Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:596/14.0 BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:04/20/2023
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:IVA
MÉTODOS INDIRECTOS
Sumário:Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

Vem U....., S.A., apresentar recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a impugnação judicial contra a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios referentes ao período 09/12, no valor total de € 244.834,29.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“A. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial apresentada contra os actos de liquidação de IVA e juros compensatórios, com referência ao exercício de 2009, decorrentes de uma correcção efectuada por aplicação de métodos indirectos.

B. A sentença padece de diversos vícios. O primeiro, que consiste na falta de fundamentação e que é gerador de nulidade, senão vejamos.

C. A transcrição do relatório de inspecção tributária deveria ter sido substituída pela apreciação dos factos alegados pela Autoridade Tributária no seu relatório de inspecção em confronto com os documentos anexos ao mesmo e, ainda, com a prova carreada para os autos pela Impugnante, e, por fim, o Tribunal a quo poderia dar ou não como provados os factos constantes do relatório.

D. No que respeita à transcrição do relatório de inspecção para a factualidade dada como provada (cfr. páginas 6 a 15 da sentença recorrida), a Recorrente considera, como aliás já decidiu o Tribunal Central Administrativo Norte, em 28/01/2016, no âmbito do processo que correu termos sob o número 00479/09.5BEPRT, que o Tribunal tem que fazer uma apreciação da prova produzida e não pode dar como provados determinados factos, por os mesmos constarem do relatório de inspecção, sem mais.

E. No citado acórdão, o Tribunal Central Administrativo Norte aprecia a nulidade de uma sentença proferida em primeira instância, por falta de fundamentação, tendo justamente por base o facto de a mesma se ter limitado a transcrever o conteúdo do relatório de inspeção tributária, como se transcreveu no presente recurso, concluindo que "A sentença não cumpre as regras legais que presidem à elaboração da sentença. E optando por «meter tudo» nos factos provados, demite-se do dever de discriminar e especificar, os fundamentos de facto da decisão. Pelo que, nos termos do art. 125.9/l do CPPT, e 6689/l-b) do CPC (correspondente ao artigo 615/l-b) do NCPC) é nula por falta de fundamentação", (sublinhado nosso)

F. Não fazer qualquer apreciação sobre os factos e sobre a prova produzida e de imediato concluir que o relatório de inspecção tributária só contem factos provados, viola desde logo o princípio do contraditório, previsto no artigo 3.º do Código de Processo Civil e o princípio da distribuição do ónus da prova, previsto no artigo 74º da LGT, que nos casos de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, distribui o ónus da prova do seguinte modo: "compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação", (cfr. nº 3 do artigo 74º)

G. E não se diga que esse procedimento tem respaldo no artigo 115º, nº 2, pois como já deixámos acima referido, não se trata de uma presunção de veracidade incondicional, nem de uma presunção inilidível.

H. Termos em que deverá ser reconhecida a nulidade da sentença, por falta de fundamentação, o que desde já se requer.

I. Outro vício de que padece a sentença recorrida respeita ao erro na apreciação e valoração da prova documental e da prova testemunhal (produzida no processo que correu termos sob o nº 590/14.0BELRA e que foi aproveitada para os presentes autos), não tendo o Tribunal a quo dado como provados alguns factos que a Recorrente considera terem ficado provados;

J. tendo dado como provados factos que estão em contradição com os documentos de prova que compõem os autos e

K. quanto a alguns factos que considerou provados, não ter retirado as consequências que as regras da lógica e da experiência exigiam.

L. Ainda no que respeita à prova, considera a Recorrente que o depoimento da inspectora que elaborou o relatório de inspecção (C.....) foi bastante tendencioso e que resultou evidente que a referida testemunha estava nitidamente a defender a posição que assumiu durante o processo de inspecção e no relatório de inspecção, facto que não foi tido em conta pelo Tribunal a quo e que deveria ter sido avaliado para conferir maior ou menor credibilidade ao depoimento da referida testemunha.

M. Por outro lado, como se deixou dito, quanto aos factos alegados pela AT no seu relatório de inspecção, o Tribunal dá como totalmente reproduzida a factualidade constante do relatório (cfr. ponto 27) do capítulo do saneamento A) Dos Factos, entre as páginas 6 e 15 da sentença recorrida), sem ter em conta a contra-prova produzida pela Recorrente, o que não se pode aceitar.

N. Com efeito, apesar do artigo 115º, nº 2, do CPPT referir que "As informações oficiais só têm força probatória quando devidamente fundamentadas, de acordo com critérios objectivos", não estamos perante uma presunção de veracidade incondicional e, muito menos, perante uma presunção inilidível. (sublinhado nosso)

O. Estamos perante um meio de prova ao qual o legislador atribuiu um maior grau de força probatória, "mas que poderá ser afastada mediante contra prova, ou seja, o interessado para abalar esta força probatória basta gerar dúvidas, não tendo de provar o contrário".

P. Ora, como se referiu, a subjectividade dos critérios em que se baseia o relatório de inspecção desde logo resulta evidente, tendo em conta a existência de um laudo de um perito independente, que colocou em causa os fundamentos utilizados pela AT para aplicar métodos indirectos de determinação da matéria tributável e que foi totalmente desconsiderado pelo Tribunal o quo.

Q. Ou seja, a Recorrente entende que no caso em apreço, porque não foram "fundamentadas e não se baseiam em critérios objectivos", as informações oficiais prestadas pela inspecção não gozam de especial valor probatório, pelo que também por essa razão, os factos invocados no relatório de inspecção deveriam ter sido objecto de uma apreciação crítica por parte do Tribunal, tendo em conta a prova oferecida pela AT e a prova produzida pela Recorrente.

R. Ora, conforme refere Cristina Flora "Toda a prova realizada ou produzida em juízo deve ser objecto de valoração pelo julgador. A valoração da prova pelo juiz consiste na formação de juízos de razoabilidade e racionalidade sobre os factos relevantes para a resolução da causa de modo a julga-los como provados ou não provados. Esse juízo deve atender às regras da experiência comum, de modo a que haja uma coerência com as ocorrências reais da vida, e deve formar-se em função do meio de prova em causa e da prova produzida, devendo ser tanto mais apurado quando no processo coexistam meios de prova não coincidentes." (sublinhado nosso)

S. Ora, como vimos o Tribunal a quo considerou que os depoimentos de todas as testemunhas, incluindo do perito independente foram todos ou pouco concretos, ou pouco objectivos, ou que as explicações foram dadas de forma simplista, enfim, nenhum foi capaz de contraria a força probatória do relatório de inspecção.

T. No caso do perito independente e da perita da AT no pedido de revisão, é flagrante a diferença de tratamento pelo Tribunal, pois se o depoimento do primeiro não foi sequer valorado, o depoimento da segunda foi valorado e até em contradição com documentos que constam dos autos (cfr. laudo da perita da impugnante).

U. Mas o Tribunal a quo em momento nenhum refere ter tido dúvidas sobre se os depoimentos foram prestados de forma séria e livre, tendo aliás referido que os depoimentos das testemunhas da Impugnante se mostraram credíveis e isentos, o que apontaria para uma valoração de todos, com idêntico peso para a prolação da decisão, o que não aconteceu.

V. Termos em que, só uma reanálise da prova produzida e a audição do registo de áudio dos depoimentos das testemunhas por este Tribunal de Recurso, no exercício da sua função jurisdicional de segundo grau sobre a matéria de facto, poderá pôr termo a tal incongruência do Tribunal o quo, que apesar de ter ouvido depoimentos isentos e credíveis, não retira deles quaisquer dúvidas sobre as conclusões a que chegou a AT no relatório de inspecção tributária.

W. Vejamos os erros da sentença quanto ao julgamento da matéria de facto.

X. No que respeita ao ponto 31) da matéria de facto, foram transcritas partes da ata da reunião de peritos de 29/10/2013, a última das três reuniões de peritos realizada e às quais não é feita qualquer referência nos autos, talvez porque a todas as actas tenha sido dado o mesmo número (acta nº 26/2013), pese embora as actas das duas reuniões anteriores, de 9 de Outubro de 2013 e de 18 de Outubro de 2013, tenham sido juntas aos autos. 

Y. Já quanto aos demais factos, vejamos aqueles que deveriam ter sido dados como provados em face da prova produzida. Nas presentes alegações, fizemos referência ao número dos artigos da PI renumerados, por requerimento apresentado em 30/06/2015.

Z. Assim, nos artigos 53º a 56º da petição inicial (sob a epígrafe "c) Erro no cálculo dos custos de produção"), a Impugnante invoca um erro da AT no cálculo desses custos para o exercício de 2010, que terá originado dúvidas à AT sobre o modo de contabilização dos custos de matérias-primas, uma vez que a aplicação de métodos indirectos decorreu de uma análise comparativa de três exercícios (2008 a 2010), sendo que um erro na análise de um dos exercícios tem reflexo nas conclusões.

AA. Ora, a Recorrente considera que a prova testemunhal esclareceu essa questão cabalmente, quer através do depoimento de parte de D....., quer da testemunha S....., nos termos transcritos nas presentes alegações, como exige o artigo 640º do CPC.

BB. E esclareceu por forma a que se possa concluir que na comparação das divergências entre os vários anos, não há uma verdadeira comparabilidade, pois se em 2009 foi considerada a totalidade dos custos de produção (custos com a produção de produto acabado, semiacabado e pasta), no ano 2010, os serviços de inspeção apenas consideraram os custos de produção de produto acabado, quanto deviam ter também considerado os custos de produção do produto semi-acabado e da pasta.

CC. Dos trechos do depoimento de D....., que se transcreveram, resulta evidente que o sistema SAP veio conferir um maior rigor no apuramento dos custos de produção por tipo de produto, mas também deixou claro que antes de ter esse sistema, a Impugnante conseguia apurar os seus custos de produção de forma fidedigna, facto que parece ter sido desconsiderado pelo Tribunal.

DD. Já quanto à diferença na amostra utilizada pela AT para o apuramento dos custos de produção nos anos de 2009 e 2010 e, por essa razão, à invocada incomparabilidade das duas realidades, os trechos dos depoimentos da testemunha S..... são bastantes esclarecedores.

EE. Termos em que considera a Recorrente que devem ser aditados os seguintes factos:
"40) Apesar do sistema de contabilidade utilizado pela Impugnante em 2009 (Primavera) ser diferente do sistema utilizado em 2010 (SAP), em 2009 a Impugnante conseguia apurar de forma fiel os seus custos com a produção, apesar de o fazer através de uma tabela de Excel e não directamente através do sistema."
"41) A forma de cálculo dos custos de produção utilizada pela AT não foi idêntica em todos os exercícios inspecionados, tendo nuns sido consideradas todas as matérias primas e noutros apenas parte das matérias primas."

FF. A matéria de facto dada como assente na sentença está também em contradição com a decisão, senão vejamos.

GG. No exercício de 2009, que é aquele que está em causa nos presentes autos, ficou provado, ainda que indirectamente, que a Impugnante utilizava o sistema Primavera (cfr. pontos 3 e 4 da matéria de facto) e que as suas contas estavam organizadas de acordo com o Plano Oficial de Contas (POC), pois só no ano seguinte, é que a Impugnante adoptou o sistema SAP.

HH. Aliás, esse facto até foi dado como provado no ponto 6) da matéria de facto constante da sentença que se transcreve: "O plano de contas da Impugnante, no exercício de 2010, não coincidia com o plano de contas publicado pela Portaria nº 1011/2009, de 13/7 (pág. 5 do relatório de inspeção tributária a fls. 11 do p.a.)." (sublinhado nosso)

II. Assim, não se compreende como é que o Tribunal a quo, perante um facto referente a 2010, valida a aplicação de métodos indirectos com fundamento na "impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável", com referência ao ano de 2009, exercício no qual ficou provado que as contas da impugnante obedeciam a todos os normativos legais e contabilísticos.

