Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2375/07.1BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:05/13/2021
Relator:VITAL LOPES
Descritores:IRC;
TRANSMISSIBILIDADE DE PREJUÍZO FISCAL;
ACTO TÁCITO DE DEFERIMENTO.
Sumário:1. Por força do disposto no art. 69.º, n.º 7, do CIRC (na redacção da Lei n.º 32 -B/2002, de 30 de Dezembro), o pedido de autorização de transmissibilidade dos prejuízos fiscais aludido no seu n.º 1, desde que instruído com os elementos previstos no n.º 2, era de considerar tacitamente deferido se a decisão não fosse proferida «no prazo de seis meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais antiabuso eventualmente aplicáveis».
2. Não podem considerar-se «elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação» de fusão de sociedades os necessários para averiguar se existem ou não dívidas à Segurança Social e se algumas das sociedades intervenientes na operação efectuaram já o pagamento de dívidas que lhes estavam a ser exigidas em processos de execução fiscal.
3. Como assim, tais exigências apresentam-se “contra legem” não tendo virtualidade para suspender o decurso do prazo de deferimento tácito, nos termos do art.º 108/4 do aplicável CPA.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por “S………, S.A.” da liquidação adicional n.º………, compensação n.º…………, em que foi apurado um valor de IRC a pagar, referente ao exercício de 2004, de 9.914,20 Euros.

A Recorrente termina as alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões:
«

A. Salvo o devido respeito, a douta sentença incorre em erro de julgamento que resulta não só da incorrecta valoração da factualidade assente, como também da errónea interpretação e violação da lei.

B. Em 04-09-2004 a Impugnante entregou, ao abrigo do art. 69º do CIRC, pedido de autorização de dedução de prejuízos fiscais, desacompanhada de Certidão de Registo Comercial e de certidão de não dívida à AT e à Segurança Social.

C. A transmissibilidade dos prejuízos fiscais é um benefício fiscal já que se trata de uma “medida de carácter excepcional instituída para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes superiores aos da própria tributação que impedem” – art. 2º, nº 1 do EBF.

D. Acrescentado o nº 2 do mesmo preceito que “São benefícios fiscais as isenções, as reduções de taxas, as deduções à matéria colectável e à colecta, as amortizações e reintegrações aceleradas e outras medidas fiscais que obedeçam às características enunciadas no número anterior”.

E. Ora, tratando-se de um benefício fiscal, nos elementos previstos naquele nº 2 do artigo 69º do CIRC – “todos os (…) necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos” – integra-se o ónus constante do artigo 11º-A, nº 1, do EBF.

F. Assim sendo, contrariamente ao decidido na douta sentença, a impugnante tinha que demonstrar que lhe poderia ser concedido o benefício fiscal, o que implica a comprovação da inexistência de dívidas fiscais ou à segurança social.

G. Contudo, este pedido de autorização, como resulta dos factos dados como provados, não foi instruído com “todos os elementos necessários ou convenientes”, já que a impugnante, só juntou certidão de não dívida actualizada em 22-02-2006, após regularização da dívida a ser cobrada no PEF nº ……………

H. Não tendo sido juntos os todos os elementos exigidos para análise do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais em 04-02-2005, data da junção da Certidão do Registo Comercial, o acto tácito de deferimento nunca se poderia formar seis meses depois, em 05-08-2005, como sustentado na sentença recorrida.

I. Tal só poderia ocorrer em 23-08-2006, seis meses depois de a contribuinte ter apresentado a certidão de inexistência de dívidas actualizada, o que aconteceu a 22-02-2006.

J. Todavia, à formação deste acto tácito de deferimento, obsta a decisão do procedimento por acto expresso do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 11-08-2006, notificado, via postal sob registo de 14-08-2006, pelo que nenhum acto tácito se formou.

K. Não se tendo formado qualquer acto tácito anteriormente, o acto expresso do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais é um acto administrativo primário, é o acto que decidiu o procedimento, indeferindo a transmissibilidade dos prejuízos fiscais no ano de 2004, uma vez que nesse exercício não houve acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante.

