Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1/10.0BEPDL
Secção:CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO
Data do Acordão:06/07/2018
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IRC
CUSTOS
Sumário:Nos termos do n.º 3 do artigo 11º do CIRC os rendimentos provenientes de qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola exercida, ainda que a título acessório, em ligação com essas actividades e, nomeadamente, os provenientes de publicidade, direitos respeitantes a qualquer forma de transmissão, bens imóveis, aplicações financeiras e jogo do bingo, não são considerados rendimentos directamente derivados do exercício das actividades indicados no n.º1 do mesmo normativo, para efeitos da isenção aí previstas, ou seja dá-lhe o tratamento de rendimentos sujeitos a imposto e dele não isentos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
GRUPO ..... recorre para este Tribunal Central Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada que julgou improcedente a impugnação judicial que deduziu contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectiva (IRC) e respectivos juros compensatórios, do exercício fiscal de 2006, no montante total de €28.387,47.

Nas alegações de recurso que apresenta, o recorrente formula as seguintes Conclusões:
«1. Entende a Recorrente que a sentença recorrida,
a. Ao considerar que o valor que a ..... concedeu ao Impugnante no ano de 2006, com vista à realização do evento desportivo ".....", não configura um donativo, mas antes uma contrapartida comercial pela prestação de serviços de publicidade, e
b. Ao afastar a aplicação da isenção de IRC prevista no artigo 11°, n°1 e 2 do CIRC, para aplicar a regra plasmada no n°3 desse artigo 11° do CIRC,
Faz uma errada interpretação e aplicação do direito e viola o disposto no artigo 11°, n°1 e 2 do CIRC. E isto porque:
2. EM PRIMEIRO LUGAR: O acordo celebrado entre o Impugnante e a ....., apesar de denominado pelas partes de "Acordo de Patrocínio" não configura um verdadeiro patrocínio. Na verdade:
2.1. O Juiz não está vinculado à denominação que as partes atribuem a um acordo;
2.2. A divulgação do nome da ..... em placards e outros elementos alusivos ao evento desportivo em causa não corresponde a uma contrapartida comercial ou económica da verba recebida;
2.3. Corresponde, isso sim, a uma mera cortesia que a Impugnante quis fazer à ....., enquanto doadora e mecenas do evento, como forma de agradecimento e reconhecimento pela quantia doada;
2.4. Tanto mais que o acordo celebrado nem sequer contempla a obrigação de o Impugnante divulgar a actividade e produtos da ....., promover as suas marcas, salientar os seus produtos e serviços, destacar os benefícios desses produtos, serviços ou marcas, granjear clientela, etc., como é típico da publicidade e patrocínio. O acordo apenas prevê - e foi apenas isso que o Impugnante fez - a divulgação do nome e logotipo do mecenas do evento.
3. EM SEGUNDO LUGAR: Sendo aplicável ao caso dos autos o já revogado Estatuto do Mecenato (aprovado pelo Decreto-Lei 74/99 de 16 de Março) - no qual estariam abrangidos os donativos, considerados como as prestações de carácter gratuito em que impera o espírito de liberalidade do doador (VD. artigo 1°, n°2 do referido diploma) - foi a própria Direcção Geral dos Impostos que emitiu uma Circular (2/2004 de 20 de Janeiro) de onde se retira que o facto de existirem contrapartidas recebidas pelo doador não é, por si só, razão suficiente para excluir tais donativos do âmbito do Estatuto do Mecenato, devendo atentar-se nas contrapartidas concretas recebidas o no facto de as mesmas terem sido desejadas pelo doador, de tal modo que se possa pôr em causa o espírito de liberalidade. E no caso dos autos:
4.1. O valor de mercado das menções ao nome e logotipo da ..... não ultrapassou o limite anual de 5% do valor do donativo concedido;
4.2. A divulgação do nome da ..... foi feita de forma meramente institucional, sem que tenha sido feita qualquer publicidade, menção ou divulgação de natureza comercial, nomeadamente a referência a marcas, produtos ou serviços prestados pela .....;
4.3. O facto de ao Rallye em causa ter sido atribuído o nome "....." - por ser o grande mecenas do evento - não afasta o facto de a divulgação da designação social e logotipo da ..... ter sido feita de forma discreta e num plano secundário relativamente ao evento. Tanto mais que a maior divulgação feita no evento reportou à Região Autónoma ..... e não a mecenas.
4.4. Pelo que, a divulgação feita no evento, pelo Impugnante, ao nome do mecenas (.....) não é suficiente para excluir a qualificação da verba recebida como donativo.