JJ. Aliás, a contabilidade da impugnante, ora Recorrente, foi analisada pelo perito independente, nomeado pela Comissão Nacional de Revisão, nos termos do disposto no artigo 93º da LGT, para o pedido de revisão, tendo o mesmo concluído pela inexistência, de erros ou imprecisões, facto totalmente desconsiderado pelo Tribunal a quo.

KK. Vejamos o erro de valoração da prova que resulta do facto dado como provado no ponto 35 da sentença recorrida.

LL Da consideração deste facto como provado resulta evidente que o Tribunal a quo é bastante contraditório, para não dizer tendencioso, na forma como valora os depoimentos da AT e do contribuinte, assim como os documentos (no caso o documento nº 11 anexo à P.I.), mesmo quando faz afirmações que o levariam a outra conclusão, o que consubstancia erro de julgamento.

MM. O Tribunal a quo afirma o seguinte quanto ao depoimento da testemunha da impugnante, S....., que segundo o mesmo "prestou um depoimento isento e credível": "Tendo sido perita nomeada pela Impugnante no procedimento de revisão declarou que a perita da Fazenda Pública lhe propôs uma redução da matéria tributável" (cfr. página 23 da sentença) (sublinhado nosso)

NN. E o Tribunal a quo afirmou também o seguinte, quanto ao depoimento da testemunha M......, perita da Autoridade Tributária no procedimento de revisão: "Mais, a testemunha declarou que, a fim de obter um acordo no procedimento de revisão, propôs a redução da matéria tributável fixada aquando da acção inspectiva" (cfr. página 24 da sentença). (Sublinhado nosso) 

OO. Ora, tendo ambas as testemunhas atestado que foi a Autoridade Tributária que propôs uma redução da matéria tributável à perita da Impugnante e que esta não colocou nenhuma questão sobre um possível acordo, o que denota, por um lado, que a Autoridade Tributária não estava segura das conclusões a que chegaram os serviços de inspecção e que estava disposta a baixar o valor e, por outro lado, que a Impugnante estava segura de que as suas contas reflectiam a realidade e que não havia razão para aplicar métodos indirectos na determinação da sua matéria tributável, veja-se o que o Tribunal a quo deu como provado:

PP. "35) A perita da Autoridade Tributária, quando questionada pela perita da Impugnante sobre uma possível proposta de acordo, propôs a redução da matéria tributável à perita da Impugnante em montante não concretamente apurado (depoimentos de S...... e M......)."

QQ. Ora, este facto não revela a verdade, não corresponde sequer ao que o próprio Tribunal considerou serem as declarações das testemunhas e resulta da total desconsideração, quer do depoimento do perito independente, que se transcreveu acima, quer do laudo da perita do contribuinte (cfr. documento nº 11 da PI).

RR. Termos em que o facto que deveria ter sido dado como provado era o seguinte:
"35) Na reunião de peritos e a fim de obter um acordo, a perita da Autoridade Tributária propôs a redução da matéria tributável à perita da Impugnante, para o montante de € 676.473,52, que a perita da Impugnante não aceitou, por desconhecer a fórmula de cálculo para a AT chegar a esse montante e por considerar que aceitar esse acordo seria anuir quanto à existência de fundamentos para a aplicação dos métodos indirectos (Cfr. depoimentos de S......, M...... e P...... e laudo da perita do contribuinte, junto como documento nº 11 da petição inicial e constante de fls. 89 e 90 do PAT, apenso aos autos por ter sido impossível à Fazenda Pública fazê-lo através do SITAF)."

SS. E deste facto, resultam várias assunções. Ora, o facto de na reunião de peritos a AT ter proposto reduzir a matéria tributável de € 1.076.473,52 para € 676.473,52, em IVA, demonstra bem que a AT não estava segura da razão que lhe assistia na aplicação dos métodos indirectos, pois se estivesse, faria o que faz sempre que tem certezas, que é manter as correcções e não propor qualquer redução.

TT. Pelo que este facto deveria ter sido considerado pelo Tribunal como susceptível de abafar as suas alegadas certezas quanto à legalidade da correcção por métodos indirectos que deu origem ao acto de liquidação impugnado e à sua quantificação.

UU. No que respeita aos factos provados e constantes dos pontos 20) a 25) da matéria de facto, a Recorrente não consegue alcançar a razão de ser da comparação feita pelo Tribunal a quo entre os gastos de gás natural referentes a 2009 e os gastos de electricidade referentes a 2010, com referência a documentos juntos com o PAT pela Fazenda Pública (cfr. 72 a 77 do p.a.).

VV. Depois de comparados os documentos a que a sentença se refere e os documentos juntos aos autos pela Impugnante e pela Fazenda Pública, verifica-se que, certamente por lapso, nos pontos 23) 24) e 25) da matéria de facto, o Tribunal a quo refere o ano de 2010, quando queria referir o ano de 2009.

WW. Assim, os pontos 23) a 25) da matéria de facto devem ser corrigidos, no sentido de se alterar o ano de 2010 para 2009, pois os valores aí referidos são respeitantes a facturas de 2009 e não de 2010, passando os mesmo a dispor o seguinte:
"23) Em junho de 2009 a Impugnante suportou encargos com a eletricidade de € 42.539,05 (documentos 13 e 14 da p.i.).
24) Em julho de 2009 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de € 13.152,03 (documentos 13 e 14 da p.i.).
25) Em agosto de 2009 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de €
47.119,13 (documentos 13 e 14 da p.i.)."

XX. Ainda no que respeita a este encerramento da fábrica, que ficou provado, o Tribunal a quo não tirou as devidas consequências, pois parte de um pressuposto ou de um preconceito de considerar que esta paragem só teve o intuito de proceder a reparações e não o de parar uma produção que se afigurava excessiva para a procura.

YY. Com efeito, a ora Recorrente, nos artigos 43º a 48º da PI, refere que a fábrica encerrou a produção durante o mês de julho de 2009, em consequência da diminuição da procura - encerrou as linhas de produção e desligou as máquinas durante o mês de julho de 2019 (demonstrado através do mapa de consumos da eletricidade e gás) e do decréscimo das vendas.

ZZ. No entanto, ignorando, uma vez mais, a prova produzida pela Impugnante, ora Recorrente, o Tribunal deu como provado o facto de que a empresa esteve encerrada em julho de 2009, a fim de fazer manutenção e introdução de novas máquinas nas linhas de produção - mas não aceita a justificação apresentada pela Impugnante, de que esse encerramento também se deveu a um decréscimo de vendas e à necessidade de escoar a mercadoria e não acumular stock.

AAA. Ora, para além dos depoimentos que revelam esses factos, o próprio Tribunal a quo, no facto dado como provado sob o ponto 15 conclui que "15) No exercício de 2009, toda a produção do ano foi vendida e foram ainda vendidos produtos produzidos em anos anteriores constantes das existências (inventários) iniciais (pág. 23 do relatório de inspecção tributária a fls. 29 do p.a.)"

BBB. Tal afirmação só vem corroborar, ainda que indirectamente, o alegado pela Impugnante, ao referir que a paragem da fábrica também se deveu a uma quebra das vendas e à necessidade de escoar stock armazenado e não só à necessidade de se fazer manutenção e introdução de novo equipamento.

CCC. Assim, o facto que deveria ter sido dado como provado, ao invés do que resulta do ponto 26) da sentença recorrida era o seguinte, que deverá ser alterado, o que desde já se requer:
"26) No mês de julho de 2009 a Impugnante teve a fábrica encerrada, a fim de fazer manutenção e introdução de novas máquinas nas linhas de produção, e de reduzir a produção e escoar o stock existente, atendendo ao decréscimo nas vendas que se fazia sentir (cfr. depoimentos de P......, S...... e laudo do perito do contribuinte junto como documento n.º 11 da P.I.)"

DDD. Vejamos agora os erros de julgamento de direito que encontrámos e identificámos na sentença recorrida.

EEE. Ora, nesse ponto, a questão que se pretende ver esclarecida pelo Tribunal de recurso é a de saber se, no caso em apreço, se verificavam os pressupostos legais para que a matéria tributável da Impugnante, no exercício de 2009, fosse apurada com recurso a métodos indirectos e se, havendo hipoteticamente razões para os aplicar, ocorreu um excesso de quantificação dessa matéria.

FFF. Os Serviços de Inspecção tributária invocaram como base legal o artigo 87º, alínea b) e o artigo 88º, alínea d) ambos da Lei Geral Tributária (LGT) (cfr. página 25 do relatório final de inspecção).

GGG. Assim, nos termos do disposto nos artigos 87º, alínea b), e 88º, alínea d), da Lei Geral Tributária, a aplicação de métodos indirectos, no caso concreto, só se poderia efectuar em caso de "impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável", sendo que tal impossibilidade teria de decorrer da "existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado dos bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada".

HHH. Deste modo, impunha-se à AT, como condição absolutamente essencial para a aplicação, no caso concreto, de métodos indirectos, a demonstração dos seguintes factos:
(i) de que existe uma discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado dos bens produzidos/vendidos pela Impugnante, e,
(ii) de que a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável estava inviabilizada.

III. Conforme ficou demonstrado pela prova produzida a AT não logrou demonstrar os supra referidos factos e a Impugnante, ora Recorrente, conseguiu não só contrariar a tese da AT, como abalar a veracidade das conclusões daquela. Note-se, que o alcançou, também com a ajuda da prova oferecida pela própria Fazenda Pública.

JJJ. Com efeito, a própria perita da AT no pedido de revisão teve dúvidas sobre as conclusões alcançadas pela equipa de inspecção, a ponto de propor uma redução de 40% do montante de matéria colectável apurada por tal equipa.

KKK. Com efeito, do relatório final de inspecção resulta que o motivo determinante invocado pelos Serviços de Inspecção Tributária para a aplicação dos métodos indirectos foi a diminuição dos proveitos da Impugnante no exercício de 2009 e é essa a argumentação que o Tribunal o quo deveria ter analisado com base na prova produzida por ambas as partes.

LLL. Entenderam os Serviços de Inspecção que a razão do decréscimo de proveitos no exercício de 2009, de cerca de 9%, se comparado com o exercício anterior (2008) e com o exercício posterior (2010), se devia a uma omissão de proveitos.

MMM. Como se aludiu, resulta da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos que essa diminuição se deveu: i) ao decréscimo das vendas da Impugnante no ano de 2009, ii) ao aumento dos custos de produção no ano de 2009, em resultado do encerramento da fábrica durante um mês e das manutenções efectuadas e iii) à redução da produção, decorrente do referido encerramento.

NNN. Assim, se o Tribunal a quo tivesse dado como provados os factos que acima se invocaram, talvez chegasse a conclusão diferente, mas independentemente disso, no que respeita à fundamentação de direito, a Recorrente entende que o Tribunal faz uma errada interpretação das normas sobre a determinação indirecta da matéria colectável, o que se demonstra por algumas contradições de argumentos.

OOO. De facto, o Tribunal a quo afirma, citando o Supremo Tribunal Administrativo, que a avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa e que tem carácter excepcional, e que "cabe à Autoridade Tributária a demonstração de que os pressupostos que legitimam o recurso a avaliação da matéria tributável por métodos indirectos se verificam, consubstanciando-se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fácticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos directos de avaliação" (cfr. página 27 da sentença),

PPP. mas, alguns parágrafos adiante, faz afirmações que não se subsumem na lei, nem na jurisprudência citada, pois pretendia que o Impugnante justificasse um facto que o mesmo não controla, pelo menos em parte, que tem a ver com o comportamento do mercado.

