Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1064/06.9BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:04/15/2021
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:IMPUGNAÇÃO
ATUALIZAÇÃO DO VPT
IMI REGIME TRANSITÓRIO
FUNDAMENTAÇÃO IMÓVEIS ADQUIRIDOS PARA REVENDA
Sumário:I Os atos tributários estão sujeitos a fundamentação (artigo 268.º, n.º 3, artigo 77.º da LGT).
II Independentemente do modo por que for obtido o VPT – avaliação ou atualização ao abrigo do regime transitório – o sujeito passivo do IMI, deve ser notificado da respetiva fundamentação de suporte à alteração antes de se proceder à liquidação do imposto, tudo sem olvidar que a própria Lei Geral Tributária (LGT) faz depender a eficácia da decisão do procedimento da sua notificação (artigo 77.º, n.º 6), exigência essa, reafirmada no n.º 1 do artigo 36.º do CPPT, ao dispor que: “Os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.
III Só constitui destino diferente a «alteração substancial do prédio, nomeadamente a transformação de um terreno em prédio urbano, através da construção de um edifício posteriormente vendido ou da demolição de uma casa e seguinte venda do terreno para construção» , não representando destino diferente a circunstância de o prédio adquirido ter sido revendido em estado diverso daquele em que foi adquirido por força dessas obras de acabamento da construção do edifício, desde que se mantenha a intenção de revenda do mesmo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

S... - S..., S.A, melhor identificada nos autos, veio deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL contra a liquidação de Contribuição Autárquica (CA) identificadas com os números 20023..., 20034..., respetivamente nos montantes de € 9.399,00 e € 8.346,31 e liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) número 2005 0212... no montante de € 4.173,15.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença de 28 de novembro de 2013, julgou procedente a impugnação.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«I. Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por S... - S..., com o contribuinte fiscal n.° 5..., impugnação judicial contra as liquidações de Contribuição Autárquica (CA) n.°s 2002 3..., 2003 4..., respectivamente nos montantes de €9.399,00 e € 8.346,31 e contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) n.° 2005 0212..., no montante de € 4.173,15.

II. A Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, total e acertada aplicação das normas legais aplicáveis ao caso sub judice e, bem assim, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante. Vejamos,

III. Alega a Impugnante que o Relatório de Inspecção Tributaria foi concluído no dia 08/05/2006, pelo que, aquando da notificação do mesmo, na data de 30/05/2006, já havia decorrido o prazo a que alude o artigo 62.°, n.° 2, do RCPIT, ou seja, os 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no n.° 4, do artigo 60.° do RCPIT.

IV. A douta sentença vai no sentido da Jurisprudência dominante, ou seja, "o prazo de elaboração do RIT estabelecido no artigo 62. °, n. °2 do RCPIT têm natureza meramente ordenatória e disciplinadora, não se trata assim, de quaisquer prazo peremptório que extinga o direito conferido a Administração Tributária e Aduaneira tendo em vista a prática do acto tributário, estando em presença de meros prazos indicativos, sem prejuízo dos prazos máximos instituídos por lei para efeitos de caducidade ou extinção do direito por parte do Estado' 

V. Embora a douta sentença assuma esta orientação e concorde com a posição da Fazenda Publica, isto é, "que o prazo identificado do citado preceito lega, é meramente ordenador ou disciplinador, e por tai razão não se verifica o imputado vicio ao procedimento de inspecção'.

VI. Esta conclui "pela ilegalidade imputada ao procedimento de inspeção'. (sublinhado nosso)

VII. Ora face ao referido, a Fazenda Pública não poderá tirar outra conclusão, a não ser de que foi por mero lapso de escrita, e que a mesma deveria querer dizer, pela legalidade imputada ao procedimento de inspecção.

VIII. Quanto ao " vicio de forma por fata de fundamentação no que tange as liquidações de IMI calculadas sobre o VAT de 1.043.288,82', veio a Impugnante argumentar que não foi informada de qualquer alteração ao valor do prédio, nem da realização de qualquer avaliação do mesmo, pelo que, entende que tal facto consubstancia uma violação do artigo 14.° do Código da CA.

IX. Ora, com o devido respeito, não podemos concordar com o referido.

Vejamos,

X. O artigo 14.° do Código da CA, no seu n.° 3, estabelecia que, "A administração fiscal procederá oficiosamente:
a) À inscrição de um prédio na matriz, bem como às necessárias actualizações, quando não se mostre cumprido o disposto no n.° 1 deste artigo;
b) À actualização do valor tributável dos prédios, em resultado de novas avaliações ou quando tal for legalmente determinado; (Negrito nosso)
c) À actualização da identidade dos proprietários, usufrutuários e possuidores, sempre que tenha conhecimento de uma transmissão para efeitos de sisa ou de imposto sobre as sucessões e doações."

XI. Com a publicação do Decreto Lei n.° 287/2003, de 12 de Dezembro, procede-se à reforma da tributação do património, aprovando os novos Códigos do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) e procedendo a alterações de diversa legislação tributária conexa com a mesma reforma.

XII. Neste seguimento previa o seu artigo 16,° que,
"1 - Enquanto não se proceder à avaliação gera, o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos não arrendados, para efeitos de IMI, é actuaiizado com base em coeficientes de desvalorização da moeda ajustados pela variação temporal dos preços no mercado imobiliário nas diferentes zonas do País.
2 - Os coeficientes referidos no n.° 1 são estabelecidos, entre um máximo de 44,21 e um mínimo de 1, e constam de portaria do Ministro das Finanças. (A Portaria n.° 1337/2003, de 5 de Dezembro, estabelece os coeficientes de desvalorização da moeda a aplicar para a actualização dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos não arrendados e dos prédios rústicos.)
3 - Aos valores dos prédios inscritos nas matrizes até ao ano de 1970, inclusive, é aplicado o coeficiente que lhe corresponder nesse ano e, aos dos prédios inscritos posteriormente, aquele que corresponder ao ano da inscrição matricial.
4 - Em qualquer dos casos previstos no número anterior, o coeficiente é sempre aplicado aos referidos valores já expurgados de quaisquer correcções efectuadas posteriormente ao ano de 1970 e aos anos da respectiva inscrição matricial.
5 - No caso de prédios urbanos arrendados que o deixaram de estar até 31 de Dezembro de 1988, é aplicado ao valor patrimonial resultante da renda o coeficiente correspondente ao ano a que respeita a última actualização da renda."