L. Pelo que, ao considerar que ocorreu presunção de deferimento tácito em 05-08- 2005, violou a sentença recorrida o disposto nos art. 69º do CIRC e art. 11-A do EBF.


Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação judicial totalmente improcedente.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA».l

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo pela improcedência do recurso.

Com dispensa dos vistos legais dado que as questões a dirimir já foram tratadas na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e deste Tribunal Central Administrativo, e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões da alegação do recurso, a questão nuclear que se coloca é a de saber se, no caso, estavam ou não reunidos os requisitos para a formação do deferimento tácito, designadamente se pode considerar-se que o requerimento da impugnante de autorização para deduzir os prejuízos fiscais, previsto no n.º 1 do artigo 69.º do CIRC, estava acompanhado dos elementos previstos no n.º 2 do mesmo artigo, de modo a que, nos termos do n.º 7, sempre do mesmo artigo, aquele requerimento pudesse considerar-se tacitamente deferido na ausência de decisão no prazo de seis meses, a contar da sua apresentação.

***


II. FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO

Na sentença recorrida deixou-se consignado em sede factual (apenas alteramos a indicação das alíneas por repetidas, por lapso, na sentença):
«
Dão-se por provados os seguintes factos:

A) Em 15-07-2004 a impugnante procedeu ao registo na Conservatória do Registo Comercial do projecto de fusão por incorporação das sociedades M………, SA e P…………, SA 8doc nº 11, da pi);

B) Por escritura Pública de 03-12-2004 foram fundidas as sociedades S………, S.A., P…….., S.A. e M…………, S.A. (doc nº 12, da pi);

C) Os efeitos contabilísticos foram reportados a 1 de Fevereiro de 2004;

D) Em 29-12-2004 foi efectuado o pedido de registo da operação identificada no ponto anterior;

E) Em 04-09-2004 a impugnante apresentou, ao abrigo do artº 69º do CIRC requerimento de autorização da dedução dos prejuízos ficais, tendo sido instruído com (doc nº 14, da pi):
1 – Anexo I
- Declaração Modelo 22 da P......; 2 – Anexo II
- Estudo demonstrativo das vantagens económicas da operação de fusão;
- Cópia dos estatutos das sociedades participantes;
- Cópia do projecto de fusão; balanço, demonstração de resultados das três sociedades;
- Relação de móveis sujeitos a registo e de imóveis a transmitir para a sociedade incorporante;
- Relação de contratos que, por força da fusão serão transmitidos para a sociedade incorporante;
3 - Anexo VI
- Informação sobre lucros previsíveis da sociedade incorporante;
4 – Anexo V
- Cópia do registo da operação na Conservatória do registo comercial;
5 – Anexo IV
- Cópia do parecer do ROC independente; 6 – Anexo III
- Certidões de inexistência de dívidas fiscais e à segurança Social:
* da S...... (fls 230 e 227);
* da P...... (fls 232 e 237);
7 – Anexo VII
- Cópia dos balanços e das demonstrações de resultados de todas as sociedades envolvidas;
8 – Anexo VIII
- Cópias dos balanços e demonstrações de resultados provisionais da sociedade incorporante para os seis exercícios seguintes ao da operação.

F) A Circular nº 7/2005, de 16 de maio de 2005:
10. Transmissibilidade de prejuízos em casos de fusão, cisão e entrada de ativos
O n.º 1 do artigo 69.º do Código do IRC permite a transmissibilidade dos prejuízos em caso de fusão, desde que seja concedida autorização pelo Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados.
A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, devendo, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, na redação que lhe foi dada pelo Dec-Lei n.º 221/2001, de 7 de agosto, ser fornecidos para esse efeito todos os elementos necessários ou convenientes ao perfeito conhecimento da operação visada, tanto nos seus aspetos jurídicos como económicos.
Elementos que devem acompanhar o pedido de transmissibilidade de prejuízos. Assim, para efeitos do disposto neste preceito, foi, por despacho n.º 534/2002, de 14 de março, de S. Exa. O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, determinado que os pedidos deverão ser acompanhados, sem prejuízo de os Serviços da DGCI poderem solicitar, quando necessário, informações adicionais, os seguintes elementos:
a) Cópia do projeto de fusão;
b) Estudo demonstrativo das vantagens económicas da operação de fusão;
c) Cópia do parecer do ROC independente;
d) Cópia do pedido de registo da operação na Conservatória do Registo Comercial competente;
e) Informação sobre os lucros previsíveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante para os seis exercícios seguintes ao da operação;
f) Cópia dos balanços e das demonstrações de resultados de todas as sociedades envolvidas na operação referentes aos três exercícios anteriores ao da operação;
g) Cópia dos balanços e das demonstrações de resultados previsionais para os três exercícios seguintes ao da operação da nova sociedade ou da sociedade incorporante.

