Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1244/22.0BELSB-S1
Secção:CA
Data do Acordão:11/17/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores: EFEITO SUSPENSIVO AUTOMÁTICO
LEVANTAMENTO DO EFEITO
Sumário:I – Dispõe o artigo 103º-A do CPTA, sob a epígrafe “Efeito suspensivo automático”, que “(…) A impugnação de atos de adjudicação no âmbito do contencioso pré-contratual urgente faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado. (…)” [cfr. nº.1].
Em qualquer caso, “(…) a entidade demandada e os contrainteressados podem requerer ao juiz o levantamento do efeito suspensivo, alegando que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, havendo lugar, na decisão, à aplicação do critério previsto no n.º 2 do artigo 120.º (…)” [cfr. nº.2], sendo que “(…) o efeito suspensivo é levantado quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento.”
II - Não está em causa ponderar valores ou interesses em si, mas danos ou prejuízos, que numa prognose relativa às circunstâncias do caso concreto, possam emergir ou não, do levantamento do efeito suspensivo dos efeitos do ato impugnado.
III - Em concreto, não tendo o Município logrado demonstrar que o adiamento da execução do ato concursado seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, não restará ao Tribunal outra alternativa que não a de conservar eficaz a regra da manutenção do efeito suspensivo automático.
IV - A regra consagrada no CPTA, após a revisão de 2015, é a de que a impugnação de ato de adjudicação faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado, reservando ao tribunal a faculdade de verificar o preenchimento dos pressupostos para a manutenção dessa suspensão.
V - Tendo presente que, nos termos do artigo 103º-A do CPTA, o efeito suspensivo automático só pode ser afastado se se demonstrar que tal é gravemente prejudicial para o interesse público ou que os danos que resultariam da sua suspensão seriam claramente superiores àqueles que resultariam do seu levantamento, a circunstância de não resultar provado nenhum dano decorrente da manutenção desse efeito suspensivo é suficiente para, sem necessidade de mais ponderação, se indeferir o pedido apresentado pela Recorrente.
VI – É manifesto que a suspensão do referido automatismo legal, reveste natureza excecional, perante a verificação de situações anómalas e atípicas, o que no caso em concreto se não vislumbra, sob pena de se estar a subverter o referido normativo.
VII - É a entidade demandada (e/ou os contrainteressados) que tem o ónus de alegar e de provar os factos que traduzam uma situação de grave prejuízo para o interesse público ou consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, com vista ao levantamento do efeito suspensivo automático que decorre do art.º 103ºA do CPTA.
Para que pudesse haver lugar ao levantamento do efeito suspensivo, seria suposto que o Município tivesse comprovado que a manutenção do efeito suspensivo lhe causava um prejuízo grave; e um prejuízo superior aos prejuízos que resultam para a Autora, o que ficou por demonstrar.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
O Município de Lisboa, devidamente identificado nos autos, no âmbito do Processo de Contencioso Pré-contratual intentado pela V...... – C....., SA, veio interpor o presente recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 14 de julho de 2022, nos termos da qual foi indeferido o pedido de levantamento do efeito suspensivo do ato objeto de impugnação, i.e., da decisão relativa ao concurso para “Aquisição de licenciamento de software e serviços conexos na modalidade de aluguer operacional”.
Concluiu-se no referido Recurso:
“1. Em 23/06/2022 o Réu apresentou requerimento de levantamento do efeito suspensivo automático, no seguimento da instauração da presente ação de contencioso pré-contratual, por parte da Autora V...... – C....., SA.
2. A manutenção do efeito suspensivo automático por força do disposto no artº 103-A, nº 1, do CPTA, lesa gravemente o interesse público, e não se vislumbra no petitório da Autora quaisquer interesses superiores aos do Réu.
3. O ato de adjudicação suspenso tem como objeto a “Aquisição de licenciamento de software e serviços conexos na modalidade de aluguer operacional”, que visa assegurar a continuidade, necessária e imprescindível, do licenciamento de software Microsoft em regime de aluguer e visa garantir a continuidade do fornecimento de bens e serviços essenciais ao funcionamento do Município de Lisboa, uma vez que se destinam a ser disponibilizados a todo o universo municipal - Executivo, respetivos elementos dos gabinetes de apoio, corpo dirigente e de chefia, funcionários e colaboradores – garantindo-lhes o acesso a ferramentas de trabalho, que na era em que vivemos são imprescindíveis.
4. Mantendo-se a suspensão do procedimento concursal nº 13/CPI/DA/DCP/2021, todos os que trabalham para o Réu deixarão de ter acesso a ferramentas indispensáveis à sua atividade, como o office, o e-mail e a toda a documentação armazenada e partilha em Cloud, e, como consequência, compromete de forma irremediável o funcionamento dos serviços do Réu., uma vez que o paralisa, e afeta, necessariamente, o cidadão de Lisboa.
5. Como refere o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 24/11/2016, disponível em www.dgsi.pt com o n.º de processo 919/16.7BELSB o regime que parece resultar dos nº 2 e nº 4 do artigo 103º-A à luz da letra da lei e da teleologia do efeito suspensivo automático, em primeiro lugar, a metodologia decisória do juiz deve passar pela ponderação racional e expressa, num juízo de prognose, de todos os interesses em presença e de todos os danos respetivos. O Juiz não se deve abster de fazer esta ponderação, e fazendo só podia chegar a uma conclusão, o interesse público do Município de Lisboa é superior ao interesse da Autora, ora Recorrida.
6. Nos dois “interesses” em análise, para ponderação por parte do Juiz, temos por um lado os prejuízos a causar pela continuação do efeito suspensivo automático e, por outro, os prejuízos a causar pela retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória.
7. Com base nestas premissas o Juiz decidirá levantar o efeito suspensivo da interposição da ação se concluir que os prejuízos que resultarão da manutenção do efeito suspensivo se mostraram claramente superiores aos prejuízos que possam resultar da retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós adjudicatória.
8. O Tribunal deve analisar todos os factos que lhe são submetidos e fazendo uso de todos os meios de prova admitidos, ponderar os prejuízos que a manutenção do efeito suspensivo impõe ao interesse público, e não o fez quando faz “tábua rasa” do documento junto ao requerimento e prescinde da inquirição da testemunha arrolada.
9. Este é o critério que o Tribunal deverá ter em consideração para a decisão a proferir no âmbito do regime do contencioso pré contratual, nos termos do artigo 120º, n.º 2 do CPTA, por remissão do artigo 103-A, n.º 3 do mesmo diploma, o que na presente ação, e com o devido respeito, não foi adotado.
10. Na sentença que ora se recorre o Tribunal a quo identifica os factos que considerou relevantes para a decisão da causa. E não se pronunciou sobre os factos que considerou como não provados, como obriga o art 607º do CPC, e, embora diga que o Recorrente não apresenta prova bastante da existência de prejuízo para o interesse público., a verdade é que, o Tribunal a quo considerou apenas como prova os documentos constantes do processo administrativo (PA) que foi anexo, não fazendo qualquer referência ao documento junto pelo ora Recorrente, cuja análise e ponderação deveria ter sido feita pelo Tribunal e não foi!
11. Com efeito, se o Tribunal a quo tivesse, como é sua obrigação, analisado o documento supra referido, tinha necessariamente concluído que a inquirição da testemunha arrolada era imprescindível, na medida em que iria dar corpo explicativo ao exposto no documento, e com toda a certeza a ilação do Tribunal teria sido outra que não a constate da sentença que se recorre.
12. Entendeu o Tribunal a quo a alegação do Réu, Município de Lisboa, (…)”se mostra amplamente genérica e conclusiva, a qual gravita maioritariamente em torno do próprio objeto contratual, para concluir que os mesmos são essenciais e que a sua interrupção comportará a paralisação da sua atividade.”