QQQ. Ou seja, o Tribunal o quo pretende do contribuinte uma justificação para um decréscimo de proveitos, que não aconteceu por facto imputável à Recorrente e cuja cominação a lei não determina ser a aplicação de métodos indirectos.

RRR. Questiona-se, em primeiro lugar, se é necessário justificar a diminuição do valor de vendas em 9% de um ano para outro. A redução das encomendas ou da procura de um determinado produto tem que ter uma justificação?

SSS. Questiona-se, em segundo lugar, quais foram os erros da contabilidade que evidenciam que a mesma não é suficiente para apurar a matéria colectável de forma directa?

TTT. Por fim, se a contabilidade padecesse de tamanhos erros que impossibilitavam a quantificação directa, como teria sido possível à perita da AT apurar um montante de € 676.473,52 de vendas presumidas, em vez dos € 1.076.473,52, apurados pela inspecção?

UUU. E ainda, se a contabilidade, organizada de acordo com o POC e assente num sistema certificado como o Primavera, não permitisse uma quantificação directa da matéria colectável, por que razão as suas contas de 2009 foram auditadas sem reservas,

VVV. e como é que o perito independente, que teve acesso às contas no âmbito do pedido de revisão, também não detectou incongruências nem vícios na contabilidade?

WWW. Parecem pessoas demais a não verem "irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos directos de avaliação“!

XXX. Apesar de a Recorrente ter conseguido, pelo menos em parte, justificar e explicar ao Tribunal a razão da diminuição das vendas, que o mesmo ignorou, não há base legal para a aplicação de métodos indirectos por as vendas, de um ano para o outro, reduzirem 9%, nem por a margem sobre o custo da venda de produtos acabados diminuir, cerca de 15%, de um ano para o outro.

YYY. Com efeito, no que respeita a métricas que possibilitam o recurso a métodos indirectos, só existem as previstas no artigo 87º, nº 1, alínea c) da LGT e que estabelece o seguinte "A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de: c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15% para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica referidos na presente lei."

ZZZ. Ora, nem a AT fundamentou as correcções nesta disposição, nem a mesma é aplicável, ainda que por hipótese académica, aos factos constantes dos autos, pelo que a decisão do Tribunal a quo de validar a aplicação de métodos indirectos é ilegal, por violação do disposto nos artigos 85º, 87º, nº 1, alínea b) e 88º da LGT.

AAAA. Assim, andou mal o Tribunal a quo quando conclui que "a Autoridade Tributária cumpriu o ónus probatório que sobre si impendia, demonstrando a impossibilidade de avaliação directa da matéria tributável da Impugnante" (cfr. página 31 da sentença)

BBBB. O que mais uma vez demonstra a violação das regras de imputação do ónus da prova, acima já referidas, bem como das normas sobre aplicação de métodos indirectos, a que também já aludimos.

CCCC. No que respeita à quantificação, o Tribunal considera que a Impugnante não demonstrou "que o critério utilizado na quantificação, não respeita o artigo 90º da Lei Geral Tributária e que os valores apurados se mostram excessivos, os argumentos apresentados não têm qualquer consistência para pôr em causa a quantificação efectuada, pelo que Improcede o vício invocado".

DDDD. Sucede que a Impugnante, não só demonstrou que os métodos indirectos não deviam ser aplicados, como demonstrou que a sua contabilidade era fiável, pelo que da mesma nunca resultaria um acréscimo de vendas declaradas de € 10.197.793,00 para vendas presumidas de € 11.274.266,52, o que originou uma liquidação adicional de IVA de € 215.294,70.

EEEE. Acresce que a própria perita da AT no pedido de revisão, certamente por considerar excessivas as vendas presumidas, propôs uma redução de 40% do seu valor, o que denota que a prova do excesso de quantificação foi feita pela própria AT.

FFFF. Ora, a posição defendida no relatório de inspecção é que houve vendas não declaradas, porque houve um decréscimo de vendas de 9%, de 2009 para 2010, acompanhado de um decréscimo da margem, então os cálculos que a AT utilizou basearam-se na presunção de que esse decréscimo não aconteceu, ficcionando que a margem do ano de 2009 foi de 61,47%, equiparando os exercícios que comparou (2008, 2009, 2010), como se não fosse possível haver uma redução de vendas por razões de mercado!

GGGG. Ora, equiparar as margens entre três anos, um dos quais (2009) diferente do anterior e do posterior, pois teve um encerramento da fábrica, uma diminuição de procura e um necessário escoamento de produtos em stock (tudo factos provados nos pontos 14), 15), 26) da matéria de facto da sentença), é evidentemente um erro, que tem como consequência o apuramento de um valor de vendas presumido excessivo.

HHHH. Por fim, quanto à fundada dúvida sobre o facto tributário, também a sentença faz uma errada interpretação e aplicação do artigo 100º da LGT, pelo que deverá ser revogada, senão vejamos.

IIII. A existência de um parecer de um perito independente desfavorável à aplicação dos métodos indirectos e também a existência de uma proposta da AT de baixar em cerca de 40%, sem qualquer justificação do quantum, a matéria colectável apurada por métodos indirectos, deveria ter sido valorada pelo Tribunal para abalar a sua fé no relatório de inspecção.

JJJJ. Para além disso, ainda que o Tribunal considerasse que a AT tinha razões para aplicar métodos indirectos, pese embora a Recorrente entenda ter provado que não, era sempre exigido ao Tribunal que ficasse convencido de que também a quantificação a que chegou a AT, por presunções, era adequada. 

KKKK. Ora, se a própria testemunha da Fazenda Pública, M......, assumiu que talvez houvesse um erro na quantificação da matéria colectável por métodos indirectos,

LLLL. pois as reservas que a testemunha disse não ter quanto à aplicação dos métodos, não conseguiu afirmar que também não tinha quanto à quantificação, como se verificou pelos depoimentos transcritos acima,

MMMM. como é possível o Tribunal ignorar isso?

NNNN. Ora, estabelece o citado artigo 100º da LGT que "1- Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado,
2- Em caso de quantificação da matéria tributável por métodos indirectos não se considera existir dúvida fundada, para efeitos do número anterior, se o fundamento da aplicação daqueles consistir na inexistência ou desconhecimento, por recusa de exibição, da contabilidade ou escrita e de mais documentos legalmente exigidos ou a sua falsificação, ocultação ou destruição, ainda que os contribuintes invoquem razões acidentais.
3- O disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de na impugnação judicial o impugnante demonstrar erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada,"

OOOO. No caso em apreço não tem aplicação o nº 2, na medida em que a aplicação de métodos indirectos não foi justificada pela AT em nenhum dos factos subsumidos no referido nº 2, pelo que nos termos do nº 1, reanalisada a prova produzida, este Tribunal de recurso, se acaso não anular a sentença por entender que ficou cabalmente demonstrado não existirem fundamentos para aplicação de métodos indirectos, irá certamente concluir pela dúvida fundada sobre a existência e a quantificação do facto tributário, pelo que determinará a revogação da sentença e a anulação do acto impugnado, fazendo assim justiça.

PPPP. Assim, de todo o exposto, podemos concluir, que com toda a prova produzida, a Impugnante pôs em causa o valor probatório do relatório de inspecção e que, para além disso, mesmo que não o tivesse logrado fazer de forma directa, demonstrando como fez, que a AT não tinha fundamento para aplicar métodos indirectos, pois havia uma justificação para a diminuição do valor das vendas de produto acabado de 2008 para 2009, sempre se dirá que conseguiu gerar fundadas dúvidas sobre a quantificação do rendimento tributável apurado pela AT, contrariamente ao que afirma a sentença recorrida.
Termos em que o presente recurso deverá ser julgado procedente com todas as consequências legais, assim se fazendo justiça.”.

* * *
A Recorrida não apresentou contra-alegações.
* *
O Exmº. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, a questão controvertida consiste em aferir se a sentença enferma de:
i) Nulidade por falta de fundamentação da decisão da matéria de facto, dado a sentença ter procedido à transcrição do relatório inspectivo;
ii) Nulidade por falta de valoração crítica da prova;
iii) Erro de julgamento quanto à determinação da matéria de facto, no que respeita à correcção por métodos indirectos;
iv) Erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto e quanto à aplicação do direito no que respeita ao preenchimento dos pressupostos do recurso aos métodos indirectos;
v) Erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto e quanto à aplicação do direito no que respeita à quantificação da matéria colectável através de métodos indirectos.
* *

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com relevância para a decisão da causa resultaram provados os seguintes factos:

1) A Impugnante é uma sociedade comercial registada para o exercício da atividade de fabricação de telhas CAE 023322, que desde 2007 integra o grupo belga ETEX (pág. 5 do relatório de inspeção tributária a fls. 11 do p. a. corroborado pelas declarações de D..... e pelos depoimentos de F......).

2) A Impugnante foi submetida a ação inspetiva a coberto da ordem de serviço nº OI201202156 de 8/10/2012 de natureza externa, de âmbito geral, incidindo sobre os exercícios de 2009 e 2010 (pág. 4 e 5 do relatório de inspeção tributária a fls. 10 e 11 do p. a.).

3) O software de gestão e de contabilidade utilizado até 2009 pela Impugnante foi o software “Primavera” e a partir de 2010 o sistema utilizado foi o “SAP” (pág. 5 do relatório de inspeção tributária a fls. 11 do p. a. corroborado pelo depoimento de S...... e declarações de D.....).

4) O software “Primavera” não permite apurar os custos de produção de forma desagregada enquanto o software “SAP” permite tal apuramento (depoimentos de D....., S......).

5) No exercício de 2010 a Impugnante contabilizava as matérias primas na conta –“matérias primas” na qual incluía os custos com os fornecedores e na conta “matérias primas IC” já sem custos de fornecedores (depoimento de C.....).

6) O plano de contas da Impugnante, no exercício de 2010, não coincidia com o plano de contas publicado pela Portaria nº 1011/2009, de 13/7 (pág. 5 do relatório de inspeção tributária a fls. 11 do p. a.).

7) A análise efetuada pelos serviços de inspeção tributária centrou-se na evolução dos custos de produção e das vendas de produtos, de 2008 a 2010, e na variação dos inventários de produtos acabados no mesmo período (pág. 20 do relatório de inspeção tributária a fls. 26 do p. a.).

8) A estrutura de custos da Impugnante mantém-se estável ao longo dos exercícios de 2008, 2009 e 2010, excetuando a rubrica das amortizações e dos custos com o pessoal que diminui substancialmente após o exercício de 2008 (pág. 22 do relatório de inspeção tributária a fls. 28 do p. a. corroborado pelos depoimentos de C..... e M......).

9) A diminuição das amortizações no valor aproximado de € 400.000,00 ficou a dever-se ao facto de algum equipamento básico se encontrar totalmente amortizado no final do exercício de 2008, sendo que os bens continuaram a contribuir para a produção da Impugnante (pág. 22 do relatório de inspeção tributária a fls. 28 do p.a.).

10) Os custos com o pessoal diminuíram entre os exercícios de 2008 e 2010 em decurso da politica de redução de custos seguida pela Impugnante (pág. 22 do relatório de inspeção tributária a fls. 28 do p. a.).