XIII. Ora, em sede Inspecção Tributária, foi detectada pela Administração Tributária, que ao lote de terreno para construção (lote 73), adquirido e contabilizado para revenda, foi dado, pela Impugnante, destino diferente, pelo que, seria de liquidar a contribuição correspondente para os de 2002 e 2003, aos quais tinha sido concedia isenção.

XIV. Neste seguimento, foi o contribuinte notificado para, no prazo de 10 dias exercer, querendo do direito de audição sobre os mesmo. 

XV. Contudo o mesmo nada disse, pelo que, as ditas correcções foram mantidas e, convolado em definido o projecto de relatório da Inspecção Tributária.

XVI. Neste seguimento foram as liquidações em causa posteriormente notificadas ao Impugnante, conforme resulta do probatório da douta sentença.

XVII. Ora a actuação da Administração Tributária não foi mais do que de que dar cumprimento aos preceitos legais em vigor à data e a sua actuação no estrito cumprimento dos mesmos.

XVIII. No entanto, a douta sentença refere que "Nem se diga que essa fundamentação já anteriormente tinha sido comunicada à Impugnante, pois não ficou demonstrado que em qualquer liquidação respeitante a período anterior, ou através de qualquer outra comunicação, a ATA tenha alguma vez dado a conhecer à Impugnante os motivos por que o valor patrimonial tributário foi fixado no valor constante no RIT e respectivas liquidações."

XIX. Na verdade o artigo 77.° da Lei Geral Tributária (LGT) prescreve um direito à fundamentação de todas as decisões em matéria tributária que afectem os direitos ou interesses do contribuinte.

XX. No entanto, também é verdade, e é hoje pacífico entre a nossa doutrina e jurisprudência que a fundamentação "deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão ... equivalendo à fata de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência não esclareçam concretamente a motivação do acto”.

XXI. Porém, também é pacifico que o conteúdo de uma fundamentação suficiente varia de acordo com as circunstâncias concretas, entre as quais avultam as do tipo de acto, as da participação e qual a sua extensão ou a não participação dos interessados no procedimento anterior conducente à decisão. 

XXII. Nos actos de liquidação de IMI, atenta sua natureza, o dever de fundamentação é cumprido pela Administração Fiscal de forma padronizada, mas sem que possa deixar de observar o disposto no n.° 2, do artigo 77.° da LGT, ou de pôr em causa as finalidades do direito à fundamentação.

XXIII. Se depreende que dessa mesma liquidação, não exigiu o legislador que a fundamentação da fixação do valor patrimonial dos prédios constasse anualmente da nota de cobrança que reflecte a liquidação do Imposto Municipal sobre móveis, mas tão só a indicação do respectivo valor patrimonial dos prédios sobre que incide o imposto.

XXIV. Dito de outro modo, a notificação da fundamentação dos critérios de fixação do valor patrimonial tributário de um prédio ao sujeito passivo do imposto, não integra o acto tributário controvertido (a liquidação de IMI) sendo um acto alheio a este, pelo que a sua falta na liquidação não afecta a sua validade, não podendo por conseguinte ser este acto anulado com base numa falta que a lei não impõe.

XXV. Em face do exposto, e de todos os elementos constantes da nota demonstrativa da liquidação, exigidos por lei, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, estar devidamente fundamentada a liquidação controvertida.

XXVI. Ao decidir como decidiu, a douta sentença incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito, consubstanciado este na errada interpretação e aplicação das normas legais citadas.

XXVII. Por fim, face ao vício de violação de lei por ofensa das alíneas e) e f) n.° 1 e n.° 3, do artigo 10.° do Código da Contribuição Autárquica, veio a douta sentença concluir que "Não cremos, contudo, quer porque o "destino" se refere a revenda e não ao estado do prédio que se compra/vende, quer peias razões e finalidades tidas em vista com esta isenção, que existindo um alvará de loteamento emitido em dada anterior à compra do prédio, permitindo a construção de 1600 lugares de estacionamento a posterior construção realizada permita concluir que o destino do prédio foi alterado." 

XXVIII. Os presentes autos estão relacionados com a aquisição de um lote do terreno para construção, adquirido, segundo o que consta na Escritura Publica, no âmbito do exercício da actividade de compra e venda de bens imobiliários, e contabilizado como bem a revender.

XXIX. Por se tratar de bens a revender, a aquisição, ficou isenta do pagamento de Imposto Municipal de SISA, nos termos do n.° 3, do artigo 11.°-A, artigo 13.°-A do Código de SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.

XXX. Ora, acontece que, em sede de Contribuição Autárquica, detectou a Inspecção Tributária que ao bem supra referido tinha sido dado um destino diferente, pelo que, seria de liquidar a contribuição correspondente para os anos do 2002 a 2003 (uma vez que para o referido prédio havia sido concedida isenção para os anos de 2001, 2002 e 2003).

XXXI. A Inspecção Tributaria não fez mais do que aplicar a legislação em vigor, ou seja, o disposto no artigo 16.° do referido Código, uma vez que este dispõe que, "(...) deixarão de beneficiar da isenção logo que se verifique respectivamente: (...) que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo do três anos ou o foram novamente para revenda

XXXII. Conforme se encontra evidenciado, o Impugnante incorreu em custos com este terreno que provam a intenção da empresa em lhe dar um destino diferente.

XXXIII. Neste sentido a prova documental recolhida pela Inspecção Tributária, bem como a prova testemunhal, desde logo, da audição do Sr. Arquitecto J..., sócio gerente da firma J... Arquitectos Lda., tendo este identificado a firma S..., ora Impugnante, como dona da obra, desenvolvida no Lote 73. 

XXXIV. Ora consultando as contas e perante todos os factos supra referidos, verifica-se que o adquirente procedeu a alteração do bem, através da incorporação de materiais de construção, tendo ai edificado uma estrutura.

XXXV. Tanto que, da consulta do relatório inspectivo, deparamos que em resultado das obras desenvolvidas no terreno, foi edificada uma estrutura de betão e ferro, identificada em vários documentos, como silo automóvel da S..., ora Impugnante.