13. Que”(…) a linha argumentativa da Entidade Demandada, para além de lacónica, é manifestamente insuficientes para que este Tribunal conclua, sequer, pela ocorrência de um prejuízo sério e grave. Um incómodo sim, mas não um efetivo prejuízo. “ e “(…) não vêm alegados ou evidenciados quaisquer factos, que demonstrem a possibilidade de, com a suspensão dos efeitos do ato de adjudicação, se vir a verificar um grave prejuízo para o interesse público, em concreto, o prosseguido pelo Município de Lisboa; ou factos que permitam concluir que a atividade dos serviços elencados [ver Item 7.º do requerimento] fique irremediavelmente comprometida. “
14. O Recorrente discorda da posição do Douto Tribunal, e com o devido respeito, a Mmª Juíza do Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e aplicação do direito aos factos articulados e provados nos autos, incorrendo, a mesma em erro de julgamento, sendo por isso merecedor de censura e consequente revogação.
15. Ao contrário do referido pelo Tribunal o juízo de gravidade ou de proporcionalidade não tem de ser de certeza ou de probabilidade quase a tocar a certeza, o que o legislador exige ao requerente do levantamento do efeito suspensivo automático nos termos do n.º 2º, do artigo 103-A do CPTA, é que prove que “… o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para os interesses envolvidos …”. o que é a posição do Supremo Tribunal Administrativo, vide acórdão proferido no Recurso de Revista nº 62/18 - processo nº 1904/16.4BELSB – A, TCA Sul.
16. Com efeito, não há dúvida que o Réu cumpriu com esta exigência, ou seja, provou que a manutenção da suspensão do ato impugnado é gravemente prejudicial para o interesse público, na medida em que os serviços que se pretendem contratar e cujo ato de adjudicação está suspenso visa garantir a continuidade do fornecimento de bens e serviços essenciais ao funcionamento do Município de Lisboa - serviços, de que são exemplo a Cloud Email (Serviço de correio eletrónico), o Office, o OneDrive (Cloud Storage – Armazenamento na “nuvem”) e a Sharepoint CML (Cloud Storage e sites), essenciais para atividades desenvolvidas no posto de trabalho, em teletrabalho, e de ligação de equipas internas e destas com elementos externos - evitando a paralisação do normal funcionamento do Município, que será e trará um dano grave para o interesse público
17. Os factos alegados pelo Município de Lisboa são claramente demonstrativos de que a paralisação do contrato implica por si só o risco de paralisação de todos os seus serviços. sendo afetado o funcionamento da Assembleia Municipal, é afetado o funcionamento da Presidência da Câmara Municipal, os Vereadores, os Gabinetes que lhe estão associados, as Direções Municipais, os Departamentos e as Divisões, todos os serviços de atendimento ao munícipe.
18. Não se entende como é que o Tribunal pode concluir pela falta de alegação de factos que demonstrem a gravidade dos danos e grave prejuízo para o interesse público, com efeito, o interesse público específico, qualificado e concreto que importa salvaguardar no caso concreto dos autos, é garantir (dada a forma como as entidades, e a prestação do trabalho, se encontram atualmente organizadas) a prossecução das atribuições municipais e o exercício das competências dos respetivos órgãos, previstas na Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, e, assim, a prossecução do(s) interesse(s) público(s) nos domínios envolvido(s) ou afetado(s) pela falta de licenciamento.
19. A necessidade de garantir de imediato a “Aquisição de licenciamento de software e serviços conexos na modalidade de aluguer operacional”, que visa assegurar a continuidade, necessária e imprescindível, do licenciamento de software Microsoft em regime de aluguer, estando, assim, salvaguardada a contratação necessária para não existir interrupção desses serviços.
20. Sem prejuízo de tudo o que foi alegado, e cuja ilação facilmente se extrai atenta a notoriedade dos factos que são de conhecimento geral, o Tribunal a quo indefere o levantamento do efeito suspensivo automático requerido porque “(…) a situação factual trazida a estes autos não evidencia a produção de danos gravemente prejudiciais para o interesse público prosseguido pela Entidade Demandada, com a manutenção do efeito suspensivo automático.“
21. Andou mal o Tribunal a quo ao decidir que os prejuízos invocados pelo Município de Lisboa são meras possibilidades abstratas e que não está demonstrada a gravidade, em concreto, a exata magnitude dos prejuízos invocados, são, segundo a posição defendida pelo Tribunal, uma mera tese.
22. De referir que demonstrar, como parece ser a exigência do Tribunal para que este tivesse deferido o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático no presente incidente, em concreto, a gravidade e a exata magnitude dos prejuízos invocados imputaria ao Réu uma muito difícil ou inultrapassável tarefa, consubstanciadora de uma probatio diabolica.
23. O Tribunal absteve-se, contrariamente ao que se lhe impunha, da tarefa de analisar as provas interpretativamente, o julgador não pode nem deve ater-se secamente à simples consideração dos factos literal e expressamente provados e das alegações das partes, podendo e devendo sobre eles operar uma interpretação crítica e dinâmica, por força das regras da experiência comum e dos ensinamentos da lógica, o julgador pode inferir de um conjunto de factos a verificação ou ocorrência de outros factos.
24. Estamos na figura da prova por presunções judiciais, prevista nos artigos 349º a 351º do Código Civil (CC) que são meios de prova que, com base em juízos de probabilidade, de regras da experiência e dos princípios da lógica, permite que o julgador tire ilações de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.
25. Não atender aos factos provados e à argumentação alegada pelo Município de Lisboa, nomeadamente, recorrendo à prova por presunção judicial, é manifestamente desproporcional e injustificável, para mais quando o Município de Lisboa indicou prova testemunhal com conhecimento dos factos em questão, que poderiam ajudar a demonstrar e explicar a realidade dos factos e que o Tribunal prescindiu de ouvir.
26. Com efeito tem que se concluir que “o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público”, afigurando-se os danos decorrentes da manutenção do efeito suspensivo da ação muitíssimo superiores aos que podem resultar do seu levantamento, como também refere o Supremo Tribunal Administrativo, o qual, num caso com inegáveis paralelismos com o dos autos, em que estava em causa a “Aquisição de sistema de comunicações de voz fixa e móvel Internet e televisão”, entendeu em suma que “No caso, no presente incidente o Tribunal Constitucional invocou factos demonstrativos de grave dano para o interesse público com a suspensão automática do ato impugnado, quais sejam a paralisação do normal funcionamento deste órgão de soberania, por falta do regular funcionamento dos diversos meios de comunicação que o contrato aqui em causa visa assegurar. (…)”(cf. acórdão de 04.04.2019, processo n.º 0198/19.4BELSB).”
27. Por fim, o Tribunal alude que o Réu dispõe de soluções alternativas para assegurar a continuidade do serviço uma vez que pode recorrer ao ajuste direto para celebração de qualquer espécie de contrato.
28. É certo que o Recorrente pode recorrer ao “critério da urgência imperiosa” previsto no artigo 24º, n.º 1, alínea c) do CCP, critério este que resulta do elevado interesse público envolvido, contudo, o Tribunal ao defender esta solução está ele próprio a reconhecer que a manutenção do efeito suspensivo automático é gravemente prejudicial para elevado interesse público sustentado pelo Réu nos presentes autos, pois só este prejuízo poderia preencher o “critério da urgência imperiosa”, entendimento que é o do Supremo Tribunal Administrativo, vide acórdão proferido no Recurso de Revista nº 62/18 - processo nº 1904/16.4BELSB – A, TCA Sul.
Nestes termos e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado integralmente procedente, sendo revogada a douta decisão proferida, em 20 de abril de 2017, e proferida nova decisão que julgue procedente, por provado, o pedido de levantamento do efeito suspensivo requerido pelo Réu Município de Lisboa, nos termos supra expostos, tudo com todas as legais consequências.”

