Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2788/16.8BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/09/2017
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CITAÇÃO EM EXECUÇÃO FISCAL.
NULIDADES EM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL.
FALTA/NULIDADE DA CITAÇÃO.
EXISTÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A DEFESA DO CITADO (ARTº.191, Nº.4, DO C.P.C.).
CITAÇÃO DOS RESPONSÁVEIS SUBSIDIÁRIOS (ARTº.22, Nº.4, DA L.G.T.).
FUNDAMENTAÇÃO DAS LIQUIDAÇÕES (ARTº.77, Nº.2, DA L.G.T.).
OBRIGATORIEDADE DE COMUNICAÇÃO DOS ELEMENTOS ESSENCIAIS DO ACTO, ENTRE OS QUAIS SE INCLUI O SEU AUTOR.
Sumário:1. A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr.artº.219, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário). Actualmente, a regulamentação nuclear da matéria relativa à citação, e respectivas formalidades a respeitar, no âmbito dos processos de execução fiscal, acha-se vertida nos artºs.188 a 194, do C.P.P.T.
2. É no artº.165, do C.P.P.Tributário que estão previstas as nulidades em processo de execução fiscal. Distintas das situações de falta de citação, que são susceptíveis de constituir casos de nulidade insanável, para efeitos deste artigo, são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr.artº.191, nº.1, do C.P.C.). Estas nulidades da citação só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados, que, em sintonia com o preceituado no artº.191, nº.2, do C.P.Civil, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição, equivalente à contestação em processo declarativo, ou, nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo. A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado (cfr.artº.191, nº.4, do C.P.C.), solução esta que sempre resultaria, por maioria de razão, do preceituado no artº.165, nº.1, al.a), do C.P.P. Tributário.
3. De acordo com a jurisprudência e a doutrina unânimes, a arguição de nulidade da citação deve ser atendida, para tanto bastando que haja a possibilidade de prejuízo para a defesa do executado, a não ser que o exequente afaste a sanção da nulidade demonstrando factos que permitam concluir que nenhum prejuízo efectivo acabou por ocorrer.
4. A citação dos responsáveis subsidiários deve conter os elementos essenciais da liquidação (ou liquidações) que está subjacente à execução fiscal, incluindo a respectiva fundamentação, a fim de lhes assegurar a possibilidade de reclamarem graciosamente ou impugnarem contenciosamente o mesmo acto tributário, direitos que lhe são assegurados pelo artº.22, nº.4, da L.G.Tributária (cfr.artº.23, nº.4, da L.G.T.). Sem tais indicações, o acto tributário não será eficaz relativamente aos responsáveis subsidiários (cfr.artº.77, nº.6, da L.G.T.; artº.36, nº.1, do C.P.P.T.), pelo que essa falta constituirá, além do mais, um fundamento autónomo de oposição à execução fiscal, enquadrável no artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.T.
5. Dispõe o artº.77, nº.2, da L.G.T., que a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, mas deve sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo. Implícita no regime resultante das disposições legais supra identificadas, está a realidade de ser através da citação em processo de execução fiscal que se opera a comunicação ao revertido, não só da entrada do tributo em fase de cobrança coerciva, como da liquidação do mesmo e dos seus fundamentos.