XXXVI. Conduzindo assim à caducidade da refenda isenção pelos motivos supra explanados e, consequente, à liquidação da contribuição autárquica por todo o período decorrido desde a aquisição.

XXXVII. Assim, é incontestável a intenção da empresa de dar um destino diferente ao bem, e se algumas dúvidas subsistissem, deveria a Impugnante juntar aos autos a contraprova necessária e suficiente, o que não se verificou.

XXXVIII. Deste modo, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, andou a Inspecção Tributária ao aplicar o disposto no artigo 16.° do Código do CA.

XXXIX. Neste sentido, foi emitido parecer pelo Ministério Público, em que no seu parecer, pronuncia-se por ser concedido improcedência à impugnação, ancorando-se nos fundamentos expendidos pela Fazenda Pública. (negrito nosso) 

XL. Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente impugnação judicial, enferma de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei e viola o disposto no n.° 1 e n.° 3 do artigo 10.° do Código da Contribuição Autárquica.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossa Excelências, deve o presente Recurso ser provido e, consequentemente ser revogada a sentença proferida pelo Douto Tribunal "a quo" assim se fazendo a costumada Justiça.»



»«

A Recorrida, S... - S..., S.A., devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.

»«

Os autos foram com vista à Exma. Sra. Procuradora Geral - Adjunta junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º, n. º1 do CPPT, que emitiu parecer, no sentido da improcedência do recurso.

»«

Com dispensa de vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

»«

2 – OBJECTO DO RECURSO
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo Recorrente a partir das alegações que definem, o objeto dos recursos que vêm submetidos e consequentemente o âmbito de intervenção do Tribunal “ad quem”, com ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua apreciação (cfr. artigos 639.º, do NCPC e 282.º, do CPPT).

Termos em que as questões que aqui importa aqui decidir, consistem, antes de mais em saber se a sentença padece de erro de julgamento de facto e de direito ao decidir pela:
i. Ilegalidade imputada ao processo de inspeção por violação da regra estabelecida no artigo 62.º n.º 2 do RCPIT;

ii. Vicio de forma por falta de fundamentação da liquidação apurada em face do novo VPT;

iii. Vício de violação de lei por ofensa das alíneas e) e f) n.º 1 e n.º 3, do artigo 10. ° do Código da Contribuição Autárquica.

3 - FUNDAMENTAÇÃO

De facto

É a seguinte a materialidade dada por provada na sentença recorrida:
« A) A Impugnante tem como objecto social o “exercício da indústria da construção civil, empreitadas de obras públicas e particulares, a compra e venda de prédios rústicos e urbanos e a revenda dos adquiridos para esse fim”. (Doc. n.°10 junto á p.i.)

B) No dia 31 de Dezembro de 1995, a Impugnante prometeu comprar e a sociedade “F..., S.A,” prometeu vender três parcelas de terreno sitas em Outorela Portela identificadas pelos artigos n.° 3…, descrito no n.° 8… do livro B 28, n.° 3… descrito na Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob a s/ ficha n.° 124 e n.° 344 descrito no n.° 8... do Livro B28. (Doc. n.° 6 junto a P.I.)

C) Em documento escrito datado de 28 de Dezembro de 1998 intitulado “Alteração de Contrato Promessa de Compra e Venda”, a Impugnante e a sociedade “F... S.A.” declaram: “Por contrato-promessa de compra e venda, celebrado em 31 de Dezembro de 1995, o Iº Outorgante prometeu vender ao 2º Outorgante, que prometeu comprar, os prédios descritos no artigo Iº do referido contrato promessa, que se anexa:

Até à data da presente resolução, nos termos do contrato promessa original, não houve tradição nem se procedeu a qualquer pagamento;

• Por razões que têm a ver com a inclusão dos prédios prometidos vender no Loteamento do Alto dos Barronhos e a sua consequente perda de autonomia física, jurídica e económica, as partes deixaram de ter interesse recíproco na concretização do negócio prometido.

Em conformidade, e pelo presente documento, os outorgantes acordam na alteração do contrato promessa celebrado em 31 de Dezembro de 1995, nos seguintes termos:


Clausula 1ª

Os outorgantes acordam em alterar os artigos 1º e 2º do contrato — promessa de compra e venda celebrado entre ambos em 31 de Dezembro de 1995, que passam a ter a seguinte redacção:

1.º

A Promitente Vendedora ê dona e legítima do lote de terreno para construção designado por lote 73, sito no Loteamento do Alto dos Barronhos em Outurela — Portela, omisso na matriz, mas em relação ao qual foi pedida a inscrição matricial na 3a Repartição de Finanças de Oeiras, e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob Ficha n.° 6… da freguesia de Carnaxide.

2.º

A Promitente Vendedora promete vender à Promitente Compradora, e esta promete comprar, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, o lote de terreno identificado no artigo anterior, pelo preço de Esc. 1 125 000 000$00.tt (Doc.n.°7 junto á p.i.)

D) Em 1999, foi emitido pela Câmara Municipal de Oeiras o Alvará de Loteamento n.° 2/99, no qual se integra o Lote 73. (Doc. n.°1 junto á p.i.)

E) Em documento escrito datado de 4 de Dezembro de 2000 intitulado “Alteração de Contrato Promessa de Compra e Venda”, a Impugnante e a sociedade “F... S.A.” declaram:


Clausula 1.ª

Os outorgantes acordam em alterar o artigo 2º do contrato - promessa de compra e venda celebrado entre ambos em 31 de Dezembro de 1995, com a redacção que lhe foi conferida pela Alteração celebrada em Dezembro de 1998, que passa a ter o seguinte conteúdo:


A Promitente Vendedora promete vender à Promitente Compradora, e esta promete comprar, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, o lote de terreno identificado no artigo anterior, pelo preço de Esc. 570.234 375$00.” (Doc.n.°8 junto á p.i.)

F) No dia 12 de Março de 2000, a sociedade “F... S.A." entregou na Câmara Municipal de Oeiras um Projecto de Arquitectura, conjuntamente do a Memória Descritiva e Justificativa” relativo ao lote 73. (Doc. n.°9 junto á p.i.)