A V...... – C....., SA, veio a apresentar as suas Contra-alegações, nas quais concluiu:
“I. A decisão recorrida não merece qualquer censura, antes segue e respeita o entendimento propugnado na Jurisprudência comunitária e nacional, mormente a deste Tribunal Central Administrativo Sul que bastamente se citou.
II. Parado o ato de adjudicação e, em consequência, o contrato, ninguém terá de ser indemnizado, o que é de manifesto benefício para o Município de Lisboa e o seu erário, e para todos os Cidadãos que dele beneficiam.
III. Dado que este processo é de natureza urgente, certamente se obterá uma decisão num curto espaço de tempo, pelo que não se afigura desmedido ou desproporcionado esperar pela decisão a tomar pelo Ilustre Tribunal, período em que não haveria qualquer alteração na prestação do serviço.
IV. Sendo exigido pelo legislador que se demonstre um grave prejuízo para o interesse público e uma clara desproporção das consequências lesivas entre os interesses envolvidos para que o efeito regra da suspensão seja levantado, o pedido formulado pelo Município de Lisboa nunca poderia proceder, dado que não só nada demonstrou – e mesmo as meras alegações resultam contraditórias entre si e com a própria realidade -, como os factos em presença levam a conclusão contrária à alegada e ainda que é mais benéfico que se mantenha o status quo até que o Ilustre Tribunal venha a decidir a ação:
“Em suma, a alternatividade de critérios que deflui da redação literal adotada para o n.º 4 do artigo 103.º-A é adaptada, embora não totalmente eliminada, no âmbito de uma interpretação em conformidade com o Direito Europeu:
i) No caso de a entidade adjudicante cumprir o ónus de alegação e de prova de que o diferimento da execução do ato objeto de suspensão seria gravemente prejudicial para o interesse público, o levantamento será decretado logo que se confirme a sua superioridade (sem que se necessite que tal superioridade seja manifesta) em face de quaisquer outros interesses favoráveis à manutenção do efeito suspensivo;
ii) Se tal não suceder (isto é, no caso de falta de gravidade dos prejuízos provocados para o interesse público), o levantamento só poderá ter lugar se a suspensão gerar consequências lesivas claramente desproporcionadas para os interesses envolvidos.” 11
V. O documento que o Município de Lisboa diz ter sido desatendido pelo Tribunal não prova nada, pelo menos nada prova quanto aos prejuízos que o Município alega sofrer com a suspensão dos efeitos do ato de adjudicação.
VI. A testemunha arrolada, qualquer que ela fosse, nada viria provar, pois que o Município de Lisboa nada alegou em concreto no sentido de que sem o contrato com a NOS ficava sem alternativa.
VII. Dado que a realidade dos factos é a de que o Município de Lisboa terá encontrado uma alternativa – a qual não revelou propositadamente -, e que nestes quase 9 meses nada aconteceu, fica desmentido quanto alegado pela Recorrente.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Excelências, Senhores Juízes Desembargadores, doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se e confirmando-se a sentença recorrida, que nega o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático formulado pelo Município de Lisboa, por não provados os legalmente exigidos pressupostos, mantendo-se o ato de adjudicação suspenso, nos termos do art.º 103.º-A, do CPTA, com as demais consequências legais.”
Já neste Tribunal, foi o Ministério Público notificado em 14 de outubro de 2022, tendo emitido Parecer no mesmo dia, no qual, a final, se pronunciou no sentido da improcedência do Recurso.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente/Município, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, predominantemente, que mal andou o Tribunal a quo ao decidir que os prejuízos invocados pelo Município de Lisboa são meras possibilidades abstratas e que não está demonstrada a gravidade, em concreto, a exata magnitude dos prejuízos invocados, são, segundo a posição defendida pelo Tribunal, uma mera tese.”
III – Dos Factos
Foi em 1ª instância, na decisão aqui Recorrida, fixada a seguinte factualidade provada:
“A) A 13 de Abril de 2021 foi emitida a informação n.º INF/24/DASIC/DSI/CML/21, da qual se extrai o seguinte:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(…)
- cfr. fls. 3 a 6 do processo instrutor, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
B) A 1 de Junho de 2021 foi elaborada a informação n.º INF/69/DSI/CML/21, da qual se extrai o seguinte:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(…)”
- cfr. fls. 22 a 36 do processo instrutor, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
C) Foi aprovado o programa do procedimento do qual se extrai o seguinte:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(…)”
- cfr. fls. 45 a 67 do processo instrutor, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
D) Autora e Contrainteressada apresentaram proposta ao concurso público internacional n.º 13/CPI/DA/DCP/2021 – aquisição, por lotes, de licenciamento de software e serviços conexos – facto não controvertido;
E) A 28 de Dezembro de 2021 foram as partes notificadas da decisão de adjudicação da proposta apresentada pela Autora ao lote 1, assim como, foi esta notificada para a apresentação dos documentos de habilitação – cfr. documento 2 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
F) Por ofício com a referência OF/12/DSI/CML/22, de 10/02/2022, a Autora foi notificada da intenção do Município de Lisboa de vir a declarar a caducidade da adjudicação – cfr. documento 10 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
G) Por ofício com referência OF/43/DSI/CML/22, de 29/04/2022, foi a Autora notificada da decisão tomada pelo Município de Lisboa de declarar a caducidade da adjudicação da proposta apresentada pela Autora e autorizar a adjudicação da proposta apresentada pelo 2.º classificado, a Contrainteressada – cfr. documento 12 da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido”.
IV – Do Direito
No que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª instância:
“(...) Peticiona a Autora nos presentes autos a anulação da decisão que determina a caducidade de adjudicação da proposta por si apresentada ao lote 1 do concurso público internacional n.º 13/CPI/DA/DCP/2021 – aquisição, por lotes, de licenciamento de software e serviços conexos e, bem assim, a anulação da decisão de adjudicação da proposta da Contrainteressada, graduada em segundo lugar, a esse mesmo lote.
(…)
Do cotejo das disposições legais supra referidas constata-se que, o deferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático assenta, portanto, na ponderação de todos os interesses em presença, ou seja, os interesses da Entidade Demandada, da Autora, e da Contrainteressada e, até, de terceiros que possam de alguma forma ser prejudicados pela manutenção ou pelo levantamento do efeito suspensivo. Exige-se, portanto, um juízo de prognose relativamente ao tempo previsível da duração da ação de contencioso pré-contratual, procurando-se a avaliação e ponderação dos danos ou prejuízos reais que advierem da manutenção do efeito suspensivo ou do seu levantamento e, nessa medida sopesar tais danos e prejuízos.
Nesse sentido veja-se o Acórdão do TCAN de 13/01/2017, p. 01223/16.6BEPRT-A, segundo o qual “só depois de o Tribunal concluir pela gravidade dos prejuízos invocados e/ou pela patente desproporcionalidade da lesão de outros interesses é que procederá, então, à ponderação entre esses prejuízos qualificados resultantes da manutenção do efeito suspensivo e os danos que podem resultar do seu levantamento.”
(…)
Em concreto quanto à natureza dos danos e prejuízos provocados pelo diferimento da execução contratual, decorrente do efeito suspensivo, tem sido entendimento unânime da jurisprudência dos tribunais superiores, o de que nem todo e qualquer dano ou prejuízo é relevante neste juízo que o Tribunal é chamado a fazer. Com efeito, a menos que se trate de um dano ou prejuízo de tal modo grave ou prejudicial – o designado dano ou prejuízo qualificado – o Tribunal nem sequer chega a fazer aquele juízo ponderativo.
A este propósito, o Tribunal Central Administrativo Sul de 24/11/2016, p. 13747/16 refere o seguinte: “Para efeitos de verificação do primeiro daqueles requisitos não basta a existência de mera prejudicialidade para o interesse público, nem a existência de apenas consequências lesivas desproporcionadas, na medida em que o legislador terá, ele mesmo, necessariamente ponderado a possibilidade da existência de um prejuízo desse tido (não qualificado) e não o afastou do alcance do efeito suspensivo.”. Entendimento reiterado em Acórdão de 10-12-2019, p. 854/19.7BELSB-S1.
Nesse mesmo sentido, o Supremo Tribunal Administrativo em Acórdão de 7/11/2.19, p. 0601/18.0BELRA-S1, esclarece que “O levantamento pelo tribunal, nos termos do artigo 103.º-A do CPTA, do efeito suspensivo automático só pode ser concedido se, no caso, o diferimento da execução do ato se mostre como «gravemente prejudicial para o interesse público» ou que seja «gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos», exigência que implica que não é suficiente a invocação abstrata pelos requerentes do incidente de prejuízos genéricos, ou que sejam os que decorrem em termos normais da suspensão do ato de adjudicação e do atraso na celebração do contrato ou na sua execução.”
(…)
Sobre o critério da decisão judicial em sede deste incidente de levantamento do efeito suspensivo, a doutrina não tem deixado de apontar algumas dúvidas, designadamente sobre as orientações que constam do anterior n.º 2, atual n.º 4, com algumas alterações.
(…)
Neste mesmo sentido, e já à luz da nova redação conferida ao Artigo 103.ºA, em Acórdão de 8 de Abril de 2021, p. 1946/20.5BELSB-S1, o qual confirmou decisão incidental proferida pela signatária em incidente como o dos presentes autos, o TCAS esclarece que, “(…) Como decorre do disposto do n.º 4 do artigo 103.º-A do CPTA, o efeito suspensivo é levantado quando, ponderados todos os interesses suscetíveis de serem lesados, o diferimento da execução do ato seja gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, o que in casu a matéria de facto assente não permite sustentar.
Desde que verificadas as condições previstas no artigo 103.º-A, n.º 1 do CPTA, o legislador erigiu o efeito suspensivo automático como efeito jurídico regra, dependendo o deferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático da verificação de pressupostos exigentes, a saber:
(i) o grave prejuízo para o interesse público ou
(ii) existir uma clara desproporção das consequências lesivas para outros interesses envolvidos, ou seja, a desproporcionalidade entre os interesses em presença. (…)”
Sendo que, do seu sumário resulta que, “I. O interesse público colocado na satisfação do contrato, ainda que relevante, não constitui um critério determinante para, só por si, alicerçar a decisão de levantamento do efeito suspensivo automático.”
Ora, entende este Tribunal, no seguimento da jurisprudência e doutrina que antecedem, que a norma ínsita no n.º 4 do Artigo 103.º-A do CPTA, aponta no sentido de uma intenção legislativa inequívoca: o levantamento do efeito suspensivo vai depender da demonstração – alegação e prova – de que o “os prejuízos que resultariam da sua manutenção se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento.”. No entanto, tal como aponta a jurisprudência e a doutrina, como primeiro pressuposto, sem o qual não se passará ao passo seguinte [isto é, ao juízo de ponderação de interesses], terá de estar em causa uma situação de grave prejuízo (para o interesse público) ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas (relativamente a outros interesses envolvidos).