5. EM TERCEIRO LUGAR: também não poderá dizer-se que a verba doada ao Impugnante pela ..... constitua um rendimento proveniente de serviços de publicidade (contrapartida comercial por parte da Impugnante) já que o que saiu verdadeiramente publicitado com a realização do evento em causa não foi a ....., mas sim a Região Autónoma ....., que era a principal visada na divulgação do Rallye. Aliás:
5.1. Até ao ano de 2006, era o Governo Regional ..... o principal mecenas dos eventos desportivos organizados pela Impugnante no cumprimento do seu objeto social,
5.2. Mas, por razões de controlo orçamental, o Governo Regional ..... entendeu que os apoios que vinha conferindo ao Impugnante deveriam passar a ser conferidos também pela ..... que é, como se sabe, detida na sua totalidade pelo Governo Regional ......
5.3. Ou seja, foi o Governo Regional ..... que continuou a prestar o seu apoio ao Impugnante:
• Quer directamente, através do arranjo das estradas e infraestruturas por onde passam os troços do Rallye,
• Quer indirectamente, através do donativo financeiro concedido pela ....., por indicação do Governo Regional.
5.4. E, deste modo, não se percebe por que motivo a Autoridade Tributária deixou de considerar uma tal quantia (desta feita entregue pela .....) como isenta de IRC - como aliás sempre sucedera até aí - para passar a considera-la como sujeita a esse imposto;
5.5. Tanto mais que tais verbas não culminaram em "lucro" para o Impugnante, mas em verbas indispensáveis à prossecução da sua actividade estatutária e, concretamente, à organização do evento.
6. EM QUARTO LUGAR: O retorno que a ..... possa, eventualmente, ter obtido, em sede de potenciação de lucros, com a divulgação do seu nome feita pelo Impugnante terá sido muito reduzido ou quase nulo. Com efeito:
6.1. Basta atentar no facto de, ao tempo, a ..... ser responsável, conjuntamente com a ….., pela totalidade dos voos realizados entre o Continente e …..,
6.2. Sendo que 80% desses voos eram realizados com aviões da .....,
6.3. Para se concluir que a divulgação do nome da ....., enquanto mecenas do evento, não correspondeu a uma efectiva ou relevante contrapartida pecuniária ou comercial.
7. Em face do exposto, conclui-se que a verba concedida pela ..... ao Impugnante, com vista à realização de um evento desportivo, consubstancia um verdadeiro donativo, efectuado como uma clara liberalidade e sem qualquer contrapartida digna de relevo a favor do doador.
8. Ao não concluir deste modo, a decisão recorrida faz uma errónea interpretação e aplicação do direito, pelo que deverá ser substituída por outra que conclua que a verba concedida pela ..... ao Impugnante constitui um donativo.
9. EM QUINTO LUGAR: a decisão recorrida também esteve mal ao concluir que não há, no caso em apreço, lugar à aplicação da isenção no pagamento de IRC a que se refere o artigo 11°, n°1 e 2 do CIRC, uma vez que:
9.1. Estamos perante um rendimento directamente derivado do exercício de actividade desportiva, que é a actividade estatutária do Impugnante;
9.2. Não foram distribuídos resultados aos associados do Impugnante;
9.3. Os membros dos órgãos sociais do Impugnante não tiveram, por si ou interposta pessoa, qualquer interesse directo ou indirecto nos resultados de exploração das actividades prosseguidas;
9.4. O Impugnante dispunha de contabilidade e escrituração que abrange todas as suas actividades e que pôs à livre disposição dos serviços fiscais, designadamente para comprovação do supra referido.
9.5. Ou seja, a importância monetária que o Impugnante recebeu da ..... reúne todos os pressupostos para atribuição da isenção de IRC, tal como previstos no artigo 11°, n°1 e 2 do CIRC,
9.6. E não se verificou qualquer facto que, atendendo ao teor do n°3 do artigo 11° do CIRC, pudesse colocar em causa a isenção em sede de tal imposto, na medida em que, em função do que já acima se disse, a importância monetária que o Impugnante recebeu da ..... não provém de qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola e, concretamente, não provém de serviços de publicidade prestados a favor da ....., os quais a Impugnante nunca realizou.
10. Ao não concluir deste modo, a decisão recorrida faz uma errónea interpretação e aplicação do direito e viola o disposto no artigo 11°, n°1 e n°2 do CIRC pelo que deverá ser substituída por outra que determine que o donativo concedido pela ..... ao Impugnante está isento do pagamento de IRC.
Termos em que espera o Impugnante/Recorrente ver concedido integral provimento ao presente recurso, como será de JUSTIÇA.».

