Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:466/07.8BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:07/02/2020
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL PELO SACRIFÍCIO;
DANOS ESPECIAIS E ANORMAIS;
AMPLIAÇÃO DO RECURSO.
Sumário:I. No âmbito da responsabilidade pelo sacrifício não basta que o Réu tenha causados danos às Autoras, pois só são indemnizáveis os encargos ou danos especiais e anormais, não sendo indemnizáveis os danos de pequena gravidade, que devam ser entendidos como um encargo normal exigível como contrapartida dos benefícios que derivam do funcionamento dos serviços públicos.

II. A especialidade e a anormalidade são requisitos do prejuízo indemnizável, enquanto pressuposto da responsabilidade civil e não um critério do cálculo da indemnização.

III. Apenas quando se caracterize o dano ou prejuízo como especial e anormal haverá lugar à indemnização pelo sacrifício, desde que se verifiquem os demais requisitos materiais do dever ressarcitório: a imposição de um encargo ou a causação de um dano a um particular, no quadro de uma intervenção de uma autoridade pública, por razões de interesse público.

IV. No caso das Autoras não é possível qualificar os danos sofridos como danos especiais, pois os danos causados foram generalizados em relação aos moradores e demais comerciantes da zona, resultando do julgamento da matéria de facto que não tiveram de suportar qualquer prejuízo especial ou diferenciador em relação aos demais estabelecimentos.

V. O que permite concluir que não se mostra quebrado o princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos.

VI. Requerida a ampliação do objeto do recurso, segundo o artigo 636.º do CPC, o Tribunal apenas conhece da alegação do Recorrido no caso de o recurso ser julgado procedente, pois sendo julgado improcedente, tal conhecimento fica prejudicado.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

A E.................., Lda. e o Restaurante.................., Lda., devidamente identificadas nos autos, vieram interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, datada de 16/12/2015, que no âmbito da ação administrativa comum, sob a forma ordinária, instaurada contra o Município de Sines, julgou a ação improcedente, absolvendo o Réu do pedido de condenação ao pagamento da indemnização à 1.ª Autora no valor de € 103.247,10 e à 2.ª Autora no valor de € 98.975,35, ambas acrescidas de juros de mora, desde a citação, pelos danos causados, a título de responsabilidade civil por factos lícitos.


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Formulam as Autoras, aqui Recorrentes, nas respetivas alegações as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:

“A) Salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida não retira dos factos provados as consequências impostas pelos dados da experiência comum, o que constitui erro de julgamento;

B) Na verdade, os factos assentes revelam a existência de constrangimentos na circulação da Rua Marquês de pombal, no troço onde se situam os estabelecimentos das AA., que tornaram difícil o acesso a estes e que levaram necessária e directamente à redução da clientela e dos proveitos;

C) Constrangimentos que, sendo mais intensos num período em que esteve totalmente interrompida a circulação automóvel, se prolongaram por mais de 4 anos, afastando toda a clientela que frequentava os estabelecimentos das AA.;

D) Afastamento de clientela que não pode ter outra causa senão os constrangimentos decorrentes da execução das obras, como resulta bem revela o facto de afectar outros estabelecimentos no mesmo troço, tendo alguns encerrado e outros mudado de instalações;

E) Resultando inequívoco da própria fundamentação das respostas aos quesitos que as testemunhas, convincentes, atribuíram a diminuição da clientela às alterações da circulação o que,

F) Atento o tempo limitado que os clientes das empresas tinham para almoçar, impediam que continuassem a ir aos restaurantes das AA., mesmo ao da 1ª A., mais afastado mas dependente da circulação que se processava por aquele troço;

G) O sacrifício imposto às AA. é especial, no sentido em que apenas incide sobre uma categoria de pessoas – aquelas que possuíam estabelecimentos no troço da Rua Marques de Pombal em causa;

H) E é especial, nomeadamente por se prolongar por mais de 4 anos, com restrições à circulação que conduziram necessariamente ao afastamento dos clientes habituais dos estabelecimentos;

I) Pelo que deve a douta sentença ser revogada e, julgando-se procedente e provado o presente recurso, deve o R. ser condenado a compensar as AA. pelos danos causados pelas obras de construção do Centro de Artes de Sines, no montante que vier a apurar-se em execução de sentença”.


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O Réu, ora Recorrido, notificado da admissão do recurso, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões, depois de sintetizadas:

“A) Os AA. surgem na presente ação voluntariamente de forma coligada sendo que, no caso concreto ambas as AA interpuseram recurso da douta sentença de primeira instância, sendo que para o efeito o valor da taxa de justiça é insuficiente. – Cfr. artº 30º VCPC a que corresponde o atual artº 36º do CPC/2013; Cfr. entre outros Ac. STJ, Proc. nº 08S3438, de 10/12/2008; Cfr. Ac. TR Lisboa, Proc. nº 2899/14.4TTL.SB.L1-A-4, de 15.07.2015; Cfr . Ac. TCA Sul, Proc. nº 11423/14, de 11/09/2014.; Cfr. Tabela I-B do RCP aprovado pelo DL nº 34/2008, de 26/02 e artº 1º, artº 2º, artº 6º, nº 2 do RCP e artº 27º do DL nº 34/2008, de 26/02, artº 8º da Lei nº 7/2012, de 13/03, artºs 446º, 446º-a, 447º-A do VCPC e atuais artºs 527º, 528º, nº 4, 529º, nº 2, 530º, nº 1 e nº 5 todos do CPC/2013.

B) Pelo que deve ser conhecida a questão prévia da omissão do pagamento da taxa de justiça devida com o Recurso pelas AA., porque de conhecimento oficioso, a qual consubstancia um pressuposto da admissibilidade legal do Recurso, notificando-se os AA., nos termos e para os efeitos previstos nos artºs 145º, nº 2 e nº 3, e artº 642º, nº 1 e nº 2 do CPC/2013.

C) Sob pena de o despacho que admitiu o recurso padecer de nulidade nos termos do disposto no artº 615º, nº 1 al. d) do CPC/2013, conjugado com o disposto no nº 3 do artº 145º e artº 642º, nº 1 ambos do CPC/2013 o que se invoca, por mera cautela e determina a prolação de decisão condicionada ao cumprimentos pelos AA., dos citados normativos legais (Cfr. al. A) e B) das presentes conclusões).