Com efeito, a leitura do n.º 4 não poderá então fazer-se sem levar em linha de conta a qualificação dos danos elegíveis e relevantes para esta ponderação, sendo estes que se vão sujeitar ao juízo de ponderação que aí se consagra. Na verdade, é essa a ratio, que é de excecionalidade, que se retira da Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Dezembro de 2007, onde nos seus considerandos 22 e 24 se explanou que: “No entanto, para assegurar a proporcionalidade das sanções aplicadas, os Estados-Membros podem permitir que a instância responsável pela decisão do recurso não ponha em causa o contrato ou lhe reconheça determinados efeitos, ou todos eles, caso as circunstâncias excecionais do caso em apreço exijam o respeito de certas razões imperiosas de interesse geral. Nesses casos deverão, em vez disso, ser aplicadas sanções alternativas. A instância de recurso independente da entidade adjudicante deverá analisar todos os aspetos relevantes a fim de estabelecer se existem razões imperiosas de interesse geral que exijam a manutenção dos efeitos do contrato”.
O interesse económico na manutenção dos efeitos do contrato só pode ser considerado razão imperiosa se, em circunstâncias excecionais, a privação de efeitos acarretar consequências desproporcionadas. No entanto, não deverá constituir razão imperiosa o interesse económico diretamente relacionado com o contrato em causa. “
É, pois, esse o regime que resulta da leitura do n.º 4 do Artigo 103.º-A do CPTA e que determina que o juízo de ponderação a efetuar e que envolve os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade, incida sobre os danos suscetíveis de serem caracterizados de “danos qualificados” ou “prejuízo qualificado”. Não basta, portanto, a existência de mera prejudicialidade para o interesse público, nem a existência de apenas consequências lesivas desproporcionadas. Isto sob pena de se afastar da previsão da lei elementos normativos, que exigem uma especial modalidade aplicativa [de particular gravidade ou de clara desproporcionalidade, que firam os que o legislador quis acautelar.
De notar também que, ainda que se admita que o risco de produção de dano ou prejuízo qualificado, não tenha a si acoplada uma certeza absoluta quanto à sua inevitável verificação, a verdade é que terá de ser uma probabilidade séria e realista – cfr. Acórdão do TCAN de 12/07/2019, p. 02842/18.1BEPRT-S1
Acontece que, a alegação da Entidade Demandada se mostra amplamente genérica e conclusiva, a qual gravita maioritariamente em torno do próprio objeto contratual, para concluir que os mesmos são essenciais e que a sua interrupção comportará a paralisação da sua atividade.
No entanto, a linha argumentativa da Entidade Demandada, para além de lacónica, é manifestamente insuficientes para que este Tribunal conclua, sequer, pela ocorrência de um prejuízo sério e grave. Um incómodo sim, mas não um efetivo prejuízo.
Com efeito, não vêm alegados ou evidenciados quaisquer factos, que demonstrem a possibilidade de, com a suspensão dos efeitos do ato de adjudicação, se vir a verificar um grave prejuízo para o interesse público, em concreto, o prosseguido pelo Município de Lisboa; ou factos que permitam concluir que a atividade dos serviços elencados [ver Item 7.º do requerimento] fique irremediavelmente comprometida.
Na verdade, os argumentos da Entidade Demandada são uma conclusão que não foi precedida de factos [eventos da vida real] que permitam alcançá-la. Deixando este Tribunal na situação de quase ter de adivinhar quais são os factos essenciais ao pedido formulado e que permitem concluir pela paragem dos serviços e, por conseguinte, pela ocorrência de um grave prejuízo para o interesse público.
Note-se que, não se coloca em causa, nem tal vem questionado pela Autora [muito pelo contrário], que os serviços contratados são relevantes e necessários à boa prossecução dos fins da Entidade Demandada. É, aliás, de conhecimento público que, os serviços desta natureza [de cariz informático] são uma ferramenta importante e relevante da prossecução de várias atividades, sendo um complemento importante às demais ferramentas utilizadas pelas entidades públicas na sua atividade.
No entanto, a sua ausência, por norma, não impede que tais entidades prossigam com os fins para que foram criadas, ou que fiquem altamente comprometidas na sua execução.
Só em casos excecionais é que tal sucede. E só nesses casos é que se poderá ponderar o levantamento do efeito suspensivo automático; isto porque, sem esses serviços seria uma certeza, [ou no mínimo uma probabilidade séria] a de que a entidade pública em causa ficaria impossibilitada de prosseguir os fins para o que foi criada, resultando daí a conclusão de que, ocorreria um grave prejuízo para o interesse público.
No entanto, teriam de ser alegados [e provados] factos que demonstrassem que o Município de Lisboa iria deixar de desenvolver a sua atividade [ou de que esta fosse ficar altamente comprometida] – v.g. factos que indiciassem, no mínimo, que os serviços em causa iriam estar encerrados, que determinados procedimentos administrativos iriam deixar de tramitar, que a capacidade de resposta aos munícipes iria ser praticamente nula, entre outros.
(…)
Com efeito, as alegações aduzidas no requerimento relativo ao incidente passam pela mera descrição dos serviços que integram o contrato, por generalidades relativas à execução da sua atividade na era digital, e por conclusões e ilações repetitivas [de que os serviços poderão ficar paralisados, de que a sua atividade ficará irremediavelmente comprometida].
(…)
A propósito deste tipo de alegação, o Tribunal Central Administrativo Sul, em Acórdão que confirmou uma decisão da signatária em situação com alegações idênticas, esclareceu que, “(…) a mera enunciação exemplificativa de serviços que potencialmente poderão ficar afetados pela ausência da segurança concursada, não permite evidenciar a necessidade de recurso a uma situação de excecionalidade para contornar a situação descrita, pois que nem sequer se enunciam os prejuízos concretos de natureza insanável gerados pela manutenção do efeito suspensivo do ato.
Admite-se, ainda assim, a eventual verificação de eventuais perturbações funcionais as quais, ainda assim, não se mostram justificativas e suficientes para o recurso a uma situação excecional.”
Sendo que, em Acórdão de 9/10/2020, p. 2476/19.3BELSB-S1, o mesmo Tribunal esclareceu que, “É uma evidência que a suspensão de um ato de adjudicação praticado no âmbito de procedimentos de formação de contratos públicos perturbará sempre a prossecução do interesse público, mas o que importa é aquilatar em que medida tal perturbação ocorre, a fim de saber se é de afastar o regime regra da suspensão automática dos efeitos da adjudicação, a levantar excecionalmente perante a verificação dos apontados requisitos.
Tratando-se, como se trata, de uma prestação de serviços continuada, que não se quer ver interrompida, a perturbação é clara.
Contudo, como se observou em aresto deste Tribunal datado de 09/05/2019 (proc. n.º 601/18.0BELRA-S1), “a mera circunstância de se estar frente a uma prestação de serviços que se pretende efetuada de forma tendencialmente permanente e contínua, não é, só por si, uma razão para se concluir pelo preenchimento do conceito de grave prejuízo para o interesse público. Se assim se entendesse estar-se-ia, nas mais das vezes, a permitir o levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação para todos os fornecimentos que se pretendessem feitos de forma permanente e contínua.”
Por outro lado, no caso concreto, a autora dispunha e dispõe de alternativas para continuar a usufruir dos serviços de segurança e vigilância, que efetivamente continuaram a ser prestados.
Sendo certo que a necessidade de recorrer ao procedimento de ajuste direto para tal efeito, ainda que por valores superiores aos decorrentes do ato de adjudicação, claramente não consubstancia a excecionalidade do grave prejuízo para o interesse público, a que alude o citado Considerando 24 da Diretiva 2007/66/CE e o n.º 4 do artigo 103.º-A do CPTA.” – fim de citação.
Certamente que, o diferimento da execução do contrato comportará alguns constrangimentos; mas, desse facto não resulta, por si só, que a qualidade dos serviços prestados pela Entidade Demandada fique altamente comprometida, ou que os mesmos deixem, até, de ser prestados.
(…)
No caso em apreço, não se afigura que se verifiquem tais circunstâncias, desde logo, porque da maior parte da alegação da Entidade apenas resulta uma descrição dos serviços que integram o objeto lote 1, para daí concluir, sem mais, que os mesmos são essenciais e imprescindíveis.
Bisa-se que, o propósito do levantamento do efeito suspensivo automático, não é o de evitar a ocorrência de todo e qualquer dano – em concreto para o interessa público – mas sim um dano que implique a ocorrência de um grave prejuízo para o interesse público.
O que implica dizer que, o dano que se pretende evitar, além de ter de ser inequívoco ou altamente provável, terá de ser um dano tal modo grave e prejudicial, que seria impensável manter a suspensão de efeitos do ato de adjudicação.
O que, manifestamente não é o caso, considerando, desde logo e sobretudo, a alegação da Entidade Demandada.
E nesta medida, a conclusão é a de que falha o requisito da ocorrência de um grave prejuízo para o interessa público, o qual terá de ser, tal como se disse, um prejuízo ou dano qualificado [o que não é o caso]; sendo que, a mera circunstância de se estar perante a prestação de serviços que se pretendem sejam efetuados de forma tendencialmente permanente e contínua, não é, só por si, uma razão para se concluir pelo preenchimento do conceito de grave prejuízo para o interesse público.
Acresce que, a presente ação tramita como um processo urgente, com prazos abreviados, que seguindo o seu rito processual normal, terminará com a decisão de 1.ª instância, ou, eventualmente, após recurso para o TCA. Também, eventualmente, pode ocorrer um recurso de revista para o STA, mas aqui, apenas se verificados os requisitos apertados para esta 3.ª via de recurso. Por conseguinte, atendendo à forma processual utilizada, esta ação terá uma tramitação célere, se as partes para isso também contribuírem.
Por fim, mostra-se relevante referir que, em matéria de prestação de serviços de vigilância, em casos em tudo idênticos ao dos presentes autos, a jurisprudência tem seguido entendimento segundo o qual o efeito suspensivo é de manter, considerando a não excecionalidade dos prejuízos alegados e os quais gravitam em torno da mera interrupção da prestação de serviços desta natureza – cfr., entre outros, Acórdãos do TCAS de 21-03-2019, p. 69/18.1BELSB-S1 e de 10-09-2020, p. 2476/19.3BELSB-S1.
Decorre, assim, de todo o exposto, que a situação factual trazida a estes autos não evidencia a produção de danos gravemente prejudiciais para o interesse público prosseguido pela Entidade Demandada, com a manutenção do efeito suspensivo automático. E assim sendo, ocorrendo a falência dos pressupostos dos quais depende o seu levantamento, este Tribunal só pode concluir pela manutenção do efeito suspensivo automático.”

