Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:00514/05
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/29/2014
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:AAE; RECLAMAÇÃO DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL; ERRO NA FORMA DE PROCESSO
Sumário:A reclamação de actos do órgão de execução fiscal, prevista no art. 276.º do CPPT é a forma processual adequada para a satisfação da pretensão da A. quando o efeito jurídico que se pretende obter é o da anulação do acto compensação e consequente devolução dos montantes dos reembolsos aplicados na execução fiscal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


PROCESSO N.º 00514/05

I. RELATÓRIO

CAMINHOS DE FERRO PORTUGUESES, EP, NIF n.º ... , com demais sinais nos autos, vem “recorrer contenciosamente” nos termos do art. 97.º, n.º 1, al. p) do CPPT, do “despacho n.º 768/2004 – XV de 23/03/04 da autoria de SESEAF e actos de execução daquele, designadamente do acto do Sr. Director de Serviços de Justiça Tributária e do acto do Sr. Chefe de Finanças de Lisboa 03”, e formulado o pedido de que “seja provido o presente recurso revogando-se os actos recorridos (…) ordenado o reembolso à CP dos créditos de imposto, que entraram em compensação (…)” tendo a presente acção sido distribuída e autuada, no então, Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Lisboa, na forma processual de ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL.

A A. alega, em síntese, enquanto causa de pedir, a ilegalidade dos actos impugnados, com os seguintes fundamentos:
_ Não se encontram preenchidos os pressupostos previstos no art. 89.º do CPPT, para a compensação de dívidas por iniciativa da Administração Tributária (AT), uma vez que: a alínea d) do n.º 3 daquele preceito legal viola a legislação “comunitária”, devendo ser considerado como inaplicável; a pendência de várias impugnações sobre a legalidade da dívida obsta a que seja efectuada a compensação, tendo sido dispensada a prestação de garantia; a dívida aduaneira foi suspensa, nos termos do art. 244.º do Código Aduaneiro Comunitário, pelo que a execução deveria estar suspensa;
_ “Erro acerca do Poder Discricionário”, porquanto as autoridades portugueses não podem “reger-se pelo seu livre arbítrio”, uma vez que a liquidação e cobrança da dívida em causa regem-se pelo art. 244.º do CAC, e nessa medida, com a interposição de recurso as autoridades aduaneiras devem suspender a execução da decisão sempre que “tenham motivos fundados para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira ou que seja de recear um prejuízo irreparável para o interessado”;
_ Vício de forma, por insuficiência e incongruência de fundamentação, uma vez que o despacho não fornece a justificação da revogação implícita das decisões anteriores;
_ “Erro acerca do Poder Discricionário”, uma vez que o despacho que ordenou a compensação de dívidas com créditos de imposto erra quando se arroga um poder discricionário para decidir a compensação, sendo que o CAC não foi observado, nem foi pedida qualquer garantia para suspender a dívida;
_ Há forte probabilidade de se estar a cobrar a dívida a quem não deve e não há certeza de que se está a cobrar a quem é o devedor.
_ Ofensa do caso julgado e primado das decisões judiciais, na medida em que foi concedido provimento às oposições à execução apresentadas, com excepção de uma, ou revogados os despachos de indeferimento liminar em 1.ª instância, pelo que tendo transitado em julgado, sobrepõem-se a quaisquer decisões administrativas, assim, a “compensação ao abrigo do art. 89.º do CPPT que ultrapassem os valores da oposição, que não mereceu provimento, materializam desrespeito de decisões judiciais”.

