Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1444/12.0 BELSB
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:01/31/2018
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:ATRASO NA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
INDEMIZAÇÃO
Sumário:i) O atraso na decisão de processos judiciais, quando viola o direito a uma decisão em prazo razoável, é um facto ilícito, gerador de responsabilidade civil do Estado.

ii) Na aplicação da Convenção Europeu dos Direitos do Homem e na densificação dos respectivos conceitos – entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e danos morais indemnizáveis -, tem, necessariamente, de atender-se à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH).

iii) Segundo a jurisprudência do TEDH os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre ocorrem em praticamente todos os casos de atraso excessivo na actuação da justiça - correspondentes ao dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas num prazo razoável - merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respectiva relevância, sem prejuízo de prova em contrário ou de diferente causalidade.

iv) No que respeita ao montante da indemnização a arbitrar para ressarcimento desses danos não patrimoniais deve atender-se aos padrões fixados pela jurisprudência do TEDH, o qual atribui entre 1.000 a 1.500 Euros por cada ano de atraso injustificado.

v) Para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pela Autora e ora Recorrente com o atraso (excessivo) de cerca de 1 ano e 9 meses na tramitação do processo de inventário, tendo presente o disposto no artigo 566.º, n.º 2, do Cód. Civil, mostra-se equitativo fixar a indemnização na quantia de EUR 2.100,00.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. Relatório

Maria de …………………. propôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa contra o Estado Português, acção administrativa comum, na qual peticionou a condenação do R. ao pagamento de EUR 8.000,00, a título de indemnização por violação da obrigação de prolação de decisão judicial em prazo razoável, acrescido de juros vincendos.

Por sentença de 30.03.2017 a acção foi julgada parcialmente procedente e condenado o Estado Português ao pagamento de EUR 1.050,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidos dos respectivos juros legais aplicáveis vincendos até efectivo e integral pagamento à A.. Quanto ao remanescente do pedido formulado pela A., foi o R. absolvido do pedido.

Nas alegações do recurso interposto a A., ora Recorrente, conclui do seguinte modo:

1. O Estado deve pagar 8.000,00€ por danos morais à A. e juros desde a citação; não se teve em conta a duração do processo e a deste no TAF: 11 anos 2 meses +5 anos= 16 ANOS!! os danos presumem-se, como o Tribunal reconhece: violou o artigo 6°, nº 1 da Convenção ao fixar montante miserabilista.

2. Está provado que em 9-12-1999 a A. instaurou Inventário, que pendeu até 31-1-2011, num total de 11 anos 2 meses e 22 dias; estes autos pendem desde 2012 e em 2017 discute-se o direito a ser ressarcida da morosidade processual....o Estado Português violou a sua obrigação de proferir Decisão jurisdicional efectiva e exequível "em prazo razoável': art.s 20 da Lei Fundamental, 6° - 1 da Convenção Europeia, 2° e 12° da lei 67/2007 de 31/12 2º CPC;

3. A Jurisprudência é no sentido de condenar face ao tempo do processo, em quantia razoável, à razão de 1.000.00€ por ano de duração do processo; a prova documental do processo atrasado fala de per si: PRESUMEM-SE os DANOS e o Tribunal Europeu condena através de indemnização justa e equitativa, pela morosidade da Justiça face ao art° 6°- 1 da Convenção, sem qualquer necessidade de prova por se tratar de facto notório, presumindo-os os danos morais:

Ac. Valada de Matos c. Portugal, Ac 73798/13 de 29-10-2015: Portugal condenado a pagar 11.930,00€ por pendência de 9 anos e 11 meses –in www.direitos humanos.gddc.pt … de conhecimento oficioso;

4. O Estado deve pagar 8.000 € a A. cfr. arts 6° da CEDH e 20° CRP: o Tribunal Europeu tem condenado Portugal pela morosidade habitual da Justiça; recentemente, o Senhor Presidente da Republica, Sr Doutor Marcelo Rebelo de Sousa alertou para a "lentidão da Justiça"; a Sra. Ministra da Justiça, sra. Dra. Francisca Van Dunem alertou que a "criminalidade demora cinco anos a ser julgada, prazo não razoável. "-in Diário de Noticias de 11-8-2009; 11 ANOS 2 MESES e 22 DIAS É PRAZO NÃO RAZOÁVEL O QUE ALIÁS É RECONHECIDO NA SENTENÇA RECORRIDA.

5. se no CASO "VALADAS DE MATOS"- Ac. Valada de Matos c. Portugal, Ac. 73798/13 de 29- 10-2015: Portugal foi condenado a pagar 11.930,00€ por pendencia de 9 anos e 11 meses- in www.direitoshumanos. gddc.pt. ....de conhecimento oficioso - PORQUE RAZÃO NÃO É O RÉU CONDENAOO A PAGAR 8.000,00 E POR PENDENCIA DE 11ANOS E 2 MESES ?...

6. 8.000.00 € É VALOR PROPORCIONADO AOS 11 ANOS E 2 MESES FACE AOS 11.930,00€ POR 9 ANOS E 11 MESES NO CASO "VALADAS DE MATOS"..; deve ser o Estado a pagar as custas e não a A. pois quem deu causa ao atraso do processo que demorou 11 anos e 2 meses e agora mais 5 anos... é o próprio Estado!


O Ministério Público, em representação do Estado, ora Recorrido apresentou recurso subordinado. Concluiu a sua alegação do seguinte modo:

1.ª - Tendo a R. fundado a sua pretensão na demora do processo de inventário que correu termos no Tribunal Judicial de Alenquer, invocando na petição inicial que o prazo razoável para a duração da acção tinha sido excedido em oito anos, a alegação em sede de recurso que a indemnização de € 8.000,00 respeita à duração global do processo de inventário, 11 anos 2 meses e 22 dias e ao tempo de duração da própria acção indemnizatória, consubstancia uma alteração da causa de pedir que não é admissível.

2 .ª - Impondo-se referir no que respeita à presente acção de indemnização que não foi ultrapassado o tempo médio de duração de uma acção de responsabilidade civil.

3.ª - Por outro lado, tendo sido considerados não provados os danos morais invocados pela Recorrente, dando-se como não provada matéria constante dos temas da prova, não há necessidade de recorrer a disposições legais relativas ao chamado ónus da prova, auxiliares do tribunal apenas em caso de dúvida.

4 .ª - Acresce que, tratando-se de uma acção de responsabilidade civil o lesado não fica automaticamente dispensado de efectuar prova dos danos, mormente dos danos não patrimoniais, pois não há indemnização sem prova dos danos, um dos requisitos essenciais da obrigação indemnizatória.

5 .ª - Sublinhando-se que, como se afirma, na sentença, dos autos não resulta uma qualquer especial urgência na obtenção da decisão pela A., ora R., que não aquela que é inerente à expectativa de uma qualquer pessoa que intenta uma acção judicial.

6 .ª- Pelo exposto, impõe-se concluir que a entender-se que se verificam os fundamentos da responsabilidade civil, o que não se concede, a indemnização arbitrada não pode ser considerada meramente simbólica.

7 .ª – Pelo que, deve o presente recurso ser julgado improcedente.

Neste Tribunal foi ordenada a notificação da A. para, querendo, contra-alegar no recurso subordinado, ao que a mesma renunciou (cfr. req. de fls. 153).



Com dispensa dos vistos legais, importa apreciar e decidir.




I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar

I.1.1. Do recurso principal

Se o Tribunal a quo errou na fixação do montante indemnizatório arbitrado.

I.1.2. Do recurso subordinado

Se o Tribunal a quo errou ao considerar existir fundamento para responsabilidade civil do Estado por atraso na justiça e assim ter condenado o mesmo no pagamento de uma indemnização de EUR 1.050,00 a título de danos não patrimoniais.