11) No exercício de 2008, a Impugnante registou uma variação de produção positiva no montante de € 304.412,60 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

12) No exercício de 2008 o inventário final de produtos acabados aumentou relativamente ao inventário inicial em € 351.886,00 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

13) No exercício de 2009, a Impugnante registou uma variação de produção negativa no montante de € 213.496,80 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

14) No exercício de 2009, o inventário final de produtos acabados diminuiu relativamente às existências iniciais em € 354.801,00 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

15) No exercício de 2009, toda a produção do ano foi vendida e foram ainda vendidos produtos produzidos em anos anteriores constantes das existências (inventários) iniciais (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

16) O valor das vendas de produtos acabados, de 2008 a 2010, é estável situando-se próximo do montante de € 11.200.000,00, exceto quanto ao exercício de 2009, no qual o valor das vendas de produtos acabados foi de € 10.200.000,00 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

17) A margem sobre o custo da venda de produtos acabados da Impugnante foi de 60,8% no exercício de 2008; 46,05% no exercício de 2009 e 62,13% no exercício de 2010 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

18) Considerando o custo de produção excluído das rúbricas de custos com valores diferentes nos vários exercícios, mas cuja diferença não produziu impacto na produção, como ocorre com as amortizações dos equipamentos que não gerando custo continuaram a operar na Impugnante, a margem sobre o custo da venda de produtos acabados da Impugnante é de 69,76% em 2008, 46,05% em 2009 e 62,13% em 2010 (pág. 23 do relatório de inspeção tributária a fls. 29 do p. a.).

19) No exercício de 2009 a composição dos produtos vendidos não se alterou (pág. 24 do relatório de inspeção tributária a fls. 30 do p. a.).

20) Em junho de 2009 a Impugnante suportou encargos com gás natural de € 121.081,52 (fls. 72 do p. a.).

21) Em julho de 2009 a Impugnante suportou encargos com gás natural de € 34.572,56 (fls. 73 do p. a.).

22) Em agosto de 2009 a Impugnante suportou encargos com gás natural de € 124.541,30 (fls. 74 do p. a.).

23) Em junho de 2010 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de € 42.539,05 (fls. 75 do p. a.).

24) Em julho de 2010 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de € 13.152,03 (fls. 76 do p. a.).

25) Em agosto de 2010 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de € 47.119,13 (fls. 77 do p. a.).

26) No mês de julho de 2009 a Impugnante teve a fábrica encerrada a fim de fazer manutenção e introdução de novas máquinas nas linhas de produção (depoimentos de P...... e S......).

27) Em 18/7/2013 foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária que consta a fls. 7 a 37 do p. a., cuja fundamentação se dá por integralmente reproduzida e da qual se extrata com relevo para os presentes autos:

“(…)

Quadro 1 - DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA AÇÃO DE INSPEÇÃO
(…)

Métodos Indiretos (2009)
Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas
Omissão de Proveitos (vendas)1.076.473,521.076.473,52
Imposto Sobre o Valor Acrescentado
Falta de liquidação de IVA 215.294,70 215.294,70

II – OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO

II – 1 CREDENCIAL E PERÍODO EM QUE DECORREU A ACÇÃO

A ação inspetiva para a qual foi emitida a Ordem de Serviço nº OI201202156, de 2012/10/08, inserida no Código de Actividade 12221019 “Controlo declarativo”, teve início em 2012/10/30, data em que foi assinada pelo sujeito passivo a referida ordem.

Nos termos das alíneas a) e b) do art.º 36º do RCPIT foi ampliado o prazo da acção de inspeção por mais três meses, com data previsível para a sua conclusão a 30-07-2012.

II – 2 MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL

A presente acção teve origem na proposta de inspecção externa efectuada quando da análise interna do processo de documentação fiscal dos períodos de 2009 e 2010.

Trata-se de uma acção geral, tendo como extensão temporal os exercícios de 2009 e 2010, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 14º do RCPIT.

II – 3 ENQUADRAMENTO FISCAL

Pela análise ao cadastro da DGCI, o sujeito passivo U..... SA, NIPC 50….., com sede em Meirinhas, freguesia de Vermoil e concelho de Pombal, CAE: 02…. – Fabricação de Telhas, iniciou a actividade em 1975-12-10.

A sociedade, desde 2007, integra o grupo ETEX, com sede na Bélgica, e tem como objeto social a fabricação de telhas cerâmicas para a construção civil.

Em 2009 a empresa passou a atuar na venda e distribuição de placas de fibrocimento para cobertura, tendo as vendas deste produto ganho expressão no total do volume de negócios da sociedade.

Enquadramento fiscal do sujeito passivo:

- IRC: regime geral de tributação

- IVA: regime normal de periodicidade mensal.

Nos exercícios de 2009 e 2010 a U..... era detida a 100% pela EBM PORTUGAL, SGPS, SA que por sua vez era detida pelas seguintes entidades:

- 99,96% M......, com sede no Luxemburgo;

- 00,01% International B......, com sede na Bélgica;

- 00,01%B......SA, com sede na Bélgica;

- 00,01% E......, com sede no Luxemburgo;

- 00,01% E......SA, com sede na Bélgica;

II – 4 OUTROS ELEMENTOS RELEVANTES

Durante a inspecção externa realizada aos períodos de 2009 e 2010, analisámos a contabilidade da sociedade tendo-se verificado uma alteração no software de gestão e de contabilidade utilizado até 2009 (software “Primavera”) e a partir de 2010 o sistema utilizado é o “SAP”.

Deparamos com muita dificuldade de análise e tratamento de dados a partir de 2010, pois o plano de contas da empresa não coincide com o plano de contas publicado pela Portaria nº 1011/2009, de 13/07, instrumento contabilístico de aplicação obrigatória para as empresas sujeitas ao SNC – Sistema de Normalização Contabilístico, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2010. Conforme nos foi sendo referido, o plano de contas utilizado, era o plano de contas definido para o grupo económico internacional onde a empresa está inserida, E…...

A não obediência ao plano de contas em SNC traduziu-se ainda em vários erros no preenchimento de dados da IES (Informação Empresarial Simplificada), do período de 2010.

Para além das dificuldades já citadas, decorrentes do plano de contas utilizado, também o software de gestão/contabilidade utilizado limitou, no exercício de 2010, o recurso ao SAFT (Standard Audit File for Tax – ficheiros normalizados de exportação de dados, criado pela Portaria 321-A/2007, de 26/03) no sentido de comprovação dos gastos, pois na grande maioria dos lançamentos contabilísticos não constava a indicação da localização em arquivo do documento que tutelava esse gasto ou perda. No entanto, com a colaboração da Técnica Oficial de Contas da sociedade tentamos superar as dificuldades encontradas e embora com maior morosidade foi possível ultrapassar a maioria dos obstáculos.

Verificou-se ainda que no exercício de 2010, foram emitidas faturas de uma série não incluída no SAFT de faturação. As faturas em causa são da série “Fatura Nº 15********”.

Desta série chegaram ao nosso conhecimento faturas referentes à venda de imobilizado, que foram registadas numa conta de rendimentos, não implicando correcções para efeitos de imposto sobre o rendimento - IRC.

(…)

IV – MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

A actividade da sociedade U..... SA consiste na produção e comercialização de telhas e o seu volume de negócios é composto por vendas de produtos (essencialmente telhas de barro e acessórios relacionados), que representa cerca de 90% do valor total do volume de negócios, e por vendas de mercadorias, designadamente coberturas.

A análise efetuada centrou-se na evolução dos custos de produção e das vendas de produtos, de 2008 a 2010, e na variação dos inventários de produtos acabados no mesmo período, tendo em particular suscitado dúvidas a diminuição do valor de vendas de produtos no exercício de 2009.

Nos quadros seguintes resumem-se os dados para as variáveis atrás referidas (custo de produção de produtos acabados, existências iniciais e finais, custo da venda dos produtos e valor das vendas), nos exercícios de 2008, 2009 e 2010.

Quadro 16 - ANÁLISE VENDAS/CUSTOS DE PRODUÇÃO /CUSTOS DE VENDA/EXISTÊNCIAS

Quadro 17 – Variação da Produção

Para uma melhor compreensão dos factos, analise-se a composição dos custos da produção entre 2008 e 2010, conforme elementos disponibilizados pelo sujeito passivo.

Quadro 18

Os dados constantes do quadro anterior foram retirados da contabilidade da sociedade, nomeadamente dos balancetes e SAFT.

Relativamente aos exercícios de 2008 e 2009 a empresa disponibilizou um quadro resumo dos custos de produção, que se junta em anexo 6.

O exercício de 2008 embora fora do âmbito da inspecção, foi aqui inserido para análise evolutiva e comparativa, por sugestão do sujeito passivo, e que de facto contribui para a consistência da análise.

Os dados referentes ao exercício de 2008, foram por nós confirmados através do balancete analítico do exercício de 2008 e da IES, validando-se todos os itens apresentados no quadro anterior à excepção do valor das amortizações o qual foi corrigido.

Da análise dos quadros anteriores, podemos concluir que:

 A estrutura de custos mantêm-se estável ao longo dos exercícios analisados, exceptuando a rubrica das amortizações e dos custos com o pessoal que diminui substancialmente após o exercício de 2008;

 A diminuição das amortizações no valor aproximado de € 400.000 ficou a dever-se ao facto de algum equipamento básico se encontrar totalmente amortizado no final do exercício de 2008, ainda que os bens tenham continuado activos na sociedade e continuado a contribuir para a produção, uma vez que não foi efectuado o abate dos referidos equipamentos;

 De acordo com o mapa de amortizações do exercício de 2008, o equipamento básico que se encontra nessa situação é o seguinte:

Quadro 19

O equipamento mencionado no quadro anterior permaneceu na empresa durante os exercícios analisados;

 Relativamente aos custos com o pessoal verificou-se também uma diminuição desta rubrica motivada pela política da empresa de redução de custos diminuindo o número médio de empregados, conforme quadro que se segue;
Quadro 20 - Número de funcionários

      2008
      2009
2010
      Administração
      31
      39
      Produção
      86
      92
      Out.sectores
      26
      7
Total
143
138
137

NOTA: Para o exercício de 2010, não dispomos de dados distribuídos por função.

 No exercício de 2008 registou-se uma Variação de Produção positiva no montante de € 304.412,60, ou seja, neste exercício o inventário final de produtos acabados aumentou relativamente ao inventário inicial em € 351.886,00;

 No exercício de 2009 registou-se uma Variação de Produção negativa no montante de € 213.496,80, ou seja, neste exercício o inventário final de produtos acabados diminui relativamente às existências iniciais em € 354.801,00;

 O que significa que, no exercício de 2009, toda a produção do ano foi vendida e foram ainda vendidos produtos produzidos em anos anteriores constantes das existências (inventários) iniciais;

 O valor das Vendas de Produtos Acabados desde o exercício de 2008 até 2011 é muito estável situando-se próximo do montante de € 11.200.000,00 à excepção do exercício de 2009 que foi de apenas € 10.200.000,00 o que representa uma diminuição em termos absolutos de aproximadamente € 1.000.000,00 e em termos relativos cerca de 9%;

 Analisando os valores do quadro 15 não se encontra justificação para a diminuição do valor das vendas no exercício de 2009 tendo em conta quer os valores das entradas de produção quer ainda como fator agravante a redução do inventário final;

 A margem sobre o custo da venda de produtos acabados de acordo com a informação obtida (ver quadro 15) foi de 60,8% no exercício de 2008; 46,05% no exercício de 2009 e 62,13% no exercício de 2010;

 No entanto, por forma a efetuar uma análise comparativa mais consistente ao longo dos exercícios consideramos o custo de produção excluindo as rubricas de custos com valores diferentes nos vários exercícios mas cuja diferença não produziu impacto na produção, como é o caso das amortizações, uma vez que os equipamentos apesar de não gerarem este tipo de custo continuam a ser utilizados na produção. Assim as margens obtidas seriam as seguintes:

Quadro 21

Após a constatação da situação descrita anteriormente e por não ter sido encontrada qualquer justificação para tal redução no montante das vendas do exercício de 2009, por via da análise da estrutura de custos, analisamos a estrutura das vendas de produtos acabados, nos exercícios analisados, mais detalhadamente o exercício de 2009 e o exercício de 2010, para os quais possuímos dados que nos permitiram concluir pela análise das referências e descrição dos produtos vendidos que a composição do cabaz de produtos vendidos não se alterou e o mesmo aconteceu com o preço de venda.