Finaliza com o pedido de revogação dos actos recorridos, e que seja “ordenado o reembolso à CP dos créditos de imposto, que entraram em compensação, acrescidos de juros à taxa legal, vencidos, contados desde a data em que devia sido processado o reembolso, e vincendos (…).”.
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O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), R. na presente acção, apresentou contestação de fls. 92 dos autos, na qual, e em síntese, invoca:
_ Por excepção:
_ Incompetência do TAF de Lisboa, em razão da hierarquia;
_ Erro na forma de processo, porquanto a A. pretende discutir a legalidade das liquidações subjacentes à dívida exequenda, e nessa medida, e o meio adequado para fazer valer a sua pretensão quanto à suspensão da execução fiscal é a reclamação prevista no art. 276.º do CPPT;
_ Por Impugnação:
_ Não foi desrespeitado qualquer preceito legal, porquanto o despacho do SEAF tem natureza meramente interpretativa da lei, e foram respeitados os requisitos legais para a compensação de dívidas;
_ Não procede a argumentação no que se reporta ao desrespeito de decisões judiciais, dado que a decisão sobre a relação material controvertida apenas tem força obrigatória dentro do processo onde foi proferida.

Finaliza peticionando, a procedência das excepções, e consequentemente a absolvição do R. da instância, e assim não se entendendo, a acção deve ser julgada improcedente.
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Em 9 de Dezembro de 2004 o TAF de Lisboa conhecendo da excepção da competência do tribunal, julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer da presente Acção Administrativa Especial, mais declarando a competência do presente Tribunal Central Administrativo Sul.
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O Magistrado do Ministério Público, junto deste TCA Sul, emitiu parecer de fls. 111 dos autos, no seguinte sentido:
_ Apenas o despacho do SEAF tem relevo, considerando que os demais dois actos impugnados são actos de mera execução daquele outro;
_ A excepção de incompetência hierárquica do TAF de Lisboa já foi decidida na 1.ª instância, e merece concordância;
_ Não se verifica a excepção de erro na forma do processo, considerando que a presente situação enquadra-se no disposto na alínea p), do n.º 1 do art. 97.º do CPPT, uma vez que não está em causa a apreciação da legalidade de um acto de liquidação, mas a obrigatoriedade do cumprimento do artigo 89.º, n.º 1 do CPPT em relação à A., e nessa medida, “o recurso contencioso é o meio próprio”;
_ No que se refere ao mérito da acção, deve o recurso improceder, na medida em que o despacho recorrido não sofre nenhuma das ilegalidades apontadas.
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A A. foi notificada para se pronunciar sobre o erro na forma de processo, juntou vários documentos.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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A questão que cumpre conhecer, antes de mais, consiste em aferir se, in casu, há erro na forma de processo, apreciando e decidindo, portanto, se o presente meio processual é o adequado à satisfação da pretensão da A., considerando o pedido formulado.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Matéria de facto

Com interesse para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se assentes os seguintes factos:

