Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:743/12.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/14/2021
Relator:VITAL LOPES
Descritores:IVA;
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL;
INVERSÃO DO SUJEITO PASSIVO;
“REVERSE CHARGE”;
PRESSUPOSTOS.
Sumário:1. No regime de inversão do sujeito passivo, também designado de “reverse charge”, o adquirente dos serviços substitui-se ao prestador na liquidação (e entrega) do IVA devido pela operação facturada.

2. A regra de inversão prevista na alínea j) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA, introduzida pelo DL 21/2007, de 29 de Janeiro, só opera em razão de dois factores: o tipo de serviços prestados (“serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada”) e o tipo de adquirente/ cliente dos serviços fornecidos (“pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto”).

3. A circunstância de o sujeito passivo que figura nas facturas como destinatário dos serviços prestados, e que pratica operações comerciais que conferem direito à dedução, não as ter contabilizado e declarar no procedimento inspectivo desconhecer tais facturas, não constitui per si um indício fundado de que não é ele o real e efectivo destinatário dos serviços prestados, pois terá todo o interesse em descartar a sua responsabilidade na falta de liquidação (e entrega) do imposto devido pela operação facturada em regime de “reverse charge”. Essa constatação tem de ser complementada pela AT com outros elementos indiciários de prova, que se apresentem globalmente consistentes e capazes de fundar um juízo de elevada probabilidade (que não de mera possibilidade), quanto à inexactidão dos elementos constantes da factura, nomeadamente os relativos à pessoa do destinatário, face à realidade subjacente.

4. Provando-se, não obstante a base indiciária recolhida pela AT, que o destinatário real e efectivo dos serviços de construção civil prestados em regime de empreitada é o que figura nas facturas emitidas com aposição da menção “IVA devido pelo Adquirente – Decreto Lei 27/2007”, não recai sobre o emitente a obrigação de liquidar o imposto devido pelas operações realizadas, devendo a liquidação adicional a que deu origem ser anulada por erro nos pressupostos.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO

O Exmo. Representante da Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por “D... – INVESTIMENTOS E CONSTRUÇÃO, LDA.”, visando as liquidações adicionais de IVA com os nºs 11144044, 11144046 e 11144048 e respectivos juros compensatórios no valor total de € 15.879,28, referentes aos períodos de 2008/03T, 2008/06T e 2008/12T.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões:
«
I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença a quo, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, considerando como adquirente dos serviços em causa a empresa “A...” e não M..., aplicando-se a regra da inversão do sujeito passivo, introduzida no CIVA, pelo Decreto-Lei n.º 21/2007, de 28/01, pelo que, a liquidação do imposto devido passa a ser responsabilidade do adquirente do serviço e não do fornecedor, não podendo, assim, a Impugnante ser responsabilizada pelo IVA em falta.

II – Porém, com a ressalva da devida vénia, dissente-se do entendimento perfilhado pela douta sentença a quo, por se entender que lavra em erro de julgamento quanto à matéria de facto, na medida em que a factualidade que resulta dos autos apenas permite concluir que os serviços prestados pela Impugnante, ao invés de o terem sido à sociedade “A...”, o foram à respectiva sócia e gerente M..., em nome próprio, a qual, por não ser sujeito passivo de IVA, não habilitava a que se procedesse à inversão do sujeito prevista na al. j), do n.º 1, do art.º 2º do CIVA.

III – Ao contrário do que preconiza a douta sentença a quo, são muitos os factos que levam esta RFP a concluir no sentido de que a regra de inversão da obrigação de liquidação de IVA, introduzida no CIVA pelo Decreto-lei n.º 21/2007, de 28/01, não tem aplicação no caso concreto, posto que o adquirente dos serviços não é um sujeito passivo IVA.

IV – Assim e desde logo, verifica-se que o contrato de prestação de serviços de construção civil subjacente, teve como primeiro Outorgante “M...” e não a sociedade “A...”, sendo que em lado algum no contrato é feita qualquer referência a esta sociedade.

V – Para além disso, importa ter presente que nos termos daquele contrato e em abono da tese de que a relação negocial se operou tendo como adquirente dos serviços um não sujeito passivo, a referência que foi feita no ponto 3º da 3ª cláusula do contrato, onde se refere que: “À quantia referida no ponto 1 acresce IVA à taxa em vigor.”

VI – Também não foi devidamente valorado o documento consistente no Auto de Recepção da obra, elaborado em 2008/06/03, entre a Impugnante e a sociedade S... – sociedade responsável pela elaboração dos estudos e projetos do espaço alvo de obras – no qual são referidos como promotores da empreitada C... e M..., sendo referido o montante do orçamento € 57.000,00 a que acresce o IVA em vigor.

