Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08611/15
Secção:CT
Data do Acordão:01/11/2018
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:IVA
FACTURAS
Sumário:I – No caso em análise, as facturas em causa, nos termos em que se apresentam, não revelam a quantificação/extensão das prestações de serviços, o que, pelas razões explicadas no acórdão, compromete definitivamente a possibilidade de a AT controlar a base tributável e o apuramento do imposto.
II - Por esta razão, o IVA liquidado nas facturas em causa não pode ser deduzido, sendo claro que não se mostram preenchidos todos os requisitos formais que as facturas, nos termos legais, devem conter – cfr. artigo 19º, nº2 do CIVA.
III - Compete ao contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do artigo 19.º do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada.
IV - A simples menção do IVA em factura ou documento equivalente, mesmo que porventura imprópria, por não haver lugar ao mesmo, origina obrigação de imposto.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por D... contra as liquidações de IVA (e juros compensatórios) emitidas com os nºs 08217941, 08217942, 08217943, 08217944, 08217945 e 08217946, respeitantes aos anos de 2004, 2005 e 2006, vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

As suas alegações terminam com as seguintes conclusões:

A - O presente recurso visa a decisão proferida, em 20-11-2014, no processo em referência, por considerar que a AT não logrou demonstrar a inverdade material das facturas, afastando, assim, os motivos formais que vinham opor-se à consideração das mesmas, considerados, na douta Sentença, contrários às normas aplicáveis;

B - Salvo o devido respeito, o Tribunal "a quo" incorreu em erro de julgamento, por não observância da alínea b), do n.º 1, do artigo 7.º, do CIVA, motivo pelo qual, ao concluir pela procedência da Impugnação, violou o citado preceito;

C - O Tribunal “a quo" incorreu igualmente em erro de julgamento por não observância dos artigos 8º - Exigibilidade do imposto em caso de obrigação de emitir a factura - e 36.º - Prazo de emissão, formalidades das facturas e documentos equivalentes - ambos do CIVA.

D - Consequentemente, as facturas não respeitando os sobreditos preceitos, não podem ser tidas "como passadas em forma legal", para efeitos do disposto na alínea a), do n.º 2, do artigo 19.º do mesmo Código;

E - Porque o "facto gerador'' do IVA, descrito no artigo 7º, em particular no seu n.º 1, alínea b), para as prestações de serviço - no momento da sua realização - não se compatibiliza nem com o clima, nem com as fases ou sequências, nem com a melhor oportunidade de facturar, ou com facturação unicamente a final de uma campanha completa;

F - O pagamento (ou recebimento) é que poderá ser fixado para o fim da campanha, nunca a facturação;

G - Porém, toda a prestação de serviços deve ter liquidação de IVA no momento da sua realização e não em épocas estipuladas, acordadas ou contratualizadas;

H - Ao invés do salientado na douta Sentença - "Vistas as normas impõe-se fazer menção quanto à validade e relevância do contrato de prestação de serviços que ficou assente existir entre o impugnante e a sociedade prestadora dos serviços que são enunciados nas facturas desconsideradas pela administração fiscal. Ora, neste aspecto não vem referida uma linha no relatório da inspecção." Sublinhado, nosso.

I - Carecendo tal afirmação de fundamento, na medida em que consta do Relatório que as prestações não podem ser consideradas como "prestações de serviços continuados " por se tratar de serviços distintos: - a monda não é a ceifa, telefone não é internet, impondo-se, por isso, formas ou determinações distintas de facturação.

J - Além de que, como decorre ainda do artigo 10.º da Lei Geral tributária (LGT), sob a epígrafe "Tributação de rendimentos ou actos ilícitos", que o carácter ilícito da obtenção de rendimentos ou da aquisição, titularidade ou transmissão dos bens não obsta à sua tributação, quando esses actos preencham os pressupostos das normas de incidência aplicáveis, como se pode ler em LGT anotada, Encontro da Escrita, de Diogo Leite Campos/Benjamim Rodrigues/ Jorge Lopes de Sousa, a páginas 118 e ss,"…o carácter lícito ou ilícito da obtenção ou disposição dos bens é indiferente à tributação.".