D) Ou caso assim não se entenda, tal despacho que admite o recurso interposto pelos AA. padece de erro de julgamento que se traduz na errada interpretação e aplicação do disposto no artº do CPC/2013, artº 1º, 2º, 6º, nº 2 todos do RCP, artº 27º do DL nº 34/2008, de 26/02, artº 8º da Lei nº 7/2012, de 13/03, artºs 527º, 528º, nº 4, 529º, nº 2, 530º, nº 1 e nº 5 e artº 145º, artº 642º, nº 1 e nº 2 todos do CPC/2013, o que importa a sua revogação e substituição por outro em consonância com o expendido nas supra alíneas A) a B) das presentes conclusões.

E) SEM Prescindir, considerando que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações nos termos do disposto no artº 140, artº 144º, nº 2 ambos do CPTA e artºs 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 4 e nº 5, 637º, 639º, nºs 1 e 2 e artº 640º todos do CPC/2013, e sendo certo que o Recurso a que ora se responde só pode incidir sobre matéria de direito, constata-se que os Recorrentes não deram qualquer cumprimento ao disposto no artº 639º do CPC/2013, limitando-se tão só a tecer considerações discordantes da douta sentença recorrida.

F) Pelo que, salvo o devido respeito, que é muito creiam-nos, dado o conteúdo generalista das conclusões e do corpo alegatório que lhes respeita, deve ser proferida decisão através da qual se decida não conhecer do mesmo. – Cfr. ainda neste sentido Ac. TCA Sul, Proc. nº 04503/08, CA – 2º Juízo – 11.09.2014, in www.dgsi.pt.

G) SEM CONCEDER, caso assim não se entenda, a douta sentença recorrida encontra-se devidamente fundamentada de facto e de direito e não merece qualquer reparo (sem prejuízo da ampliação do âmbito do recurso no que se refere à prescrição dos eventuais, não provados, direitos a indemnizações, não provadas), devendo assim ser mantida.

H) O vertido nas alíneas A) a I) das Conclusões do Recurso das AA., não tem qualquer acolhimento com o probatório, mormente com o disposto nas als. A), B), E) a H), Q), R), T), U), V), W), X), AA) a UU), YY), ZZ), AAA) a PPP) da douta sentença recorrida. – Cfr. alegações supra – págs 6 a 11; Cfr. páginas 7 a 20 da douta sentença recorrida.

I) Bem como está em contradição com o segmento da douta sentença ainda no que se refere ao probatório em que se decidiu que “Em face da prova produzida não resultaram provados os factos articulados sob o n.º 5º; n.º 6º; n.º 10º a n.º 32º; n.º 37º; n.º 44 (não existe); n.º 50 e n.º 51; n.º 61º e n.º 62; n.º 66º; n.º 72; n.º 82º; n.º 86º e n.º 87º todos da BI: cfr. fls. 230 a 234 e fls. 235 a 364; fls. 485 a 490; fls. 575 a 579; fls. 594 a 598; fls. 599 a 603; fls. 604 a 607 e fls. 616 a 642” – Sic – sublinhado nossos - vd. página 20 da douta sentença recorrida.

J) O digníssimo Tribunal “a quo” efetuou uma correta interpretação e aplicação do direito. – Cfr. artº 9º do DL nº 48.051, de 21/11/1967. – Cfr. págs. 21 e seguintes da douta sentença recorrida, não tendo incorrido em qualquer erro de julgamento.

K) Sendo ainda de referir que quando se diz nas als. JJJ) e KKK) do probatório que entretanto, alguns estabelecimentos comerciais fecharam ou mudaram de local, tal adveio ao tempo em que o julgamento foi efetuado e nada teve que ver com a obra em causa, sendo certo que não resulta assente as razões pelas quais alguns estabelecimentos encerraram ou mudaram de local, nem poderia resultar.

L) O certo é que os estabelecimentos de restauração e bebidas na zona e confinantes/e ou próximos das AA., não encerraram, nem mudaram de local, estiveram sempre a laborar tal como aliás resulta das als. HHH) e III) do probatório.

M) Pelo que, sempre deve o Recurso interposto pelas AA. ser julgado improcedente.

N) REQUER-SE a ampliação do âmbito do Recurso, a título subsidiário, nos termos do disposto no artº 636º, nº 1 do CPC/2013, ex vi do artº 640º do CPTA, circunscrita ao segmento da decisão da primeira instância através da qual se decidiu julgar improcedente a exceção de prescrição dos eventuais (não provados) direitos a indemnizações (não provadas) invocada pelo Réu na Contestação sob os artºs 1º a 14º. – Cfr. ainda págs. 4 a 6 da douta sentença.

O) O Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento tendo efetuado uma errada interpretação e aplicação do direito aos factos, nomeadamente violou o disposto no artº 498º, nº 1 do CC, conjugado o disposto no artº 9º, nº 1 do DL nº 48051, de 21/11/1967, e bem ainda do disposto no artº 323º do CC, sendo certo que não ocorreu, no caso concreto qualquer facto interruptivo da prescrição, a qual à data em que o R. foi citado, a saber, em 17/12/2007, há havia decorrido.

P) A carta que as AA enviaram ao R. (Cfr. alínea I) do probatório), não tem a virtualidade de interromper a prescrição, sendo certo que da mesma resulta à evidência que o conhecimento dos alegados e não provados danos por parte das AA., adveio em data anterior a tal carta - Cfr. ainda als E), F), G), I), J), M), O) e P) do probatório – Págs. 8, 9 e 10 da douta sentença. – Cfr. ainda entre outros, Acs. do STA de 24.4.2002, proc. n.º 47368, 4.12.2002, proc. n.º 1203/02, 6.7.2004, proc. n.º 597/04, 1.6.2006, proc. n.º 257/06, 8.1.2009, proc. n.º 604/08, e 9.6.2011, proc. n.º 410/11, Ac. Do TCA Sul de 7.3.2013, proc. n.º 9449/12 e Acs do TCA Norte de 25.10.2007, proc. n.º 834/06.2BEPNF, 20.1.2012, proc. n.º 699/08.BEPNF, 3.5.2013, proc. n.º 905/12.6BEPRT, e 19.6.2015, proc. n.º 436/09.1BEMDL.

Q) Deve, assim, ser revogada a douta sentença de primeira instância, neste segmento, o que se requer a título subsidiário e consequentemente ser proferida decisão através da qual se reconheça a prescrição, e sempre manter-se a absolvição do R. dos pedidos.”.