Vejamos:
Como se sumariou no Acórdão do TCAN nº 240/17.3BEVIS-S1 de 02.03.2018, com idêntico relator:
1 – Dispõe o artigo 103º-A do CPTA, sob a epígrafe “Efeito suspensivo automático”, que “(…) A impugnação de atos de adjudicação no âmbito do contencioso pré-contratual urgente faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado. (…)” [cfr. nº.1].
Em qualquer caso, “(…) a entidade demandada e os contrainteressados podem requerer ao juiz o levantamento do efeito suspensivo, alegando que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, havendo lugar, na decisão, à aplicação do critério previsto no n.º 2 do artigo 120.º (…)” [cfr. nº.2], sendo que “(…) o efeito suspensivo é levantado quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento.”
2 - Não está em causa ponderar valores ou interesses em si, mas danos ou prejuízos, que numa prognose relativa às circunstâncias do caso concreto, possam emergir ou não, do levantamento do efeito suspensivo dos efeitos do ato impugnado.
3 - A ponderação a efetuar deve ser feita entre prejuízos ou danos e não entre os interesses em presença, sendo que a lei não consagra qualquer prevalência do interesse público face aos demais interesses em conflito, tanto mais que não se trata de ponderar o interesse público com o interesse privado, visto o que está em conflito são as consequências que podem resultar da concessão ou da sua recusa para todos os interesses envolvidos, independentemente da sua natureza.
4 – Em concreto, não tendo o Município logrado demonstrar que o adiamento da execução do ato concursado seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, não restará ao Tribunal outra alternativa que não a de conservar eficaz a regra da manutenção do efeito suspensivo automático. (…)”