G) No dia 13 de Julho de 2001, a Impugnante por escritura pública lavrada adquiriu, á sociedade designada “F...; S.A. ” mediante compra o lote de terreno para construção, designado por lote setenta e três com a área de seis mil novecentos e setenta e nove metros quadrados, denominado “ Alto dos Barronhos” inscrito na matriz predial urbana na respectiva freguesia sob o artigo 1…, pelo preço de € 2.844.317,07. (Doc. n.° 5 junto a P.I. — Anexo 1 ao RIT)

H) A Impugnante declarou no acto notarial a que alude a al. A) do probatório, que destina o bem adquirido a revenda, beneficiando da isenção do pagamento de sisa ao abrigo do artigo 11º, n° 3 e artigo 13º - A do CIMSSD. (Doc. n.° 5 junto a P.I. - Anexo 1 ao RIT)

I) No dia 28 de Agosto de 2001, a Impugnante requereu ao abrigo da al. f) do n.°l do artigo 10° do Código da Contribuição autárquica a isenção relativamente ao lote 73. (Doc. fls. 171 dos autos)

J) Em 24 de Novembro de2004, a Impugnante requereu á Câmara Municipal de Oeiras autorização para executar a escavação e a estrutura do lote 73 e muros de suporte de modo a “ concluir os acessos à habitação social, nomeadamente o final da rua … da Urbanização. (Doc. n.° 4 junto ao Req. de fls. 203/204 dos autos)

L) Em resposta á pretensão a que alude a al.J) do probatório, foi comunicado o seguinte: “ (...) autorizo nos termos propostos (...) é recomendável, a titulo de garantia da segurança das pessoas e edifícios confinantes, a execução de trabalhos de contenção, pelo que se considera não haver inconvenientes em autorizar a execução da estrutura do edifício ate a costa da soleira e na extensão entre o encontro com a construção existente e a primeira junta da dilatação “. (Doc. n.° 4 junto ao Req. de fls. 203/204 dos autos)

M) Em cumprimento das Ordens de Serviço n.°s OI200506556, OI200506557 e OI200506558 de 07.10.2005, da Direcção de Finanças de Lisboa, foi efectuada uma acção inspectiva de âmbito parcial à sociedade dominada “ S... S..., S.A." quanto aos exercícios de 2002, 2003 e 2004.(Doc. n.°4 junto á p.i.)

N) No dia 08.05.2006, na sequência da acção de inspecção a que alude a al. M) do probatório foi elaborado o RIT do qual se destaca:

III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
. 1. - Imposto Municipal de SISA 1.1.- Exercício de 2002
Em 13 de Julho de 2001 a sociedade "S..." adquire a, F... SA” (sociedade dos mesmos accionistas), um lote de terreno para construção -lote 73, situado no Alto dos Barronhos, Camaxide - conforme Escritura Pública lavrada no 9.° Cartório Notarial de Lisboa, que se junta em Anexo 1.
Conforme se encontra inscrito na mesma, este prédio (lote de terreno para construção) destina-se a revenda, tendo por este facto a referida aquisição ficado isenta do pagamento de Imposto Municipal de SISA nos termos do n.° 3 do art.° 11.° e art.° 13.0-A do Código da SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.
Estipula ainda o art.° 16.° do referido código que:
"As transmissões de que tratam os n°s 3.°,..., do art.° 11.°, .... , deixarão de beneficiar da isenção logo que se verifique, respectivamente:
1.° Que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda;."
Este lote de terreno para construção - Lote 73 - faz parte do Alvará de Loteamento N° 2/99 da Câmara Municipal de Oeiras, conforme fotocópias que se juntam em Anexo 2.
Este lote 73 possui 8.979 m2, prevendo as seguintes áreas brutas de construção: serviços - 6.995 e garagens - 33.808.
Durante a acção inspectiva aos anos em causa, apura-se que a empresa apenas possui em existências (Mercadorias) este lote 73, contabilizado na conta 32320J - Lote 73 - Silo Automóvel.
Conforme refere o Plano Oficial de Contabilidade registam-se nas contas:
Conta 32 "os bens adquiridos pela empresa com destino a venda, desde que não sejam objecto de trabalho posterior de natureza industrial ".
Conta 33 "os bens provenientes da actividade produtiva da empresa, assim como os que, embora normalmente reentrem no fabrico, possam ser objecto de venda ".
Pela aquisição do terreno para construção (com destino a revenda) o sujeito passivo movimenta e bem a conta 32, só que posteriormente incorre em custos com tal terreno. Custos estes. que não são consequência de simples obras de conservação e beneficiação mas sim derivados do facto de que não são consequência de simples obras de conservação e beneficiação mas sim derivados do facto de que para tal terreno o contribuinte contribuinte tinha um outro destino.
Nos anos em causa - 2002. 2003 e 2004 - este terreno continua sempre contabilizado na refenda conta 32 "dando assim a impressão que se destina a revenda" e todos os custos incorridos com obras nele efectuadas são levadas a conta 3312. (...)
1.2. - Conclusão
Pelo exposto no ponto anterior, consideramos que a este lote de terreno para construção — Lote 73 adquirido e contabilizado como sendo para revenda, tendo por este facto a referida aquisição ficado isenta do pagamento de Imposto Municipal de SISA nos termos do n.° 3 do art.° 11 e art.° 13.°-A do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, foi-lhe dado um destino diferente, pelo que nos terrenos do n.° 1 do art.° 16.° do referido código, caducou essa isenção em Novembro de 2002 (data da 1 a factura - n.°2984, referente a desaterro).
Desta forma encontra-se em falta o seguinte montante de Imposto Municipal de Sisa, que deverá ser liquidado pelo Serviço de Finanças de Oeiras 3 (Algés):
Valor de Incidência - €5.611.4 7 6,34
Taxa (art.33° n.° 1) = 10%
Imposto em falta = €5.611.4 76,34 * 10% = € 561.147,63
2. - Contribuição Autárquica
De acordo com alínea f) elo n.°1 e n.°2 do art.° 10.° do Código da Contribuição Autárquica:
" 1 - A contribuição e devida a partir:
f) Do terceiro ano seguinte, inclusive, àquele em que um prédio tenha passado afigurar nas existências de uma empresa que tenha por objecto a sua venda.
2) Nas situações previstas nas alíneas e) efi do número anterior, caso ao prédio seja dada diferente utilização, liquidar-se-á a contribuição por todo o período decorrido desde a sua aquisição”
No caso em análise - Lote 73 - foi-lhe dada utilização diferente, pelo que nos termos do art.° 10.° do citado código, dever-se-á liquidar a correspondente contribuição em 2002 e 2003, uma vez que ao referido prédio lhe foi concedida isenção em 2001, 2002 e 2003, conforme fotocópia de "Print" do sistema informático da DGCI que se junta em Anexo 12.
Desta forma encontra-se em falta o seguinte montante de Contribuição Autárquica, que deverá ser liquidada pejo Serviço de Finanças de Oeiras 3 (Algés):

(Doc. n.°4 junto á p.i.)

