Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1872/08.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/08/2018
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:PRÉMIOS DE PRODUTIVIDADE
CARÁCTER DE REGULARIDADE
CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL
Sumário:I. Consideram-se remunerações sujeitas a contribuições para a segurança social, para efeitos do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, os prémios de produtividade que tenham carácter de regularidade;
II. O carácter de regularidade do prémio de produtividade deverá ser aferido casuisticamente, atendendo às circunstâncias do caso concreto;
III. Uma prestação terá carácter regular quando assume a mesma natureza e se repete num intervalo de tempo (contínuo ou periódico) podendo esses montantes ser constantes ou variáveis;
IV. Assumem carácter regular para os efeitos do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, os prémios de produtividade com as características dos autos, designadamente, que são contratualizados aquando da admissão do trabalhador com a designação de “remuneração variável anual”, cujos valores são actualizados anualmente, e que são pagos durante vários anos, e em regra, em determinados meses do ano, podendo abranger em alguns casos os 12 meses do ano, sendo pagos por adiantamento.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

... Services, SA., com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial por si apresentada, contra a liquidação adicional respeitante ao apuramento efectuado em acção de inspecção do Instituto da Segurança Social, relativo a ajudas de custo, subsídios de transporte e prémios de produtividade correspondentes aos anos de 2003 a 2008.

A Recorrente apresentou as suas alegações e formulou as seguintes conclusões:

«Conclusões

A) O tribunal a quo considerou que os prémios de produtividade pagos pela Recorrente são sujeitos a descontos para a Segurança Social;
B) É sobre esse entendimento que discorda a Recorrente;
C) Foi estipulado que os prémios seriam pagos sempre que os trabalhadores atingissem determinados objectivos;
D) Não existia expectativa de recebimento, mas sim vontade nesse recebimento;
E) Por conta desse hipotético prémio, a Recorrente decidiu pagar adiantamentos, havendo lugar a acertos no final do ano, após o fecho de contas;
F) Nem sempre houve lugar a pagamento de prémio, caso em que os trabalhadores tiveram de devolver as entregas antecipadas;
G) Os prémios de produtividade não são considerados como retribuição, nos termos do Código do Trabalho;
H) Devem, por isso, ser excluídos de tributação em sede de Segurança Social.»


O Recorrido, Instituto da Segurança Social, não apresentou contra-alegações.

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Foram os autos a vista da Magistrada do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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A questão invocada pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir, consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento, na medida em que os prémios pagos pela Impugnante aos seus trabalhadores não estão sujeitos a contribuições para a segurança social, porquanto não existia a expectativa do seu recebimento, não sendo considerados retribuição [conclusões A) a H) ].

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«III. I – DE FACTO

Com relevância para a decisão da presente ação de impugnação, de acordo com as diversas soluções plausíveis de direito, considero provados os seguintes factos:
A)
Decorre dos autos que a impugnante, «... Services, SA», anterior «..., SA.» é uma sociedade anónima, integrada num grupo de nacionalidade espanhola, cuja atividade económica se insere na área da limpeza industrial, com o número de segurança social NISS ...;
B)
Nos contratos de trabalho celebrados entre a impugnante e os quadros superiores ficou estabelecido na Cláusula 4.ª o seguinte:
«(…)

1- A PRIMEIRA OUTORGANTE pagará ao Trabalhador uma remuneração fixa mensal de €1.775,00 (mil setecentos e setenta e cinco euros), sujeita aos descontos legais.

2– A PRIMEIRA OUTORGANTE pagará ainda ao trabalhador:
a) A quantia de €5,24 por dia de trabalho a título de subsídio de alimentação;
b) A quantia mensal de €444,00 a título de retribuição especial por isenção de horário de trabalho, logo e quando for praticada;