VII – Por outro entende-se que os depoimentos testemunhais produzidos nos autos não permitam alcançar as conclusões a que chegou a douta sentença a quo, posto que, não obstante o facto de alguns deles referirem que no local da obra se apresentavam a dirigi-la os ditos C... e M..., porém, o certo, é que não ficou demonstrado que o faziam em representação da sociedade, nem tal vem referido na douta sentença a quo.

VIII – Para além disso, relevam os pagamentos efectuados à Impugnante, alguns dos quais foram efectuados a partir de contas bancárias não tituladas pela sociedade “A...”.

IX – E quanto ao facto de as facturas terem sido emitidas em nome da sociedade “A...”, tal apenas deve relevar para efeitos de reconhecimento do erro em que lavrou a Impugnante, ao considerar como sujeito passivo do imposto uma sociedade que não era parte contratual no contrato de prestação de serviços de construção civil
X – Decidindo em sentido diverso, incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, tendo sido violados, entre outros, o disposto na al. j), do n.º 1, do art.º 2º do CIVA.

Termos em que,
Concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente, tudo com as legais e devidas consequências.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO, FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!».


A Recorrida apresentou contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões:
«
A. Tendo a Recorrente se limitado a impugnar, de forma global, (cfr. artigos 3.º a 53.º das Alegações de Recurso) a matéria de facto dada como provada por mera discordância, sem indicar, por referência aos concretos pontos de facto que constam da sentença que impugna, os que foram erradamente julgados e em que medida o foram, não cumpriu o estabelecido no artigo 640.º n.sº 1 e 2 do CPC, devendo o Recurso ser, em consequência, liminarmente rejeitado.

B. Tendo a Recorrente indicado erro na valoração da prova testemunhal e declarações de parte, nos artigos 39.º a 53.º das Alegações de Recurso, sem indicar a passagem da gravação em que fundamenta o seu recurso, nem apresentar transcrição dos autos, antes se limitando (novamente) a impugnar a globalidade da prova testemunhal por mera discordância, não cumpriu o estabelecido no artigo 640.º n.º 2, alínea a) do CPP, devendo o Recurso ser, em consequência, liminarmente rejeitado.

C. Não tendo a Recorrente logrado demonstrar nas suas Alegações de Recurso erros manifestos na apreciação da prova nem desconformidades entre os elementos probatórios e a decisão do Tribunal recorrido sobre os mesmos, não é permitido alterar a matéria de facto fixada segundo o princípio da livre apreciação da prova, atribuído ao julgador em 1ª instância nos termos do artigo 662.º do CPC, devendo, em consequência, ser negado provimento ao Recurso e mantida a sentença recorrida.

D. Os factos assentes nos pontos 2,4,5,6,27,29,30,33,34, Factos Provados da sentença recorrida – e que só se podem tomar por assentes atenta a falta de impugnação da Recorrente – levam à conclusão de que:
a. M..., não sendo gestora de direito da A... era gerente de facto desta sociedade, tendo uma intervenção pessoal e ativa na vinculação da sociedade, sem necessitar de qualquer procuração para o efeito; e,
b. Não obstante a existência de um documento titulado de “Contrato de Prestação de Serviços para Execução de Obras Gerais de Remodelação Interiores” celebrado entre M... e a Recorrida, o negócio jurídico que se veio verdadeiramente a concretizar - e que assim apenas se pode admitir segundo as regras da declaração negocial e interpretação constantes dos artigos 217.º e seguintes do Código Civil - foi o da prestação de serviços de construção civil à sociedade A...; este é o único negócio que se deduz dos factos assentes e que, com toda a probabilidade, o revelam.

Pelo que também aqui deve ser negado provimento ao Recurso e mantida a sentença recorrida.
Termos em que se deverá: (i) a título principal, rejeitar liminarmente o recurso interposto pela Fazenda Publica e (ii) a título subsidiário negar provimento ao recurso mantendo a decisão recorrida, com as consequências legais devidas.».