Quadro 22 - Resumo dos Produtos mais vendidos nos exercícios de 2009 e 2010

Quadro 23

Nota: De acordo com o estabelecido na Tabela de Preços, os preços de 2009 tem um acréscimo de 3% caso sejam vendidos à unidade ou em paletes incompletas, o mesmo não acontece em 2010, pelo que se conclui que os preços na prática não sofreram alteração.

Tendo em conta a análise contabilística efetuada e os esclarecimentos solicitados na empresa, não foi encontrada justificação para o decréscimo do valor das vendas de produtos no exercício de 2009.

Estabelece o artigo 88º da Lei Geral Tributária – A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria coletável para efeitos de aplicação de métodos indiretos, referida na alínea b) do artigo 87º da LGT, pode resultar das seguintes anomalias e incorrecções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:

d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de fatos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.

V – CRITÉRIOS DE CÁLCULO DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Na impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, propomos a aplicação de métodos indirectos nos termos da alínea b) do art.º 87 da Lei Geral Tributária (LGT) e do art. 52º (atual art. 57º) do CIRC, para o exercício de 2009.

Quadro 24

Tendo em conta o atrás referido e o facto da margem sobre o custo de venda dos produtos acabados [(Vendas P.Acabados - Custo Venda P. Acabado) / Custo Venda do P.Acabado] declarada pelo sujeito passivo para os exercícios de 2008, 60,80% e no exercício de 2011, 62,13%, foi utilizada a margem de 61,47% [(0,6080+0,6213)/2 média aritmética das margens de 2008 e 2011], para determinação do valor das vendas de produto acabado.

As vendas corrigidas de 2009 foram assim apuradas: 1,6147 x 6 982 267,00 (Custo da Venda P. Acabado 2009) = 11.274.266,52€ (valor das vendas de P. Acabado de 2009).

Nos termos dos art.º 87 e 88 da LGT e dos art.ºs 20º e 57º do CIRC propomos a correcção aos proveitos do exercício de 2009 no montante de € 1.076.473,52, que resulta numa correcção ao lucro tributável de 2009 no mesmo montante.

Quadro 25

A venda de produtos é uma operação sujeita a IVA nos termos dos art.º 1º, 2º e 3º do CIVA.

Assim de acordo com os art.º(s)16º,18º do CIVA, é devido IVA no montante de € 215.294,70, assim determinado € 1.076.473,52 x 20%(taxa normal de IVA em vigor à data dos fatos) = € 215.294,70.

Quadro 26

Correção Venda de Produtos 1.076.473,52 €

Falta de Liquidação de IVA 215.294,70 €

(…)

IX – DIREITO DE AUDIÇÃO

Para efeitos de direito de audição foi concedido o prazo de 15 dias (previsto no nº 6 do artigo 60º da LGT e nº 2 do art.º 60º do RCPIT).

Foi recebido no dia 3 de Julho de 2013 nestes serviços, o direito de audição prévia, nos termos do qual é referido que após a análise do Projecto de Relatório a exponente optou por regularizar voluntariamente as irregularidades detectadas pelos Serviços de Inspecção Tributária relativamente às seguintes correcções:

a) IMT respeitante ao exercício de 2009. (Ponto III.3)

b) IVA relativo ao exercício de 2010, tendo para o efeito apresentado declaração de substituição para o período de Janeiro de 2010 e efetuado o pagamento do imposto em falta. (Ponto III.2)

c) IRC referente ao exercício de 2010, apenas quanto à correcção da provisão de bonús anual (deduzida indevidamente no campo 764 do Q07 da declaração periódica de rendimentos de IRC Modelo 22) e à correcção relativa à provisão de rappel (que deveria ter sido acrescida no campo 721 do Q07 da declaração periódica de rendimentos de IRC Modelo 22 – Ponto III.1.2.B). Para o efeito, a Exponente apresentou uma declaração de substituição e procedeu ao pagamento do imposto apurado.

Relativamente às correcções aceites, no decurso do prazo para o exercício do direito de audição prévia, a Exponente apresentou os competentes pedidos de redução de coima.

Relativamente às correcções que não são aceites, a saber, quanto ao exercício de 2009 a correcção do IRC relativa aos ajustamentos de dívidas a receber não dedutíveis e a correcção do IRC e IVA referente aos métodos indirectos e quanto ao exercício de 2010 a correcção do IRC relativa ao ajustamento de dívidas de clientes e ao apuramento do custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas, a exponente refere que as mesmas não serão objecto de audição prévia, serão oportunamente objecto de contestação.

A exponente apenas exerce o seu direito de audição prévia quanto à correcção do IRC do exercício de 2009, relativa às provisões não dedutíveis, no valor de € 60.235,03 e ao benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho, no valor de € 67.968,30.

(…)”

28) A Impugnante foi notificada, na pessoa do seu legal representante, do relatório de inspeção tributária, através do ofício datado de 31/7/2013, enviado sob registo RD216265173PT, cujo aviso de receção se encontra assinado em 1/8/2013 (fls. 1 a 3 do p. a.).

29) A Impugnante foi notificada, na pessoa do seu mandatário, do relatório de inspeção tributária, através do ofício datado de 31/7/2013, enviado sob registo RD216265187PT, cujo aviso de receção se encontra assinado em 1/8/2013 (fls. 4 a 6 do p. a.).

30) Em 2/9/2013 deu entrada na Direção de Finanças de Leiria o pedido de revisão apresentado pela aqui Impugnante com os fundamentos que constam a fls. 54 a 65 do p. a. e que se dão por reproduzidos (fls. 53 do p. a. volume respeitante ao procedimento de revisão – doravante p. a. procedimento de revisão).

31) Em 29/10/2013, os peritos nomeados no procedimento de revisão em causa nestes autos, reuniram tendo declarado o que se encontra registado na respetiva ata que consta a fls. 9 e 10 do p. a. procedimento de revisão e da qual se extrata por relevante para os presentes autos:

“(…)

l. O perito da reclamante começou por discordar dos valores fixados solicitando, em conclusão, a anulação dos mesmos, justificando tal pretensão com os argumentos invocados no requerimento de pedido de revisão, que referiu manter na íntegra, e que são resumidamente os seguintes:

1 - Motivos invocados para aplicação de métodos indirectos

O decréscimo de proveitos no exercício de 2009, de cerca de 9% quando comparado com os anos de 2008 e 2010 não se deve a omissão de proveitos mas ao decréscimo do valor das vendas da requerente ao aumento dos custos de produção no ano de 2009 e à redução da produção, o que obrigou ao encerramento da fábrica durante um mês, como a seguir se expõe.

a) Falta de comparabilidade dos dados referentes a 2009 e 2010 — a alteração de software no início do ano de 2010 não garante a comparabilidade dos dados já que a reclamante passou a utilizar outro software, igual ao utilizado pelo grupo económico internacional onde está inserida

Se ajustarmos os dados de 2010 aos critérios de 2009 obtemos. para 2010, um total de custos de produção de €7.424.310,93, multo superior ao valor apurado pela IT que é de €6.729.94,00 demonstrando-se assim que a alteração de software impede a comparabilidade dos dados.

b) Paragem da fábrica no mês de Julho de 2009 — A fábrica parou durante o mês de Julho de 2009, conforme informamos a IT durante a inspecção, e conforme se comprova pela redução dos consumos de electricidade e gás natural, cu]as fotocópias das facturas dos fornecedores que se juntam

Neste mês, aproveitámos a paragem da fábrica para "proceder à reparação e manutenção de máquinas e fornos" constatando-se que, além de mantermos os custos fixos, aumentamos os encargos de manutenção, o que implica o aumento dos custos de produção, o que inviabiliza a premissa seguida peia AT que considerou que a estrutura de custos se mantém estável, com excepção da rubrica de amortizações e de custos com o pessoal que diminuiu substancialmente após o exercício de 2008

c) Erro no cálculo do custo de produção — a IT considerou a totalidade dos CUSTOS de produção no ano de 2009, que são o produto acabado, semi-acabado e pasta, e no ano de 2010, apenas considerou os custos de produção do produto acabado.

Ora, a produção de produto semi-acabado e a produção de pasta acarretam custos de produção que deveriam ter sido considerados em todos os anos para permitir que os dados sejam comparáveis.

d) Alteração dos produtos vendidos e da tipologia do cliente — O perito da reclamante acrescentou que a tipologia de produtos comercializados foi alterada em 2009, passando a comercializar-se mais os produtos com menor valor acrescentado, como a telha natural que não apresenta nenhum tipo de acabamento especial.

Em simultâneo as vendas foram direccionadas para os clientes grossistas, em detrimento dos retalhistas, a quem foram concedidos descontos maiores designadamente pelo facto de adquirirem quantidades superiores,

A alteração desta tipologia de produto comercializada e de cliente gera, por si só, uma redução na margem bruta praticada

e) Demonstração do CMVMC e da variação da produção de acordo com o programa informático utilizado pela reclamante — a reclamante identificou cada uma das contas do programa SAP utilizadas para o correcto apuramento do CMVMC e da variação da produção.

3. Conclusão

Em conclusão o perito da reclamante afirmou não existirem fundamentos para aplicação de métodos indirectos uma vez que todos os invocados no relatório da IT foram devidamente justificados pelo que as correcções devem ser anuladas.

II. O Perito Independente acrescentou:

Pela análise financeira e comparativa feita ás demonstrações financeiras e atendendo á justificação apresentada pela reclamante no que concerne à paragem da produção durante o mês de Julho e à alteração na tipologia do produto e do cliente entende que não há justificação para a aplicação de métodos indirectos no apuramento do resultado fiscal do ano de 2009

Acrescentou que a análise aos custos de produção apresentados pela reclamante são fidedignos verificando que os custos unitários de produção conforme apresentados pela reclamante indicam que os custos unitários de produção não têm alterações significativas o que valida os rácios apresentados pela empresa nas suas demonstrações financeiras.

III. Por sua vez, o perito da Fazenda Pública, face á análise por si efectuada ao relatório da inspecção tributária (relatório da IT) e ao requerimento de pedido de revisão da matéria colectável apresentado pelo sujeito passivo, referiu não assistir razão ao reclamante pelo seguinte:

1 - Motivos e factos que implicaram o recurso a métodos indirectos

O motivo invocado para aplicação de métodos indirectos, conforme prevê o artigo 87º b) conjugado com o artigo 88º, a) e d) da Lei Geral Tributária (LGT) foi a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de IVA e IRC.