3– A PRIMEIRA OUTORGANTE pagará ainda ao Trabalhador uma remuneração anual variável até ao máximo de €7.000,00, a pagar em função de objetivos, sendo como tal, auferível em condição, que será recebido na proporção do tempo de trabalho em cada ano civil. Esta remuneração variável será paga a título de prémio, em função dos resultados mensais, por adiantamentos por conta que se vencerão em datas a fixar pela Empresa, e sendo que, por se tratar de um prémio anual em função de objetivos, o acerto final e definido das contas terá lugar após o encerramento anual das contas. Os resultados a atingir são os estabelecidos anualmente pela empresa podendo ser alterados em cada ano civil.
(…)»
(cfr. fls. 101 dos autos)
C)
Para além do Contrato de Trabalho foi celebrado um “Acordo Sobre Prémios de Produtividade” relativamente aos anos 2003 a 2006, cujo teor se dá por reproduzido, de fls. 104 a 127 dos autos;
D)
À impugnante foi instaurado um processo de Averiguações n.º 200801198679, por falta de entrega de contribuições devidas sobre remunerações, compreendidas entre Janeiro de 2003 e Fevereiro de 2008 no montante de €205.599,77, descritas no relatório do Departamento de Fiscalização, de cujo conteúdo, se retira que:
«(…) III – APRECIAÇÃO DA MATÉRIA E DA PROVA PRODUZIDA

3.1 - Tendo em consideração a prova carreada para os autos resulta claro que a empresa “... Services, S.A.” pagou aos seus trabalhadores a exercerem cargos de chefia valores a título de Subsídio de Transporte, Ajudas de Custo e Prémios de Produtividade (no período compreendido entre Janeiro de 2003 a Fevereiro de 2008) e que não entregou as Declarações de Remunerações, referentes aos meses de Dezembro de 2007, Janeiro e Fevereiro de 2008 (tendo procedido à sua entrega após a intervenção destes serviços).
3.2 – Resulta ainda provado que sobre os valores pagos a título de Subsidio de Transporte, Ajudas de Custo e Prémio de Produtividade não incidiram descontos para a Segurança Social.
3.3 – Resulta também provado que os abonos pagos a título de Subsidio de Transporte e Prémio de Produtividade são contratualizados assumindo o primeiro um valor fixo distribuído pelos doze meses do ano e o segundo a designação de “remuneração variável anual”.
3.4 – Resulta quanto ao abono pago a título de Prémio de Produtividade que este não é mais do que uma remuneração variável anual (designação constante dos contratos de trabalho elaborados pelo contribuinte) paga de forma regular e contínua inerente à prestação de trabalho que assenta em critérios objectivos conferindo assim ao trabalhador a justa expectativa do seu recebimento sendo então passível de descontos para a Segurança Social, de acordo com a alínea d) do n.” 3 de Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, na redacção dada pelo Decreto Regulamentar n.º 53/83 de 22 de Junho.
3.5 – Resulta quanto ao Subsidio de Transporte que este não é mais do que uma forma de remuneração uma vez que o mesmo assume um valor fixo mensal e não existe documentos que suportem tal natureza sendo então passível de descontos para a Segurança Social.
3.6 – Resulta quanto ao abono pago a título de Ajudas de Custo que o mesmo apresenta um valor fixo ao longo dos meses não existindo documentos suporte que justifiquem o seu pagamento não havendo relativamente ao abono Subsídio de Alimentação a equivalência comportamental que se deveria verificar (por cada ajuda de custo paga subtracção do respectivo subsidio diário de alimentação) de acordo com o art.º 37 o do Decreto Lei n.º 106/98 de 24 de Abril, assumindo-se que a mesma é uma forma de remuneração sendo então passível de descontos para a Segurança Social.