K - Na verdade, ao invés do entendimento do douto Tribunal (vertido que foi na douta Sentença) não se aplica ao caso vertente o n.º 3 do artigo 7º do CIVA, na medida em que não se está em presença de prestações de serviços continuados pela sociedade emissora das facturas;

L - Para trabalhos, tais como sementeira, monda, ceifa, secagem e debulha, entre outros, inseridos numa actividade globalmente considerada, que terá o seu termo na debulha, impõe a lei formas e determinações distintas de facturação;

M - Como referido, nos termos da alínea b) do nº 1 do antedito artigo 7º do Código do IVA, nas prestações de serviços, o imposto torna-se exigível no momento da realização, independentemente do disposto na Cláusula Quarta do aludido contrato de prestação de serviços, Junto ao Autos;

N - Decorrendo (à data da celebração do contrato de prestação de serviços) dos nºs 1e 4 do artigo 35.º do CIVA, que a factura ou documento equivalente referidos no artigo 28.º devem ser emitidos o mais tardar no quinto dia útil seguinte ao do momento em que o imposto é devido e que as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter elementos, tais como a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável;

O - Assim, (à data) a alínea b), do n.º 5, do sobredito artigo 35.º do CIVA, prescrevia que as facturas ou documentos equivalentes deviam (e devem) não só ser datados e numerados sequencialmente, como ainda conter, designadamente, a indicação da quantidade e denominação usual dos serviços prestados;

P - Com o devido respeito, fica assim provado que, relativamente ao critério ou forma de cálculo dos valores apurados e facturados, o critério não é, nem podia ser, o que resulta da Cláusula Quarta do Contrato de Prestação de Serviços, mas sim, o critério invocado pelos Serviços de Inspecção e enunciado pela alínea b) do n.º 1, do artigo 7.º do CIVA;

Q - Razão pela qual, atento o atrás referido, e ao invés do alegado na douta petição Inicial (PI 91 e ss), que de modo algum se concebe e concede, crê-se que o afirmado no Relatório da Inspecção tem naturalmente fundamento legal;

R - Como ali (Relatório) se diz, o valor a facturar não pode ser obtido por "conveniência" das partes, daquele que factura e daquele que necessita de custos - "Em caso algum o sujeito passivo faz a demonstração da razão dos € 31.000,00, em vez, por exemplo, de € 50.000,00;”

S - Regista-se que o artigo 3º, nº3, alínea f) (nas transmissões de bens) e o artigo 4.º, n.º 2, alínea a) (nas prestações de serviços) classificam operações gratuitas como tributáveis, quando da esfera económica ou empresarial se retiram bens ou serviços para uso particular ou de terceiros - ofertas, ou a afectação de um bovino para casamento de um familiar, por exemplo, quando na sua aquisição, criação, alimentação, etc., se procedeu à dedução do IVA;

T - Sendo que as ofertas são tributadas em IVA, quando o seu valor é superior a € 50,00, cf. art.º 3.º, n.º 7, pelo que a entreajuda não é isenta de IVA, podendo-se efectuar encontro entre duas facturas, uma de cada sujeito passivo, mas com a devida liquidação de IVA em cada factura;

U - Tendo o Relatório também salientado, que as facturas infringem o disposto o art.º 36.º (Corresponde ao artigo 35º, na redacção anterior à revisão do articulado, efectuada pelo DL 102/2008, de 20 de Junho) n.º 5, alínea f), quando omitem a data da realização dos citados serviços, que foi precisamente aditado para localizar temporalmente os serviços;