A) Em 22/07/1998, na sequência de recurso hierárquico apresentado pela A. do acto tácito de indeferimento do Director da Alfândega de Aveiro do seu pedido de suspensão da cobrança da dívida aduaneira e fiscal, solicitando a anulação do título executivo prematuramente emitido por desconforme com o artigo 244.º do CAC e do artigo 255.º do CPT, foi proferido despacho pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de concordância com o parecer e respectiva informação n.º 2879/98 prévios, que determinou ao chefe do então 3.º Bairro Fiscal de Lisboa que procedesse “[a]o envio da comunicação referida no n.º 1 do art. 298.º do CPT; e proceder, de seguida, à suspensão do processo de execução nos termos do art. 255.º do CPT, sem a prestação de qualquer garantia, tendo em conta o estabelecido no art. 298.º do mesmo Código; e solicitar à executada, sempre que entenda oportuno, informação sobre as diligências e promoções tendentes ao pagamento da importância em dívida a fim de aquilatar da sustação decretada.” (cfr. teor do documento n.º 3 junto pela A. a fls. 20 e ss dos autos).
B) Em 23/03/2004 foi proferido o despacho n.º 768 pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), de concordância com o parecer do Director Geral de Serviços de Justiça Tributária e com a informação n.º 634/04, com o seguinte teor, que se transcreve na parte com interesse para a decisão (cfr. documento de fls. 159 a 160 dos autos):
“I – O Sr. Director de Finanças Adjunto da Divisão de Gestão da Dívida Executiva da Direcção de Finanças de Lisboa, coloca à consideração desta Direcção de Serviços a questão de se dever ou não cumprir o disposto no art. 89.º do CPT, relativamente a créditos tributários emitidos em nome de C.P. – Caminhos de Ferro Portugueses, EP, no valor total de € 833.022,17, respeitantes a IRC de 1998 e de 2002, tendo em consideração as dívidas de IVA pendentes em nome daquela entidade a serem exigidas coercivamente, de valor muito superior àquele montante e do Despacho de 11 de Julho de 2000 de SESEAF, que dispensou a prestação de garantia em todos os processos executivos instaurados com base nas dívidas apuradas no conjunto da designada fraude de tabaco em regime de trânsito na via ferroviária em relação a cujas liquidações foram deduzidas impugnações judiciais ainda não decididas. II. O art. 89.º do CPPT determina que os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação graciosa ou impugnação judicial de qualquer acto tributário são obrigatoriamente aplicados na compensação das suas dívidas à mesma administração tributária, salvo se pender reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução da dívida exequenda ou esta esteja a ser paga em prestações, devendo a dívida exequenda mostrar-se garantida nos termos deste Código, não referindo este normativo legal qualquer situação de excepção no que respeita às situações de dispensa de garantia. III. A Administração Tributária está, por força do disposto no art. 55.º da LGT obrigada a exercer as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários. Conclusão: Face ao que atrás se disse, somos de parecer não existir fundamento legal para a não aplicação do disposto no art. 89.º do CPPT na situação em apreço, sob pena de violação do disposto no art. 55.º da LGT, conjugado com o art. 85.º do CPPT, até face à força obrigatória da norma contida no n.º 1 do já referido art. 89.º do CPPT. (…)”
C) O pedido de esclarecimento mencionado na alínea anterior solicitado pelo Director de Finanças Adjunto da Divisão de Gestão da Dívida Executiva da Direcção de Finanças de Lisboa, surge na sequência de um pedido de esclarecimento do serviço de finanças de Lisboa-3, datado de 12/01/2004 (cfr. ofício de 27/01/2004, constante de fls. 100 do Processo Administrativo em apenso)
D) As dívidas da A. que se encontravam a ser exigidas no processo de execução fiscal n.º 3085-1998/1021885, instaurado no serviço de finanças de Lisboa-3, foram compensadas em 19/04/2004, por créditos da A. junto da AT, nos montantes de 832.540,19€ e 481,98€, em cumprimento pelo serviço de finanças de Lisboa-3 do determinado pela Direcção de Serviços de Justiça Tributária e pelo despacho n.º 768/2004-XV, de 23/03/2004 referido na alínea B) (cfr. teor do documento n.º 1 e 2 junto pela A. a fls. 18 e 19 dos autos).
E) A A. teve conhecimento da compensação de dívidas referida na alínea anterior, em 19/04/2004, pela notificação do ofício n.º 2078 do serviço de finanças de Lisboa-3 (cfr. teor do documento n.º 1 junto pela A. a fls. 18 dos autos, e confissão - art. 11.º da p.i.).
F) A p.i. foi apresentada em 09/07/2004 (cfr. fls. 1 dos autos).

A convicção do tribunal no que diz respeito à factualidade dada como provada, assentou no teor de cada um dos documentos assinados em cada um das alíneas.
Não existem factos, com interesse para a decisão, que importe registar como não provados.

2. Do Direito

Cabe então, aferir se, in casu, há erro na forma de processo, apreciando e decidindo, portanto, se o presente meio processual é o adequado à satisfação da pretensão da A..

Apreciando.

Da leitura da p.i. resulta que a A. insurge-se contra a compensação dos seus créditos nos montantes de 832.540,19€ e 481,98€, que foi efectuada no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3085-1998/1021885, instaurado no serviço de finanças de Lisboa-3.

Trata-se de compensação que foi efectuada naquele serviço de finanças em cumprimento do determinado pela Direcção de Serviços de Justiça Tributária e do despacho n.º 768/2004-XV, de 23/03/2004 do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF).