6. No caso “sub judice”, a indicação da fonte da informação sobre os rendimentos sujeitos a retenção (ou, se se quiser, de informação sobre se está em causa a cobrança de quantias cuja liquidação foi feita pelo devedor originário ou pela Fazenda Pública) está compreendida, não só pela exigência genérica de indicação dos fundamentos de facto (e de direito) da decisão, como pela obrigatoriedade de comunicação dos elementos essenciais do acto, entre os quais se inclui o seu autor.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.74 a 87 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo recorrido, J..., no âmbito dos processos de execução fiscal nºs.... e apensos e ... e apensos que correm seus termos no 3º. Serviço de Finanças de ..., tendo por objecto despacho que indeferiu requerimento de arguição de nulidade da citação.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.97 a 99-verso dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Considerou o Tribunal, na douta sentença, não resultar provado que a dívida nos autos respeita a imposto retido e não entregue ao Estado;
2-Não concorda a Fazenda Publica com o doutamente decidido pelas razões que se seguem;
3-Contrariamente ao considerado na douta sentença, o Oficio de 2014-02-21 foi acompanhado de elementos nos quais são referidos a natureza do imposto (IRS/Ret. Font-Cjm), o período de tributação, data de pagamento voluntario e respectivo valor, é indicada a certidão, bem como o documento de origem;
4-Acresce que, encontrando-se o reclamante a desempenhar funções de gerente da devedora originária à data de entrega da prestação tributária, não pode agora alegar que desconhece a origem das dívidas;
5-Tanto mais, porque se trata de retenção da fonte de IRS, imposto que foi retido pela devedora originária e não entregue nos cofres do Estado;
6-Sendo, em regra, a retenção na fonte feita por conta do imposto devido a final, não se pode falar em liquidação efectuada pela AT nem mesmo em autoliquidação;
7-No caso de se determinar que o substituo fez retenções na fonte sobre determinados rendimentos sem que tenha procedido à entrega das quantias retidas nos cofres do Estado, a AT só se limita a apurar os montantes retidos e não entregues e a exigir-lhe o cumprimento da obrigação, não procedendo a qualquer liquidação;
8-Ora, estando nos presentes autos em causa dívida de imposto retido na fonte, estamos perante a exigência do cumprimento de uma obrigação imposta ao substituto e não perante uma liquidação propriamente dita;
9-Perante este quadro, não pode o reclamante, enquanto gerente da devedora originária à data dos factos, alegar desconhecimento da origem das dívidas;
10-Resulta do exposto, que foram comunicados ao reclamante todos os elementos que lhe permitiam identificar a divida objecto do PEF, pelo que não se pode considerar qualquer prejuízo para a sua defesa;
11-Pelo que, salvo o devido respeito, ao decidir como decidiu, fez o Tribunal na douta sentença, uma errada interpretação do disposto nos arts. 190º, 163º do CPPT e arts. 22º, nº 4 e 23º, nº 4 da LGT;
12-Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a reclamação judicial totalmente improcedente. Porém v. Ex.as decidindo farão a costumada Justiça.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.115 dos autos) no sentido de se conceder provimento ao recurso.
X
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.76 a 82 dos autos):
1-No dia 14 de Janeiro de 2014, o reclamante, J..., com o n.i.f. …, foi citado, por reversão, no processo de execução fiscal nº.... e apensos, o qual corre termos no 3º. Serviço de Finanças de ... (cfr.documentos juntos a fls.35, 36 e 50 do processo n.º…/14.2BELRS apenso);
2-O teor da referida citação é o seguinte (cfr.documento junto a fls.12 e 12 verso dos presentes autos):
“Imagem no original”



3-Em anexo à referida citação não seguiu nenhum envelope contendo a demonstração da liquidação (cfr.acordo das partes);
4-Por carta registada no dia 23/01/2014, o reclamante requereu ao Chefe do 3º. Serviço de Finanças de ... a notificação da demonstração da liquidação ou a emissão de certidão que a contivesse (cfr.documentos juntos a fls.14 e verso dos presentes autos);
5-Por ofício com data de 21/02/2014, o Chefe do 3º. Serviço de Finanças de ... enviou ao reclamante os documentos reproduzidos a fls.25 a 28 verso dos presentes autos, cujo teor é o que seguidamente se apresenta, com a indicação «Para cumprimento do disposto no n.º 4 do artigo 22.º da LGT, junto se remetem os elementos essenciais da liquidação e fundamentação subjacente à dívida revertida»:
“Imagem no original”


6-O reclamante deduziu oposição contra a execução, arguindo a nulidade da citação, a qual tramitou neste Tribunal como processo n.º …/14.2BELRS (cfr.processo apenso);
7-Esta oposição foi convolada em requerimento de arguição de nulidade da citação e devolvida ao OEF para conhecimento de tal nulidade pelo mesmo (cfr.processo apenso);
8-O Chefe do 3º. Serviço de Finanças de ... indeferiu o requerimento de declaração de nulidade da citação com a seguinte fundamentação (cfr.documento junto a fls.6 e 7 dos presentes autos):
9-Pela inscrição nº.1 - apresentação 30, de 12/06/1987, foi registada, na 1.ª Conservatória de Registo Comercial de ..., a designação do reclamante como sócio e gerente da sociedade C..., LDA., NIPC ... (cfr. documento junto a fls.29 e 30 dos presentes autos; documento junto a fls.58 a 62 do processo de execução apenso);
10-Pelo averbamento nº.2 - apresentação 2, de 15/07/2008, foi registada, na 1.ª Conservatória de Registo Comercial de ..., a renúncia, em 01/06/2008, do reclamante ao cargo de gerente da sociedade C..., LDA., NIPC ... (cfr.documento junto a fls.29 e 30 dos presentes autos; documento junto a fls.58 a 62 do processo de execução apenso);
11-A dívida revertida e em cobrança no processo de execução fiscal nº.... e apensos respeita a retenções na fonte de IRS dos anos de 2007 e 2008, no montante total de € 4.878,14 (cfr.documentos juntos a fls.25 a 28 verso dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Ficaram por provar os seguintes factos alegados com relevância para a decisão:
12. A dívida em cobrança nos autos respeita a imposto retido e não entregue ao Estado [artigo 12.º da resposta da Fazenda Pública]…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…O julgamento da matéria de facto fundou-se, conforme indicado a propósito de cada facto provado, na prova fornecida pelos documentos juntos aos autos.
