Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:00411/04
Secção:Contencioso Administrativo - 2º Juízo
Data do Acordão:03/31/2005
Relator:Cristina dos Santos
Descritores:INVALIDADE OSTENSIVA - ARTº 120º Nº 1 A) CPTA
PENA DISCIPLINAR A APOSENTADO
QUESTÃO NOVA
PERIGO DE INFRUTUOSIDADE
PERIGO DE RETARDAMENTO
SITUAÇÃO DE FACTO CONSUMADO
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE ACTO DISCIPLINAR
Sumário:1. A invalidade ostensiva do acto a que alude o artº 120º nº 1 a) não se traduz na convolação da tutela cautelar em tutela final urgente, meio adjectivo tipificado no artº 121º, ambos do CPTA.
2..A aposentação, como causa extintiva da relação jurídica de emprego público não implica a impossibilidade jurídica de aplicação de sanções disciplinares a funcionários aposentados, na exacta medida em que nos termos do artº 74º nº 1 do EA continuam vinculados à função pública, conservando os títulos e a categoria do cargo que exerciam e os direitos e deveres que não dependam da situação de actividade.
3. Assume a natureza de questão nova insusceptível de ser conhecida em sede de recurso, toda a matéria que extravase o elenco de fundamentos que suportam a parte decisória da sentença recorrida, delimitada esta pelo objecto do processo, com ressalva das de conhecimento oficioso.
4. O pressuposto do periculum in mora na vertente específica do perigo de infrutuosidade da sentença refere-se ao acervo de prejuízos previsíveis para o requerente cautelar em consequência da impossibilidade de execução da sentença na causa principal favorável ao direito aparente, por perda de garantias da contra-parte, nomeadamente perda de garantias jurídico-patrimoniais.
5. No perigo de retardamento, a fonte dos prejuízos que se antevêm deriva de circunstâncias inerentes ao Requerente cautelar, com fundamento em factos presentes que enunciam a incapacidade financeira da sua esfera jurídico-patrimonial para suportar de acordo com um trem de vida digno o decurso do tempo até que seja decidida em definitivo a causa principal.
6. Os prejuízos na esfera jurídica do Requerente da suspensão de eficácia do acto sancionatório, na vertente de suspensão do pagamento da pensão de aposentação pelo período de um ano, e que fundamentam a alegação do periculum in mora de retardamento têm de provir das circunstâncias que enformam a esfera jurídica do interessado e delas deve fluir a demonstração de uma situação objectiva de incapacidade económica que lhe permita aguardar pela decisão definitiva da acção principal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Carlos ......, com os sinais nos autos, inconformado com a sentença cautelar proferida pelo Mmo. Juiz do tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra dela vem recorrer, concluindo como segue:
1. Determina o artigo 120.º do CPTA, n.° 1, al. a) e b), que a providência requerida é adoptada a) quando seja evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal e/ou b) quando haja fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular nesse processo;
Da manifesta ilegalidade do acto
2. Ora, na presente providência cautelar, foi indicada a manifesta ilegalidade do acto, reportando-se nomeadamente ao relatório da Instrutora do Processo Disciplinar, mediante diversos argumentos que o Recorrente se escusa a repetir.
3. Sucede que o Tribunal recorrido não julgou evidente a manifesta ilegalidade do acto, fundamentalmente "na medida em que na deliberação Impugnada foram feitas apreciações sobre cada um dos factos constantes da nota de culpa, e confrontados com a defesa apresentada pelo requerente, concluindo a Instrutora, e a deliberação suspensa, que perante os factos provados, a sanção a aplicar era de pena de inactividade de um ano pela sua gravidade, nos termos do art. 25.º do E.D."
4. Porém, quanto à manifesta ilegalidade do acto, a autoridade administrativa apenas se pronunciou sobre a resposta à Nota de Culpa (uma vez que se limitou nesta matéria a transcrever o relatório) e já não aos argumentos aduzidos em sede de recurso, apesar de semelhantes.
5. Conclui-se que não só a autoridade administrativa não impugnou os factos invocados pelo Recorrente, como também o Tribunal os não apreciou, pois limitou-se a invocar que lhes foi dada resposta - o que não aconteceu, e ainda que tivesse acontecido implicaria sempre uma apreciação, ainda que perfunctória ou preliminar, do mérito da contestação.
6. Assim, a sentença recorrida é nula por ausência de fundamentação (art, 668.°, n.° 1, al. b) do CPC), devendo a questão ser apreciada em sede de recurso, com os fundamentos já arguidos, e com os que se seguem, nos termos do art. 149.°, n.° 1 do CPTA.
Da inconstitucionalidade do acto
7. A deliberação subjacente aos presentes autos, na parte em que aplica ao Recorrente a pena de inactividade graduada em um ano substituída pela perda da pensão por igual tempo, conforme é referido no Parecer AJ/UTL/16/2004 da Assessoria Jurídica da Reitoria, baseia-se no disposto no artigo 15.° do Estatuto Disciplinar que estabelece que "para os funcionários e agentes aposentados as penas de suspensão ou inactividade serão substituídas pela perda da pensão por igual tempo"
8. Ora, a aplicação da perda de pensão nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15.° do Estatuto Disciplinar é uma clara e insustentável violação do principio da dignidade humana contido no princípio do Estado de Direito, que resulta das disposições conjugadas dos artigos 1.°, 63.°, n.° 1 e 3 e 72.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).
9. Com efeito, a CRP, no seu artigo 63.°, n.° 1, consagra como direito fundamental o direito à segurança social, referindo no n.6 3 da mesma disposição que "o sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas es outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho" (realçado nosso), "tratando-se, como se trata, dos mais elementares direitos à sobrevivência" (J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.' edição revista, pág, 63; realçado nosso).
10. Aliás, o respeito pelo direito fundamental à segurança social, em cumprimento do disposto na CRP, encontra variadas consagrações, tanto em legislação vária, como na jurisprudência do Tribunal Constitucional.
11. Já estabelecia o artigo 45.° da Lei n.9 28/84, de 14 de Agosto, que "as prestações devidas pelas instituições de segurança social são impenhoráveis e intransmissíveis1', o artigo 68.º da Lei 17/2000, de 8 de Agosto, que "as prestações dos regimes de segurança social são parcialmente penhoráveis nos termos da lei gerar, o mesmo dispondo o artigo 73.° da Lei n,° 32/2002, de 20 de Dezembro, que se encontra actualmente em vigor.
12. E o mesmo decorre do disposto no Código de Processo Civil, no que se refere à execução para pagamento de quantia certa. Com efeito, nos termos do artigo 824.°. n.° 1, alínea b), do CPC, são impenhoráveis "dois terços das prestações periódicas pagas a titulo de aposentação ou de outra qualquer regalia social, seguro, indemnização por acidente ou renda vitalícia, ou de quaisquer outras pensões de natureza semelhante", sendo que o juiz pode, nos termos do n.° 4 do artigo 824.° do CPC, isentar de penhora tais rendimentos, tendo em conta "essas necessidades do executado e do seu agregado familiar”.
13. Ou seja, entende o legislador do CPC que dois terços de tais rendimentos (nos quais se incluem as pensões por aposentação) até ao limite máximo de três salários mínimos correspondem ao estritamente necessário para garantir aos executados uma existência condigna, significando que, uma vez mais, o legislador teve a preocupação de salvaguardar o direito fundamental à segurança social eonstitucionalmente consagrado.
14. E se, no âmbito dos processos de execução para pagamento de quantia certa, o CPC estabelece a referida impenhorabilidade é porque a Constituição a isso obriga. Ora, tal preocupação não foi atendida aquando da elaboração do artigo 15." do Estatuto Disciplinar, o que, além de inconstitucional, atenta contra os mais elementares ditames morais.
15. Acresce que o respeito pelo direito fundamental à segurança social decorre igualmente da jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre esta matéria: o próprio artigo 63.° dá CRP 'poderá, desde logo, ser interpretado como garantindo a todo o cidadão a percepção de uma prestação proveniente do sistema de segurança social que lhe possibilite uma subsistência condigna em todas as situações de doença, velhice ou outras semelhantes. [...] Mas, ainda que não possa ver-se garantido no artigo 63º da Lei Fundamental um direito a um mínimo de sobrevivência, é seguro que este direito há-de extrair-se do principio da dignidade da pessoa humana, condensado no artigo 1.° da Constituição" (In Acórdãos do Tribunal Constitucional, 19.° volume, pág. 515), sendo que tal ideia já resultava igualmente do Acórdão n.° 232/91 do Tribunal Constitucional.
16. Face ao exposto, conclui-se que a deliberação ora sindicada, ao aplicar ao Recorrente o disposto no artigo 15.° do Estatuto Disciplinar, e, em consequência, ao estabelecer a perda de pensão por um ano, coarcta, pelo referido período, um direito fundamental que a todos é garantido pela Constituição - não garantindo sequer ao Recorrente o mínimo dequado e necessário para uma existência condigna (ou até mesmo para a sua própria sobrevivência) - viola as normas constitucionais que se referem à tutela do valor supremo da dignidade da pessoa humana.
17. Acresce que o artigo 72.°, n,° 1 da Constituição estabelece também que as pessoas idosas têm direito â segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem e superem o isolamento ou a marginalização social.
18. Em decorrência da manifesta inconstitucionalídade do artigo 15,° do Estatuto Disciplinar, e tendo em conta o facto de a deliberação ora sindicada se basear no Parecer AJ/UTU16/2004 da Assessoria Jurídica da Reitoria, que aplica o artigo 15º do Estatuto Disciplinar, acolhendo o conteúdo do mesmo, aplicando ao Recorrente, enquanto aposentado, a pena de perda de pensão por um ano, em substituição da pena de inactividade graduada em um ano, a referida deliberação é nula, nos termos do disposto na alínea d) do artigo 133.° do Código do Procedimentos Administrativo, por ofender o conteúdo essencial de um direito fundamental. Da falta de quorum
19. Nos termos do disposto no artigo 28.°, alínea a), do Regimento do Senado (aprovado em 11 de Abril de 1991, com as alterações introduzidas na reunião do Senado de 26 de Outubro de 1995), e no n.° 2 do artigo 27.°, o exercício do poder disciplinar relativamente às infracções disciplinares praticadas por docentes é da competência de uma Subsecção da Secção dos Assuntos Disciplinares do Senado.
20. Nos termos do n.* 3 do artigo 27.° do Regimento do Senado, "a subsecção a que incumbe a matéria disciplinar relativa a docentes e funcionários não docentes é composta pelos Presidentes dos Conselhos Directivos e pelos representantes de outros docentes e dos funcionários não docentes", sendo presidida, nos termos do n.° 4 da referida disposição, pelo Reitor, "podendo delegar no Vice-Reitor membro da Secção".
21. Ou seja, e tendo em conta que a Universidade Técnica de Lisboa é composta por sete escolas (Faculdade de Medicina Veterinária, Instituto Superior de Agronomia, instituto Superior de Economia e Gestão, Instituto Superior Técnico, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Faculdade de Motricidade Humana e Faculdade de Arquitectura), e tendo ainda em conta o disposto nos números 1, 3 e 4 do artigo 27." do Regimento do Senado, concluímos que a subsecção responsável pela matéria disciplinar relativa a docentes é composta por 29 elementos, a saber: (i) pelo Reitor que preside à subsecção, nos termos do n.° 4 do artigo 27,° do Regimento do Senado, (M) pelos (sete) Presidentes dos Conselhos Directivos das Escolas que compõem a Universidade Técnica de Lisboa, nos termos do n,° 3 do artigo 27.° do Regimento do Senado, (iii) pelos (sete) representantes de outros docentes, nos termos dos n.°s 1 e 3 da referida disposição, (iv) e pelos (catorze) representantes dos funcionários não docentes, ainda nos termos dos n.°s 1 e 3 do artigo 27.° do Regimento.
22. No que se refere ao quorum de funcionamento, verificamos que, nos termos do disposto no n." 2 do artigo 43.' do Regimento do Senado, "as Secções só poetem funcionar com a maioria absoluta dos seus membros", sendo que a aplicação da referida norma ao caso concreto nos leva a concluir que, no que se refere ao quorum de funcionamento da secção responsável peta matéria disciplinar relativa a docentes, a maioria absoluta corresponde a 15 membros.
23. Porém, da análise da acta do dia 29 de Abril de 2004 da Subsecção dos Assuntos Disciplinares, relativa a docentes e funcionários não docentes, do Senado da Universidade Técnica de Lisboa (Cfr. Doe. 3 junto ao requerimento de providência), onde se encontra consubstanciada a deliberação ora sindicada, verificamos que, por um lado, apenas se encontravam presentes 16 membros (cfr. Lista de Presenças anexa à referida acta), e, por outro, "por motivos de força maior, e antes de ser posta a votação, ausentaram-se da reunião os senadores Professor Oscar Soares Barata e Acácio de Almeida Santos', pelo que a votação foi realizada entre os 14 membros presentes, o que não constitui, nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 2 do artigo 43.° do Regimento do Senado, a exigida maioria absoluta.
24. Assim sendo, à hora da votação que veio a aprovar a aplicação ao ora Recorrente da pena de inactividade graduada em um ano, não se encontrava reunido o necessário quorum de funcionamento, pelo que a deliberação deve ser considerada como nula, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea g) do artigo 133.° do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
25. Pelos argumentos aduzidos em sede de requerimento de providência cautelar, que se mantêm e que não mereceram fundamentação, e pelas duas nulidades supra descritas, de evidência imediata e incontomável, deve, pelo menos no âmbito de uma análise meramente perfunctória, ser o acto considerado manifestamente ilegal e ser decretada a providência cautelar de suspensão de eficácia requerida.
Do fundado receio de prejuízos de difícil reparação
26. Conforme exposto supra, as providência cautelares devem ser decretadas, ainda que o acto não seja manifestamente ilegal, no caso previsto na alínea b) do n.° 1 do art. 120.° do CPTA.
27. Sendo uma providência conservatória, "a introdução do critério do fumus boni iuris é, neste domínio, mais suave, intervindo apenas na sua formulação negativa: se não existirem elementos que tornem evidente a improcedência ou a inviabilidade da pretensão material, não será por esse lado que a providência será recusada" (Mário Aroso de Almeida, O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 3.° Edição, pág, 301). É o que se tem designado por fumus malus.
28. Por outro lado, estabelece o art, 120,°, n.9 5, do CPTA, que na falta de contestação da autoridade requerida ou da alegação de que a adopção das providencias cautelares pedidas prejudica o interesse público, o tribunal julga verificada a inexistência de tal lesão, salvo quando esta seja manifesta ou ostensiva.
29. Assim, considerando que não é manifesta a improcedência ou a inviabilidade da pretensão material - bem pelo contrário! - e atento a que não foi alegado o prejuízo para o interesse público, bastaria ao ora Recorrente, para que fosse decretada a providência cautelar nos termos da al. b) do art. 120.° do CPTA, apenas fazer prova - sumária (artº .114.°, nº 3, al. g) do CPTA) - do fundado receio da constituição de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
30. No caso sub judice, e considerando que o acto atenta contra o conteúdo de direitos fundamentais e constitucionalmente consagrados, mais não era necessário argumentar relativamente à constituição de um prejuízo de difícil reparação.
31. Caso contrário, cabia ao Recorrente provar sumariamente que com a suspensão da pensão o casal (e obviamente o Recorrente) não conseguia manter as despesas normais do agregado familiar, pelo que teria consequentemente de provar sumariamente: (i) o rendimento do casal; (ii) o valor da pensão; (iii) as despesas correntes do casal, de forma a que o valor resultante da subtracção de (ii) a (i) fosse inferior a (iii).
32. Para prova dos dois primeiros factos juntou como Doc. 6 a Declaração de IRS do ano transacto onde vem descriminado o rendimento do casal pelos dois sujeitos passivos (A e B) e a pensão, onde se constata que o Recorrente (o sujeito passivo A), auferiu: • a título de trabalho dependente - quadro 4 do Anexo A - € 14.347,30 líquidos (19.203,69-2.936,00-1.920,39), valor corresponde à colaboração com a Escola Universitária Vasco da Gama, que entretanto cessou (cfr. Doc. 7 junto aos autos); - a título de pensões e rendas, € 45.329,90 líquidos (62.087,90-16,758,00); - a título de direitos de propriedade intelectual, € 1.839,61 líquidos (2.164,06-324,45),. e que a sua mulher (sujeito passivo B) auferiu apenas a titulo de pensões e rendas, € 20.037,50 líquidos (22.501,50-2.464,00).
33. Daqui resulta que o rendimento total liquido do casal é de € 67.207,01 (45.329,90+1.839,61+20.037,50), que a pensão auferida cujo acto pretende suspender é de € 45.329,90, (Doe. 10) e que sem a pensão do Recorrente, o rendimento do casal é de € 21.877,11 (67.207,01-20.037,50).
34. Sucede que a projecção de custos fixos e despesas - cfr. Doe. 8 junto aos autos – está calculada em € 61.728,00. É certo que grande parte das despesas não podem ser documentalmente provadas mas recorda-se que se trata apenas de prova sumária no âmbito de uma providência cautelar, com carácter necessariamente urgente, o que dificulta a organização de meios de prova.
35. Ainda assim, ficam provados documentalmente, pelo menos os gastos anuais com: Imposto sobre imóveis: € 189,42; Seguro automóvel: € 1.429,12; Gás e electricidade: € 5.443,85; Água: € 2.799,91; TV cabo/internet: € 514,27; Telemóvel: € 556,06; Supermercado: € 10.275,80, tudo num total de € 21.208,43.
36. Isto significa que é apresentada prova evidente de que só com as referidas despesas, totalmente documentadas, sem incluir outras despesas ordinárias básicas como calçado, manutenção da casa, gasolina, portagens, manutenção de viaturas, empregada doméstica, telefone, despesas de saúde, prestações mensais de viatura, e, em geral, despesas pessoais e culturais, o casal gastará todo o seu rendimento.
37. É por isso inegável e flagrante que caso o acto administrativo não seja suspenso, o casal terá diminuir drasticamente o seu nível de vida, com prejuízos irreparáveis para a sua saúde física e moral, ao que acresce o estado físico debilitado do Recorrente e sua mulher, ambos de idade avançada, e que tomam ainda mais gravosa a diminuição do nível de vida, nomeadamente pela impossibilidade de recorrerem aos convenientes cuidados médicos (Doc. 2).
38. Decorre, portanto, da prova documental apresentada, o manifesto fundado receio de constituição de prejuízos de difícil reparação. Sucede que o Tribunal recorrido, ao estabelecer a matéria de facto, considerou não provados "que a pensão indicada em 4 do probatório [i] é o único rendimento do requerente, [ii] qual a composição do seu agregado familiar, [iii] respectivo rendimento e [iv] despesas, pois todos os documentos apresentados estão em nome de Mela Costa Rosa Y Alberty Ferreira" (fls. 476 - realçado nosso).
39. Trata-se por isso de um erro na apreciação da matéria de facto que deverá agora ser corrigido. Segundo o art. 49.0 do CPTA, o tribunal de recurso também conhece da matéria de facto, mas dada a evidência da prova apresentada, sempre resultaria da al. a) do n.° 1 do art. 712º, do CPC, ex vi 140.° do CPTA.
40. Parece claro que o Tribunal recorrido não apreciou devidamente a prova documental por mero lapso. Efectivamente, na sua análise perfunctória, não se deve ter apercebido de que Aricia Costa Rosa Y Alberty Ferreira, é a mulher do Recorrente (Doc. 1), não tendo assim considerado todas as facturas em seu nome. Apesar de não ter sido articulado no requerimento de suspensão o nome da mulher do Recorrente, tal constava expressamente do artigo 289.° da resposta à Nota de Culpa e de resto decorria claramente da Declaração de IRS do agregado familiar, em que consta como Sujeito Passivo B Aricia Costa Rosa Alberty Ferreira, e que foi junto aos autos como Doc. 6.
41. Também a composição do agregado familiar resulta da mesma Declaração, pois que no quadro 3.B, relativo ao número de dependentes não deficientes e deficientes, encontra- se o número "0" em ambos.
42. Não se vê porque é que a Declaração de IRS não foi atendida para efeitos meramente indiciários, uma vez que serve, pelo menos, para a liquidação dos impostos, atendendo ainda a que se trata da prova de um facto negativo, com as inerentes dificuldades. A, Declaração de IRS é a prova oor excelência do rendimento tio agregado familiar, e nem se percebe que outra prova podia ser apresentada! Basta dizer que a Declaração de IRS é o documento base que serve para todo e qualquer crédito e financiamento bancário.
43. De resto, sempre se dirá que se o Tribunal recorrido tinha quaisquer dúvidas sobre a identidade de Aricia Costa Rosa Alberty Ferreira ou sobre a composição do agregado familiar, ou de resto entendia que os documentos apresentados não eram suficientes ou não podiam fazer prova dos factos articulados, deveria o Mmo Juiz ter convidado o ora Recorrente a esclarecê-los ou a apresentar os necessários documentos, conforme estabelece o n.° 2 do art. 88.° do CPTA, como aliás fez por despacho de fls. 421 em relação aos extractos da Credipius, ao que o Recorrente juntou os respectivos documentos (como Docs. 11a 17 juntos aos autos).
44. De qualquer forma, os documentos apresentados bastavam para deles se retirar os elementos considerados não provados pelo Tribunal recorrido, e suprir a falta de alegação, nomeadamente do nome da mulher do Recorrente, pois que "os documentos juntos com os articulados devem considerar-se pari» integrante deles, suprindo lacunas de que enfermem quanto a uma completa exposição dos factos" (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.03.2001, no Proc° n.º 535/01 da 7* secção).
45. Em suma, deverá o Tribunal de recurso, caso não entenda dever decretar desde logo a providência a titulo da al. a) do n.g 1 do art. 120.° do CPTA, dar como provado a título meramente indiciário que: (i) o agregado familiar é composto unicamente pelo Recorrente e sua mulher Aricia Costa Rosa Alberty Ferreira (cfr. consta da Declaração de IRS, do art 289.° da resposta à Nota de Culpa, e do Doc. 1 ora junto); (ii) o rendimento total liquido do casal com a pensão é de € 67.207,01; (iii) a pensão do Recorrente, cujo acto objecto da presente providência pretende suspender é de € 45.329,90: (iv) o rendimento total líquido do casal, caso a pensão seja suspensa, é de € 21.877,11; (v) as despesas anuais do casal cifram-se em cerca de € 61.728,00 (cfr. Doc.8 junto aos autos), ou pelo menos que são claramente superiores a (iv) supra, pois que apenas com despesas totalmente documentadas, sem incluir outras despesas ordinárias básicas como calçado, manutenção da casa, gasolina, portagens, manutenção de viaturas, empregada doméstica, telefone, despesas de saúde, prestações mensais de viatura, e, em geral, despesas pessoais e culturais, o casal despende anualmente cerca de €21.208,43.
46. Dos factos ora enunciados, deve o Tribunal concluir sem margem de dúvida pelo fundado receio da constituição de prejuízos de difícil reparação, caso o acto administrativo não seja suspenso, e assim decretando a providência requerida.