3.7 – Resulta desta forma a elaboração dos Mapas de Apuramento onde constam os abonos pagos ao grupo de trabalhadores em análise a título de Ajudas de Custo, Subsidio de Transporte e prémio de Produtividade no montante de 205.599,77 (duzentos e cinco mil quinhentos e noventa e nove euros e setenta e sete cêntimos) Euros, onde nos meses de Janeiro e Outubro de 2003. Julho de 2004, Maio e Outubro de 2005, Janeiro e Abril de 2006, Julho e Outubro de 2007 e Fevereiro de 2008, o valor das contribuições mensais ascendem a 7.500,00 (sete mil e quinhentos) Euros donde resultam indícios da prática do crime de Fraude contra a Segurança Social de acordo com o art.º 106 do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT).
3.8 – Resulta ainda que pela falta de entrega das Declarações de Remunerações referentes aos meses de Dezembro de 2007, Janeiro e Fevereiro de 2008 foram levantados os respectivos Autos de Notícia de acordo com a alínea b) do Art.º 7° n.º 1, do Decreto-Lei n.º 64/89, de 25 de Fevereiro, e Art.º4° do Decreto-Lei nº 103/80 de 09 de Maio;
3.9 – Resulta também que o contribuinte, após a intervenção deste serviço, procedeu à entrega das Declarações de Remunerações referentes aos meses de Dezembro de 2007, Janeiro e Fevereiro de 2008 estando regularizada a situação que se prende com a falta de entrega de Declarações de Remunerações junto da Segurança Social tendo-se apurado um total de contribuições no valor de 417.272,73 (quatrocentos e dezassete mil duzentos e setenta e dois euros e setenta e três cêntimos) Euros.
(…)»
(cfr. fls. 309 a 311 dos autos)
E)
Através do Ofício n.º 30317 de 13.08.2008 a impugnante foi notificada da decisão definitiva do Relatório da Fiscalização e dos fundamentos que serviram de base à «Elaboração de Declarações de Remunerações», cujos mapas de apuramento de valores se encontram juntos, a fls. 284 a 321;
F)
A política de objetivos anual foi implantada, em 1999 junto de todo o Grupo ... (ora ...), onde se encontram estabelecidos os seus termos e condicionalismos, cf. doc. n.º3 junto com a petição inicial, e cujo conteúdo se dá por reproduzido;
G)
Os prémios de produtividade eram pagos aos cargos de chefia, por avaliação trimestral da situação económica do ano, segundo os objetivos delineados pela empresa em função do desempenho e do volume de vendas, facturação;
(cfr., depoimento unânime das testemunhas da impugnante e inspectora da SS)
H)
Da avaliação final anual, relativa aos objetivos a cumprir, resultava um encontro de contas com as pessoas que recebiam os prémios, para mais ou para menos, dos montantes já recebidos;
(cfr., depoimento unânime das testemunhas da impugnante)
I)
O montante atribuído aos cargos de chefia a título de ajudas de custo, todos os meses do ano foi acordado com a direcção da empresa em Espanha, suscetivel de ser alterado por insuficiência das despesas a realizar no exercício da função desempenhada;
(cfr., depoimento unânime das testemunhas da impugnante)
J)
O montante atribuído aos cargos de chefia a título de subsídio de transporte, todos os meses do ano foi acordado com a direcção da empresa em Espanha, suscetivel de ser alterado por insuficiência das despesas a realizar no exercício da função desempenhada;
(cfr., depoimento unânime das testemunhas da impugnante)
K)
A forma de funcionamento da empresa, os cheques, transferências bancárias e os pagamentos à segurança social eram todos efetuados a partir de Espanha;
(cfr., depoimento da inspectora da SS)