G) A impugnante foi notificada através do ofício nº 2375 de 27-01-2005 para “comprovar novamente a inexistência das dívidas à Segurança Social e enviar fotocópia do registo da operação no livro de registo da Conservatória do Registo Comercial (doc nº 15, da pi);

H) Em 02-02-2005 a impugnante satisfez o pedido formulado no ofício nº 2375 (doc nº 16, da pi);

I) Pelo ofício nº 019292 de 12-07-2005, a DSIRC notificou a impugnante para juntar comprovativo da inexistência de dívidas à Segurança Social da empresa incorporada M......, SA (fls 342, do pa);

J) Em 07-09-2005 a declaração foi entregue pela impugnante (fls 343 e 344, do pa);

K) Entretanto a DSIRC detectou a existência do processo executivo nº…………. , contra a S...... (sociedade incorporante);

L) A notificação foi enviada à S...... a 09-02-2006, tendo esta respondido a 22-02-2006;

M) Em 20-07-2006 foi prolatada a Informação nº 965/2006, junto a fls. do PA, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais onde consta, nomeadamente nos pontos 25, 26 e na conclusão:
25. Plano de Dedução dos Prejuízos
Relativamente à fixação de um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, de acordo com o que estabelece o nº 4 do art.º 69º do CIRC, esta deverá ser efectuada nos termos do Despacho nº 79/2005-VII, de 15/04, de S. Exª o SEAF, no qual se determinou no nº 7 que “a dedução dos prejuízos fiscais transmitidos por uma sociedade fundida seja limitada, em cada exercício, de acordo com as orientações seguintes:
a) Quando se trate de uma operação de fusão por incorporação, ao acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante relativamente ao lucro tributável apurado por esta sociedade no exercício anterior ao da fusão adicionando, quando for o caso, dos lucros tributáveis das demais sociedade fundidas, com excepção da sociedade transmitente dos prejuízos, apurados nesse exercício;
b) Quando se trate de uma fusão por constituição de uma nova sociedade, ao acréscimo do lucro tributável da nova sociedade relativamente ao resultado da soma dos lucros tributáveis apurados pelas sociedades fundidas, com excepção da sociedade transmitente dos prejuízos, no exercício anterior ao da fusão;
c) Nos casos referidos nas alíneas anteriores, o limite da dedução do prejuízos fiscais resultantes da aplicação das regras aí estabelecidas não poderá exceder, em cada exercício, o montante de lucro tributável da sociedade incorporante, ou da nova sociedade, correspondente à proporção entre o património líquido da sociedade fundida e o valor do património líquido de todas as sociedades envolvidas na operação, determinados com base no último balanço anterior à fusão.
26 No caso em apreço, atendendo a que se trata de uma fusão por incorporação, a dedução dos prejuízos fiscais transmitidos pela sociedade P...... será limitada ao acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante relativamente ao lucro tributável por ela obtido no exercício anterior ao da fusão e não poderá exceder 0,081 (308.692,06/3.806.801,60) do lucro tributável desta sociedade apurado em cada exercício.
De notar que no exercício de 2004, verificando-se que não houve acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante, não poderia a mesma deduzir qualquer montante de prejuízos fiscais, tal como resulta da aplicação do plano de dedução.
CONCLUSÃO
Em face do exposto, propõe-se a autorização da transmissibilidade dos prejuízos fiscais, nos termos do disposto no artigo 69º do CIRC e dentro do prazo previsto no nº 1 do artº 47º do CIRC, devendo a mesma efectuar-se nos termos referidos nos pontos nº 25 e 26 desta informação.