V - Cumprindo ainda salientar que (tal como se encontra ainda descrito no actual artigo 36.º n.º 1 - 2.ª parte - à data artigo 35.º, n.º 1 - 2.º§) a data da emissão do documento comprovativo coincidirá sempre com a da percepção de tal montante, mas apenas em caso de pagamentos relativos a uma transmissão de bens ou prestação de serviços ainda não efectuada;

W - Estando aqui apenas em causa adiantamentos antes do serviço efectuado, o que não é o caso

X - Assim, por toda a fundamentação descrita, conclui-se que (i) não existe verdade temporal nas facturas; (ii) que não existe verdade na descrição nas facturas e que (iii) não existe quantificação dos serviços;

Y - Finalmente, as facturas não respeitam a alínea b), do n.º 1, do artigo 7º, nem o artigo 8º, nem o artigo 36.º, todos do CIVA, pelo que não respeitando, as mesmas, os sobreditos preceitos, não podem ser consideradas como "passadas em forma legal", para efeitos do disposto na alínea a), do n.º 2, do artigo 19.º do mesmo Código;

Z - Sendo pois, com o devido respeito, e como referido, entendimento da Fazenda Pública que a douta Sentença, ao decidir com o decidiu, violou o estatuído na alínea b), do n.º 1, do artigo 7º do CIVA, na medida em que os serviços prestados pela sociedade emissora das facturas não são continuados no tempo e, em consequência, ocorre prejuízo para o Estado resultante da facturação a final da época da cultura.

Termos em que, concedendo-se provimento ao presente recurso, deve a douta Sentença recorrida ser revogada, com as devidas consequências legais.

PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”


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Não foram produzidas contra-alegações.

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A Exma. Magistrada do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu Parecer onde concluiu no sentido da procedência do recurso.

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Colhidos os vistos, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.


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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

1) O impugnante desenvolve a actividade de “Agricultura e produção animal combinadas”, com o CAE 01500, encontrando-se como tal enquadrado no regime normal trimestral para efeitos de IVA desde 01/01/2003 até 12/31/2007, data em que cessou a sua actividade.

2) Na sequência do despacho interno nº DI 200801239, de 16/06/2008, foi realizada acção de inspecção à documentação contabilística do impugnante visando a análise do pedido de reembolso de IVA no montante de 19.374,94 euros, apresentado na DP de 07/12.

3) Do relatório final da inspecção, datado de 17/10/2008, consta, além do mais:
“III – Descrição dos Factos e Fundamentos das Correcções à Matéria Tributável

O presente reembolso foi apresentado para apreciação por ser o pedido de cessação de actividade.
Após a análise dos elementos retirados do sistema informático foram solicitados ao sujeito passivo através do n/ofício nº 20780 datado de 2008-06-19 (anexo 1) documentos justificativos dos valores elevados do campo 24 nos últimos trimestres de 2004 a 2006 e do destino dado ao imobilizado.
Em 04-06-2008 deu entrada nestes serviços a resposta do sujeito passivo, referindo que o imobilizado foi vendido à ..., SA conforme fotocópia da referida factura tendo sido liquidado IVA (anexo 2 a 5) assim como fotocópias dos documentos mais significativos do campo 24.
Verifica-se que nesta rubrica constam três facturas, uma de cada exercício referido, emitidas por “Herdeiros de ... – Sociedade Agro Pecuária, Lda”, NIPC ... que referem serviços prestados anualmente de lavouras, mondas, debulha, secagem e transporte na Herdade das ... relativa à companha de arroz. Deste modo as facturas nº 32 de 18/11/2004, 52 de 22/12/2005 e 66 de 30/10/2006, no montante respectivamente de € 31.000,00, € 34.081,20 e € 14.280,00 (IVA excluído) dos exercícios de 2004 a 2006 não cumprem os requisitos exigidos pelo art. 35º do CIVA.
Assim, foi o contribuinte novamente questionado sobre o porquê desta facturação ser efectuada só no final da campanha acrescentando-se o facto de ser desconhecida a forma de cálculo destes valores apurados dado que, estranhamos o valor de 2004 ser “certinho” de € 31.000,00 (anexo 9).
Note-se, como é próprio na campanha da cultura do arroz, as fases de produção são nomeadamente:
· preparação do terreno, entre os meses de Fevereiro a Abril.
· sementeira, entre quinze de Abril a quinze de Maio.
· monda ….
· ceifa, no mês de Setembro (antes das chuvas).
· secagem e debulha no mês de Outubro / Novembro
· venda do cereal entre os meses de Dezembro e Janeiro.

