Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:201/16.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:11/14/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL;
CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL;
PAGAMENTO VOLUNTÁRIO
Sumário:I. A certidão de dívida que servir de base à instauração do processo de execução fiscal só pode ser extraída na sequência da falta de pagamento voluntário (cfr. artigo 88.º, n.ºs 1 e 4, do CPPT).

II. Se o processo de execução fiscal foi instaurado sem que se mostre provada a notificação à Recorrente para proceder ao pagamento voluntário da dívida exequenda, ocorre fundamento próprio para oposição, enquadrável na alínea i) do artigo 204.º do CPPT, derivada da instauração indevida do processo executivo fiscal, com a consequente extinção da execução.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

I.RELATÓRIO

M.........., Lda (doravante Executada, Oponente ou Recorrente) veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a OPOSIÇÃO, por si deduzida, ao processo de execução fiscal (PEF) nº .......... e apensos, instaurado pela Secção de Processos de Execução de Lisboa …, do INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, para cobrança coerciva de cotizações e contribuições, perfazendo o montante de € 2.035.787,68.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«1) Vem o presente recurso interposto da Douta sentença proferida em 18/10/2018 de fls… que determinou a improcedência da oposição à execução apresentada pela ora Recorrente. Não podendo o recorrente concordar com tal sentença, nomeadamente com a declaração de improcedência da oposição à execução apresentada, já que, a seu ver, ela enferma de vários vícios, no que toca à aplicação de facto e de direito.

2) Vem a Recorrente impugnar a decisão proferida pelo tribunal "a quo", no que respeita à matéria facto e de direito e à aplicação da lei processual, designadamente, quando faz errada aplicação do direito violando a lei substantiva e processual.

3) Quanto à impugnação da matéria de facto dada como provada: Cumpre referir que resulta provado na alínea I) e J) da matéria de facto provada que a Recorrente foi notificada do relatório final a que alude a al. H) da matéria de facto provada e que esse ofício foi endereçado aos representantes legais da Recorrente.

4) Ora conforme resulta da documentação junta aos autos, nomeadamente a fls. 390.º e 391.º, tal facto não corresponde à verdade, dado que conforme resulta do documento em causa, a notificação do relatório final foi tão só notificada aos mandatários da aqui Recorrente e não à Recorrente, sendo que, nunca a recorrente foi notificada pelo I.S.S., conforme resulta à saciedade dos autos, do relatório final proferido no âmbito do processo de averiguações. E apesar de ter tido efectivamente conhecimento do mesmo teve-o anos mais tarde.

5) Mais resulta cabalmente provado nos autos que em momento algum foi a Recorrente notificada para pagar voluntariamente a divida e do prazo que dispunha para o fazer assim como não foi igualmente informada dos meios que dispunha para defesa acaso não concordasse com tais liquidações, sendo que não só tais factos foram invocados pelo aqui recorrente na oposição que apresentou e na resposta à contestação apresentada pela recorrente em 17/11/2016 como igualmente se encontra provado por inexistência de qualquer documento que prove tal notificação.

6) Razão pela qual, também deverá resultar da matéria de facto provada que a recorrente não foi notificada para proceder ao pagamento voluntária da divida nem lhe foi informado o prazo para o fazer e nem tão pouco foi informada dos meios que dispunha para defesa acaso não concordasse com tais liquidações.

7) Razão pela qual deverá ser alterada parte da matéria de facto dada como provada nas alíneas I) e J) e aditada a al. N) dela (matéria de facto provada) passando a constar o seguinte:

1) Sobre o relatório final a que alude a alínea anterior foi proferido despacho de concordância pelo Director do Serviço de Fiscalização de LVT, do ISS, I.P., datado de 25-11-2010, o qual foi notificado apenas aos mandatários da oponente através do ofício n.º ....., de 26-11-2010 (cfr. fls. 390 e 391 dos autos).

2) O ofício identificado na alínea precedente tem por assunto "Regularização de Contribuições à Segurança Social", e foi endereçado apenas aos mandatários da sociedade M.........., Lda., constando do mesmo a seguinte menção «(…) a partir da data do registo do presente oficio, respeitada a dilação de 3 dias, essa entidade é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a Segurança Social, na importância de 1.804.721,39 €», fazendo-se ainda menção de que anexa o relatório final (Cfr. Doc. n.º 2 junto com a petição inicial e doc. n.º 2 junto com a contestação).

3) A oponente não foi notificada para proceder ao pagamento voluntário da divida nem foi informada do prazo que dispunha para o fazer e nem tão pouco foi informada dos meios que dispunha para defesa acaso não concordasse com tais liquidações.

Pelo exposto, deverá dar-se como provado o que consta nas alíneas 1) a 2) supra referidas por seres estas consonantes com a prova documental junta aos autos e aditado à matéria de facto provada a alínea 3) supra, por ser de suma relevância tal facto.

8) Quanto à matéria de direito veio a Meritíssima Juiz do Tribunal "a quo" considerar improcedente a oposição à execução apresentada pois considera que a Recorrente foi notificada para proceder ao pagamento voluntário e nada fez. Ora não pode de todo a recorrente concordar com tais fundamentos já que estes violam claramente a legislação em vigor como se demonstrará.

9) Ora com interesse para o presente recurso resultou provado que a dívida em cobrança resulta de liquidações adicionais efectuadas no âmbito de um processo de averiguações e que esse processo de averiguações correu termos pelo I.S.S., IP de Santarém (alínea E) da matéria de facto provada) Que do relatório final consta a seguinte proposta que obteve o despacho de concordância do Director do Serviço de Fiscalização de LVT: "(...) Caso o presente relatório mereça aprovação propõe-se o seguinte: a) Que, para os devidos efeitos, se tornem públicos o mapa de apuramento e demais documentação pertinente, após expedição para que o CDist de Lisboa promova o registo oficioso das Declarações de Remunerações, devendo este proceder à notificação do contribuinte para pagamento voluntário da dívida, com a cominação de, não o fazendo, o processo seguir para cobrança coerciva; (alínea H) da matéria de facto provada) Que o relatório final apenas foi notificado aos mandatários da Recorrente (fls. 390 e seguintes dos autos). Que a Recorrente nunca foi notificada para proceder ao pagamento voluntário da divida e consequentemente não foi informada do prazo que tinha para o fazer e nem tão pouco foi informada dos meios que dispunha para defesa acaso não concordasse com tais liquidações. E que foram extraídas 2 certidões de divida com vista à instauração do processo executivo as quais foram utilizadas e consequentemente foi instaurado o processo de execução fiscal n.º .......... e apensos.

10) Ora da conjugação dos artigos 36.º n.º 1 e 2, 38.º n.º 1, 41.º, 84.º, 85.º n.º 1 e 2 e 88.º todos do C.P.P.T e 77.º n.º 6 da LGT, em primeiro lugar, resulta claro que o relatório final efectuado pelo I.S.S. tinha de ter sido obrigatoriamente notificado ao contribuinte, no caso em concreto à Recorrente, dado tratar-se de uma notificação com caracter pessoal pois que afecta claramente os direitos e interesses legítimos da Recorrente, o que não ocorreu dado que apenas foi notificado aos seus mandatários, razão pela qual tal notificação, conforme aliás resulta no citado artigo 36.º n.º 1 do C.P.C. não é válida nem eficaz, o que em devido tempo se invocou dado que a Recorrente sempre referiu na oposição à execução apresentada e na resposta que deu à contestação nos termos do artigo 3.º n.º 3 do C.P.C. em 17/11/2016 que nunca foi notificada para proceder ao pagamento voluntário da divida e que a notificação aos mandatários da Recorrente e a funcionários da recorrente não é válida, não tendo assim qualquer notificação produzido, salvo melhor entendimento, os seus efeitos na esfera jurídica da aqui Recorrente.

11) No entanto ainda que se entenda que tal invocação não foi realizada, o que só hipoteticamente se concebe, refere o artigo 165.º n.º 1 al. b) do C.P.P.T que "São nulidades insanáveis em processo de execução fiscal a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental.", e sendo certo que como decorre do art. 163.º do CPPT, as dívidas sujeitas a execução fiscal serão certas, líquidas e exigíveis (no nosso entendimento e salvo melhor opinião requisitos essenciais do titulo executivo) e ao credor só é conferido o direito de exigir judicialmente o cumprimento e executar o património do devedor, quando a obrigação não tenha sido voluntariamente cumprida (art. 817º do CC), pelo que a dívida só poderia ser exigida após a constituição do devedor em mora e na qual aquele só se constituiria depois da notificação nos sobreditos termos, a qual não foi efectuada, não poderia o I.S.S. ter extraído qualquer certidão e muito menos interposto qualquer execução.