Importa assim, aferir e ponderar, designadamente, o interesse público entendido como “(...) manifestação direta ou instrumental das necessidades fundamentais de uma comunidade política e cuja realização é atribuída, ainda que não em exclusivo, a entidades públicas.”, [cfr. José Carlos Vieira de Andrade, Dicionário Jurídico da Administração Pública, Vol V, Lisboa/1993, págs. 275/282], fazendo-se um juízo de prognose no tocante às consequências para o interesse público das alternativas em presença.

Diga-se que o novel 103º-A do CPTA, resulta da transposição da Diretiva nº 2007/66/CE, de 11 de dezembro, que veio introduzir alterações à “Diretiva Recursos” (Diretiva nº 89/665/CEE, de 21 de dezembro), visando “(…) melhorar a eficácia do recurso em matéria de adjudicação de contratos públicos, atento às deficiências que estas apresentavam, onde «figura, em especial, a inexistência de um prazo que permita interpor um recurso eficaz entre o momento da decisão de adjudicação e o de celebração do contrato em causa», o que «conduz a que as entidades adjudicantes, que pretendam tornar irreversíveis as consequências da decisão de adjudicação contestada, procedam rapidamente à assinatura do contrato(nº 4 da aludida Diretiva).

A intenção da referida Diretiva foi, assim, e designadamente, a de evitar a constituição de situações de facto consumado na pendência dos processos judiciais resultante de uma “corrida à assinatura dos contratos” (Acórdão do TCA Sul de 28/10/2010, proc. 06616/10).

Neste mesmo sentido, refere Carlos Cadilha que a “Diretiva 2007/66/CE teve por principal finalidade corrigir ou atenuar a situação (…) de défice de tutela jurisdicional dos participantes em procedimentos de contratação pública, em particular no que respeita à possibilidade de impugnação, em momento útil, do ato decisivo deste tipo de procedimentos (o ato de adjudicação).
Tal défice resultava de algumas deficiências que atingiam, em termos de configuração e eficácia, os sistemas de contencioso em matéria de contratação pública que vigoravam nos vários Estados-membros no início do processo de revisão da Diretiva “Recursos”. (…) A prática demonstrava que a «anulação de contratos públicos na sequência da anulação de atos pré-contratuais da entidade adjudicante era uma situação claramente excecional». A celebração e início de execução do contrato tendia a tornar material ou juridicamente irreversíveis as infrações ao direito da contratação pública - pelo menos no plano da reparação natural, por via da reconstituição da situação jurídico-procedimental existente antes de tais infrações” (Contencioso pré-contratual, in “Julgar”, 2014, pág. 208).