A resposta do contribuinte refere que “tradicionalmente nesta actividade é comum a prestação de serviços entre agricultores por forma a utilizar os equipamentos agrícolas de algumas explorações com benefício para ambas. Refere ainda que acordou com a empresa agrícola (Herdeiros de ...) a cooperação da totalidade dos serviços de máquinas necessárias às campanhas em causa, razão pela qual só foi possível efectuar o acerto de contas e facturação no final de cada campanha do arroz (anexo 10 folha 1 e 2).
Pelo exposto e dado que segundo o art. 7º, nº 1, al. b) nas prestações de serviços “o imposto é devido e torna-se exigível no momento da sua realização”, não sendo cumprido neste caso o disposto neste artigo visto a facturação ser global e no final de cada exercício quando a mesma deveria ser efectuada na data de cada prestação efectuada.
Assim, o art. 19º, nº 2, alínea a) refere que só confere direito À dedução o imposto mencionado em documentos na posse do sujeito passivo passados de forma legal o que não se verifica neste caso.
Com efeitos, nestes documentos analisados o disposto no art. 35º, nº 5, al. f) do CIVA não é respeitado visto que não mencionam a data das prestações de serviços pelo que as facturas não foram emitidas em forma legal.
De referir que aceitamos como correcta a factura nº 6 de 2004 -11-10 emitida por A... por considerarmos que a descrição da mesma (só a debulha do arroz) se insere na data em que efectivamente esta fase de produção é efectuada nomeadamente no mês de Novembro.
(…)
A – Falta de Temporização dos Serviços Prestados
1. Relativamente à data de discriminação / temporização dos serviços prestados nas referidas facturas e à falta de facturação prestação de serviços o sujeito passivo alega:
a) Que é a “actividade agrícola caracterizada por especificidades próprias, entre as quais a imprevisibilidade face à intervenção de factores como o clima entre outros”;
b) Que a “prática de certas actividades agrícolas traduzem-se na realização de um conjunto de acções que se prolongam no tempo e que são concretizadas sequencialmente em moldes logica e cronologicamente interligados”;
c) Que “a execução de vários trabalhos desenvolvidos faseadamente e em períodos temporais distintos que globalmente considerados constituem uma actividade atomisticamente considerada”;
d) Que se está “perante o exercício de uma prestação de serviços que constitui um facto continuado e que se prolonga no tempo”;
2. Importa, pois, contrapor que as normas fiscais, nomeadamente o “facto gerador” do IVA descrito no art. 7º, em particular no seu nº 1, al. b) para as prestações de serviço (no momento da sua realização) não se coadunam nem com o clima nem com fases ou sequências nem com a melhor oportunidade para facturar ou com facturação só no fim de uma campanha completa. O pagamento (ou recebimento) é que poderá ser fixado para o fim da campanha nunca a facturação. Toda a prestação de serviços deve ter liquidação de IVA “no momento da sua realização” e não em épocas estipuladas acordadas ou contratualizadas.
3. E também não podem ser consideradas como “prestações de serviços continuados” previstas no art. 7º, nº 3 do CIVA como a prestação de serviços de telefone ou internet porque tratam-se de serviços distintos (a monda não é a ceifa) impondo formas ou determinações distintas de facturação;
4. E também a alegação de artigos do Código Civil não é fundamento porque regula relações entre as partes e não obstam à aplicação de normas fiscais tais como o art. 10º da Lei Geral Tributária afirma que “o caracter ilícito da obtenção de rendimentos ou da aquisição, titularidade ou transmissão dos bens não obsta à sua tributação quando esses actos preencham os pressupostos das normas de incidência aplicáveis” ou quando o art. 11º, nº 3 afirma que “persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários”,