N) Sobre a informação identificada no ponto anterior recaiu, em 24-07-2006, despacho de concordância deferindo o pedido da impugnante (fls. 28, dos autos );

O) Pela Ordem de Serviço nº OI200607803/OI2006077804 os Serviços de Inspecção Tributária – Área C – da Direcção de Finanças de Lisboa procederam à notificação da impugnante para, ao abrigo do princípio da colaboração proceder ao envio do extracto da conta corrente relativamente às rubricas “Outros Custos e Perdas Financeiras”, “Perdas em Existências”, “Multa e Penalidades” e “Correcções Relativas a Exercícios Anteriores”;

P) Em 29-01-2007 a impugnante procedeu ao envio da documentação;

Q) Os Serviços de Inspecção Tributária notificaram a impugnante do Projecto de Correcções, para exercer direito de audição prévia;

R) Em 07-05-2007 a impugnante exerceu o direito de audição prévia, contestando o fundamento previsto no ponto 1.1.2 do projecto de Conclusões e declarando a intenção de proceder à correcção da situação tributária relativamente ao fundamento de correcção previsto no ponto 1.1.1 do Relatório

S) Em 30-03-2007 a impugnante procedeu à entrega da declaração Modelo 22, de substituição na qual foi reflectido o acréscimo ao resultado fiscal de €16.897,39

T) Em 15-05-2007 a impugnante pagou o imposto decorrente da autoliquidação corrigida, no valor de €4.646,78

U) Pelo ofício nº 046362, de 06-06-2007 a impugnante foi notificada das correcções resultantes da análise interna, que se dá por inteiramente reproduzida para todos os efeitos legais, constando do ponto 1.1.2 Dedução indevida de prejuízos fiscais - €33.415,03 (doc. nº 3, da pi):
Foram deduzidos indevidamente prejuízos fiscais no montante de €33.415,03, contrariando o disposto no art.º 69º do CIRC.
Conforme informação elaborada pelos serviços do IRC em resposta ao pedido de autorização pela S......, S.A., da dedução dos prejuízos fiscais apurados pela sociedade P......, S.A., no âmbito de uma operação de fusão por incorporação, não se verificando as condições previstas no artº 69º do CIRC, conforme descriminado na referida informação não poderão deduzir qualquer montante de prejuízos fiscais.

V) Em 07-07-2007 a impugnante foi notificada da compensação nº……………. , relativa a liquidação de juros compensatórios, no valor de €363,08, relativa à apresentação espontânea da declaração, que foi pago em 20-07-2007 (doc. nº 8, da pi);

X) A impugnante foi notificada da liquidação adicional nº …………… , compensação nº……………. , onde foi apurado um valor de IRC a pagar de €9.914,20 (doc. nº 8, da pi);

Z) Em 06-08-2007 a impugnante pagou o montante de €9.914,20 (doc. nº 17, da pi).
*
A convicção do tribunal formou-se no teor dos documentos identificados em cada ponto dos factos provados, inexistindo quaisquer outros.

Ao abrigo do disposto no art.º 662/1 do CPC, altera-se o ponto N) da matéria assente, que passa a ter a seguinte redacção:

N) Sobre a Informação 965/2006 identificada no ponto anterior recaiu, em 11/08/2006, despacho concordante de S. Exa. o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (fls. 28 dos autos e 305 do PA).