III.I – Factos não Provados
Não se provaram outros factos com relevância para a presente decisão.

MOTIVAÇÃO

A matéria de facto, dada como provada nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, a formação da convicção do tribunal, para efeitos da fundamentação dos factos, atrás dados como provados, encontra-se referida no probatório com remissão para as folhas do processo onde se encontram, bem como da prova testemunhal produzida, em sede de inquirição das testemunhas arroladas pela impugnante.

Prova Testemunhal:

Marco ..., gestor de uma unidade de negócio de uma empresa “... Groupe” trabalhou na impugnante desde 2003 até final de 2008. Afirmou que a empresa fixava uma série de rácios e objetivos a atingir anualmente de volume de vendas. Confirmou que no ano de 2003 recebeu prémios de produtividade. Não recebeu todos os anos porque os objetivos delineados para a empresa e em função do desempenho comercial eram atingiam ou não. Afirmou que não tinha espectativa de o receber mas tinha desejo e lutava por esse objectivo. Esclareceu que o prémio era efetuado por acordo com a empresa, em função do volume de vendas (de negócios conseguidos). Confirmou que era pago faseadamente, por trimestre, com valores variáveis de acordo com os pontos atingidos em cada exercício, como forma incentivar a conseguir o objectivo proposto. Se no final do ano este não era totalmente atingido faziam o acerto do que foi adiantado ou a devolução do que já tinha recebido. Confirmou ao tribunal que em 2004 não recebeu qualquer prémio de produtividade porque não atingiu os objetivos traçados para esse ano.
José ..., trabalhador da impugnante entre 2004 e 2015 geria contratos, efetuados com pessoas, materiais de limpeza e manutenção.
Afirmou ao tribunal que recebia prémios de produtividade em função dos objectivos traçados para a empresa em Portugal baseado no volume de faturação e margem. Confirmou que apenas recebia o prémio se esses objetivos fossem atingidos sendo o seu pagamento era feito por indicação de Espanha, através de uma análise trimestral, e se a situação estivesse a correr bem, no sentido de alcançar os objetivos recebiam um adiantamento. Informou que posteriormente passou a ser semestral e há cerca de 4 anos, passou a ser anual, devido ao mau estar de quem tinha de devolver verbas por recebimento a mais.
Confirmou ainda que, como responsável da zona sul, desde Castelo Branco até ao Algarve andava permanentemente andava de cima abaixo do país. Afirmou que por vezes tinha de ficar nas localidades onde realizava os serviços e recebia ajudas de custo. Afirmou que os horários de funcionamento da impugnante são definidos pelos clientes. Esclareceu o tribunal afirmando que, com a sub-rogação, prevista no contrato colectivo de trabalho do setor, quando a empresa que vence o concurso, tem de receber os trabalhadores das empresas sub-rogadas e manter as regalias já tinham, sendo os clientes que determinam os horários da prestação de serviço de limpeza que necessitam. Informou que as limpezas industriais normalmente são efetuadas durante a noite e fora dos horários normais de trabalho e que os piquetes são permanentes durante 24 horas. Confirmou que a impugnante tinha cerca de 150 locais diferentes de prestação de serviços e os horários têm de ser cumpridos em todos. Afirmou que, inicialmente, em relação às ajudas de custo e subsídio de transporte, as pessoas pagavam as despesas e depois apresentam os comprovativos e a empresa pagava. Mas como pagava sempre tarde por problemas de tesouraria e as pessoas ganhavam pouco ficou acordado que a impugnante pagava às pessoas um valor mensal fixo e se depois achassem que não chegava falavam com a empresa, mas faziam por chegar também para contribuir para os objetivos da empresa e fazer face às despesas da função. Confirmou que as ajudas de custo eram pagas quando tinha de ficar a dormir e comer em Portalegre, Elvas, Algarve, Castelo Branco etc.. Informou nos encerramentos em larga escala tinha muitas vezes de ir buscar pessoas para trabalhar toda a noite. Confirmou que tinha subsídio de transporte, não obstante a empresa ter uma frota de carros para transportar os trabalhadores. Mas, como vive em Setúbal e a sede da empresa é em Lisboa e tinha de se deslocar de urgência ao Algarve ou ao Norte, não vinha a Lisboa buscar um carro da empresa ia no seu carro e depois a empresa pagava. Confirmou que o subsídio de transporte não está incluindo nas ajudas de custo porque a política da empresa exigia que fosse separado. Esclareceu que