B – Falta de Discriminação e Valorimetria dos Serviços
1. Relativamente à valorimetria dos serviços o sujeito passivo alega:
a) Que o critério é o que consta da Cláusula Quarta, tal como “um valor que será liquidado após apurado o valor final obtido com a colheita” ou “para o cálculo desse valor, será tido em conta o preço médio corrente de cada operação ponderando pela real produção obtida por há”;
b) Que a valorimetria do conjunto de inúmeras e diversas prestações de serviços origina um valor tão “certinho” porque “as relações entre profissionais do mesmo ramo (…) são pautadas por valores de entreajuda e solidariedade recíprocas”;
c) Que “a fixação do valor a receber (…) pode sempre decorrer única e exclusivamente da vontade das partes, à luz do princípio da autonomia privada” com referências aos arts. 405º e 1154º do Código Civil;
d) Que na emissão das facturas “a data da emissão do documento comprovativo coincidirá sempre com a da percepção de tal montante” cfr. art. 35º, nº 1
2. Importa, pois, salientar que o art. 36º (corresponde ao art. 35º na redacção anterior à revisão do articulado efectuada pelo Decreto-Lei n 102/2008, de 20/06) nº 5, al. b) impõe “a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados” pelo que descrições como “monda”, “ceifa”, etc. podendo denominar os serviços nunca os quantificam.
3. Para quantificar serviços dever-se-ia aplicar preços unitários de hxH (horas/Homem) ou hxm (horas/máquina), por exemplo. E, por esta forma de determinar o valor dos serviços prestados dificilmente se obterá uma valor muito “certinho”.
(…)
6 O valor não pode ser obtido por “conveniência” das partes, daquele que factura e daquele que necessita de custos. Em caso algum o sujeito passivo faz a demonstração da razão dos € 31.000,00, em vez, por exemplo, de € 50.000,00;
7 Aliás, o art. 3º, nº 3, al. f) (nas transmissões de bens) e o art. 4º, nº 2, al. a) (nas prestações de serviços) classificam operações gratuitas como tributáveis quando da esfera económica ou empresarial se retiram bens ou serviços para uso particular ou de terceiros (ofertas ou afectação de um bovino para um casamento de um familiar, por exemplo, quando na sua aquisição, criação, alimentação, etc, se andou a deduzir IVA).
(…)
9 E note-se que as referidas facturas infringem o art. 36º (Corresponde ao art. 35º na redacção anterior à revisão do articulado efectuada pelo Decreto-Lei nº 102/2008, de 20/06) nº 5, al. f) quando omitem a data da realização dos citados serviços que foi precisamente aditado para localizar temporalmente os serviços.
10 Finalmente a “data da emissão do documento comprovativo coincidirá sempre com a da percepção de tal montante” que se encontra descrita no actual art. 36º, nº 1 refere-se apenas “em caso de pagamentos relativos a uma transmissão de bens ou prestação de serviços ainda não efectuada” que completa o texto citado mas que se omitiu pelo que estará apenas em causa nos adiantamentos antes do serviço efectuado o que não é o caso.
C – Conclusão
1. Por toda a fundamentação descrita, em contraponto às alegações efectuadas no exercício do Direito de Audição, importa concluir que:
a) Não existe verdade temporal nas facturas;
b) Não existe verdade na descrição nas facturas;
c) Não existe quantificação dos serviços;
d) Enfim, as facturas não respeita o art. 7º nem o art. 8º nem o art. 36º pelo que não podem ser consideradas como “passadas em forma legal” para os efeitos do art. 19º, nº 2, al. a) do CIVA”