II. Fundamentação

II.1. De facto

Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto:

1. Em 09.12.1999, a A. apresentou, junto do Tribunal Judicial de Alenquer, um requerimento de abertura de inventário, autuado sob o n.º 373/1999, em virtude do falecimento de João …………….., aí solicitando a sua citação para ser nomeada cabeça-de-casal e para prestação de declarações (cf. cópia do requerimento junta a fls. 4 e 5 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

2. Em 15.12.1999, foi proferido despacho pelo Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999, instando a A. a juntar a certidão de assento de óbito aos autos, no prazo de 10 dias (cf. cópia do despacho junta a fls. 21 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

3. Em 07.01.2000, a A. apresentou um requerimento juntando a certidão do assento de óbito (cf. cópia do requerimento junta a fls. 22 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

4. Em 14.01.2000, foi proferido despacho pelo Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999, admitindo liminarmente o pedido de apoio judiciário formulado pela A. e determinando o pedido de informações às autoridades competentes, a notificação da A. para juntar documento comprovativo da sua situação de desemprego, a citação dos interessados e a nomeação da A. como cabeça-de-casal, mais ordenando “Depreque o seu compromisso de honra e a tomada das suas declarações nos termos do artigo 1340º do CPC” (cf. cópia do despacho junta a fls. 24 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

5. Em 27.01.2000, foram autuados no Tribunal Judicial de Torres Vedras, sob o n.º 31/2000, os autos de carta precatória, tendentes ao compromisso de honra e tomada de declarações da A. (cf. cópia da autuação junta a fls. 30 e 31 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

6. Em 17.02.2000, a A. prestou, junto do Tribunal Judicial de Torres Vedras, compromisso de honra, mais tendo este colhido as suas declarações (cf. cópia do auto de compromisso de honra e declarações iniciais junta a fls. 53 e 53-v da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

7. Em 30.03.2000, foi proferido despacho pelo Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999, determinando a notificação da A. para juntar aos autos a relação de bens, no prazo de 5 dias (cf. cópia despacho do requerimento junta a fls. 54-v da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

8. Em 10.04.2000, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de Alenquer, solicitando a junção da relação de bens, do qual se ressaltam as verbas identificadas sob os n.os 20 e 21, descritas enquanto “As importâncias de duzentos e treze mil, quinhentos e cinquenta e oito escudos e de sete milhões trezentos e cinquenta mil oitocentos e oitenta e oito escudos no valor global de Escudos: sete milhões quinhentos e sessenta e quatro mil quatrocentos e quarenta e seis escudos que constituíam o saldo em capital e juros vencidos até à data do falecimento do autor da herança, da conta de depósito à ordem (solidária) sob os n.º. ………………- e conta de depósito a prazo nº. ………….- Constituídas no Banco …………. – Agência ….. // 7.564.446$00” e “A importância de oitocentos e noventa e cinco escudos quatrocentos e trinta e dois escudos e vinte centavos que constituía o saldo da conta de depósito à ordem e aplicação de fundo de investimento existente na Caixa ………… de A.............. // 895.432$20” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 55 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

9. Em 03.05.2000, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação da A. para juntar aos autos certidão da Conservatória do Registo Predial e certidão matricial de um conjunto de bens identificados na relação de bens (cf. cópia do despacho junta a fls. 62 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

10. Em 24.05.2000, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., solicitando a junção de quatro certidões do registo predial (cf. cópia do requerimento junta a fls. 62-v da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

11. Em 12.06.2000, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação da A. para dar inteiro cumprimento ao despacho referido no ponto 9. supra, juntando aos autos certidão matricial dos bens aí identificados (cf. cópia do despacho junta a fls. 78 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

12. Em 05.09.2000, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., solicitando a junção de quatro documentos (cf. cópia do requerimento junta a fls. 79 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

13. Em 04.10.2000, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando que fosse dado cumprimento ao disposto nos artigos 1341.º, 1342.º e 1348.º do CPC (cf. cópia do despacho junta a fls. 110 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

14. Em 04.12.2000, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. uma reclamação apresentada por Luís ……………, aí pugnando, a final, pela relação dos “bens da herança não partilhada da pré-falecida esposa do ora inventariado”, pela “exclusão dos bens relacionados sob as verbas n.os 20 e 21 da relação de bens apresentada e, bem assim, do prédio urbano correspondente ao antigo artigo 16 da freguesia da Aldeia ,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,, indevidamente relacionado como fazendo parte do prédio que constitui a verba n.º 24 da relação de bens apresentada” e pela correcção da “descrição do prédio relacionado sob a verba n.º 24 e completar-se a descrição quer deste prédio, quer do relacionado sob a verba n.º 23” (cf. cópia da reclamação junta entre fls. 95-v e 97-v da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

15. Em 05.01.2001, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., aí pugnando, em suma, pela improcedência dos pedidos formulados por Luís ………….. na reclamação referida no ponto anterior, mais solicitando que este fosse instado a juntar aos autos documentação comprovativa de que os dinheiros constantes das verbas 20 e 21 foram depositados pela sua mãe e pela irmã do inventariado (cf. cópia do requerimento junta entre fls. 183 e 186 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

16. Em 08.02.2001, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação de Luís……………..para, no prazo de 15 dias, juntar aos autos documentos comprovativos de que os dinheiros constantes das verbas 20 e 21 foram depositados pela sua mãe (cf. cópia do despacho junta a fls. 193 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

17. Em 21.03.2001, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, renovando o despacho referido no ponto anterior, com cominação de multa se nada fosse dito no prazo de 15 dias (cf. cópia do despacho junta a fls. 195 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

18. Em 30.04.2001, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. um requerimento apresentado por Luís ……………………………, dando conta da impossibilidade em juntar aos autos a referida documentação (cf. cópia do requerimento junta a fls. 196 e 197 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

19. Em 05.06.2001, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação do requerimento referido no ponto anterior aos interessados (cf. cópia do despacho junta a fls. 199 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

20. Em 12.10.2001, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, ordenando a realização de um conjunto de diligências com vista a comprovar a propriedade dos montantes depositados em contas bancárias, mais determinando que a Caixa …………. fosse oficiada a fim de informar se a conta bancária era solidária e de identificar os restantes titulares da mesma (cf. cópia do despacho junta a fls. 199 e 200 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

21. Em 12.11.2001, o 1.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............. deu cumprimento ao despacho referido no ponto anterior, oficiando o 2.º Juízo do mesmo Tribunal, o Senhor Gerente do Banco ………….– ……… e o Senhor Gerente da …………………………… – A.............. (cf. cópias dos ofícios juntas entre fls. 202 e 204 dos autos, documentos que se dão por integralmente reproduzidos).

22. Em 03.12.2001, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. um requerimento apresentado pela gerência da agência do Banco ………………, pelo qual dá conta de que a “Caixa ……….. S.A., na qual foi incorporado o ex-Banco ……………… S.A. por fusão registada em 23 de Julho de 2001, (…) vem informar que as informações solicitadas (…) estão abrangidas pelo segredo bancário a que esta instituição se encontra obrigada”, que apreciará “a entrega das referidas informações mediante autorização a nós dirigida pelos titulares do direito ao segredo bancário, quanto às mesmas contas” e que “as informações e documentos que se reportem a datas anteriores aos últimos dez anos não poderão de qualquer forma ser fornecidas, por os respectivos suportes terem já sido destruídos”, ao passo que “Quanto às que se reportam aos últimos dez anos, encontram-se [sic] (…) em fichas microfilmadas, cuja localização e consulta, em arquivos territorialmente dispersos, não será possível em prazo inferior a cerca de 30 dias” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 209 e 210 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

23. Em 23.02.2002, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. um requerimento apresentado pela gerência da agência da Caixa ………….. de A.............., pelo qual dá conta de que “a conta em nome de João ………………….. foi aberta em 1990-05-09, com um valor de 15.000$00, cujo documento já não temos em arquivo. Em 1991-02-28 foi efectuado um depósito em cheque no valor de Esc. 1.013.590$00, cuja fotocópia anexo, sendo que na mesma data esse valor foi aplicado num Fundo de Investimento, cujos rendimentos eram creditados na conta à ordem, não tendo havido outros depósitos. // Mais informo que o referido senhor era o único titular da conta” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 211 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

24. Em 14.03.2002, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação dos requerimentos referidos nos dois pontos anteriores aos interessados (cf. cópia do despacho junta a fls. 213 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

25. Em 20.01.2003, o despacho referido no ponto anterior foi notificado aos interessados (cf. cópias dos ofícios juntas a fls. 214 e 215 da certidão, documentos que se dão por integralmente reproduzidos).