Pede que seja conhecida a questão prévia suscitada, ordenando-se o que se tiver por conveniente ser proferida decisão que não admita o recurso ou, se assim não se entender, o improvimento do recurso, mantendo-se a sentença recorrida; subsidiariamente, deve ser admitida a ampliação do recurso e proferida decisão que reconheça a prescrição do direito de indemnização.


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Notificadas as Recorrentes das contra-alegações apresentadas, vieram pronunciar-se sobre as questões suscitadas pelo Recorrido.

Pedem que seja indeferida a questão prévia relativa à taxa de justiça e que quanto à ampliação do âmbito, que seja mantida a decisão de improcedência da questão da prescrição do direito.


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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

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O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelas Recorrentes, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

A questão suscitada pelas Recorrentes resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:

1. Erro de julgamento quanto à valoração dos factos provados para a verificação do sacrifício especial imposto às Autoras, em consequência dos constrangimentos da circulação na Rua Marquês de Pombal, causados pelas obras de construção do Centro de Artes de Sines.

Nas contra-alegações apresentadas, o Recorrido suscita as seguintes questões:

2. Insuficiência do valor da taxa de justiça paga pelas Recorrentes para a interposição do recurso, sob pena de o despacho que admitiu o recurso ser nulo, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, d) do CPC ou enfermar de erro de julgamento;

3. Não se conhecer do objeto do recurso, em face da apresentação de conclusões com conteúdo generalista, em violação do artigo 639.º do CPC;

4. Subsidiariamente, a ampliação do âmbito do recurso, circunscrita à decisão que julgou improcedente a exceção de prescrição, por violação do artigo 498.º, n.º 1 do CC.


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Por despacho proferido em 28/05/2020 foi determinada a notificação das Autoras para liquidarem a taxa de justiça correspondente aos pedidos formulados na presente ação, o que foi efetuado pela Recorrentes, pelo que, a questão supra identificada em 2. se encontra ultrapassada, mediante liquidação da taxa de justiça devida.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

“Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos: cfr. fls. 230 a 234 e fls. 235 a 364; fls. 485 a 490; fls. 575 a 579; fls. 594 a 598; fls. 599 a 603; fls. 604 a 607 e fls. 616 a 642.

A) A 1ª A. exerce a atividade de exploração de um restaurante designado “A ……….”, sito na Rua …………., nº ….., em Sines;

B) A 2ª A. exerce a mesma atividade, explorando o restaurante “O ………”, no nº ….. da mesma rua e localidade, numa zona próxima das obras em causa;

C) As pessoas singulares que se encontram a explorar o respectivo estabelecimento comercial denominado “O ………”, já o fazem há mais de 20 anos;

D) A Rua …….. sempre teve trânsito e possibilidades de estacionamento nos dois sentidos de circulação;

E) Em 2001-07-26, foi celebrado o contrato referente ao concurso público da empreitada de obras públicas “ESCAVAÇÃO, CONTENÇÃO PERIFÉRICA E DESVIO DE INFRA-ESTRUTURAS – 1ª FASE” da Biblioteca e Centro de Artes de Sines;

F) Em 2001-10-22 iniciaram-se os trabalhos referentes à execução da empreitada acima identificada, tendo sido concluídos em 2003-06-05: cfr. Doc. n.º 8 junto com a Contestação;

G) Em 2004-01-12, iniciaram-se os trabalhos referentes à empreitada “BIBLIOTECA E CENTRO DE ARTES DE SINES – CONSTRUÇÃO DO EDIFÍCIO – 2ª FASE”, os quais foram concluídos em 2005-11-30, incluindo os respectivos arranjos exteriores: cfr. Doc. n.º 9 junto com a Contestação;

H) Por força das obras em apreço verificou-se a supressão de uma zona destinada a estacionamento, a qual foi ocupada pelo edifício construído;

I) Em 2004-12-17, deu entrada nos serviços do R. duas cartas enviadas pela 1ª e 2ª AA., respetivamente, nas quais se solicitava, em síntese, uma indemnização reportada aos anos de 2002 a 2004 e que a 1ª AA quantificou de € 57.178,66, e uma indemnização reportada à alegada quebra de volume de negócios, durante os anos de 2001 a 2004, que a 2ª AA., cifrou em € 96.126,96: cfr. Doc. n.º 1 e 2 juntos com a Contestação;

J) Em 2005-11-29, as 1ª e 2ª AA., voltaram a dirigir ao R., duas cartas, respetivamente, em que, a 1ª A. veio pedir uma indemnização reportada aos anos de 2002 a 2005, desta feita, no valor de € 120.589,71 e a 2ª A., voltou a solicitar o pagamento de uma indemnização por parte do R., no montante de € 123.589,71, reportada aos anos de 2001 a 2005: cfr. Doc. n.º 3 e 4 juntos com a Contestação

K) Na mostra gastronómica de 2006, a “A ……….” recebeu o primeiro prémio de melhor prato de sardinha: cfr. Doc. 3 e 4 juntos com a PI;

L) No mesmo concurso gastronómico de 2006, “O ……….”, obteve uma menção honrosa: cfr. Doc. 5 e 6 juntos com PI;

M) Em 2007-02-09, a Ré oficiou as AA. informando-as de que não lhes reconhecia o direito a qualquer indemnização por força da execução das empreitadas em causa: cfr. Doc. n.º 5 e 6 juntos com a Contestação;

N) O que mereceu a resposta das AA. contida no Doc. n.º 7 junto com a Contestação;

O) Em 2007-12-10, as AA. intentaram a presente ação neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja: cfr. fls. 1;

P) Em 2007-12-17, foi o Réu citado para a presente acção, reportada ao pedido de indemnização melhor identificado nos autos e referente aos anos de 2001, 2002, 2003 e de Janeiro de 2004 a 16 de Dezembro de 2004;

Q) Provado apenas que durante o período de execução da obra do Centro de Artes foram suprimidos estacionamentos na Rua ………… e, em determinado período, a circulação na referida artéria: cfr. fls. 616 a 642; art. 1º da Base Instrutória – BI;

R) Provado apenas que durante o período de execução da obra do Centro de Artes se tornou difícil a circulação e acesso aos restaurantes das AA., quer pela falta de estacionamento, quer pelo incómodo causado pela movimentação das máquinas em serviço nas obras e pela poeira resultante das mesmas: cfr. fls. 616 a 642; art. 2º da BI;