*
A Requerida contra-alegou, concluindo como segue:

1. Deve ser mantido o efeito devolutivo do recurso em apreciação, como determina o n.° 2 do artigo 143.° do CPTA, não sendo aplicável aos procedimentos cautelares o regime decorrente dos n.°s 4 e 5 do artigo 143º do CPTA;
2. Com efeito, a douta Sentença recorrida considerou que o Recorrente não provou que, sem a pensão de aposentação durante um ano, não conseguiria fazer face às suas despesas, por o vencimento da sua mulher ser insuficiente, não estando, assim, demonstrada a existência de danos de difícil reparação;
3. E admitir, para efeitos de determinar qual o efeito do recurso — suspensivo ou devolutivo — que do efeito devolutivo resultam danos superiores à sua recusa representa tomar uma decisão revogatória da Sentença sob recurso que recusou a suspensão de eficácia;
4. Ao contrário do que alega o Recorrente a Sentença recorrida não é nula por ausência de fundamentação, por violação da alínea b) do n.° l do artigo 668.° do Código de Processo Civil;
5. Com efeito, é pacificamente reconhecido que "a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.° l é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença";
6. Ora, é manifesto que tal ausência de fundamentação não ocorre na Sentença recorrida;
7. Por outro lado, o artigo 15.° do E.D. não sofre de inconstitucionalidade;
8. Na verdade, não são aqui aplicáveis as disposições relativas à penhora de remunerações ou pensões, pois não está em causa a penhora de uma remuneração para efeitos de pagamento de qualquer direito de crédito, mas antes a aplicação de uma sanção disciplinar por actos culposos ou dolosos praticados em violação dos respectivos deveres profissionais;
9. Acresce que a aplicação da pena de inactividade a um funcionário aposentado apenas afecta temporariamente a pensão de aposentação, deixando intactos todos os restantes bens e outras fontes de rendimentos do funcionário em causa, o que não se verifica na situação de penhora;
10. Igualmente não se verifica a alegada falta de quorum na aprovação do acto impugnado;
11. Com efeito, a composição do Senado, varia de Escola para Escola, em função da sua representatividade, sendo fixada, por mandato, por despacho do Reitor;
12. No mandato em curso, em que foi tomada a deliberação objecto dos autos, a composição do Senado da Universidade Técnica de Lisboa foi fixada pelo Despacho N.° 14/2002, de l de Outubro de 2002, do Reitor da Universidade, constando dos Quadros III e V, anexos ao mesmo;
13. Nos termos do Quadro III, cinco Escolas (Faculdade de Medicina Veterinária; Faculdade de Motricidade Humana, Instituto Superior de Economia e Gestão, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas e Faculdade de Arquitectura) apenas elegem l (um) funcionário para o Senado pelo que não podem ter 2 (dois) funcionários nas Subsecções Disciplinares, apenas podendo ter l (um) funcionário quer no plenário quer nas várias Subsecções do Senado;
14. Assim, o quorum não é de 29, mas de 29 menos 5, ou seja, 24, pelo que estando presentes 14 membros, foi cumprido o quorum de maioria absoluta legalmente exigido;
15. Finalmente, o Recorrente também não demonstrou que a execução do acto recorrida lhe causa prejuízos de difícil reparação, tendo apenas juntado documentos elaborados pelo próprio e alegado despesas meramente hipotéticas e não reais;
16. Acresce que não é credível que a suspensão da pensão de aposentação apenas durante um ano produza prejuízos de difícil reparação para os interesses do Requerente, tendo em conta designadamente o seu estatuto social e o nível de vida elevado que manifesta na P.I.;
17. Assim, não se verificam os requisitos legais previstos no artigo 120.° do CPTA para que seja decretada a suspensão da decisão da Sub-secção de Assuntos Disciplinares do Senado da Universidade Técnica de Lisboa de 29 de Abril de 2004.

*
O EMMP junto deste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido que se transcreve:
“(..)
Entende-se não merecer censura a sentença recorrida.
Decorre, na realidade, incumbir ao requerente do presente meio processual a prova e demonstração dos factos em que se baseiam os prejuízos invocados, de modo a permitir ao Tribunal apreciar e decidir dos efectivos prejuízos e da irreparabilidade e sua não possível reconstituição e de fazer prova de viver exclusivamente da sua pensão e de não deter diferentes rendimentos ou meios de subsistência.
No respeitante ao pedido de reforma da sentença, considera-se em consonância com a posição da agravada, de as conclusões das alegações do recorrente serem de todo omissas sobre o pedido de reforma da sentença e de igual modo, não ocorrer lapso manifesto do Juiz na apreciação dos documentos particulares, juntos com a petição inicial, nem da sua apreciação decorrer decisão diversa da proferida.
Quanto aos vícios da sentença a começar pela invocada nulidade por falta de fundamentação, decorre que, somente, existe falta de fundamentação se for de todo omissa e não quando seja incompleta ou não suficiente e ser aliás, apreciado e fundamentado o sentido de o acto recorrido fosse ilegal.
No concernente a invocada inconstitucionalidade do disposto no art.° 15° do E.D., decorre que a substituição da medida disciplinar de inactividade por igual período de perda de pensão, não ofende o conteúdo essencial do invocado direito fundamental , ao estar em causa aplicação de medida punitiva disciplinar e que afecta somente, de modo temporário a pensão de aposentação e não atingir outros diferentes rendimentos ou meios de subsistência que permitam manter um nível de vida digno, ao aliás, não se comprovar que fosse o exclusivo meio de subsistência.
No tocante a serem causados prejuízos de difícil reparação, decorre como se salienta na sentença recorrida, não comprovar o recorrente como lhe incumbia que vive de modo exclusivo da pensão de aposentação e não deter diferentes rendimentos e acrescer que mesmo que se constatasse essa factualidade a sua qualidade de professor universitário permitia que exercesse actividade profissional privada durante esse período de tempo e auferir rendimento que lhe possibilitasse manter o elevado nível de vida e despesas que afirma deter.
Entende-se, assim, sido feita correcta aplicação do direito pela sentença recorrida e desse modo, dever manter-se. (..)”.