III. B) DE DIREITO

Estabilizado o probatório e como já deixamos enunciado, a questão que se coloca é a de saber se, no caso, estavam ou não reunidos os requisitos para a formação do deferimento tácito, designadamente se pode considerar-se que o requerimento de autorização para deduzir os prejuízos fiscais, previsto no n.º 1 do artigo 69.º do CIRC, estava acompanhado dos elementos previstos no n.º 2 do mesmo artigo, de modo a que, nos termos do n.º 7, sempre do mesmo artigo, aquele requerimento pudesse considerar-se tacitamente deferido na ausência de decisão no prazo de seis meses, a contar da sua apresentação.
A sentença, depois de discorrer sobre o regime legal aplicável e fazer os considerandos de doutrina e jurisprudência que entendeu pertinentes, veio a concluir assim:
«
Assim, in casu, o prazo de formação do acto tácito de deferimento que se iniciou com a entrega do requerimento em 04-02-2005, uma vez que o pedido de dedução dos prejuízos fiscais das sociedades incorporadas apresentado, em 04-09-2004, não havia sido instruído com aquela certidão do registo comercial, mas apenas com o pedido de registo.
Entende-se, por isso, que o deferimento tácito do pedido se formou em 05-08-2005, com a entrega dessa certidão por via da resposta concretizada a 04-02-2005 e, decorridos seis meses, nos termos do disposto no artigo 57º, nº 5, da LGT, na redacção então em vigor.
Daí que aquando a prolação do Parecer pela Direcção dos Serviços de IRC (de 10-06- 2006) e bem assim no momento em que os Serviços de inspecção Tributária procedem às correcções (em 23-05-2007) já se havia verificado o deferimento tácito.
E, nos termos do nº 9 do art.º 69º do CIRC, no caso de ocorrer o deferimento tácito, a dedução dos prejuízos considera-se automaticamente escalonada por um período mínimo de três anos, não podendo em cada um dos dois primeiros praticar-se dedução superior a um terço do total dos prejuízos.
As correcções efectuadas violam assim o disposto nos nº 7, 8 e 9 do art.º 69º do CIRC, devendo ser anuladas.
Com a procedência deste fundamento ficam por conhecer os demais fundamentos da impugnação».

Não se conforma a Recorrente com o assim decidido, apontando à sentença erro de julgamento, no entendimento de que o deferimento tácito só poderia formar-se em 23/08//2006, seis meses depois de a contribuinte ter apresentado a certidão de inexistência de dívidas actualizada, o que só ocorreu em 22/02/2006.

A enunciada questão - relativa à formação do deferimento tácito e dos respectivos requisitos do requerimento de autorização para deduzir os prejuízos fiscais, previsto no n.º 1 do artigo 69.º do CIRC - foi já objecto de pronúncias várias no Supremo Tribunal Administrativo (Acórdãos de 20.01.2010 (Pleno) e 04.10.2017, proferidos respectivamente nos processos nºs 548/08 e 498/11, disponíveis em texto integral em www.dgsi.pt) cuja fundamentação sufragamos sem qualquer reserva de convicção.

Assim sendo, limitamo-nos a transcrever o que ficou dito no mais recente Acórdão de 04.10.2017, proferido no processo n.º 498/11, tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (artigo 8.º, n.º 3, do Cód. Civil).

