do Despacho nº 3863-B/2020 de forma a continuar a garantir os direitos de todos os cidadãos estrangeiros com processos pendentes no SEF e que os mesmos se encontram em situação de permanência regular em território nacional, tendo em consideração que os nºs 2 e 3 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 10-A/2020, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 87-A/2020, prevêem expressamente que os «documentos neles referidos continuam a ser aceites nos mesmos termos até 31 de março de 2021» e, após esta data, «desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respetiva renovação». O Decreto-Lei nº 22-A/2021, de 17 de Março, veio prorrogar prazos e estabelece medidas excepcionais e temporárias no âmbito da pandemia da doença COVID-19, alterando o referido artigo 16º do Decreto-Lei nº 10-A/2020: «Artigo 16.º 1 - [...][...] 2 - O cartão de cidadão, certidões e certificados emitidos pelos serviços de registos e da identificação civil, documentos e vistos relativos à permanência em território nacional, bem como as licenças e autorizações, cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor do presente decreto-lei ou nos 15 dias imediatamente anteriores, são aceites, nos mesmos termos, até 31 de dezembro de 2021. 3 - Os documentos referidos nos números anteriores continuam a ser aceites nos mesmos termos após 31 de dezembro de 2021, desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respetiva renovação. 4 – O cartão do beneficiário familiar da ADSE (…). 5 – […] 6 – […] 7 – A validade das cartas de condução (…).». O Despacho nº 4473-A/2021, de 30 de Abril, veio determinar o alargamento do âmbito dos Despachos n.ºs 3863-B/2020 e 10944/2020, considerando que importa garantir os direitos de todos os cidadãos estrangeiros com processos pendentes no SEF e que os mesmos se encontram em situação de permanência regular em território nacional e, ainda alargar o âmbito dos processos pendentes no SEF abrangidos pelos efeitos do referido despacho, desde a data da declaração do estado de emergência até ao dia 30 de Abril de 2021, atendendo que os nºs 2 e 3 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 10-A/2020, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 22-A/2021, prevêem expressamente que os «documentos e vistos relativos à permanência em território nacional, bem como as licenças e autorizações, cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor do presente decreto-lei ou nos 15 dias imediatamente anteriores, são aceites, nos mesmos termos, até 31 de dezembro de 2021» e, após esta data, «desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respetiva renovação». O Decreto-Lei nº 119-A/2021, de 22 de Dezembro, veio alterar as medidas no âmbito da pandemia da doença COVID-19, prorrogando até 31 de Março de 2022 a admissibilidade dos documentos e vistos relativos à permanência em território nacional cuja validade tenha expirado a partir da data de entrada em vigor do Decreto-Lei nº 10-A/2020, na sua redacção actual, ou nos 15 dias imediatamente anteriores, alterando o respectivo artigo 16º em conformidade. O Despacho nº 12870-C/2021, de 31 de Dezembro, veio, na sequência da Resolução do Conselho de Ministros nº 157/2021, de 27 de Novembro, declarou a situação de calamidade em todo o território nacional continental até 20 de Março de 2022, determinar o alargamento do âmbito dos Despachos nºs 3863-B/2020, 10944/2020 e 4473-A/2021, por persistem constrangimentos ligados aos mencionados atendimentos e, consequentemente, a necessidade de salvaguardar os direitos dos cidadãos estrangeiros cujos processos junto do SEF não foi ainda possível concluir e por importar continuar a assegurar os direitos de todos os cidadãos estrangeiros com processos pendentes no SEF e que os mesmos se encontram em situação de permanência regular em território nacional, através da manutenção dos efeitos dos referidos despachos, durante todo o período de apreciação e tramitação dos respectivos processos, tendo em consideração que os nºs 2 e 3 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 10-A/2020, na sua redacção actual, conjugados com os nºs 8 e 9 do mesmo artigo, idem, e com o respectivo nº 1 do artigo 18º que determina a sua produção de efeitos a 1 de Janeiro de 2022, prevêem que os documentos e vistos relativos à permanência em território nacional, cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor daquele decreto-lei ou nos 15 dias imediatamente anteriores, são aceites, nos mesmos termos, até 31 de Março de 2022 e, após esta data, «desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respetiva renovação». O Decreto-Lei nº 23-A/2022, de 18 de Fevereiro, veio alterar as medidas aplicáveis no âmbito da pandemia da doença COVID-19, prorrogando até 30 de Junho de 2022 a admissibilidade dos documentos e vistos relativos à permanência em território nacional cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor do Decreto-Lei nº 10-A/2020, na sua redacção actual, ou nos 15 dias imediatamente anteriores, alterando o respectivo artigo 16º em conformidade. O Decreto-Lei nº 42-A/2022, de 30 de Junho, veio alterar as medidas aplicáveis no âmbito da pandemia da doença COVID-19, prorrogando até 31 de Dezembro de 2022 a admissibilidade dos documentos e vistos relativos à permanência em território nacional cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor do Decreto-Lei nº 10-A/2020, na sua redacção actual, ou nos 15 dias imediatamente anteriores, alterando o respectivo artigo 16º em conformidade. Por fim, o Decreto-Lei nº 90/2022, de 30 de Dezembro, veio prorrogar a validade de diversos documentos e, adicionalmente, considerou oportuno assegurar a continuidade do regime estabelecido no Decreto-Lei nº 10-A/2020, na sua redacção actual, no que respeita à atendibilidade de documentos expirados relativos à permanência em território nacional, medida que decorre do facto de a pandemia por COVID-19 ter tido um impacto significativo no atendimento ao público, que resultou num aumento de pendências em matéria de concessão e renovação de autorizações de residência, impondo-se assegurar a vigência deste regime até ao final de 2023, de modo a acautelar a transição de competências em matéria administrativa, no âmbito da reestruturação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, aprovada pela Lei nº 73/2021, de 12 de Novembro, na sua redacção actual, alterando o artigo 16º daquele diploma nos seguintes termos: «Artigo 16.