Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:582/09.1BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/11/2021
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:OPOSIÇÃO
PRESCRIÇÃO/ REVERTIDO/ CITAÇÃO
INEXISTÊNCIA/ INSUFICIÊNCIA DOS BENS
GERÊNCIA EFECTIVA/ ÓNUS DA PROVA
REQUERIMENTO PARA INÍCIO DO PROCESSO DE REVERSÃO
Sumário:I - Se a citação do responsável subsidiário pela dívida exequenda ocorrer para além do 5º ano posterior ao ano da liquidação, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto a ele, nos termos do n.º 3 do artigo 48.º da LGT.
II - No entanto, se a citação do responsável subsidiário pela dívida exequenda tiver ocorrido para além do 5º ano posterior ao ano da liquidação, mas antes do 8.º ano a contar do início da prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele.
III - A reversão não depende exclusivamente da inexistência de bens, bastando-se com a sua insuficiência.
IV - É à AT, enquanto titular do direito de reversão, que cabe fazer a prova do exercício da gerência.
V – A apresentação de um singelo pedido para que se “dê início ao processo de reversão” não permite que a Administração se demita como sucedeu, de averiguar os pressupostos da sua actuação, com vista a efectivar a reversão, em concreto o exercício da gerência.
VI - A efectivação da responsabilidade tributária subsidiária é uma prerrogativa da Administração, a exercer mediante um acto administrativo, fundamentado, com prévia possibilidade de participação do interessado. A efectivação desta responsabilidade, pela agressividade que lhe é inerente, surge rodeada de exigências legais impostas à Administração, as quais se destinam a assegurar que a Administração, no exercício desse seu poder de decisão, observa os pressupostos legais que permitem exigir o pagamento de uma dívida a alguém que não é o deu devedor originário.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

A..., veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a oposição deduzida contra o processo de execução fiscal (PEF) n.º 310..., que o Serviço de Finanças (SF) de Lisboa 8 lhe moveu, por reversão de dívidas de IVA dos anos de 2000 e 2001, da devedora originária W... – T…, Lda.

Nas suas alegações, o Recorrente formula as conclusões seguintes:

Da citação efectuada ao Recorrente, em 23/09/2008, não constava a decisão que tivesse determinado a reversão nem, em consequência dos factos e fundamentos da mesma, em violação do disposto no nº 4 do art. 22 da LGT;

A omissão referida na conclusão anterior determina que o respectivo acto tributário não será eficaz relativamente aos responsáveis subsidiários (cfr.art.77, nº6, da LGT e artº36, nº1, do CPPT), no caso o Recorrente, pelo que essa falta constituirá, além do mais, um fundamento autónomo de oposição à execução fiscal, enquadrável no artº.204, nº.1, al. i), do CPPT, e como tal devendo ser conhecida no âmbito da presente oposição;

Ainda a omissão referida na conclusão 1ª configura uma nulidade, por omissão de uma formalidade que a lei prescreve-comunicação da decisão e respectiva fundamentação – a acompanhar a citação efectuada ao Recorrente, a qual foi arguida pelo interessado e no prazo indicado, no caso, para a oposição, conforme resulta dos art. 195 e 198, ambos do CPC e deverá ser atendida porquanto é manifesto o prejuízo para a defesa por impedir o Recorrente de aferir, na data da citação e na elaboração da oposição que deduziu, quais os factos e fundamentos constantes da decisão que determinou a reversão, contestando-os ou dando a sua versão dos factos;

Acresce ainda que perante as demais questões suscitadas na oposição, designadamente a falta de fundamentação de facto e de direito da verificação dos pressupostos que determinam a reversão, sempre a questão suscitada, relativa á omissão da notificação dessa decisão, devia ser conhecida ainda que a título incidental no âmbito do presente processo de oposição, conforme constitui jurisprudência do STA, veja-se a titulo de exemplo o Acórdão de 11/12/1996 in www.dgsi.pt.;

O Recorrente foi citado, como responsável subsidiário, em 23/09/2008, no entanto a citação do Recorrente não tem por efeito a interrupção do prazo de prescrição em curso, porquanto segundo o nº 3 do art. 49 da LGT (na redacção em vigor na data da citação) a interrupção do prazo de prescrição tem lugar uma única vez e com o facto que se verificar e primeiro lugar;

No caso dos autos a primeira causa de interrupção do prazo de prescrição em curso ocorreu com a citação da devedora principal para os termos da execução, face ao nº 1 do art. 49 da LGT; face ao disposto no nº 3 do art. 48 da LGT, tendo o Recorrente sido citado em 23/09/2008, assim para além do 5º ano posterior ao da liquidação- 4º trimestre de 2001e 1º trimestre de 2002 03/2002- terá de concluir-se que a interrupção do prazo de prescrição causada pela citação da devedora principal não produz efeitos sobre o Recorrente, pelo que o prazo em curso na data da sua citação continuou o seu curso até se completar pois não ocorreu mais nenhuma causa nem de interrupção nem de suspensão;

Assim a sentença recorrida ao considerar que a citação do Recorrente em 23/09/2008 é a primeira causa interruptiva do prazo de prescrição da divida exequenda e que em consequência tal prazo não está consumado, viola o disposto no art, 48 e 49 da LGT, devendo ser revogada e substituída por outra que julgue verificado o prazo de prescrição das dividas exequendas;

A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão no processo de execução fiscal determinada por decisão, a qual deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa e deve incluir, igualmente, a declaração dos pressupostos da responsabilidade subsidiária - a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária;