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A Fazenda Pública, notificada, apresentou contra-alegações, das quais extraiu as seguintes conclusões:
«a) Foi, efectivamente, feita uma justa apreciação da situação submetida a análise;
b) Está a douta decisão bem fundamentada, ungida de todas as formalidades legais, assim como, desferidos de quaisquer ilegalidades os actos tributários subjacentes;
c) Concretizou a douta sentença a delimitação correcta dos pressupostos de direito concretamente aplicados em torno da questão em apreço;
d) Verifica-se, indubitavelmente, por um contrato entre o Grupo ..... e a Recorrente, o qual se traduz, mormente, em contrapartidas publicitárias, nomeadamente da promoção do donatário, junto do público em geral, logo, tais serviços são efetivamente enquadráveis como não isentos, de acordo com a previsão do nº3 do artigo 11º do CIRC;
e) Acresce a cláusula contratual de não concretização de atividades que possam colidir com a concorrência do Grupo ......

Termos em que, e sempre com o doutro provimento dos Senhores juízes Desembargadores, não deve ser dado provimento ao presente recurso, mantendo-se in totum a decisão recorrida e os correspondentes atos tributários.
Fazendo-se, desta forma, a acostumada Justiça!»

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Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
De acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Ora compulsando tais conclusões do recurso verifica-se que a única grande questão que importa aqui a apreciar consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao considerar que não há lugar à aplicação da isenção no pagamento de IRC a que se refere o artigo 11°, n°1 e 2 do CIRC.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a fundamentação respectiva que nos seguintes termos:

«1. A Impugnante é uma associação de recreio e desporto, sem fins lucrativos, que tem por objeto: promover, incentivar e desenvolver a prática dos desportos em geral e dos motorizados em particular; colaborar com as entidades oficiais e particulares, no desenvolvimento do turismo na Região e do motorismo e na organização de competições desportivas; promover relações de convívio entre os seus associados, através de reuniões ou manifestações de carácter social, cultural, artístico, recreativo, técnico e desportivo; e cuidar da defesa dos interesses dos associados, procurando conseguir para eles as vantagens e regalias possíveis. (estatutos disponíveis em http://www.gdc. com.pt/estatutos.html);

2. O Impugnante organiza anualmente, entre outras, a prova internacional “.....” (acordo);

3. Desde o ano de 2000 que o Impugnante beneficia do estatuto de utilidade pública

4. Em 04/04/2006, o Impugnante e a “..... S.A.”, subscreveram um “Acordo de patrocínio” nos termos do qual esta concederia ao GDC um apoio no montante de 169.500,00€, obrigando-se este a realizar, em 2006, a prova “..... ”, designadamente nos seguintes termos:

(Texto no Original)
(Texto no Original)
(Texto no Original)
(Texto no Original)

(Texto no Original)

– cfr. fls. do processo administrativo apenso.

5. A Impugnante recebeu os montantes em causa. – cfr. fls. do processo administrativo apenso.

6. Por ordem de serviço OI..... de 13/04/2009, foi determinada uma ação de inspeção externa à ora Impugnante, com início em 08/06/2009 e término no dia 09/07/2009, compreendendo a “análise da situação tributária do GDC, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), para o exercício de 2006” e que foi proposta “no decorrer da análise externa à Fábrica ....., S.A., onde foram detetados 2 recibos referentes a publicidade, que não cumpriam os preceitos legais”.

7. No âmbito do procedimento inspetivo, foi emitido “Relatório de Inspeção Tributária”, do qual consta, designadamente, o seguinte:
(…)

(Texto no Original)
(…)

(…)

(Texto no Original)




(Texto no Original)
(Texto no Original)
(Texto no Original)








(Texto no Original)








(…)


(Texto no Original)


(Texto no Original)


(…)

– cfr. fls. do processo administrativo apenso.