O) No dia 25 de Maio de 2006, o Chefe de Divisão II da Inspecção Tributária - Equipa II, exarou no RIT a que alude a al. N) do probatório, despacho de concordância. (Doc. n.°4 junto á p.i.)


P) Mediante ofício datado de 30 de Maio 2006, foi a Impugnante notificada do RIT e do despacho que sobre ele recaiu. (Doc. n.°4 junto á p.i.)


Q) A Impugnante foi notificada da liquidação de CA do ano de 2002, do prédio sito na freguesia de Carnaxide/Oeiras, artigo U-1…, no montante de € 4.175,15 com pagamento voluntário ate 31.08.2006, através do documento de cobrança n° 2002 388401603 da qual consta :



«Imagem no original»




(Doc.n.°1 junto á p.i.)


R) A Impugnante foi notificada da liquidação de IMI do ano de 2003, prestação única, do prédio sito na freguesia de Carnaxide/Oeiras, artigo U-1..., no montante de € 8.346,31 com pagamento no mês de Agosto de 2006, através do documento de cobrança n° 2003 487733803, da qual consta:



«Imagem no original»




(Doc. n.°2 junto á p.i.)


S) A Impugnante foi notificada da liquidação de IMI do ano de 2005, prestação única, do prédio sito na freguesia de Carnaxide/Oeiras, artigo U-1..., no montante de € 4.175,15 com pagamento no mês de Setembro de 2006, através do documento de cobrança n° 2005 0212..., da qual consta:



«Imagem no original»




(Poc.n ° 3 junto â p.i.)


T) Da caderneta predial urbana relativa ao artigo matricial 1... consta: “Ano de inscrição na matriz: 1999 Valor patrimonial actual: € 1.043.288,82 Determinado no ano: 2003”. (Doc. fls. 95 dos autos)


U) Foi necessário adequar os projectos iniciais e o alvará de loteamento á dimensão da fachada do lote. (Prova testemunhal)


V) A petição inicial que originou os presentes autos foi remetida via postal com data de 20 de Setembro de 2006. (Cfr. carimbo aposto a fls. s dos autos)


MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO


A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, e depoimento da testemunha inquirida tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.


FACTOS NÃO PROVADOS


Não se mostram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa..»


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De direito

Em sede de aplicação do direito a sentença recorrida julgou procedente a impugnação e determinou a anulação dos atos tributários sindicados.

A Recorrente, Fazenda Pública (FP), não se conformando com a decisão proferida vem dela recorrer encetando por arguir à sentença um lapso de escrita, pedindo a sua correção.

Para assim epilogar dá conta que a sentença recorrida, acompanhando a jurisprudência dominante, se pronuncia no sentido de que os prazos de elaboração do RIT previstos no artigo 62. ° n.º 2, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT), têm natureza meramente ordenatória e disciplinadora. – concl. III e IV

Posição que a recorrente não contesta, porém considera que a ser assim não poderia a sentença concluir, como o fez, “pela ilegalidade imputada ao procedimento de inspeção”. – concl. III e IV

E tem razão, na verdade a sentença recorrida pronunciando-se sobre o invocado vício de violação de lei por ofensa do artigo 62°, n.°2 do RCPIT, vem dizer que o mesmo não se verifica por considerar que “… o prazo de elaboração do RIT estabelecido no artigo 62. °, n. °2 do RCPIT têm natureza meramente ordenatória e disciplinadora, não se trata assim, de quaisquer prazo peremptório que extinga o direito conferido a Administração Tributária e Aduaneira tendo em vista a prática do acto tributário, estando em presença de meros prazos indicativos, sem prejuízo dos prazos máximos instituídos por lei para efeitos de caducidade ou extinção do direito por parte do Estado…” e conclui pela ilegalidade imputada ao procedimento de inspeção.

Acompanhamos nesta parte as conclusões recursivas (concl. VII), e como ali arcámos que é obvio que se trata de mero lapso de escrita sendo forçoso concluir pela legalidade do procedimento inspetivo, nesta parte, situação que aqui se deixa corrigida.

Dito isto prosseguimos.

Conforme deixamos autonomizado da delimitação do objeto do recurso, vem ainda alegado " vicio de forma por fata de fundamentação no que tange as liquidações de IMI calculadas sobre o VAT de 1.043.288,82', neste contexto alega a recorrente que, contrariamente ao decidido, a liquidação controvertida encontra-se devidamente fundamentada, tendo a sentença incorrido em erro de julgamento sobre a matéria de direito, consubstanciado este errada interpretação e aplicação das normas legais citadas. - concl. XXV e XXVI

Para assim concluir vem esgrimir argumentos alicerçados nas regras de atualização do valor patrimonial tributário previstas no artigo 14.º da Contribuição Autárquica (CA) e 16.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), aplicáveis à situação em apreço. – concl. VIII a XIII

Rematando com a afirmação de que “… em sede Inspecção Tributária, foi detectada pela Administração Tributária, que ao lote de terreno para construção (lote 73), adquirido e contabilizado para revenda, foi dado, pela Impugnante, destino diferente, pelo que, seria de liquidar a contribuição correspondente para os de 2002 e 2003, aos quais tinha sido concedia isenção.” – concl. XIII

Com efeito, é o que resulta da materialidade dada por provada (pontos M) e N) do probatório).