12) Mais tal facto, salvo melhor entendimento, dado tratar-se de uma nulidade insanável nos termos do artigo 165.º n.º 1 al. b) do C.P.P.T esta é de conhecimento oficioso conforme refere o artigo 165.º n.º 4 do C.P.C. e pode inclusivamente ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, sendo certo que serve o presente acto, por mera cautela, para novamente a arguir, o que desde já se faz.

13) No entanto ainda que assim não se entenda o certo é que conforme resulta do relatório final - única notificação que valorou para efeitos da prolação da sentença que ora se recorre - de forma cabal diga-se, tal relatório não tinha a finalidade de interpelar a recorrente para pagar a dívida voluntariamente.

14) De facto, como aliás resulta cabalmente provado, veja-se a matéria constante da matéria de facto provada na al. H) apenas foi notificado, no que aqui interessa, aos mandatários da Recorrente o seguinte: "(…) Que, para os devidos efeitos, se tornem públicos o mapa de apuramento e demais documentação pertinente, após expedição para que o CDist de Lisboa promova o registo oficioso das Declarações de Remunerações, devendo este proceder à notificação do contribuinte para pagamento voluntário da dívida, com a cominação de, não o fazendo, o processo seguir para cobrança coerciva. (.)"

15) Ora conforme resulta demonstrado cabalmente ainda que se considere que a Recorrente foi notificada do relatório final o certo é que não foi, quer com essa notificação, quer com qualquer outra, de todo notificada para pagar voluntariamente a quantia em causa.

16) De facto o que resulta do relatório final, note-se elaborado pelos Serviços de fiscalização de Santarém (e não o Centro Distrital de Lisboa) é que tais apuramentos deveriam ser enviados para o Centro Distrital de Lisboa para que este procedesse ao registo oficioso das declarações de remuneração e posteriormente este (e não outro) Centro Distrital de Lisboa notificasse a Recorrente para pagar voluntariamente a divida. Não resulta assim do Relatório final qualquer notificação para pagamento voluntário da divida em causa, resulta até claramente o contrário. De facto resulta cabalmente demonstrado que tal notificação (para pagamento voluntario da divida) a ocorrer seria posterior à emanação e notificação do relatório final, seria emitida não por aquela entidade mas sim pelo Centro Distrital de Lisboa e tão só após terem sido efectuados os registos oficiosos das declarações de remuneração.

17) Ora conforme resulta cabalmente dos autos, após a notificação do Relatório final proferido no âmbito do processo de averiguações efectuada aos mandatários da Recorrente, donde não consta qualquer interpelação para pagamento voluntario, nunca foi efectuada qualquer outra notificação à Recorrente para que esta procedesse voluntariamente ao pagamento da divida ou sequer qualquer interpelação para pagar a mesma, prazo para o fazer por forma voluntária e meios de defesa que dispõe acaso não concorde com tais liquidações. A única notificação que ocorre após a prolação e notificação aos mandatários da recorrente do relatório final é tão só uma notificação informativa dos registos oficiosos efectuados e a forma de apuramento dos mesmos, não havendo também nesta comunicação qualquer interpelação para pagamento voluntario, indicações de prazos para o fazer por forma voluntaria, nem a indicação dos meios de defesa e prazos para reagir contra o acto notificado. (Cfr. al M) da matéria de facto provada).

18) Em momento algum é dado a conhecer à Recorrente que deverá proceder ao pagamento daquela quantia voluntariamente em determinado prazo e se não fizer tal quantia será cobrada coercivamente e que dispõe de um conjunto de meios de defesa, e quais, para reagir ao acto notificado, apesar de no relatório final fazer expressa menção que seria o Centro Distrital de Lisboa, após proceder aos registos oficiosos da declarações de remuneração, a notificar a Recorrente para pagar voluntariamente a divida com a cominação de não o fazendo o processo prosseguir para a cobrança coerciva.

19) Sempre esperou a Recorrente, e é-lhe absolutamente lícito assim esperar, face ao conteúdo do relatório final, que o Centro Distrital de Lisboa a notificasse informando expressamente que a estava a notificar para que esta pagasse voluntariamente o montante em causa e que, se assim o entendesse fazer, dispunha do prazo de 30 dias, que acaso não concordasse com tais liquidações então dispunha de um conjunto de meios de defesa e que acaso não impugnasse ou não pagasse o processo seguiria para cobrança coerciva.

20) De facto pela leitura do relatório final resulta claro que a notificação para proceder ao pagamento voluntário não seria efectuada por aquele Instituto mas sim pelo Centro Distrital de Lisboa razão pela qual teria o Recorrente de esperar que tal notificação fosse efectuada por quem de direito.

21) E não se diga que pelo documento identificado na al. M) da matéria de facto provada que tem como assunto "Declaração de remuneração" (que não serviu sequer de fundamento para considerar improcedente a oposição pois do teor do mesmo e da sua epigrafe resulta claro que não é uma interpelação para pagamento e que assim não foi considerado pelo Tribunal "a quo") se consegue extrair tal conclusão, pois como facilmente se poderá verificar, qualquer cidadão comum, onde se inclui a Recorrente, não consegue de todo, desse documento, extrair, pela epígrafe e conteúdo do mesmo, e nem sequer lhe é exigível que faça, que tal notificação se tratava de uma eventual interpelação para pagamento voluntário dado que não só não consta da mesma tal menção, não tão pouco consta prazos para proceder a tal pagamento voluntariamente, informação dos meios de reação de que dispunha, e a informação que acaso não pague voluntariamente tal divida que o processo prosseguiria para a cobrança coerciva.

22) Mais ao considerar-se que a notificação para pagamento voluntário foi realizada com a notificação aos mandatários da Recorrente do relatório final ou com a notificação constante do al. M) da matéria de facto provada (o que aqui só por mero dever de raciocínio se concebe relativamente a este último, pois repete-se não é fundamento da decisão de que ora se recorre e não foi de todo considerado pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal "a quo") de modo algum salvaguarda os direitos de defesa da Recorrente ao permitir a extracção de uma certidão de dívida e posterior instauração de uma execução fiscal sem que em momento prévio tenha sido eficazmente notificada para efectuar o pagamento voluntariamente do imposto liquidado e respectivos juros (cfr. artigos 88.º e 163.º do CPPT).

23) De facto, na situação "sub judicio", a Recorrente, como já se referiu, desconhecia, porque para tal não foi notificada, que tinha um prazo de trinta dias a contar da notificação da liquidação para efectuar o pagamento do imposto voluntariamente. Ora sem tal notificação (para pagamento voluntário), e face ao disposto nos artigos 36.º, 38.º, 84.º, 85.º e 88.º todo do C.P.P.T. e 77.º da LGT a divida não é certa, nem líquida e muito menos exigível, razão pela qual a interposição da referida execução é ilegal, ilegalidade esta que novamente se invoca e se espera que venha a ser declarada, por inexistência/ilegalidade do título que a suporte.

24) De facto, repetimos, sem prejuízo da invocação atempadamente realizada em sede de oposição à execução e resposta efectuada, relembramos novamente que tais factos consubstanciam nulidades insanáveis nos termos do artigo 165.º n.º 1 al. b) do C.P.P.T e que estes são de conhecimento oficioso conforme refere o artigo 165.º n.º 4 do C.P.C. e podem inclusivamente ser arguidos até ao trânsito em julgado da decisão final, sendo certo que serve o presente acto para mais uma vez, e por mera cautela as arguir (nulidades), o que desde já novamente se faz.

25) Importa, pois, concluir que a Recorrente não foi notificada para pagar voluntariamente a divida e consequentemente não lhe foi concedido um prazo para pagamento voluntário da dívida, facto este que determina a ilegalidade da instauração da execução por incumprimento do disposto nos artigos 84.º, 85.º e "maxime" 88.º todos do CPPT, sendo que a dívida exequenda apenas coercivamente não seria exigível, o que configura o fundamento de oposição fiscal previsto na alínea i), do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

26) Razão pela qual, ao decidir como decidiu violou o Meritíssima juiz "a quo" violou os artigos 36.º, 38.º, 84.º, 85.º, 88.º, 163.º e 165.º todos C.P.P.T. e 77.º da LGT.