S) Provado apenas que os AA. acreditaram que se tratasse de uma situação temporária e que, após a conclusão das obras, tudo regressasse à normalidade: cfr. fls. 616 a 642; art. 3º da BI;

T) Provado apenas que terminadas as obras, a Rua …………. foi parcialmente fechada ao trânsito, na zona imediatamente contígua ao Centro de Artes: cfr. fls. 616 a 642; art. 4º da BI;

U) Provado apenas que os AA. tem como atividade principal a exploração dos respectivos restaurantes: cfr. fls. 616 a 642; art. 7º da BI;

V) Provado apenas que os restaurantes dos AA. tem também como clientes trabalhadores das empresas instaladas na plataforma industrial e que, pela distância desta à cidade e ausência de transportes públicos, obriga à deslocação em viatura automóvel: cfr. fls. 616 a 642; art. 8º da BI;

W) Provado apenas que existem clientes que optam por ir a outros locais: cfr. fls. 616 a 642; art. 9º da BI;

X) Provado apenas que os trabalhadores das indústrias da zona, continuam a frequentar restaurantes do mesmo segmento, embora situados em zonas de mais fácil acesso: cfr. fls. 616 a 642; art. 33º da BI;

Y) Provado apenas que a confeção das refeições continua assegurada pelas mesmas responsáveis: cfr. fls. 616 a 642; art. 34º da BI;

Z) Provado apenas que ganharam prémios – não tendo ficado provados quais ou quantos – no evento, em Sines, conhecido como as “Tasquinhas”: cfr. fls. 616 a 642; art. 35º da BI;

AA) Durante todo o período de execução das obras em apreço, sempre foi possível aceder ao estabelecimento comercial da 1ª A. bem como da 2ª A., respetivamente, quer através da circulação automóvel através da Rua …………., quer através de outras vias que com esta entroncam, quer de forma pedonal”: cfr. fls. 616 a 642; art. 36º da BI;

BB) Existiam e existem em toda a zona circundante alternativas para efeitos de estacionamento de viaturas automóveis: cfr. fls. 616 a 642; art. 38º da BI;

CC) Durante a execução das obras em causa, por razões de segurança de pessoas e bens, foi necessário proceder, temporariamente, a alterações no que diz respeito à circulação rodoviária na Rua …………..: cfr. fls. 616 a 642; art. 39º da BI;

DD) Desde logo, através da Rua ………, bem como da própria Rua ………. no sentido inverso àquele em que a circulação nesta última foi parcialmente interrompida: cfr. fls. 616 a 642; art. 40º da BI;

EE) Bem como através da Rua ……….., onde, aliás, existe uma zona de estacionamento, esta bem mais próxima do estabelecimento da 1ª A., mas também do estabelecimento da 2ª A.: cfr. fls. 616 a 642; art. 41º da BI;

FF) Ainda era e é possível a circulação rodoviária, pela Rua ………..: cfr. fls. 616 a 642; art. 42º da BI;

GG) Sempre foi possível o acesso aos estabelecimentos comerciais das AA. de forma pedonal: cfr. fls. 616 a 642; art. 43º da BI;

HH) Como aliás o foi para todos os estabelecimentos comerciais que se encontram na zona circundante às obras em apreço, sendo que, ali se encontravam e encontram vários estabelecimentos de restauração e bebidas, bem como de prestação de serviços, os quais também sofreram incómodos com a execução das obras em apreço: cfr. fls. 616 a 642; art. 45º da BI;

II) A 1ª A., encontra-se situada junto a um cruzamento: cfr. fls. 616 a 642; art. 46º da BI;

JJ) Em que o respectivo acesso nunca foi suspenso ou interrompido, bem como se encontra a uma distância considerável, em face dos demais estabelecimentos comerciais, da zona onde a obra decorreu: cfr. fls. 616 a 642; art. 47º da BI;

KK) A 2ª A. encontra-se situada na zona próxima das obras em causa: cfr. fls. 616 a 642; art. 48º da BI;

LL) Provado apenas que as AA. continuaram em funcionamento, em laboração, antes, durante e depois das obras em causa: cfr. fls. 616 a 642; art. 49º da BI;

MM) Verificou-se a impossibilidade de circulação que entretanto era admitida no entroncamento da Rua ……….. com a Rua …………, muito antes da zona onde se encontram os estabelecimentos das AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 52º da BI;

NN) Esta situação mantém-se até à presente data e por forma a reduzir a circulação de veículos motorizados na zona histórica da cidade de Sines, designadamente, entre os edifícios construídos e que se consubstanciam na Biblioteca e Centro de Artes e a Rua …………..: cfr. fls. 616 a 642; art. 53º da BI;

OO) Provado apenas que, durante um a quatro meses foi interdita a circulação rodoviária, mas não pedonal, do final da Rua………. com a interceção da Rua………….., no sentido onde se encontram situados os estabelecimentos das AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 54º da BI;

PP) Zona de interdição essa circunscrita a poucos metros, a qual sequer chegou ao estabelecimento da 1ª A.: cfr. fls. 616 a 642; art. 55º da BI;

QQ) Provado apenas que a Zona de interdição estava vedada, desconhecendo-se a existência de reclamações ou acidente (vide art.º 64º): cfr. fls. 616 a 642; art. 56º da BI;

RR) Provado apenas que, durante um a quatro meses, sempre houve possibilidade de circulação pedonal para acesso aos estabelecimentos situados naquela zona, incluindo necessariamente os dos AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 57º da BI;

SS) Circulação pedonal que, na respectiva zona de interdição, conheceu as condicionantes próprias de um ambiente de obra vizinha: cfr. fls. 616 a 642; art. 58º da BI;

TT) E, continuou a haver, tal como há, acesso direto aos estabelecimentos dos AA., por via rodoviária, em especial no que diz respeito à 1ª A: cfr. fls. 616 a 642; art. 59º da BI;

UU) Provado apenas que os condutores de veículos automóveis tiveram que percorrer outras vias, que já existiam, para, caso quisessem, passarem ao lado dos estabelecimentos em causa; com esclarecimento de que, durante o período em que decorreram as obras, nem sempre foi possível passar ao lado dos estabelecimentos em causa de carro – (vide art. 4º e art. 54º): cfr. fls. 616 a 642; art. 60º da BI;