26. Em 27.01.2003, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., aí peticionando que a Caixa ………….. fosse oficiada a enviar “cópia de todos os depósitos – cheques e outros – com identificação do(s) depositante(s)”, na medida em que mesmos se revelariam “essenciais para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 216 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

27. Em 21.02.2003, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando que se procedesse como requerido pela A. (cf. cópia do despacho junta a fls. 218 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

28. Em 19.05.2003, o despacho referido no ponto anterior foi notificado à Caixa Geral de Depósitos (cf. cópia do ofício junta a fls. 219 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

29. Em 11.12.2003, o 1.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............. remeteu novo ofício à Caixa Geral de Depósitos, com o assunto “Insistência”, com vista ao cumprimento do despacho referido no ponto 27. supra (cf. cópia do ofício junta a fls. 229 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

30. Em 03.02.2004, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. um requerimento apresentado pela gerência da agência da Caixa ………….. de A.............., pelo qual dá conta de que “o Sº João …………., possui conta aberta nesta Agência desde 09-05-1990, com o nº ………….. (ordem) e nº ………….. (títulos), encontrando-se as contas saldadas “a zero” não registando movimentação desde 1999/06/09” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 223 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

31. Em 16.06.2004, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., aí “renova[ndo] o pedido formulado em 5 Janeiro 2001 in fine (…) devendo o interessado Luís ........... responder em 5 (cinco) dias e, findo tal prazo, prosseguirem os autos, mantendo-se relacionadas as verbas 20 e 21 e designada data para a conferência de interessados” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 276 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

32. Em 28.09.2005, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando que se solicitasse à Caixa …………………. a remessa aos autos do extracto das contas em causa desde a sua constituição até 05.06.1999 e informação sobre se após essa data foram registados movimentos e, em caso afirmativo, qual a identidade do seu autor e destino (cf. cópia do despacho junta a fls. 237 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

33. Em 29.05.2006, o despacho referido no ponto anterior foi notificado à Caixa Geral de Depósitos (cf. cópia do ofício junta a fls. 238 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

34. Em 17.11.2006, o 1.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............. remeteu novo ofício à Caixa ……………., com o assunto “Insistência”, com vista ao cumprimento do despacho referido no ponto 32. supra (cf. cópia do ofício junta a fls. 239 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

35. Em 22.02.2007, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho com o seguinte teor “Insista, por confidencial” (cf. cópia do despacho junta a fls. 240 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

36. Em 26.02.2007, o 1.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............. remeteu novo ofício à Caixa …………….., com o assunto “Insistência”, com a menção “Confidencial”, com vista ao cumprimento do despacho referido no ponto 32. supra (cf. cópia do ofício junta a fls. 239 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

37. Em 09.03.2007, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. um requerimento apresentado pela gerência da agência da Caixa ……………. de A.............., dando nota da junção do “movimento da conta sediada neste balcão e copia do respectivo levantamento em referência. Mais informa-mos [sic] que relativo às contas sediadas na agência da M………….. foi enviada cópia do referido ofício para resposta a esse Tribunal, assim solicitamos que na falta da mesma o pedido fosse feito directamente à agência da M……..” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 242 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

38. Em 21.03.2007, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, renovando o despacho referido no ponto 32. supra, “agora dirigido à agência da C……. em M……….” (cf. cópia do despacho junta a fls. 247 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

39. Em 27.03.2007, deu entrada no Tribunal Judicial de A.............. um requerimento apresentado pela gerência da agência da Caixa ……………., juntando um conjunto de documentos e informando “que a 2ª titular existe desde a abertura das contas na agência de M...........” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 248 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

40. Em 17.04.2007, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação da A. e demais interessados do teor dos documentos referidos nos pontos 37. e 39. supra (cf. cópia do despacho junta a fls. 358 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

41. Em 13.06.2007, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, determinando a notificação da A. e co-interessado para, no prazo de 10 dias, esclarecerem a proveniência dos valores respeitantes a um conjunto de movimentos identificados na documentação remetida pela Caixa …………….., alegadamente atinente a uma “adega cooperativa” e, bem assim, para solicitar ao 2.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............. os autos de inventário identificados sob o n.º 243/1997 (cf. cópia do despacho junta a fls. 363 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

42. Em 30.07.2007, o 1.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............. deu cumprimento ao despacho referido no ponto anterior (cf. cópias dos ofícios juntas entre fls. 364 e 366 da certidão, documentos que se dão por integralmente reproduzidos).

43. Em 10.09.2007, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., aí referindo que “os valores provenientes da “adega cooperativa” se referem a venda de uvas para a adega pelo inventariado provenientes da exploração da vinha que este cultivava” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 367 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

44. Em 11.09.2007, foi lavrado termo de conclusão no âmbito do processo n.º 373/1999 (cf. cópia do termo junta a fls. 369 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

45. Em 30.03.2009, foi lavrado termo de cobrança no âmbito do processo n.º 373/1999, “a fim de os presentes autos serem conclusos à Mmª Juiz de Círculo (em regime de acumulação)” (cf. cópia do termo junta a fls. 369 da certidão).

46. Em 30.09.2009, a Senhora Juiz titular do processo proferiu decisão, julgando improcedente a reclamação apresentada pelo interessado Luís ……………… e, consequentemente, mantendo a relação de bens apresentada pela A., mais determinando a conclusão oportuna dos autos com vista à designação de data para realização da conferência de interessados (cf. cópia da decisão junta entre fls. 370 e 373 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

47. Em 19.10.2009, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., requerendo a junção aos autos de sentença proferida pelo Tribunal Judicial de ……………, “na qual foi Doutamente decidido que os valores constantes das Verbas 20 e 21 pertenciam ao falecido JOÃO ………………… e sendo o interessado Luís ……….. condenado a restituí-las à herança” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 377 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

48. Em 02.11.2009, Luís ……………….. interpôs recurso de agravo da decisão referida no ponto 46. supra junto do Tribunal Judicial de A.............., mais requerendo a extracção de certidão de elementos do processo n.º 373/1999 com vista a instruir o mesmo (cf. cópia do requerimento de recurso junta a fls. 399 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

49. Em 05.07.2010, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., requerendo a junção aos autos de cópia de acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, confirmando a decisão referida no ponto 47. supra (cf. cópia do requerimento junta a fls. 409 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

50. Em 16.11.2010, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., requerendo a designação de data para conferência de interessados, sugerindo os dias 24.11, 09.12, 10.12, 05.01, 06.01, 10.01, 11.01, 14.01, 18.01 ou 31.01 (cf. cópia do requerimento junta a fls. 433 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

51. Em 26.11.2010, a Senhora Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, designando a conferência de interessados para 19.01.2011 (cf. cópia do despacho junta a fls. 435 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

52. Em 02.12.2010, a A. apresentou um requerimento junto do Tribunal Judicial de A.............., requerendo a antecipação ou adiamento da diligência referida no ponto anterior, sugerindo os dias 18.01, 20.01, 21.01 ou 31.01 (cf. cópia do requerimento junta a fls. 439 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

53. Em 16.12.2010, a Senhora Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu despacho, designando a conferência de interessados para 31.01.2011 (cf. cópia do despacho junta a fls. 435 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

54. Em 31.01.2011, foi realizada a conferência de interessados no âmbito do processo n.º 373/1999, aí tendo os interessados acordado excluir da relação de bens todas as verbas aí descritas, à excepção dos n.os 20 e 21, as quais foram adjudicadas à A., mais tendo a Senhora Juiz proferido sentença homologatória de tal acordo (cf. cópia da acta junta a fls. 448 e 449 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

55. Em 14.02.2011, o processo n.º 373/1999 transitou em julgado (cf. cópia de certidão junta a fls. 452 da certidão, documento que se dá por integralmente reproduzido).

56. Em 12.06.2012, a A. apresentou a juízo a petição inicial dos presentes autos de acção administrativa comum (cf. comprovativo de entrega de documento junto a fls. 1 dos autos).

Não resultou provado que:

A. A A. se tenha mantido numa situação de incerteza entre 1999 e 2011.

B. A A. seja doente.

C. A A. não trabalhe.

D. A A. viva a expensas do seu companheiro.

E. A A. tenha sofrido ansiedade, incerteza, angústia, frustração, depressão e impaciência entre 1999 e 2011.

F. A A. tenha telefonado dezenas de vezes ao seu mandatário a fim de aferir o estado do processo de inventário.

No tribunal a quo foi exarada a seguinte motivação da decisão sobre a matéria de facto:

A prova dos factos fixados supra assenta no teor das alegações produzidas pelas partes e dos documentos juntos aos autos, conforme referido a respeito de cada facto.

Já os factos não provados A. a F. supra decorrem da sua impugnação pelo R., em sede de contestação apresentada, aliada à circunstância de nenhuma das partes ter apresentado qualquer meio de prova a esse respeito.



II.2. De direito

II.2.1. Do recurso principal

A questão colocada no recurso pela Autora é tão-somente a de saber se o tribunal a quo errou no arbitramento da indemnização julgada devida, nenhuma outra crítica vindo dirigida contra a sentença recorrida. Com efeito, a Autora e aqui recorrente, não impugna a matéria de facto, nem invoca erro de julgamento acerca da factualidade levada ao probatório.

Por outro lado, a Autora também não contesta a sentença recorrida na parte em que nesta foi o Estado Português absolvido do pedido, pelo que o recurso tem como objecto válido apenas a decisão de condenação do Estado no pagamento à A. da quantia de EUR 1.050,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidos dos respectivos juros legais aplicáveis vincendos até efectivo e integral pagamento.

O recurso assenta, pois, numa divergência quanto ao valor da indemnização que foi arbitrado.

Vejamos então, para o que importa recapitular o discurso fundamentador constante, nesse capítulo, na sentença recorrida:

O princípio da responsabilização civil do Estado decorre, prima facie, do disposto no artigo 22.º da CRP, segundo o qual “O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem”.