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo pela procedência do recurso, porquanto, “a douta sentença errou na apreciação da matéria fáctica dada como provada, bem como na subsunção dos factos dados como provados aos preceitos legais aplicáveis”.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, a questão que importa apreciar reconduz-se essencialmente a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao concluir não ser a impugnante o sujeito passivo do IVA não liquidado nas facturas relativas a serviços de construção civil que emitiu, e as quais mencionam como adquirente dos serviços prestados em regime de empreitada, o sujeito passivo “A..., Lda.”, sendo aplicável o regime de inversão do sujeito passivo (art.º 2.º, n.º1 alínea j) do CIVA, na redacção introduzida pelo DL n.º 21/2007, de 29 de Janeiro).
***

III. FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Na sentença recorrida deixou-se factualmente consignado:
«
Compulsados os autos e analisada a prova documental e testemunhal apresentada, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a presente decisão:

1. A Impugnante iniciou a sua atividade em 2007, consistindo o seu objeto social na construção de edifícios, sua recuperação e remodelação – cfr. fls. 269 a 270 dos presentes autos;

2. M..., inicialmente, e posteriormente, o filho C..., foram apresentados ao gerente da impugnante, R..., como sendo os donos de dois bares da marca “T...”, um em Telheiras e outro em Évora, sendo que aqueles pretendiam expandir o negócio, abrindo um bar em Torres Vedras – cfr. depoimento dos declarantes R... e de J...;

3. Os gerentes da impugnante, R... e J..., por altura das primeiras reuniões ocorridas com M... e C..., apresentaram-se aos primeiros como “donos” dos bares “T...”, em Telheiras e Évora e, de um futuro bar em Torres Vedras, este último, onde foram prestados os trabalhos de construção civil- cfr. depoimento dos declarantes, R... e de J...;

4. R... e J..., dirigindo-se ao bar de Telheiras presenciaram M... a dar ordens aos empregados do bar e a fechar as contas do mesmo - cfr. depoimento dos declarantes, R... e de J...;

5. M..., juntamente com filho, C..., eram eles quem decidia todos os assuntos relacionados com a obra no bar de Torres Vedras - cfr. depoimento dos declarantes, R... e de J...;

6. Em 15/12/2007, foi celebrado “Contrato de Prestação de Serviços para Execução de Obras Gerais de Remodelação Interiores”, entre M... e a D... - Investimentos e Construção, Lda., ora impugnante – cfr. fls. 103 a 109 dos autos;

7. Através daquele contrato, referido no ponto 2, a D... -Investimentos e Construções, Lda. compromete-se a prestar serviços de empreitada geral com vista à execução “ (...) de um estabelecimento de bebidas, como objetivo à instalação do Bar T..., discriminadas em orçamento em anexo, na loja nº 5, arrendada pelo primeiro outorgante, sito no B..., em Torres Vedras (...)” – cfr. 1º § do contrato, a fls. 103 dos autos;

8. Em 26/12/2007, a impugnante emite a fatura nº A-64, à A... pelo valor de € 17.100,00, constando da descrição daquela fatura o seguinte: ” 30% do orçamento referente aos trabalhos de remodelação das vossas instalações em Torres Vedras, conforme adjudicação” – cfr. fls. 110 dos autos;

9. À fatura enunciada no ponto anterior corresponde a nota de crédito nº 1 (A- 1) de 15/05/2008, no valor de € 17.100,00 com o seguinte descritivo, “Anulação da nossa fatura nº A-64, substituída pela nossa fatura A-81” – cfr. fls. 236 do processo administrativo em apenso aos autos;

10. Em 15/05/2008, a impugnante emite a fatura nº A-81, pelo valor de € 17.100,00, correspondente ao seguinte descritivo “30% do orçamento referente aos trabalhos de remodelação das vossas instalações em Torres Vedras, conforme adjudicação” – cfr. fls. 60 dos autos;

11. Para pagamento parcial da fatura nº A-81, em 02/06/2008, é efetuada a transferência bancária do NIB 00070000002..., pertencente à A..., no valor de € 5.000,00 (Abate de € 17.100,00) (recibo: R-16) – cfr. fls. 245 e 246 verso do processo administrativo em apenso aos autos;

12. Para pagamento parcial da fatura nº A-81, em 11/08/2008, é efetuado o pagamento em numerário no valor de € 3.000,00 (Abate de € 17.100,00) (recibo: R-18) – cfr. fls. 245 verso e 246 dos autos;

13. Para pagamento da fatura nº A-64, é emitido cheque nº 6420..., sobre a conta bancária nº 11..., da titularidade de M... (Recibo: R-5), no valor de € 17.100,00 – cfr. fls. 240 a 241 do processo administrativo em apenso aos autos;

14. Em 06/02/2008, a impugnante emite a fatura nº A-74, à A... pelo valor de € 17.100,00, constando da descrição daquela fatura o seguinte” 30% do orçamento referente aos trabalhos de remodelação das vossas instalações em Torres Vedras, conforme adjudicação” – cfr. fls. 57 dos autos;

15. Para pagamento parcial da fatura nº A-74, é efetuado o depósito em numerário, na conta bancária da impugnante, no valor de € 5.000,00 (Recibo: R-6) – cfr. fls. 240 a 242 do processo administrativo em apenso aos autos;