Neste ponto o texto decisório sintetiza as questões colocadas pela impugnante na petição inicial nos seguintes termos:

“Neste particular alega a Impugnante que o prédio foi inscrito na matriz no ano de 1999, com o valor patrimonial tributário de € 939.899,84, contudo o valor considerado para efeito da liquidação de CA difere em ambos os exercícios em causa, correspondendo € 938.899,84 em 2002 e € 1.043.288,82 em 2003, sem que se indique o facto que impulsionou tal procedimento.

Argumenta ainda a Impugnante que não foi informada de qualquer alteração ao valor do prédio, nem da realização de qualquer avaliação do mesmo, pelo que entende que tal facto consubstancia uma violação ao artigo 14° do Código da CA.

A questão trazida pela impugnante, cinge-se ao valor patrimonial que serviu de suporte ao cálculo das liquidações sindicadas, importando saber se o RIT e os elementos constantes dos documentos de cobrança remetidos à Impugnante, são ou não suficientes para dar cumprimento às exigências legais de fundamentação, designadamente se a declaração fundamentadora deve ou não integrar os motivos por que o valor Patrimonial Tributário (VPT) foi fixado no montante referido.” – fim de citação.

Acompanhamos, com facilidade, a questão assim formulada, face aos argumentos expostos pela impugnante, sendo certo, que em momento algum a Fazenda Pública logrou esclarecer o modo como procedeu à alteração do valor tributável do imóvel (Lote 73) do ano de 2002 para 2003, limitando-se o RIT à indicação dos respetivos valores (ponto N) do probatório “in fine”, e agora, em sede de recurso, a dizer que a atuação da AT não foi mais do que dar cumprimento aos preceitos legais em vigor à data, no estrito cumprimento dos mesmos – concl. XVII

Por seu lado a sentença recorrida, ancorada em princípios gerais do direito tributário constitucionalmente protegidos (artigo 268.º n.º 3 da CRP e 71.º n.º 1 da LGT) e em jurisprudência fixada assume que:

“(…)

A fundamentação do acto é suficiente se, as razões nele expressas são aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal reconstitua o iter cognoscitivo - valorativo da decisão; é clara quando tais razões permitem compreender qual foi o referido iter cognoscitivo - valorativo do acto; e por fim, é congruente quando a decisão surge como a conclusão lógica e necessária de tais razões.

Ora, analisando o Relatório de Inspecção Tributária e bem assim os documentos de cobranças temos como certo que a ATA não deu a conhecer o que a levou a apurar o valor patrimonial de € 1.043.288,82, não permitindo à Impugnante saber como foi alcançado tal valor patrimonial tributário do prédio a que se referem as liquidações levadas ás alíneas R) e S) do probatório.

Nem se diga que essa fundamentação já anteriormente tinha sido comunicada á Impugnante, pois não ficou demonstrado que em qualquer liquidação respeitante a período anterior, ou através de qualquer outra comunicação, a ATA tenha alguma vez dado a conhecer á Impugnante os motivos por que o valor patrimonial tributário foi fixado no valor constante no RIT e respectivas liquidações.

Com efeito, as liquidações de IMI, nem o Relatório que as suportou não dão a conhecer o que a levou a ATA a apurar o valor patrimonial de € 1.043.288,82 e não outro qualquer, não permite saber se aquele valor tem fundamento no estatuído no artigo 16.°, n.°s 1 a 4, n.° 5 ou no artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 287/2003 ou se foi determinado nos artigos 36.° a 47.° do CIMI ou até com base em quaisquer outras disposições legais.

(…)”

Diga-se, desde já, que acompanhamos este entendimento.

Sabemos que por força da reforma da tributação do património imobiliário, operada a aprovação do CIMI e a revogação do regime estatuído na CA. até aí em vigor o VPT foi transitoriamente, atualizado (artigo 2.º n.º 1 e 31.º n.º 1, ambos do Dec-Lei n.º 287/2003, de 12/12).

No referido diploma foi instituído um regime transitório de atualização dos valores patrimoniais tributários a ter em conta, até que se mostrasse concluída a avaliação geral dos prédios urbanos, para a qual, na altura, foi fixado um prazo de dez anos (artigo 15.º do referido Dec-Lei).

Porém, este regime transitório previa ab initio que o sujeito passivo de IMI fosse notificado do resultado da atualização, nela influindo várias circunstâncias, nomeadamente isenções, arrendamento, sendo prenunciado ainda a possibilidade de reclamação (artigo 20.º n.ºs 1 a 3); de solicitar a determinação do VPT através das regras do CIMI (artigo 20.º n.º 4) ou mesmo deduzir a impugnação judicial (artigo 20.º n.º 5).

Infere-se assim, do que se deixou dito que, independentemente do modo por que for obtido o VPT – avaliação ou atualização ao abrigo do regime transitório – o sujeito passivo do IMI, deveria ter sido notificado da fundamentação de suporte á respetiva alteração antes de se proceder à liquidação do imposto, tudo sem olvidar que a própria Lei Geral Tributária (LGT) faz depender a eficácia da decisão do procedimento da sua notificação (artigo 77.º, n.º 6), exigência essa, reafirmada no n.º 1 do artigo 36.º do CPPT, ao dispor que: “Os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.

Dito isto, é obvio que não acolhemos a exposição recursiva esgrimida na conclusão XIV a XVI, ou seja, não podemos aceitar que a notificação ao sujeito passivo das conclusões do relatório de inspeção e do despacho que sobre ele recaiu (pontos P) do probatório), corresponda à notificação fundamentada com os motivos que levaram á alteração do VPT e, bem assim, do modo como se chegou ao valor indicado (€ 1.043.288,82).

Importa aqui proceder a um curto parênteses apenas para dizer que a notificação para o exercício do direito de audição a que se reportam as conclusões XIV e XV do salvatério, são inócuas já que, tanto quanto nos parece, reportam-se às conclusões do RIT, sendo certo que a situação ali referida encontra-se assumida na petição inicial (pontos 17. a 19., não constituindo, por conseguinte, qualquer conflito.

Dito isto, prosseguimos.