nem sempre era possível utilizar veículo da empresa por não havia, chegava a fazer cerca de 5 mil quilómetros repartidos entre o seu carro e o carro da empresa. Informou que muitas vezes o planeamento feito pela empresa não é cumprido porque surgem situações de emergência não planeadas e que obrigam o movimento de trabalhadores em que não existe viatura da empresa disponível. As pessoas que tinham ajudas de custo e subsídio de transporte eram dois ou três responsáveis de área e dois ou três supervisores. Esclareceu ainda que, como não podiam gozar férias num mês inteiro, estipularam com a empresa, um valor médio igual para todos os meses do ano. Afirmou por fim que esses trabalhadores chegaram a um acordo com a empresa em função das despesas que efectuavam em resultado da função exercida.
António ..., representa a zona geográfica de Portugal na empresa mãe espanhola e afirmou que a política salarial é estipulada pela Direção e Administração de Espanha.
Confirmou ao tribunal que, o Prémio de Produção é atribuído em função dos objetivos traçados pela empresa para cada ano e traduz-se na angariação de clientes ou produção e pode ser atribuído ao pessoal mais operacional ou ao mais comercial. Confirmou que quando entrou para a empresa lhe disseram que teria um vencimento base e constante e ainda poderia ter prémio de produtividade se atingisse os objetivos traçados para cada ano. Caso não fosse cumprido o objectivo não haveria prémio. Afirmou que, na altura em causa ao fim de cada trimestre a empresa fazia uma avaliação para aferir se a situação conduzia ao cumprimento do objectivo e que, no final de cada ano, era feita um encontro de contas para mais ou para menos, dos montantes já recebidos.
Quanto às ajudas de custo, esclareceu que a dispersão geográfica dos trabalhos prestados pela empresa é muito grande e são efetuados nas instalações dos clientes, na sua maioria industriais. Confirmou que, para além da deslocação permanente existem muitos imprevistos de acompanhamento e estas pessoas incorrem em despesas próprias que a empresa depois tem de os compensar. Esclareceu ainda exemplificando que existem muitos problemas internos relacionados com trabalhadores que faltam e têm de ser substituídos com tempo de resposta muito curto, máquinas que se avariam e têm de ser substituídas. Confirmou ao tribunal que no, ano de 2004 a empresa teve que pagar indemnizações a trabalhadores o que afetou os resultados financeiros, em consequência do resultado de várias decisões jurídicas, era ... nessa altura, o que representou uma situação pesada para Portugal. Devido a essa situação a direcção central tomou uma atitude excecional de pagar, ainda assim, prémios a quem cumpriu os objetivos. Confirmou também que recebia ajudas de custo porque saía várias vezes todos os meses do seu local de trabalho para todos os locais de prestação de serviços espalhados pelo país. Esclareceu que Espanha estipulou consoante a atividade exercida por determinadas pessoas um valor fixo, sendo que os trabalhadores operacionais recebiam mais. Esclareceu que nunca recebeu subsídio de transporte porque a empresa colocou à disposição algumas viaturas que eram utilizadas pela testemunha. Esclareceu por fim que, as de ajudas de custo que recebem todos aos meses reside no facto de não poderem gozar o período de férias todo junto, razão porque trabalham todos os meses.
Filomena ..., inspectora da Segurança Social, participou na elaboração do relatório em causa dos autos informou o tribunal que o subsídio de transporte estava contratualizado e era pago nos 12 meses ao ano. Informou também que as ajudas de custo não tinham documentos suporte nem foi subtraído do subsídio de alimentação que faz parte da remuneração. Afirmou que em relação ao prémio de produtividade existia uma adenda ao contrato de trabalho todos os anos para actualizar os valores que iriam ser pagos ao trabalhador.
Confirmou que estes prémios eram atribuídos a cargos de chefia e estavam diretamente ligados com a facturação atingida pela empresa. Afirmou que quando questionada, a pessoa que estava à frente dos recursos humanos, sobre as questões em causa nos autos afirmou que tinha de desconhecimento do funcionamento da empresa afirmando que os cheques, transferências bancárias bem como os pagamentos à segurança social eram todos efetuados a partir de Espanha.
As testemunhas revelaram nos seus depoimentos, isenção responderam às
questões colocadas sem hesitações demonstrando ter conhecimento directo dos factos a que foram indicados.»