O facto n.º 12 foi considerado não provado porque na documentação constante dos autos e dos processos anexos, designadamente da representada pelos documentos n.º 2 e 6 anexos à reclamação, a fls. 12, 12 verso, e 25 a 28 verso dos presentes autos, assim como da que se encontra a fls.2, 3, 18, 52 e 52 verso, e 179 a 182 verso do processo de execução fiscal, não figura qualquer indicação a respeito de se tratar de imposto retido mas não entregue ou, em alternativa, de imposto que não chegou a ser retido na fonte.
Entre tais documentos figuram dois intitulados “Consultar Guias de Retenção na Fonte – Detalhe” (fls.27 e 28 verso). Constata-se portanto, que há “guias” emitidas nas datas de 02 e 04 de Junho de 2009, dias antes das dívidas por elas apuradas ficarem no “estado” «em cobrança coerciva» (23 e 25/06/2009, datas das certidões de dívida). Contudo, dadas, por um lado, essas datas de emissão; e dado, por outro, que esses documentos não indicam quem emitiu as guias, fica a dúvida sobre se se trata de guias emitidas pelo devedor originário ou se se trata da emissão oficiosa de guias, por ser essa a forma (é?) de tratamento informático das liquidações oficiosas de retenções devidas…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese:
1-Absolver a Fazenda Pública da instância relativamente ao pedido de declaração da nulidade da citação efectuada no processo de execução fiscal nº.... e apensos, constatada a sua extinção;
2-Julgar procedente o pedido e, em consequência, declarar a nulidade da citação efectuada ao reclamante e ora recorrido no âmbito do processo de execução fiscal nº. ... e apensos.
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Aduz o apelante, em síntese, que considerou o Tribunal “a quo” não resultar provado que a dívida exequenda respeita a imposto retido e não entregue ao Estado. Que contrariamente ao considerado na decisão recorrida o ofício de 21/2/2014 foi acompanhado de elementos nos quais são referidos a natureza do imposto (IRS/Ret. Font-Cjm), o período de tributação, data de pagamento voluntário e respectivo valor, é indicada a certidão, bem como o documento de origem. Acresce que, encontrando-se o reclamante a desempenhar funções de gerente da devedora originária à data de entrega da prestação tributária, não pode agora alegar que desconhece a origem das dívidas. Que foram comunicados ao reclamante todos os elementos que lhe permitiam identificar a dívida objecto do PEF, pelo que não se pode considerar qualquer prejuízo para a sua defesa. Que fez o Tribunal “a quo” uma errada interpretação do disposto nos artºs.163 e 190, do C.P.P.T., e nos artºs.22, nº.4, e 23, nº.4, da L.G.T. (cfr.conclusões 1 a 12 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo assacar à sentença recorrida um erro de julgamento de direito.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal pecha.
A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr. artº.219, nº.1, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário).
É no artº.165, do C.P.P.Tributário, que estão previstas as nulidades em processo de execução fiscal. Distintas das situações de falta de citação, que são susceptíveis de constituir casos de nulidade insanável, para efeitos deste artigo, são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr.artº.191, nº.1, do C.P.C.). Estas nulidades da citação só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados, que, em sintonia com o preceituado no artº.191, nº.2, do C.P.Civil, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição, equivalente à contestação em processo declarativo, ou, nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo. A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado (cfr.artº.191, nº.4, do C.P.C.), solução esta que sempre resultaria, por maioria de razão, do preceituado no artº.165, nº.1, al.a), do C.P.P. Tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.137 e seg.; Carlos Paiva, O Processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.193 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/2/2007, proc.1065/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.5763/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/3/2013, proc. 6488/13).