Conforme resulta do teor do próprio despacho, este é proferido na sequência de um pedido de esclarecimento feito pelo Director de Finanças Adjunto da Divisão de Gestão da Dívida Executiva da Direcção de Finanças de Lisboa, para satisfazer, por sua vez, um pedido de esclarecimento do serviço de finanças de Lisboa-3.
Ou seja, o despacho do despacho n.º 768/2004 – XV de 23/03/04 da autoria de SESEAF, sindicado nos presentes autos pela A., juntamente com os respectivos “actos de execução”, surge na sequência de uma troca de pedidos de esclarecimentos internos, com o objectivo de se determinar se havia lugar, ou não, ao cumprimento do disposto no art. 89.º do CPT, relativamente a créditos tributários emitidos em nome da A., no valor total de € 833.022,17.

Na sequência do despacho, e em conformidade com o exarado no mesmo, foram compensadas as dívidas da A. com aqueles créditos provenientes de reembolso de imposto, sendo a A. notificada dessa mesma compensação, através do ofício n.º 2078 do serviço de finanças de Lisboa-3.

É neste contexto, e na sequência da notificação da A. da compensação, que é proposta a presente acção, na qual é indicado como objecto da mesma o “despacho n.º 768/2004 – XV de 23/03/04 da autoria de SESEAF e actos de execução daquele, designadamente do acto do Sr. Director de Serviços de Justiça Tributária e do acto do Sr. Chefe de Finanças de Lisboa 03”, e formulado o pedido de revogação dos actos recorridos, e que seja “ordenado o reembolso à CP dos créditos de imposto, que entraram em compensação, acrescidos de juros à taxa legal, vencidos, contados desde a data em que devia sido processado o reembolso, e vincendos (…).”.

Vejamos então, se estamos perante erro na forma de processo.

Verifica-se o erro na forma de processo quando o A. faz uso de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão.

A propriedade ou impropriedade do meio processual afere-se pelo pedido final formulado na p.i., ou seja, pela pretensão que o requerente pretende fazer valer com a acção.

In casu, a A. formula o pedido de revogação dos actos recorridos e que seja “ordenado o reembolso à CP dos créditos de imposto, que entraram em compensação”.

Saliente-se que o juiz está vinculado pelo pedido, uma vez este delimita as questões que o tribunal deve apreciar nos termos da alínea e) do n.º 1 do art. 615.º do Código de Processo Civil, não obstante, pode interpretar o pedido, determinando o real sentido da pretensão do A..

Ora, conforme resulta do pedido do A. a utilidade que pretende ver satisfeita com a presente acção é obter o reembolso dos seus créditos que, na sua perspectiva, foram objecto de compensação indevidamente.

O que significa que, o que a A. pretende é sindicar a legalidade do acto que impediu que o reembolso do seu crédito se concretizasse, ou seja, o acto de compensação.

Na verdade, a compensação operada no processo de execução fiscal, a subsistir, impede que a pretensão da A. seja satisfeita, ou dito de outro modo, a pretensão da A. de desfrutar dos seus créditos resultante de reembolso de imposto, apenas se poderá concretizar se for anulado o acto de compensação.

Assim sendo, o pedido da A. deve ser interpretado como sendo o de anulação do acto de compensação, que se fundamentou no despacho n.º 768/2004 – XV de 23/03/04 da autoria de SESEAF, até porque este último não se dirigiu à A., mas foi praticado num contexto de esclarecimentos internos solicitados, sendo que a lesividade dos direitos da A. apenas se verifica quando é aplicada a doutrina veiculada no mesmo, ou seja, quando é efectuada a compensação no processo de execução fiscal.

Por outro lado, se atentarmos aos fundamentos da A. vertidos na p.i., verifica-se que são todos consentâneos com o pedido de anulação da compensação, na medida em que todos radicam no entendimento de que o processo de cobrança coerciva da dívida deveria estar suspenso, e por conseguinte, assaca-se a ilegalidade da compensação das dívidas que consubstancia uma violação à suspensão de que beneficiava o processo de execução fiscal.