Tal impossibilidade deveu-se aos seguintes factos

a) Paragem da fábrica no mês de Julho de 2009 — A reclamante refere que a produção esteve parada durante o mês de Julho de 2009, como se comprova pelos consumos de electricidade e gás natural e que durante este mês procederam à reparação e manutenção de máquinas e fornos o que implicou (conforme alegado pela reclamante) um aumento dos custos de manutenção os quais, associados à manutenção dos custos fixos, originaram um aumento dos custos de produção

Note-se, porém, que os custos variáveis diminuíram devido à paragem da produção durante o mês de Julho de 2009. Se analisarmos os consumos de electricidade e de gás natural, verificamos que houve uma redução no consumo em Julho de 2009 de mais de €150.000.00 (de acordo com os valores apresentados pela reclamante no mapa incluído no parágrafo 230) quando comparado com o consumo médio dos restantes meses do ano. Ou seja, podemos afirmar que o aumento dos custos de manutenção foi pelo menos em parte, compensado com a diminuição dos custos variáveis directamente relacionados com a produção.

b) Falta de comparabilidade dos dados referentes a 2009 e 2010 / erro de cálculo do custo de produção — A reclamante alega que os dados de 2009 e 2010 não são comparáveis devido à alteração do software de contabilidade. Refere que, ajustando os dados de 2010 aos de 2009 os custos de produção de 2010 ascendem a €7.424.310,93, valor este superior ao apurado pela IT que foi de €6.729,941 ,00. Acrescenta que, relativamente ao ano de 2010, a IT não considerou os gastos suportados com a produção do produto semi-acabado e a produção de pasta.

Da análise realizada constatámos que, na contabilidade, nas subcontas da conta 61 existem duas contas correntes para matérias-primas: a conta "6120300 — Consumo matéria-prima" e a conta "612C301 — Consumo matéria-prima IC". Estas contas são movimentadas por contrapartida das contas “3310010 — Inventário matéria-prima" e “3310000 — Inventário matéria-prima IC”, respectivamente.

Depois dos esclarecimentos prestados pelo perito da reclamante foi possível perceber que as contas com a descrição “matéria-prima” apresentam os valores correspondentes à matéria prima em bruto, ou seja, reflecte a compra de matéria-prima à chegada às instalações da U....., S.A. As contas com a descrição “matéria-prima IC” correspondem à mesma matéria-prima depois de passar por um processo de limpeza de algumas impurezas, ou seja, esta conta reflecte um primeiro processo de transformação da matéria-prima adquirida

Com esta explicação o perito da fazenda pública fez uma análise aos movimentos registados nestas contas correntes constatando que a conta 331010 é movimentada a débito transferência da correspondente conta "31 — Compras" e a crédito por contrapartida da conta "6120300 — consumo de matéria-prima"

A conta 3310000 é movimentada a débito por contrapartida da conta "6129401 — CP-MP Sub. Cons." e a crédito pela conta "6120301 - Consumo matéria-prima IC Isto significa que o valor do custo de produção de 2010 apresentado pela reclamante está sobrevalorizado em €697.452,12 que corresponde ao saldo da conta 6120301 por duplicação com os dados da conta 6120300

c) Diminuição da margem bruta no ano de 2009 — Testados os preços unitários médios dos produtos mais comercializados pela reclamante constatamos que não registam alterações significativas no biénio 2009-2010. Os produtos testados representam cerca de 50% do volume de negócios declarado os resultados obtidos são os seguintes:

Da análise realizada ao relatório da IT, ao requerimento do pedida de revisão da matéria tributável, e aos fundamentos apresentados e discutidos nas reuniões realizada, mantêm-se os fundamentos para a utilização de métodos indirectos designadamente a diminuição injustificada da margem bruta no ano de 2009 dado que os custos de produção e os preços de venda praticados em 2009 e 2010 se mantêm sem alterações significativas.

(…)”

32) Em 31/10/2013 foi elaborado o parecer do perito da Fazenda Pública, cuja fundamentação consta a fls. 11 e 12 do p. a. que se dá por reproduzida.

33) Em 4/11/2013 deu entrada na Direção de Finanças o parecer do perito independente que consta a fls. 15 e 16 do p. a. procedimento de revisão, cuja fundamentação se dá por integralmente reproduzida.

34) Em 4/11/2013 deu entrada na Direção de Finanças o parecer do perito do

contribuinte que consta a fls. 13 e 14 do p. a. procedimento de revisão, cuja fundamentação se dá por integralmente reproduzida.

35) A perita da Autoridade Tributária, quando questionada pela perita da Impugnante sobre uma possível proposta de acordo, propôs a redução da matéria tributável à perita da Impugnante em montante não concretamente apurado (depoimentos de S...... e M......).

36) Em virtude da falta de acordo entre os peritos, por despacho datado de 5/11/2013, o Diretor de Finanças da Direção de Finanças de Leiria fixou a matéria tributável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas do exercício de 2009 em € 1.630.209,47 e o Imposto sobre o Valor Acrescentado – imposto em falta, no montante de € 215.297,70 (fls. 6 do p. a. procedimento de revisão)

37) A Impugnante foi notificada, na pessoa do seu mandatário, da decisão do Diretor de Finanças da Direção de Finanças de Leiria mencionada no ponto precedente, por ofício datado de 5/11/2013 enviado sob registo RF002225559PT, cujo aviso de receção se mostra assinado em 6/11/2013 (fls. 2 e 3 do p. a. procedimento de revisão).

38) Em decorrência da decisão proferida no procedimento de revisão mencionada em 36), a Autoridade Tributária emitiu a liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado n.º 13109351 relativa ao período 09/12, no montante de € 215.294,68 e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 13109352, no montante de € 29.539,61, com data limite de pagamento voluntário até 31/1/2014, perfazendo o montante global de € 244.834,29 (fls. 33 e 34 do processo físico).

39) A presente impugnação judicial foi remetida a Tribunal por correio sob registo ED017783664PT datado de 28/4/2014 (contracapa do volume I do processo físico).

B) FACTOS NÃO PROVADOS

Nada mais se provou com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir e o pedido.


*

Os factos elencados em 1) a 3); 6) a 25) e 27) a 39) da factualidade assente resultaram da análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente das informações oficiais, documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada número do probatório, sendo indicado expressamente em cada número o(s) documento(s) que contribuíram para a extração de tal facto, através da indicação das folhas do processo físico ou do processo administrativo em que o mesmo se encontra.

A valoração dos documentos atendeu ao seu valor probatório, ao seu teor e aos factos que os mesmos comprovam, em si mesmos ou em conjugação com os demais, sendo de salientar que as informações oficiais, fazem fé, quando devidamente fundamentadas, como sucede nos presentes autos (cfr. artigos 76º, n.º 1 da Lei Geral Tributária e 115º, n.º 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário).

Quanto aos factos elencados em 1), 3), 4), 5), 8) e 26), a convicção do Tribunal baseou-se na prova testemunhal produzida e nas declarações de parte, tendo sido devidamente ponderadas e valoradas nos termos que se passam a descrever:

Declarações de parte:

As declarações de parte prestadas por D....., gerente da Impugnante e diretor financeiro, foram valoradas quanto ao enquadramento e desenvolvimento da atividade da Impugnante e da integração no grupo ETEX, assim como, a descrição e funcionamento dos programas de gestão e contabilidade adotados pela Impugnante.

A parte declarou que a Impugnante se dedica ao fabrico de telhas e que desde 2007 passou a integrar o grupo belga ETEX.

O declarante expôs o modo de funcionamento dos dois softwares de gestão e contabilidade no apuramento dos custos de produção, declarando que no programa “SAP” o apuramento dos custos por produto é mais detalhado do que o permitido pelo programa “Primavera”, no qual o apuramento era efetuado de acordo com o peso relativo de cada produto. Tendo o mesmo referido ainda que, em termos globais, os resultados são iguais, apenas diferindo se se pretender apurar o custo por produto.

Quanto ao demais, nomeadamente quanto ao modo de contabilização dos custos das matérias-primas, estas declarações não foram valoradas pelo Tribunal dada a falta de rigor demonstrada nesta explicitação que assumiu uma forma simplista, declarando que na contabilidade existe o balanceamento pelo que se sai de uma conta entra noutra, o que não se mostrou suficiente para pôr em causa as conclusões ínsitas no relatório de inspeção tributária.

Prova testemunhal:

A testemunha F......, diretor comercial, funcionário da Impugnante há 34 anos, fez um enquadramento da evolução comercial da Impugnante desde 2002 até à atualidade.

Este testemunho não foi valorado pelo Tribunal, à exceção da descrição da atividade a que a Impugnante se dedica, por não relevar para a matéria em discussão nos presentes autos. Por outro lado, o depoimento desta testemunha, mostrou-se muito disperso e pouco concreto, não sendo de forma alguma suficiente para pôr em causa as conclusões do relatório de inspeção tributária quanto à variação das vendas e dos preços de venda praticados pela Impugnante, porquanto apesar da testemunha ter referido a incursão da Impugnante no mercado externo e a falta de encomendas, a verdade é que o fez de forma pouco circunstanciada, sem que tal argumento resulte refletido nas próprias alegações da Impugnante que, também de forma genérica se limita a referir no ponto 19 da sua petição inicial que houve uma descida das vendas no ano de 2009.

Por seu turno, a testemunha S......, técnica oficial de contas da Impugnante desde 2008, prestou um depoimento isento e credível declarou que acompanhou a inspeção à Impugnante, explicou o funcionamento dos dois softwares de gestão e contabilidade da Impugnante.

A testemunha declarou ainda que a fábrica esteve encerrada em 2009 e que por isso a produção diminuiu.

Tendo sido perita nomeada pela Impugnante no procedimento de revisão declarou que a perita da Fazenda Pública lhe propôs uma redução da matéria tributável.

No demais declarado, este depoimento não assumiu capacidade de pôr em causa a prova documental junta aos autos, nomeadamente quanto ao decréscimo das vendas em 2009, na medida em que o mesmo se mostrou generalista e pouco concreto e ainda pelo facto de tais circunstâncias não estarem refletidas na contabilidade, especificamente nos movimentos das contas relativas a cada um dos produtos vendidos, assim como na tabela de preços da Impugnante, elementos usados pelos serviços de inspeção tributária a fim de aferir da constância nos produtos vendidos e nos respetivos preços.

Relativamente à testemunha P......, perito independente no procedimento de revisão, prestou um depoimento isento e credível, limitando-se a expor as conclusões a que chegou no procedimento de revisão.

A testemunha declarou que estando as contas da Impugnante auditadas sem reservas não seria expectável que não tivesse tudo corretamente contabilizado e declarado, o que, é do conhecimento comum, não se encontra correlacionado e nessa medida este testemunho não foi valorado por se encontrar condicionado por tal premissa.

Quanto ao depoimento de P......, engenheiro a exercer funções na Impugnante, este mostrou-se credível e isento.

A testemunha declarou que, desde o final de junho de 2009 até ao final de julho de 2009, a fábrica da Impugnante esteve encerrada para manutenção e com a finalidade de introduzir algumas máquinas na linha de produção. Disse ainda a testemunha que apenas prestaram serviço, neste período, cerca de seis trabalhadores para proceder às limpezas necessárias.

Por fim, a mesma testemunha explicitou a forma de laboração da Impugnante bem como o processo produtivo dos produtos por esta produzidos.

A testemunha C....., inspetora tributária responsável pelo procedimento de inspeção aqui em causa explicitou a forma de contabilização das matérias-primas pela Impugnante, de acordo com o que apurou na análise à contabilidade desta e confirmou, tal como concluiu no relatório de inspeção tributária, que a estrutura de custos da Impugnante se manteve estável nos exercícios de 2008 a 2010.

Por fim a testemunha M......, perita da Autoridade Tributária no procedimento de revisão, confirmou as conclusões a que chegou nesse procedimento e que constam da ata da última reunião.

Mais, a testemunha declarou que, a fim de obter um acordo no procedimento de revisão, propôs a redução da matéria tributável fixada aquando da ação inspetiva.”.