16. Para pagamento parcial da fatura nº A-74, é realizado depósito na conta bancária da impugnante titulado pelo cheque nº 605... no valor de € 9.865,52 (Recibo: R-7) – cfr. fls. 242 verso do processo administrativo em apenso aos autos;

17. Para pagamento parcial da fatura nº A-74 é efetuada uma transferência interbancária no valor de € 1.245,48 (Recibo: R-10) – cfr. fls. 243 do processo administrativo em apenso aos autos;

18. Para pagamento parcial da fatura nº A-74, é efetuada uma transferência interbancária no valor de € 1.500,00 (Recibo: R-11) – cfr. fls. 243 verso do processo administrativo em apenso aos autos;

19. Para pagamento parcial da fatura nº A-74 é efetuada uma transferência interbancária no valor de € 2.000,00 (Recibo: R-12) – cfr. fls. 244 do processo administrativo em apenso aos autos;

20. Em 15/05/2008, a impugnante emite a fatura nº A-79, à A... pelo valor de € 17.100,00, constando da descrição daquela fatura o seguinte: ” 30% do orçamento referente aos trabalhos de remodelação das vossas instalações em Torres Vedras, conforme adjudicação” – cfr. fls. 58 dos autos;

21. Em 15/05/2008, a impugnante emite a fatura nº A-80, à A... pelo valor de € 5.700,00, constando da descrição daquela fatura o seguinte: “10% do orçamento referente aos trabalhos de remodelação das vossas instalações em Torres Vedras, conforme adjudicação” – cfr. fls. 59 dos autos;

22. Em 16/05/2008, a impugnante emite a fatura nº A-82, à A... pelo valor de € 7.320,00, constando da descrição daquela fatura o seguinte: ”Execução de trabalhos de tratamento da infiltração no tecto da loja: reparação da viga superior, parede e pavimento danificado devido a infiltração de águas provenientes das escadas e pátio superior do empreendimento. Fornecimento e montagem da caleira em inox junto ao tecto para recolha de águas infiltradas. Fornecimento e montagem de esgoto para escoamento de águas infiltradas” – cfr. fls. 61 dos autos;

23. Em 15/12/2008, a impugnante emite a fatura nº A-94, à A... pelo valor de € 3.160,00, constando da descrição daquela fatura o seguinte ”Trabalhos a mais realizados na vossa obra de Torres Vedras, de acordo com o Auto de receção de obra”- cfr. fls 62 dos autos;

24. Em todas as faturas, identificadas supra, é mencionado o seguinte “IVA devido pelo adquirente- D.L. 21/2007” cfr. fls. 60 a 110 dos autos;

25. As faturas nºs A-80, A-82 e a fatura A-94, no total de € 14.179,00, não vieram a ser pagas, tendo a impugnante efetuado diligências em Março de 2009 (envio de cartas que não foram devolvidas), com vista à sua cobrança junto da sociedade A... e de M... – cfr. fls. 118 a 126 dos autos e depoimento da testemunha A...;

26. Em 30/07/2009, no Balcão Nacional de Injunções, é instaurada a Injunção nº 287271/09.9YIPRT, no valor de € 17.992, 65, em que é Requerente: D...-Investimentos e Construção, Lda. e, Requerida, a sociedade A... -Salão de Chá, Lda. – cfr. fls. 127 a 130 e 133 a 134 dos autos e depoimento da testemunha A...;

27. C... é gerente da sociedade A... desde 24/03/2008 – cfr. fls. 280 a 286 do processo administrativo em apenso aos autos e depoimento dos declarantes R... e de J...;

28. Do cadastro dos contribuintes, informação fornecida pela A.T., constava em 2008, que a A... pertencia ao Serviço de Finanças da Maia, sujeito passivo enquadrado em IVA no regime normal/trimestral – cfr. fls. 278 do processo administrativo em apenso aos autos;

29. Em 27/08/2008, C..., com endereço na Rua S..., 11º Esq., Queluz, requer ao Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, autorização para alteração de utilização do bar de Torres Vedras “ (...) autorização de alteração de utilização, em conformidade com o estabelecido no nº 2 do art. 62º do D.L. nº 555/99, de 16 de Dezembro ...Local do pedido: B..., bloco 9, loja 5, Torres Vedras....” – cfr. fls. 161 dos autos;

30. Em 14/10/2008, M..., requer ao Presidente da Câmara Municipal de Évora, Licença de Utilização para exploração de estabelecimento em nome de A... – Salão de Chá, com endereço na Praceta S...- 11º Esq., identificando o local objeto do requerimento na Praça A..., em Évora – cfr. fls. 156 e 157 e 158 dos autos;