“In casu”, conforme se retira da matéria de facto provada o reclamante/recorrido foi citado, enquanto responsável subsidiário e no âmbito do processo de execução fiscal nº. ... e apensos (cfr.nº.1 do probatório).
A citação dos responsáveis subsidiários deve conter os elementos essenciais da liquidação (ou liquidações) que está subjacente à execução fiscal, incluindo a respectiva fundamentação, a fim de lhes assegurar a possibilidade de reclamarem graciosamente ou impugnarem contenciosamente(1) o mesmo acto tributário, direitos que lhe são assegurados pelo citado artº.22, nº.4, da L.G.Tributária (cfr.artº.23, nº.4, da L.G.T.). Sem tais indicações, o acto tributário não será eficaz relativamente aos responsáveis subsidiários (cfr.artº.77, nº.6, da L.G.T.; artº.36, nº.1, do C.P.P.T.), pelo que essa falta constituirá, além do mais, um fundamento autónomo de oposição à execução fiscal, enquadrável no artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.T. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.5763/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.112; Diogo L. Campos e Outros, L.G.T. comentada e anotada, Editora Encontro de Escrita, 4ª. edição, 2012, pág.216; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.189 e seg.).
Por outro lado, dispõe o artº.77, nº.2, da L.G.T., que a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, mas deve sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
Implícita no regime resultante das disposições legais supra identificadas, está a realidade de ser através da citação em processo de execução fiscal que se opera a comunicação ao revertido, não só da entrada do tributo em fase de cobrança coerciva, como da liquidação do mesmo e dos seus fundamentos.
Revertendo ao caso dos autos, entendeu o Tribunal “a quo” que não foram incluídas na citação ao recorrido as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo (a demonstração da liquidação). Tal como não foi incluído no acto de citação que a dívida em cobrança respeite a imposto retido e não entregue nos cofres do Estado. Com base em tais pressupostos concluindo pela nulidade da citação, visto que a falta dos elementos indicados é susceptível de prejudicar o exercício pleno dos direitos de reclamação e de impugnação da liquidação por parte do mesmo.
Pelo contrário, o recorrente entende que foram comunicados ao reclamante/recorrido todos os elementos que lhe permitiam identificar a dívida objecto do PEF, pelo que não se pode considerar qualquer prejuízo para a sua defesa.
Vejamos quem tem razão.
De acordo com o estabelecido no citado artº.77, nº.2, da L.G.T., a fundamentação exigida é descrita como uma sucinta exposição das razões de facto e de direito que motivaram a decisão que pode ser efectuada de forma sumária, embora deva conter sempre as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo. Ainda que sucinta e sumária, ela deve conter, no entanto, as razões de facto e de direito que motivaram a decisão. Esta menor exigência de fundamentação compreende-se nos casos de uma liquidação efectuada com base em declaração do próprio sujeito passivo de imposto (cfr.José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.835 e seg.).
“In casu”, dos factos provados (cfr.nºs.2 e 5 do probatório), não resulta provado que tenha sido comunicado ao reclamante/recorrido a informação sobre “como foi efectuada a liquidação dos tributos reclamados”, ou seja, não foram incluídas na citação as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo/demonstração da liquidação.
Por outro lado, também não foi indicado ao recorrido se as liquidações que consubstanciam a dívida exequenda foram realizadas pela devedora originária em declarações, eventualmente, por si entregues (v.g.através de “guias” emitidas que têm subjacentes as declarações de retenções aprovadas pela portaria 523/2003, de 4/7) mas não pagas, ou em declarações modelo 10 (aprovadas, sucessivamente, pelas portarias 1145/2004, de 30/10, 11/2007, de 4/1, e 16-B/2008, de 9/1) que hajam sido entregues ao Estado pelo devedor originário. Ou, pelo contrário, se efectuadas pela A. Fiscal, nomeadamente, através de elementos colhidos nas declarações apresentadas pelos titulares dos rendimentos sujeitos a retenção (o substituído, no mecanismo de retenção na fonte por conta do imposto devido a final).