8. Dão-se por reproduzidos os documentos anexos ao relatório de inspeção: balancetes analíticos, cheques.

9. Em resultado do procedimento inspectivo levado a cabo, foi emitida, em 26/08/2009, a liquidação com o n.º....., relativa ao ano de 2006, no montante de € 28.387,47 e nota de cobrança com tal montante. – cfr. fls. do processo administrativo apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

10. Em 02/02/2010, deu entrada no Serviço de Finanças de ….., reclamação graciosa da liquidação, cuja apensação foi ordenada aos presentes autos.


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FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram outros factos com relevo para a decisão em causa.

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos e do processo administrativo constam, tudo conforme referido a propósito de cada um dos pontos do probatório.»

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B.DE DIREITO
A questão a decidir nestes autos, conforme já afirmamos, consiste em saber se a quantia de € 169.590.00 entregue pela “..... S.A.” à Impugnante configura um donativo ou um proveito nos termos da al.b) do n.º1 e n.º4 ambos do CIRC.
Sobre esta questão respondeu-se na sentença recorrida da forma que se passa a transcrever: «À data dos factos, os donativos estavam regulados no Estatuto do Mecenato, com o Decreto-Lei n.º74/99, de 16 de março de 1999 [tendo sido posteriormente incluídos no Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), no Capítulo X - que tem atualmente os artigos 61º a 66.º. O que aconteceu com a aprovação do Orçamento do Estado para 2007, que também revogou o Estatuto do Mecenato].
Em princípio, poderemos falar em donativos no caso de uma empresa (ou pessoa singular) atribuir um valor monetário ou oferta de bens, sem objetivo de obter contrapartidas com essa atribuição.
No artigo primeiro, que aprova o Estatuto do Mecenato, começa por dizer-se que “Para os efeitos do disposto no presente diploma, apenas têm relevância fiscal os donativos em dinheiro ou em espécie concedidos sem contrapartidas que configurem obrigações de carácter pecuniário ou comercial às entidades públicas ou privadas nele previstas, cuja atividade consista predominantemente na realização de iniciativas nas áreas social, cultural, ambiental, desportiva e educacional”.
No caso, imediatamente ressalta que, no contrato assinado por ambas as partes, se estabelece que se trata de um “Acordo de Patrocínio”, sem que se tenha dito tratar-se de doação ou sem que se tenha estabelecido a inexistência de contrapartidas e tampouco se faz referência ou reporte a antecedente entrega de subsídios por entidades públicas.
Antes estamos perante um contrato sinalagmático oneroso, uma vez que há o recebimento de quantia, que tem como contrapartida uma vantagem e que se enquadra na definição constante do artigo 3.º n.º l do Código de Publicidade.
É que, nos termos do artigo 3º nº1 do Código da Publicidade (CPub) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23/10, considera-se publicidade, (...), qualquer forma de comunicação feita no âmbito de uma atividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objetivo de promover o fornecimento de bens ou serviços, incluindo direitos e obrigações”.
A publicidade é, pois, um instrumento ao serviço da atividade económica; com ela se visa propiciar o conhecimento por parte do público da existência da empresa, da atividade que desenvolve, da qualidade ou potencialidade dos produtos ou serviços produzidos ou comercializados.
Por outro lado, para que se possa falar em contrato de publicidade é necessário, como em qualquer outro negócio, um acordo de vontades entre dois sujeitos e direitos e obrigações para ambos, a relação de sinalagma.
A publicidade integra, pois, um contrato de prestação de serviços [cfr. igualmente o artigo 1.º e artigo 4.º do CIVA. O artigo 4.º do CIVA dispõe, sobre o conceito de prestação de serviços, no seu n.º1, que “são consideradas como prestações de serviços as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens ”. Para que se considere que existe uma prestação de serviços em sede de IVA, deverá existir um serviço enquadrável numa atividade económica. Isto é, se existe, ou não, uma operação com substância económica que se possa tributar a título de prestação de serviços. A prestação de serviços só será tributável em sede de IVA se existir um nexo direto entre o serviço prestado e a contrapartida recebida, de acordo com a teoria das contraprestações recíprocas (cfr. Clotilde Celorico Palma e Outros, Código do IVA e RITI, Notas e Comentários, Almedina, 2014, pág.66 e seg)].
Note-se que no “Acordo de Patrocínio” celebrado, para além de se atribuir o nome “.....” ao evento desportivo, se refere que o CGD, ora Impugnante, se obriga a proporcionar contrapartidas publicitárias, designadamente pela colocação de placards, logotipos em camisas, bonés, painéis publicitários e ainda “compromete-se a não efetuar publicidade de qualquer tipo a empresa com atividade que possa ser concorrencial com a de empresas que pertençam ao Grupo ....., nomeadamente publicidade que possa beneficiar companhias de aviação com atividade doméstica ou internacional”.