VV) A supressão do pequeno espaço destinado a estacionamento poderia influir na decisão das pessoas em deslocar-se, ou não, aos estabelecimentos dos AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 63º da BI;

WW) Provado apenas que o local onde se realizavam as obras foi vedado (vide art.º 56º): cfr. fls. 616 a 642; art. 64º da BI;

XX) Sendo que, as máquinas que operavam em obra se encontravam dentro do interior do perímetro da obra, que se encontrava vedado, portanto, fora das vias públicas e do acesso ao público: cfr. fls. 616 a 642; art. 65º da BI;

YY) Durante a execução das obras em apreço apenas se verificou um desvio de percurso: cfr. fls. 616 a 642; art. 67º da BI;

ZZ) Concluída a obra, continua a ser possível a circulação automóvel, bem como pedonal, na Rua ………….., em especial onde se encontram situados os estabelecimentos dos AA: cfr. fls. 616 a 642; art. 68º da BI;

AAA) Bem como continuava e continua a ser possível a circulação automóvel e pedonal, através de outras vias públicas, que servem toda a zona, incluindo as dos AA., em especial através quer da Av. …………, quer da Rua ……….., Rua ………, Rua da ……., Rua …………..: cfr. fls. 616 a 642; art. 69º da BI;

BBB) Bem como passou a ser alargado o estacionamento na Rua da ……. e na Rua …………: cfr. fls. 616 a 642; art. 70º da BI;

CCC) Provado apenas que tendo-se mantido a zona de estacionamento junto da Travessa …………, bem como na parte detrás do estabelecimento hoteleiro denominado “S……….”, bem ainda na Rua da ……., no Largo da ………, na Rua ……….., na Av. ……………, na Rua ………., Rua …………., zonas que se encontram a poucos metros de distância dos estabelecimentos dos AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 71º da BI;

DDD) Provada apenas a supressão de alguns lugares de estacionamento na zona onde se encontram situados os estabelecimentos dos AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 73º da BI;

EEE) As zonas de estacionamento existentes mantiveram-se: cfr. fls. 616 a 642; vide (vide facto assente H); art. 74ºda BI;

FFF) E foram ampliadas zonas de estacionamento na zona onde se encontram situados os estabelecimentos dos AA.: cfr. fls. 616 a 642; art. 75º da BI;

GGG) Provado apenas que existiu encerramento parcial da circulação rodoviária na Rua …………. – (vide art. 4º, art. 54º e art. 60º): cfr. fls. 616 a 642; art. 76º da BI;

HHH) Provado apenas que na zona em causa, laboravam e laboram aos lados direito e esquerdo, contíguos à 2ª AA., dois estabelecimentos, um de bebidas e outro de restauração, este último, a servir refeições, conhecido por servir refeições diárias a um preço económico: cfr. fls. 616 a 642; art. 77º da BI;

III) E praticamente em frente da 2ª A. encontrava-se e encontra-se a laborar outro estabelecimento de bebidas – pastelaria, onde também se servem refeições ao almoço, estabelecimento este mais próximo ainda do local da obra: cfr. fls. 616 a 642; art. 78º da BI;

JJJ) E, também muito próximo do estabelecimento da 2ª A., se encontram, para além de outros estabelecimentos comerciais de prestação de serviços e venda de bens, como seja de material fotográfico, bem ainda um talho, outro estabelecimentos de bebidas – pastelaria, todos sitos na Rua ………. que entronca também com a Rua ………, a par ainda das lojas sitas no interior de um centro comercial, sendo que alguns dos identificados estabelecimentos comerciais mudaram de local e outros fecharam: cfr. fls. 616 a 642; art. 79º da BI;

KKK) E, por sua vez, percorrendo a Rua ……….., desde o local onde se situa o estabelecimento da 2ª A., em que ao seu lado esquerdo, no sentido de quem circula do entroncamento entre a Rua ………. e a Rua da ……….. para o entroncamento da Rua …………… com a Rua Travessa …………., se encontra outro estabelecimento de restauração, existe ainda, logo a seguir, no entroncamento da Rua ………… com a Rua ………….., dois estabelecimentos de venda de peças de vestuário, bem ainda existia outro estabelecimento de venda de produtos alimentares, encontrando-se então, no entroncamento da Rua ……………. com a ………….., o estabelecimento da 1ª A., bem como um Hotel, e outras lojas destinadas a comércio, sendo que alguns dos identificados estabelecimentos comerciais mudaram de local e outros fecharam: cfr. fls. 616 a 642; art. 80º da BI;

LLL) As quais não reclamaram qualquer indemnização junto do R., mas que sofreram incómodos com a execução das obras em causa: cfr. fls. 616 a 642; art. 81º da BI;

MMM) As quais, facultam transporte aos respectivos funcionários, deixando- os num ponto de referência, normalmente, na Av. …………..: cfr. fls. 616 a 642; art. 83º da BI;

NNN) O R. executou obras de Construção da Biblioteca e Centro de Artes de Sines, numa acção pautada pelo interesse público e dentro da licitude de meios e fins: cfr. fls. 616 a 642; art. 84º da BI;

OOO) Provado apenas que tal obra consubstanciou um fenómeno normal de desenvolvimento urbano, social e cultural e que implicou uma alteração da circulação automóvel, consubstanciada através de um desvio de percurso rodoviário, mas nunca pedonal, em relação a parte de uma das vias públicas: cfr. fls. 616 a 642; art. 85º da BI;

PPP) No caso concreto, a atuação do R., foi pensada tendo em vista o interesse público: cfr. fls. 616 a 642; art. 88º da BI.


*

FACTOS NÃO PROVADOS:

Em face da prova produzida não resultaram provados os factos articulados sob o n.º 5º; n.º 6º; n.º 10º a n.º 32º; n.º 37º; n.º 44 (não existe); n.º 50 e n.º 51; n.º 61º e n.º 62; n.º 66º; n.º 72; n.º 82º; n.º 86º e n.º 87º todos da BI: cfr. fls. 230 a 234 e fls. 235 a 364; fls. 485 a 490; fls. 575 a 579; fls. 594 a 598; fls. 599 a 603; fls. 604 a 607 e fls. 616 a 642.