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Com substituição legal de vistos pelas competentes cópias entregues aos Exmos. Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência – artºs. 36º nºs. 1 e 2 CPTA e 707º nº 2 CPC, ex vi artº 140º CPTA.

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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

1. No despacho n° 3/2000, de 10 de Agosto de 2000, do Reitor da Universidade Técnica de Lisboa, pode ler-se: '”Na sequência do pedido formulado pelo Reitor da universidade Técnica de Lisboa, em 16 de Junho de 1998, dignou-se o Ministro da Educação proferir um despacho, em 17 de Junho do mesmo ano, determinando a instauração de um processo de sindicância à Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, tendente à averiguação, com referência ao período compreendido entre l de Janeiro de 1996 e a data daquele despacho, do funcionamento geral daquela Faculdade, designadamente nos planos científico, pedagógico, administrativo e financeiro. Concluída a sindicância, determinou o Ministro da Educação em despacho de 28 de Julho de 2000, que o processo fosse remetido ao Reitor da UTL para actuação nos termos legais e no âmbito das competências próprias (...) O Juiz Sindicante formula nas suas conclusões um conjunto de recomendações de natureza (....) e disciplinar. (....) No capítulo disciplinar o Juiz Sindicante aponta propostas muito concretas de inquéritos e de processos disciplinares às quais, para total esclarecimento dos factos, há que dar a devida sequência. Assim determino: (...) 3.2. "que sejam instaurados processos disciplnares aos seguintes docentes: Professor Carlos Antero Ferreira (aposentado) Para apuramento de factos e graduação das responsabilidades decorrentes de acções ou omissões verificadas nos período em que exerceram funções de direcção nos órgãos de gestão da Faculdade, ou em sectores de actividade da Faculdade que tiveram a seu cargo, e dos quais possam ter resultado prejuízos institucionais e pessoais. " (cfr. fls. 5 a 7 do I vol. do processo instrutor, que se considera reproduzido para todos os efeitos legais);
2. Para instrução do processo disciplinar do requerente, foi nomeada, por despacho do Secretário de Estado do Ensino Superior, de 23.04.2001, a inspectora superior principal da Inspecção-Geral da Educação, Maria Paula Simões de Carvalho Santos Madeira (cfr. fls. 2 a 4 do I vol. do processo instrutor, que se considera reproduzido para todos os efeitos legais);
3. O Requerente encontra-se na situação de aposentado desde l de Agosto de 1999 (DR, n° 175, II Série de 29/07/1999);
4. A pensão indicada em 3 corresponde ao valor líquido de 2.929.,98 € (cfr. declaração da CGA a fls. 441)
5. Por ofício datado de 10.10.2002 da Inspecção-Geral da Educação, enviado por carta registada com aviso de recepção, a Instrutora comunicou ao Requerente o início da instrução do processo disciplinar indicado em l (cfr. fls. 37 e 38 do p.i. vol. I, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
6. Com data de 28 de Julho de 2003 foi elaborada Nota de Culpa, pela instrutora do processo, que se transcreve, na parte que importa:

"Nomeado em 7 de Novembro de 1996 pelo Presidente do Conselho Directivo, Prof. Francisco Berger, Presidente da Comissão eleitoral para as eleições dos órgãos da Faculdade de Arquitectura, a realizar nessa ocasião, não respeitou o calendário eleitoral que, nos termos do art. 36° dos Estatutos da FAUTL, o Conselho Directivo havia fixado em reunião de 18 de Novembro de 1996, designadamente:
a) no que respeita à data limite para entrega das listas concorrentes pois, tendo o calendário fixado pelo Conselho Directivo estabelecido o dia 29 de Novembro de 1996 como data limite para a entrega das listas concorrentes à Assembleia de Representantes e ao Conselho Pedagógico, o arguido fixou outra data limite - 14 de Fevereiro de 1996 - de modo a que apenas uma das listas, a lista "A ", liderada pelos Prof. Taveira e Troufa Real, pudesse ser entregue em tempo, em deferimento da outra lista, lista "B", liderada pelo Prof. Berger, que estava então a constituir-se e a organizar-se para se apresentar, até ao dia 29 de Novembro, a sufrágio.
b) Promoveu a realização do acto eleitoral no dia 28 e 29 de Novembro de 1996, quando a data legalmente fixada determinava o dia 16 e 17 de Dezembro de 1996 para esse efeito.
c) Consentiu, ainda, que na eleição para a Assembleia de Representantes apenas votasse o corpo docente. Com efeito, sendo aquele órgão constituído por delegados dos três corpos da Faculdade (docentes, estudantes e pessoal técnico, administrativo e auxiliar) era dever do Presidente da Comissão Eleitoral velar para que os três corpos electivos exercessem o seu direito de voto de modo a que o órgão ficasse regularmente constituído, assegurando a representação de todos eles, conforme o disposto no art. 17° dos Estatutos.
Este comportamento, que esteve na origem da sua destituição do cargo de presidente da Comissão eleitoral e não homologação das eleições pelo Reitor da UTL, constitui um grosseiro atropelo às normas consagradas nos Estatutos e ao dever de isenção, de zelo e de lealdade, e concorreu fortemente para avolumar a situação de grave crise que então se vivia na Faculdade de Arquitectura.

Nomeado por despacho reitoral n°l/SEC/UTL/9 de 3 de Janeiro de 1997 Presidente da 1° Comissão de Gestão, como dec o da Faculdade, logo tomou as seguintes medidas:
a) No dia 9 do mesmo mês, revogou o despacho de 22 de Novembro de 1996 do anterior Presidente do Conselho Directivo que tinha instaurado processo disciplinar contra o Prof. Troufa Real (na sequência de ofensas corporais por este infringidas ao Prof. Lamas, no dia 15 do mesmo mês de Novembro, numa sala de aulas e na presença de alunos de mestrado e de funcionários) com fundamento em nulidade por falta de competência do seu autor, nulidade essa que se não verificava, de acordo com o disposto no n° l do art. 39 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local e revogou igualmente o despacho que nomeava o Senhor Juiz Conselheiro jubilado António Arlindo Payan Teixeira Martins instrutor do mesmo processo disciplinar.
b) No dia seguinte, dia 10 do mesmo mês de Novembro, determinou a instauração de um inquérito, decisão para a qual, nos termos do n°l e 2 do art. 85° do Estatuto Disciplinar carecia de competência, o que veio a agravar as tensões internas. Acresce que a instauração de um inquérito aquela incidente ocorrido entre o Prof. Troufa Real e o Prof. Lamas carece de qualquer fundamento legal, uma vez que estava instaurado, e bem, um processo disciplinar, pois se verificavam todos os pressupostos para a sua instauração: queixa formalizada, factos determinados e autor identificado.
c) E, ainda mais, nesse mesmo dia, nomeou inquiridor ou, no seu dizer "Presidente da Comissão de Inquérito", o Prof. Tomás Taveira, apesar de não ignorar existirem motivos para poder ser deduzida a sua suspeição como instrutor nos termos do art. 52, als. c) e e) do Estatuto Disciplinar e de claro impedimento nos termos do art. 44 do CPA. Na verdade a aliança do Prof. Taveira com o Prof. Troufa Real e inimizade de ambos ao Prof. Lamas eram públicas e notórias e atravessavam uma fase particularmente exacerbada. Esta inimizade encontrava-se manifestada em injurias e difamação da autoria do Prof. Taveira contra o Prof. Lamas, divulgadas pelos colegas da Faculdade de Arquitectura em documento escrito. Estas ofensas morais motivaram queixa apresentada por este contra aquele, junto do Conselho Directivo, da Reitoria e do DIAP. O processo resultante desta última queixa foi arquivado pelo Ministério Público com base na extinção, do procedimento criminal por amnistia (Lei n° 29/99, de 12 de Maio) mas, tendo sido deduzido pedido cível de indemnização o demandado, Prof. Taveira, foi condenado ao pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais ao assistente, Prof. Lamas. Embora à data da nomeação não fosse ainda conhecida a decisão judicial, era bem conhecida a ofensa que se consubstanciou em documento divulgado, pelo menos na Faculdade de Arquitectura, bem como eram conhecidas as queixas que dela foram apresentadas, circunstância suficiente para que fossem tidas em conta as garantias de imparcialidade consagradas no CP A, e acauteladas as mais elementares regras de boa gestão de pessoal e de sensata gestão de conflitos. A situação torna-se ainda mais grave quando a escolha do Prof. Taveira para instrutor foi feita em substituição de uma primeira escolha, esta tendo recaído sobre um juiz conselheiro jubilado, de indiscutível competência e isenção para o efeito
d) Tendo acabado por despachar favoravelmente, em 18 de Fevereiro, o requerimento de declaração de impedimento, interposto pelo Prof.. Lamas, contra a nomeação do prof. Taveira para instrutor do processo de inquérito, nomeou então o Prof. Rui de Sousa Cardim, o qual, em 27 de Maio de 1997 fez entrega do respectivo relatório final. Não obstante, e apesar de várias vezes o assunto ter sido abordado nas reuniões do conselho directivo, o arguido apenas deu vistas do processo aos alunos que integravam aquele conselho, e que, por isso, tinham direito a voto, durante um dia, o dia 15 de Agosto, feriado nacional, impedindo, de facto, que estes tomassem conhecimento dos autos ou, pelo menos, justificando forte suspeita sobre a intenção de criar tal impedimento. Tanto mais que só em reunião do Conselho Directivo de 7.Jan.98 viria a ser deliberado o arquivamento do mesmo, contrariamente à proposta do instrutor, e provocando declarações de voto de todos os restantes membros do Conselho Directivo.
e) Tendo nomeado em 18 de Fevereiro de 1997 o Prof. Duarte Castel Branco instrutor de um processo de averiguações em, que era visado O Prof. Tomás Taveira resultante de queixa do Prof. José Manuel Lamas, por injúrias e difamação em documento escrito e divulgado, mandou arquivar esta queixa com fundamento em que: - o instrutor havia deixado passar os prazos legais sem que tivesse apresentado qualquer relatório; - havia necessidade de apaziguar a Escola; - era seu entendimento que a conduta do participado não constituía qualquer ilícito disciplinar. Apenas o primeiro fundamento procede e dele deveria o arguido ter tirado as necessárias consequências, as quais teriam sido as de responsabilizar disciplinarmente o instrutor que não cumpriu uma tarefa importante que lhe havia sido cometida. Os dois outros fundamentos, tendo o arguido o dever de saber que não podiam proceder, apenas se podem entender como inscrevendo-se numa linha de favor ao Prof. Taveira, que marcou todo o exercício das junções que desempenhou nos conselhos directivo e científico. Com efeito, dada a situação de tensão e conflito, que ao tempo era vivida pela Faculdade de Arquitectura, optar por não esclarecer redundava, como redundou, e era espectável, em agravamento desse clima. Não se podia legitimamente considerar, também, que a conduta do Prof. Taveira não configurava ilícito disciplinar, uma vez que tendo sido mandado averiguar, não se obteve qualquer resultado dessa averiguação. E quem mandou averiguar foi o mesmo arguido. Ao proceder desta forma, considerando as tensões vividas na Escola, o arguido deitou a perder a oportunidade criada de contribuir, através da intervenção de uma entidade de indiscutível competência e isenção, para o esclarecimento de situações graves e, desse modo, contribuir decisivamente para o seu apaziguamento. Esta atitude traduz-se mana omissão do dever de propiciar condições para o bom e normal funcionamento da Escola. O arguido, com este comportamento manifestou, por um lado, tratamento de favor para com o Prof. Troufa Real, por todos conotado com o Prof. Taveira, a cujo grupo indubitavelmente pertencia e, por outro lado, tratamento desfavorável para com o Prof. Lamas, por aquele agredido, nas condições já referidas.
3º (..)
4º (..)

Como presidente da Comissão de Gestão e, depois, do Conselho Directivo,
a) Apresentou à Assembleia de Representantes o relatório de actividades do ano de 1997 apenas em Março de 1998 e não até final de Janeiro como impõem os Estatutos da Faculdade de Arquitectura, com o que infringiu o disposto no art. 22°, n° l, alin. j) dos mesmos. Este relatório, mesmo assim, foi rejeitado por aquele órgão, sem que tenha sido reformulado.
b) Não apresentou qualquer plano de actividades para o ano de 1998, com o que incumpriu o disposto no art. 22°, n° l ali e) dos mesmos Estatutos da Faculdade de Arquitectura.
Deixou assim de cumprir o disposto nas alis. e) e f) do art. 22" dos Estatutos da Faculdade de Arquitectura e impediu que se conhecesse a actividade que o mesmo se propunha desenvolver no ano seguinte. Sendo certo que só a clareza do desempenho e das propostas de desempenho legitima, num Estado de Direito, o exercício da função pública.

Enquanto presidente do Conselho Directivo não deu despacho a qualquer dos pedidos de aquisição de obras nem sequer de renovações de assinaturas de revistas, apresentadas pelo director da Biblioteca, Prof. Horácio Bonifácio, desde Junho de 1997 até Maio de 1998, data em que este foi substituído no cargo pelo Prof. José Cabido.
Dada a coincidência das datas e porque havia verba orçamentada para as referidas aquisições, criou-se a convicção de que aquela recusa era uma forma de vindicta contra o director da Biblioteca, que integrava o grupo dos professores associados que em Junho de 1997 requereram a nomeação definitiva, com os incidentes que no artigo 9° desta nota de culpa melhor se explicitará.
Esta atitude, mais do que prejuízo para o director da Biblioteca, causou um considerável empobrecimento da Biblioteca e, consequentemente, da Faculdade de Arquitectura, sobretudo em relação às revistas que ficaram com números em falta e que não foi possível adquirir ulteriormente quando a Comissão de Gestão, empossada em Maio de 1998 veio a despachar os inúmeros pedidos de aquisição que se tinham vindo a avolumar.

Enquanto presidente do Conselho Científico, não obstante na Faculdade de Arquitectura exercessem Junções docentes cerca de quarenta doutorados, promoveu a realização de Conselhos Científicos "restritos", ou seja, Conselhos Científicos em que apenas era admitida a presença de professores catedráticos, ao todo seis, de onde resultaram deliberações e dos quais se elaborou a respectiva acta contrariando, assim, os Estatutos da faculdade de Arquitectura. Estes prevêem apenas restrições de voto a determinadas categorias de docentes, em certas situações (n° 2 do art. 25°), mas não a composição restrita a uma só categoria de professores, o que redundaria na criação de um órgão inexistente.