Malgrado o Decreto-Lei n.º 48051, de 21.11.1967 – diploma que regulava a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio de actos de gestão pública e que se encontrava ainda em vigor à data da propositura da acção de inventário ora em crise – circunscrever o seu âmbito de aplicação, essencialmente, ao exercício da função administrativa, a jurisprudência e doutrina vieram a consolidar o entendimento de que o supracitado artigo 22.º da CRP se afiguraria de aplicação directa, permitindo, assim, aos interessados demandar o Estado pelos danos que resultassem das funções legislativa e jurisdicional prosseguidas por este último (neste sentido, vide, a título exemplificativo, o acórdão prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 08.09.2009, no âmbito do processo 368/09.3YFLSB).

De harmonia com o que antecede, o legislador veio a consagrar expressamente, nos artigos 12.º e 13.º do RRCEE (regime jurídico já vigente quando da propositura da presente acção administrativa comum pela A.), a responsabilidade civil do Estado pelos danos decorrentes do exercício da função jurisdicional.

Neste âmbito, estatui o artigo 12.º do RRCEE ser “aplicável aos danos ilicitamente causados pela administração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa” (sublinhado nosso).

O direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável encontra, de resto, guarida constitucional expressa no n.º 4 do artigo 20.º da CRP, o qual estabelece que “Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”.

Por seu turno, e atento o disposto no n.º 2 do artigo 8.º do texto constitucional, importa também compulsar o n.º 1 do artigo 6.º da CEDH, aprovada para ratificação pela Lei n.º 65/78, de 13.10, com depósito do respectivo instrumento em 09.11.1978, conforme aviso publicado no DR, 1.ª Série, de 21.01.1979, nos termos do qual “Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. (…)”.

Aqui chegados, cumpre, em face do que antecede, extrair, a título intercalar, um duplo corolário: qualquer pessoa tem o direito a obter uma decisão judicial em prazo razoável e, bem assim, a recorrer aos tribunais, por forma a obter a responsabilização civil do Estado, em caso de violação desse mesmo direito.

Tal como é hoje jurisprudência pacífica, o apuramento da responsabilidade civil extracontratual do “Estado-Juiz”, em casos de atraso na justiça, não se basta com a mera constatação objectiva de que os prazos legais para a prática de actos jurisdicionais foram incumpridos: ao invés, esse apuramento encontra-se adstrito à observância cumulativa dos pressupostos do facto, da ilicitude, da culpa, do dano e do nexo de causalidade entre o facto e o dano – neste sentido, vide, a título exemplificativo, entre muitos outros, o aresto prolatado pelo Supremo Tribunal Administrativo, ou “STA”, em 21.05.2015, no âmbito do processo n.º 072/14.

Atentos os termos em que a A. formula a sua pretensão, bem como a causa de pedir em que a mesma é estribada, cumpre apreciar se esses pressupostos se encontram ou não observados, in casu.

III. 2.1. Da violação do direito à obtenção de decisão judicial em prazo razoável

As normas constantes do artigo 20.º, n.º 4, da CRP e do artigo 6.º, n.º 1, da CEDH, respeitantes ao direito de obter uma decisão judicial em prazo razoável, recorrem a uma formulação necessariamente aberta, que carece de concretização em função dos contornos específicos de cada caso.

A este respeito, importa assinalar que o n.º 1 do artigo 46.º da CEDH consagra a força vinculativa das decisões prolatadas pelo TEDH para os Estados Contratantes da referida Convenção.

Assim, é inequívoco que os entendimentos expendidos por aquele órgão jurisdicional se revelam um elemento hermenêutico de maior importância a atender, com vista à densificação, interpretação e aplicação das normas vertidas na CEDH.

Ora, da extensa jurisprudência produzida pelo TEDH a respeito do n.º 1 do artigo 6.º da CEDH citado supra, é possível extrair quatro crivos base para aferir a razoabilidade da duração de um processo:

(a) A complexidade do processo;

(b) O comportamento das partes;

(c) A actuação das autoridades competentes no processo; e

(d) O assunto que é discutido no processo e a importância que o mesmo reveste para o respectivo autor.

(vide, neste sentido, a título exemplificativo, os acórdãos proferidos pelo TEDH em 06.04.2000, processo n.º 35382/97, COMINGERSOLL S.A. v. PORTUGAL, ou em

08.06.2006, processo n.º 75529/01, SÜRMELI v. GERMANY, disponíveis para consulta online em http://hudoc.echr.coe.int/eng#).

Reconhecendo a especial relevância interpretativa desta jurisprudência, nos termos em que acima se fez menção, o STA veio, no acórdão prolatado em 09.10.2008, no âmbito do processo n.º 0319/08, preconizar uma metodologia com vista à apreciação da razoabilidade da duração de um processo, à qual se adere sem reservas e não pode, como tal, deixar de aqui se citar integralmente.

Assim, por forma a determinar se se excedeu ou não o prazo razoável para a prolação de decisão, considera o STA que:

“Esta determinação tem de adoptar como primeiro critério o que resulta do elemento textual, isto é, a razoabilidade, o que nos remete para uma análise global, de conjunto da situação processual dos autos em que o demandante se queixa do atraso e não para os seus pormenores e para os prazos de cada fase e momento processual.

São de excluir desde logo da possibilidade de servir de esteio à apreciação os atrasos que tenham sido provocados pela própria parte que se queixa da demora.

Deve em seguida passar a analisar-se na globalidade o tempo de duração da acção e o seu estado e, se a conclusão que se recolher deste conspecto for clara e seguramente no sentido de que foi ultrapassado o prazo razoável não deveremos perder-nos na floresta dos meandros processuais à procura de saber se foi ou não cumprido religiosamente cada um dos prazos dos actos daquele percurso. Uma situação deste tipo pressupõe evidentemente uma opinião praticamente unânime de um universo de apreciadores que o julgador pode prefigurar e portanto ocorre apenas quando a demora processual seja chocante, inaceitável, para os critérios do homem comum e das suas expectativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça. Mas, existem casos destes.

É de sublinhar neste ponto que em alguns casos de claro excesso do prazo razoável poderia porventura o método analítico de cada acto processual e respectivo prazo conduzir à conclusão de que não houve atrasos, mas nem assim se pode infirmar a conclusão do excesso injustificado porque a ser assim teria o Estado que prover a criação de outros ou diferentes meios, mecanismos, prazos, organização, para atingir o objectivo de administrar a justiça em prazo razoável.

Numa segunda hipótese vemos aqueles casos em que no conjunto do meio processual e do tempo que tardou, atendendo a aspectos como a complexidade do caso e o enxerto de incidentes indispensáveis, haja de concluir-se que se tratou ainda de um prazo razoável.

Também neste caso, como no antecedente se deve evitar conceder relevância, sequer analítica ao que se passou concretamente com os actos atomísticos que preenchem o processo e irreleva se houve um atraso na secretaria ou de um magistrado se ele não determinou a ultrapassagem do tempo razoável para a decisão da causa.

Uma terceira hipótese contempla aqueles casos em que é ultrapassada a duração média daquele tipo de processos, mas não existe uma demora que se afaste profundamente daquela média nem do tempo que seria expectável por um destinatário médio bem colocado para esta apreciação e o processo teve relativa complexidade e incidentes de modo que se podem colocar dúvidas quanto a determinar o que seria o prazo razoável naquela situação.

Neste grupo de casos parece que, ao lado de outros o critério analítico do cumprimento ou não dos prazos processuais pode desempenhar um papel relevante.” (sublinhado nosso).

Ora, no caso dos autos, resultou provado que a A. requereu, em 09.12.1999, a abertura de inventário perante o Tribunal Judicial de A.............., cujo processo, autuado sob o n.º 373/1999, correu termos até à prolação de decisão em 31.01.2011. [sublinhado nosso]

Assim, e diferentemente do que alega a A., esta não esperou doze anos pela prolação de decisão, tendo, em rigor, aqueles autos corrido os seus termos durante um período de onze anos, dois meses e vinte e dois dias.

Não obstante o período indicado consubstanciar um hiato temporal inquestionavelmente dilatado, não é possível a este Tribunal afirmar que o mesmo se revele capaz de reunir “uma opinião praticamente unânime de um universo de apreciadores que o julgador pode prefigurar” no sentido de que tal “demora processual seja chocante, inaceitável, para os critérios do homem comum e das suas expectativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça”, conforme refere o STA no aresto a que retro se aludiu.

Na verdade, a experiência diz-nos que os processos de inventário não raras vezes demoram vários anos – em alguns casos, décadas – a serem solucionados, em virtude das diferentes vicissitudes com que se deparam, potenciadas por pesadas tarefas instrutórias a levar a cabo pelo julgador e pela multiplicidade de interessados no processo.