Face à prova produzida, inexistem ainda outros factos sobre que o Tribunal se deva pronunciar já que as demais asserções aduzidas nos autos integram, no mais, meras considerações pessoais e conclusões de facto e/ou de direito das partes.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise do fundamento do recurso jurisdicional, assim como das questões suscitadas nas contra-alegações, segundo a sua ordem lógica ou prioritária de conhecimento.

A. Da questão suscitada pelo Recorrido

Não se conhecer do objeto do recurso, em face da apresentação de conclusões com conteúdo generalista, em violação do artigo 639.º do CPC

Segundo o Recorrido, as Recorrentes apresentaram alegações de recurso que contém alegações com conteúdo generalista, o que deve conduzir a que seja proferida decisão de não conhecimento do objeto do recurso, por ter sido violado o disposto no artigo 639.º do CPC.

Sem razão.

Estabelece o disposto no artigo 145.º do CPTA o despacho sobre o requerimento de interposição do recurso jurisdicional, prevendo que o mesmo seja indeferido em duas situações, assim enunciadas:

(i) quando se entenda que a decisão não admite recurso, que o mesmo foi interposto fora de prazo ou que o requerente não tem as condições necessárias para recorrer;

(ii) quando não contenha ou junte a alegação ou quando esta não contenha conclusões, sem prejuízo do n.º 4 do artigo 146.º do CPTA.

Nenhuma destas situações ocorre no presente caso para que o recurso interposto pelas Recorrente não seja admitido.

Mesmo que as conclusões não permitissem identificar os concretos pontos de facto impugnados ou as normas jurídicas que considera terem sido violadas pelo tribunal recorrido, sempre caberia despacho de convite ao aperfeiçoamento, nos termos do disposto no artigo 639.º, n.º 3 do CPC, tal como prescreve o artigo 146.º, n.º 4 do CPTA para as ações de impugnação de ato administrativo.

No caso das conclusões apresentadas pelas Recorrentes, embora de forma sintética, não deixa de ser possível conhecer as razões pelas quais as Recorrentes interpõem o presente recurso, tal como supra enunciado no respeitante ao fundamento do recurso ou da questão a decidir.

Além de que, não se extrai das extensas contra-alegações e respetivas conclusões apresentadas pelo Recorrido que o mesmo não tenha compreendido as razões que motivam o presente recurso.

Por conseguinte, além de não se considerar necessária a prolação de despacho de aperfeiçoamento, menos ainda existe fundamento para a não admissão do recurso.

Termos em que, improcede, por não provada a questão suscitada pelo Recorrido.

B. Do recurso interposto pelas Recorrentes

Erro de julgamento quanto à valoração dos factos provados para a verificação do sacrifício especial imposto às Autoras, em consequência dos constrangimentos da circulação na Rua …………. causados pelas obras de construção do Centro de Artes de Sines

Vêm as Autoras recorrer da sentença na parte em que julgou a ação improcedente, absolvendo o Réu do pedido de condenação ao pagamento da indemnização que contra ele vinha formulado, defendendo que, ao contrário do decidido, se verifica o pressuposto da responsabilidade civil do dano, aqui configurado, no âmbito da responsabilidade civil por factos lícitos, como prejuízos especiais e anormais.

Sustentam que pode retirar-se dos factos provados as consequências que decorrem dos dados da experiência comum, que a análise crítica da prova impunha.

Alegam que os factos provados revelam a existência de dificuldades acrescidas dos restaurantes explorados pelas Autoras, bem como a outros estabelecimentos, situados na mesma zona, alguns dos quais mudaram de local ou fecharam, durante o período de execução das obras do Centro de Artes.

Defendem que o facto de haver estabelecimentos que fecharam ou tiveram de mudar de localização, deixa claro e inequívoco que sofreram prejuízos e prejuízos anormais, pelo que, nas circunstâncias de facto dadas como assentes, não pode dar-se como não provada a existência de prejuízos para as Autoras.

Entendem as Recorrente que quando muito tais prejuízos podem não ser quantificados, o que implicará que a liquidação se faça em execução de sentença, mas não pode dizer-se que se não provaram prejuízos, públicos e notórios nas mais circunstâncias assentes.

Face aos depoimentos prestados, valorados pelo Tribunal a quo defendem que não se poderia concluir que não ficaram provados prejuízos, tendo essa prova sido feita –redução da frequência dos estabelecimentos e consequentemente dos proveitos – reforçada com a existência, provada, de estabelecimentos que tiveram de encerrar ou de mudar de local.

Alegam, por isso, as Recorrentes que tem de ser considerado como assente que houve redução da sua clientela e dos proveitos.

Mais sustentam que, atentas as circunstâncias, essa diminuição de clientela e de proveitos, segundo os dados da experiência comum, só podem resultar duma rua em obras durante mais de 4 anos, além de que bastaria invocar o facto de haver estabelecimentos que encerraram ou mudaram para não poder ser outra a explicação.

A simples mudança de hábitos poderia fundamentar a redução da clientela dum estabelecimento, mas só as obras podem justificar a redução generalizada no troço da rua ……….. em que situam os estabelecimentos das Autoras.

Assim, segundo as Recorrentes, estando provados os danos, como decorre dos factos provados e dos dados da experiência comum, eles são indemnizáveis nos termos do artigo 9.º do D.L. n.º 48.051, de 21/11/1967, a tal não obstando o facto de existir uma pluralidade de lesados, quer tenham ou não pedido indemnização.

Vejamos.

Considerando não ter sido impugnado o julgamento da matéria de facto da sentença recorrida, a decisão a proferir sobre o fundamento do recurso terá de atender à concreta factualidade apurada, julgada provada e não provada.