****
Com base na matéria de facto supra transcrita, o Meritíssimo Juiz do TT de Lisboa julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, designadamente, na parte com relevo para o presente recurso, julgou-a improcedente na parte respeitante às correcções relativas aos prémios de produtividade dos anos de 2004 a 2008, entendendo em síntese que os prémios de produtividade estão sujeitos a contribuições para a segurança social na medida em que apresentam, in casu, caracter regular.

A Recorrente Impugnante não se conforma com o decidido invocando erro de julgamento na medida em que os prémios pagos aos seus trabalhadores não estão sujeitos a contribuições para a segurança social, não existia a expectativa do seu recebimento, não sendo considerados retribuição, não obstando ao carácter aleatório e eventual o facto de se estipularem critérios objectivos para a atribuição do prémio, nem o facto de se encontrar acordado contratualmente [conclusões A) a H)].

Portanto, cumpre aferir se os prémios de produtividade ora em causa integram a base de incidência das contribuições para a segurança social.

Conforme resulta dos autos, a Recorrente Impugnante foi objecto de uma acção de inspecção no âmbito da qual os serviços da segurança social apuraram contribuições em falta e elaboraram as respectivas liquidações oficiosas.

Relativamente à correcção referente aos prémios de produtividade subjaz o entendimento da segurança social de que estamos perante uma remuneração variável anual, de natureza retributiva, porque paga de forma regular e contínua inerente à prestação de trabalho que assenta em critérios objectivos conferindo assim ao trabalhador a justa expectativa do seu recebimento, e por conseguinte, constitui base de incidência contributiva, nos termos da alínea d) do art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro.

Os serviços de inspecção fundaram a sua conclusão nos seguintes indícios apurados quanto aos prémios de produtividade:
_ são contratualizados aquando da admissão do trabalhador com a designação de “remuneração variável anual”, sendo anualmente efectuada uma adenda ao contrato de trabalho para actualização dos valores a atribuir;
_ são pagos, em regra, nos meses de Abril, Julho e Outubro e Fevereiro do ano seguinte, de forma a se proceder a acertos de valores de acordo com o contratualizado;
_ são pagos por adiantamentos trimestrais, na totalidade dos anos em análise (5 anos);
_ em alguns casos são pagos durante os 12 meses dos anos em análise;
_ está assente em critérios objectivos, como seja o volume de facturação, entre outros identificados nas adendas dos contratos de trabalho, cuja verificação dessas condições objectivas contratualizadas, o contribuinte tem a obrigação de pagar os montantes acordados.

Vejamos.

Dispunha a alínea d) do art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro:

“Artigo 2.º Para os efeitos do disposto no artigo anterior, consideram-se remunerações as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação do trabalho e pela cessação do contrato, designadamente: (…)
d) Os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de economia e outros de natureza análoga, que tenham carácter de regularidade; (redacção dada pelo Decreto Regulamentar n.º 53/83 de 22 de Junho).”

Portanto, nos termos daquela disposição legal, em conjugação como o art. 1.º do mesmo diploma, e para o que importa nos autos, constituem remunerações, sujeitas a contribuições para a segurança social, os prémios de produtividade que tenham carácter de regularidade.

Por outras palavras, constitui base de incidência contributiva para a segurança social, nos termos da alínea d) do art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, os prémios de produtividade que tenham carácter de regularidade, e portanto, ficará excluída do âmbito de incidência normativa dos prémios de produtividade que não assumam esse carácter de regularidade.

O conceito de regularidade para efeitos da delimitação da base de incidência contributiva das prestações que constituam prémios de produtividade encontra-se actualmente estabelecido no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (aprovado pela Lei 110/2009, de 16 de Setembro), na redacção dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro que alterou o art. 47.º que sob a epígrafe “Conceito de regularidade” estatui: “Considera-se que uma prestação reveste caráter de regularidade quando constitui direito do trabalhador, por se encontrar preestabelecida segundo critérios objetivos e gerais, ainda que condicionais, por forma que este possa contar com o seu recebimento e a sua concessão tenha lugar com uma frequência igual ou inferior a cinco anos.”

No entanto, importa ter presente que, in casu não se poderá aplicar aquele conceito de regularidade previsto consagrado no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Socia para determinar se as prestações pagas a título de prémios de produtividade nos anos de 2004 a 2008 pela Impugnante encontram-se abrangidas pela base de incidência contributiva, porquanto, à época, aquele regime não se encontrava em vigor, sendo aplicável a alínea d) do art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro.

É, por isso, fundamental estabelecer um critério orientador que permita aferir quando um prémio de produtividade tem carácter de regularidade, sendo certo que a lei o não concretiza, pois sendo regular constitui remuneração está sujeita a contribuições para a segurança social.

No acórdão do STA de 09/12/2009, proc. 0739/09 entendeu-se “(…) é em face da lei vigente à data dos factos que a questão sub judice deve ser analisada, respeitando os factos a contribuições para a segurança social dos anos de 2000, 2001, 2002 e 2003 (até Março). (…) havendo que recorrer, em caso de necessidade, às normas gerais sobre a matéria vigentes à data dos factos (Lei do Contrato de Trabalho - LCT - e Decreto Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro).”).

No âmbito do direito do trabalho, não são consideradas retribuições os prémios de produtividade quando não tenham carácter regular e permanente, como se retira da conjugação do disposto no n.º 1 e 3 do art. 260.º do Código do Trabalho.