Ora, o procedimento inspetivo encontra-se regulado no regime RCPITA e visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infrações da mesma natureza, conforme decorre do artigo 2.º do respetivo, situação diferente é a que conduz ao apuramento fixação ou alteração do valor patrimonial tributário dos imóveis, que à data dos factos se encontrava regulado no Dec-Lei n.º 287/2003, de 12/12, como dissemos, e que encontra a sua matriz do Código da Contribuição Predial de 1913, não obstante as consequentes reformas operadas, nomeadamente pelo código da Contribuição Predial e do Imposto Sobre a Industria Agrícola de 1963, e pontualmente pelo Código da Contribuição Autárquica, em vigor desde em 1 de Janeiro de 1989, e revogado pelo Dec-Lei que institui o IMI.

Aqui chegados, resta apenas referir que não acompanhamos a dissertação recursiva tendente à desvalorização da fundamentação por se tratar de fixação de VPT enunciadas nas conclusões XVIII a XXIV, desde logo porque em sede de IMI, há que distinguir se estamos perante uma liquidação realizada com carater anual concretizada pela aplicação da taxa ao VPT, conhecido e constante da matriz em 31 de dezembro do ano a que respeita, nos termos previstos no n.º 1 e 2 do artigo 113.º do CIMI, ou se, pelo contrário, nos defrontamos com uma liquidação resultante de fixação ou alteração do VPT, apurada ex novo, face à realização de um novo procedimento de avaliação ou atualização.

Decorre do artigo 119.º do CIMI que no primeiro caso «[O]os serviços da Direcção-Geral dos Impostos enviam a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, o competente documento de cobrança» (n.º 1), sendo que, se tal documento não for recebido, o sujeito passivo da obrigação tributária «… deve solicitar em qualquer serviço de finanças uma 2.ª via» (n.º 3), o que se explica pelo caráter regular e anual do imposto, situação que não ocorre nos restantes casos, justificando maior cuidado quer no procedimento conducente à fixação do VPT e bem assim, quanto às regras de notificação, liquidação e cobrança do imposto, dispensando especial cuidado aos princípios da fundamentação do ato de fixação enunciados na LGT e na CRP, que aqui nos escusamos de repetir, face ao que supra deixamos claro.

Termos em que, na esteira do aresto citado na decisão recorrida (proferido em 17/10/2012 no proc. n.º 0822/12) consideramos que se “… a liquidação de IMI não der a conhecer a forma como foi determinado o VPT, … não pode ter-se por suficientemente fundamentada, tanto mais que o nº 2 do art. 77º da LGT impõe que a fundamentação dos actos tributários seja integrada, entre o mais, pelas operações de apuramento da matéria tributável.”, independentemente da fixação do VPT resultar de avaliação ou de atualização.

Dito isto e tendo presente a situação em análise, forçoso será de concluir pela improcedência das conclusões que vimos analisando.

Por fim resta-nos a questão de saber se a sentença recorrida padece de vício de violação de lei por ofensa das alíneas e) e f) n.º 1 e n.º 3, do artigo 10. ° do Código da Contribuição Autárquica – concl. XXVII a final.

Sustenta a recorrente que o imóvel objeto do conflito (Lote 73) perdeu o direito à isenção por lhe ter sido dado destino diferente daquele para que foi adquirido (revenda), face à construção de 1600 lugares de estacionamento, o que, em seu entender, faz precludir o decurso do prazo de isenção previsto na alínea e) do n.º 1 ao artigo 10.º da CA.

Lembra que a questão está relacionada com a aquisição de um lote do terreno para construção, adquirido no âmbito do exercício da atividade de compra e venda de bens imobiliários, e contabilizado como bem a revender, razão pela qual, a aquisição, ficou isenta do pagamento de Imposto Municipal de SISA, nos termos do n.º 3, do artigo 11. °-A, artigo 13. °-A do Código de SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.

Acrescenta que o que a IT fez foi aplicar a legislação em vigor, ou seja, o disposto no artigo 16. ° do referido Código, que dispõe que, "(...) deixarão de beneficiar da isenção logo que se verifique respetivamente: (...) que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda.

A este respeito a sentença recorrida alinhou o seguinte discurso fundamentador:

“(…)
Como resulta das posições assumidas nos autos, quer pela PI, quer pelo RIT que originaram as liquidações, é pacífico entre as partes ter a Impugnante adquirido em 13.07.12001, um lote de terreno para construção, designado por lote 73 que faz parte do Alvará de Loteamento n.° 2/99 emitido pela Câmara Municipal de Oeiras em 05.03.1999 e com destino a revenda.
A divergência situa-se em que a ATA considera que a realização do silo automóvel importa uma destinação do adquirido diferente, posição contestada pela Impugnante.
Antes de mais, não pode deixar de apontar-se que a razão essencial da isenção radica na intenção formalizada aquando da compra, consubstanciada na revenda; a revenda é, pois, do ponto de vista legal, o cerne da isenção, nada mais sendo referido (neste particular) nos arts. 11° § 3º e 16° § Iº, designadamente sobre o estado ou características em que se compra o prédio ou em que o mesmo deve ser revendido.
Assim, da conjugação destes dois normativos, deve extrair-se que o destino diferente a que alude o § Iº do art. 16° se deve apurar por contraposição a qualquer tipo de transacção diferente da revenda, como por exemplo, a permuta, doação ou permanecer o comprador com o prédio na sua titularidade, cedendo o seu uso gratuita ou onerosamente a qualquer título, etc.
É que, como bem referem F. e Nuno Pinto Fernandes “A isenção deste n.° 3 justifica-se pela sujeição a IRS ou IRC dos ganhos obtidos na actividade de revenda de prédios adquiridos para esse fim, tributação que ê mais perfeita que a que resultaria da sisa, pois entra em linha de conta com os proveitos e os custos respectivos, procurando atingir o lucro real. Além disso, os prédios adquiridos para revenda fazem parte do activo permutável da empresa (mercadorias) e não do seu imobilizado (capital), o que aponta para a sua tributação como rendimento e não como transmissão de capital.
Nesta perspectiva, a questão de eventuais alterações efectuadas no prédio adquirido ê apenas um elemento coadjuvante, uma vez que ao conceito de revenda anda inerente a ideia de vender o que se comprou, ou seja, uma mesma coisa." (In:Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, Anotado e Comentado», Editora Rei dos Livros, 4ª ed., 1997, pág. 194)
Não cremos, contudo, quer porque o “destino” se refere a revenda e não ao estado do prédio que se compra/vende, quer pelas razões e finalidades tidas em vista com esta isenção, que existindo um alvará de loteamento emitido em dada anterior á compra do prédio, permitindo a construção de 1600 lugares de estacionamento a posterior construção realizada permita concluir que o destino do prédio foi alterado.
Contudo, como bem adiantou a Impugnante, a ATA “ se quisesse retomar a abordagem que adoptou no relatório de inspecção em matéria de Sisa, teria de considerar a isenção de CA aplicável aos terrenos para construção destinados a revenda.
Sucede, que no caso, a fundamentação que suportou as liquidações considerou inaplicável a al. f) do artigo 10º do CA, pelo facto de no lote em causa se encontrar implantado " em final de Março de 2006, um edifício em " estrutura de ferro e betão".
Todavia, não se acompanha tal entendimento.
É, que (...) por força do artigo 10° do Código da Contribuição Autárquica, alínea f, um terreno para construção adquirido por uma empresa para nele construir um prédio que destina a revenda, a contribuição autárquica não ê devida durante cinco anos contados da data em que aquele bem passou a figurar no activo da empresa, permitindo-se assim que a empresa edifique o imóvel que pretende revender e, durante esse período não seja tributada em contribuição autárquica,” (In: Acórdão do TCA Sul de 07.03.2006, proferido no rec. n.°37l/03
(…)”- fim de citação