Quanto á inexistência ou fundada insuficiência de bens da devedora originária, resultando provado apenas o que consta da decisão de reversão enunciada no nº 6 dos factos provados, ou seja “… a inexistência de bens penhoráveis do devedor originário…”, conclusão que aparentemente se sustenta em resultados de consultas à bases de dados da AT, terá de concluir-se pela inexistência de factos que sustentem a conclusão da inexistência de bens da devedora originária ou da sua fundada insuficiência, e que tal decisão não cumpre o art. 77 da LGT, pois dela não consta a sucinta exposição de factos e de direito que a motivaram, nem o comando previsto no nº 2 do art. 23 da LGT, limitando-se á reprodução de uma conclusão jurídica;

10ª Na decisão que ordenou a reversão a AF não cumpre o ónus de prova que a Lei lhe impõe, qual seja a prova de que além de gerente de direito o recorrente exerceu, nos períodos das dividas em causa ou anterior ao respectivo prazo de pagamento, a gerência de facto e que ao abrigo dessa gestão praticou actos ou omissões susceptíveis de o fazerem incorrer em responsabilidade subjectiva, ou seja culposa, e como tal responsável pelas dividas tributárias de que a sociedade é responsável originária, não constando de tal decisão, nem de qualquer prova posterior nem assim do elenco dos factos provados, qualquer facto de onde tal conclusão, de direito, se possa extrair, pelo que a decisão que ordenou a reversão carece de fundamentação de facto porquanto não contém qualquer facto dos que a lei considera constitutivos dos pressupostos da reversão e que legitimem a reversão contra o ora recorrente;

11ª Exigindo a Lei á AF que fundamente, por factos provados ou a provar, na decisão que determina a reversão, e não existindo outros factos provados que não os já referidos, conclui-se que a AF não cumpriu o seu ónus de fundamentação e consequentemente de prova, sobre qualquer um dos pressupostos de cuja verificação cumulativa a Lei faz depender a possibilidade da determinação da reversão da execução sobre responsáveis subsidiários, pelo que o despacho que a determina é ilegal, por falta de fundamentação, substancial, violação do disposto nos artigos 23.º e 24.º ambos da LGT, sendo o Recorrente parte ilegítima;

12ª Da decisão que determinou a reversão, datada de 25/07/2008, não consta, fundamentadamente, a verificação dos pressupostos que permitam a reversão contra o ora Recorrente nem aliás quaisquer factos que, a provarem-se, a justificassem, pelo que tal omissão constitui falta de fundamentação, conforme Ac. do STA de 15/04/2009 in www.dgsi.pt;

13ª Ao não entender desta forma, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, erro na aplicação das normas aplicáveis, nomeadamente, entre outras os artigos 153, 157 a 161, todos do CPPT, artigos 12, 22, 23, 24, 48 e 49 todos da LGT e artigo 12.º do Código Civil e, como tal deverá ser revogada, pois só assim se fará JUSTIÇA


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A Recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos, vem o processo submetido à conferência desta Secção de Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

“1) Foi emitida, a 26.10.2002, pelos serviços da AT, certidão de dívida, relativa a liquidação de IVA respeitante ao quarto trimestre de 2001, no valor de 21.776,20 Eur., cujo termo do prazo para pagamento voluntário ocorreu a 15.02.2002 (cfr. fls. 15, dos autos, e fls. 2, do PEF apenso).

2) Foi emitida, a 26.10.2002, pelos serviços da AT, certidão de dívida, relativa a liquidação de IVA respeitante ao primeiro trimestre de 2002, no valor de 16.367,61 Eur., cujo termo do prazo para pagamento voluntário ocorreu a 15.05.2002 (cfr. fls. 16, dos autos, e fls. 3, do PEF apenso).

3) Foi instaurado, a 09.11.2002, no SF de Lisboa 8, o PEF n.º 310..., contra a sociedade W... – T…, Lda, sendo a dívida exequenda respeitante às certidões de dívida mencionadas em 1) e 2) (cfr. fls. 14 a 16, dos autos, e fls. 1 a 3, do PEF apenso).

4) O oponente apresentou, junto do SF de Lisboa 8, requerimento, que aí deu entrada a 25.07.2008, requerendo a reversão no âmbito do PEF mencionado em 3), constando do mencionado requerimento designadamente o seguinte:

“…


«Imagem no original»

…” (cfr. fls. 28, dos autos, e fls. 15, do PEF apenso).

5) No âmbito do PEF mencionado em 3), foram efetuadas, a 25.07.2008, consultas ao sistema SIPA e CEAP, nas quais não foram identificados bens penhoráveis da sociedade referida em 3) (cfr. fls. 34, dos autos, e fls. 21, do PEF apenso).

6) Na sequência do mencionado em 4) e 5) e após elaboração de informação de 25.07.2008, foi proferido, na mesma data, despacho de reversão, pelo chefe do SF de Lisboa 8, do qual consta designadamente o seguinte:

“Face da petição de folhas 12 e inf. 18 (…) prossiga-se a reversão da execução fiscal contra A... contribuinte n.º 1... (…), pela dívida abaixo discriminada.

(…)

Fundamentos da reversão: inexistência de bens penhoráveis do devedor originário (art.ºs 153.º e 160.º CPPT e art.ºs 23.º e 24.º LGT) e o revertido ter requerido o pagamento (petição de fls. 12).

Não foi feito o direito de audição por força do n.º 2 do art.º 60 LGT.

(…)


«Imagem no original»

…” (cfr. fls. 34 e 35, dos autos, e fls. 21 e 22, do PEF apenso).

7) No seguimento do mencionado em 6), foi emitido, pelos serviços da AT, documento designado de “Citação (Reversão)”, datado de 25.07.2008, dirigido ao oponente, remetido via correio postal registado com aviso de receção (cfr. fls. 38 a 41, dos autos, e fls. 25 a 28, do PEF apenso).

8) O ofício mencionado em 7) foi devolvido ao remetente com a indicação “Objeto não reclamado” (cfr. fls. 28, do PEF apenso).

9) No seguimento do mencionado em 8), foi emitido, pelos serviços da AT, documento designado de “Citação (Reversão)”, datado de 12.09.2008, dirigido ao oponente, remetido via correio postal registado com aviso de receção (cfr. fls. 42 e 43, dos autos, e fls. 29 a 30B, do PEF apenso).

10) No aviso de receção mencionado em 9) foram apostas, no campo para preenchimento no destino, assinatura e a data 23.09.2008 (cfr. fls. 42 e 43, dos autos, e fls. 29 a 30B, do PEF apenso).

11) No âmbito do PEF mencionado em 3) foi apresentado requerimento, pela devedora originária, através de mandatária, mandatada por procuração assinada pelo oponente em representação da devedora originária, que deu entrada no SF de Lisboa 8 a 03.10.2008, oferecendo à penhora créditos (cfr. fls. 46 a 76, dos autos, e fls. 33 a 63, do PEF apenso).

12) Em anexo ao requerimento mencionado em 11), foram juntas cópias de faturas emitidas pela devedora originária, no valor total sem IVA de 31.758,86 Eur., das quais constam os seguintes elementos:


«Imagem no original»

(cfr. fls. 49 a 75, dos autos, e fls. 36 a 62, do PEF apenso).

13) No seguimento do referido em 11) e 12), foi elaborada informação, no SF de Lisboa 8, datada de 23.10.2008, da qual consta designadamente o seguinte:

“…


«Imagem no original»

…” (cfr. fls. 77 e 78, dos autos, e fls. 64 e 65, do PEF apenso).

14) Sobre a informação mencionada em 13), foi proferido, a 24.10.2008, despacho de concordância com a mesma (cfr. fls. 77 e 78, dos autos, e fls. 64 e 65, do PEF apenso).

15) Na sequência do referido em 14) foram emitidos, pelos serviços da AT, ofícios dirigidos às entidades mencionadas em 12) (cfr. fls. 79 a 92, dos autos, e fls. 66 a 79, do PEF apenso).

16) O oponente apresentou a presente oposição, através de petição, que deu entrada no SF de Lisboa 8 a 24.10.2008, tendo sido remetida via correio postal registado com aviso de receção a 23.10.2008 (cfr. fls. 5 a 10).

17) Por referência a 23.10.2008, a dívida exequenda, juros de mora e custas do PEF mencionado em 3) eram no valor total de 52.474,21 Eur. (cfr. fls. 44, 77 e 78).

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DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.

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MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou na prova documental junta aos autos, conforme indicado em cada um desses factos”.



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- De Direito

Como a Mma. Juíza elencou, foram as seguintes as questões alegadas na p.i e apreciadas na sentença recorrida: nulidade absoluta da decisão que determinou a reversão e nulidade emergente de tal decisão, por não constar expressamente da citação; não existência de qualquer facto que determine a conclusão de que a devedora originária não dispõe de bens ou que os mesmos são insuficientes, sendo certo que a devedora originária, em outubro de 2008, ofereceu à penhora créditos da empresa sobre clientes; não observância, por parte da AT, do ónus da prova de exercício de funções de gestão de facto; nulidade da decisão que ordenou a reversão, por absoluta ausência da mesma e consequente falta de fundamentação de facto e de direito, não cumprindo o disposto nos artigo 23.º, n.º 4, e 60.º, n.º 5, ambos da LGT.

Todos estes fundamentos foram julgados improcedentes pelo TT de Lisboa. Foi, ainda, julgada não verificada a prescrição da dívida exequenda, questão que, na pendência do processo, foi suscitada também.

Como se vê pelas conclusões da alegação de recurso, o Recorrente insurge-se contra a sentença em toda a sua extensão, discordando da análise levada a efeito relativamente a cada fundamento.

Vejamos, então, começando pela prescrição da dívida exequenda, questão que o Recorrente pretende ver reapreciada, tal como resulta das conclusões 5ª a 7ª.

No essencial, defende Armando Madeira que “ a citação do Recorrente não tem por efeito a interrupção do prazo de prescrição em curso, porquanto segundo o nº 3 do art. 49 da LGT (na redacção em vigor na data da citação) a interrupção do prazo de prescrição tem lugar uma única vez e com o facto que se verificar e primeiro lugar; no caso, “a primeira causa de interrupção do prazo de prescrição em curso ocorreu com a citação da devedora principal para os termos da execução, face ao nº 1 do art. 49 da LGT; face ao disposto no nº 3 do art. 48 da LGT, tendo o Recorrente sido citado em 23/09/2008, assim para além do 5º ano posterior ao da liquidação (…) terá de concluir-se que a interrupção do prazo de prescrição causada pela citação da devedora principal não produz efeitos sobre o Recorrente, pelo que o prazo em curso na data da sua citação continuou o seu curso até se completar pois não ocorreu mais nenhuma causa nem de interrupção nem de suspensão”; em suma, “a sentença recorrida ao considerar que a citação do Recorrente em 23/09/2008 é a primeira causa interruptiva do prazo de prescrição da divida exequenda e que em consequência tal prazo não está consumado, viola o disposto no art, 48 e 49 da LGT”.

Vejamos o que se nos oferece a este propósito.

Comecemos por deixar devida nota daquele que foi o discurso fundamentador adoptado pela sentença e que determinou a conclusão no sentido da não prescrição da dívida exequenda. Aí se lê:

“(…)

Em causa nos autos de execução estão dívidas relativas a IVA de 2001 e 2002.

Na contagem do prazo prescricional, há que ter, desde logo, em conta o disposto no art.º 48.º, da LGT, nos termos do qual:

“1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário…”.

A redação do n.º 1 supracitado foi-lhe dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro.

Considerando que, in casu, a dívida exequenda abrange liquidações de IVA anteriores a 01.01.2005 (data da entrada em vigor da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro), cumpre, antes de mais, definir os termos em que é fixado o dies a quo.

A este respeito já se pronunciou por diversas vezes o Supremo Tribunal Administrativo, e, seja por aplicação do disposto no art.º 297.º, n.º 2, do Código Civil, seja por aplicação do disposto no art.º 12.º, do mesmo código, o entendimento tem sido no sentido de aplicação da lei nova aos prazos em curso [v., a título exemplificativo, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 26.11.2008 (Processo: 0598/08), de 20.05.2009 (Processo: 0293/09), de 25.06.2009 (Processo: 01109/08), de 03.03.2010 (Processo: 01076/09), de 30.06.2010 (Processo: 0158/10), de 30.06.2010 (Processo: 0201/10), de 17.03.2011 (Processo: 0177/11) e de 28.09.2011 (Processo: 764/2011), de 08.02.2012 (Processo: 033/12), de 30.05.2012 (Processo: 0504/12) e de 26.06.2013 (Processo: 0489/13)].

Assim, e no caso em concreto, considerando tal entendimento, aplica-se a todas as situações, in casu, o art.º 48.º, n.º 1, da LGT, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de dezembro, pelo que o prazo de prescrição das dívidas de IVA de 2001 e 2002 se iniciou, respetivamente, em 1 de janeiro de 2002 e 2003, completando-se, no caso de não existirem quaisquer causas de suspensão ou interrupção, oito anos depois (cfr., exemplificativamente, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19.03.2015 – Processo: 08542/15).

Há que, então, verificar se ocorreram causas de suspensão ou interrupção deste prazo.

A este propósito, é de chamar à colação o disposto no art.º 49.º, da LGT.

Cumpre, antes de mais, atentar na redação do art.º 49.º, da LGT, anterior e posterior a 2007, considerando a redação dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro.

Assim, dispunha o art.º 49.º, da LGT, na redação anterior à que lhe foi dada pela referida Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro:

“1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.

2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.

3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso”.

Com a alteração decorrente da referida Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, da mencionada disposição legal passou a constar o seguinte:

“1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.

2 – (Revogado)

3 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.

4 - O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”.

A este propósito, há que ter em consideração o disposto no art.º 91.º, da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, nos termos do qual “[a] revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objeto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo”.

Portanto, até 2007, a LGT previa a possibilidade de sobreposição de vários efeitos interruptivos, situação que deixou de estar consagrada, como decorre do atual n.º 3 do art.º 49.º, da LGT.

A este propósito, refere Jorge Lopes de Sousa (Sobre a prescrição da obrigação tributária, 2.ª edição, Áreas Editora, Lisboa, 2010, pp. 73, 78 e 79):

“[E]sta lei [Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro] (…) entrou em vigor a 1-1-2007 e, sendo aquela uma norma sobre os efeitos de factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força da regra do art.º 12.º, n.º 2, do CC. (…)

Até 1-1-2007, qualquer das causas de interrupção da prescrição tinha, por si própria, os efeitos de eliminar todo o tempo anteriormente decorrido e obstar ao decurso do prazo da prescrição enquanto estivesse pendente o processo em que ela se tinha produzido.

Por isso, mesmo que, quando ocorreu a segunda causa de interrupção da prescrição, o período anterior à primeira estivesse eliminado e não tivesse decorrido qualquer período para a prescrição, por o processo que determinou a primeira interrupção estar pendente e não ter parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, a segunda causa de interrupção mantém a sua própria potencialidade para produzir os mesmos efeitos em relação ao período anterior (…) e durante o seu próprio processo”.

Por outro lado, e uma vez que estamos perante uma situação de reversão, há que ter em conta o disposto no art.º 48.º, n.º 3, da LGT, nos termos do qual “[a] interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação”.

Para se verificar qual a lei aplicável, há que considerar a redação em vigor à data da ocorrência do primeiro efeito interruptivo.

Com efeito, nos termos do art.º 12, n.º 2, do Código Civil:

“Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor” (sublinhado nosso).

Como refere Baptista Machado, “… o art.º 12.º, n.º 2 [do Código Civil], distingue dois tipos de leis ou de normas: aquelas que dispõem sobre os requisitos de validade (…) (1.ª parte) e aquelas que dispõem sobre o conteúdo de certas situações jurídicas e o modelam sem olhar aos factos a que tais situações deram origem (2.ª parte). As primeiras só se aplicam a factos novos, ao passo que as segundas se aplicam a relações jurídicas (…) constituídas antes da [lei nova] (…) mas subsistentes ou em curso à data da sua [entrada em vigor]…” (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1994, p. 233).

Como decorre do termo do prazo para pagamento voluntário, as liquidações em causa foram emitidas em 2002, tendo o oponente sido citado em 2008. Ou seja, entre o termo do ano de emissão das liquidações e a citação do oponente decorreram mais de 5 anos. Como tal, qualquer eventual interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao oponente, nos termos do art.º 48.º, n.º 3, da LGT.

A este respeito, chama-se à colação o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 06.03.2014 (Processo: 0601/13):

“No âmbito dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, o condicionamento do responsável subsidiário apenas está previsto quanto aos actos interruptivos da prescrição (…). Isto é, no nº 3 do art. 48º da LGT o legislador só criou e consagrou uma regra especial e/ou excepcional quanto a uma tramitação específica relativamente à responsabilidade subsidiária apenas e só quanto às causas de interrupção da prescrição, deixando de fora do espírito deste normativo o prazo da prescrição ou mesmo a eventual suspensão deste prazo (inerente, em regra, à prestação da garantia).

Portanto, (…) a citação do oponente (chamado à execução na qualidade de responsável subsidiário) (…) efectuada (…) após o 5º ano posterior ao da liquidação (…) poderá desconsiderar as causas interruptivas que relevantemente tiverem ocorrido em relação ao devedor originário. (…) [C]omo salienta o Cons. Jorge Lopes de Sousa, (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª ed., 2010, p. 119.) mesmo «no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5° ano, se ele for citado até ao fim do 8° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n° 2 do art. 48°). O efeito daquele nº 3 do art. 48° é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário», sendo que esta interpretação é a que melhor se adequa à teleologia global do art. 48º da LGT, permitindo, aliás, a conjugação do estatuído nos seus nºs 2 e 3”.

Como mencionado por Jorge Lopes de Sousa (CPPT anotado, Vol. III, 6.ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 265 e 266):

“Se o facto com efeito interruptivo em relação ao devedor originário ocorreu na vigência da LGT, a sua eficácia em relação ao responsável subsidiário fica subordinada à verificação da condição de que depende, que é a respectiva citação vir a ocorrer até ao termo do 5.º ano posterior ao da liquidação. (…) É de salientar que a subordinação a condição da extensão ao responsável subsidiário dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, que se estabelece no n.º 3 do art. 48.º da LGT, apenas está prevista quanto aos actos interruptivos da prescrição e não também quanto às causas de suspensão da prescrição, como tal denominadas designadamente as previstas no n.º 4 do art. 49.º (…). Quanto a estes factos com efeito suspensivo da prescrição, aplica-se a regra do n.º 2 do mesmo art. 48.º da LGT de que as causas de suspensão em relação ao devedor principal produzem efeitos em relação ao responsável subsidiário, independentemente do momento em que ocorrer a citação deste. (…)

Os efeitos que não se produzem em relação ao responsável subsidiário que não for citado até ao fim do quinto ano posterior ao da liquidação são todos os efeitos dos actos interruptivos, isto é, tanto a inutilização do período de tempo decorrido anteriormente (…) como o efeito suspensivo que decorre desses actos (até ao termo do processo ou até se verificar paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte)”.

Dado que dos autos não consta que tenha ocorrido qualquer causa de suspensão do prazo de prescrição, há que verificar se, à data da citação do oponente, já ocorrera ou não a prescrição das dívidas exequendas relativas a IVA.

Ora, ainda que, tal como referido nas alegações do oponente, desde a data da liquidação até à data da citação tenham decorrido mais de cinco anos, isso não implica prescrição da dívida contra o revertido. Como resulta do quadro legal, a que já se fez referência, esse período de cinco anos apenas releva para efeitos de desconsideração de efeitos interruptivos anteriores.

Assim, ainda que não se considere qualquer efeito interruptivo ou suspensivo, relativo à devedora originária, refira-se que a citação do oponente ocorreu já em plena vigência do art.º 49.º, da LGT, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro. Por outro lado, não decorre dos autos que tenha ocorrido antes qualquer outra das causas de interrupção previstas no art.º 49.º, da LGT (reclamação, impugnação, recurso hierárquico ou pedido de revisão).

Portanto, a primeira causa interruptiva ocorreu já em plena vigência da nova redação do art.º 49.º, sendo a única também a ter em conta, irrelevando uma eventual paragem do PEF por mais de um ano, dada a revogação do n.º 2 do art.º 49.º (cfr. Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado, vol. III, 6.ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, p. 253).

Esta causa de interrupção, única a considerar, atendendo ao n.º 3 do art.º 49.º, da LGT, tem o efeito de instantâneo de inutilização de todo o tempo decorrido anteriormente, mas tem ainda o efeito duradouro de paralisação do decurso do prazo, enquanto não houver termo do processo, dado decorrer da citação.

A este propósito, chama-se à colação Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 11.10.2011 (Processo: 05009/11):

“[A] interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil).

Resultam, assim, destes artºs.326 e 327, do C. Civil, dois conceitos de interrupção da prescrição: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (…).

Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C. Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.52 e seg.)…” (sublinhados nossos).

Atenta a factualidade assente e o disposto no art.º 48.º, n.º 3, da LGT, relativamente ao oponente, até 2008, não ocorreu qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição, excetuando a citação.

Assim, à data da citação (23.09.2008), as dívidas exequendas relativas a IVA do ano de 2001 e 2002 não se encontravam prescritas, completando-se o prazo de prescrição oito anos depois de 01.01.2002 e 01.01.2003, respetivamente. Tendo a citação ocorrido em momento anterior, o respetivo prazo interrompeu-se, nos termos do art.º 49.º, n.º 1, da LGT”.

Adiantamos, desde já, que a análise feita em 1ª instância é irrepreensível, sendo de manter inalterada.

Na verdade – e esta era a pedra de toque do recurso jurisdicional quanto à análise da prescrição –contrariamente ao sustentado pelo Recorrente, inexiste demostração nos autos de que se tenha verificado qualquer causa interruptiva da prescrição, por referência à devedora originária, antes da citação do vertido. O recorrente afirma esse circunstancialismo mas não o demonstra, nem ensaia tal demostração, sendo que a análise do PEF apenso não evidencia tal ocorrência, como a sentença não deixou de ponderar.

Como já vimos, o n.º 3 do artigo 48.º da LGT prevê que a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.

No caso em apreço, o responsável subsidiário foi citado em 23/09/08, logo foi efetuada depois do 5.º ano posterior às liquidações de IVA (uma de 2000, outra de 2001). No caso, porém, importa relevar que a sua citação, enquanto responsável subsidiário, ocorreu antes de se ter completado o prazo de 8 anos da prescrição.