Enquanto presidente do Conselho Cientifico delegou no vice-presidente, Prof. Tomás Taveira, em despacho de 4 de Fevereiro de 1997, "o acompanhamento dos processos respeitantes à aprovação, renovação ou rescisão de contratos de pessoal docente a submeter à oportuna e devida deliberação do Conselho", quando a Faculdade de Arquitectura vivia um período particularmente difícil, caracterizado por grandes lutas de poder, em que um dos principais protagonistas era, justamente, o Prof. Taveira. Esta atitude que transfere para um dos mais aguerridos contendores dos conflitos que se viviam na Escola poderes daquela ordem — decisões sobre o movimento do pessoal - traduz uma atitude de demissão do exercício da sua competência, sem que o interesse do serviços o justificasse e, por outro lado, uma capitulação a um dos grupos de poder, liderado pelo Prof. Taveira.

Como presidente do Conselho Científico em "conselho restrito de catedráticos ", já acima referidos, de 6 de Junho de 1997 e de 22 de Julho de 1997 assumiu as seguintes atitudes:
a) Consentiu, não manifestando a tanto qualquer oposição, que no "conselho restrito " de 6 de Junho, por si presidido, fosse nomeado o Prof. Taveira para emitir o parecer previsto no n° 2 do art. 20° do Estatuto da Carreira Docente Universitária acerca dos relatórios de actividades pedagógicas e cientificas de cinco dias dos seis professores associados (Profs. Berger, Braizinha, Bonifácio, Fialho e Lamas) que haviam requerido a nomeação definitiva, muito embora tivesse sobejamente conhecimento das situações geradoras de impedimento àquele professor catedrático, existentes em relação a cada um destes cinco requerentes, embora de diferentes formas. Esta situação foi particularmente grave em relação ao Prof. Lamas dados os factos já relatada no artigo 2° desta nota de culpa.
b) Apesar de os cinco professores associados, interessados no processo de nomeação definitiva para cujos relatórios tinha sido nomeado relator o Prof. Taveira, terem requerido em 16,19, 23 de Junho e 8 de Julho declaração de impedimento deste para intervir naquela qualidade, nos seus processos, nos termos dos art.s 44° e seguintes do CPA e de os pareceres da Assessoria Jurídica da Reitoria, com a concordância do Senhor Reitor, lhes ter reconhecido razão e deles ter a faculdade de Arquitectura tido atempado conhecimento, em 4.Jul.97, o aqui arguido, mesmo assim consentiu, não exercendo qualquer oposição, que o processo de nomeação definitiva prosseguisse, como se os incidentes de suspeição não tivessem sido levantados nem existissem os pareceres da Reitoria. Tendo sonegado aos pares uns e outros e tendo-se abstido de decidir do incidente, com ofensa do estabelecido no n" 3 do art. 45° do CPA propôs à votação, em 22 de Julho de 1997, em mais uma reunião restrita do Conselho Científico, órgão estatutariamente inexistente após leitura dos pareceres dos relatores acerca dos relatórios da actividade pedagógica e cientifica, os pareceres para a nomeação definitiva, nos termos do art. 21° do EDCU.
Dos seis processos em presença, cinco - aqueles para os quais tinha sido nomeado relator o Prof. Tomás Taveira - mereceram do Conselho Científico parecer desfavorável em consonância com os pareceres daquele relator, muito embora os pareceres dos outros relatores fossem favoráveis às nomeações. Tais deliberações vieram a ser declaradas nulas em recurso contencioso administrativo, tendo sido reconstituído o processo de nomeação de novos relatores.
c) Ainda na mesma reunião restrita, em 6 de Julho de 1997, sem ter manifestado desacordo ou exercido qualquer oposição, o arguido possibilitou que o dito Conselho Cientifico propusesse como vogal do júri do concurso para professor catedrático em que havia dois candidatos - Prof. Troufa Real e Prof. Lamas - e uma só vaga, o Prof. Tomás Taveira, conhecido aliado do primeiro e inimigo do segundo pelas razões ditas no artigo 3 ° desta nota de culpa.
Tendo o Prof. Lamas requerido a declaração de impedimento do Prof. Taveira para aquela função, o arguido limitou-se a exarar os despachos de "Recebi 06.8.97" e "Arquive-se. 08.08.97", com total desrespeito pelos procedimentos previstos no art. 45° do CPA.
Esta nomeação é particularmente incompreensível e inaceitável, quando é certo que, em deliberação da Comissão de Gestão de 18 de Fevereiro desse mesmo ano, também presidida pelo Prof. Lamas de pedido de declaração de impedimento do Prof. Taveira para instrutor do processo de inquérito em que era visado o Prof. Troufa Real e queixoso o requerente.
Este conjunto de atitudes e procedimentos, uns de sua autoria pessoal, outros por si consentidos, sem qualquer oposição e, portanto, por eles responsável enquanto presidente do Conselho Científico, são mais um afloramento objectivo do favor, da cobertura e da sujeição que aos grupos de pressão liderado pelo Prof. Taveira dispensou.
10° (..)
11° (...)
12°
Tendo reunido no dia 5.Mar. 98 o Conselho Científico, o arguido não diligenciou que a acta da reunião fosse devidamente assinada. E, mesmo confrontado com o requerimento assinado por oito conselheiros para que submetesse à votação aquela acta e para que sujeitasse a votação secreta e nominal todos os assuntos referentes a propostas de nomeações, nem assim tomou qualquer medida, não dando andamento ao pedido, mantendo-se essa acta no arquivo, até hoje, por assinar.
Esta omissão é particularmente grave: o requerimento dos conselheiros tinha como causa uma notícia publicada na imprensa segundo a qual a Faculdade de Arquitectura havia contratado como monitor o filho do Prof. Taveira.
Ora tendo estado aqueles docentes, autores do requerimento presentes na reunião do Conselho Cientifico e sabendo que nada sobre o assunto havia sido abordado, queria, legitimamente, conhecer a acta da reunião. Esta tinha sido redigida pelo então secretário da Faculdade, Dr. Baptista, que lhe tinha acrescentado, a mando do Prof. Taveira duas questões que em verdade não tinham sido abordadas na reunião: uma relativa à contratação de monitores, entre os quais o filho deste professor na cata referido sem o apelido "Taveira" e outra relativa à proposta para doutoramento de assistentes do Centro de Informática da Faculdade de Arquitectura (CIFA), de que o Prof. Taveira era presidente.
A complacência do arguido face a estas atitudes do Prof. Taveira revela uma total conivência e sujeição aos interesses e jogos de poder deste, que muito agravaram a crise da Faculdade que se tornou pública em Maio/Junho de 1998 pela cobertura mediática que mereceu e justificou, ainda, a instauração de um processo de sindicância à Faculdade de Arquitectura.
13º'
Como presidente do Conselho Científico oficiou em 25.Set.97 ao presidente do Conselho Directivo, ele próprio, uma vez que à data acumulava as duas funções, solicitando instauração de processo disciplinar contra o Prof. Lamas, alegadamente em cumprimento de deliberação do Conselho Cientifico de 17.Set.97, deliberação essa inexistente.
Esta atitude contra o Prof. Lamas, como comportamento persecutório, revela falta de independência em relação aos interesses e pressões particulares de um dos grupos dominantes na Faculdade de Arquitectura - o grupo liderado pelo Prof. Taveira - e, ainda, falta de subordinação aos objectivos do serviço e da persecução do interesse público no desempenho das suas funções.
14°
Enquanto presidente do Conselho Administrativo da Faculdade de Arquitectura (3.Jan.97 a 5.Jun.98) nunca reuniu este órgão não existindo consequentemente, desse período, qualquer acta que possa esclarecer sobre a actividade do mesmo. Com esta omissão, não só infringiu o disposto no art. 33"dos Estatutos como ocultou o desempenho da gestão administrativa, financeira e patrimonial da Faculdade de Arquitectura.
Dos factos articulados resulta que o comportamento do aqui arguido, Prof. Carlos Antero Ferreira, quer como presidente da Comissão Eleitoral de 1996, quer como presidente da 1a Comissão de Gestão, e depois do Conselho Directivo, quer como presidente do Conselho Científico e quer ainda como presidente do Conselho Administrativo, se pautou por uma total falta de rigor e transparência, compadrio com o grupo liderado pelo Prof. Taveira e Prof. Troufa Real e sujeição aos interesses destes, com prejuízo para alguns docentes, com especial relevo para o professores Doutores José Manuel Lamas, Francisco Berger, Horácio Bonifácio, Joaquim Braizinha, Pedro Fialho de Sousa e Jorge Bastos.
Com o seu comportamento e atitudes, quer por acção quer por omissão, contribuiu para que a crise instalada na Faculdade de Arquitectura se agravasse aceleradamente. Crise cujos contornos mais visíveis foram do conhecimento público, dado o tratamento mediático que então tiveram e que obrigou à intervenção extraordinária do Senhor Ministro da Educação, que em 17 de Junho mandou instaurar uma sindicância, da qual resultou, entre outros, este processo disciplinar.
O conjunto destes factos, de natureza diversa, mas todos de elevado grau de gravidade, e de que resultaram prejuízos para a Faculdade de Arquitectura, verificados ao longo de um período de um ano e nove meses, revelam um comportamento que inviabiliza a manutenção da relação funcional, integrando a infracção prevista e punida com as pena expulsivas de demissão ou aposentação compulsiva, nos termos do art. 26. ° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários da Administração Central Regional e Local, aprovado por DL n.° 24/84, de 16 de Janeiro.
A competência para punir cabe ao Senado da Universidade Técbnica de Lisboa, nos termos do art. 28° do regulamento daquele órgão publicado na II Série do DR de 8.Ago.98, conjugado com o n" l do art. 9° da Lei n° 108/88, de 4 de Setembro, de acordo com o parecer da PGR n" 74/2002, homologado pelo Senhor Ministro da Ciência e do Ensino Super ir, no que concerne à competência para aplicar penas aos órgãos de governo das universidade, em 16 de Abril de 2003.
Fixo ao arguido, nos termos do art. 59" do Estatuto Disciplinar, 20 dias para apresentar, querendo, a sua defesa escrita. Com ela poderá juntar documentos, rol de testemunhas ou requerer diligências pertinentes. A falta de resposta dentro do prazo marcado vale como efectiva audiência do arguido, nos termos do n° 9 do art. 61° do mesmo Estatuto. (..)” - (cfr. doc. n° l, junto pelo Requerente, de fls. 18 a 36 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7. O Requerente apresentou a sua Resposta à nota de culpa, invocando, em resumo, que o processo disciplinar se reporta a factos ocorridos entre 1996, 1997 e 1998, donde quanto aos factos constantes dos artigos 1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 8°, 9° 10° e 11° da Nota de Culpa encontram-se prescritos no que à instauração de um procedimento disciplinar diz respeito; propõe a anulação do processo pela existência de vícios insupríveis, e quando assim se não entenda, requer várias diligências de prova, como apensação de outros processos disciplinares, junção de documentos; e inquirição das testemunhas, tendo, ainda junto, 55 documentos. - (fls. 37 a 126 dos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
8. Com data de 16 de Março de 2004, foi elaborado pela instrutora o Relatório, contendo, entre outros, os factos apurados na instrução (Nota de Culpa) pág. 11 a 29, defesa do arguido, sua estruturação e sua análise (pág. 29 a 92), tendo respondido, na parte que importa, que:
"A defesa entende que a nota de culpa padece de nulidade insuprível por não se referir aos preceitos legais violados nem enquadrar os comportamentos nas cláusulas gerais exemplificativas previstas nos arts. 22.0 a 27.0 do Estatuto Disciplinar, violando o disposto nos arts. 42.0, n.O l, 57.°,n.O 2 e 59.0 n.O 4 do mesmo Estatuto Disciplinar e, também, por não indicar os motivos que levaram a qualificar de inviável a relação e por ter omitido a existência de diversas circunstâncias atenuantes previstas no art. 29 do Estatuto Disciplinar.... Quanto à primeira questão posta pela defesa, deve responder-se que dos vários comportamentos levados à acusação, uns corresponderam a violações directas de preceitos legais, e assim está dito (arts. art. 1.0, 5.0, 7.0, 14.0), outros traduzem ofensa aos deveres gerais das várias junções que o arguido exerceu, o que vem explicitado no termo de cada artigo e conduziu, no seu conjunto, à qualificação que a final foi feita. Os mesmos comportamentos não foram enquadrados nas referidas cláusulas exemplificativas porque, dada a sua especificidade, nelas não cabem. Sendo certo que estas cláusulas são isso mesmo, "exemplificativas"; A inviabilização da manutenção da relação funcional resulta explicitada a fls. 476 (pág. 18 da nota de culpa).
Em conclusão, não parece que a nota de culpa, pelas razões aqui assacadas na defesa, se vier a constituir fundamento da punição, possa gerar a nulidade insuprível prevista no art. 42° do Estatuto Disciplinar, interpretado este de acordo com abundante jurisprudência administrativa sobre a matéria". ... Tendo apresentado a seguinte proposta:"10.1. Considerando (factos provados) que:
10.1.1 Como Presidente da Comissão Eleitoral para as eleições dos órgãos da Faculdade de Arquitectura, a realizar nos finais de 1996, antecipou-se afixação do calendário eleitoral que, nos termos do art. 36° dos Estatutos da FAUTL, o Conselho Directivo viria a aprovar em reunião de 18 de Novembro de 1996, designadamente:
10.1.1.1 no que respeita à data limite para entrega das lista concorrentes à Assembleia de Representantes e ao Conselho Pedagógico, considerou o dia 14 de Novembro de 1996 para esse efeito, quando o Conselho Directivo viria a estabelecer o doa 29 de Novembro de 1996 para esse efeito, de modo a que apenas uma das lista, a lista encabeçada pelo Prof. Castel-Branco se tenha apresentado a sufrágio, prejudicado a outra uma outra lista que estava então a constituir-se e a organizar-se para se apresentar, até ao dia 29 de Novembro a sufrágio;
10.1.1.2 no que respeita à data do acto eleitoral promoveu a realização do eleições no dia 28 e 29 de Novembro de 1996, quando a data fixada em edital do Conselho Directivo de 18 de Novembro determinava o dia 16 e 17 de Dezembro de 1996 para esse efeito.
10.1.1.3. Consentiu, ainda, que na eleição para a Assembleia de Representantes apenas votasse o corpo docente. Sendo aquele órgão constituído por delegados dos três corpos da Faculdade (docentes, estudantes e pessoal técnico, administrativo e auxiliar) era dever do Presidente da Comissão Eleitoral velar para que os três corpos electivos exercessem o seu direito de voto de modo a que o órgão ficasse regularmente constituído, assegurando a representação de todos eles, conforme o disposto no art. 17° dos Estatutos - ver pontos 7.1 e
10.1.2. Como Presidente da 1a Comissão de Gestão em 10 de Janeiro de 1997 nomeou inquiridor de um processo por si instaurado, ou, no seu dizer, "Presidente da Comissão de Inquérito", aos factos ocorridos na Faculdade de Arquitectura em 16 de Novembro de 1996, entre os Profs. Troufa Real e Prof. Lamas o Prof. Tomás Taveira, apesar de não ignorar existirem motivos de suspeição, nos termos do art. 52°, alin. c) e e) do Estatuto Disciplinar e de claro impedimento nos termos do art. 44° do CPA - ver pontos 7.2.19 a 7.2.28 e 9.2.2 a 9.2.4.
10.1.3 Apenas em reunião de 7 de Janeiro de 1998 promoveu a decisão sobre o processo de inquérito, não obstante o instrutor ter feito entrega do relatório final em 27 de Março de 1997 - ver pontos 7.2.21 a 7.2.24 e 9.2.5 a 9.2.6.
10.1.4 Como Presidente da 1a Comissão de Gestão mandou arquivar o processo de averiguações para o qual tinha sido nomeado instrutor o Prof. Castel-Branco, que dele nunca apresentou relatório nem proposta, e, sem ter tomado qualquer medida administrativa ou disciplinar contra este, justificou aquela decisão de arquivamento com a prescrição, com a necessidade de apaziguar a Escola e com o facto de não existir ilícito disciplinar - ver ponto 7.2.25 a 7.2.28 e 9.2.7 a 9.2.9. 70.7.5 Enquanto Presidente do Conselho Directivo e também Presidente do Conselho Cientifico permitiu ao Prof. Tomás Taveira, vice-presidente do Conselho Cientifico que comparecesse em 12 de Junho de 1997 à tomada de posse dos presidentes dos Departamentos da Faculdade de Arquitectura, onde deveria tomar posse o presidente do Departamento de Arte e Design, de acordo com a proposta do Conselho Científico, conforme era convicção geral e conforme constava da acta da posse, sem que assinasse o respectivo termo, assim criando a aparência de que era de facto e de direito o presidente daquele Departamento, mas sem incorrer na ilegalidade que seria ter tomado efectivamente posse, ou seja, ter assinado o respectivo termo e, simultaneamente, manter as funções de Vice-Presidente do Conselho Cientifico, nos termos do n" 4 do art. 10 do Regulamento do Departamento de Arte e Design da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa (publicado no DR II S. de 25.Jan.92, p.955) - ver pontos 7.4 e 9.4.
10.1.6. Como presidente da Comissão de Gestão e, depois, do Conselho Directivo apresentou à Assembleia de Representantes o relatório de actividades do ano de 1997 apenas em Março de 1998 e não até ao final de Janeiro como impõem os Estatutos da aculdade de Arquitectura, com o que infringiu o disposto no art. 22°, n° l, alin. f); não procedeu à sua reformulação depois de rejeitado pela Assembleia de Representantes;
10.1.7 Não apresentou qualquer plano de actividades para o ano de 1998, com o que incumpriu o disposto no art. 22°, nº l ali e) dos mesmos Estatutos da Faculdade de Arquitectura - ver ponto 7.5.5 a 7.5.12.
10.1.8 Enquanto presidente do Conselho Directivo não deu despacho a qualquer dos pedidos de aquisição de obras nem sequer de renovações de assinaturas de revistas, apresentadas pelo director da Biblioteca, Prof. Horácio Bonifácio, desde Junho de 1997 até Maio de 1998, data em que cessou funções - ver ponto 7.6 e 9.6.
10.1.9 Enquanto presidente do Conselho Cientifico, promoveu a realização de Conselhos Científicos "restritos", para os quais só foram convocados professores catedráticos, ao todo seis, de onde resultaram deliberações e dos quais se elaborou a respectiva acta contrariando os Estatutos e dando assim corpo a um órgão não previsto – ver ponto 7.7. e 9.7.
10.1.10. Enquanto presidente do Conselho Científico delegou no vice-presidente, Prof. Tomás Taveira, em despacho de 4 de Fevereiro de 1997, "o acompanhamento dos processos respeitantes à aprovação, renovação ou rescisão de contratos de pessoal docente a submeter à oportuna e devida deliberação do Conselho", quando a Faculdade de Arquitectura vivia um período particularmente difícil, caracterizado por grandes lutas de poder, em que este era um dos principais protagonistas – ver ponto 7.8 e 9.8.
10.1.11. Como presidente do Conselho Científico apresentou uma proposta no "conselho restrito ", de 6 de Junho de 1997, por si presidido de nomeação do Prof. Taveira para emitir o parecer previsto no n" 2 do art. 20" do ECDU acerca dos relatórios de actividades pedagógicas e científicas de cinco dias dos seis professores associados (Profs. Berger, Braizinha, Bonifácio, Fialho e Lamas) que haviam requerido a nomeação definitiva, muito embora soubesse das situações geradoras de impedimento daquela Professor em relação a cada um destes cinco requerentes – ver pontos 7.9.14 a 7.9.19 e 9.9.1.
10.1.12 Como presidente do Conselho Cientifico consentiu, sem qualquer oposição, que os processos de nomeação definitiva prosseguissem e fossem votados os relatórios da actividade pedagógica e científica, em 22 de Julho de 1997, apesar dos incidentes de suspeição levantados pelos professores interessados e de os pareceres da Assessoria Técnica da Reitoria, com a concordância do Senhor Reitor, atempadamente conhecidos, lhes ter reconhecido razão abstendo-se de decidir do incidente – ver pontos 7.9.20 a 7.9.34 e 9.9.2 a 9.9.3.
10.1.13. Na mesma reunião restrita, em 6 de Junho de 1997, consentiu, sem ter manifestado desacordo ou exercido qualquer oposição, que se deliberasse propor à Reitoria o Prof. Taveira para vogal do jure do concurso para uma vaga de professor catedrático em que havia dois opositores - Prof. Troufa Real e Prof. Lamas -, conhecido aliado do primeiro e inimigo do segundo. Limitou-se a exarar os despachos de "Recebi 06.8.97" e "Arquive-se. 08.08.97", sobre os requerimentos de suspeição e impedimento apresentados pelo Prof. Lamas relativamente ao Prof. Taveira - ver pontos 7.9.34 a7.9.50 e 9.9.2 e 9.9.3.10.1.14 Não promoveu que a acta da reunião do Conselho Científico do dia 5.Mar.98 fosse devidamente assinada (depois de lida e votada), apesar de ter sido instado por oito conselheiros a que a submetesse a votação secreta e nominal todos os assuntos referentes a propostas de nomeações, mantendo-se essa acta em arquivo, até hoje, por assinar - ver pontos 7.12.5 a 7.12.11 e 9.12.
10.1.15 Oficiou em 25.09.97 ao presidente do Conselho Directivo, ele próprio, enquanto presidente do Conselho Científico, solicitando, instauração de processo disciplinar contra o Prof. Lamas, alegando tratar-se de uma deliberação do Conselho Científico de 17.Set.97, deliberação essa inexistente. Ver pontos 7.13.5 a 7.13.11 e 9.3. 10.1.16. Enquanto presidente do Conselho Administrativo da Faculdade de Arquitectura (3.Jan.97 a 5.Jun.98) nunca reuniu este órgão não existindo, consequentemente, desse período, qualquer acta que possa esclarecer sobre a actividade do mesmo – ver pontos 7.14.3 a 7.14.7 e 9.4.
10.1.17 Não concorre nenhuma circunstância atenuante, mas verifica-se a circunstância agravante prevista na alínea g) do art. 31 - acumulação de infracções.
10.2 Considerando (factos não provados) que:
10.2.1 É de desistir da matéria acusatória vertida nas alíneas a) e b) do art. 2 e nos arts 3, 10 e 11 da nota de culpa.
10.2.2 Não se fez prova da conivência imputada no art. 4° da "vindicta" imputada no art. 6° nem da perseguição imputada no art. 13°, todos da nota de culpa.
10.3 Considerando (enquadramento) ainda que:
10.3.1 Estes factos, com todas as circunstâncias que os rodearam e que neste relatório
estão amplamente referidas manifestam um comportamento, por parte do aqui arguido, Prof. Carlos Antera Ferreira, quer como presidente da Comissão Eleitoral de 1996, quer como presidente da 1. a Comissão de Gestão, e depois do Conselho Directivo, quer como presidente do Conselho Científico e quer ainda como presidente do Conselho Administrativo, revelador, de falta de dever de cuidado no exercício das Junções de chefia e direcção, falta de rigor e transparência nas decisões com prejuízo efectivo dos professores Doutores José Manuel Lamas, Francisco Berger, Horácio Bonifácio, Joaquim Braizinha, Pedro Fialho de Sousa e também prejuízo no bom funcionamento, da imagem, prestigio e honrabilidade da própria Faculdade de Arquitectura da UTL.
10.3.2 Com o seu comportamento e atitudes, quer por acção quer por omissão, contribuiu também para que a crise instalada na Faculdade de Arquitectura, cujos contornos mais visíveis foram do conhecimento público, se agravasse, obrigando à intervenção extraordinária do Senhor Ministro da Educação, que mandou instaurar uma sindicância, em 17 de Junho de 1998, da qual resultou, entre outros, este processo disciplinar.
10.3.3 O conjunto destes factos, de natureza diversa, mas todos de elevado grau de gravidade, com os prejuízos que causou, independentemente das intenções que na nota de culpa lhe foram atribuídos ao longo de um período de um ano e nove meses, atenta gravemente contra a dignidade e prestígio do funcionário e da função, infracção prevista e punida nos termos do n" l do art. 25° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários da Administração Central Regional e Local, aprovado por DL n.° 24/84, de 16 de Janeiro.
10.4 Proponho, por tudo o que ficou dito, que ao Prof. aposentado da Faculdade de Arquitectura da UTL, Arq. Doutor Carlos ......, seja aplicada a pena de inactividade prevista no art. 25° do citado Estatuto Disciplinar, graduada em um ano” – (cfr. Doc. Junto de fls. 248 a 249, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)
9. Com data de 16 de Abril de 2004 foi emitido pelo jurista da Reitoria da Universidade Técnica de Lisboa, o Parecer AJ/UTL n° 16/2004, sobre o assunto: Processo disciplinar instaurado ao Professor Catedrático aposentado Carlos Antero Ferreira, da Faculdade de Arquitectura, tendo concluído que: "5. Em conclusão, o processo disciplinar instaurado ao Professor Catedrático Carlos Antero Ferreira, da Faculdade de Arquitectura, encontra-se instruído nos termos da lei, estando em condições de ser submetido à competente Subsecção de Assuntos Disciplinares para decisão final.," (cfr. doe. fls. 134 a 136 dos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
10. Em 29 de Abril de 2004, por deliberação do Senado - Subsecção dos Assuntos Disciplinares, relativos a docentes e funcionários não docentes, proferida no âmbito do processo disciplinar indicado em 1.), foi deliberado aplicar ao Requerente a pena proposta pela instrutora no Relatório Final de inactividade, graduada em um ano. - (cfr. fls. 129 a 32 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
11. A deliberação indicada em 10 foi comunicada ao Requerente em 4 de Maio de 2004 (confissão e doe. de fls. 128).
12. Dos documentos juntos aos autos, em nome de Alicia Costa R. A Ferreira, constam facturas de electricidade e gás do mês de Junho de 2003, de € 824,70 e € 604,43 (cfr. fls 270 e 271);
13. No período de 2003-12-12 a 2004-02-09, e de 2004-02-09 a 2004-04-14, consumos de água no valor respectivamente de 343,76 € e 387,37 € (fls. 274 e 275);
14. De TV Cabo, meses de Março de 2003 e Janeiro a Maio, valores mensais entre 29,52 € e 57,03 €) fls. 281 a 292;
15. Da TMN - Telecomunicações Móveis Nacionais S.A, dos meses entre Maio de 2003 e Abril de 2004, valores mensais entre 36,63 e 61,18 (fls. 294 a 305);
16. Da PT - Comunicações SÁ dos meses de Maio de 2003 a Abril de 2004 entre 35,98 e 133,31 (fls. 309 a 318);