27) Mais invocou igualmente a Recorrente a ilegalidade da liquidação da divida exequenda, sendo que quanto a esta matéria e salvo melhor entendimento o Juiz do Tribunal "a quo" não se pronunciou, pois apena se pronuncia, quanto a um dos fundamentos invocados pela Recorrente na oposição à execução, nomeadamente quanto à falta de notificação para pagamento voluntário/ ilegalidade do titulo executivo, sendo que quanto ao outro fundamento, nomeadamente a ilegalidade da liquidação da divida é absolutamente omisso.

28) Com efeito, a nulidade do acórdão por omissão, prevista no art.º 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, está directamente relacionada com o comando fixado n.º 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras».

29) Ora conforme supra se referiu a sentença recorrida é totalmente omissa quanto à invocada ilegalidade das liquidações adicionais, e assim sendo, e salvo melhor entendimento não podemos deixar de concluir que há omissão de pronúncia. Razão pela qual a sentença de que ora se recorre é nula, nulidade esta que desde já se invoca e se espera que venha a ser declarada, uma vez que o Mmo. Juiz do Tribunal " a quo" ao decidir como decidiu violou o disposto nos artigos 125.º do C.P.P.T. e arts. 615.º, n.º 1, al. b), c) e d) todos do C. P. Civil.

30) No entanto ainda que assim não seja entendido o certo é que dispõe, a alínea h) do n.º 1 do art.º 204 do CPPT, que constitui fundamento de oposição a "Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação."

31) No que concerne às dívidas perante a Segurança Social tem vindo a entender- se ser a oposição o meio adequado para discussão da pertinente legalidade. Como refere Jorge Lopes de Sousa, no Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado e comentado, 5.ª edição, Vol. II, pág. 467/468) «Pode alegar-se a ilegalidade das dívidas à Segurança Social, visto que, tratando-se de dívidas que não são objecto de um verdadeiro acto de liquidação por parte dos serviços, pelo que a oposição será o único meio legalmente previsto de impugnação, nos termos da alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.»

32) Ainda no acórdão do STA, proferido em 23.09.2009, no processo n.º 0436/09, pode ler-se: "sempre se dirá que no caso das contribuições para a Segurança Social a oposição à execução fiscal será o meio processual adequado para impugnar a legalidade do acto de extracção da certidão confirmativa da dívida, posto que em relação a esta dívida não é assegurada ao contribuinte qualquer via autónoma de impugnação e daí que o uso do meio processual de oposição à execução fiscal seja abrangido pelo campo de aplicação da norma constante da alínea h) do artigo 204.º do CPPT- cfr. Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição, a fls. 367 e verso, anotação 42 ao artigo 204.º do CPPT.".Cfr. ainda o Ac. STA de 07-12-2004, P. n.º 0749/04.

33) Ora a aqui Recorrente impugnou a legalidade da divida exequenda em sede de oposição à execução, sendo certo que pelos fundamentos supra expostos a oposição à execução é o meio adequado para o fazer, razão pela qual deveria ter o Tribunal "a quo" considerado como fundamento da oposição à execução a ilegalidade da liquidação invocada tempestivamente e consequentemente apreciado a oposição à execução quanto a este fundamento (ilegalidade da liquidação) o que não fez.

34) Aliás a pretensão da Recorrente é e sempre foi de impugnar a liquidação oficiosa de contribuições e cotizações à Segurança Social por via de oposição à execução fiscal com fundamento na alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, pois que, o meio processual adequado para o sindicar é, precisamente a oposição à execução fiscal deduzida com fundamento na alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT pois que, a lei não lhe assegurou, antes da data da citação para o processo de execução fiscal, meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação.

35) Sendo que ao decidir como decidiu violou a Meritíssima Juiz do Tribunal "a quo" o disposto no artigo 204.º n.º 1 al. h) do C.P.P.T. Razão pela qual e também por esta via a sentença de que ora se recorre é nula, nulidade esta que desde já se invoca e se espera que venha a ser declarada, uma vez que a Juiz do Tribunal "a quo" ao decidir como decidiu violou o disposto nos artigos 125.º do C.P.P.T. e arts. 615.º, n.º 1, al. b), c) e d) todos do C. P. Civil.

36) Assim, por todos os fundamentos supra referidos, deverá a sentença ora recorrida ser substituída por outra que considere totalmente procedente por provada a oposição apresentada com as legais consequências.

37) Mais, ainda que se considere que o meio próprio não é a oposição à execução apresentada e tendo em atenção que a única notificação que se poderá - o que apenas se concede por mero dever de raciocínio - eventualmente considerar como notificação para pagamento voluntário será a notificação referida na alínea M) do factos provados (dado que face ao factos supra referidos a notificação constante na linha H) da matéria de facto provada claramente não poderá ser considerada uma notificação para pagamento voluntário da dívida), a qual, conforme resulta provado por documento junto com a contestação, apenas se realizou no dia 28/03/2012, sempre se dirá que na eventualidade de se estar perante um erro na forma de processo deverá a oposição à execução apresentada ser convolada em impugnação.

38) O erro na forma do processo é uma nulidade processual prevista no artigo 98.º do CPPT que impõe ao juiz a sua correcção nos termos do disposto no n.º 4 do mesmo preceito e também do artigo 97.º n.º 3 da LGT. A convolação para o processo que se considera o adequado é possível e obrigatória sempre que o pedido formulado e os fundamentos invocados - a chamada causa de pedir - se ajuste à forma do processo convolando e não tenha ocorrido a caducidade da acção.

39) Ora parecendo pacifico que os fundamentos invocados na oposição à execução - a chamada causa de pedir - se ajuste à forma do processo convolando, e tendo sido a Recorrente notificada do ofício referido na al. M) dos factos provados em 28/03/2012 e acaso se considere que tal notificação consubstancia uma notificação para pagamento voluntário, então dispunha Recorrente do prazo de 90 dias para interpor a correspondente impugnação judicial nos termos do artigo 102.º do C.P.P.T. vigente à data.

40) Tal prazo de 90 dias, conforme resulta do artigo 102.º n.º 1 do C.P.P.T, começava a correr no termo do prazo para pagamento voluntário, sendo certo que conforme resulta do citado artigo 85.º n.º 1 e 2 do C.P.T.T. o prazo para pagamento voluntário é de 30 dias. Assim desde a data da notificação que ocorre em 28/03/2012 a Recorrente dispunha de 120 dias para apresentar a impugnação, sendo que o prazo para pagamento voluntário viu o seu términos em 27/04/2012 tendo-se iniciado no dia 28/04/2012 o prazo de 90 dias que apenas viu o seu términos em 26/07/2012. Ora a Recorrente apresentou a oposição à execução em 28/06/2012 conforme resulta provado pelas al. C) e D) da matéria de facto provada.

41) Razão pela qual, não tendo ocorrido a caducidade da acção, poderá conforme supra se demostrou, e acaso assim se entenda, o que só hipoteticamente se concebe, que a notificação constante da alínea M) da matéria de facto provada consubstancia uma notificação para pagamento voluntário então, salvo melhor entendimento deverá o Tribunal proceder "ex officio" à convolação do processo de oposição para o processo de impugnação judicial.

Termos em que deverá, com o douto suprimento de V. Ex.ª ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se consequentemente a sentença ora recorrida substituindo-a por outra que considere totalmente procedente por provada a oposição à execução apresentada. Assim farão V. Ex.ª como sempre e mais uma vez JUSTIÇA!»


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O Recorrido, Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP. veio apresentar as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

«I - Invoca a oponente que os fundamentos da oposição judicial apresentada se subsumem ao disposto nas alíneas a), h) e i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.

II - Pelas razões expostas na douta sentença a quo, bem como pelas supra expostas, resulta claro dos autos que não se encontra em causa nos autos nenhum daqueles motivos invocados se encontra em causa nos autos.

III - Ao contrário do invocado pela Oponente, a mesma foi devidamente notificada de cada um dos atos praticados quer no âmbito do processo de averiguações, quer da liquidação oficiosa da dívida e do valor global que poderia ter pago voluntariamente ou ter impugnado o mesmo.

IV - Pelos motivos supra expostos não poderia o Tribunal a quo, ao contrário do ora invocado pela Recorrente, ter procedido à convolação oficiosa da oposição em impugnação.

Pelo que se requer que o presente recurso seja declarado totalmente improcedente, com o que se fará a tão costumeira JUSTIÇA!»


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Dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Neste quadro as questões a decidir são as seguintes:

-Se a sentença enferma da nulidade prevista no artigo 615º, nº 1, al. b) do CPC;

-Se a sentença enferma da nulidade prevista no artigo 615º, nº 1, al. c) do CPC;

-Se a sentença enferma da nulidade prevista no artigo 615º, nº 1, al. d) do CPC;

-Impugnação da matéria de facto;

-Se a sentença incorre em erro de julgamento ao não considerar extinta a execução fiscal com base no previsto na alínea i), do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT;

-Se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento ao considerar que não é possível discutir em sede de oposição à execução fiscal a ilegalidade da liquidação que subjaz à dívida exequenda;

-Aferir se é possível convolar a oposição em processo de impugnação judicial.


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III. FUNDAMENTAÇÃO

A. DOS FACTOS

Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:

«A) Com base nas certidões de divida n.º ...../2012 e n.º ...../2012, emitidas pelo Instituto da Segurança Social, IP., foi instaurado em 11-04- 2012, contra a sociedade M.........., Lda., o processo de execução fiscal n.º .......... e apenso (..........) por dívidas relativas a contribuições e cotizações ao sistema de segurança Social dos meses de 2007/04 a 2007/12, 2008/2 a 2008/12, 2009/02 a 2009/12, 2010/02 e 2010/04 (cfr. fls. 6 a 9 dos autos).

B) O órgão de execução fiscal expediu a citação pessoal para a sede da executada em 10 de Maio de 2012, a qual foi confirmada em 24 de Maio de 2012 (cfr. doc. 1 junto com a petição inicial e fls. 10 a 18 dos autos).

C) A presente oposição ao processo de execução n.º .......... e apenso foi remetida ao órgão da execução fiscal por correio registado em 28-06-2012 (cfr. fls. 1532, 1618 dos autos).

D) Em 28-06-2012 a oponente pagou a taxa de justiça montante de € 612,00 e a multa, nos termos do art. 145º do CPC, no montante de € 244,80 (cfr. fls. 377 in fine e 379 a 382 dos autos).

E) A dívida em cobrança coerciva no PEF identificado na alínea A) foi apurada no âmbito de processo de averiguações realizado à sociedade M.........., LDA. que foi autuado com o n.º .......... e que correu seus termos pelo I.S.S., l.P.-Serviços Centrais-Departamento de Fiscalização-Serviços de Fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo-Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes – Sector de Santarém (cfr. doc. 2 junto com a petição inicial).

F) O projecto de relatório do processo de averiguações nº .........., datado de 11-10-2010, extraiu as seguintes conclusões (cfr. fls. 405 a 419 dos autos):

«Com base na análise efectuada à documentação disponibilizada pelo contribuinte, constatou-se que as remunerações pagas mensalmente aos trabalhadores constam devidamente das declarações de remunerações entregues pelo contribuinte, dentro dos prazos regulamentares em vigor.

Na sequência das diligências efectuadas, verificou-se que o contribuinte paga mensalmente aos seus trabalhadores para além do vencimento e, na maior parte das vezes, em montantes mais elevados do que o valor dos vencimentos, montantes referentes a "ajudas de custo" que não considera como base de incidência para a Segurança Social, não se justificando o pagamento destes valores pelo anteriormente demonstrado.

Ao analisar os documentos apresentados verificou-se que a empresa desenvolve a sua actividade em Espanha e Holanda, onde executa trabalhos de serralharia civil, tendo em Portugal estabelecimento da sede da empresa, que consta de um escritório onde trabalham quatro a cinco pessoas até à presente data.

Estes trabalhadores recebiam habitualmente montantes considerados fixos a título de ajudas de custo, apesar de não se deslocarem frequentemente em trabalho, sendo a empresa a suportar os custos das deslocações e alojamentos dos mesmos, quando eram efectuadas.

Os restantes trabalhadores da empresa desempenham as suas funções em Espanha, França e Holanda sendo contratados pelo tempo de duração da obra nesses países, não havendo assim lugar ao pagamento de ajudas de custo que visam compensar o trabalhador pelas despesas que foi obrigado a suportar por motivo de deslocação em trabalho, visto os mesmos não se terem de facto deslocado por ser nesses Países o seu local efectivo de trabalho (domicílio necessário).

Além disso, de acordo com os trabalhadores ouvidos em Auto de Declarações, o contribuinte suporta ainda as despesas de alojamento, bem como o custo das viagens para o estrangeiro, pelo que ao pagar ajudas de custo está a duplicar as despesas por si suportadas.

Perante os factos supra referidos pode concluir-se que os montantes pagos a título de ajudas de custo aos trabalhadores não são mais que complementos de vencimento, pois não apresentam a característica fundamental de compensar o trabalhador pelas despesas que foi obrigado a suportar por motivo de deslocação em trabalho.

Desta forma, estes valores, sendo verdadeiras remunerações e não ajudas de custo, estão sujeitos à incidência de taxa social única, pelo que devem ser incluídos nas declarações de remunerações e pagas as respectivas contribuições, conforme a alínea a), art.º 2.º do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, conjugado com o art.º 4.0 do Decreto-Lei n.º 103/80 e art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de Junho, no montante de € 1.804.728,39.

Em virtude da matéria de facto verificada neste processo poder indiciar o procedimento criminal, previsto no art.º 106° da Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, pela prática do crime de fraude contra a Segurança Social, no período de Março de 2006 a Abril de 2010, será, oportunamente, elaborado o respectivo auto.

7. Propostas:

Propõe-se:

- Envio de notificação à entidade empregadora, acompanhada do presente relatório e mapas de apuramento, para efeitos de audiência prévia à decisão final.».

G) A ora oponente foi notificada para se pronunciar sobre o projecto de relatório, através do ofício nº ....., de 18-10-2010 (cfr. doc. 2-A, junto com a petição inicial).

H) O relatório final do processo de averiguações nº .........., datado de 15-11-2010, apresenta as seguintes conclusões e propostas:

«3.1. Em face da matéria apreciada no ponto anterior e tendo presente tudo quanto se apurou e fundamentou em sede de projecto de relatório são de extrair as seguintes conclusões:

a) A Entidade Empregadora em apreço não incluiu nas declarações de remunerações enviadas à Segurança Social, como legalmente estava obrigada, a totalidade das remunerações respeitantes ao período Janeiro de 2006 a Abril de 2010, da generalidade dos seus trabalhadores, identificados no mapas de apuramento, anexo como documentos de fls. 5801 a 5836;

b) A Entidade Empregadora violou assim o disposto no nº 1 e nº 2 do art° 56° da Lei 4/2007, de 16 de Janeiro, e art° 6° do Dec - Regulamentar nº 26/99, de 27 de Outubro, do qual decorre a obrigação, por parte da entidade empregadora, de entregar as declarações de remunerações até ao dia 15 do mês seguinte a que se verificou o exercício de actividade por parte dos trabalhadores;

c) Em face do exposto, impõe-se efectuar o suprimento oficioso das Declarações de Remunerações, ao abrigo das competências previstas na alínea c) do n° 2 do artigo 10º da Portaria n° 638/2007, de 30 de Maio, republicados pela Portaria nº 1460-A/2009, de 31 de Dezembro e do artigo 33° do Decreto Lei nº 8-B/2002, de 15 de Janeiro;

d) Liquidar as contribuições totais no valor de 1.804.721,39 Euros, correspondentes aos valores que não foram objecto de incidência de taxa social única, inscritos no mapa de apuramento, anexo ao processo de 5801 a 5836, que dele fazem parte integrante.

e) Tendo em conta que a prática do contribuinte, (consubstanciada no facto de não ter incluído nas declarações de remunerações entregues, os pagamentos efectuados aos trabalhadores a título de ajudas de custo, que se apurou serem verdadeiras remunerações) resultou uma omissão de contribuições devidas no montante mensal superior a 7.500,00 euros.

f) Tal conduta, configura a prática de crime de fraude contra a Segurança Social, enquadrando-se no artº 106° do RGIT (Regime Geral das Infracções Tributárias) aprovado pela Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho, pelo que foi levantado o respectivo Auto de Notícia-Crime.

4 - Propostas

Caso o presente relatório mereça aprovação propõe-se o seguinte:

a) Que, para os devidos efeitos, se tornem públicos o mapa de apuramento e demais documentação pertinente, após expedição para que o CDist de Lisboa promova o registo oficioso das Declarações de Remunerações, devendo este proceder à notificação do contribuinte para pagamento voluntário da dívida, com a cominação de, não o fazendo, o processo seguir para cobrança coerciva;

b) O envio do presente processo ao NIC (Núcleo de Investigação Criminal), face aos indícios apurados da prática do crime de fraude contra a Segurança Social;

c) O envio dos mapas de apuramento à DGCI (Direcção Geral Contribuições e Impostos) para efeitos da eventual liquidação adicional de imposto sobre rendimento, em face das remunerações agora apuradas relativamente ao período de 01/2006 a 04/2010.

d) Que seja dado como concluído o presente processo de averiguações, considerando-se para o efeito, como contribuições apuradas por este Serviço de Fiscalização, o montante de 1.804.721,39 Euros.»

I) Sobre o relatório final a que alude a alínea anterior foi proferido despacho de concordância pelo Director do Serviço de Fiscalização de LVT, do ISS, I.P., datado de 25-11-2010, o qual foi notificado à oponente através do ofício nº ....., de 26-11-2010 (cfr. fls. 390 e 391 dos autos).

J) O ofício identificado na alínea precedente tem por assunto “Regularização de Contribuições à Segurança Social”, e foi endereçado aos representantes legais da sociedade M.........., Lda., constando do mesmo a seguinte menção «(…) a partir da data do registo do presente oficio, respeitada a dilação de 3 dias, essa entidade é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a Segurança Social, na importância de 1.804.721,39 €», fazendo-se ainda menção de que anexa o relatório final (Cfr. Doc. nº 2 junto com a petição inicial e doc. nº 2 junto com a contestação).

L) A oponente tomou conhecimento da referida notificação, conforme consta expressamente do artigo 5º da petição inicial.

M) Através do ofício com a referência UIQ/NGR/RB do ISS, I.P.- Centro Distrital de Lisboa – Unidade de Identificação e Qualificação- Núcleo de Gestão das Remunerações, foi comunicado à oponente o registo oficioso das Declarações de Remuneração e o montante em dívida., o qual foi recebido em 28-03-2012. (Cfr. doc. 2 junto com a contestação).


*

Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.

*

A convicção do tribunal formou-se com base na análise crítica dos documentos juntos aos autos, expressamente referidos no probatório supra.»

**

B.DO DIREITO

DAS NULIDADES DA SENTENÇA

Compulsadas as alegações de recurso e respectivas conclusões, constata-se que a Recorrente visa imputar à sentença as nulidades decorrentes das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

Vejamos, se ocorrem as invocadas nulidades.

Nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, a sentença é nula quando: « Não especifique os fundamentos de facto e de direitos que justificam a decisão;».

A causa de nulidade referida no normativo transcrito, ocorre quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido, mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (artigo 208.º, n.º 1, da CRP e artigo 154.º, n.º1 do CPC).

Como ensina Teixeira de Sousa: «o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível» (“Estudos Sobre o Novo Processo Civil», pág. 221).

Neste contexto, a falta de motivação susceptível de integrar a nulidade da sentença, é apenas a que se reporta «(…) à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito.

A motivação incompleta, deficiente ou errada não produz nulidade, afectando somente o valor doutrinal da sentença e sujeitando-a consequentemente ao risco de ser revogada ou alterada quando apreciada em recurso» (Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 9.ª edição, 2009, pág. 55).

In casu, decorre da argumentação que sustenta a arguida nulidade, que o inconformismo da Recorrente assenta na matéria de facto que o Tribunal de 1ª Instância deu como provada e das ilações que da mesma extraiu (error in iudicando), o que se reconduz, a um problema de erro de julgamento e não à nulidade da sentença enquanto vício intrínseco (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria sentença (neste sentido, vide entre outros; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1.4.2014, proferido no processo n.º 360/09, disponível em www.dgsi.pt).

Quanto à nulidade tipificada na alínea c) do n.º1 do artigo 615º do CPC, é sabido que ocorre quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, isto é, quando se verifica uma contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença.

Ora, manifestamente, que alegação produzida pela Recorrente está longe de preencher o dispositivo legal contido na alínea c) do n.º1 do artigo 615.º do CPC, porquanto não vislumbramos, nem a Recorrente aponta, onde reside a contradição entre os fundamentos e a decisão adoptada.

Acresce precisar que, se a interpretação e a relevância que a sentença deu a certos factos e se a conclusão que deles se extraiu foram, ou não, as mais correctas, é questão que tem a ver com o mérito da decisão e com um eventual erro de julgamento, mas que não está associada à construção lógica da sentença, a qual se mostra correctamente formulada.

Arguiu ainda a Recorrente a nulidade da sentença por omissão de pronúncia - alínea d) do n.º1 do artigo 615.º do CPC-, devido à circunstância de, em seu entender, o Tribunal de 1ª Instância ter deixado de se pronunciar sobre a questão que invocou em sede de petição inicial, relativa à ilegalidade da liquidação que subjaz à dívida exequenda. Trata-se de um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de actividade que afecta a validade da sentença.

A nulidade por omissão de pronúncia, está prevista no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, está directamente relacionada com o comando fixado n.º 2 do artigo 608.º do CPC, segundo o qual «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras». E, diz-nos o artigo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Daí que se possa afirmar que a nulidade da sentença com fundamento na omissão de pronúncia apenas se verifica quando uma questão que devia ser conhecida nessa peça processual não ter tido aí qualquer tratamento, apreciação ou decisão, sem que a sua resolução tenha sido prejudicada pela solução, eventualmente, dada a outras.

Portanto, a omissão de pronúncia equivale ao não conhecimento de questões, é o silêncio sobre questão que o tribunal devia conhecer.

Feito este breve enquadramento, vejamos se ocorre a invocada nulidade.

Analisado o conteúdo da sentença sob recurso resulta à evidência que a nulidade arguida pela Recorrente não se verifica. Com efeito, o Tribunal de 1ª Instância não deixou de dar resposta à questão colocada - ilegalidade da liquidação -, simplesmente entendeu que : «(…) não se mostra verificado o fundamento previsto no art. 204.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, invocado pela oponente» uma vez que « (…) está em causa uma liquidação oficiosa por iniciativa do Instituto da Segurança Social, efectuada em suprimento das obrigações dos contribuintes em conformidade com o disposto no art. 33º do decreto-Lei nº 8- B/2002, e que constitui, por isso, um verdadeiro acto administrativo declarativo de liquidação de um tributo, praticado por autoridade pública.».

Assim, não vislumbramos onde falta a pronúncia, na medida em que a sentença recorrida produziu a sua análise sobre a questão concreta que lhe foi colocada.

O inconformismo da Recorrente parece radicar no concreto juízo formulado pelo Tribunal de 1ª Instância relativamente àquela questão, todavia de modo algum configura causa de nulidade da sentença, mas quando muito o que poderá estar em causa é um suposto erro de julgamento, a apreciar em sede apreciação do mérito da sentença.

Concluímos, pois, não padecer a sentença das apontadas nulidades, as quais improcedem.

Erro de julgamento da matéria de facto

Apreciaremos a impugnação da matéria de facto pretendida pela Recorrente, pois sem a fixação definitiva dos factos provados e não provados não é possível extrair as pertinentes consequências à luz do direito.

A Recorrente está em desacordo com a decisão sobre a matéria de facto assente na sentença, por duas ordens de razões: por um lado, entende que as alíneas I) e J) devem ter diferente formulação daquela que foi dada pelo Tribunal de 1ª Instância, por outro lado, pretende o aditamento de um novo facto.

Conforme decorre do preceituado no artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), e n.º 2, alínea a), do CPC, quando impugna a matéria de facto, o recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição.

De tal artigo resulta que a lei exige o cumprimento pelo Recorrente dos seguintes requisitos cumulativos:

i) a indicação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente

julgados;

ii) a indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados;

iii) a indicação da decisão que, no seu entender, deve ser proferida quanto aos indicados pontos da matéria de facto;

iv) a indicação, com exactidão, das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, isto quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, sem prejuízo da faculdade que a lei concede ao Recorrente de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.

Lidas as conclusões em consonância com o corpo das alegações do recurso, verificamos que a Recorrente identificou quais os concretos pontos de facto da sentença recorrida que pretende ver modificados, indicou o concreto sentido da modificação por si pretendida, não deixando de fazer referência ao meio probatório que sustenta a sua pretensão.

Por isso, nada obsta a que este Tribunal Central Administrativo proceda à reapreciação da matéria de facto nos termos pretendidos.

Conhecendo da pretendida alteração das alíneas I) e J) matéria de facto, diremos o seguinte:

Consta na alínea I) dos Factos dados como Provados:

«Sobre o relatório final a que alude a alínea anterior foi proferido despacho de concordância pelo Director do Serviço de Fiscalização de LVT, do ISS, I.P., datado de 25-11-2010, o qual foi notificado à oponente através do ofício nº ....., de 26-11-2010 (cfr. fls. 390 e 391 dos autos).»

Consta na alínea J) dos Factos dados como Provados:

«O ofício identificado na alínea precedente tem por assunto “Regularização de Contribuições à Segurança Social”, e foi endereçado aos representantes legais da sociedade M.........., Lda., constando do mesmo a seguinte menção «(…) a partir da data do registo do presente oficio, respeitada a dilação de 3 dias, essa entidade é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a Segurança Social, na importância de 1.804.721,39 €», fazendo-se ainda menção de que anexa o relatório final (Cfr. Doc. nº 2 junto com a petição inicial e doc. nº 2 junto com a contestação).».

São esses factos que a Recorrente pretende ver alterados (com suporte aos documentos juntos a fls. 390 e 391 dos autos) de modo a passarem a ter a seguinte redacção:

«I) Sobre o relatório final a que alude a alínea anterior foi proferido despacho de concordância pelo Director do Serviço de Fiscalização de LVT, do ISS, I.P., datado de 25-11-2010, o qual foi notificado apenas aos mandatários da oponente através do ofício nº ....., de 26-11-2010 (cfr. fls. 390 e 391 dos autos).»

«J) O ofício identificado na alínea precedente tem por assunto “Regularização de Contribuições à Segurança Social”, e foi endereçado apenas aos mandatários da M.........., Lda., constando do mesmo a seguinte menção «(…) a partir da data do registo do presente oficio, respeitada a dilação de 3 dias, essa entidade é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a Segurança Social, na importância de 1.804.721,39 €», fazendo-se ainda menção de que anexa o relatório final (Cfr. Doc. nº 2 junto com a petição inicial e doc. nº 2 junto com a contestação).».

Analisámos a prova documental junta, em especial o teor dos documentos de fls. 390 e 394 dos autos, e da mesma foi possível, de facto, concluir, com a necessária segurança, pela existência de um erro de apreciação da prova em causa, relativamente aos referidos pontos de facto ora impugnados sob as alíneas I) e J).

Com efeito, é fácil de ver, através da leitura do documento de fls. 393, que a Recorrente constituiu mandatários os Drºs José .......... e Nuno .......... para a representarem no âmbito do procedimento de averiguações, concretamente na fase procedimental de exercício do direito de audição. Ora, compulsado o documento 391, verificamos que foram, precisamente, os Mandatários constituídos no mencionado procedimento que foram notificados do Relatório Final e não os Representantes Legais da Recorrente conforme inscrito na al.J) do probatório.

E não há que confundir «Representantes Legais», enquanto órgão de representação da sociedade por quotas, a quem cabe exteriorizar a vontade da sociedade perante terceiros, a gerência (cfr.artigo 252.º, n.º 1 do CSC) com «mandatários constituídos» no âmbito do procedimento tributário (vide: artigo 40.º do CPPT).

Donde, e porque a notificação foi, como já referimos atrás, efectuada aos Mandatários da Recorrente, a expressão inscrita na al.I) do probatório « o qual foi notificado à oponente através do ofício nº ....., de 26-11-2010 » não poderia integrar a matéria de facto, uma vez que saber-se se a Recorrente foi, ou não, notificada, implica, no caso, necessariamente, a formulação de um juízo de direito, designadamente à luz do artigo 40.º, n.º1 do CPPT.

Decorre do exposto que a apreciação efectuada pelo Tribunal de 1ª Instância quanto à prova documental que suportou a matéria assente nas alíneas I) e J), não pode permanecer no elenco da decisão da matéria de facto.

Assim, altera-se a decisão relativa à matéria de facto, nos termos seguintes:

I) Sobre o relatório final a que alude a alínea anterior foi proferido despacho de concordância pelo Director do Serviço de Fiscalização de LVT, do ISS, I.P., datado de 25-11-2010.(cfr. fls. 391 e 394 dos autos).

J) Com data de 26.11.2010, foi endereçado aos mandatários da Oponente, constituídos no âmbito do procedimento de averiguações a que alude a al.E) do probatório, Drºs José .......... e Nuno .........., o oficio n.° ....., sob o assunto “Regularização de Contribuições à Segurança Social”, na qual se lê: « (…) De acordo com os fundamentos de facto e de direito vertidos no referido relatório, verifica-se que as alegações em causa não foram consideradas procedentes, razão pela qual, a partir da data do registo do presente oficio, respeitada a dilação de 3 dias, essa entidade é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a Segurança Social, na importância de 1.804.721,39 €», fazendo-se ainda menção de que anexa o relatório final . (cfr. fls. 391 e 394 dos autos).

Procede-se à reformulação oficiosa da redacção do facto inscrito na al.M) do probatório que passa a ter a seguinte redacção:

« Através do ofício com a referência UIQ/NGR/RB do ISS, I.P.- Centro Distrital de Lisboa – Unidade de Identificação e Qualificação-Núcleo de Gestão das Remunerações, foi comunicado à oponente o registo oficioso das Declarações de Remuneração e o montante em dívida., o qual foi recebido em 28-03-2012, cujo teor é o seguinte:

«No decurso de um pedido de averiguações junto do Departamento de Fiscalização da Segurança Social, foi efectuada uma inspecção a essa empresa do qual resultaram apuramentos conforme Mapas anexos, respeitantes a diferenças de remunerações referentes ao período de jan/06 a abril/10, de vários trabalhadores ao serviço dessa entidade.

Uma vez que não foi dado cumprimento aos artigos 1.º e 2.º, alínea a) do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, art. 4.º do Dec. Lei 103/80, de 9 de Maio e artigo 10.º do Dec-Lei 199/99, de 8 de Juno, foram registadas as declarações de remunerações oficiosas de acordo com os Mapas de Apuramento elaborados pela Fiscalização, para o período de jan/ a abril/10.»

Assim, fica V.Exª notificado, nos termos do artigo 66.º do CPA que foram registadas oficiosamente Declarações de Remunerações no valor de 5.198.49.69, e em consequência passa essa Entidade a ser devedora à Segurança Social da importância de € 924.58 conforme taxa contributiva de 23% e de € 1.805.085.97, à taxa de 34,75% aplicada de acordo com o art. 53º da Lei 110/2009 de 16 de Setembro, alterada pela Lei 119/2009 de 30/12.

Anexo: cópias dos Mapas de Apuramento» ( doc. n.º2 junto à contestação).

Por último, pretende a Recorrente que seja aditado ao probatório o seguinte facto: «A Oponente não foi notificada para proceder ao pagamento voluntário da divida nem foi informada do prazo que dispunha para o fazer e nem tão pouco foi informada dos meios que dispunha para a defesa acaso não concordasse com tais liquidações

Ora, a factualidade pretendia aditar encerra matéria conclusiva/ juízo valorativo a qual deve extrair-se dos factos concretos dados como assentes, a respeito das comunicações efectuadas sendo por isso insusceptível de integrar a decisão sobre matéria de facto.

Mostrando-se definitivamente fixada a matéria de facto, vejamos agora se assiste razão à Recorrente quanto aos demais fundamentos invocados no presente recurso.

Como resulta dos autos, a Recorrente deduziu a presente oposição ao processo de execução fiscal n.º .......... e apensos, instaurado pela Secção de Processos de Execução de Lisboa …, do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, para cobrança de cotizações e contribuições, decorrentes de uma liquidação oficiosa efectuada, ao abrigo da alínea c) do n.º2 do artigo 10.º da Portaria n.º 638/2007, de 30 de Maio e do artigo 33.º do Decreto – Lei n.º 8-B/2002, de 15 de Janeiro, na sequência de um processo de averiguações realizado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., invocando como causas de pedir «falta de notificação à oponente para proceder ao pagamento voluntário» da quantia apurada, o que «gera a ilegalidade do título executivo» e a «ilegalidade da liquidação da divida exequenda».

Enfrentando primeira a questão (saber se o processo de execução deve ser extinto, por falta de notificação da Recorrente para proceder ao pagamento voluntário da liquidação que subjaz à divida exequenda) na sentença disse-se, além do mais, o seguinte:

«Com resulta do probatório, a ora oponente foi notificada do teor integral do relatório da inspecção, no qual se encontram expressos os fundamentos e conclusões que subjazem à liquidação efectuada (cfr. al. I) do probatório).

De facto, no final do processo de averiguações nº .........., a oponente foi notificada, na pessoa dos seus mandatários, que é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a segurança social, na importância de € 1.804.721,39.

Ora, esta comunicação constitui um verdadeiro acto de liquidação, pois é através dela que a oponente fica a conhecer a decisão que irá alterar a sua situação contributiva.

Após a notificação, a oponente dispunha do prazo de 30 dias, para efectuar o pagamento do montante liquidado (cfr. art. 85º, nº 2 do CPPT) e, a partir do termo do prazo de pagamento, dispunha de prazo para usar dos meios graciosos e contenciosos, para discutir a legalidade em concreto da liquidação (cfr. art. 70º, nº 1 e art. 102º, nº 1 do CPPT), o que, não resulta dos autos que tenha feito.».

Discorda a Recorrente em absoluto do sentido decisório perfilhado pelo Tribunal de 1ª Instância, por entender que, « (…) em momento algum foi a Recorrente notificada para pagar voluntariamente a divida e do prazo que dispunha para o fazer » o que em seu entender determina a ilegalidade da instauração da execução « por incumprimento do disposto nos artigos 84.º, 85.º e "maxime" 88.º todos do CPPT, sendo que a dívida exequenda apenas coercivamente não seria exigível, o que configura o fundamento de oposição fiscal previsto na alínea i), do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.».

Vejamos se lhe assiste razão.

Comece por notar-se que a certidão de dívida que há-de constituir o título executivo e servir de base à instauração do processo de execução fiscal só pode ser extraída na sequência da falta de pagamento voluntário (cfr. artigo 88.º, n.ºs 1 e 4, do CPPT). Significa isto que a dívida só pode ser exigida coercivamente depois de ter sido facultada aos responsáveis pelo seu pagamento a possibilidade de a pagarem voluntariamente dentro de determinado prazo para o efeito (cfr. artigo 84.º do CPPT). E, nos casos em que as leis tributárias não estabeleçam prazo de pagamento, este será de 30 dias após a notificação para pagamento efectuada pelos serviços competentes (cfr. artigo 84.º, n.º2 do CPPT).

Pois bem, no caso em presença, resulta do probatório que a Recorrente constituiu mandatários no processo de averiguações n.º .......... (que correu termos no ISS,IP --Serviços Centrais-Departamento de Fiscalização-Serviços de Fiscalização de Lisboa e Vale do Tejo-Núcleo de Fiscalização de Beneficiários e Contribuintes – Sector de Santarém), tendo os mesmos sido notificados do despacho de concordância do Director do Serviço de Fiscalização de LVT, que recaiu sobre o Relatório Final, através do ofício de n.º ....., de 26.11.2010.

Pese embora conste daquele ofício que: « (…) a partir da data do registo do presente oficio, respeitada a dilação de 3 dias, essa entidade é considerada definitivamente em dívida de contribuições para com a Segurança Social, na importância de 1.804.721,39 €», a verdade é que é completamente omisso quanto à indicação de qualquer elemento relativo ao prazo para o pagamento voluntário da quantia ali mencionada.

E, foi perante esta realidade fáctica que o Tribunal de 1.ª Instância considerando que « (…) no final do processo de averiguações nº .........., a oponente foi notificada, na pessoa dos seus mandatários, que é considerada definitivamente em divida de contribuições para com a segurança social, na importância de € 1.804.721,39.» entendeu que a comunicação operada através do oficio inscrito na aal. I) do probatório, « constitui um verdadeiro acto de liquidação, pois é através dela que a oponente fica a conhecer a decisão que irá alterar a sua situação contributiva.».

Ora, salvo o devido respeito, discordamos deste entendimento, pelas razões que passamos a explicar.

Conforme supra dissemos, a Recorrente foi objecto de processo de averiguações que viria a culminar com a elaboração do Relatório Final, no qual concluiu que: « a) A Entidade Empregadora em apreço não incluiu nas declarações de remunerações enviadas à Segurança Social, como legalmente estava obrigada, a totalidade das remunerações respeitantes ao período Janeiro de 2006 a Abril de 2010, da generalidade dos seus trabalhadores, identificados no mapas de apuramento, anexo como documentos de fls. 5801 a 5836;

b) A Entidade Empregadora violou assim o disposto no nº 1 e nº 2 do art° 56° da Lei 4/2007, de 16 de Janeiro, e art° 6° do Dec - Regulamentar nº 26/99, de 27 de Outubro, do qual decorre a obrigação, por parte da entidade empregadora, de entregar as declarações de remunerações até ao dia 15 do mês seguinte a que se verificou o exercício de actividade por parte dos trabalhadores;».

E determinou, em consequência:

«- o suprimento oficioso das Declarações de Remunerações, ao abrigo das competências previstas na alínea c) do n° 2 do artigo 10º da Portaria n° 638/2007, de 30 de Maio, republicados pela Portaria nº 1460-A/2009, de 31 de Dezembro e do artigo 33° do Decreto Lei nº 8-B/2002, de 15 de Janeiro;

- Liquidar as contribuições totais no valor de 1.804.721,39 Euros, correspondentes aos valores que não foram objecto de incidência de taxa social única, inscritos no mapa de apuramento, anexo ao processo de 5801 a 5836, que dele fazem parte integrante.».

Ora, a comunicação operada pelo ofício a que nos vimos reportando, não constitui qualquer acto de liquidação, desde logo, porque o Relatório Final que foi comunicado por via do referido oficio é claro ao ordenar o «suprimento oficioso das Declarações de Remunerações, ao abrigo das competências previstas na alínea c) do n° 2 do artigo 10º da Portaria n° 638/2007, de 30 de Maio, republicados pela Portaria nº 1460-A/2009, de 31 de Dezembro e do artigo 33° do Decreto Lei nº 8-B/2002, de 15 de Janeiro;» e que se liquide « as contribuições totais no valor de 1.804.721,39 Euros, correspondentes aos valores que não foram objecto de incidência de taxa social única, inscritos no mapa de apuramento, anexo ao processo de 5801 a 5836, que dele fazem parte integrante.».

Por isso, o Relatório Final de Averiguações não é, nem nunca poderia ser considerado uma liquidação, mas apenas o apuramento das responsabilidades da Recorrente de acordo com os dados obtidos no âmbito do procedimento. Note-se, por último, que são diferentes as entidades a quem compete a acção de averiguações e aquela que promove a execução do registo oficioso das Declarações de Remunerações e a notificação para pagamento voluntário da quantia apurada em sede do procedimento de averiguações, estando esta última a cargo do Centro Distrital de Lisboa.

Tanto que assim é que, posteriormente, foi a Recorrente notificada por ofício enviado pelo Centro Distrital de Lisboa (28.03.2012) de « (…) que foram registadas oficiosamente Declarações de Remunerações no valor de 5.198.49.69, e em consequência passa essa Entidade a ser devedora à Segurança Social da importância de € 924.58 conforme taxa contributiva de 23% e de € 1.805.085.97, à taxa de 34,75% aplicada de acordo com o art. 53º da Lei 110/2009 de 16 de Setembro , alterada pela Lei 119/2009 de 30/12.» [cfr. al.M) do probatório].

Esta comunicação é, em nosso entendimento, a correspondente à notificação da liquidação [a liquidação (em sentido estrito) de um imposto (como, aliás, o apuramento de qualquer parte de um todo) se faz pela aplicação (multiplicação) de uma taxa (valor expresso em percentagem) à matéria colectável- Acórdão do TCA Norte de 08.01.2009, proferido no processo n.º 430/07.3BEPNF, disponível em texto integral em www.dgsi.pt)] que claramente indica a quantia a pagar resultante da «taxa contributiva de 23% e de € 1.805.085.97, à taxa de 34,75% aplicada de acordo com o art. 53º da Lei 110/2009.»

De resto, nem tão pouco o montante monetário constante nos ofícios identificados nas alíneas I) e M) é idêntico, o que se compreende, pois que, o procedimento de inspecção e o procedimento de liquidação são realidades distintas, traduzindo-se este último na operação matemática através da qual se aplica a taxa ao montante apurado com base nas declarações de remunerações oficiosamente elaboradas no âmbito do procedimento de inspecção.

Assim, face às circunstâncias fácticas supra referidas, embora estejamos de acordo com a sentença no que diz respeito ao prazo de 30 dias para pagamento voluntário do montante liquidado (cfr. artigo 85.º, nº 2 do CPPT), o certo é que a Recorrente não foi notificada para proceder ao pagamento voluntário da dívida em questão (sendo que é sobre a Recorrida que recai o ónus da prova dos pressupostos de que depende o seu direito de exigir a obrigação tributária - artigo 342.º, nº.1, do C.Civil; artigo 74.º, nº.1, da LGT - , designadamente que houve uma notificação validamente efectuada ou foi atingido o fim por ela visado de transmitir ao destinatário o teor da liquidação).

Sempre se diga, aliás, que o Relatório de Averiguações, sobre o qual recaiu o despacho de concordância proferido em 25.11.2010 pelo Director do Serviço de Fiscalização de LVT, do ISS, IP, não deixou de determinar «que o CDist de Lisboa promova o registo oficioso das Declarações de Remunerações, devendo este proceder à notificação do contribuinte para pagamento voluntário da dívida, com a cominação de, não o fazendo, o processo seguir para cobrança coerciva- sublinhado da nossa autoria- [Conclusão H)].

Ora, não foi isso que aconteceu na integra, pois que, embora tivesse sido efectuado o registo oficioso das Declarações de Remunerações [cfr. al.M) do probatório], não foi feita prova da notificação à Recorrente no sentido de facultar o pagamento voluntário da quantia exigida em execução fiscal, isto apesar, como vimos, de ter sido determinada.

De todo o modo, à data em que foi instaurado o processo de execução (11.04.2012- cfr. al.A) do probatório-) ainda não havia decorrido o prazo de trinta dias (contados deste a data de 28.03.2012) para a Recorrente proceder ao pagamento voluntário da quantia dita como devida.

Resulta do que se vem dizendo, que tendo o processo de execução fiscal sido instaurado sem que se mostre provada a notificação à Recorrente para proceder ao pagamento voluntário da divida exequenda, ocorre fundamento próprio para oposição, enquadrável na alínea i) do artigo 204.º do CPPT, da instauração indevida do processo executivo fiscal, com a consequente extinção do mesmo.

Nesta sequência, procede o recurso nesta parte.

Alega ainda a Recorrente que sentença violou o artigo 204.º, n.º1, alínea h) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), uma vez que « (…) é precisamente a oposição à execução fiscal deduzida com o fundamento na alínea h) do n.º1 do artigo 204.º do CPPT pois que, a lei não lhe assegurou, antes da data da citação para o processo de execução fiscal, meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação.».

Nesta matéria, a Recorrente carece de razão.

Senão vejamos.

No artigo 204.º, nº.1, alínea h), do CPPT, contemplam-se como fundamento de oposição situações «em que seja a própria lei que não prevê meio de impugnação contenciosa e não de casos em que a lei a preveja, mas ela não tenha sido posta à disposição do sujeito passivo, por ter sido omitida a necessária notificação» (Jorge Lopes de Sousa CPPT, Anotado e Comentado, Vol. III, 6ª Edição, 2011, Áreas Editora, pág. 495.).

E, concretiza Autor citado que «Casos em que a lei não assegura meios de impugnação dos actos de liquidação são aqueles em que se permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio, definidor da obrigação.

E o que se passa com as contribuições para a segurança social, salvo nos casos excepcionais previstos nos artigos 175 .°, n.°- 6, e 176.° do Decreto n.° 45266, de 23-9-63.(…).Será esse acto de extracção, assim, o «acto de liquidação» a que se refere esta alínea h), que terá de existir sempre para se estar no campo de aplicação desta norma.

No entanto, não se trata de formalmente de um acto de liquidação, isto é, não se trata de um acto de administrativo formal de fixação de uma prestação tributária, pelo que não está, designadamente, dependente de qualquer procedimento tributário próprio para liquidação de tributos, nem é imposta por lei a notificação de qualquer acto antes da citação em processo de execução fiscal. » (obra e págs.496 e 497).

No caso concreto, está em causa, repetimos, uma liquidação oficiosa que resultou da iniciativa da Segurança Social em suprimento das obrigações da Recorrente, daí que, em nosso entendimento, é o processo de impugnação judicial, e não o de oposição à execução fiscal, o meio adequado para reagir contra a ilegalidade da liquidação subjacente à divida exequenda.

E, sendo assim, atento o disposto no artigo 102º, nº1, alínea a) do CPPT, a impugnação judicial teria que ser apresentada no prazo de 90 dias a contar do termo do prazo para pagamento voluntário da liquidação.

Com efeito, esclarece o citado Autor: «liquidado um tributo, é feita a notificação, podendo o sujeito passivo impugnar a liquidação, por via graciosa ou contenciosa (reclamação graciosa ou impugnação judicial, em conformidade com o preceituado nos arts. 70º, 99º e 102º do CPPT)” vide obra e pág. citada.

Finalmente, quanto à questão da pretendida convolação, desde já se adianta que não pode obter vencimento, porquanto o meio processual escolhido pela Recorrente (oposição fiscal) é o próprio face ao pedido formulado -«extinção da execução»- (Neste sentido, vide, entre muitos outros; Neste sentido vide entre muitos outros: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13.02.2019, proferido no processo n.º 244/18.9BELLE, disponível em texto em www.dgsi.pt).

Perante esta situação, não se verificando o pressuposto do erro na forma de processo, naturalmente, que fica desde logo inviabilizada a convolação requerida, já que a existência de erro na forma do processo constitui um dos pressupostos da convolação do meio processual inadequadamente utilizado no meio processual adequado, como decorre do disposto no n.º 3 do artigo 97.º da Lei Geral Tributária e no n.º 4 do artigo 98.º do CPPT.

Da dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça

Conforme entendimento expresso no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13 a que aderimos, «A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes),iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Considerando que o valor da presente causa ultrapassa o patamar de 275.000€ e que a mesma não assumiu especial complexidade, nem a conduta assumida por qualquer uma das partes, em recurso, pode considerar-se num nível reprovável, tendo-se limitado, como referido, grosso modo, à discussão da questão jurídica da falta de notificação para pagamento voluntário da liquidação que subjaz à dívida exequenda e consequência daí decorrente no âmbito da execução fiscal instaurada para cobrança coerciva da mesma.

Nada obsta, assim, a que a Recorrida seja dispensada, do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atento o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.

IV. CONCLUSÕES

I. A certidão de dívida que servir de base à instauração do processo de execução fiscal só pode ser extraída na sequência da falta de pagamento voluntário (cfr. artigo 88.º, n.ºs 1 e 4, do CPPT).

II. Se o processo de execução fiscal foi instaurado sem que se mostre provada a notificação à Recorrente para proceder ao pagamento voluntário da dívida exequenda, ocorre fundamento próprio para oposição, enquadrável na alínea i) do artigo 204.º do CPPT, derivada da instauração indevida do processo executivo fiscal, com a consequente extinção da execução.

V.DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, as juízas da 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso e, consequentemente, em revogar a sentença recorrida, julgando-se procedente a oposição determinando-se a extinção da execução.

Custas a cargo da Recorrida, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º n.º7, do RCP para ambas as partes.


Lisboa, 14 de Novembro de 2019

Ana Pinhol

Isabel Fernandes

Catarina Almeida e Sousa