Daí que um processo de inventário que correu termos durante um período de onze anos, dois meses e vinte e dois dias não possa, na perspectiva deste Tribunal, ser reconduzido, sem mais, ao primeiro critério enunciado pelo STA para aferir a razoabilidade do prazo para prolação de decisão, o qual tem por referência a “análise global, de conjunto da situação processual dos autos em que o demandante se queixa do atraso”. [idem]

Urge, então, perscrutar se os autos de inventário sub judice são subsumíveis aos segundo ou terceiro crivos gizados por aquele órgão jurisdicional, por forma a determinar se o R. terá ou não violado o direito da A. à obtenção de uma decisão em prazo razoável.

Vejamos:

Tal como se referiu, a A. intentou a acção de inventário ora em crise em 09.12.1999, junto do Tribunal Judicial de A.............. (cf. facto 1. firmado supra).

De seguida, e até à apresentação de reclamação pelo interessado Luís ……………….., em 04.12.2000 (cf. facto 14.) – no âmbito da qual requeria, entre outras pretensões, a “exclusão dos bens relacionados sob as verbas n.os 20 e 21 da relação de bens apresentada” – constata-se que o processo foi tramitado de forma perfeitamente ordinária, sem qualquer anomalia a assinalar.

Assim, a A. prestou, em 17.02.2000, compromisso de honra junto do Tribunal Judicial de Torres Vedras, o qual colheu, igualmente, as suas declarações, mais tendo a parte junto aos autos de inventário a relação de bens em 10.04.2000, posteriormente complementada, a pedido do Senhor Juiz titular do processo, com os documentos apresentados em 24.05.2000 e 05.09.2000 (cf. pontos 6. a 12. da matéria de facto que acima se deu por assente).

Salienta-se, assim, que a prestação do compromisso de honra, a tomada de declarações da requerente do inventário, a apresentação da relação de bens regularmente instruída, a citação dos interessados no processo de inventário e a consequente reclamação apresentada por Luís …………….. tiveram todos eles lugar no espaço de um ano contado da propositura de tais autos. [sublinhado nosso]

Todavia, é com a dedução daquela reclamação pelo interessado Luís …….. e com a respectiva resposta por parte da ora A. (factos 14. e 15.) que se começam a registar anormalidades que vieram, ulteriormente, a ditar a extensão dos autos de inventário – anormalidades essas que, adianta-se já, se ligam quase exclusivamente à instrução da reclamação. [idem] Senão vejamos:

Em 08.02.2001, o Senhor Juiz titular do processo n.º 373/1999 proferiu um despacho, determinando a notificação do interessado Luís ………para, no prazo de 15 dias, juntar aos autos documentos comprovativos de que os dinheiros constantes das verbas 20 e 21 da relação de bens haviam sido depositados pela sua mãe – despacho esse que, na ausência de resposta da parte, foi renovado em 21.03.2001, sob pena de cominação de multa (cf. factos 16. e 17. firmados supra).

Em 30.04.2001, o interessado Luís ........... viria a apresentar um requerimento dando conta da impossibilidade em satisfazer o pedido que lhe havia sido endereçado pelo Tribunal (cf. facto 18.).

Notificada a ora A. deste mesmo requerimento sem que nada viesse aduzir, o Tribunal proferiu, em 12.10.2001, novo despacho determinando a realização de um conjunto de diligências com vista a comprovar a propriedade dos montantes depositados em contas bancárias, mais determinando que a Caixa Geral de Depósitos fosse oficiada a fim de informar se a conta bancária era solidária e de identificar os restantes titulares da mesma – como, de resto, lhe impunha o disposto no n.º 3 do artigo 265.º do CPC, na redacção então em vigor –, ao qual as agências daquela entidade bancária de M........... e A.............. vieram responder, em 03.12.2001 e 23.02.2002, nos termos consignados nos pontos 19. a 23. da matéria de facto que acima se firmou.

Notificada de tais informações, veio a A., através de requerimento apresentado em 27.01.2003, peticionar que a Caixa Geral de Depósitos fosse oficiada a enviar “cópia de todos os depósitos – cheques e outros – com identificação do(s) depositante(s)”, na medida em que mesmos se revelariam “essenciais para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa” (cf. facto 26. fixado supra) – requerimento esse deferido pelo Senhor Juiz titular do processo, em 21.02.2003, tendo então o Tribunal remetido ofícios à Caixa …………. em 19.05.2003 e em 11.12.2003 (insistência), com vista a tal fim (cf. factos 26. a 29. supra).

Em 30.02.2004, a agência da Caixa Geral de Depósitos de A.............. remeteu aos autos de inventário em apreço um requerimento pelo qual se limitava a dar conta de que “o Sº João ……….., possui conta aberta nesta Agência desde 09-05-1990, com o nº 0039/016951/500 (ordem) e nº 0039/016951/844 (títulos), encontrando-se as contas saldadas “a zero” não registando movimentação desde 1999/06/09” (cf. facto 30.).

Neste contexto, o Senhor Juiz titular do processo proferiu, em 28.09.2005, novo despacho solicitando à …………. a remessa aos autos do extracto das contas em causa desde a sua constituição até 05.06.1999 e informação sobre se após essa data foram registados movimentos e, em caso afirmativo, qual a identidade do seu autor e destino, o qual lhe foi remetido em 29.05.2006, em 17.11.2006 (insistência) e 26.02.2007 (insistência, por confidencial, determinada por despacho), conforme ressalta dos pontos 32. a 36. da matéria de facto assente). [sublinhado nosso]

Ora, apenas em 09.03.2007 e 27.03.2007 é que a solicitação do Tribunal viria a obter resposta cabal por parte das agências da Caixa …………. de A.............. e M..........., respectivamente (cf. factos 37. e 39.), remetendo aos autos a documentação requerida – elementos esses que vieram ainda a ser sujeitos a esclarecimentos e contraditório pelas partes. [idem]

Constata-se, assim, que o Tribunal apenas se encontrava em posição de decidir a reclamação apresentada pelo interessado Luís ........... em 11.09.2007 – momento em que foi lavrado termo de conclusão pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de A.............., tendo então sido proferida a referida decisão em 30.09.2009 (conforme se infere dos pontos 44. e 46. da matéria de facto). [sublinhado nosso]

Posteriormente à decisão da reclamação apresentada pelo interessado, observa-se que a A. veio ainda juntar aos autos dois documentos em 19.10.2009 e 05.07.2010, bem como um requerimento solicitando a designação de data para conferência de interessados em 16.11.2010, a qual viria a ocorrer logo em 31.01.2011, com a consequente prolação de decisão nos autos de inventário (cf. factos 47 a 54. fixados supra). [idem]

Atendendo ao exposto, é possível constatar que:

(i) O processo de inventário e a respectiva reclamação deduzida pelo interessado Luís ........... sofreram, logo ab initio, dois atrasos de cerca de cinco meses e de dois meses e meio, em virtude da incompletude da relação de bens apresentada pela ora A. em 10.04.2000 e posteriormente complementada pela parte em 24.05.2000 e 05.09.2000 e, bem assim, da (falta de) resposta à solicitação endereçada pelo Tribunal em 08.02.2001, a qual apenas viria a ser obtida em 30.04.2001 (cf. factos 8. a 12. e 16. A 18. supra);

(ii) A instrução da reclamação deduzida pelo interessado Luís ........... teve início em 08.02.2001 com a prolação de despacho a determinar a realização de um conjunto de diligências com vista a aferir a propriedade do dinheiro depositado nas contas bancárias identificadas sob as verbas n.os 20 e 21 da relação de bens apresentada pela ora A. e apenas foi concluída em 11.09.2007, tendo, assim, decorrido durante um período de seis anos, oito meses e dois dias (cf. factos 16. e 44. supra);

(iii) Malgrado a existência de alguns atrasos na tramitação do processo na sua fase instrutória (designadamente, ao nível do cumprimento dos despachos judiciais a que se alude nos pontos 24., 27. e 32. da matéria de facto, do qual resultou uma dilação de cerca de um ano e oito meses, conforme se constata dos factos 25., 28. e 33. supra), este hiato temporal deve-se, na sua maioria, à demora da Caixa ………… na satisfação cabal à solicitação do Tribunal, a qual foi instada, pela primeira vez, a facultar ao Tribunal um conjunto de elementos em 12.10.2001 e cujo cumprimento integral apenas veio a ser assegurado em 27.03.2007, perfazendo, assim, um período de cinco anos, seis meses e catorze dias (cf. factos 20. e 39. supra);

Ora, tal como vem sendo entendido pelo TEDH, apenas os atrasos imputáveis aos Estados Contratantes da CEDH são passíveis de carrear à sua condenação por violação do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável (neste sentido, vide os acórdãos BUCHHOLZ V. GERMANY, processo n.º 7759/77, de 06.05.1981, § 49; PAPAGEORGIOU V. GREECE, processo n.º 97/1996/716/913, de 22.10.1997, § 46; HUMEN V. POLAND [GC], processo n.º 26614/95, de 15.10.1999, § 66, todos disponíveis para consulta online em http://hudoc.echr.coe.int/eng#).