*
A matéria dada como indiciáriamente provada resulta dos elementos expressamente indicados em cada um dos pontos do probatório.
Não se logrou demonstrar, entre outros factos, que a pensão indicada em 4 do probatório é o único rendimento do requerente, qual a composição do seu agregado familiar, respectivo rendimento e despesas, pois todos os documentos apresentados estão em nome de Arícia Costa Rosa Y Alberty Ferreira.

DO DIREITO

Vem assacada a sentença de incorrer em:

a) violação primária de lei adjectiva por:
a. falta de fundamentação, artº 668º nº 1 b) CPC ................ ítens 2 a 6 das conclusões de recurso;
b) violação primária de lei substantiva por erro de julgamento em matéria de estatuição do artº 120º nº 1 a) CPTA derivada de :
a. nulidade do despacho sancionatório derivada da inconstitucionalidade do artº 15º ED por violação do princípio da dignidade humana, artºs. 1º, 63º nº 1 e 3 e 72º nº 1 CRP e 133º nº 2 d) CPA ..................................................... ítens 1 e 7 a 18 das conclusões;
b. nulidade do despacho sancionatório derivada da falta de quorum para a deliberação, artº 133º nº 2 g) CPA .................................................... ítens 19 a 25 das conclusões;
c) violação primária de lei substantiva por erro de julgamento em matéria de estatuição do artº 120º nº 1 b) CPTA derivada de
a. erro de subsunção da matéria de facto no requisito de “fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado” ......................... ítens 26 a 45 das conclusões.