Ora, em face da factualidade provada, nenhuma dúvida resta de que esse sinalagma existe: o Impugnante obrigou-se a difundir a mensagem publicitária, quer nas suas instalações, quer no equipamento desportivo, quer no evento e comunicações à imprensa; como contrapartida, a empresa ..... efectuou-lhe entregas monetárias. Não resultando dos autos, indubitavelmente, a que se destinaram tais quantias recebidas.
Nesta situação existe, pois, uma contrapartida económica para ambas as partes (pelo Impugnante, os montantes recebidos e, pela empresa, a publicitação dos seus produtos e serviços, potenciadores de maiores proventos), a qual exclui o animus donandi típico dos donativos.
Assim, nas relações diretas entre a Impugnante e ....., e dado que existem prestações / obrigações para ambas as partes, só cabe a classificação de negócio oneroso, no caso, qualificado de prestação de serviços.
Aliás, o patrocínio referido no contrato está explicitamente previsto como uma das formas especiais de publicidade: entende-se por patrocínio (...), a participação de pessoas singulares ou coletivas no financiamento de quaisquer obras audiovisuais, programas, reportagens, edições, rubricas ou secções, (...), independentemente do meio utilizado para a sua difusão, com vista à promoção do seu nome ou imagem, bem como das suas atividades, bens ou serviços (cf. artigo 24.º n.º 1 do CPub).
Pelo exposto, entende-se que, quanto a esta questão, a razão caberá à Administração Tributária e que, contrariamente ao entendimento do Impugnante, o montante de € 169.590,00, que lhe foi considerado, não pode ser tido como integrando um mero donativo, antes integrando um negócio oneroso de prestação de serviços.
Crê-se que só assim não seria - isto é, não se poderia considerar como “publicidade”, - a simples menção do nome do doador, como modo de mero reconhecimento público, feita em folhetos, revistas e outros documentos, editados a propósito da realização dos eventos. E, só assim, se afastaria a ideia do patrocínio como uma contrapartida.
Mas este não é, claramente, o caso dos autos, ademais porque há um dever de não inserir outras marcas diretamente concorrentes em tais meios publicitários, havendo a divulgação do produto e atividade prosseguidas pela ......
Conclui-se, portanto, que não se trata de donativo.»
A recorrente não se conforma com essa decisão, alegando, que: «O acordo celebrado entre o Impugnante e a ....., apesar de denominado pelas partes de "Acordo de Patrocínio" não configura um verdadeiro patrocínio.»[Conclusão 2] na medida em que «A divulgação do nome da ..... foi feita de forma meramente institucional, sem que tenha sido feita qualquer publicidade, menção ou divulgação de natureza comercial, nomeadamente a referência a marcas, produtos ou serviços prestados pela .....» [Conclusão 4.2];« O facto de ao Rallye em causa ter sido atribuído o nome "..... " - por ser o grande mecenas do evento - não afasta o facto de a divulgação da designação social e logotipo da ..... ter sido feita de forma discreta e num plano secundário relativamente ao evento. Tanto mais que a maior divulgação feita no evento reportou à Região Autónoma ..... e não a mecenas.» [Conclusão 4.3];«O retorno que a ..... possa, eventualmente, ter obtido, em sede de potenciação de lucros, com a divulgação do seu nome feita pelo Impugnante terá sido muito reduzido ou quase nulo[Conclusão 6].
Não se vislumbra como acolher a posição defendida pela recorrente, isto porque, resulta da matéria dada como provada que aquela em troca de vantagem económica (montante recebido) se obrigou à prática de um conjunto de actos (organizar, produzir publicitar, proporcionar, colocar utilizar) e a uma omissão (não publicitar a concorrência).
Quer dizer, que face aos argumentos fáctico-jurídicos expendidos na sentença não existe a mínima razão para dela divergir cuja matéria de facto fixada não foi impugnada.
No que respeita à pretendia isenção no pagamento do IRC, escreveu-se na sentença recorrida: «Dispunha o artigo 10.º do CIRC (Redação dada pelo artigo 44º da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro), designadamente:
1- Estão isentas de IRC: (…)
c) As pessoas coletivas de mera utilidade pública que prossigam, exclusiva ou predominantemente, fins científicos ou culturais, de caridade, assistência, beneficência, solidariedade social ou defesa do meio ambiente.
2- A isenção prevista na alínea c) do número anterior carece de reconhecimento pelo Ministro de Estado e das Finanças, a requerimento dos interessados, mediante despacho publicado no Diário da República, que define a respetiva amplitude, de harmonia com os fins prosseguidos e as atividades desenvolvidas para a sua realização, pelas entidades em causa e as informações dos serviços competentes da Direcção-Geral dos Impostos e outras julgadas necessárias
3- A isenção prevista no n.º 1 não abrange os rendimentos empresariais derivados do exercício das atividades comerciais ou industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários, bem como os rendimentos de títulos ao portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor, e é condicionada à observância continuada dos seguintes requisitos:
a) Exercício efetivo, a título exclusivo ou predominante, de atividades dirigidas à prossecução dos fins que justificaram o respetivo reconhecimento da qualidade de utilidade pública ou dos fins que justificaram a isenção, consoante se trate, respetivamente, de entidades previstas nas alíneas a) e b) ou na alínea c) do n.º 1;