Nesta medida, é possível concluir, desde já, que nem os atrasos no processo que resultam da inércia da ora A. e do interessado Luís ..........., nem, bem assim, os que decorrem da delonga da Caixa ……… em satisfazer cabalmente os pedidos de informação que lhe foram endereçados pelo Tribunal (os quais, note-se, tiveram a concordância da A., conforme se infere do requerimento a que se alude no ponto 26. da matéria de facto, aí tendo a parte expressamente reconhecido que os elementos em causa “se revelariam “essenciais para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa”) – e que, in casu, se cifram em cerca de sete meses e meio, por um lado, e três anos, onze meses e treze dias, por outro (i.e., o período que dista entre a primeira solicitação à Caixa ……………. e a sua integral satisfação pela instituição bancária, deduzido dos atrasos prolongados registados pelo Tribunal Judicial de A.............. no cumprimento dos despachos judiciais supra identificados), num total de cerca de quatro anos e sete meses – poderão ser relevados para efeitos da apreciação da razoabilidade do prazo da decisão judicial nem, por conseguinte, imputados ao R. Estado.

Sendo certo que, segundo o entendimento do mesmo órgão jurisdicional plasmado no acórdão Martins Moreira v. Portugal (processo n.º 21/1987/144/198, de 26.10.1988), o Estado é responsável por todas as suas autoridades (e não só as autoridades judiciárias, como aí era controvertido), é também inequívoco que, com a publicação do Decreto-Lei n.º 287/93, de 20.08, que transformou a Caixa ……………….. em sociedade anónima de capitais públicos, a mesma passou a ser regida, em primeira linha, por “um regime de direito privado ou, mais rigorosamente, [pela] aplicação à instituição de regras idênticas às que regem as empresas privadas do sector”, não perscrutando este Tribunal, in casu – nem, de resto, o alegando a A. –, um qualquer racional que carreasse a que a entidade bancária aqui em causa devesse ser tratada diversamente de uma qualquer outra instituição financeira a que fossem requeridos os elementos necessários à decisão da reclamação da relação de bens e devesse, como tal, qualificada como uma autoridade estadual, nos termos e para os efeitos da jurisprudência do TEDH que antecede.

O período a atender, para efeitos da apreciação da responsabilidade do R. pela alegada violação do direito da A. à obtenção de decisão em prazo razoável, encontra-se, assim, in casu, circunscrito a cerca de seis anos e nove meses (i.e., pendência total do processo n.º 373/1999 deduzida do período que não é imputável ao R., nos termos acabados de expender). [sublinhado e carregado nossos]

Ora, atendendo aos termos específicos do processo de inventário sub judice, entende este Tribunal que que o referido prazo de cerca de seis anos e nove meses para a prolação de decisão se revela irrazoável, nos termos e para os efeitos do artigo 20.º, n.º 4, da CRP e do artigo 6.º, n.º 1, da CEDH.

Com efeito, apelando aos critérios a que acima se fez alusão e que são erigidos pelo TEDH para apreciar a razoabilidade da duração de um processo, é possível confirmar, sem grande esforço interpretativo, a conclusão que antecede. Senão vejamos:

(a) Não existe qualquer evidência nos presentes autos que o processo de inventário detivesse uma complexidade assinalável. Assim, a relação processual aí estabelecida acabou por se circunscrever a duas partes (a ora A. e o interessado Luís ...........), nela não tendo intervindo quaisquer outros sujeitos.

A isto acresce que, à margem da dificuldade na obtenção dos elementos requeridos à Caixa ………….. – a qual foi já desconsiderada, para efeitos do cômputo do prazo razoável para prolação de decisão, nos termos expendidos supra –, não se perscruta que a instrução do processo de inventário e da respectiva reclamação se afigurasse particularmente intrincada.

(b) Por seu turno, e paralelamente à inércia das partes a que acima se fez menção e que foi já, como tal, desconsiderada, para efeitos da aferição da razoabilidade do prazo para decisão, dos factos fixados supra não resulta também uma qualquer actuação das partes que fosse passível de justificar um desvio desta ordem ao prazo razoável para a prolação de decisão.

(c) Relativamente à conduta das autoridades competentes, não se verificam aqui também quaisquer factores capazes de justificar a demora assinalada nos autos de inventário.

No entanto, salienta-se que, no que tange à natureza do processo, não existem nos autos quaisquer elementos que deixem antever um especial interesse na rápida resolução do processo que não aquele que subjaz a um qualquer processo judicial. [sublinhado nosso]

Na verdade, estamos perante um meio processual que visa, essencialmente, dilucidar questões patrimoniais, as quais não podem ser equiparadas aos processos em que se discutem “bens imateriais”, o que, de certo modo, desqualifica este processo, para efeitos da apreciação da razoabilidade da sua duração.

Não obstante a natural dificuldade inerente à tarefa de indicar, em termos absolutos, qual o prazo razoável a para a prolação de decisão judicial, considera este Tribunal, em face dos circunstancialismos do caso concreto, que o mesmo deve ser fixado, in casu, em cinco anos – o qual, de resto, se mostra próximo da baliza de razoabilidade de quatro anos indicada pela própria A., em sede de douta p.i. apresentada.

Com efeito, tendo em conta as especificidades do processo que correu termos no Tribunal Judicial de A.............. sob o n.º 373/1999 – a saber, o requerimento de abertura de inventário pela ora A., o facto de o seu compromisso de honra e respectivas declarações terem sido deprecados no Tribunal Judicial de Torres Vedras, a extensão da relação de bens apresentada pela A., a dedução de reclamação pelo interessado Luís ..........., a necessária instrução do processo e respectiva reclamação e a necessidade de prolação de decisão incidente sobre o processo principal e correlativo incidente, bem como a interposição de recurso de agravo da decisão da reclamação –, aliadas à referida circunstância de não constarem dos autos quaisquer elementos que indiciem uma particular urgência da A. na obtenção de uma decisão, conclui-se que cinco anos prefiguram um prazo razoável para a obtenção de uma decisão judicial.

A este respeito, cumpre ainda salientar que o TEDH considerou já que a existência de longos períodos durante os quais o processo não seja tramitado – como aqueles que antecederam a prolação da decisão da reclamação e do inventário per se –, sem qualquer justificação para o efeito, não é aceitável, para efeitos da razoabilidade da duração do processo (neste sentido, vide o § 33 do acórdão proferido em 24.11.1994, processo n.º 15287/89, BEAUMARTIN v. FRANCE, disponível para consulta online em http://hudoc.echr.coe.int/eng#).

Em face do que antecede, urge concluir que o direito de a A. obter uma decisão em tempo razoável no âmbito do processo de inventário que correu termos no Tribunal Judicial de A.............. sob o n.º 373/1999 foi, in casu, violado pelo R. Estado, o que prefigura um facto omissivo ilícito, por violação do artigo 20.º, n.º 4, da CRP, e do artigo 6.º, n.º 1, da CEDH, conjugadamente com o n.º 2 do artigo 8.º da CRP, e culposo (culpa essa que “resulta da ilicitude e do próprio facto de o serviço não funcionar de acordo com os standards de qualidade e eficiência que são esperados e constituem uma obrigação do Estado de Direito perante os cidadãos”, tal como sufraga o STA no acórdão prolatado em 09.10.2008, no âmbito do processo n.º 0319/08, entendimento que se subscreve).

Efectivamente, não obstante a alegação do R. no sentido de que a A. não teria alegado nem, por maioria de razão, demonstrado factos susceptíveis de materializar a culpa exigível para a sua responsabilização civil, o certo é que a jurisprudência dos tribunais superiores já há muito se vem consolidando no sentido de que “Face à definição ampla de ilicitude constante do aludido artº 6º do DL 48051, torna-se difícil estabelecer uma linha de fronteira entre os requisitos de ilicitude e da culpa, sucedendo não raras vezes que a culpa se dilui na ilicitude assumindo-se como seu elemento subjectivo” (vide, entre outros, o acórdão prolatado pelo STA, em 11.01.2001, no âmbito do processo n.º 044447) – isto ainda na vigência do Decreto-Lei n.º 48051, de 21.11.1967, entendimento que resultou robustecido com a entrada em vigor do RRCEE – pelo que se julga observada a culpa do R., na situação sub judice.