*

O discurso jurídico fundamentador em sede de sentença é o seguinte:

“(..)
A pretensão formulada de suspensão de eficácia do acto consiste na adopção de uma providência conservatória, como reacção ao acto de conteúdo lesivo, de natureza positiva, que determinou a aplicação da pena disciplinar de inactividade por um ano.
O requerente visa, assim, manter a situação jurídica existente antes da prática do acto suspendendo.
Dispõe o art. 120° do CPTA, sobre os critérios de decisão dos quais depende a concessão das providências cautelares, prevendo-se nos artºs 128° e 129°, especificamente, sobre a providência cautelar de suspensão de eficácia do acto administrativo.
Os critérios ou pressupostos para a concessão das providências cautelares são agora diferenciados, nos termos da nova lei de processo administrativo, consoante se trate de conceder providências de natureza conservatória ou antecipatória, dispondo o legislador acerca dos pressupostos de decisão de maneira diferente, relativamente à pendência da lei de processo anterior.
Não sendo evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, designadamente, por não estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente, não haverá que aplicar o regime previsto na alín.a) do n° l do art. 120° do CPTA.
Assim, no caso dos termos conjugados da alínea b) do n° l e do n° 2 do art. 120° do CPTA, a adopção da providência cautelar de suspensão de eficácia depende dos seguintes critérios:
i) haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito - al. b) do n° l do art. 120° do CPTA;
ii) devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultarem da sua concessão não se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências - n° 2 do art. 120° do CPTA.

Relativamente à alínea a) do n° l do art. 120° do CPTA
Nos termos legalmente definidos o critério a que alude a referida alínea assume-se como decisivo para a concessão da providência cautelar, no sentido de que, se pela convicção formada pelo julgador for considerado preenchido, é, sem mais, concedida a providência cautelar, ficando prejudicada a aplicação dos critérios subsequentes: alin. b) do n° l e do n° 2 do art. 120° do CPTA.
O critério em análise é aquele em que, na sua maior intensidade, se manifesta o fumus boni iuris ou a aparência do bom direito e, por isso, é evidente a procedência material no processo principal.
Deve, assim, o tribunal proceder à sumario cognitio, quer de facto, quer de direito, da pretensão do requerente e do grau de probabilidade de procedência da acção principal, pois tratando-se os presentes autos de um processo de natureza cautelar, cujo fim se destina a assegurar a utilidade da decisão definitiva que vier a ser proferida no processo principal, não se destinando a resolver definitivamente o litígio em presença.
Por conseguinte não cabe na presente providência decidir sobre a (ilegalidade da deliberação tomada pelo Senado dos Assuntos Disciplinares da Universidade Técnica de Lisboa.
Cumpre apenas avaliar se é evidente a procedência da pretensão do requerente na acção principal, por o acto que aplicou a referida pena disciplinar em causa ser manifestamente ilegal, ou seja, se a ilegalidade da deliberação é tão manifesta que não deixe dúvidas sobre o eventual provimento da pretensão a formular no processo principal. Todavia tal juízo não antecipa, prejudica ou preclude a decisão a proferir no processo principal.
O requerente alega, como fundamento da ilegalidade da decisão proferida, por um lado que os factos provados no Relatório manifestam uma evidente negligência do requerente e não dolo, além de que não terem sido provados os factos de que era acusado na nota de culpa. Invoca a violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por os factos provados se subsumirem no art. 23° do E.D. Pois entende que a análise do Relatório resulta que o comportamento do arguido, quando muito se resume a mera negligência ou má compreensão dos seus deveres funcionais, pelo que o seu comportamento não poderia ser considerado como atentado gravemente contra a dignidade e prestígio do funcionário e subsumido ao comando do art. 25°, n° l, do E.D.
Assim não entende a autoridade requerida que defende a manifesta legalidade da decisão.
Embora tenha sido junto o processo instrutor, dos factos assentes não é evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, na medida em que na deliberação impugnada foram feitas apreciações sobre cada um dos factos constantes da nota de culpa, e confrontados com a defesa apresentada pelo requerente, concluindo a Instrutora, e a deliberação suspendenda, que perante os factos provados, a sanção a aplicar era a de pena de inactividade de um ano pela sua gravidade, nos termos do art. 25° do E.D. No mesmo Relatório foi dada resposta às questões suscitadas pelo arguido, como seja da excepção de prescrição do procedimento disciplinar, e que está relacionada com o sindicância ordenada pelo Ministro da Educação em Julho de 1998 à Universidade Técnica de Lisboa e com a falta de conhecimento pelo Reitor da Universidade Técnica de Lisboa à data dos acontecimentos de que os factos praticados pelo arguido tivessem a natureza de infracção disciplinar (pontos 6.8.11 a 6.8.22 do Relatório indicado no ponto 8 do probatório).
Assim, não é evidente a procedência da pretensão a formular pelo requerente no processo principal, nem tão pouco estamos perante um acto administrativo manifestamente ilegal para efeitos do disposto na alínea a) do n° l do art. 120° do CPTA.
*
Passemos, então, à análise dos pressupostos constantes da alínea b) do mesmo normativo.
Nas situações em que não é evidente a procedência da pretensão material a formular no processo principal, na providência cautelar a decisão a tomar basta que sumariamente (sumaria cognitio) se conclua pelo justo receio de que a natural demora na resolução definitiva cause prejuízos de difícil reparação ou pela constituição de uma situação de facto consumado (periculum in mora) e pela séria probabilidade do direito invocado (fumus boni iuris).
Estatui a alínea b) do n° l do artigo 120° do CPTA que quando esteja em causa uma providência conservatória é adoptada desde que cumulativamente:
1) "haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal"; e
2) "não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito."
Face ao que a concessão da providência "depende da demonstração do periculum in mora, que o Código articula com o critério do fumus boni iuris." (Mário Aroso de Almeida, "O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos", 2a edição, páginas 291).
Quanto ao periculum in mora, significa que a providência deve ser concedida "desde que os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. É este o único sentido a atribuir à expressão "facto consumado". (...)
Do ponto de vista do periculum in mora, a providência também deve ser, entretanto concedida quando, mesmo que não seja de prever que a reintegração, no plano dos jactos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível pela demora do processo, os jactos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de "prejuízos de difícil reparação", no caso de a providência ser recusada, seja porque a reintegração no plano dos factos se perspectiva difícil, seja porque pode haver prejuízo que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar, ou pelo menos de reparar integralmente. Ainda neste último caso, justifica-se a adopção da providência para evitar o risco de retardamento da tutela que deverá ser assegurada péla sentença a proferir no processo principal." (Mário Aroso de Almeida, "O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos", 3a edição, págs. 299 e 300).
"O Juiz deve, pois fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por entretanto se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica." (Vieira de Andrade, "A Justiça Administrativa" (Lições), 4a edição, página 298).
*
No caso sub judice o Requerente invoca que sem a pensão de aposentação durante o período de um ano não vai conseguir manter as despesas actuais, sendo o vencimento da sua mulher insuficiente.
Ora, o certo é que não logrou fazer prova, dessa situação, na medida em que os documentos juntos, impugnados, não fizeram prova, ainda que indiciaria, dos factos alegados no que respeita ao requerente, designadamente de que o requerente só dispõe daquele rendimento, de qual o seu agregado familiar e suas despesas e encargos, para concluir a posteriori para a insuficiência ou impossibilidade de fazer face a eles sem o decretamento da presente providência.
Não podemos olvidar que o "juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica.
Neste juízo, o fundado receio há-de corresponder a uma prova, em princípio a cargo do requerente, de que tais consequências são suficientemente prováveis para que se possa considerar "compreensível" ou "justificada" a cautela que é solicitada" (1)
(1) Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 4ª ed. Pág. 298.
Na verdade, impende sobre o requerente o ónus de alegação concretizada, bem como a respectiva demonstração, de factos dos quais decorra o prejuízo de difícil reparação, como consequência da execução do acto, em relação de causalidade adequada (v. entre outros, Ac. 1345/02-A, de 18.09.2002, do STA), e nos termos do art. 114°, n° 3, alínea g), do CPTA e 342° do Código Civil.
Como afirma Isabel Celeste da Fonseca, in "Introdução ao Estudo sistemático da Tutela Cautelar no Processo Administrativo", pág. 100 e 101, "na cognição cautelar defende-se a exigência de um juízo próximo da certeza sobre a produção do dano e um juízo de probabilidade sobre a existência do direito".
Termos em que [se] conclui que não sendo evidente a procedência da acção principal, para efeitos do disposto na alínea a) do n° l do art. 120° do CPTA, e não tendo sido demonstrado o receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente que visa assegurar no processo principal, temos por não verificada uma das condições prescritas na primeira parte da alínea b) do n° l do mesmo artigo, ficando prejudicada, nos termos do art. 660°, n° 2, do CPC ex vi art. 1° do CPTA, a apreciação do restante segmento, de que não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão a formulada ou a formular no processo. (..)”.

***
1. falta de fundamentação

A violação do dever de fundamentação de facto em sede de sentença, cfr. artºs. 158º e 653º nº 3 CPC, afere-se tendo por parâmetro a extensão do objecto do processo, configurado pelo pedido deduzido com referência ao direito que o Autor pretende fazer valer e à incidência material desse mesmo direito, ou seja, em última instância, com referência à causa de pedir que o substancia.
Dito de outro modo, o que configura o objecto do processo é o pedido traduzido pelo efeito jurídico que o Autor pretende ver declarado pelo Tribunal e que será declarado a partir dos factos concretos alegados na petição inicial (causa de pedir), caso esses mesmos factos sejam jurídicamente relevantes de acordo com as diversas soluções jurídicamente plausíveis no direito objectivo e resultem, feita a prova, subsumíveis na hipótese legal da norma que concretiza a solução jurídica do caso concreto.
Portanto, para que a sentença não incorra no vício de insuficiência de fundamentação de facto, o efeito jurídico declarado (seja de procedência ou improcedência) deve repousar considerando exactamente a extensão de factos relevantes alegados pelo Autor na petição inicial como fundamento do efeito jurídico pretendido.
Tendo por pressupostos que a petição não padeça de insuficiência de causa de pedir, se também não ocorrer por parte do Tribunal erro no juízo de inclusão na norma aplicada dos factos provados (erro na subsunção) nem erro na determinação da consequência definida pela norma (erro sobre a estatuição), a sentença expressar-se-á sem vícios próprios e, das duas uma, ou o Autor conseguiu provar todos os factos necessários à obtenção do efeito jurídico pretendido e obtém ganho de causa ou, embora alegados, os factos não resultaram provados e, por insuficiência de prova, a acção naufraga.
Em síntese, apenas a falta absoluta de indicação dos fundamentos de facto (ou de direito) inquina a sentença de nulidade – artº 668º nº 1 b) CPC.
Se houver insuficiência de fundamentação, uma de duas: ou o Tribunal ad quem pode recorrer ao mecanismo do artº 712º nº 1CPC e acresce ao probatório fixado em 1ª Instância a factualidade necessária por recurso aos elementos constantes do processo em função dos factos concretos que substanciam a causa e que são alegados pelo Autor, ou não pode porque cumpre produzir prova sobre o alegado e, nesse caso, os autos baixam à 1ª Instância para ampliação da matéria de facto em resultado do julgamento parcial que caiba, artº 712º nº 4 CPC.
Se o problema não reside na insuficiência da fundamentação de facto pelo Tribunal, mas na insuficiência ou extravagância da causa de pedir alegada para o efeito jurídico pretendido pelo Autor, a questão de recurso morre logo no Tribunal ad quem , pois que a acção naufraga também neste caso.
*
Pelo exposto, na medida em que da simples análise da sentença sob recurso é patente que a mesma não evidencia a ausência de motivação seja de facto seja de direito, improcede a questão trazida a recurso sob os ítens 2 a 6 das conclusões.

2. invalidade ostensiva do acto – artº 120º nº 1 a) CPTA

Cumpre deixar patente que, pelo menos em tese, a invalidade ostensiva do acto a que alude o artº 120º nº 1 a) não se traduz na convolação da tutela cautelar em tutela final urgente, meio adjectivo tipificado no artº 121º, ambos do CPTA.
Deste modo, não tem fundamento legal configurar o juízo de valoração jurídica a que alude o artº 120º nº 1 a) como juízo antecipado fundamentado na cognição sumária tout court (e, por isso, definitiva) da impugnação do acto administrativo que a lei autoriza nos estritos limites dos requisitos de natureza substantiva e adjectiva estatuídos no artº 121º CPTA, excepção à sindicabilidade e consequente juízo valorativo do acto administrativo em todos os seus elementos em sede de acção principal de tramitação normal.
Estas evidências teóricas diferenciadoras entre a cognição sumária tout court e sumária cautelar sofrem considerável esbatimento aquando da sua concretização na medida em que tanto a admissibilidade de realização como a valoração dos meios de prova carreados para os autos acabam, à face da lei, por não se distinguir quer entre si quer relativamente ao estatuído para a cognição normal ou “plena” (1), salvo no que toca à celeridade - prazos adjectivos mais curtos, por exemplo – e reversibilidade dos efeitos jurídicos da decisão sumária cautelar cuja determinabilidade e estabilidade de duração fica na dependência dos efeitos jurídicos definitivos declarados na acção principal.
Em suma, a decisão cautelar tem natureza rebus sic stantibus sendo jurídicamente inábil, porque provisória, para formar caso julgado.

Dito isto, da exemplificação enunciada no artº 120º nº 1 a) apenas importa ao caso dos autos a hipótese da invalidade ostensiva, pois que todos os demais exemplos se reconduzem, de uma forma ou de outra, à operatividade substantiva e normativa do caso julgado, o que não se verifica no tocante à pena disciplinar aplicada ao Recorrente, cuja suspensão de eficácia foi recusada em 1ª Instância..