Na verdade, a A. invoca desde o não preenchimento dos pressupostos previstos no art. 89.º, do CPPT para a compensação até a ilegalidade do prosseguimento da execução fiscal que deveria estar suspensa violando-se o art. 244.º do CAC, a falta de fundamentação do despacho do SEAF por não se compreender o porque do levantamento da suspensão e subsequente compensação, a incerteza quanto ao devedor que obsta à cobrança, e a “ofensa ao caso julgado” na medida em que a “compensação ao abrigo do art. 89.º do CPPT que ultrapassem os valores da oposição, que não mereceu provimento, materializam desrespeito de decisões judiciais”.

Concluindo, do pedido resulta que a A. pretende a anulação do acto de compensação, com o qual poderá obter o reembolso dos seus créditos que, na sua perspectiva, foram indevidamente compensados.

Aqui chegados, temos que, a forma processual adequada para que o A. veja satisfeita a sua pretensão, não é a presente acção (Acção Administrativa Especial), mas antes, a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, prevista nos artigos 97.º, n.º 1, alínea n) do CPPT.


Isto mesmo resulta quer do art. 276.º do CPPT no qual se determina que “As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância”, bem como do art. 103.º, n.º 2, da LGT, onde se estabelece que “é garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária”.

Por conseguinte, in casu, verifica-se o erro na forma de processo, porquanto a forma processual adequada para a satisfação da pretensão da A. de anulação da compensação, com a consequente devolução dos montantes dos reembolsos de impostos aplicados nessa compensação, é a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, previsto no art. 276.º do CPPT.

Cumpre ainda determinar se, em face dos elementos constantes dos autos é possível a convolação do presente processo na forma processual adequada.

Dispõe o art. 97.º n.º 3 da LGT que “[o]rdenar-se-à a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei” e em consonância dispõe o art. 98.º n.º 4 do CPPT que “[e]m caso de erro na forma do processo, este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei”.

Sucede que, in casu, obsta à convolação a tempestividade da reclamação, pois, considerando que a A. foi notificada da compensação em 19/04/2004, pelo ofício do serviço de finanças de Lisnboa-3 e que a p.i. foi apresentada em 09/07/2004, a acção é manifestamente intempestiva, face ao prazo de 10 dias previsto no art. 277.º, n.º 1 do CPPT (cfr., Ac. do STA de 16/05/2012, proc. n.º 0473/12, em cujo sumário se escreveu: “I - O prazo para deduzir reclamação de acto do órgão da execução fiscal é de 10 dias, tal como resulta do disposto no art.º 277.º, n.º 1 do CPPT. II - O prazo de 30 dias referido no n.º 3 do predito preceito legal tem a ver, não com o prazo da reclamação, mas antes com o prazo de revogação do acto reclamado, quando o seu autor for entidade diversa do órgão da execução fiscal.)

Logo, a ordenar-se a convolação, incorrer-se-ia na prática de um acto inútil, a que o tribunal deve obstar nos termos do art. 130.º do CPC.

Por conseguinte, nos termos do art. 98.º do CPPT, atento o erro na forma de processo e a insusceptibilidade de convolação dos presentes autos na forma processual adequada, deve declarar-se a respectiva nulidade.

3. Sumário do acórdão

A reclamação de actos do órgão de execução fiscal, prevista no art. 276.º do CPPT é a forma processual adequada para a satisfação da pretensão da A. quando o efeito jurídico que se pretende obter é o da anulação do acto compensação e consequente devolução dos montantes dos reembolsos aplicados na execução fiscal.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em julgar verificado o erro na forma de processo, e em consequência, declara-se a nulidade de todo o processado e ABSOLVE-SE o R. da instância.

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Valor do Processo: 833.022,17€, nos termos do art. 32.º do CPTA ex vi art. 2º, alínea c) do CPPT.
Custas pela A., sem prejuízo do apoio judiciário concedido (art. 527.º do CPC).
D.n.
Lisboa, 29 de Maio de 2014.


(Cristina Flora)

(Joaquim Condesso)



(Catarina Almeida e Sousa)