Adiante-se, desde já que o assim decidido não nos merece qualquer censura, na verdade não se compreende como é que obras efetuadas num terreno que foi adquirido e declarado, para construção, executadas de acordo com o projeto que lhe havia sido aprovado, em data anterior à respetiva aquisição possam ser vistas como intervenções suscetíveis de alterar o destino do bem, para efeitos de exclusão da isenção de imposto.

Relativamente a idêntico contexto factual recordemos a jurisprudência do STA, vem assumindo que só constitui destino diferente a «alteração substancial do prédio, nomeadamente a transformação de um terreno em prédio urbano, através da construção de um edifício posteriormente vendido ou da demolição de uma casa e seguinte venda do terreno para construção» (1), não representando destino diferente a circunstância de o prédio adquirido ter sido revendido em estado diverso daquele em que foi adquirido por força dessas obras de acabamento da construção do edifício, desde que o destino se mantenha, como sendo o da revenda.

Deve dizer-se que, in casu, ressalta dos próprios registos contabilísticos da empresa que o imóvel se encontra, no período a que respeita a tributação, registado no ativo permutável da sociedade adquirente, situação confirmada RIT, diz-se ali:

Pela aquisição do terreno para construção (com destino a revenda) o sujeito passivo movimenta e bem a conta 32, só que posteriormente incorre em custos com tal terreno. Custos estes. que não são consequência de simples obras de conservação e beneficiação mas sim derivados do facto de que não são consequência de simples obras de conservação e beneficiação mas sim derivados do facto de que para tal terreno o contribuinte contribuinte tinha um outro destino.

Nos anos em causa - 2002. 2003 e 2004 - este terreno continua sempre contabilizado na refenda conta 32 "dando assim a impressão que se destina a revenda" e todos os custos incorridos com obras nele efectuadas são levadas a conta 3312. (...)”. – fim de citação

Ou seja, são os próprios serviços de inspeção tributária da AT, que assumem que os registos contabilísticos da sociedade refletem a manutenção da intenção de destinar o imóvel à revenda.

Deve dizer-se que a tese (2), segundo a qual o benefício da isenção só atua desde que os prédios adquiridos para revenda sejam objeto desse destino nas mesmas condições em que se encontravam no momento em que foram adquiridos, aqui defendida pela recorrente foi, no passado, também defendida na nossa jurisprudência, porém há muito se encontra ultrapassada, tendo sido definitivamente afastada pelo acórdão, também do Pleno, da secção do CT do STA proferida em 26/01/2005 no Processo n.º 0798/04.

Sendo certo que a questão constitui, hoje, jurisprudência uniformizada, conforme se expressa no Acórdão do Pleno da secção do Contencioso Tributário do STA proferido em 17/09/2014 no processo n.º 01626/13, proferido em sede de IMT, mas com inteira aplicação ao IMI, e que aqui, com a devida vénia, transcrevemos: “… uniformiza-se a jurisprudência conflituante nos seguintes termos: para efeitos de caducidade da isenção de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) que decorre da conjugação das normas contidas nos arts. 7º e 11º nº 5 do CIMT (isenção pela aquisição de prédios para revenda), não importa se o imóvel adquirido é ou não revendido no preciso estado em que foi adquirido; o que importa é que não haja uma metamorfose ou alteração substancial do bem adquirido para revenda. Pelo que se o imóvel adquirido é constituído por um terreno com um edifício habitacional já em construção ou remodelação mediante projecto aprovado (seja em tosco, seja em adiantada fase de construção/remodelação), a expressão para revenda não exige que o imóvel seja alienado tal como existia no momento da aquisição, admitindo, antes, a possibilidade de realização de todas as obras necessárias à ultimação dessa construção, por forma a acabá-lo, licenciá-lo para o referido destino, constituir a propriedade horizontal e alienar as respectivas facções autónomas.” – o negrito é nosso

Por tudo o que se deixou exposto resta-nos sufragar a sentença recorrida e julgar improcedentes in totum as conclusões recursivas, ao que se provirá na parte do dispositivo do presente acórdão.

3 - DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência, os juízes da 1.ª Subsecção de CT deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida que assim se mantém na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 15 de abril de 2021

[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Ana Cristina Carvalho e Lurdes Toscano]


Hélia Gameiro Silva

(Assinado digitalmente)


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(1) Vide, entre outros o acórdão do STA proferido em 23/02/2000, no recurso nº 018135
(2) Trata-se de posição assumida num acórdão do STA proferido no recurso n.º 16153 em 27/05/1970 e defendida pelos Autores nela citados SILVÉRIO MATEUS e CORVELO DE FREITAS, in “Os Impostos sobre o Património Imobiliário, O Imposto do Selo, Anotados e Comentados”, 1ª edição, Engifisco, 2005.
Esta tese foi definitivamente afastada no acórdão, também. do Pleno da secção do CT do STA proferida em 26/01/2005