(…)

Apartando-nos aqui da discussão académica em torno da extensão do artigo 22.º da CRP e da questão de saber se a obrigação de indemnização que aí é genericamente imposta ao Estado exige ou não a alegação e prova de um qualquer dano em concreto, o certo é que, tal como se fez menção anteriormente:

(i) A CEDH – aprovada para ratificação pela Lei n.º 65/78, de 13.10, com depósito do respectivo instrumento em 09.11.1978, conforme aviso publicado no DR, 1.ª Série, de 21.01.1979 – vigora na ordem jurídica portuguesa, por força do disposto no n.º 2 do artigo 8.º da CRP; e

(ii) O n.º 1 do artigo 46.º da CEDH consagra a força vinculativa das decisões prolatadas pelo TEDH, cujas orientações devem, como tal, ser atendidas pelos órgãos jurisdicionais domésticos, sob pena de condenação do Estado Português naquela instância internacional.

E, a este respeito, vem sendo entendido pela jurisprudência dos tribunais superiores que:

“Com efeito, na aplicação da Convenção Europeu dos Direitos do Homem (tendo presente que na sentença recorrida se alude à violação do direito à decisão da causa em prazo razoável, consagrado nomeadamente no art. 6º, desta Convenção) e na densificação dos respectivos conceitos – entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e danos morais indemnizáveis -, tem, necessariamente, de atender-se à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) – neste sentido, Ac. do STA de 28.11.2007, proc. n.º 308/07 (“IV - O art. 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem consagra o princípio da subsidiariedade, segundo o qual compete às autoridades nacionais, em primeiro lugar, reparar as violações da mesma Convenção. V - Na densificação dos conceitos da Convenção, entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e de danos morais indemnizáveis, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem desempenhará, seguramente, um papel de relevo.”).

Ora, segundo a jurisprudência do TEDH é de presumir, embora se admita prova em contrário, que da violação do direito à obtenção em prazo razoável da decisão judicial que regule definitivamente o caso submetido a juízo resulta um prejuízo não patrimonial – neste sentido, cfr. parágrafo 94, do acórdão proferido em 29.3.2006, no âmbito da petição n.º 62361/00 (caso Riccardi Pizzati contra Itália), disponível para consulta no sítio da internet do TEDH (http://www.echr.coe.int), mais concretamente na base de dados Hudoc.

Esta jurisprudência foi acolhida pelo STA no seu Ac. de 28.11.2007, proc. n.º 308/07, acima citado, que considerou que o dano não patrimonial é uma consequência normal, ainda que não automática, da violação do direito a uma decisão em prazo razoável, que se presume como existente, sem necessidade de fazer prova deste, sempre que a violação tenha sido objectivamente constatada. [sublinhado nosso]

Este dano não patrimonial corresponde a um facto notório que, como tal, não carece de alegação, nem de prova (cfr. art. 412º n.º 1, do CPC de 2013), constituindo, como se explicitou no Ac. do STA, de 9.10.2008, p roc. n.º 319/08, o “ dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas por um acto final do processo” .” (sublinhado nosso) – aresto prolatado pelo Tribunal Central Administrativo, ou “TCA”, Sul, em 15.12.2016, no âmbito do processo n.º 13706/16.

Ora, não se observam motivos para que este Tribunal se afaste da orientação que antecede.

Com efeito, tal como entendeu o TCA Norte, numa situação com manifesta similitude à dos autos, “Os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre atingem os demandantes, isto é, ocorrem em praticamente todos os casos de atraso significativo na actuação da justiça, merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respectiva relevância, sem prejuízo de prova em contrário, ou de diferente causalidade, em cada caso, pelo que “Se a parte que invoca a lesão alegar e procurar provar mais danos do que os comuns, mas não conseguir provar que os sofreu, nem por isso fica prejudicada no direito à indemnização que resulta da presunção natural de um dano moral relevante, salvo quando se provar que em concreto, mesmo este, não ocorreu” (acórdão de 22.10.2010, processo n.º 01357/07.8BEVIS).

Assim, e ainda que a A. não tenha feito qualquer prova dos danos que por si são expressamente alegados, tal circunstância não preclude o seu direito a ser ressarcida pelo dano moral presumido – e que não é, por qualquer forma, infirmado nos presentes autos de acção administrativa comum – que, segundo a jurisprudência do TEDH, normalmente decorre da violação do direito à obtenção de decisão judicial em prazo razoável.

Pelo que, contrariamente ao alegado pelo R., observado se encontra também, por maioria de razão, o nexo de causalidade que necessariamente subjaz à responsabilização civil extracontratual de uma qualquer entidade, nos termos gerais da lei.

Em face de tudo o que antecede, urge concluir que:

(a) O R. cometeu um facto omissivo ilícito e culposo, consistente na falta de decisão em prazo razoável do processo de inventário que correu termos no Tribunal Judicial de A.............. sob o n.º 373/1999, nos termos e para os efeitos do n.º 4 do artigo 20.º da CRP e do n.º 1 do artigo 6.º da CEDH, conjugadamente com o n.º 2 do artigo 8.º da CRP.

(b) Não obstante a A. não ter demonstrado, como lhe incumbia, os danos não patrimoniais por si expressamente alegados em sede de petição inicial, a jurisprudência do TEDH e dos tribunais superiores portugueses concebem o dano não patrimonial como a consequência normal e presumível da violação do direito à obtenção de decisão judicial em prazo razoável, conquanto tal presunção não resulte ilidida – como não resultou, na situação sub judice.

O valor da indemnização a fixar equitativamente pelo Tribunal, de harmonia com o disposto no n.º 4 do artigo 496.º do CC, terá, assim, que atender às circunstâncias expostas.

A este respeito, importará salientar que, tal como nos dá conta Isabel Celeste M. Fonseca, in “Cadernos de Justiça Administrativa”, n.º 72, página 41, o valor de indemnização atribuído pelo TEDH a título de danos morais cifra-se, em média, em menos de EUR 1.000,00 por ano de atraso no processo (neste sentido, vide ainda os acórdãos proferidos pelo TCA Sul em 12.05.2011 e 21.11.2013, no âmbito dos processos n.os 07472/11 e 09424/11, respectivamente).

Contudo, este montante corresponde a uma média aritmética e não poderá, como tal, ser aplicado tout court. Diversamente, e ainda que possa servir como um referencial a atender pelo julgador, sempre poderá este aumentá-lo ou diminuí-lo, em função dos danos concretamente sofridos, segundo critérios de equidade.

Ora, no caso dos autos, apenas serão de considerar os danos que se presumem resultar da violação do direito à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável, nos termos propugnados pelo TEDH no acórdão proferido em 29.3.2006, no âmbito do processo n.º 62361/00 (caso Riccardi Pizzati v. Italy), e já não aqueles que foram expressamente alegados pela A., os quais não foram demonstrados, por qualquer forma, nos presentes autos.

Por seu turno, importa destacar ainda que dos autos não resulta, conforme se fez já menção, uma qualquer especial urgência na obtenção dessa decisão pela A., que não aquela que é inerente à expectativa de uma qualquer pessoa que intenta uma acção judicial.

Assim, e atentas as variáveis enunciadas, julga-se justa e equitativa a atribuição à A., a título de danos morais, de uma indemnização à razão de EUR 600,00 por cada ano de atraso no processo, o que, considerando o referido atraso de cerca de um ano e nove meses que acima ficou demonstrado (id est, período total de tempo em que o processo de inventário n.º 373/1999 correu termos, deduzido do hiato que não pode ser imputado ao R., pelos motivos enunciados, e da baliza de razoabilidade para a prolação de decisão que se fixou supra em cinco anos, nos termos e com os fundamentos que antecedem), perfaz um total de EUR 1.050,00, em cujo pagamento se condena o R. Estado. [sublinhado nosso]

(…).”

O assim decidido é de subscrever no que se refere aos pressupostos dogmáticos de base em que assenta a responsabilidade civil do Estado, bem como à análise e fixação dos períodos de atraso. Aliás, terá que se deixar estabelecido que relativamente ao julgamento efectuado sobre os períodos de atraso e respectiva definição não existe alegação recursória eficaz, insistindo a Recorrente numa contagem de tempo global, sem efectuar crítica concreta ao decidido.

Porém, já não pode manter-se o decidido no que tange ao concreto arbitramento da indemnização devida.