Como se sumariou no acórdão do STJ de 26/05/2015, proc. n.º 373/10.7TTPRT.P1.S1 “II - Não assume natureza retributiva o prémio de produtividade cuja atribuição estava dependente da avaliação da produtividade e do desempenho profissional dos trabalhadores, num ciclo temporal anual, excluída estando, em função desses factores, a antecipada garantia do direito ao seu pagamento. (…)”

Mais se entendeu naquele acórdão, interpretando-se o art. 260.º, n.º 1 e n.º 3 do Código do Trabalho, o seguinte: “Tratando-se de uma prestação específica, dependente do preenchimento de requisitos pré-estabelecidos (avaliação de desempenho/alcance dos objectivos), que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados, excluída estava a antecipada garantia do direito ao seu pagamento.
A lei retira-lhe expressamente a natureza retributiva – art. 260.º, n.º 1, c), do Cód. Trabalho: não se consideram retribuição (c) as prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido.
Só assim não será – o disposto na alínea c) do n.º 1 não se aplica… – se verificado o condicionalismo previsto no n.º 3, a), da norma, (…).
E sendo a função principal de tal prestação condicional – como o postulante expressamente reconhece – a de premiar a produtividade e o desempenho profissional dos trabalhadores, num ciclo temporal anual, com a sua atribuição dependente, além do mais, de uma avaliação de desempenho, conceder-se-á que não colhe o entendimento preconizado no sentido de que, no contexto delineado, a pretendida atribuição era obrigatória.” (sublinhado nosso)

Portanto, considerando a jurisprudência supra citada, a priori, os prémios de produtividade, cuja atribuição estava dependente da avaliação da produtividade e do desempenho profissional dos trabalhadores, não assume natureza retributiva, só assim não será se “pela sua importância e carácter regular e permanente, devam, segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele;” - cfr. alínea a) do n.º 3 do art. 260.º do Código do Trabalho.

Sobre o carácter regular das prestações o acórdão do STJ de 14/01/2015, proc. n.º 2330/11.7TTLSB.L1.S1: “Ainda no que se refere às caraterísticas da regularidade e da periodicidade e da repercussão que as mesmas importam na expetativa de ganho do trabalhador, afigura-se-nos ser incontornável que, efetivamente, uma atribuição patrimonial que não permita que se infira uma certa cadência no seu pagamento e que não tenha a virtualidade de, precisamente e por essa via, originar na esfera jurídica do trabalhador aquela expetativa não pode ser qualificada como retribuição, para os efeitos a que agora importa atender.”

Sumariou-se neste acórdão “Deve considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de retribuição, para os efeitos de cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorra todos os meses de atividade do ano.”

“A regularidade das prestações que constituem a retribuição exprime, como ensina Bernardo Xavier, o seu carácter não arbitrário, sugerindo que seguem "uma regra permanente", que se caracterizam pela constância.” – Ac. do STJ de 25/11/2002, proc. n.º 83/02.

Cumpre sublinhar, antes de mais, que o carácter de regularidade do prémio de produtividade, pressuposto que a verificar-se consideram-se remunerações nos termos do art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, deverá ser aferido casuisticamente, atendendo às circunstâncias do caso concreto.

Não obstante, em termos gerais, uma prestação regular significará que estamos perante mais do que uma prestação da mesma natureza que se repete durante um certo período de tempo (contínuo ou periódico), cujos montantes podem ser constantes ou variáveis. Parece-nos que deverá ser este o critério orientador da regularidade de uma prestação que confere natureza de remuneração à prestação nos termos e para efeitos do art. 2.º do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro.

Portanto, um prémio de produtividade assume carácter regular, constituindo remuneração, quando é atribuído várias vezes durante um significativo período de tempo, quer seja de forma contínua, quer seja com uma determinada periodicidade, cujos montantes podem ser constantes ou variáveis.

Com efeito, ainda que as prestações que configuram prémio de produtividade tenham valores distintos, tal facto, de per se, não afasta o carácter regular do prémio, pois o carácter regular previsto da lei reporta-se às prestações que constituam prémios de produtividade, e não aos montantes destas prestações.