31. Em 22/10/2008, C... remete para a D..., Lda. carta registada, com vista à regularização das questões referentes fatura A-76, emitida pela D..., Lda., referindo que só após a realização dos trabalhos enunciados procederia aos pagamentos que se encontravam por regularizar – cfr. fls. 113 dos autos;

32. Essa carta tem como morada do remetente o endereço da sociedade A..., Lda. constante na respetiva Certidão Permanente, Praceta S..., 2745-366, referida no ponto anterior, e o seguinte conteúdo:
«Imagem no original»

- cfr. fls. 113 dos autos;

33. Por ocasião da emissão da primeira factura pela prestação dos trabalhos de construção civil, a impugnante interpelou M... com vista aquela fornecer os dados para facturação, tendo esta indicado a sociedade A..., Lda. – cfr. depoimento do declarante R...;

34. Aquando da entrega de vários equipamentos e materiais para o bar de Torres Vedras, os vários fornecedores e transportadores que se dirigiam ao local da obra perguntavam se era naquele local que entregavam os equipamentos para a A..., Lda. – cfr. depoimento do declarante J... e da testemunha M...;

35. No âmbito da Ordem de Serviço nº OI201103526, foi realizada à impugnante uma ação de inspeção interna com vista à averiguação do IVA do exercício de 2008 – cfr. fls. 44 dos autos;

36. Dessa ação inspetiva concluíram os serviços inspectivos da A.T. que existiam divergências entre o sujeito passivo D..., que havia declarado o montante de vendas de € 67.480,00, sendo que o valor de compras declarado pelo respetivo cliente, A..., foi de € 0,00 – cfr. fls. 48 dos autos;

37. Os serviços da A.T., no âmbito do procedimento inspetivo supra mencionado, no ponto 2, concluíram o seguinte: “(...) Conclusões: Pelas declarações do sujeito passivo A..., as declarações de M..., os meios de pagamento e o contrato de prestação de serviço de construção civil, conclui-se que os serviços prestados pela D... não deveriam ter sido facturados à sociedade A... mas sim, a M.... Verifica-se deste modo falta de liquidação de IVA por parte do sujeito passivo D... uma vez que a regra de inversão da obrigação de liquidação do IVA introduzida no CIVA pelo D.L. 21/2007, de 28/01, que entrou em vigor em 01/04/2007, não se aplica neste caso concreto pois o cliente não é um sujeito passivo de IVA, cabendo ao prestador de serviços liquidar o IVA de acordo com al. a) do nº 1 do art. 2º do CIVA, pelo exposto há falta de liquidação de IVA no seguinte montante (...) € 14.139,20 (...)” – cfr. relatório de inspeção a fls. 50 dos autos, que se dá aqui como integralmente reproduzido;

38. As correções efetuadas pelos serviços inspectivos da A.T. tiveram por base as seguintes facturas e valores:

NUMERO DATA CLIENTE VALOR
(EUROS)
IVA FALTA
(EUROS)
74 06/02/2008 A... 17.100,00 3.591,00
79 15/05/2008 A... 17.100,00 3.591,00
80 15/05/2008 A... 5.700,00 1.197,00
81 15/05/2008 A... 17.100,00 3.591,00
82 16/05/2008 A... 7.320,00 1.537,20
94 15/12/2008 A... 3.160,00 632,00
Total 101.680,00 14.139,20

39. Em 24/09/2011, a A.T. emite à D... - Investimentos e Construções, Lda., as liquidações adicionais de IVA/2008 seguintes:

- cfr. fls. 137 a 146 dos autos;

40. Em 24/11/2011, as liquidações adicionais de IVA e, de juros compensatórios, identificadas no ponto anterior, foram pagas pela impugnante – cfr. fls. 137 a 146 dos autos.

II. 2- DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provou que os serviços de construção civil prestados pela impugnante se tenham destinado a M..., na qualidade de proprietária e exploradora do bar “T...” em Torres Vedras.
Não se provou que M... tenha solicitado, em seu nome individual, a emissão de faturas/recibos quanto à prestação dos trabalhos pela impugnante.

Não existem outros factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.

II. 3 – MOTIVAÇÃO

A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos e expressamente referidos no probatório supra.