A regra consagrada no CPTA, após a revisão de 2015, é, pois, a de que a impugnação de ato de adjudicação faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado, reservando ao tribunal a faculdade de verificar o preenchimento dos pressupostos para a manutenção dessa suspensão.

Com efeito, assim não será, pois “Durante a pendência da ação, a entidade demandada e os contrainteressados podem requerer ao juiz o levantamento do efeito suspensivo previsto no número anterior (…)” (artigo 103º-A, nº 2, do CPTA).

À luz do mencionado artigo 103º-A do CPTA, a regra geral é a da proibição de execução do ato, podendo tal efeito suspensivo automático ser afastado se se demonstrar que tal é gravemente prejudicial para o interesse público ou que os danos que resultariam da sua suspensão seriam claramente superiores àqueles que resultariam do seu levantamento.

Como se sumariou no Acórdão de 23/09/2016, no proc. 00166/16.8BEPRT-A, aqui aplicado mutatis mutandis, “Tendo presente que, nos termos do artigo 103º-A do CPTA, o efeito suspensivo automático só pode ser afastado se se demonstrar que tal é gravemente prejudicial para o interesse público ou que os danos que resultariam da sua suspensão seriam claramente superiores àqueles que resultariam do seu levantamento, a circunstância de não resultar provado nenhum dano decorrente da manutenção desse efeito suspensivo é suficiente para, sem necessidade de mais ponderação, se indeferir o pedido apresentado pela Recorrente.”
Desde logo, há um conjunto de situações que não podem deixar de ser evidenciadas, qual sejam, estarmos em presença de um Processo Pré-contratual, por natureza, urgente.

Em conformidade com o descrito, é manifesto que a argumentação aduzida pelo Recorrente se mostra predominantemente conclusiva, vaga, genérica, e meramente descritiva dos serviços a prestar.

É incontornável o teor da Diretiva 2007/66/CE, que veio alterar a Diretiva 89/665/CE - Diretiva Recursos – quando no seu artigo 2.º, n.º 3, estabelece que “Caso seja interposto recurso de uma decisão de adjudicação de um contrato para um órgão que decida em primeira instância, independente da entidade adjudicante, os Estados-Membros devem assegurar que a entidade adjudicante não possa celebrar o contrato antes de a instância de recurso ter tomado uma decisão, quer sobre o pedido de medidas provisórias, quer sobre o pedido de recurso. A suspensão não pode cessar antes do termo do prazo suspensivo a que se referem o n.º 2 do artigo 2.º-A e os n.ºs 4 e 5 do artigo 2.º-D.”

Em função do teor da referida Diretiva, e do Artº 103º-A do CPTA que a acolheu, é manifesto que a suspensão do referido automatismo legal, reveste natureza meramente excecional, perante a verificação de situações anómalas e atípicas, o que no caso em concreto se não vislumbra, sob pena de se estar a subverter o referido normativo.

Como se observou em aresto do TCAS de 09/05/2019 (proc. n.º 601/18.0BELRA-S1), “a mera circunstância de se estar frente a uma prestação de serviços que se pretende efetuada de forma tendencialmente permanente e contínua, não é, só por si, uma razão para se concluir pelo preenchimento do conceito de grave prejuízo para o interesse público. Se assim se entendesse estar-se-ia, nas mais das vezes, a permitir o levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação para todos os fornecimentos que se pretendessem feitos de forma permanente e contínua.”

Atenda-se ainda no referido no Acórdão deste TCAS de 5.4.2018, proferido no Procº n.º 1595/17.5BELRA-S1:
“(…) II - Quando o legislador - europeu e nacional – impôs o regime da suspensão automática do ato de adjudicação e reduziu as possibilidades do seu levantamento aos casos excecionais, terá pressuposto que todas as consequências naturais, normais, coevas, ou imediatamente decorrentes da não execução imediata do contrato seriam prejuízos que se assumiam como necessários e que se tinham como não tão relevantes quanto os interesses que se queriam proteger por via da aplicação do referido instituto da suspensão automática do ato de adjudicação;
III - Para que se possa afastar o indicado regime é necessário, primeiro, que a Entidade Demandada ou os contrainteressados venham alegar e provar a existência de tais efeitos extraordinários – gravemente prejudiciais ou de lesividade claramente desproporcional – e, depois, terão os mesmos que alegar e provar que os danos que para si resultam da manutenção do efeito suspensivo do ato de adjudicação são superiores aos que podem resultar para o Autora da ação com a não suspensão desse ato.”

Alude-se, ainda, ao Acórdão deste TCAS de 24-05-2018, proferido no Proc. n.º 78/17.8BEPDL-A, no qual se referiu que “Deste normativo legal resulta que o levantamento do efeito suspensivo automático depende da verificação dos seguintes requisitos:
a) Alegação e prova de grave prejuízo para o interesse público ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos.
b) Ponderação de todos os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade.
Quanto ao requisito ora enunciado sob a alínea a), cumpre esclarecer que, face ao estatuído no art.º 103º-A n.º 2, acima transcrito, conjugado com o art.º 342º n.º 1, do Cód. Civil, recai sobre a Entidade Demandada e os contrainteressados o ónus de alegar e provar que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos.”

Também no acórdão deste TCAS nº 953/21.5BELSB-S1, de 02-12-2021, se sumariou que “É a entidade demandada (e/ou os contrainteressados) que tem o ónus de alegar e de provar os factos que traduzam uma situação de grave prejuízo para o interesse público ou consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, com vista ao levantamento do efeito suspensivo automático que decorre do art.º 103ºA do CPTA.”