Ora, como salienta Jorge de Sousa, in Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª ed., 2010, p. 119.) “(…) a subordinação do efeito das causas interruptivas em relação aos responsáveis subsidiários não é um prazo especial de prescrição em relação ao responsável subsidiário.

O prazo de prescrição, à face da LGT, é de 8 anos, tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário. E o termo desse prazo pode ser diferido se ocorrerem causas de interrupção e suspensão tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário. É apenas a relevância das causas de interrupção que se verifiquem apenas em relação ao devedor originário (e o consequente diferimento do termo do prazo que delas deriva) que é afastada em relação ao responsável subsidiário, se a sua citação não ocorrer até ao 5.º ano posterior ao da liquidação. Mas, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5.º ano, se ele for citado até ao fim do 8.º ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n.º 2 do art.º 48.º). O efeito daquele n.º 3 do art.º 48.º é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário”. – sublinhado nosso.

E também é esta a jurisprudência do STA, no acórdão n.º 0601/13 de 06/03/14, nos termos do qual “(…) Mas, de todo o modo, como parece claro, no âmbito dos efeitos dos actos praticados em relação ao devedor originário, o condicionamento do responsável subsidiário apenas está previsto quanto aos actos interruptivos da prescrição (e não também quanto ao prazo da própria prescrição – que continua a ser o de 8 anos; aliás, também quanto à suspensão da prescrição não se estabelece condicionamento). Isto é, no nº 3 do art. 48º da LGT o legislador só criou e consagrou uma regra especial e/ou excepcional quanto a uma tramitação específica relativamente à responsabilidade subsidiária apenas e só quanto às causas de interrupção da prescrição, deixando de fora do espírito deste normativo o prazo da prescrição ou mesmo a eventual suspensão deste prazo (inerente, em regra, à prestação da garantia).

Portanto, ainda que a citação do oponente (chamado à execução na qualidade de responsável subsidiário) fosse efectuada (para as dívidas de IVA relativas ao ano de 1999) após o 5º ano posterior ao da liquidação, tal não encurtaria, ao invés do que se considerou na sentença recorrida, o prazo a prescrição para 5 anos: aquela circunstância apenas poderá desconsiderar as causas interruptivas que relevantemente tiverem ocorrido em relação ao devedor originário. (…)”

Em síntese, se a citação do responsável subsidiário pela dívida exequenda ocorrer para além do 5º ano posterior ao ano da liquidação, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto a ele, nos termos do n.º 3 do artigo 48.º da LGT.

No entanto, se a citação do responsável subsidiário pela dívida exequenda tiver ocorrido para além do 5º ano posterior ao ano da liquidação, como aqui ocorre, mas antes do 8.º ano a contar do início da prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele.

Tendo sido citado na execução fiscal em 23/09/08, antes de se ter completado o prazo de 8 anos a contar do início do prazo de prescrição, inutilizou o prazo decorrido em relação ao Recorrente, responsável subsidiário, e impediu o decurso do prazo até ao termo do processo.

Consequentemente, a obrigação tributária (IVA dos anos de 2000 e 2001) não se encontrava prescrita como bem decidiu a sentença recorrida, pelo que improcede esta questão.


*

Avancemos na análise, e centremo-nos na questão suscitada quanto à circunstância de não constar da citação efectuada em Setembro de 2008 a decisão que determinou a reversão, nem os factos e fundamentos da mesma, assim se violando o artigo 22º, nº4 da LGT.

Comecemos por ter presente o que o TT de Lisboa decidiu a propósito. Lê-se na sentença o seguinte:

“ Refira-se que o alegado em torno da nulidade absoluta da decisão que determinou a reversão e nulidade emergente de tal decisão, por não constar expressamente da citação, invocada na petição inicial e reiterada em sede de alegações, mais não é do que uma alegada nulidade da citação.

Quanto à nulidade da citação, a mesma não configura fundamento de oposição à execução fiscal, mas sim de requerimento a apresentar junto do órgão de execução fiscal e dirigido a este, para sua apreciação e, eventualmente, reclamação, nos termos do art.º 276.º, do CPPT (cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 10.03.2011 – Processo: 042/11; de 27.02.2013 – Processo: 01460/12).

Com efeito, com a oposição à execução fiscal, o efeito pretendido é, regra geral, a extinção desta (ou a sua suspensão, em certos casos, ou mesmo a anulação do despacho de reversão), sendo que a alegada nulidade da citação não tem tal efeito, mas sim o da sua declaração, com consequências no processado posterior. No entanto, ainda que a mesma seja declarada, tal não conduz à extinção da oposição, mas sim à repetição do ato.

Como tal, improcede aqui o alegado pelo oponente.”

Como está bem de ver, lida a alegação de recurso e as correspondentes conclusões, o Recorrente, ao invés de se insurgir contra o decidido em 1ª instância, rebatendo, no caso, a conclusão no sentido de que a nulidade da citação não configura fundamento de oposição à execução fiscal, não sendo de conhecer nesta sede, limita-se a reiterar todo o seu argumentário inicial, sem atacar a decisão.

E, assim sendo, sem esforço se conclui que o ataque à decisão, quanto a esta questão, é absolutamente ineficaz e imprestável para a colocar em causa.

Improcede, pois, esta questão e as conclusões que lhe estavam subjacentes.


*

Importa prosseguir.

Nas conclusões 9ª e seguintes o Recorrente insurge-se contra o decidido, reiterando que a AT não demonstrou, como lhe competia, os pressupostos da reversão, seja quanto à conclusão de que a devedora originária não dispõe de bens ou que os mesmos são insuficientes, seja quanto ao não cumprimento do ónus da prova quanto ao exercício de funções de gestão de facto na sociedade W... – T… Lda.