As declarações de R... e de J..., ambos sócios gerentes da impugnante, foram esclarecedores para fixação dos factos enunciados nos pontos 2, 3, 4, 5, 27, 33 e 34, dos quais se retirou que ambos estavam convencidos que M... e filho, C..., seriam os gerentes dos bares, pois eram eles que decidiam tudo o que à obra dissesse respeito, o que se encontra em conformidade com os factos 29, 30, 31 e 32 do probatório. Ambos os declarantes foram unânimes em referenciar M..., como a pessoa que forneceu a identificação da sociedade A..., Lda., para destinatária dos serviços prestados pela impugnante.

O depoimento de M..., que prestou trabalhos de ladrilhador no bar de Torres Vedras, foi determinante para a fixação do facto 34. Com efeito, o mesmo destacou, categoricamente, que quando lá trabalhou na execução da obra, recebia indicações sobre a orientação dos trabalhos e reclamações desse trabalho, quer de M..., quer do filho C....

O depoimento da testemunha A..., advogada da impugnante, foi esclarecedor para fixação dos factos 25 e 26, uma vez que relevou conhecimento direto dos factos por ter sido contratada com vista a dirimir o contencioso relacionado com as faltas de pagamento à impugnante, por parte da A.... Nesse âmbito, afirmou que redigiu e remeteu cartas à A... e por falta de resposta, encetou as diligências executivas. Asseverou que tanto ela como a impugnante estavam convencidas que, tanto M..., como C..., seriam os gerentes da sociedade A..., o que se encontra em conformidade com prova documental em que assentaram os factos vertidos nos pontos 2, 3, 4, 5, 27 e 33 e 34, bem como com os factos fixados nos pontos 29, 30, 31 e 32 do probatório.

Os depoimentos foram convincentes, por serem coerentes com a restante prova produzida, assente em base documental.».

B.DE DIREITO

Como se apreende das peças processuais pertinentes, a questão a resolver prende-se com a aplicabilidade in casu das regras de inversão da obrigação de liquidação do IVA, constante da alínea j) do n.º 1 do art.º 2.º do CIVA e a consequente responsabilidade ou do emitente ou do adquirente pela falta de liquidação e entrega do imposto.

O imposto sobre o valor acrescentado introduzido em Portugal em 1986 é um imposto indirecto, que tributa o consumo e, em consequência, deve ser um imposto neutro para os operadores económicos, não devendo introduzir distorções na actividade económica, sendo unicamente suportado pelo consumidor final.

Na normalidade das relações comerciais entre sujeitos passivos de IVA deve ser sempre emitida uma factura ou documento equivalente por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efectuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços – cf. art.º 28.º, n.º 1 alínea b) do CIVA, redacção vigente à época.

Esta obrigação recai sobre os fornecedores dos bens ou serviços, que consequentemente ficam também obrigados ao cumprimento da liquidação do imposto que se mostre devido – cf. art.º 36.º, n.º 1 do CIVA.

Todavia, a lei comporta, em situações especiais, desvios à normalidade dos procedimentos estabelecidos na liquidação do imposto. Tal é o caso do regime de inversão do sujeito passivo, também designado de reverse charge, em que ocorre a substituição do fornecedor ou prestador, pelo cliente, na liquidação do imposto devido pela operação económica realizada.

Na base das regras de inversão, está o escopo da prevenção da fraude e da evasão fiscal, no fundo acautelar a redução da receita fiscal, não surpreendendo, por conseguinte, que as situações a que se aplica o regime de inversão se reconduzam, nas operações localizadas (cf. art.º 1.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do CIVA), àquelas que se estabelecem entre operadores económicos integrados em ramos ou sectores de actividade em que mais recorrentemente se detectam situações de fraude e fuga a este imposto.

No contexto descrito, o Decreto-Lei 21/2007, de 29 de Janeiro, aditou ao n.º 1 do art.º 2.º do CIVA uma alínea j), passando a ter o seguinte teor no segmento que importa para os autos:
«1 – São sujeitos passivos do imposto:
a) As pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões livres, e, bem assim, as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos de incidência real de IRS e de IRC.
(…)
j) As pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada.
(…)».

Pois bem, constata-se que a regra de inversão prevista naquela alínea j) só opera em razão de dois factores: o tipo de serviços prestados (“serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada”) e o tipo de adquirente/ cliente dos serviços fornecidos (“pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto”).

Feito este enquadramento inicial e regressando aos autos, constata-se que a impugnante emitiu facturas relativas a serviços de construção civil em que menciona como adquirente um sujeito passivo, a “A..., Lda.”, NIPC 507793226 (cf. art.º 35/5, alínea a), do CIVA), com aposição da menção “IVA DEVIDO PELO ADQUIRENTE – Decreto Lei 21/2002” (cf. art.º 35/5, alíneas d) e e) do CIVA).