Como se escreveu no citado Acórdão:
«Esta questão foi já apreciada pelo Pleno da seção de contencioso tributário, no âmbito do processo n.º 548/08, que, por acórdão de 20/01/2010, considerou que os requisitos consignados no artigo 11º-A do EBF não eram considerados no nº 2 do artigo 69º do CIRC para efeitos de concessão de autorização da transmissão dos prejuízos fiscais e nessa medida para a formação do ato de deferimento tácito.
Com efeito escreveu-se neste acórdão que:
“ … nos termos do n.º 7 do artigo 69.º do Código do IRC, o início do prazo de deferimento tácito do pedido estava apenas dependente da entrega dos elementos referidos no seu n.º 2, entre os quais não se incluíam os necessários para averiguar da existência de dívidas à segurança social, mas apenas os “necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada”, entendendo-se como tal os que se relacionam com a “demonstração de que a fusão é relacionada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia da redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, entre os quais não se vê que caiba, por indicação expressa ou implícita, a declaração de inexistência de dívidas à segurança social.
Tal exigência, a decorrer da lei, decorreria não do artigo 69.º do Código do IRC, que a tal declaração de inexistência de dívidas se não refere, mas do artigo 11.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, ao tempo vigente, que a ela aludia expressamente. Isso mesmo foi, aliás, assumido no Acórdão fundamento, que expressamente qualificou o regime especial de transmissibilidade dos prejuízos fiscais previsto no artigo 69.º do Código do IRC como tendo natureza de “benefício fiscal”, por isso sujeito aos requisitos gerais daqueles, posição que é agora reiterada pelo recorrente, não obstante as consistentes dúvidas sobre a adequação daquela qualificação ao regime em causa expressas não apenas pela doutrina (Cfr. MANUEL ANSELMO TORRES, «A Portabilidade dos Prejuízos Fiscais», in J.L. Saldanha Sanches e Outros, Reestruturação de Empresas e Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra, Coimbra Editora, 2009, pp. 114/115) mas inclusive no Relatório do Grupo de Trabalho criado por Despacho de 1 de Maio de 2005 do Ministro do Estado e das Finanças para a Reavaliação dos Benefícios Fiscais (cfr., Reavaliação dos Benefícios Fiscais: Relatório do Grupo de Trabalho criado por Despacho de 1 de Maio de 2005 do Ministro do Estado e das Finanças, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 198, Lisboa, 2005, pp. 95, 118, 173/174 e 188/196).
Ora, o artigo 11.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais não foi fundamento normativo convocado no Acórdão recorrido e não tinha, aliás, de o ser, pois que nos termos do n.º 7 do artigo 69.º do Código do IRC apenas os requisitos do n.º 2 do mesmo artigo, e não outros, tinham de ser entregues com o requerimento referido no n.º 1, para que começasse a correr o prazo de deferimento tácito.

Observe-se, aliás, que a norma do n.º 7 do artigo 69.º do Código do IRC era já mais exigente quanto aos requisitos do deferimento tácito do que o regime geral estabelecido no artigo 108.º do Código de Procedimento Administrativo, que faz depender o início da contagem do prazo de deferimento tácito tão só da “formulação do pedido ou da apresentação do processo” (cfr. o seu n.º 2), independentemente deste estar devidamente instruído, relevando a deficiente instrução, quando verificada, apenas para efeitos de suspensão do decurso do prazo, se o requerente for notificado para suprir as deficiências e enquanto o não fizer, pois que aí o procedimento fica parado “por motivo imputável ao particular “(cfr. o n.º 4 do artigo 108.º do Código de Procedimento Administrativo).”
Como refere o MP esta jurisprudência tem vindo a ser reiterada nos posteriores acórdãos em termos de se considerar jurisprudência consolidada - cfr. acórdãos do STA de 27/01/2010 p.1097/09, de 03/02/2010, p. 0844/09, de 16/06/2010, p. 0103/10, de 24/10/2012, p. 0699/11, de 08/09/2013, p. 01180/11, e de 28/05/2014, p. 0274/12.
Escreveu-se no sumário deste último acórdão o seguinte:
“I. Por força do disposto no art. 69.º, n.º 7, do CIRC (na redacção da Lei n.º 32 -B/2002, de 30 de Dezembro), o requerimento aludido no seu n.º 1, desde que instruído com os elementos previstos no n.º 2, era de considerar tacitamente deferido se a decisão não fosse proferida «no prazo de seis meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais antiabuso eventualmente aplicáveis».
II - Atento o teor do n.º 2 do referido art. 69.º (na redacção do Decreto-Lei n.º 221/2001, de 7 de Agosto), os elementos em causa são todos os que se mostrem «necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos», em ordem a ser demonstrado que «a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva».
III - Não podem considerar-se «elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação» de fusão de sociedades os necessários para averiguar se existem ou não dívidas à Segurança Social e se algumas das sociedades intervenientes na operação efectuaram já o pagamento de dívidas que lhes estavam a ser exigidas em processos de execução fiscal.
IV - Ao invés, no âmbito de procedimentos deste tipo, a cópia do pedido de registo definitivo da operação de fusão configura um elemento documental insubstituível, em função da necessidade de o requerente comprovar a publicidade legalmente exigida para a conclusão de uma operação de fusão societária, capaz de ser oponível a terceiros.
V - O facto de um talão de registo comercial ostentar, na qualidade de apresentante, a identidade de um indivíduo e não a firma da sociedade requerente, não legitima que, mais de um ano após a entrega do requerimento aludido no n.º 1 do art. 69.º do CIRC instruído com aquele documento, o pedido feito pela AT de cópia da certidão do teor da descrição da inscrição da fusão na competente Conservatória seja apto a impedir o decurso do prazo legal de deferimento tácito, quando se comprova que tal talão respeita ao registo do acto de concentração societária em causa nos autos.
VI - A circunstância de o acto expresso de indeferimento do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais ter sido emitido depois do seu deferimento tácito, confere-lhe uma dimensão revogatória implícita, por substituição, pelo que o prazo para essa revogação não é ilimitado, mas sim um prazo limitado de um ano contado da data em que se formou o deferimento tácito, em conformidade com o disposto nos arts. 140.º e 141.º do CPA, subsidiariamente aplicáveis por força do preceituado nos arts. 2.º, alínea c), da LGT e 2.º, alínea d), do CPPT, em conjugação com o disposto no art. 58.º do CPTA.”.
Entende-se, por isso, que bem andou o acórdão recorrido ao considerar que o prazo de formação do ato tácito de deferimento se iniciou com a entrega da certidão de registo comercial, em 20/09/2005, uma vez que o pedido de dedução dos prejuízos fiscais das sociedades incorporadas apresentado, em 31/01/2005, não havia sido instruído com aquela certidão.
Bem andou, também, o acórdão recorrido ao não dar relevância às exigências da AF referentes a pagamentos e regularizações de dívidas fiscais.
Entende-se, por isso, que o deferimento tácito do pedido se formou em 21/03/2006, decorridos seis meses, nos termos do disposto no artigo 57º, nº 5, da LGT, na redação então em vigor.
(…)» (fim de citação).