Por sua vez, o artigo 11.º, sob a epígrafe “Atividades culturais, recreativas e desportivas”, dispunha:
1- Estão isentos de IRC os rendimentos diretamente derivados do exercício de atividades culturais, recreativas e desportivas.
2- A isenção prevista no número anterior só pode beneficiar associações legalmente constituídas para o exercício dessas atividades e desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes condições:
a)Em caso algum distribuam resultados e os membros dos seus órgãos sociais não tenham, por si ou interposta pessoa, algum interesse direto ou indireto nos resultados de exploração das atividades prosseguidas;
b)Disponham de contabilidade ou escrituração que abranja todas as suas atividades e a ponham à disposição dos serviços fiscais, designadamente para comprovação do referido nas alíneas anteriores.
3- Não se consideram rendimentos diretamente derivados do exercício das atividades indicadas no nº1, para efeitos da isenção aí prevista, os provenientes de qualquer atividade comercial, industrial ou agrícola exercida, ainda que a título acessório, em ligação com essas atividades e, nomeadamente, os provenientes de publicidade, direitos respeitantes a qualquer forma de transmissão, bens imóveis, aplicações financeiras e jogo do bingo. (sublinhado nosso).
Decorre das normas aplicáveis que, na esfera das entidades que recebem donativos e não prosseguindo estas, a título principal atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, os donativos serão considerados isentos de IRC quando destinados à direta e imediata realização dos fins estatutários.
Como se disse, para as empresas, estas contribuições voluntárias podem ter como objetivo obter ou consolidar uma imagem institucional de responsabilidade cívica, sem que isso coloque em causa o espírito de liberalidade do mecenas. Será o caso quando existe uma mera divulgação pública do nome dos mecenas que contribuíram para uma dada iniciativa ou evento.
Mas já estaremos perante patrocínio se se visa associar a tal iniciativa ou os produtos comercializados pelo “doador”, ou que, mesmo que seja apenas o seu nome, o objetivo seja a promoção comercial junto dos consumidores. São atos de publicidade que proporcionam rendimentos não isentos de imposto.».
Ora, acompanhando-se, como se acompanha inteiramente este entendimento nenhuma censura merece a sentença. Com efeito, a pretendida isenção não abrange, os rendimentos provenientes de qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola exercida, ainda que a titulo acessório, em ligação com essas, e, nomeadamente, os provenientes de publicidade (cfr. artigo 11º, n.º1 do CIRC).
Improcede, pois, o recurso interposto pela Impugnante, razão pela qual a sentença recorrida é de manter.
IV.CONCLUSÕES
Nos termos do n.º 3 do artigo 11º do CIRC os rendimentos provenientes de qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola exercida, ainda que a título acessório, em ligação com essas actividades e, nomeadamente, os provenientes de publicidade, direitos respeitantes a qualquer forma de transmissão, bens imóveis, aplicações financeiras e jogo do bingo, não são considerados rendimentos directamente derivados do exercício das actividades indicados no n.º1 do mesmo normativo, para efeitos da isenção aí previstas, ou seja dá-lhe o tratamento de rendimentos sujeitos a imposto e dele não isentos.
V. DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 7 de Junho de 2018.
[Ana Pinhol]

[Jorge Cortês]

[Lurdes Toscano]