No entanto, essa indicação da fonte da informação sobre os rendimentos sujeitos a retenção (ou, se se quiser, de informação sobre se está em causa a cobrança de quantias cuja liquidação foi feita pelo devedor originário ou pela Fazenda Pública) está compreendida, não só pela exigência genérica de indicação dos fundamentos de facto (e de direito) da decisão, como pela obrigatoriedade de comunicação dos elementos essenciais do acto, entre os quais se inclui o seu autor (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/5/2008, rec.309/08).
E recorde-se que não ficou provado nos autos que a dívida em cobrança respeite a imposto retido e não entregue nos cofres do Estado (cfr.facto nº.12, considerado não provado), sendo que o recorrente não impugnou a factualidade provada e não provada (cfr.artº.640, do C.P.Civil).
Mas mais, ainda que se provasse que a dívida em cobrança respeita a imposto retido e não entregue, não se confundindo o reclamante/recorrido, responsável subsidiário, com o sujeito passivo da obrigação de retenção - o devedor originário - não se poderá nunca falar em autoliquidação dos valores a reter, a não ser que se tivesse alegado (o que não se fez) e provado que foi o reclamante/recorrido quem, nos períodos em causa, procedeu, em representação da sociedade devedora originária, à liquidação dos valores a reter, ou, pelo menos, como início de prova, que era ele quem estava incumbido da gestão das questões fiscais da devedora originária. Pois nessa hipótese, que se não verifica, poder-se-ia proceder à desconsideração, para este fim, da personalidade jurídica da pessoa colectiva.
Tem, portanto, de se concluir, com o Tribunal “a quo”, que a citação não observou todas as formalidades prescritas na lei, estando preenchida a previsão do citado artº.191, nº.1, do C.P.Civil.
Aqui chegados, haverá que recordar que a arguição de nulidade da citação só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, conforme mencionado supra (cfr.artº.191, nº.4, do C.P.Civil; artº.165, nº.1, al.a), do C.P.P. Tributário).
De acordo com a jurisprudência e a doutrina unânimes, a arguição de nulidade da citação deve ser atendida, para tanto bastando que haja a possibilidade de prejuízo para a defesa do executado, a não ser que o exequente afaste a sanção da nulidade demonstrando factos que permitam concluir que nenhum prejuízo efectivo acabou por ocorrer (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/5/2008, rec.309/08; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/4/2014, rec.217/14; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.5763/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.138 e seg.).
“In casu”, é manifesto que a falta dos elementos indicados é susceptível de prejudicar o exercício pleno dos direitos de reclamação e de impugnação da liquidação, por parte do responsável subsidiário.
Desde logo, porque, atendendo ao disposto no artº.132, nº.6, do C.P.P.T., o regime de impugnação difere consoante tenha havido retenção na fonte (e, portanto, seja de aplicar o regime para que remete essa disposição) ou se trate de uma liquidação realizada pela A. Fiscal (em que aquele regime se não aplicará).
Depois porque, não sendo informado se se trata, ou não, de imposto que chegou a ser retido, não pode, na hipótese de não o ter sido, sem a demonstração do cálculo do apuramento do imposto devido - através, designadamente, da identificação dos rendimentos sujeitos a retenção, dos respectivos titulares, da condição destes (casado, solteiro, com dependentes, sem dependentes, etc.) - aferir-se, por exemplo, da correcção da taxa aplicada à luz do disposto no C.I.R.S., e nos despachos que fixam as taxas de retenção.
As omissões verificadas na citação são, portanto, susceptíveis de prejudicar o exercício pleno dos direitos de reclamação e de impugnação da liquidação por parte do revertido/responsável subsidiário.
Dito isto, é também de referir que o recorrente não alega facto algum que permita concluir que esse prejuízo potencial não existiu efectivamente.
Em conclusão, a decisão recorrida não violou o disposto nos artºs.163 e 190, do C.P.P.T., e 22, nº.4, e 23, nº.4, da L.G.T.
Arrematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 9 de Março de 2017



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)

(1) A reclamação graciosa ou a impugnação judicial podem ser deduzidas nos prazos de 120 dias e três meses, respectivamente, a contar da data da citação, em conformidade com o preceituado nos artºs.70, nº.1, e 102, nº.1, al.c), do C.P.P.T.