Ou seja, a impugnante não liquidou nas facturas emitidas o IVA devido pelas operações tituladas.

Sucede que em acção de fiscalização cruzada, apurou a AT que o destinatário constante das facturas, “A..., Lda.”, não tinha contabilizado quaisquer facturas do emitente (impugnante), nem liquidado o IVA devido pelas operações facturadas.

A empresa mencionada nas facturas como destinatária dos serviços de construção civil prestados pela impugnante (a referida A..., Lda.”), em sede de procedimento inspectivo, veio declarar que, não obstante a menção feita nas facturas, o destinatário dos serviços prestados era um terceiro, que identificou como sendo M..., a qual não preenche a condição exigida por lei quanto ao tipo de destinatário, para operar a regra de inversão do sujeito passivo ou reverse charge.

Feita a instrução julgada pertinente em sede inspectiva, concluiu a AT que não estando preenchidos, quanto ao tipo de destinatário, os requisitos da regra de inversão, a impugnante incumprira a obrigação de liquidar o imposto devido nas facturas emitidas relativas a serviços de construção civil prestados e dos quais, na realidade, M... e não a referida “A..., Lda.”, tinha sido a verdadeira beneficiária.

A impugnante, já se vê, dissente daquele entendimento tendo produzido no processo prova documental e testemunhal de que resultaram factos que convenceram a Mma. Juiz a quo de que o real destinatário dos serviços de construção civil prestados tinha sido mesmo a “A..., Lda.”, que constava das facturas como destinatário e não a citada M....

Vem agora o Recorrente, em sede recursiva, sustentar que a prova produzida não suporta a factualidade levada ao probatório, nem dela se pode extrair o juízo conclusivo de que o real destinatário dos serviços prestados foi o sujeito passivo “A..., Lda.”, que consta das facturas e que, esse sim, preenche a condição exigida quanto ao tipo de destinatário, para fazer operar a regra de inversão na liquidação do imposto.

Vejamos.

Antes de mais, tal como sublinha a Recorrida nas suas contra-alegações, o Recorrente não impugna eficazmente a decisão relativa á matéria de facto, pois não indica, nem nas alegações, nem nas conclusões, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, nem especifica os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da que foi proferida, nem indica a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, ou seja, não cumpre o ónus processual que o art.º 640.º do CPC faz recair sobre o recorrente que impugne a decisão de facto.

Nessa medida, haverá que rejeitar a impugnação da matéria de facto, sendo com o probatório da sentença que importará prosseguir na apreciação das demais questões do recurso, sem prejuízo de se vir a sindicar se se mostra erróneo o juízo conclusivo que a sentença extraiu da globalidade dos factos provados e não provados, no sentido de que o destinatário mencionado nas facturas foi mesmo o real e efectivo destinatário dos serviços de construção civil prestados, sobre ele, e não sobre a impugnante (emitente), recaindo a obrigação de liquidar o imposto devido pelas operações facturadas.

Nesta matéria, como se sabe, logo importa trazer à colação o art.º 75.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, segundo o qual (redacção à época vigente), “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”.

Nos termos do seu n.º 2, alínea a), cessa tal presunção de veracidade quando “As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.

Pois bem, para afirmar o erro ou inexactidão dos elementos constantes das facturas, a AT tem de recolher indícios sólidos, seguros e credíveis de que é outra a realidade representada por tais facturas, nomeadamente e ao que agora importa, de que foi outro (a M...), que não o mencionado (“A..., Lda.”), o real e efectivo destinatário dos serviços facturados.

Ora, base factual com aquela valia indiciária não a vemos nos autos, parecendo oportuno lembrar que, do ponto de vista dos interesses fiscais da impugnante, é-lhe indiferente liquidar o imposto ou não o liquidar, na medida em que a importância liquidada não constitui receita sua, destinando-se a ser entregue nos cofres do Estado. Ou seja, se liquida o imposto ao cliente, tem de entregar ao Estado a respectiva importância; se não liquida, nada entrega, nem a operação se reflecte na sua conta corrente do IVA.

Retomando, ilustra o probatório (não eficazmente impugnado), que os indícios recolhidos pela AT são essencialmente os seguintes:
- A impugnante emitiu facturas, mencionando ser o IVA devido pelo adquirente e, por sua vez, a entidade que figura nas facturas e recibos emitidos pela impugnante, a A..., não liquidou, nem entregou o IVA ao Estado;
- Em sede inspectiva foram ouvidos em declarações, C..., gerente da A... e M..., mãe daquele, tendo ambos negado que os trabalhos prestados pela impugnante o tenham sido à A...;
- O contrato de prestação de serviços do “Bar T...” sito em Torres Vedras, é outorgado entre a impugnante e a referida M...;
- Com referência aos pagamentos efectuados à impugnante, verificou-se que apesar de a sociedade A... ter procedido ao pagamento do montante de € 5.000,00, outros pagamentos referenciados às facturas foram efectuados por M... e, ainda em dinheiro, cheque e transferência bancária.