Quanto à questão da inexistência/ insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, lê-se na sentença, além do mais, o seguinte:

“ Ora, in casu, ao contrário do alegado pelo oponente, o órgão de execução fiscal fez pesquisas às bases de dados disponíveis, das quais não resultou qualquer identificação de bens penhoráveis.

Logo, no momento da prolação do despacho de reversão, os dados de que a AT dispunha permitiam-lhe concluir pela fundada insuficiência ou inexistência de património da devedora originária.

Por outro lado, o facto de a devedora originária, em momento ulterior ao da citação do oponente na qualidade de revertido, vir indicar créditos à penhora não altera esta conclusão, não só pelo momento em que tal foi suscitado, mas também pelo facto de os mesmos serem de valor inferior ao da dívida exequenda e acrescido.

Assim, por um lado, a AT não tinha como saber da existência destes créditos, sem informação por parte da devedora originária, que só lha facultou depois de revertida a execução e de citado o oponente (sublinhe-se que pouco tempo antes deste requerimento, o oponente requereu a sua reversão e, em momento ulterior à sua citação, a sociedade, representada pelo oponente e através de mandatário, já veio indicar créditos à penhora).

Por outro lado, como referido, esses mesmos créditos eram de valor insuficiente para solver a dívida exequenda, pelo que a fundada insuficiência do património da devedora originária sempre estaria evidenciada.

Com efeito, a dívida exequenda e respetivo acrescido eram, na data em causa, de 52.474,21 Eur. (dado que o pedido de penhora de créditos foi da iniciativa da devedora originária, há que considerar este valor total em dívida). Por outro lado, os créditos indicados, mesmo que viessem todos a ser reconhecimentos pelos respetivos credores, eram no valor total sem IVA de 31.758,86 Eur., valor inferior à dívida exequenda. Aliás, sublinhe-se ainda que, nos termos do disposto no art.º 40.º, n.º 4, da LGT, o pagamento parcial que seja feito é em primeiro lugar imputado aos juros de mora, em segundo aos demais encargos legais e só em terceiro lugar à dívida tributária.

Ou seja, face a todo este contexto, a indicação de créditos para efeitos da sua penhora, além de não pôr em causa o despacho de reversão, proferido em momento anterior e numa altura em que, face aos elementos de que a AT dispunha, não se identificaram quaisquer bens, não alteraria a decisão, dado que os créditos em causa não são suficientes para responder pela dívida e respetivo acrescido.

Nesse seguimento, encontra-se evidenciado o requisito previsto no n.º 2 do art.º 23.º, da LGT, e no n.º 2 do art.º 153.º, do CPPT”.

O raciocínio adoptado na sentença é inatacável, estando em absoluta sintonia com o quadro legal aplicável – artigos 23º, 2 da LGT e 153º, nº 2 do CPPT - e com o circunstancialismo de facto verificado nos autos, o qual, aliás, não se mostra contestado no recurso.

Deve salientar-se que a reversão não depende exclusivamente da inexistência de bens, bastando-se com a sua insuficiência. Para além do mais, no caso, atendendo ao momento da reversão, até aí, a AT fez as diligências que podia e que estavam ao seu alcance, daí não resultando a identificação de bens penhoráveis.

Mesmo considerando a indicação feita, mais tarde, de créditos sobre clientes, a verdade é que o seu total era ainda insuficiente para efeitos de pagamento da dívida exequenda, como bem observou a sentença.

E, assim sendo, como se verifica ser, sempre a situação em causa redundaria numa clara insuficiência de bens penhoráveis e– repete-se – a reversão basta-se com a constatação dessa insuficiência.

Da leitura da conclusão 9ª nada mais de relevante se retira que possa contrariar e colocar em causa o decidido pelo TT de Lisboa.

Avancemos para outro aspecto evidenciado na conclusão 10ª da alegação recursória.

Sustenta o Recorrente que “a AF não cumpre o ónus de prova que a Lei lhe impõe, qual seja a prova de que além de gerente de direito o recorrente exerceu, nos períodos das dividas em causa ou anterior ao respectivo prazo de pagamento, a gerência de facto e que ao abrigo dessa gestão praticou actos ou omissões susceptíveis de o fazerem incorrer em responsabilidade subjectiva, ou seja culposa, e como tal responsável pelas dividas tributárias de que a sociedade é responsável originária, não constando de tal decisão, nem de qualquer prova posterior nem assim do elenco dos factos provados, qualquer facto de onde tal conclusão, de direito, se possa extrair”.

Mantendo o procedimento de análise que temos vindo a adoptar, tenhamos presente a apreciação feita pelo TT de Lisboa a este propósito.

Lê-se na sentença, entre o mais, o seguinte:

“(…) Na sequência deste entendimento unânime na jurisprudência atual, a que se adere, decorre que cabe, em primeira linha, à AT demonstrar cabalmente que o revertido exerceu, nos termos consignados no n.º 1 do art.º 24.º, da LGT, efetivas funções de gerência, entendidas como funções de gestão e representação da sociedade (cfr., para as sociedades por quotas, os art.ºs 192.º e 252.º, do Código das Sociedades Comerciais).

Ora, in casu, essa circunstância encontra-se demonstrada, desde logo pela própria declaração de vontade do oponente, revelada no requerimento mencionado em 4), do probatório, no qual o próprio requereu que fosse revertida a execução contra si (cfr., a este respeito, o disposto no art.º 217.º, do Código Civil, com as necessárias adaptações, bem como o disposto no art.º 59.º, n.º 2, da LGT). Aliás, atentando no despacho de reversão, o mesmo funda-se desde logo no próprio pedido formulado pelo oponente, que, como manifestação de vontade, tem naturalmente implícita a assunção por parte do requerente da reunião dos pressupostos subjetivos para a reversão. Assim, desde logo por aí, considera-se que a AT, por remeter para o próprio requerimento do oponente, cumpriu a sua obrigação decorrente do disposto no n.º 1 do art.º 24.º, da LGT.