* * *
A Recorrente invoca erro de escrita nos pontos 23, 24 e 25 do probatório pedindo sejam corrigidos, no sentido de se alterar o ano de 2010 para 2009, pois os valores aí referidos são respeitantes a facturas de 2009 e não de 2010.

Compulsados os autos, em especial os documentos que sustentam a prova de tais documentos, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 281º do CPPT, por estarem documentalmente provados e serem pertinentes para a boa decisão da causa e das questões colocadas em recurso, acorda-se em corrigir o probatório nos seguintes termos:
"23) Em junho de 2009 a Impugnante suportou encargos com a eletricidade de € 42.539,05 (documentos 13 e 14 da p.i.).
24) Em julho de 2009 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de € 13.152,03 (documentos 13 e 14 da p.i.).
25) Em agosto de 2009 a Impugnante suportou encargos com eletricidade de €
47.119,13 (documentos 13 e 14 da p.i.).".
*
Considerando o disposto no art.° 640.° do CPC, aplicável ex vi do art. 281º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto caracteriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de discordância com tal decisão.

O art. 640º do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, consagra que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos nºs 1 e 2 aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.° 2 do artigo 636°."

Na verdade não basta invocar que determinados factos não deveriam ter sido dado como provados para que possamos julgar minimamente cumpridos os ónus previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, que exige não apenas a indicação dos factos alegadamente mal apurados (como provados, não provados ou impertinentes) mas, também no mínimo, o sentido ou redacção com que deviam constar no probatório.

Quanto ao julgamento da matéria de facto, a Recorrente vem requerer o aditamento dos seguintes factos:
40) Apesar do sistema de contabilidade utilizado pela Impugnante em 2009 (Primavera) ser diferente do sistema utilizado em 2010 (SAP), em 2009 a Impugnante conseguia apurar de forma fiel os seus custos com a produção, apesar de o fazer através de uma tabela de Excel e não directamente através do sistema.”
“41) A forma de cálculo dos custos de produção utilizada pela AT não foi idêntica em todos os exercícios inspecionados, tendo nuns sido consideradas todas as matérias primas e noutros apenas parte das matérias primas.” (cfr. conclusão EE) das alegações).

Vejamos.

Atento o probatório fixado na sentença recorrida verifica-se que os factos que contam no ponto 40) a aditar são redundantes porquanto os mesmos já constam dos pontos 3 e 4 do probatório, a saber, a existência do sistema Primavera utilizado pela impugnante em 2009 e o sistema SAP utilizado em 2010. No demais o teor do ponto 40 tem carácter conclusivo, não sendo aceite.

Da mesma forma o ponto 41), é igualmente redundante relativamente aos factos enunciados nos pontos 3 e 4 do probatório. Por outro lado a prova produzida nos autos não permite confirmar a afirmação em causa, para além do que consta do acervo probatório. Em relação à prova testemunhal ouvida, desprovida do cruzamento com mais elementos documentais, não permite sustentar as asserções em apreço.

Vem ainda a Recorrente requerer seja dado como provado o seguinte facto:
35) Na reunião de peritos e a fim de obter um acordo, a perita da Autoridade Tributária propôs a redução da matéria tributável à perita da Impugnante, para o montante de €676.473,52, que a perita da Impugnante não aceitou, por desconhecer a fórmula de cálculo para a AT chegar a esse montante e por considerar que aceitar esse acordo seria anuir quanto à existência de fundamentos para a aplicação dos métodos indirectos (Cfr. depoimentos de S......, M...... e P...... e laudo da perita do contribuinte, junto como documento n.º 11 da petição inicial e constante de fls.89 e 90 do PAT, apenso aos autos por ter sido impossível à Fazenda Pública fazê-lo através do SITAF ).” (cfr. conclusão RR) das suas alegações).

Mais requer a alteração da redacção do ponto 26) do probatório no seguinte teor:
26) No mês de julho de 2009 a Impugnante teve a fábrica encerrada, a fim de fazer manutenção e introdução de novas máquinas nas linhas de produção, e de reduzir a produção e escoar o stock existente, atendendo ao decréscimo nas vendas que se fazia sentir (cfr. depoimentos de P......, S...... e laudo do perito do contribuinte junto como documento n.º 11 da P.I.)” (cfr. conclusão CCC) das alegações de recurso).

Apreciando.

Quanto ao facto 35) ora proposto pela Recorrente, já consta do ponto 35) do probatório que “A perita da Autoridade Tributária, quando questionada pela perita da Impugnante sobre uma possível proposta de acordo, propôs a redução da matéria tributável à perita da Impugnante em montante não concretamente apuradosendo que quanto ao demais, os elementos constantes dos autos não permitem assumir a asserção que a Recorrente ora pretende seja dada como provada, porquanto nem a prova documental nem a prova testemunhal ouvida permitem confirmar tais factos.

Prosseguindo.

A alteração que a Recorrente pretende efectuar ao ponto 26 no sentido de aditar ao mesmo a expressão “e de reduzir a produção e escoar o stock existente, atendendo ao decréscimo nas vendas que se fazia sentir”, não pode ser aceite porquanto também quanto à factualidade que se pretende aditar, não existem elementos nos autos (prova documental e testemunhal ouvida) que permita provar tais factos.

Por tudo o que vem exposto improcede o alegado erro de julgamento da matéria de facto.

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria foi julgada improcedente a impugnação judicial deduzida por U....., S.A relativamente à liquidação adicional de IVA de 2009 tendo aquele Tribunal entendido que se mostravam preenchidos os pressupostos legais para a avaliação indirecta e que a impugnante não logrou provar o erro ou excesso na quantificação da matéria colectável.

Dissente do assim decidido vem a Recorrente invocar desde logo erro de julgamento da matéria de facto, já decidida supra, bem como nulidade da sentença por falta de fundamentação na medida em que, em seu entender, a transcrição do relatório de inspecção constante do probatório não configura apreciação sobre os factos e a prova produzida, invocando ainda erro de julgamento de direito quanto à aplicação dos métodos indirectos e quanto à prova do erro na quantificação da matéria colectável.

Vejamos.

A Recorrente invoca que a transcrição do relatório inspectivo no probatório torna a especificação da matéria de facto uma actividade não fundamentada, conducente à nulidade da sentença. Mais afirma que “Não fazer qualquer apreciação sobre os factos e sobre a prova produzida e de imediato concluir que o relatório de inspecção tributária só contem factos provados, viola desde logo o princípio do contraditório, previsto no artigo 3.º do Código de Processo Civil e o princípio da distribuição do ónus da prova, previsto no artigo 74.º da LGT” (cfr. conclusão F) das suas alegações).

Desde já se afirma que não lhe assiste razão.

Nos termos do art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, constitui nulidade da sentença, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito.

A nulidade por não especificação dos fundamentos de facto e de direito abrange as situações de falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito.

A lei processual exige que a sentença esteja fundamentada, de facto e de direito, como resulta, desde logo, do disposto no art.º 123.º, n.º 2, do CPPT, bem como no art.º 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, por forma a que seja perfeitamente apreensível o itinerário cognoscitivo percorrido, fundamental para a sua adequada compreensão e eventual impugnação.

Nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 615º do CPPT, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, mas, como tem sido entendimento do Supremo Tribunal Administrativo, a nulidade da sentença, por falta de fundamentação de facto ou de direito, só abrange a falta absoluta de motivação da decisão (cfr. Ac. do STA de 06/02/2019 – proc. 249/09.0BEVIS).

No caso em apreço, compulsado o teor da decisão recorrida verifica-se que estão elencados os factos provados, deles constando, expressa e individualmente, o meio probatório que permitiu a fixação da respectiva factualidade, complementada com a expressa motivação da decisão da matéria de facto, quanto aos factos provados e não provados, com expressa enunciação e consubstanciação da motivação da matéria de facto relativamente à prova documental, às declarações de parte e à prova testemunhal.

Como se afirma no Acórdão deste TCA Sul proferido em 02/03/2023 no âmbito do processo nº 590/14.0BELRA relativo à mesma Recorrente mas ao IRC de 2009 cuja factualidade é idêntica “(…) A sentença contém também a explicitação das razões que justificam a decisão da matéria de facto e a valoração feita sobre os elementos documentais e testemunhais coligidos nos autos. Mais se refere que a sentença contém a especificação da matéria de facto através dos números a 1) a 27); destes números apenas o n.º 22, contém a transcrição de partes do Relatório de Inspecção (RIT) consideradas relevantes. Cumpre recordar que «[a]s informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos» (artigo 76.º/1, da LGT e artigo 115.º/2, do CPPT), pelo que nada tem de censurável a especificação na matéria de facto de parte do relatório inspectivo relevante para a instrução da causa, tornando assim transparente ao destinatário médio, colocado na posição da impugnante/recorrente, as razões que sustentam o acto tributário impugnado. Sem prejuízo, obviamente, do direito à alegação e prova dos factos contrários.”

Quanto à fundamentação de direito, de uma leitura atenta da decisão recorrida resultam, claramente, quais as razões que determinaram o julgamento da impugnação judicial, tendo sido elencados os normativos legais que alicerçam essa decisão.

Face ao exposto, resulta que foram analisadas, criticamente, as provas e especificados os fundamentos de facto e de direito que foram decisivos para a convicção do julgado.

Acresce que, como referido anteriormente só existe nulidade, em caso de ausência absoluta de fundamentação, ou seja, quando não se conseguir discernir qual o iter cognoscitivo que esteve na base da decisão tomada, o que não é o caso dos presentes autos.

Pelo exposto resulta claro que a sentença recorrida não padece de nulidade por falta de fundamentação porquanto estão evidenciadas as razões de facto e de direito que conduziram à decisão proferida.

Mais alega a Recorrente que o tribunal a quo não apreciou, de forma crítica e coerente a prova produzida nos autos, mas sem razão, como já referimos anteriormente, com referência à motivação da matéria de facto.

Importa apenas mencionar que “[a] análise crítica da prova é da maior importância do ponto de vista da fundamentação de facto da decisão, pois é através dela que os fundamentos e razões de ciência são exteriorizados e explicitados. A análise da prova visa, deste modo, evidenciar o modo como o tribunal valorou a prova e as razões pelas quais decidiu de determinada maneira (dando um certo facto como provado e outro como não provado ou considerando determinando elemento probatório mais relevante ou credível em detrimento de outro. // A análise crítica da prova de cada decisão deve (…) ser elaborada pelo tribunal por forma a que, através da mera leitura da mesma, qualquer pessoa (aqui se incluindo as partes, os respectivos mandatários ou os juízes do tribunal superior a julgar o recurso) possa retirar quais os concretos meios de prova em que o tribunal se baseou para considerar determinado facto como provado (ou não provado) e a razão pela qual os mesmos foram considerados credíveis e idóneos para sustentar tal facto. // (…) // Também por via da análise crítica da prova procura-se atingir um outro objectivo do dever de fundamentação: por um lado, o convencimento das partes quanto à bondade da decisão tomada pelo tribunal, através da explicitação das razões que levaram o tribunal a decidir daquele modo e não do outro, não se logrando o convencimento, pretende-se que as partes que discordam da decisão tomada e respectivos fundamentos possam contrapor os seus próprios argumentos e justificar as razões da sua discordância na fase de recurso, o que só será possível através da explicitação, por parte do tribunal, dos fundamentos por si atendidos” (cfr. Ac. TCA Sul de 02/03/2023 no proc. nº 590/14.0BELRA mencionado supra).