Ora, como a sentença refere, tais indícios apresentam-se frágeis por razões de vária ordem, a saber:

Primeiro, a credibilidade das declarações de M... e C..., tem de ser valorada sem olvidar que ambos têm, ou tinham, todo o interesse em convencer a AT de que a beneficiária dos serviços não foi a “A..., Lda.”, mas sim a M..., deste modo descartando a responsabilidade da sociedade na falta de liquidação e entrega do IVA devido pelas operações facturadas, por via do mecanismo de reverse charge.

Outrossim, decorre dos autos, que a impugnante obteve os dados para facturação da “A...”, como bem diz a sentença, “não os podia ter inventado por actuação própria, o mesmo é dizer, alguém os terá fornecido, ou M... ou o seu filho C...”.

Quanto aos fluxos financeiros que suportam as operações, as fragilidades das conclusões da AT, também resultam evidentes.

Neste ponto, cabe referir, acompanhando a sentença recorrida, que “tendo por referência os trabalhos de construção civil, se é certo que a M... efectuou pagamentos à impugnante, não é menos verdade que também há pagamentos realizados pela A..., Lda., pelo que a A.T. deveria ter realizado outras diligências investigatórias com vista ao apuramento da materialidade dos factos”.

Para além disso, como também refere a sentença, “a impugnante à data da inspecção já dispunha de elementos, os quais sugeriam que C..., enquanto gerente da empresa, reconhecia e aceitava tacitamente a emissão das facturas à A..., Lda. Com efeito, C..., referindo-se a uma factura em concreto, discute em pormenor os defeitos e o grau de acabamento da obra, o que deita por terra as declarações prestadas em sede inspectiva, nas quais M... e o próprio C... negam conhecer tais facturas (cf. pontos 31 a 33 do probatório)”.

A fragilidade indiciária, em particular no que concerne à formalização da empreitada entre M... e a impugnante, mais sai reforçada se atentarmos que decorre do probatório que a impugnante logrou demonstrar que quer aquela M..., quer o seu filho C..., desde o início actuaram perante a impugnante e seus trabalhadores de modo a convencê-los de que as obras em causa se dirigiam à exploração de uma actividade económica de bar, e que a mesma seria prosseguida pela A..., Lda., agindo eles como representantes, ainda que só de facto, desta empresa.

A impugnante logra provar, ainda, como refere a sentença, “que M... forneceu os dados da A..., Lda. para facturação, sendo certo que tal não é contrariado pelo gerente da A..., C..., a não ser na altura em que presta declarações à A.T., em sede inspectiva. Até então, nas relações comerciais que este manteve com a impugnante, aceitou as facturas emitidas em nome da empresa como decorre dos pontos 32 e 33 do probatório.

A impugnante relaciona, ainda, pagamentos de facturas/recibos, bem como diligências efectuadas junto da A..., com vista ao pagamento de determinadas facturas, indicadores que permitem concluir pela existência efectiva de uma relação comercial com aquela empresa (ponto 11 do probatório)”.
O único facto que a sentença valorou positivamente, mas que, a nosso ver, nada aproveita à pretensão anulatória da impugnante, é o vertido no ponto 26. da matéria assente, pois sendo a “A..., Lda.” a devedora que consta das facturas, naturalmente contra ela foi dirigido o requerimento de injunção. Em todo o caso, tal não inquina o juízo extraído da globalidade da restante prova.

Face ao exposto, forçoso se torna concluir que a globalidade da prova produzida não suporta a conclusão de que o real e efectivo beneficiário dos serviços de construção civil prestados e facturados pela impugnante não foi aquele que consta das facturas emitidas, ou seja, a A..., Lda., que se trata de um sujeito passivo que pratica operações que conferem direito à dedução, como tal, não recaindo sobre a impugnante (emitente), ao abrigo do regime de inversão previsto no art.º 2.º, n.º 1 alínea j) do CIVA, a obrigatoriedade de liquidação do imposto devido pelas operações facturadas.

A sentença não incorreu no erro de julgamento que lhe é apontado, merecendo ser confirmada e negado provimento ao recurso.

IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a douta sentença recorrida.

Condena-se o Recorrente em custas.

Lisboa, 14 de Outubro de 2021


Vital Lopes




Luísa Soares



Tânia Meireles da Cunha