Com relevo, enunciam-se os seguintes factos julgados provados:

- Em 22/10/2001 iniciaram-se os trabalhos referentes à execução da empreitada de obras públicas “Escavação, Contenção Periférica e Desvio de Infra-Estruturas – 1.ª Fase”, da Biblioteca e Centro de Artes de Sines, os quais ficaram concluídos em 05/06/2003-06-05;

- Em 12/01/2004 iniciaram-se os trabalhos referentes à empreitada “Biblioteca e Centro de Artes de Sines – Construção do Edifício – 2.ª fase”, os quais foram concluídos em 30/11/2005;

- Por força das obras em apreço verificou-se a supressão de uma zona destinada a estacionamento, a qual foi ocupada pelo edifício construído;

- Durante o período de execução da obra do Centro de Artes foram suprimidos estacionamentos na Rua ………. e, em determinado período, a circulação na referida artéria;

- Durante o período de execução da obra do Centro de Artes tornou-se difícil a circulação e acesso aos restaurantes das Autoras, quer pela falta de estacionamento, quer pelo incómodo causado pela movimentação das máquinas em serviço nas obras e pela poeira resultante das mesmas;

- Durante todo o período de execução das obras em apreço, sempre foi possível aceder ao estabelecimento comercial da 1ª Autora, bem como da 2ª Autora, respetivamente, quer através da circulação automóvel através da Rua ……….., quer através de outras vias que com esta entroncam, quer de forma pedonal;

- Existiam e existem em toda a zona circundante alternativas para efeitos de estacionamento de viaturas automóveis;

- Durante a execução das obras em causa, por razões de segurança de pessoas e bens, foi necessário proceder, temporariamente, a alterações no que diz respeito à circulação rodoviária na Rua …………, através da Rua da ………., bem como da própria Rua …………… no sentido inverso àquele em que a circulação nesta última foi parcialmente interrompida, bem como através da Rua………….., onde existe uma zona de estacionamento, próxima do estabelecimento da 1ª Autora, mas também do estabelecimento da 2ª Autora;

- Ainda era e é possível a circulação rodoviária, pela Rua ……….;

- Sempre foi possível o acesso aos estabelecimentos comerciais das Autoras de forma pedonal;

- Como o foi para todos os estabelecimentos comerciais que se encontram na zona circundante às obras em apreço, sendo que ali se encontravam e encontram vários estabelecimentos de restauração e bebidas e de prestação de serviços, os quais também sofreram incómodos com a execução das obras em apreço;

- A 1ª Autora encontra-se situada junto a um cruzamento, em que o respetivo acesso nunca foi suspenso ou interrompido, bem como se encontra a uma distância considerável, em face dos demais estabelecimentos comerciais, da zona onde a obra decorreu;

- A 2ª A. encontra-se situada na zona próxima das obras em causa;

- As Autoras continuaram em funcionamento e em laboração, antes, durante e depois das obras em causa;

- Verificou-se a impossibilidade de circulação que entretanto era admitida no entroncamento da Rua ……….. com a Rua da …….., muito antes da zona onde se encontram os estabelecimentos das Autoras;

- Durante um a quatro meses foi interdita a circulação rodoviária, mas não pedonal, do final da Rua da ………. com a interceção da Rua …………, no sentido onde se encontram situados os estabelecimentos das Autoras;

- Durante um a quatro meses sempre houve possibilidade de circulação pedonal para acesso aos estabelecimentos situados naquela zona, incluindo necessariamente os das Autoras;

- A circulação pedonal na zona de interdição, conheceu as condicionantes próprias de um ambiente de obra vizinha;

- O local onde se realizavam as obras foi vedado.

A factualidade descrita permite dar por provadas as limitações em matéria de acessibilidades, quer rodoviárias, quer pedonais, assim como de estacionamento, embora sem que, em nenhuma ocasião, tivesse sido vedado o acesso aos estabelecimentos das Autoras ou tivessem sido abolidas as possibilidades de estacionamento nas imediações dos restaurantes em causa.

No entanto, rigorosamente nada foi julgado provado acerca da quebra de receitas de cada uma das Autoras, no período em que decorreram as obras.

Os factos são aqueles que constam como provados nos autos, pelo que, quaisquer outros que não constem da fundamentação de facto não podem ser considerados ou valorados pelo Tribunal.

Neste sentido, tudo quanto se mostre alegado pelas Recorrentes em sede de erro de julgamento de direito que tenha por base uma diferença de valoração ou consideração dos factos assentes, não pode ser considerado por este Tribunal de recurso.

Tal é o que se verifica em relação ao pressuposto da responsabilidade civil do dano, aqui configurado no âmbito da responsabilidade civil por factos lícitos como prejuízos especiais e anormais, já que estes, enquanto requisito normativo da obrigação de indemnizar, não se encontram demonstrados nos autos.

Não se provou que tivesse sido vedado o acesso a qualquer dos estabelecimentos, nem que o trânsito automóvel tenha sido cortado ou desviado, pois durante todo o período de execução das obras foi sempre possível aceder aos estabelecimentos comerciais de ambas as Autoras, quer através da circulação automóvel (através da Rua ………., quer através de outras vias que com esta entroncam), quer de forma pedonal.

Além de que resultou provado que existiam em toda a zona circundante alternativas para efeitos de estacionamento de viaturas automóveis.

A que acresce que em nenhum momento as ora Autoras foram forçadas a encerrar os seus estabelecimentos ou a limitar o seu funcionamento.

Do mesmo modo que nada resulta provado que tenham sido colocadas vedações e tapumes que tenham dificultado o acesso aos estabelecimentos em causa ou que tivessem aumentado os percursos para alcançar os estabelecimentos da Autoras.

Além que, também em relação aos prejuízos causados pela execução das obras, provou-se que as obras foram vedadas, sem que tivesse sido provada qualquer factualidade relativa a ruído de máquinas e camiões.

A que acresce não ter ficado provada qualquer diminuição de clientela e consequentemente, das respetivas receitas de cada uma das Autoras.

Assim, no exercício da referida atividade de interesse público e como consequência desta atividade decorrente da execução da empreitada, não se provou que o Réu tivesse lesado as Autoras, causando-lhes danos.

Relevantemente, no âmbito do instituto da responsabilidade pelo sacrifício, não basta que o Réu, ora Recorrido, tenha causados danos às Autoras, pois só são indemnizáveis os encargos ou danos especiais e anormais, não sendo indemnizáveis os danos de pequena gravidade, que devam ser entendidos como um encargo normal exigível como contrapartida dos benefícios que derivam do funcionamento dos serviços públicos.

A especialidade e anormalidade são requisitos do prejuízo indemnizável, enquanto pressuposto da responsabilidade civil e não propriamente um critério do cálculo da indemnização.

Assim, apenas quando se caracterize o dano ou prejuízo como especial e anormal haverá lugar à indemnização pelo sacrifício, desde que se verifiquem os demais requisitos materiais do dever ressarcitório: a imposição de um encargo ou a causação de um dano a um particular, no quadro de uma intervenção de uma autoridade pública, por razões de interesse público.