Já não assumirá carácter regular um prémio de produtividade que é atribuído esporadicamente, que ocorre sem constância no tempo, sem periodicidade ou continuidade.

Portanto, para aferir do carácter regular de um prémio de produtividade importa, sobretudo, analisar, casuisticamente, a sua periodicidade, o intervalo de tempo que medeia entre as sucessivas prestações.

Regressando ao caso dos autos, os prémios de produtividade em causa são contratualizados aquando da admissão do trabalhador com a designação de “remuneração variável anual”, sendo anualmente efectuada uma adenda ao contrato de trabalho para actualização dos valores a atribuir.

Ora, concorre para o carácter regular de um prémio de produtividade, embora de forma não decisiva, quando do contrato de trabalho se possa inferir que a atribuição desse prémio se irá repetir ao longo do contrato de trabalho. Ou seja, resulta do próprio contrato de trabalho um indício de que a atribuição do prémio de produtividade irá se repetir, que não tem carácter esporádico, que constitui uma “remuneração variável anual”. Como muito bem se refere na sentença recorrida “aquando a celebração contratual o trabalhador fica ciente de que receberá ainda uma remuneração anual, não obstante o limite de €7.000, a fixar em função dos objectivos e na proporção do tempo de trabalho em cada ano civil, sendo que os resultados a atingir são estabelecidos anualmente pela empresa, podendo ser alterados em cada ano civil”.

No que diz respeito à constância do prémio de produtividade os serviços de inspecção apuraram que são pagos, em regra, nos meses de Abril, Julho e Outubro e Fevereiro do ano seguinte, de forma a se proceder a acertos de valores de acordo com o contratualizado, e são pagos por adiantamentos trimestrais, na totalidade dos anos em análise (5 anos), e em alguns casos são pagos durante os 12 meses dos anos em análise. Parece-nos que estes são os indícios decisivos para a classificação dos prémios de produtividade como regulares.

Estes elementos sustentam consistentemente que as prestações ora em causa assumem um carácter regular, pois repare-se, é uma constante a atribuição das prestações, são atribuídas periodicamente, em regra de três em três meses, e todos os anos. A regularidade do prémio de produtividade fica evidenciada pela sua repetição não só no mesmo ano, mas também, ao longo de vários anos. Ou seja, parece-nos que estamos perante um prémio de produtividade que é pago regularmente, pois a sua constância no tempo é manifesta quer quando se analisam períodos de tempo mais curtos (meses) quer mais longos (anos), e é esse carácter regular que preenche a previsão legal considerando-se remunerações, nos termos do no art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro.

Portanto, dos indícios apurados que resultam do contrato de trabalho, quer dos que resultam da forma como se processou o pagamento concreto dos prémios de produtividade, resulta de forma consistente que estamos perante uma prestação com carácter regular, e assim sendo, nos termos do disposto no art. 2 do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, essas prestações consideram-se remunerações sujeitas a contribuições para a segurança social.

E, ao contrário do que parece entender a Recorrente, não se coloca em causa que os prémios de produtividade apenas sejam pagos quando sejam atingidos os objectivos (alínea G) e H) da matéria de facto assente), nem está em causa a existência de expectativa no recebimento de per se, o que está em causa é o seu carácter regular que permite preencher a hipótese legal do disposto no art. 2.º do Decreto Regulamentar 12/83 de 12 de Fevereiro, pelo que improcedem as conclusões de recurso C) a F) e H). Por outro lado, não é rigorosa a afirmação vertida na conclusão de recurso G), pois conforme supra exposto, nos termos da alínea a) do n.º 3 do art. 260.º do Código do Trabalho revestem natureza retributiva quando têm carácter regular.

Encontra-se, deste modo, legitimada a actuação dos serviços de inspecção da segurança social, tendo cumprido com o seu ónus da prova (art. 74.º, n.º 1 da LGT) não tendo a Recorrente logrado infirmar o carácter regular das prestações, e nessa medida, improcedem todas as conclusões de recurso.

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pela Recorrente.
Após trânsito em julgado, informe o Magistrado do Ministério Público conforme solicitado a fls. 581.
D.n.
Lisboa, 8 de Março de 2018.

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Cristina Flora

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Ana Pinhol

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Joaquim Condesso