Atento o teor da sentença recorrida reafirma-se que a mesma contém a explicitação das razões e motivação que conduziram à decisão no que respeita à matéria de facto provada e à matéria de facto não provada. E com base nos elementos de prova, a sentença explicita as razões que sustentam o processo cognitivo e valorativo que suporta a decisão da matéria de facto.

Em face do exposto improcedem os fundamentos invocados quanto à nulidade por falta de fundamentação bem como à falta de motivação da matéria de facto.

Vejamos agora o alegado erro de julgamento quanto à aplicação dos métodos indirectos, porquanto na perspectiva da Recorrente não se mostravam preenchidos os pressupostos para a sua aplicação, face à credibilidade da sua contabilidade.

O tribunal a quo considerou que se mostravam preenchidos os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos tendo vertido na sentença recorrida a seguinte fundamentação:
“(…) cabe à Autoridade Tributária a demonstração de que os pressupostos que legitimam o recurso a avaliação da matéria tributável por métodos indiretos se verificam, consubstanciando-se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fáticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos diretos de avaliação.
Nos termos do artigo 87º, n.º 1, al. b) da Lei Geral Tributária “A avaliação indireta só pode efetuar-se em caso de: b) Impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável;”
A situação prevista na alínea b) supratranscrita, única pertinente in casu, remete-nos para o artigo 88º da Lei Geral Tributária, nos termos do qual: “A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável para efeitos da aplicação de métodos indiretos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorreções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;
b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;
c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de simulação da realidade perante a administração tributária e erros e inexatidões na contabilidade das operações não supridos no prazo legal.
d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.”.
Nesse sentido, o artigo 90º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, sob a epígrafe “Liquidação com base em presunções e métodos indiretos” remete para os artigos 87º e 89º da Lei Geral Tributária.
No caso concreto, tal como consta do relatório de inspeção tributária, a fundamentação legal para o recurso à avaliação indireta radica no disposto nos artigos 87º, alínea b) e 88º, alínea d), ambos da Lei Geral Tributária.
Entendeu, pois, a Autoridade Tributária que estava perante a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, resultante da existência de factos concretamente identificados através dos quais estava patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada. (…)
Da concatenação dos motivos elencados no relatório de inspeção tributária, nomeadamente aqueles decorrentes da análise à estrutura dos custos de produção e dos custos de venda da Impugnante, a Autoridade Tributária concluiu que aqueles factos concretamente identificados patenteavam uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada pela Impugnante.
E, nessa medida, a contabilidade da Impugnante não permitia apurar de forma direta, mediante correções meramente aritméticas o apuramento da matéria tributável.
Claro está que, como supra já se deixou dito, a avaliação indireta da matéria tributável, sendo presuntiva, exige contudo um esforço de aproximação à realidade e daí que o artigo 90º da Lei Geral Tributária, prevendo os critérios de quantificação possíveis de utilização nesta atividade presuntiva estabeleça que a determinação da matéria tributável por métodos indiretos poderá ter em conta as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros (n.º 1, al. a)).
E foi este efetivamente o critério utlizado pelos serviços de inspeção tributária, tal como se pode constatar pela leitura do relatório de inspeção tributária, onde se refere:
“Tendo em conta o atrás referido e o facto da margem sobre o custo de venda dos produtos acabados [(Vendas P.Acabados - Custo Venda P. Acabado) / Custo Venda do P.Acabado] declarada pelo sujeito passivo para os exercícios de 2008, 60,80% e no exercício de 2011, 62,13%, foi utilizada a margem de 61,47% [(0,6080+0,6213)/2 média aritmética das margens de 2008 e 20111], para determinação do valor das vendas de produto acabado.
As vendas corrigidas de 2009 foram assim apuradas: 1,6147 x 6 982 267,00 (Custo da Venda P. Acabado 2009) = 11.274.266,52€ (valor das vendas de P. Acabado de 2009).”
(…)
A Autoridade Tributária, através dos elementos disponibilizados pela Impugnante e dos esclarecimentos por esta prestados, nomeadamente analisando a evolução dos custos de produção e das vendas de produtos, de 2008 a 2010, e a variação dos inventários de produtos acabados no mesmo período, apurou uma diminuição do valor de vendas de produtos no exercício de 2009, diminuição para a qual não encontrou qualquer explicação. Da análise efetuada a Autoridade Tributária concluiu que:
a) a estrutura de custos, nos exercícios analisados se manteve estável, exceto quanto ao valor das amortizações e dos custos com pessoal que diminuiu após o exercício de 2008;
b) no exercício de 2008 a Impugnante registou uma variação de produção positiva no montante de € 304.412,60;
c) no exercício de 2009 o inventário final de produtos acabados diminuiu relativamente às existências iniciais em € 354.801,00, pelo que, a Impugnante registou uma variação de produção negativa no montante de € 213.496,80;
d) no exercício de 2009, toda a produção do ano foi vendida e foram ainda vendidos produtos produzidos em anos anteriores constantes das existências (inventários) iniciais;
e) o valor das vendas de produtos acabados desde o exercício de 2008 até 2011 apresenta-se muito estável situando-se próximo do montante de € 11.200.000,00 à exceção do exercício de 2009 que foi de apenas € 10.200.000,00 o que representa uma diminuição em termos absolutos de aproximadamente € 1.000.000,00 e em termos relativos cerca de 9%;
f) analisando os valores das vendas, os custos de produção, os custos de vendas e as existências, os serviços de inspeção tributária não encontraram justificação para a diminuição do valor das vendas no exercício de 2009 tendo em conta quer os valores das entradas de produção, quer ainda, como fator agravante, a redução do inventário final;
g) a margem sobre o custo da venda de produtos acabados foi de 60,8% no exercício de 2008; 46,05% no exercício de 2009 e 62,13% no exercício de 2010.
Contudo, com o intuito de efetuar uma análise comparativa mais consistente ao longo dos exercícios, os serviços de inspeção tributária consideraram o custo de produção excluído das rubricas de custos com valores diferentes nos vários exercícios, mas cuja diferença não produziu impacto na produção, como é o caso das amortizações, uma vez que os equipamentos apesar de não gerarem este tipo de custo continuam a ser utilizados na produção. Assim, apuraram para o exercício de 2008 uma margem sobre o custo da venda de produtos acabados de 69,79%, para 2009 de 46,05% e para 2010 de 62,13%.”.

Em face do exposto conclui-se que a sentença não padece de erro de julgamento quanto aos pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos, na verdade a AT demonstrou a falta de credibilidade da contabilidade da impugnante no exercício de 2009, no que respeita às vendas, ocorrendo omissão de proveitos, precludindo desta forma a avaliação directa da matéria colectável.

E por sua vez a Impugnante não logrou provar o alegado erro na quantificação, na medida em que, tal como decidido pelo tribunal a quo “a Impugnante atacando o critério de quantificação refere-se à alegada incomparabilidade dos exercícios de 2009 e 2010, à paragem da fábrica durante o mês de julho de 2009 e aos alegados erros de cálculo nos custos de produção do exercício de 2010, fundamentos que conhecemos no ponto precedente desta sentença, ressalvando-se ainda que uma das margens utilizadas foi a de 2008, margem à qual a Impugnante não aponta qualquer vício. Assim, e por tudo quanto já se deixou dito no ponto precedente que aqui se dá por reproduzido, tem, quanto a este vício, a impugnação que improceder, na medida em que os apontados erros, como vimos, não se verificam.
E, a tal conclusão não obsta o facto da perita da Fazenda Pública, no procedimento de revisão, ter proposto uma redução da matéria tributável, pois que, o procedimento de revisão está vocacionado para a resolução de questões técnicas e não jurídicas, sem prejuízo da apreciação das questões de direito que se refiram aos pressupostos da utilização dos métodos indiretos, «que estão profundamente conexionadas com a verificação dos respectivos pressupostos de facto» (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES E JORGE LOPES DE SOUSA, LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA E COMENTADA,
Encontro da Escrita Editora, 4.ª edição, nota 5 ao artigo 86º, pág. 746.).
Em conformidade, dispõe o artigo 92º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, que “[o] procedimento de revisão da matéria coletável assenta num debate contraditório entre o perito indicado pelo contribuinte e o perito da administração tributária, com a participação do perito independente, quando houver, e visa o estabelecimento de um acordo, nos termos da lei, quanto ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos de liquidação.”
Ora, sendo o objetivo do procedimento de revisão a discussão de questões técnicas e a obtenção de um acordo quanto à determinação da matéria tributável e ainda não resultando provados nos autos quaisquer erros quanto aos factos concretamente evidenciados no relatório de inspeção tributária que determinaram o recurso à avaliação indireta, não serve o facto de a perita da Fazenda Pública ter proposto uma qualquer redução na matéria tributável tal propósito.
Nesta conformidade, não tendo a Impugnante demonstrado que o critério utilizado
na quantificação, não respeita o artigo 90º da Lei Geral Tributária e que os valores apurados se mostram excessivos, os argumentos apresentados não têm qualquer consistência para pôr em causa a quantificação efetuada, pelo que improcede o vício invocado.”.

Importa ainda destacar que “Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º/3, da LGT).
Compulsadas as alegações da recorrente e tendo em conta o explanado no relatório inspectivo, não se apura erro ou vício no critério de quantificação da matéria colectável por métodos indirectos do exercício de 2009, em exame. O método da média aritmética da margem dos exercícios próximos (2008 e 2010) do que está em causa (2009) é adequado à aferição da realidade do sector de actividade em apreço, sendo também imposto pela lei (artigo 90.º/1/a), da LGT). Em sede de avaliação indirecta da matéria colectável, o cumprimento do ónus da prova do contribuinte implica a demonstração de factos concretos que justifiquem a asserção de que o cômputo do rendimento presumido se mostra inquinado por vícios ou erros que o tornam implausível, afastado da realidade do sector em causa. O que não sucedeu no caso em exame, atendendo às exigências de objetividade e fundamentação acolhidas.
Ao julgar no sentido referido, a sentença sob recurso não incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica” (cfr. Acórdão deste TCA de 02/03/2023 no proc. nº 590/14.0BELRA).

Quanto à fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário prevista no art. 100º do CPPT desde já afirmamos a nossa concordância com a sentença recorrida ao afirmar-se que “Assim, a Impugnante não pode limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida «a existência e quantificação do facto tributário», incumbindo-lhe o ónus probandi de tais factos sem prejuízo de o Tribunal, no uso do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também pela sua comprovação só sendo possível concluir-se pelo fundamento da dúvida mediante a
prova concludente dos mesmos. No caso, cumpria, pois, à Autoridade Tributária a prova dos requisitos legais da sua atuação – tributação por métodos indiciários – o que como supra se viu logrou fazer, e à Impugnante demonstrar a ilegalidade do ato ou, pelo menos, gerar a predita fundada dúvida quanto à quantificação do rendimento coletável (neste sentido o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 1/11/2002 proferido no processo 01015/02, publicado em www.dgsi.pt).
O que está de acordo com o artigo 342º do Código Civil e com o artigo 74° n° 1 da Lei Geral Tributária.
Assim, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Autoridade Tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque, isto tanto no procedimento como no processo judicial tributário.
Ora, resulta de tudo quanto supra já se deixou dito, que a Impugnante não logrou fazer prova da factualidade que lhe incumbia demonstrar, pelo que não pode pretender aproveitar-se do instituto da «dúvida fundada», consagrada no artigo 100º do Código de Procedimento e Processo Tributário.”.

Por tudo o que vem exposto conclui-se que a sentença recorrida não merece censura sendo de negar provimento ao recurso.

DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.
Lisboa, 20 de Abril de 2023
Luisa Soares
Vital Lopes
Susana Barreto