Aplicando esta jurisprudência ao caso concreto, podemos afirmar que o início do prazo de deferimento tácito do pedido de autorização para dedução de prejuízos fiscais apresentado pela Impugnante e ora recorrida estava apenas dependente dos elementos referidos no nº2 do artigo 69.º do CIRC, entre os quais não se incluem os necessários para averiguar a existência de dívidas ao Estado, nomeadamente à Segurança Social, mas apenas e só os «necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada».

Cabe acrescentar que as exigências decorrentes da Circular n.º 7/2005, de 16 de Maio de 2005, referida no ponto F) do probatório, que demandaria outros elementos, entre os quais declarações de inexistência de dívidas ao Estado e informação sobre os lucros tributáveis previsíveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante para os seis exercícios seguintes ao da operação não tem aplicabilidade ao caso em apreço, porquanto, o pedido da impugnante, aqui recorrida, de transmissibilidade de prejuízos fiscais é anterior (04/09/2004 – cf. ponto E) do probatório), pelo que nunca se poderia dessa Circular administrativa retirar qualquer efeito negativo em relação à recorrida, derivado do seu não cumprimento. (Neste sentido, vd. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04/22/2009, tirado no processo n.º 548/08, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Assim, nada mais resta que validar as conclusões extraídas na sentença recorrida de que o deferimento tácito do pedido de autorização da transmissibilidade dos prejuízos fiscais se formou, pelo menos, em 05/08/2005, decorridos seis meses (nos termos do art.º 69/7 do CIRC) sobre a data de 04/02/2005 (cf. ponto H) do probatório), em que a recorrida completou a instrução do pedido com a efectiva junção ao procedimento da certidão de registo comercial da operação de concentração.

O que significa que o acto expresso do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 11/08/2006 (a fls.28 dos autos, cf. ponto N) do alterado probatório), foi praticado já depois de formado deferimento tácito sobre o pedido de autorização de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, dele não se podendo validamente extrair os efeitos menos favoráveis reflectidos nas correcções a que deu lugar e que estão na base da liquidação impugnada.

O recurso não merece provimento.

IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo do Recorrente.



Lisboa, 13 de Maio de 2021

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes–Desembargadores integrantes da formação de julgamento, Luísa Soares e Cristina Flora].

Vital Lopes