Em regra a cognição sumária cautelar implica que na valoração antecipada da causa o Tribunal proceda à apreciação perfunctória, sumária e provisória da relação material controvertida de modo a que o conteúdo e alcance dos efeitos de direito da decisão cautelar se traduzam em efeitos provisórios, isto é, jurídicamente reversíveis se assim for exigido na sequência do juízo probatório quanto à matéria de facto e do discurso jurídico fundamentador em sede de .acção principal.
O escopo cautelar da defesa do requerente contra o arrastamento no tempo da acção principal (normal ou anormal) evidenciada pelo perigo de não satisfação do direito aparente ou periculum in mora, implica que recaia sobre si o ónus de alegar os factos que evidenciam a provável existência do quid - a provável existência do direito, ou fumus boni iurissobre que incide o processo principal.
Consequentemente, entre outras que não vêm ao caso, não há identidade de objecto entre as acções cautelar e principal e os efeitos produzidos pela decisão cautelar são de duração limitada no tempo, ou seja, hão-de cessar no momento e que a decisão na causa principal é decretada.
Ora, no tocante à invalidade ostensiva configurada no artº 120º nº 1 a) CPTA o pressuposto do fumus boni iuris toma configuração distinta, pois a decisão cautelar deixa de derivar da “probabilidade de existência do direito alegado” para sê-lo “quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal”.
Como já se afirmou que o caso do artº 121º nº 1 a) não constitui a convolação do meio adjectivo cautelar em acção principal, em via de coerência há-de concluir-se que a hipótese do artº 120º nº 1 a) exige um critério de fumus boni iuris qualificado, independentemente de a pretensão do requerente se subsumir na hipótese de providência antecipatória do artº 120º nº 1 c) e nº 2 CPTA ou do enquadramento doutrinário por que se opte para além dos normativamente assumidos.
Dito de outro modo, tenha ou não o requerente em vista a manutenção do statu quo (providência conservatória) ou a sua alteração (providência antecipatória) – o que se decide com base na factualidade alegada que determina os contornos do caso concreto – desde que a determinação e valoração probatória suporte um juízo jurídico de evidente procedência do pedido formulado ou a formular na acção principal, é de decretar a providência.
*
Aplicado o que vem de ser dito ao caso concreto, no domínio do artº 120º nº 1 a) CPTA o fumus boni iuris não é a provável existência do direito à anulação (ou declaração de nulidade) da deliberação do Senado de 29.ABR.2004 que aplicou ao Recorrente a pena de um ano de inactividade, cuja suspensão de eficácia foi recusada na 1ª Instância, mas a evidente invalidade de que padece, por ser evidente que se mostra inquinado de vício de violação de lei em qualquer dos seus elementos constitutivos - competência, forma, objecto mediato, objecto imediato, pressupostos e fim.
Ora essa evidência de invalidade da deliberação sancionatória de modo nenhum resulta dos factos levados ao probatório na sentença sob recurso e que constituem a transcrição da fundamentação de facto e de direito que motiva a razão da pena disciplinar aplicada ao Recorrente no procedimento instaurado, facto que evidenciam o exercício pelo Recorrente de funções na Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa [FAUTL] do modo como vem descrito no probatório, e consequente funcionamento da FAUTL no período de 1.JAN.1996 e 17.JUN.1998, a saber:
- presidente da comissão eleitoral – pontos 1. e 6. do probatório
- presidente da 1ª comissão de gestão da FAUTL – ponto 6 do probatório
- presidente do conselho directivo da FAUTL - ponto 6 do probatório
- presidente do conselho científico da FAUTL – ponto 6 do probatório
- presidência do conselho restrito da FAUTL – ponto 6 do probatório
- presidente do conselho administrativo da FAUTL - ponto 6 do probatório
- relatório do processo disciplinar – ponto 8. do probatório
- parecer de jurista da Reitoria da UTL – ponto 9 do probatório
- deliberação do Senado de 29.ABR.2004 de aplicação da pena disciplinar – ponto 10 do probatório

3. acto administrativo inconstitucional – artº 133º nº 2 d) CPA

E também não resulta evidente a invalidade da deliberação sancionatória do Senado por agressão à Constituição – acto administrativo inconstitucional – no sentido de que a substituição da pena de inactividade em perda de pensão de aposentação por igual tempo, prevista no artº 15º nº 1 do ED, constitui uma violação do princípio da dignidade humana, ex vi artºs. 1º, 63º nº 1 e 2 e 72º nº 1 da CRP pelos motivos aduzidos a propósito dos efeitos da pena de demissão estando já o funcionário aposentado, no Ac. desta mesma formação, proferido no Rec. nº 10549/01, de 25.NOV.2004, aplicáveis ao caso da substituição em presença no caso dos autos:
“(..)
A aposentação, como causa extintiva da relação jurídica de emprego público não implica a impossibilidade jurídica de aplicação de sanções disciplinares a funcionários aposentados, na exacta medida em que nos termos do artº 74º nº 1 do Estatuto da Aposentação, continuam vinculados à função pública, conservando os títulos e a categoria do cargo que exerciam e os direitos e deveres que não dependam da situação de actividade.
A nova relação jurídica configura-se, substantivamente, como garantia obrigacional fundada e constituída pelo próprio funcionário a partir dos descontos feitos no seu vencimento, reportada ao valor pecuniário a receber in futurum, valor essa que assume natureza assistencial.
Pela demissão, o funcionário perde todas as regalias que auferia, ficando impedido de reexercer, na função pública funções que exijam os requisitos de dignidade funcional e de confiança em sede de vínculo jurídico que, pelo comportamento sancionado, fundamentaram a razão de ser da pena expulsiva, isto é, que em juízo valorativo sancionatório demonstrou não possuir, cfr. artº 13º nº 11º , DL 24/84 de 16.01.
Está em causa o disposto no artº 15º nº 4 do ED, no sentido de que este normativo, impeditivo do pagamento da pensão de aposentação pelo período de 4 anos a funcionário que, aquando da aplicação da pena disciplinar de demissão não se encontre no activo por ter, o entretanto, ter sido desligado do serviço e passado à aposentação, viola os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito fundamental à segurança social, artºs. 2º e 63 da Constituição.
Efectivamente, como ensina Gomes Canotilho, a dignidade humana é “(..) Outra esfera constitutiva da República Portuguesa [cuja] resposta deve tomar em consideração o princípio material subjacente à ideia de dignidade humana. Trata-se do princípio antrópico que acolhe a ideia pré-moderna e moderna da dignitas hominis (Picco della Mirandola) ou seja, o indivíduo conformador de si próprio e da sua vida segundo o seu próprio projecto espiritual (plates et fictor) . (..) A compreensão da dignidade da pessoa humana associada à ideia de homo noumenon, justificará a conformação constitucional da República Portuguesa onde é proibida a pena de morte (artº 24º) e a prisão perpétua (artº 30º/1) A pessoa ao serviço da qual está a República também pode cooperar na República, na medida em que a pessoa é alguém que pode assumir a condição de cidadão, ou seja, um membro normal e plenamente cooperante ao, longo da sua vida (..)” (2).
Quanto ao catálogo dos direitos sociais nomeadamente no que importa ao caso concreto em questão, o artº 63º nº 4 CRP, “(..) o conceito de constituição social servirá aqui para designar o conjunto de direitos e princípios de natureza social formalmente plasmados na Constituição (..) Estes direitos apelam para uma democracia económica e social num duplo sentido: em primeiro lugar, são direitos de todos os portugueses e, tendencialmente, de todas as pessoas residentes em Portugal (..): em segundo lugar, pressupõem um tratamento preferencial para as pessoas que, em virtude de condições económicas, físicas ou sociais, não podem desfrutar desses direitos (..)” (3).
*
Aplicando o sentido dos dispositivo constitucionais, não podemos acompanhar a tese do Recorrente, na medida em que o cidadão que, em concreto, no exercício das funções inerentes à relação jurídica de emprego público se determina livre e voluntáriamente pelo comportamento não querido pela norma, bem sabendo que tal comportamento não lhe é permitido por lei (o chamado dolo directo), da gravidade do que está em causa nos autos [...], esse cidadão encontraria na aplicação da pena de demissão [inactividade] um modo de se eximir ao cumprimento de qualquer pena, isto é, no caso de um funcionário concreto, a violação do dever de conduta digna sancionado com a pena de demissão [inactividade], permitir-lhe-ia passar à impunidade, com toda a tranquilidade, bastando, para tal, a aposentação e o consequente recebimento da pensão.
A dignidade da pessoa humana e o direito à segurança social não estão, pois, em causa porque a suspensão do pagamento da pensão tem carácter punitivo e, como é inerente às penas, temporário. (..)”

Pelo exposto, improcede a questão trazida a recurso sob os ítens 1 e 7 a 18 das conclusões.


4. falta de quórum (artº 133º nº 2 g) CPA)
- questão nova

Importa lembrar que os recursos visam modificar a decisão recorrida e não criar decisões sobre matéria nova, isto é, em sede de LPTA os recursos ordinários são cassatórios – reponderam, revêm a decisão recorrida - e não de reexame – não procedem, por substituição, a novo julgamento do mérito da causa (4).
Mas ainda que a Reforma admita o Tribunal ad quem a conhecer, pela primeira vez, de questões suscitadas no processo em que revogue a decisão recorrida, cfr. artº 149º nºs. 3 e 4 CPTA, esta possibilidade – semelhante ao que já vinha do direito adjectivo cível - não vai ao ponto de distorcer a tradição do nosso direito adjectivo.
De modo que temos dois domínios íntimamente conexionados:
A) O primeiro, pelo qual “(..) em regra o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados (..) excluída está, por isso, a possibilidade de alegação de factos novos (ius novorum; nova) na instância de recurso, embora isso não resulte de qualquer proibição legal, mas antes da ausência de qualquer permissão expressa (..) salvaguarda-se, naturalmente, a possibilidade de apreciação, em qualquer grau de recurso, de matérias de conhecimento oficioso (..) e, embora sem aceitar a invocação de factos novos pelas partes, o recurso de apelação também se pode aproximar, numa situação específica, do modelo de recurso de reexame. Trata-se da possibilidade prevista no artº 712º nº 3 de a Relação determinar a renovação dos meios de prova produzidos na 1ª instância que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade. Nesta hipótese, o tribunal de recurso não se limita a controlar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, antes manda efectuar perante ele a prova produzida na instância recorrida (..)” (5).
Possibilidade que veio a ter consagração expressa no art 149º nº 2 CPTA.
B) O segundo “(..) Dado que o direito português consagra o modelo do recurso de reponderação, o âmbito do recurso encontra-se objectivamente limitado pelas questões colocadas ao tribunal recorrido, pelo que, em regra, não é possível solicitar ao tribunal ad quem que se pronuncie sobre uma questão que não se integra no objecto da causa tal como foi apresentada na 1ª instância (..)” (6).

*
Aplicando a doutrina exposta ao caso concreto, atentos os fundamentos da sentença que se centram, exclusivamente na análise dos pressupostos legais estatuídos no artº 120º nº 1 a) e b), CPTA para efeitos de decidir do pedido de suspensão de eficácia do acto administrativo recorrido, é patente que o recurso interposto no tocante à questão da falta de quorum do Senado enunciada nos ítens 19 a 25 das conclusões, uma das que determinam o objecto do mesmo, é questão que extravasa os fundamentos em que se alicerçou a parte decisória cautelar, sendo certo que também não figura no domínio das questões que substantivam a causa de pedir.
Como é de lei, a delimitação do objecto do recurso afere-se pelas questões a apreciar em sede de sentença, no sentido de “(..) tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem (..)” (7) ( Anselmo de Castro, Processo civil declaratório, Vol. III, Coimbra/1982, pág. 142.), com ressalva para as de conhecimento oficioso – cfr. artºs. 690º nº 1 e 660º nº 2 CPC, aqui aplicáveis ex vi artº 1º CPTA.
De modo que, em síntese, assume a natureza de questão nova insusceptível de ser conhecida em sede de recurso, toda a matéria que extravase o elenco de fundamentos que suportam a parte decisória da sentença recorrida, delimitada esta pelo objecto do processo, com ressalva das de conhecimento oficioso.

O mesmo é dizer que as referidas conclusões de recurso sob os ítens 19 a 25 configuram questão nova insusceptível de ser conhecidas pelo Tribunal ad quem.

5. periculum in mora de infrutuosidade ou de retardamento - artº 120º nº 1 b) e c) CPTA

Assaca o Recorrente a sentença de incorrer em erro de julgamento no que respeita ao requisito do artº 120º nº 1 b) CPTA “do fundado receio da constituição de facto consumado” vd. conclusão sob o ítem 29, derivado de erro na apreciação da matéria de facto por não ter sido considerada a força probatória dos documentos que especifica no corpo alegatório e que, em síntese, refere nas conclusões.
*
No domínio do artº 120º nº 1 b) a providência deverá ser concedida “(..) desde que os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. É este o único sentido a atribuir à expressão “facto consumado” (8) O pressuposto do periculum in mora na vertente específica do perigo de infrutuosidade da sentença refere-se ao acervo de prejuízos previsíveis para o requerente cautelar em consequência da impossibilidade de execução da sentença na causa principal favorável ao direito aparente, por perda de garantias da contra-parte, nomeadamente perda de garantias jurídico-patrimoniais.
Ainda que obtenha ganho de causa na acção principal, nada fruirá de objectivamente útil para ressarcimento dos prejuízos sofridos, porque os factos do presente enunciam a possibilidade do desaparecimento de quanto tenha existência jurídicamente susceptível de execução no âmbito da esfera jurídica da contra-parte.
Por isso, no tocante ao “(..) periculum di infruttuosità a tutela cautelar tem fundamentalmente uma função cristalizadora, de protecção do status quo ante (..) da decisão da causa principal (9).
O artº 120º “(..) ao exigir para a adopção da providência cautelar que haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado (..)” implica que o Tribunal deva “(..) fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil por, entretanto, se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela (..) o periculum in mora de infrutuosidade (..) [releva] de modo a manter a situação existente (..)” (10).
*
A nosso ver, os efeitos negativos derivados da pendência da acção principal que o Recorrente pretende evitar subsumem-se, não ao perigo de infrutuosidade mas, ao perigo de retardamento da sentença.
No perigo de retardamento, a fonte dos prejuízos que se antevêm deriva de circunstâncias inerentes ao Requerente cautelar, com fundamento em factos presentes que enunciam a incapacidade financeira da sua esfera jurídico-patrimonial para suportar de acordo com um trem de vida digno o decurso do tempo até que seja decidida em definitivo a causa principal.
Consequentemente, no perigo de retardamento a fonte dos prejuízos não tem origem na parte contrária, antes deriva de circunstâncias próprias ao Requerente cautelar.
Pelo que vem dito e em função do que vem alegado e peticionado no tocante à pretensão do Recorrente de suster os efeitos sancionatórios da suspensão por um ano do pagamento da pensão de aposentação, por substituição ex lege da pena disciplinar de inactividade por um ano, o quadro normativo que importa reporta-se ao periculum in mora de retardamento da sentença a proferir na acção principal de impugnação do acto sancionatório.

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Os efeitos sancionatórios derivados da substituição da pena de inactividade por igual período de suspensão do pagamento da pensão de aposentação, que o Recorrente enquadra na categoria de prejuízos que fundamentam o fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado, são efeitos inerentes ao cumprimento da pena aplicada, no domínio da natureza punitiva e funções de prevenção especial e geral pelos comportamentos assumidos e não queridos pela norma.
Pelo que vem dito, a suspensão de eficácia requerida tem como traço significativo reconduzir-se à suspensão da pena de inactividade até decisão definitiva da acção principal de impugnação da deliberação do Senado.
O Recorrente pretende obter em sede provisória cautelar uma solução interina e antecipada da acção de impugnação da pena aplicada, evitando a suspensão do pagamento da pensão durante a pendência da acção principal e obstar ao “(..) periculum in mora de retardamento que postulará a adopção de uma providência antecipatória que antecipe parcial ou mesmo totalmente, ainda que em termos provisórios, a solução pretendida (..)” (11).
Na medida em que, do ponto de vista estrutural da providência e não apenas em sede funcional, é jurídicamente admissível atribuir à suspensão de eficácia dos actos a natureza cautelar de medida antecipatória – porque o objecto da antecipação cautelar é exactamente a hipotética solução para a controvérsia na acção principal e, nesta medida, a decisão cautelar de suspensão de eficácia do acto nada mais será do que composição provisória da lide mediante a antecipação do hipotético conteúdo da sentença definitiva da acção em que se pede a anulação ou declaração de nulidade do mesmo acto - em tese nada obsta ao enquadramento da situação concreta peticionada no quadro da providência concretamente deduzida (12), mas no domínio do artº 120º nº 1 c) e não na alínea b) que regula as providências conservatórias, sendo certo que, como é óbvio, o pressuposto do facto consumado em sede de periculum in mora está presente em ambas as categorias de medida cautelar.
*
Portanto, independentemente dos restantes requisitos – seja da alínea b) seja da alínea c) do nº 1 do artº 120º CPTA – que não importam ao caso porque não são parte do objecto do recurso, cumpre agora analisar se a factualidade levada ao probatório padece de erro na apreciação da prova por ter sido atribuído ao meio de prova um valor que ele não comporta ou deixou de lhe ser concedido o seu valor legal, em ordem a, se assim for e por substituição, concluir se a factualidade é subsumível no conceito legal de fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado.


6. perigo de retardamento e constituição de uma situação de facto consumado - artº 120º nº 1 b) e c) CPTA.

Os prejuízos na esfera jurídica do Requerente da suspensão de eficácia do acto sancionatório, na vertente de suspensão do pagamento da pensão de aposentação pelo período de um ano, e que fundamentam a alegação do periculum in mora de retardamento têm de provir das circunstâncias que enformam a esfera jurídica do interessado e delas deve fluir a demonstração de uma situação objectiva de incapacidade económica que lhe permita aguardar pela decisão definitiva da acção principal - hipotisando o sentido favorável da decisão - no sentido expresso no artigo 58º da petição inicial de que a suspensão do pagamento da pensão de aposentação significa “(..) uma drástica redução do rendimento do casal, pondo em risco a sua sobrevivência. (..)”.
Exemplificando, “(..) O “pericolo del ritardo”, como lhe chama a doutrina italiana, resulta para o demandante da satisfação tardia do direito, por causa da demora na composição da lide. Perante esta prejuízo, a tutela cautelar tem como função solucionar interina e antecipadamente a lide. É o perigo de retardamento, por exemplo, aquele que ameaça o credor de alimentos, já que enquanto aguarda a condenação na prestação de alimentos, pode correr o risco de definhar. (..)” (13).
Em sede de sentença fundamentou-se no seguinte sentido:
“(..) No caso sub judice o Requerente invoca que sem a pensão de aposentação durante o período de um ano não vai conseguir manter as despesas actuais, sendo o vencimento da sua mulher insuficiente.
Ora, o certo é que não logrou fazer prova, dessa situação, na medida em que os documentos juntos, impugnados, não fizeram prova, ainda que indiciária, dos factos alegados no que respeita ao requerente, designadamente de que o requerente só dispõe daquele rendimento, de qual o seu agregado familiar e suas despesas e encargos, para concluir a posteriori para a insuficiência ou impossibilidade de fazer face a eles sem o decretamento da presente providência. (..)”
*
De acordo com o ítem 45 das conclusões de recurso, considera o Recorrente que do processo consta documentação probatória da seguinte factualidade:
(ii) o rendimento total líquido do casal com a pensão é de € 67 .207,01
(iii) a pensão do Recorrente é de € 45 329,90
(iv) o rendimento líquido do casal, caso a pensão seja suspensa, é de € 21.877,11
(v) as despesas anuais do casal cifram-se em cerca de € 61.728,00 (cfr. doc. 8 junto aos autos)”
A fim de se ter uma noção de grandeza, convertendo para a moeda nacional antiga temos os seguintes valores:
- € 61.728,00 de despesas anuais correspondem a 12 375 000$00 esc.
- € 67.207,00 de rendimento líquido do casal correspondem a 13 474 000$00 esc.
- € 45.329,00 de pensão do Recorrente corresponde a 9 088 000$00 esc.
- € 21.877,00 de rendimento líquido do casal deduzido do valor da pensão de aposentação do Recorrente correspondem a 4 386 000$00 esc.

Salvo no respeitante ao valor da pensão de aposentação, matéria alegada no artº 44º da p.i. e levada ao ítem 4 do probatório [“A pensão indicada em 3 corresponde ao valor líquido de 2.929.,98 € (cfr. declaração da CGA a fls. 441)], todos os demais factos foram julgados não provados, com a seguinte fundamentação:
“(..) Não se logrou demonstrar, entre outros factos, que a pensão indicada em 4 do probatório é o único rendimento do requerente, qual a composição do seu agregado familiar, respectivo rendimento e despesas, pois todos os documentos apresentados estão em nome de Arícia Costa Rosa Y Alberty Ferreira. (..)”.
*
De acordo com a petição e corpo alegatório, os quesitos em causa são os seguintes:
- 46º e 50º - “Esta pensão é o único meio de subsistência do ora requerente, que lhe resta”,
- 53ª - “O rendimento líquido anual do casal é de € 61 057,22”,
- 55º - “O agregado familiar tem encargos fixos e despesas normais que ascendem a € 61 728,00”
*
Analisando os meios de prova carreados para os autos e a respectiva matéria, temos de concluir que não assiste razão ao Recorrente no que concerne ao alegado erro de apreciação da matéria de facto, pelas razões que seguem.
Em primeiro lugar o estado civil de casado prova-se por documento autêntico - assento de casamento ou a certidão de nascimento averbada com o mencionado facto – vd. artº s 1651º e 1652º do C. Civil.
Em segundo lugar, a declaração documentada de rendimentos em sede de IRS por parte do contribuinte nada mais é do que o início do procedimento dirigido ao apuramento de qualquer situação tributária - vd. artºs 59º CPPT, 78º CIRS e 71º CIRC – constituindo, por isso, um mero documento particular que evidencia o cumprimento de obrigações acessórias declarativas do sujeito passivo de imposto mas que não tem, sequer, força probatória – porque a lei fiscal não lha atribui – no domínio da matéria colectável, isto é, do quantum de rendimento fiscal declarado para efeitos de tributação por aplicação da taxa e apuramento da colecta.
Em terceiro lugar, o doc. nº 8, junto a fls. 259 a 340 dos autos, constitui o único meio de prova sobre os encargos alegados, sendo que o documento de fls. 259 é uma projecção anual de custos fixos (empregada doméstica, Natal, prestações mensais de uma viatura, etc.) manuscrita no que concerne aos valores ali referidos e os documentos de fls. 260 a 340 se referem a declarações fiscais, facturação diversa de consumos de electricidade, seguros, água, TV Cabo, PT, TMN, Crediplus, empréstimo contraído junto do BES, etc. , todos sob a forma de fotocópia simples e emitidas em nome de Arícia Costa Rosa Y Alberty Ferreira, pessoa que, no tocante à relação material controvertida, tem no processo a qualidade de terceiro relativamente ao ora Recorrente.
Do que vem dito conclui-se:
1. o doc. de fls. 259 é uma relação de projecção de despesas emitida e manuscrita por pessoa não identificada, pelo que o seu valor probatório é nulo;
2. não existe prova legal tabelada – o assento - de que o Recorrente e a pessoa em cujo nome é emitida toda a documentação de fls. 260 e 340 sejam casados entre si;
3. as fotocópias de fls. 260 a 340 são documentos particulares destituídos de qualquer efeito jurídico probatório para demonstrar quer o volume de encargos quer o rendimento líquido anual “do casal” alegados nos artigos 53º e 55º da p.i;
4. a declaração mod. 3 do IRS não constitui prova legal tabelada do casamento nem da realidade dos rendimentos fiscais declarados;
5. não se provou que a pensão de aposentação é o “único meio de subsistência que resta ao Recorrente”, alegado nos artigos 46º e 50º da p.i..

*
Por conseguinte, nada se tendo provado no tocante aos rendimentos e encargos do Recorrente, nada há a censurar ao enquadramento jurídico do discurso fundamentador em sede de sentença, que se transcreve:
“(..)Termos em que [se] conclui que não sendo evidente a procedência da acção principal, para efeitos do disposto na alínea a) do n° l do art. 120° do CPTA, e não tendo sido demonstrado o receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente que visa assegurar no processo principal, temos por não verificada uma das condições prescritas na primeira parte da alínea b) do n° l do mesmo artigo, ficando prejudicada, nos termos do art. 660°, n° 2, do CPC ex vi art. 1° do CPTA, a apreciação do restante segmento, de que não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão a formulada ou a formular no processo. (..)”.
E o mesmo ocorre no que respeita a este requisito em sede de al. c) do nº 1 do citado artº 120º, acrescentamos nós, uma vez que se admite a natureza jurídica da suspensão de eficácia dos actos administrativos no campo das providências antecipatórias de conteúdo assegurador.


7. situação de necessidade e mínimo de existência fiscal - artº 403º nº 2 CPC


Todavia, cumpre salientar que o recurso seria improcedente ainda que resultasse provada toda a factualidade alegada, na medida em que alegado rendimento remanescente de € 21.877,00 [4 386 000$00 esc.] uma vez suspenso o pagamento da pensão de aposentação, de modo algum preenche o requisito legal de decretamento da providência.
O requisito de “perigo de retardamento e constituição de uma situação de facto consumado” no domínio da incapacidade financeira do Requerente cautelar para, mantendo um trem de vida digno, aguardar o decurso do tempo até decisão definitiva da causa principal, exige a demonstração de uma situação de necessidade (pressuposto específico), por previsível ocorrência de danos susceptíveis de pôr seriamente em causa o sustento ou habitação do Requerente cautelar.
O mesmo é dizer que a prova da situação actual do Requerente cautelar - cujo agravamento, continuação ou génese a acção cautelar pretende obstar com a prova do “fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado” - há-de exprimir um contexto de vida económicamente carenciado em ordem a fundamentar a suspensão de eficácia do acto administrativo resultante na incapacidade financeira do Requerente para manter um trem de vida digno.
Ou seja, no que concerne à carência económica, o requisito do “fundado receio de retardamento e constituição de uma situação de facto consumado” estatuído no artº 120º nº 1 b) e c) CPTA move-se no mesmo domínio circunstancial do conceito de “situação de necessidade” em sede cautelar de arbitramento de quantia certa, estatuído no artº 403º nº 2 CPC.
Ambos têm por escopo afrontar aquilo que se denomina por mínimo de existência, conceito jurídico-fiscal de isenção de tributação do rendimento das pessoas singulares, de feição garantística no sentido de, para “(..) assegurar e manter intocável o mínimo necessário à manutenção com dignidade, da pessoa humana e a respectiva família [se entende que] pelo menos, o salário mínimo não deve ser tributado (..)” (14).
Em nexo de causalidade adequada, os factos provados hão-de demonstrar a relação entre a situação de necessidade que será vivida pelo Requerente cautelar pelos danos previsíveis no seu modo de vida em consequência da não suspensão de eficácia do acto conjugada com a demora na decisão definitiva da acção principal.
Temos que convir que o patamar de rendimento anual de € 21.877,00, esc. 4 386 000$00 que traduz mais ou menos 350 000$00 mensais, está longe de configurar uma situação de necessidade que ponha seriamente em causa o sustento ou habitação do Requerente cautelar ou, como alegado pelo ora Recorrente no artigo 58º da petição, ponha “em risco a sua sobrevivência”.
De modo que, como acima referido, ainda que se tivesse provado o elenco factual suscitado no presente recurso, este teria que naufragar por insusceptibilidade de preenchimento do escopo cautelar com a peticionada suspensão de eficácia da deliberação disciplinar.


Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul – 2º Juízo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo do Recorrente, fixando-se a cada a taxa de justiça em 15 (quinze) UC, reduzida a metade - artºs. 73º - D nº 3 e 73º - E nº 1 f) CCJ.



Lisboa, 31.MAR.2005,




(Cristina dos Santos)

(Teresa de Sousa)

(Coelho da Cunha)

(1) Seguimos aqui a terminologia conceptual de Isabel Celeste M. da Fonseca, Introdução ao estudo sistemático da tutela cautelar no processo administrativo, Almedina, 2002, págs. 100/109.
(2) Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 7ª edição Almedina, pág. 225.
(3) Gomes Canotilho, Obra ciada na nota (19), págs. 347 e 348.
(4) Vieira de Andrade, A justiça administrativa, Almedina, 5ª edição, pág. 391, 402/404; Mário Aroso de Almeida, O novo regime de processo nos tribunais administrativos, Almedina/2003, pág. 288/289;.
(5) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex/2ª edição, págs. 374, 395 e 397.
(6) Miguel Teixeira de Sousa, Obra citada, pág. 460.
(7) Anselmo de Castro, Processo civil declaratório, Vol. III, Coimbra/1982, pág. 142.
(8) Mário Aroso de Almeida, O novo regime de processo nos tribunais administrativos, Almedina/2003, pág. 260;
(9) Isabel Celeste M. da Fonseca, Introdução ao estudo sistemático da tutela cautelar no processo administrativo, Almedina, 2002, págs. 116/117 e 122; .
(10) Vieira de Andrade, A justiça administrativa, Almedina, 5ª edição, pág. 308.
(11) Vieira de Andrade, Obra citada na nota 10, pág. 308.
(12) Isabel Celeste M. da Fonseca, Obra citada, págs.125/128, 368 e segts.
(13) Isabel Celeste M. da Fonseca, Obra citada, pág.117.
(14) Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Vol. II, Rei dos Livros, 1997, págs. 200/201.