4) Sobre este relatório incidiu o parecer do Chefe de Equipa dos Serviços de Inspecção da Direcção de Finanças de Setúbal nos seguintes termos: Independentemente da proposta de Deferimento do pedido de Reembolso, ref. a 07/12T, no valor de € 19.374,94, face a crédito acumulado desde 0706T e inerente a actividade susceptível de gerar algum crédito de IVA (Cultura de Arroz), bem como alguns investimentos em imobilizado, 15% do reembolso dade que as principais deduções de IVA se “concentram” no último trimestre de cada exercício com facturas de serviços que não cumprem os requisitos legais quer do art. 7º, nº 1, al. b) quer do art. 36º, nº 5 todos do CIVA confirmo a(s) proposta(s)s de Liquidação Adicional pelo(s) valor(es) e período(s);

5) Sobre este recaiu o despacho de 24/10/2008 com o seguinte teor “Concordo com os fundamentos de facto e de direito expressos no relatório da acção inspectiva e parecer elaborados para o efeito. Notifique-se nos termos do art. 77º da LGT e do art. 62º do RCPIT.”

6) Nesta sequência foram emitidas em 31/10/2008, as liquidações adicionais de IVA em determinação daquelas correcções, com os números 08217941 no valor de 5.890,00 €, 08217942 no valor de 840,41 €, 08217943 no valor de 7.157,05 €, 08217944 no valor de 725,51 €, 08217945 no valor de 2.999,00 €, 08217946 no valor de 185,69 €, todas com limite de pagamento voluntário definido em 31/12/2008;

7) Não se conformando com as mesmas veio o impugnante, em 10/02/2009, instaurar a presente impugnação daquelas liquidações;

8) Por contrato celebrado entre o impugnante e a sociedade comercial “Herdeiros de ... – Sociedade Agro-Pecuária, Lda”, em 26/01/2006, esta obrigou-se a prestar em favor daquele serviços de máquinas agrícolas, nomeadamente para preparação de terrenos, sementeira, monda, ceifa, secagem e debulha entre outros inseridos numa actividade globalmente considerada e o primeiro a pagar-lhe os mesmos;

9) A sociedade identificada em 8) emitiu as facturas com os números 32, 52 e 66, respectivamente em 18/11/2004, 22/12/2005 e 30/10/2006;

10) Em cada uma, correspondentemente, foram apostos os valores totais de 36.890,00 €, 41.238,25 € e 17.279,00 € e em todas incorporado IVA a 21%;

11) Nas facturas nºs 32 e 52 foi aposta a seguinte menção: Serviços prestados na Herdade das ... Campanha 2004 Lavouras, Mondas, Debulha, Secagem”;

12) Na factura nº 66, por sua vez, foi aposto Serviço de Máquinas na Preparação da Lavra para Cultura de Arroz;

13) As mencionadas facturas indicam como destinatário / beneficiária da citada prestação de serviços o ora impugnante;

14) O impugnante não procedeu ao pagamento voluntário do imposto liquidado;

15) Com fundamento nas referidas liquidações adicionais foi instaurado o processo de execução fiscal nº ... em 21/01/2009, encontrando-se o mesmo suspenso em virtude da apresentação de garantia por parte do impugnante.

Factos não provados

Inexistem. As demais asserções integram antes conclusões de facto e/ou direito.

Motivação

Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos dos autos, designadamente do processo administrativo e aqueles que foram juntos com a petição inicial, os quais não foram impugnados.