No caso das Autoras não é possível qualificar os danos sofridos como danos especiais, pois os danos causados foram generalizados em relação aos moradores e demais comerciantes da zona, resultando do julgamento da matéria de facto que as Autoras não tiveram de suportar qualquer prejuízo especial ou diferenciador em relação aos demais estabelecimentos.

O que nos permite concluir que não se mostra quebrado o princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, não tendo, assim, as Autoras sofrido prejuízos especiais.

Nem sofrido prejuízos anormais, que ultrapassem os custos próprios da vida em sociedade, concretamente, em termos de duração e de gravidade.

No caso dos autos, atentos os factos provados e não provados, é de concluir estarem em causa danos generalizados e de pequena gravidade, insuscetíveis de serem indemnizáveis.

Não são dados como provados prejuízos anormais, que se revistam de um certo peso ou gravidade, em termos de ultrapassar os limites daquilo que, no caso, as Autoras têm de suportar enquanto membros da comunidade, extravasando os encargos sociais normais, exigíveis em contrapartida da existência e funcionamento dos serviços públicos, no caso, a Biblioteca e Centro de Artes, nem a ocorrência de prejuízos especiais, pois, foram impostos à generalidade das pessoas, empresas ou comerciantes da zona.

Além de rigorosamente nada se provou-se em matéria de quebra global de receitas das Autoras, seja considerando o período mensal, que atendesse a certos e concretos meses do ano, seja considerando o período de cada ano.

Não se provaram quaisquer variações de receitas, muito menos uma evolução negativa ou um seu decréscimo, no período de realização das obras da empreitada.

Tal prova cabia às Autoras, o que não logra decorrer do julgamento da matéria de facto.

Por conseguinte, não se prova ter existido uma diminuição dos proveitos das Autoras para que se possa entender pela existência de um sacrifício pesado para as Autoras ou uma limitação considerável das suas posições jurídicas no aspeto aqui em causa.

Os danos sofridos, nos termos em que resultam do julgamento da matéria de facto, não ultrapassam, assim, o ónus natural decorrente da vida em sociedade, pelo que, não sendo especiais, nem anormais, não gozam de gravidade, importância e peso que justificam a sua ressarcibilidade, nos termos do instituto da responsabilidade civil pelo sacrifício.

Deve, pois, entender-se pela falta de razão das ora Recorrentes quanto ao alegado no presente recurso relativamente ao pressuposto da verificação do dano resultante da atuação imputável ao Réu, por os factos em que alicerçam a sua alegação não resultarem, enquanto tais, provados em juízo.

O que determina o juízo de falta do requisito do dano, indispensável para a procedência do fundamento do recurso e, consequentemente, da ação de responsabilidade civil extracontratual que pelas Autora foi instaurada.

Termos em que, nos termos das razões invocadas, será de negar provimento ao fundamento do recurso, por não provado.


*

O que implica que se mantenha a sentença recorrida, que julgou a ação administrativa improcedente, por não provada, absolvendo o Réu do pedido.

C - Da ampliação do âmbito do recurso, relativa à decisão que julgou improcedente a exceção de prescrição

Veio o Recorrido requerer a ampliação do objeto do recurso, subordinada à questão da exceção de prescrição, julgada improcedente na sentença recorrida.

A ampliação do objeto do recurso prevista no artigo 636.º do CPC, pressupõe apenas que o fundamento ou fundamentos invocados para escorar a decisão favorável não foram acolhidos.

Tendo o desfecho da ação sido favorável ao Réu, por a ação ter sido julgada improcedente, não cabe ao Réu reagir mediante a interposição de recurso (nem subordinado, nem independente), antes mediante a ampliação do objeto do recurso nas contra-alegações, de forma a obter uma resposta favorável às questões que suscitou, prevenindo o eventual acolhimento pelo tribunal ad quem dos argumentos de facto ou de direito suscitados pelo recorrente – neste sentido, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1, Almedina, Coimbra, 2018, pp. 324-325.

Porém, considerando a improcedência do recurso interposto pelas Autoras, fica prejudicado o conhecimento da ampliação do objeto do recurso pelo Réu, ora Recorrido, por o mesmo constituir argumentação meramente subsidiária, a apreciar e a decidir apenas no caso da procedência do recurso.

Termos em que, nos termos antecedentes, se julga prejudicado o conhecimento da ampliação do recurso.


***

Pelo que, em face de todo o exposto, será de julgar improcedente, por não provado, o recurso interposto pelas Autoras e em julgar prejudicada a ampliação do objeto do recurso, determinando a manutenção da sentença recorrida.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. No âmbito da responsabilidade pelo sacrifício não basta que o Réu tenha causados danos às Autoras, pois só são indemnizáveis os encargos ou danos especiais e anormais, não sendo indemnizáveis os danos de pequena gravidade, que devam ser entendidos como um encargo normal exigível como contrapartida dos benefícios que derivam do funcionamento dos serviços públicos.

II. A especialidade e a anormalidade são requisitos do prejuízo indemnizável, enquanto pressuposto da responsabilidade civil e não um critério do cálculo da indemnização.

III. Apenas quando se caracterize o dano ou prejuízo como especial e anormal haverá lugar à indemnização pelo sacrifício, desde que se verifiquem os demais requisitos materiais do dever ressarcitório: a imposição de um encargo ou a causação de um dano a um particular, no quadro de uma intervenção de uma autoridade pública, por razões de interesse público.

IV. No caso das Autoras não é possível qualificar os danos sofridos como danos especiais, pois os danos causados foram generalizados em relação aos moradores e demais comerciantes da zona, resultando do julgamento da matéria de facto que não tiveram de suportar qualquer prejuízo especial ou diferenciador em relação aos demais estabelecimentos.

V. O que permite concluir que não se mostra quebrado o princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos.

VI. Requerida a ampliação do objeto do recurso, segundo o artigo 636.º do CPC, o Tribunal apenas conhece da alegação do Recorrido no caso de o recurso ser julgado procedente, pois sendo julgado improcedente, tal conhecimento fica prejudicado.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em:

1. Negar provimento ao recurso interposto pelas Autoras, por não provado e, em consequência, em manter a sentença recorrida, de absolvição do Réu no pedido;

2. Julgar prejudicada a ampliação do objeto do recurso apresentado pelo Recorrido.

Custas pelas Autoras, ora Recorrentes.

Registe e Notifique.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)



(Pedro Marchão Marques)


(Alda Nunes)