Com efeito, neste ponto acompanha-se o discurso fundamentador do acórdão deste TCAS de 15.12.2016, proc. nº 13706/16, que assim se reproduz:

Com efeito, na aplicação da Convenção Europeu dos Direitos do Homem (tendo presente que na sentença recorrida se alude à violação do direito à decisão da causa em prazo razoável, consagrado nomeadamente no art. 6º, desta Convenção) e na densificação dos respectivos conceitos – entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e danos morais indemnizáveis -, tem, necessariamente, de atender-se à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) – neste sentido, Ac. do STA de 28.11.2007, proc. n.º 308/07 (“IV - O art. 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem consagra o princípio da subsidiariedade, segundo o qual compete às autoridades nacionais, em primeiro lugar, reparar as violações da mesma Convenção. V - Na densificação dos conceitos da Convenção, entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e de danos morais indemnizáveis, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem desempenhará, seguramente, um papel de relevo.”).

Ora, segundo a jurisprudência do TEDH é de presumir, embora se admita prova em contrário, que da violação do direito à obtenção em prazo razoável da decisão judicial que regule definitivamente o caso submetido a juízo resulta um prejuízo não patrimonial – neste sentido, cfr. parágrafo 94, do acórdão proferido em 29.3.2006, no âmbito da petição n.º 62361/00 (caso Riccardi Pizzati contra Itália), disponível para consulta no sítio da internet do TEDH (http://www.echr.coe.int), mais concretamente na base de dados Hudoc.

Esta jurisprudência foi acolhida pelo STA no seu Ac. de 28.11.2007, proc. n.º 308/07, acima citado, que considerou que o dano não patrimonial é uma consequência normal, ainda que não automática, da violação do direito a uma decisão em prazo razoável, que se presume como existente, sem necessidade de fazer prova deste, sempre que a violação tenha sido objectivamente constatada.

Este dano não patrimonial corresponde a um facto notório que, como tal, não carece de alegação, nem de prova (cfr. art. 412º n.º 1, do CPC de 2013), constituindo, como se explicitou no Ac. do STA, de 9.10.2008, proc. n.º 319/08, o “dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas por um acto final do processo”.

Questão distinta é a de saber se o dano comum resultante do atraso na administração da justiça assume gravidade tal que justifique a reparação, face ao prescrito no art. 496º n.º 1, do Cód. Civil, o qual determina a indemnização dos “danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.

A este propósito esclarece-se no citado Ac. do STA de 28.11.2007, proc. n.º 308/07, que “(…) a jurisprudência do TEDH, relativamente aos danos morais suportados pelas vítimas de violação da Convenção, não restringe a dignidade indemnizatória aos de especial gravidade e, em casos similares, de ofensa ao direito a uma decisão em prazo razoável, tem entendido que a constatação da violação não é bastante para reparar o dano moral (vide, por exemplo: acórdão de 21 de Março de 2002, processo nº 46462/99, no caso Rego Chaves Fernandes c. Portugal; acórdão de 29 de Abril de 2004, processo nº 58617/00, proferido no caso Garcia da Silva c. Portugal). Razão pela qual, estando em causa uma violação do art. 6º § 1º da Convenção e a sua reparação, em primeira linha, ao abrigo do princípio da subsidiariedade, pelo Estado Português, a norma do art. 496º/1 do C.Civil haverá de interpretar-se e aplicar-se de molde a produzir efeitos conformes com os princípios da Convenção, tal como são interpretados pela jurisprudência do TEDH (vide ponto 80. do acórdão de 29 de Março de 2006, proferido no processo nº 64890/01, no caso Apicella c. Itália).”.

Na linha de entendimento dos acórdãos acabados de citar, que se adopta aqui e que correspondem à aplicação da doutrina que dimana da jurisprudência do TEDH, os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre ocorrem em praticamente todos os casos de atraso excessivo na actuação da justiça, merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respectiva relevância, sem prejuízo de prova em contrário ou de diferente causalidade.

Assim, in casu tem de considerar que, em consequência do atraso (excessivo) de cerca de 10 meses na tramitação da oposição à execução, o recorrente sofreu danos não patrimoniais, correspondentes ao dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas num prazo razoável. [no caso, 21 meses – v. infra]

No que respeita ao montante da indemnização a arbitrar nos processos decorrentes de atraso na decisão de processo judicial também se deve atender, como acima referido, aos padrões fixados pela jurisprudência do TEDH. [sublinhado nosso]

Sobre esta questão pronunciou-se o Ac. do TCA Sul de 12.5.2011, proc. nº 7472/11, nos seguintes termos:

“(…) grelha estabelecida pelo TEDH no “caso Musci C. Itália” (P. 64699/01) variável entre 1000 e 1500 Euros por cada ano de demora do processo, nunca se poderia esquecer que se estava perante uma mera base de partida, susceptível de ser aumentada ou diminuída, de acordo com os danos concretos, a importância dos interesses em jogo e o comportamento do requerente eventualmente justificativo da demora.

(…)”.

Dito de outro modo, o TEDH, em processos semelhantes, atribui entre € 1000 a € 1500 por cada ano de atraso injustificado. [sublhinado nosso]”

Existe, pois, o apontado erro de julgamento.

Assim, na fixação da indemnização terá que atender-se aos valores-padrão supra referidos, sendo que terá também, no caso concreto, que considerar-se que não vem provado nenhum dano anormal ou que exija especial reparação e que o período a atender, para efeitos da apreciação da responsabilidade do ora Recorrido pela violação do direito da A. à obtenção de decisão em prazo razoável, encontra-se, circunscrito a cerca de 1 ano e nove meses.

Com efeito, e no que ao período de atraso respeita, como explicitado na sentença recorrida, este foi de cerca de um ano e nove meses, considerando o período total de tempo em que o processo de inventário n.º 373/1999 correu termos, deduzido do hiato temporal que não pode ser imputado ao Recorrido (v. supra) e tendo presente a baliza de cinco anos fixada como razoável para a prolação de decisão

Nestes termos, tudo avaliado, considera-se equitativo atribuir à Recorrente, para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos com o atraso (excessivo) de cerca de 1 ano e 9 meses na tramitação do processo de inventário e tendo presente o disposto no art. 566.º, n.º 2, do Cód. Civil, a quantia de EUR 2.100,00.

São devidos juros de mora, a contar da data da prolação do presente acórdão, até integral pagamento, calculados à taxa de 4% ao ano e correspondentes taxas legais subsequentemente em vigor.


II.2.2. Do recurso subordinado

O que se vem de dizer, dá igualmente resposta ao objecto do recurso subordinado interposto pelo Estado, o qual questiona, se bem se percebe, o preenchimento dos pressupostos em que assenta a responsabilidade civil do Estado, concretamente da demonstração da prova dos danos sofridos.

Com efeito, como extensamente explicitado, o atraso na decisão de processos judiciais, quando viola o direito a uma decisão em prazo razoável, é em si um facto ilícito, gerador de responsabilidade civil do Estado. E segundo a jurisprudência do TEDH, replicada na jurisprudência nacional (cfr. os inúmeros acórdãos supra citados), os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre ocorrem em praticamente todos os casos de atraso excessivo na actuação da justiça - correspondentes ao dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas num prazo razoável - merecem a tutela do direito, não sendo de minimizar na respectiva relevância (sem prejuízo de prova em contrário ou de diferente causalidade).

Razões pelas quais tem este recurso que improceder.



III. Conclusões

i) O atraso na decisão de processos judiciais, quando viola o direito a uma decisão em prazo razoável, é um facto ilícito, gerador de responsabilidade civil do Estado.

ii) Na aplicação da Convenção Europeu dos Direitos do Homem e na densificação dos respectivos conceitos – entre os quais os de prazo razoável de decisão, indemnização razoável e danos morais indemnizáveis -, tem, necessariamente, de atender-se à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH).

iii) Segundo a jurisprudência do TEDH os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre ocorrem em praticamente todos os casos de atraso excessivo na actuação da justiça - correspondentes ao dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas num prazo razoável - merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respectiva relevância, sem prejuízo de prova em contrário ou de diferente causalidade.

iv) No que respeita ao montante da indemnização a arbitrar para ressarcimento desses danos não patrimoniais deve atender-se aos padrões fixados pela jurisprudência do TEDH, o qual atribui entre 1.000 a 1.500 Euros por cada ano de atraso injustificado.

v) Para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos pela Autora e ora Recorrente com o atraso (excessivo) de cerca de 1 ano e 9 meses na tramitação do processo de inventário, tendo presente o disposto no artigo 566.º, n.º 2, do Cód. Civil, mostra-se equitativo fixar a indemnização na quantia de EUR 2.100,00.




IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Conceder parcial provimento ao recurso principal e fixar a indemnização devida em EUR 2.100,00, acrescida dos juros vincendos à taxa legal até efectivo e integral pagamento, revogando-se a sentença recorrida nessa parte; e

- Negar provimento ao recurso subordinado.

Custas pelo Estado e pela Recorrente, em ambas as instâncias, fixando-se o respectivo decaimento em 90% e 10%.

Lisboa, 31 de Janeiro de 2018


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Pedro Marchão Marques

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Helena Canelas

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Cristina Santos