Para terminar a resenha jurisprudencial relativamente à controvertida matéria, alude-se ainda ao Acórdão do STA de 7-11-2019, proferido no Proc. n.º 0601/18.0BELRA-S1, onde se sumariou, o seguinte:
“I - O levantamento pelo tribunal, nos termos do artigo 103.º-A do CPTA, do efeito suspensivo automático só pode ser concedido se, no caso, o diferimento da execução do ato se mostre como «gravemente prejudicial para o interesse público» ou que seja «gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos», exigência que implica que não é suficiente a invocação abstrata pelos requerentes do incidente de prejuízos genéricos, ou que sejam os que decorrem em termos normais da suspensão do ato de adjudicação e do atraso na celebração do contrato ou na sua execução.
II - O deferimento pelo tribunal de tal pedido de levantamento só deve ocorrer quando, na comparação do peso relativo dos interesses em presença, conclua que os danos dele decorrentes para o interesse público ou para os interesses dos contrainteressados seriam consideravelmente superiores àqueles que podem advir para o impugnante da celebração e execução do contrato”

Vejamos em concreto:
Entende o Recorrente na defesa do deferimento do requerido efeito suspensivo:
a) Que a manutenção do efeito suspensivo automático por força do disposto no artº 103-A, nº 1, do CPTA, lesa gravemente o interesse público;
b) Que o Tribunal a quo ao não ter seguido um método de decisão que passasse “pela ponderação racional e expressa, num juízo de prognose, de todos os interesses em presença e de todos os danos respetivos”, não analisou “todos os factos que lhe são submetidos e fazendo uso de todos os meios de prova admitidos”;
c) Que o Tribunal terá errado ao ter concluído que “a linha argumentativa da Entidade Demandada, para além de lacónica, é manifestamente insuficiente para que este Tribunal conclua, sequer, pela ocorrência de um prejuízo sério e grave”;

Entende, assim, o Recorrente que se verificam os pressupostos para que, nos termos do art.º 103.º-A, n.ºs 2 e 4, do CPTA, seja levantado o efeito suspensivo automático estabelecido no n.º 1 desta norma.

Objetivamente, e como referido pelo Tribunal a quo, “não tendo o Município logrado demonstrar que o adiamento da execução do ato concursado seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, não restará ao Tribunal outra alternativa que não a de conservar eficaz a regra da manutenção do efeito suspensivo automático. (…)”

Mais refere o Tribunal a quo, o que aqui se ratifica, que, à luz do n.º 4 do artigo 103.º-A do CPTA, “o efeito suspensivo é levantado quando, devidamente ponderados todos os interesses públicos e privados em presença, os prejuízos que resultariam da sua manutenção se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento”.

O novel 103º-A do CPTA, resulta da transposição da Diretiva nº 2007/66/CE, de 11 de dezembro, que veio introduzir alterações à “Diretiva Recursos” (Diretiva nº 89/665/CEE, de 21 de dezembro), visando “(…) melhorar a eficácia do recurso em matéria de adjudicação de contratos públicos, atento às deficiências que estas apresentavam, onde «figura, em especial, a inexistência de um prazo que permita interpor um recurso eficaz entre o momento da decisão de adjudicação e o de celebração do contrato em causa», o que «conduz a que as entidades adjudicantes, que pretendam tornar irreversíveis as consequências da decisão de adjudicação contestada, procedam rapidamente à assinatura do contrato” (nº 4 da aludida Diretiva).

A correspondente regra consagrada no CPTA, após a revisão de 2015, é, pois, a de que a impugnação de ato de adjudicação faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado, reservando ao tribunal a faculdade de verificar o preenchimento dos pressupostos para a manutenção dessa suspensão.

Do já referido resulta que, para que pudesse haver lugar ao levantamento do efeito suspensivo, seria suposto que o Município de Lisboa tivesse comprovado que a manutenção do efeito suspensivo lhe causava um prejuízo grave; e um prejuízo superior aos prejuízos que resultam para a Autora, o que ficou por demonstrar.

Efetivamente, não resultou demonstrado que a suspensão do ato de adjudicação objeto de impugnação na Ação Principal determine necessariamente, e de imediato, graves prejuízos para o Município de Lisboa e o interesse público que este tem por missão promover e proteger, sem prejuízo de se admitir a verificação de alguns constrangimentos funcionais, o que não tem impedido que os serviços se mantenham operacionais.

Como se sumariou no Acórdão deste TCAS, de 30.04.2020, proferido no Procº nº 02801/19, “A decisão sobre o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático depende dos concretos interesses que as partes aleguem e demonstrem que possam ser lesados, por forma a possibilitarem uma aferição acerca da sua relevância através da ponderação jurisdicional dos mesmos.
Se o réu, enquanto entidade adjudicante, requereu o levantamento do efeito suspensivo do contrato, sem que alegasse a verificação de circunstâncias integradoras dos pressupostos de que depende o levantamento do efeito suspensivo automático da impugnação do ato de adjudicação, e não se constatando que elas se verifiquem, deve ser recusada essa pretensão.”

É incontornável que, de acordo com as regras do ónus da prova aplicáveis a este incidente, cabia ao Município de Lisboa demonstrar os factos que apenas alega conclusiva, vaga e hipoteticamente.

Com efeito, o Município limita-se a enunciar os serviços que carecerão do software em questão, o que não se questionando, não resulta que se consubstancie numa situação de urgência insustentável, o que não poderia ser contrariado pela mera inquirição de testemunha, mormente em processo de natureza urgente.

Não pode deixar de se referir que mesmo nas situações em que é necessário manter a satisfação das necessidades públicas através de ajustes diretos, tem sido entendido Jurisprudencialmente, que tal não determina que automaticamente se possa afirmar que se verifica um grave prejuízo para o interesse público.

Neste sentido, ficou sumariado no Acórdão do TCAS de 10.09.2020, proferido no Procº nº 2476/19.3BELSB-S1:
“I. O levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação de contrato público, previsto no artigo 103.º-A, n.ºs 2 a 4, do CPTA, depende (i) da sua manutenção implicar um grave prejuízo para o interesse público ou a produção de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, (ii) e de serem superiores os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo para os interesses da entidade demandada ou dos contrainteressados por contraponto aos que venham a resultar do seu levantamento para o autor da ação de contencioso pré-contratual, segundo um juízo de proporcionalidade.
II. Recai sobre a entidade demandada e a contrainteressada o ónus de alegar e provar a gravidade do prejuízo para o interesse público e a aludida lesão claramente desproporcionada para os demais interesses envolvidos, em conformidade com a regra decorrente do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.
III. Se com a suspensão do ato de adjudicação impugnado é possível a continuação da prestação dos serviços em causa no contrato, no caso de segurança e vigilância, ainda que por valores superiores aos decorrentes daquele ato, tal não consubstancia a excecionalidade do grave prejuízo para o interesse público, a que alude o Considerando 24 da Diretiva 2007/66/CE e o n.º 4 do artigo 103.º-A do CPTA.”

Aqui chegados, importa reconhecer que o suscitado pelo Município ficou por demonstrar, pois que a suspensão do ato de adjudicação objeto de impugnação não colocou em causa a realização de quaisquer atribuições e competências daquele, não tendo implicado qualquer entrave inultrapassável ao seu desempenho funcional.

Em face de tudo quanto supra se expendeu, e sem necessidade de acrescida argumentação, resulta que a decisão recorrida se não mostra censurável, devendo assim, ser confirmada, pois que se não reconhece a verificação de qualquer erro de julgamento que pudesse determinar a sua anulação ou revogação.

V - Decisão
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão proferida em 1ª instância.

Custas pelo Recorrente
Lisboa, 17 de novembro de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa