Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07577/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA.
ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA DO ESTADO.
REGIME DE ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA DO ESTADO.
DEC.LEI 155/92, DE 28/7.
REPOSIÇÃO DE DINHEIROS PÚBLICOS.
PRAZO DE PRESCRIÇÃO CONSAGRADO NO ARTº.40, Nº.1, DO DEC.LEI 155/92, DE 28/7.
Sumário:1. A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução fiscal (cfr.artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).

2. A Administração Financeira do Estado, em sentido orgânico, está inserida na realidade mais vasta que é a Administração Pública, encontrando-se centralizada no Ministério das Finanças, órgão que tem por missão definir e conduzir as políticas financeiras do Estado, tal como as políticas da Administração Pública. Integram a Administração Financeira do Estado, estruturas orgânicas da administração directa do Estado, como a Direcção-Geral do Orçamento, tal como estruturas da administração indirecta do Estado, como seja a "Caixa Geral de Aposentações, I.P.".

3. O dec.lei 155/92, de 28/7, finalizou a arquitectura legislativa relativa ao Regime de Administração Financeira do Estado (RAFE), desenvolvendo o dito regime inicialmente consagrado na Lei 8/90, de 20/2.

4. Entre os seus dispositivos, o dec.lei 155/92, de 28/7, estabelece nos seus artºs.36 e seg. as normas de reposição de dinheiros públicos, designadamente pelos funcionários ou agentes da Administração Pública, cominando o artº.40, nº.1, para a obrigatoriedade da reposição das quantias indevidamente percebidas, o curto prazo prescricional de cinco anos. Tal regime visa, normalmente, os adiantamentos, abonos, subsídios ou remunerações, processados por erro ou duplicação, imputáveis aos serviços ou ao próprio funcionário, cuja reentrada nos Cofres do Estado a lei pretende seja operada com celeridade, por uma questão de segurança jurídica e para combater a inércia ou falta de diligência da Administração em recuperar o que lhe é devido.

5. O prazo de prescrição de cinco anos consagrado no artº.40, nº.1, do dec.lei 155/92, de 28/7, para a obrigatoriedade de reposição de quantias recebidas que devam entrar nos cofres do Estado, reporta-se, exclusivamente, à exigibilidade ou à possibilidade de cobrança de um crédito preexistente a favor do Estado, não contendendo com a prévia definição jurídica da obrigação de repor.

6. As importâncias pecuniárias depositadas na conta bancária não se destinavam à oponente/recorrida mas ao pensionista entretanto falecido, pelo que aquela "levantou" tais importâncias e não as "recebeu", nenhuma relação jurídica havendo entre a mesma e a "Caixa Geral de Aposentações, I.P.". Em consequência do acabado de mencionar, deve concluir-se que a situação concreta dos presentes autos não cabe na previsão do regime de reposição de dinheiros públicos previsto no dec.lei 155/92, de 28/7, assim não lhe sendo aplicável o prazo de prescrição de cinco anos consagrado no examinado artº.40, do mesmo diploma.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
A "CAIXA ………………………." deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Beja, exarada a fls.127 a 149 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a oposição deduzida pelo recorrido, Maria …………………., visando o processo de execução fiscal nº………………………, no qual este surge como executado, tendo por objecto a cobrança coerciva de dívida no montante total de € 31.085,27.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.157 a 162 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Em termos gerais, o prazo de prescrição começa a correr no momento em que o direito pode ser exercido. Este princípio, contido na primeira parte do nº1 do artigo 306 do Código Civil, tem a sua justificação na própria razão do instituto da prescrição. A prescrição funda-se na inércia injustificada do credor, quando este, podendo exercer o seu direito de reclamar o crédito, opta por o não fazer. Por conseguinte, se a prescrição se funda na inércia injustificada do credor só a partir do momento em que este está em condições de o exercer é que faz sentido começar a contar o prazo que, uma vez preenchido, determinará a prescrição;
2-A prescrição é, pois, uma forma de extinção de direitos, que assenta na necessidade de pôr termo à incerteza sobre o seu exercício e na presunção do seu abandono por parte do respetivo titular. Na base do instituto da prescrição está, portanto, a negligência real ou presumida do titular do direito, que não o exercendo dentro do prazo fixado legitima a presunção de abandono desse exercício;
3-A sentença recorrida, ao decidir em sentido inverso, incorreu em violação de lei, designadamente do disposto no artigo nº 1 do artigo 306 do Código Civil e também do artigo 40 do Decreto-Lei nº 155/92, de 28 de Julho;
4-Nestes termos e com o douto suprimento de V.ª Ex.ª deve o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida e absolvendo-se a recorrente dos pedidos.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.194 a 196 dos autos) no sentido de se conceder provimento ao recurso.
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.197 e 199 do processo), vêm os autos à conferência para deliberação.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A decisão recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.132 a 134 dos autos - numeração nossa):
1-Em 15/11/2011, o processo de execução fiscal nº………………….. foi instaurado no Serviço de Finanças de Beja, no qual surge como executada Maria ………………….., com o n.i.f. 141 395 290 (cfr.documento junto a fls.1 do processo de execução fiscal apenso);
2-O processo de execução fiscal identificado no nº.1 tem por base (cfr.documentos juntos a fls.3 a 5 do processo de execução fiscal apenso):

a. Certidão emitida em 2011.11.01, que atesta que Maria …………….., residente na Rua Escritor ……………….., nº ……, C/V D, ……….. deve à Caixa Geral …………….. o [montante] de € 30.758,92, correspondente aos valores indevidamente creditados pela C………. no período de 2002.03.01 a 2011.09.30 na conta nib …………………….., constituída no banco Caixa ……………., por perda do direito à pensão de sobrevivência; à dívida acima mencionada acrescem os respectivos juros de mora, à taxa de 0,529% ao mês, entre 2011.09.01 e 2011.10.31, no montante global de € 326,35; até pagamento da dívida continuarão a ser devidos juros de mora à aludida taxa de 0,529% ao mês; importa a certidão no valor global de € 31 085,27 (…);
b. Em anexo à certidão:

c. Nota de débito: pensão e juros de mora;

d. Informação

e. Pensionista nº …………………..;

f. Nome: Maria ………………………..

g. Conta de depósitos: ……………………………..;

h. Devedores: Maria ……………….., Rua Escritor ………….., …….., C/V D, ……..;

i. Pensão:

i. Período: desde 2002.03.01 até 2011.09.30;

ii. Pensão: € 30 758,92;

iii. Reembolso: € 0,00;

iv. Dívida: € 30 758,92;

j. Juros:

i. Período: desde 2011.09.01 até 2011.10.31;

ii. Meses: 2;

iii. Juros: € 326,35;

k. Total da dívida + juros: € 31 085,27;
(…);

3-Em 2011/12/20, a oponente assinou aviso de recepção relativo a carta enviada pelo Serviço de Finanças de Beja (cfr.documentos juntos a fls.6 a 8 do processo de execução fiscal apenso);
4-Em 2011/12/22, a presente oposição deu entrada no T.A.F. de Beja (cfr.data de entrada aposta a fls.3 dos presentes autos);
5-A oponente era co-titular da conta bancária nº. …………………, existente na Caixa ………………… (cfr.factualidade admitida no artº.6 da p.i. de oposição).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Os factos constantes das precedentes alíneas consubstanciam o circunstancialismo que, em face do alegado nos autos, se mostra provado com relevância, necessária e suficiente à decisão final a proferir, à luz das possíveis soluções de direito.
Mas, não pode ser dado como provado que a citação tenha ocorrido na data de assinatura do aviso de recepção por não ter sido feita qualquer prova do conteúdo remetido…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto, consoante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo…”.
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
6-Visando a instauração do processo de execução fiscal identificado no nº.1 supra, a exequente e ora recorrente, "Caixa …………….., I.P.", remeteu ao Serviço de Finanças de Beja um requerimento, do qual consta, além do mais, o seguinte (cfr. documento junto a fls.3 do processo de execução fiscal apenso):
"(...)
Maria …………………, pensionista nº……….., recebia, da Caixa ……………., uma pensão vitalícia que cessaria com a sua morte.
Apesar de tal pensionista ter falecido em 18/02/2002, a Caixa Geral de Aposentações, por desconhecer esse facto, creditou-lhe ainda pensões relativas aos meses de março de 2002 a setembro de 2011.
A executada levantou ilicitamente da conta de depósito à ordem nº. ………….., constituída na Agência da Caixa Geral de Depósitos de Moura, a importância de € 30.758,92, relativa a pensões creditadas em nome de Maria ………………, após o seu falecimento, ocorrido em 18/02/2002.
Na sequência daquele levantamento constituiu-se em dívida perante a Caixa …………………… no valor daquela importância, por si ilegalmente percebida.
Apesar de todas as diligências efectuadas junto da executada, nos termos dos artigos 38 e 42 do dec.lei 155/92, de 28/7, não foi possível recuperar qualquer importância, pelo que se mantém a dívida de € 30.758,92.(...).
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar parcialmente procedente a oposição deduzida pela recorrida Maria …………….., devido a prescrição parcial da dívida exequenda, no que se refere às prestações pagas anteriores a Novembro de 2006.
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Aduz o recorrente, em síntese e como acima se alude, que o prazo de prescrição começa a correr no momento em que o direito pode ser exercido. Que a sentença recorrida, ao decidir pela prescrição parcial da dívida exequenda, incorreu em violação de lei, designadamente do disposto no artº.306, nº.1, do C.Civil, e do artº.40, do dec.lei 155/92, de 28/7 (cfr.conclusões 1 a 3 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor (cfr.Pedro Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98 e seg.).
O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da L.G.Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P.Tributário), e antes de vinte anos nos termos do artº.27, do C.P.C.Impostos. Embora mais favorável ao contribuinte, o prazo actual não é de aplicação retroactiva, devendo, em tal situação, lançar-se mão dos princípios consagrados no artº.297, do C. Civil, no que diz respeito ao cômputo do mesmo. Nestes termos, o prazo de dez anos consagrado no artº.34, do C. P. Tributário, ou o prazo de oito anos consagrado no artº.48, da Lei Geral Tributária, somente se contam a partir da entrada em vigor dos respectivos diplomas (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/93, Acórdãos Doutrinais, nº.385, pág.461; ac.T.T.2ª.Instância, 29/10/91, C.T.F.365, pág.243 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2014, proc.8145/14; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94 e seg.).
Passemos à determinação do regime de prescrição a apor ao caso dos autos.
“In casu”, conforme se retira da factualidade provada (cfr.nºs.1, 2 e 6 do probatório), o opoente e ora recorrido, surge como devedor/executado do montante total de € 31.085,27, de que é credor/exequente a "Caixa …………………., I.P.".
Haverá que saber, antes de mais, se em relação à dívida exequenda objecto do processo de execução fiscal nº……………………, instaurado no Serviço de Finanças de Beja e de que a presente oposição constitui apenso, se aplica, conforme decisão do Tribunal "a quo", o regime previsto no dec.lei 155/92, de 28/7, nomeadamente, o procedimento de prescrição da reposição de dinheiros públicos previsto no artº.40, deste diploma.
Desde logo, se dirá que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C. Civil; artº.11, da L.G.Tributária).
O dec.lei 155/92, de 28/7, finalizou a arquitectura legislativa relativa ao Regime de Administração Financeira do Estado (RAFE), desenvolvendo o dito regime inicialmente consagrado na Lei 8/90, de 20/2.
A Administração Financeira do Estado, em sentido orgânico, está inserida na realidade mais vasta que é a Administração Pública, encontrando-se centralizada no Ministério das Finanças, órgão que tem por missão definir e conduzir as políticas financeiras do Estado, tal como as políticas da Administração Pública. Integram a Administração Financeira do Estado, estruturas orgânicas da administração directa do Estado, como a Direcção-Geral do Orçamento, tal como estruturas da administração indirecta do Estado, como seja a "Caixa ………………………, I.P." (João Ricardo Catarino, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Almedina, 2012, pág.123 e seg.).
Entre os seus dispositivos, o dec.lei 155/92, de 28/7, estabelece nos seus artºs.36 e seg. as normas de reposição de dinheiros públicos, designadamente pelos funcionários ou agentes da Administração Pública, cominando o artº.40, nº.1, para a obrigatoriedade da reposição das quantias indevidamente percebidas, o curto prazo prescricional de cinco anos. Tal regime visa, normalmente, os adiantamentos, abonos, subsídios ou remunerações, processados por erro ou duplicação, imputáveis aos serviços ou ao próprio funcionário, cuja reentrada nos Cofres do Estado a lei pretende seja operada com celeridade, por uma questão de segurança jurídica e para combater a inércia ou falta de diligência da Administração em recuperar o que lhe é devido (cfr.ac.S.T.A.Pleno da 1ª.Secção, 29/4/1998, rec.40276, Antologia de Acórdãos do S.T.A. e T.C.A., Almedina, ano I, nº.3, pág.44 e seg.; ac.T.C.A.Norte-1ª.Secção, 26/10/2012, proc.1584/09.3BELSB).
De resto, o prazo prescricional de cinco anos, previsto no citado artº.40, nº.1, do dec.lei 155/92, de 28/7, é igual ao consagrado no artº.35, do mesmo diploma, quanto à restituição de receitas que tenham dado entrada nos cofres do Estado, não havendo direito a tal arrecadação.
Da exegese do regime de reposição de dinheiros públicos, previsto nos aludidos artºs.36 a 42, do dec.lei 155/92, de 28/7, deve concluir-se que o mesmo se aplica, essencialmente, a funcionários ou agentes da Administração Pública, categorias que o legislador expressamente prevê no artº.36, nº.2, do diploma. No mesmo sentido, vão, de resto, as normas do artº.36, nºs.1 e 3, ao estabelecer que a reposição de dinheiros públicos que devam reentrar nos cofres do Estado, se pode efectivar através de compensação ou por dedução não abatida, sendo que, somente quando tais hipóteses não sejam praticáveis, se prevê a possibilidade do quantitativo a repor ser entregue nos cofres do Estado por meio de guia.
Em conclusão, o prazo de prescrição de cinco anos consagrado no artº.40, nº.1, do dec.lei 155/92, de 28/7, para a obrigatoriedade de reposição de quantias recebidas que devam entrar nos cofres do Estado, reporta-se, exclusivamente, à exigibilidade ou à possibilidade de cobrança de um crédito preexistente a favor do Estado, não contendendo com a prévia definição jurídica da obrigação de repor.
Revertendo ao caso dos autos, do exame da factualidade provada deve concluir-se que os pagamentos subsequentes à data de óbito da pensionista Maria ………………. (18/02/2002 - cfr.nº.6 do probatório), efectuados devido a desconhecimento do facto extintivo, carecem em absoluto de suporte legal, pois falece-lhes o direito que os justifica, sendo tidos como meros actos jurídicos de pagamento, e não actos administrativos, definidores de qualquer relação jurídica do mesmo cariz que já não existe.
Por outro lado, na situação concreta dos presentes autos as quantias depositadas pela recorrente "Caixa ………………., I.P." na conta de depósito à ordem nº. ………., constituída na Agência da …………… de Moura, não foram recebidas pela oponente/recorrida mas antes depositadas na conta de que a mesma era co-titular com a falecida Maria ……………………. E sabendo a opoente/recorrida da proveniência de tais quantitativos não deveria efectuar o levantamento das importâncias pecuniárias em causa, as quais iam sendo creditadas pela recorrente em nome da falecida Maria ………………….. Por outras palavras, aquelas importâncias não se destinavam à oponente/recorrida mas ao pensionista entretanto falecido, pelo que a oponente/recorrida "levantou" tais importâncias e não as "recebeu", nenhuma relação jurídica havendo entre a mesma e a "Caixa …………………, I.P.". Em consequência do acabado de mencionar, deve concluir-se que a situação concreta dos presentes autos não cabe na previsão do regime de reposição de dinheiros públicos previsto no dec.lei 155/92, de 28/7, assim não lhe sendo aplicável o prazo de prescrição de cinco anos consagrado no examinado artº.40, do mesmo diploma (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/4/2002, rec.26676).
Arrematando, à dívida exequenda objecto do processo de execução fiscal nº.0248-2011/104841.4 aplica-se o prazo ordinário (vinte anos) de prescrição previsto na lei civil (cfr.artº.309, do C.Civil), e respectivas causas de suspensão e interrupção (cfr.artºs.318 e 323 e seg. do C.Civil), pelo que não ocorreu, na situação concreta dos presentes autos, a invocada prescrição.
Face ao exposto, desnecessário será o exame do argumento relativo à alegada violação do artº.306, nº.1, do C.Civil.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se procedente o presente recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida a qual padece do vício de erro de julgamento de direito que se consubstancia na violação do regime de prescrição previsto no artº.40, do dec.lei 155/92, de 28/7, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA E JULGAR TOTALMENTE IMPROCEDENTE A PRESENTE OPOSIÇÃO.
X
Condena-se o recorrido em custas, sem prejuízo da dispensa do pagamento da taxa de justiça devida no âmbito da instância de recurso.
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 10 de Julho de 2015


(Joaquim Condesso - Relator)


(Jorge Cortês - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)