Face ao exposto, improcede também nesta parte o alegado pelo oponente”

Vejamos, então, o que nos suscita a questão assim colocada, lembrando que o despacho de reversão proferido é o que consta do ponto 6 dos factos provados.

A reversão operada ao abrigo do artigo 24º da LGT, independentemente de se tratar da alínea a) ou b) do nº 1 da LGT, pressupõe o exercício da gerência de facto da devedora originária, por parte do revertido – consta de tal preceito que “1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação; b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”.

Ora, no caso, é para nós claro, que a AT não demonstrou suficientemente o que lhe competia, isto é, que o revertido, ora Recorrente, era gerente de facto da devedora originária no período temporal relevante (o qual, de resto, nem sequer foi indicado), não oferecendo dúvidas que é à AT, enquanto titular do direito de reversão, que cabe fazer a prova do exercício da gerência.

Na verdade, em função da inclusão na disposição apontada das expressões “exerçam, ainda que somente de facto, funções” e “período de exercício do seu cargo”, fácil é concluir que não basta para a responsabilização das pessoas aí indicadas a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respectivas funções. Assim, desde logo se vê que a responsabilidade subsidiária depende, antes de mais, do efectivo exercício da gerência ou administração, ainda que somente de facto.

Com efeito, e como repetidamente se vem considerando na jurisprudência, da gerência de direito não se retira, por presunção, a gerência de facto.

Ora, no caso, o que se verifica é que a AT, escudada num requerimento em que o Recorrido pedia que fosse dado início ao processo de reversão, com vista a permitir o pagamento o abrigo do artigo 23º da LGT (cfr. nº 4 dos factos provados), demitiu-se, por completo, de todo e qualquer ónus de invocação e probatório quanto à gerência de facto da devedora originária, limitando-se a considerar – como suficiente – esse pedido de pagamento (cfr. nº 6 dos factos provados).

Aliás, tanto considerou esse pedido suficiente para efeitos de reversão que, inclusive, dispensou o exercício do direito de audição, ao abrigo do nº2 do artigo 60º da LGT (preceito este, de resto, previsto para actos de liquidação e não para o caso do despacho de reversão).

Para nós, jamais um singelo pedido para que se dê início ao processo de reversão permitia que a Administração se demitisse, como sucedeu, de averiguar os pressupostos da sua actuação que, aliás, apesar de tal requerimento, podia até constatar não se verificarem e, nessa medida, podia a AT vir a abster-se de operar a reversão.

Assim sendo, não podemos acompanhar o assim decidido em sede de reversão, nem a sentença que, neste esteio, corroborou a actuação administrativa.

Dos autos, e do despacho de reversão em particular, nada consta sobre o exercício da gerência por banda do ora Recorrente, devendo ter-se presente que a gerência de facto de uma sociedade consiste “no efectivo exercício das funções que lhe são inerentes e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade. Para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efectivamente, dos respectivos poderes, que seja um órgão actuante da sociedade, tomando as deliberações consentidas pelo facto, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros - nestes termos, Rúben Anjos de Carvalho - Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139” – cfr. acórdão do TCA Norte, de 30/04/14, no processo nº 1210/07.5 BEPRT.

No caso, aliás, nem sequer é feita qualquer alusão ao período temporal relevante, entre o necessário exercício da gerência e o facto constitutivo das dívidas ou o prazo legal de pagamento ou entrega. Nada, mesmo nada, é dito em sede de reversão.

Tenhamos presente que a efectivação da responsabilidade tributária subsidiária é uma prerrogativa da Administração, a exercer mediante um acto administrativo, fundamentado, com prévia possibilidade de participação do interessado. A efectivação desta responsabilidade, pela agressividade que lhe é inerente, surge rodeada de exigências legais impostas à Administração, as quais se destinam, naturalmente, a assegurar que a Administração, no exercício desse seu poder de decisão, observa os pressupostos legais que permitem exigir o pagamento de uma dívida a alguém que não é o deu devedor originário.

Ora, no caso que nos ocupa - com especiais especificidades - tudo isto falhou, pois a Administração Tributária demitiu-se, por completo, do ónus que lhe incumbia.

Em face de tudo o que vem dito e tendo presente o circunstancialismo fáctico que subjaz à oposição/ recurso em análise, constata-se que ficou por demonstrar uma realidade susceptível de evidenciar o exercício efectivo dos poderes de gerência por parte do ora Recorrido, sendo que, como antes já dissemos, era sobre a FP que recaía o ónus de provar tal exercício.

Não se provando o exercício efectivo da gerência, e considerando que, para os efeitos aqui em análise, o requerimento constante do ponto 4 dos factos provados, é absolutamente insuficiente, é evidente que não se pode manter a sentença recorrida, pois ficou por cumprir o que competia à AT, em sede de demonstração dos pressupostos da reversão, concretamente o exercício da gerência de facto da devedora originária por parte do Recorrido.

Procedem, assim, as conclusões que vínhamos analisando e isso basta para concedermos provimento ao recurso, revogar a sentença e julgar procedente a oposição, com a consequente extinção da execução fiscal. Isto mesmo ficará consignado no dispositivo da sentença.


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Face ao decidido, fica prejudicado o conhecimento do demais suscitado neste recurso jurisdicional.



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III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgar procedente a oposição e, consequentemente, extinguir a execução fiscal que lhe está subjacente.

Custas pela Recorrida.

Registe e Notifique.

Lisboa, 11/02/21


Catarina Almeida e Sousa

Hélia Gameiro

Ana Cristina Carvalho