º 1 - [...].[...] 2 - [...]. 3 - [...]. 4 - [...]. 5 - [...]. 6 - [...]. 7 - [...]. 8 - Os documentos e vistos relativos à permanência em território nacional, cuja validade expire a partir da data de entrada em vigor do presente decreto-lei ou nos 15 dias imediatamente anteriores, são aceites, nos mesmos termos, até 31 de dezembro de 2023. 9 - Os documentos referidos no número anterior continuam a ser aceites, nos mesmos termos, após 31 de dezembro de 2023, desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respetiva renovação. 10 – (…).» Do alegado e provado nos autos não resulta quando é que o Recorrido entrou no território nacional e, no seu entender, terá ficado em situação irregular, mas sabe-se que celebrou contrato de trabalho em Setembro de 2020 e formulou pedido de manifestação de interesse em obter autorização de residência ao abrigo do artigo 88º da Lei nº 23/2007, em 10.2.2022, ou seja, já na vigência das medidas excepcionais e temporais adoptadas no âmbito da pandemia por Covid-19, iniciadas com o Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, mormente com o disposto no seu artigo 16º [que entrou em vigor com efeitos iniciais reportados a 9.3.2020] e que ainda se mantêm por força do disposto no Decreto-Lei nº 90/2022. Donde, o/s documento/s com que, conforme alega, entrou legalmente em Portugal, apesar de, entretanto, expirados, continuaram a ser aceites pelas autoridades nacionais, e por ter processo pendente no SEF podia e pode usar o respectivo comprovativo de entrega para, perante todos os serviços públicos, obter, para além dos que já dispõe, designadamente, acesso ao Serviço Nacional de Saúde ou a outros direitos de assistência à saúde, a prestações sociais de apoio, celebração de contratos de arrendamento, celebração de contratos de trabalho, abertura de contas bancárias e contratação de serviços públicos essenciais, até 31.12.2023 e após essa data, fazendo prova da pendência do referido processo no SEF e até ao termo deste. A saber, ao abrigo deste regime jurídico excepcional, a permanência do Recorrido em território nacional, desde pelo menos Março de 2020, considera-se regular, pelo que em nada influi no exercício de direitos fundamentais que, enquanto equiparado a cidadão nacional, pode exercer, o facto de o Recorrente por razões que também se explicam por todos os condicionalismos a que a sua actuação esteve sujeita durante a pandemia, não ter decidido ainda o pedido que lhe dirigiu, manifestando interesse em obter autorização de residência para exercício de actividade profissional subordinada. O significa que não estão verificados os pressupostos de que depende o uso do meio processual de intimação previsto no artigo 109º do CPTA, porquanto, por referência à data em que a acção foi instaurada, não se encontra demonstrada nem a urgência, nem a necessidade em obter uma decisão de mérito para assegurar o exercício dos direitos fundamentais à segurança, à identidade pessoal, à estabilidade no trabalho, à protecção na saúde, à família, alegados no pressuposto de que, sem a concessão da pretendida autorização de residência, se encontrava em situação ilegal e, por isso, impedido de exercer os exercer, sendo desnecessário averiguar se seria suficiente o decretamento provisório de providência cautelar para o efeito. Atendendo à actual redacção dos artigos 110º e 110º-A do CPTA, o despacho liminar que determinou a citação da aqui Recorrente para responder, constitui caso julgado formal no processo, significando que o que foi decidido - no caso, prosseguir com os autos como acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias - não pode em momento posterior ser decidido diversamente, no sentido da substituição da p.i. ou da convolação da acção em processo cautelar ou de absolver da instância a entidade requerida por inidoneidade do meio processual. Entendimento que é defendido por Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Coimbra, 2018, p. 903, “Esse despacho [o despacho liminar] constitui, pois, caso julgado formal quando conclua que não há obstáculo a que o processo seja tramitado como intimação. E, nesse sentido, já não será possível, na fase de decisão, rejeitar a petição ou promover a sua substituição por um pedido de adoção de providência cautelar, cabendo ao juiz unicamente proferir a decisão de mérito”. Serve a explicação para concluir que assiste razão ao Recorrente, não se verificando os pressupostos previstos no artigo 109º do CPTA, o que torna desnecessária a apreciação dos demais fundamentos do recurso. Devendo proceder o recurso, não poderá a sentença recorrida manter-se na ordem jurídica e a acção deve ser julgada improcedente. Não são devidas custas por os processos de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias delas estarem isentos, nos termos do disposto na alínea b) do número 2 do artigo 4º Regulamento das Custas Processuais (RCP).
Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, e, em consequência, revogar a sentença recorrida e julgar a acção de intimação improcedente. Sem custas. Registe e notifique. Lisboa, 11 de Maio de 2023. (Lina Costa – relatora) (Catarina Vasconcelos) (Rui Pereira) |