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Ao abrigo do disposto no artigo 662º do CPC, adita-se o seguinte ponto ao probatório:

16) No contrato a que alude o ponto 8 supra, cujo teor se dá por reproduzido, foi inserida a cláusula quarta que se apresenta com a seguinte formulação (cfr. fls. 31 e 32 dos autos):

“1. Como contrapartida dos serviços prestados pela Segunda Outorgante, e identificados na Cláusula Primeira deste Contrato, a Primeira Outorgante pagará à Segunda, um valor que será liquidado após apurado o valor final obtido com a colheita.

2. Para o cálculo desse valor, será tido em conta o preço médio corrente no mercado para cada operação ponderado pela real produção obtida por ha”.


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2.2. De direito

Os presentes autos respeitam a uma impugnação judicial cujo objecto corresponde a três liquidações adicionais de IVA (e respectivos juros compensatórios), respeitantes aos anos de 2004, 2005 e 2006, todas elas resultantes da não aceitação da dedução do imposto liquidado em três diferentes facturas, emitidas pela “Herdeiros de ... – Sociedade Agro Pecuária, Lda”, relativas – segundo o relatório de inspecção - a “serviços prestados anualmente de lavouras, mondas, debulha, secagem e transportes na Herdade das ...”, em campanhas de arroz.

No essencial, a não aceitação do IVA deduzido pela Impugnante resulta do entendimento da AT segundo o qual as três facturas em causa “não cumprem os requisitos legais, quer do artº 7º, nº1 al. b), quer do artº 36º nº5”, do CIVA (cfr. relatório de inspecção).

Com efeito, de acordo com a fundamentação constante do relatório dos serviços inspectivos, as facturas em causa pecam pela “falta de temporização dos serviços prestados” e, bem assim, pela “falta de discriminação e valorimetria dos serviços”, o que determinou a aplicação ao caso da alínea a), do nº2 do artigo 19º do CIVA, nos termos do qual só confere direito a dedução o imposto mencionado em facturas passadas na forma legal.

Na impugnação judicial deduzida, a Impugnante, ora Recorrida, defendia o direito à dedução do IVA constante das facturas nºs 32, 52 e 66, considerando que as mesmas se mostram passadas na forma legal, ou seja, de acordo com os requisitos previstos no artigo 35º do CIVA (actual artigo 36º) e no artigo 226º, nº6 da Directiva 2006/112/CEE. Defendia a Impugnante que, caso assim não fosse entendido, sempre se deveria fazer actuar o disposto no artigo 100º, nº1 do CPPT, por se suscitarem “dúvidas sobre o facto tributário”.

No entendimento da Recorrida, a posição da AT, in casu, resultou de uma deficiente interpretação e aplicação do conceito de prestação de serviços (por referência ao contrato de prestação de serviços exibido na p.i), a reclamar, eventualmente, o recurso ao mecanismo do reenvio prejudicial. Para além do mais, trata-se de uma interpretação violadora da CRP, designadamente dos artigos 80º, alíneas c) e e), 81º, f), 82º, nº1 e 86º, nº2.

Em abono da sua tese, defendia a Impugnante, ainda, não ser aceitável que a AT não aceite a dedução do IVA liquidado nas facturas em causa e, ao mesmo tempo, se “mantenha absolutamente inactiva em relação ao emissor das facturas”, por daí resultar um enriquecimento sem causa da AT.

Dito isto, avancemos.

Em 1ª instância, a impugnação judicial foi julgada procedente e, em consequência, as liquidações contestadas foram anuladas.

Para assim concluir, a Mma. Juíza a quo começou por discorrer demoradamente sobre a temática dos custos fiscais, designadamente sobre o requisito da indispensabilidade dos mesmos, tudo por referência (implícita) ao disposto no artigo 23º do CIRC, para afirmar que “são custos fiscalmente dedutíveis todas as despesas que se relacionem directamente com o processo produtivo, designadamente com a aquisição de factores de produção, como é o caso das prestações de serviços objectivadas na preparação de terrenos e demais actividades afins com a cultura de arroz desenvolvida pelo impugnante”.

Como é evidente, correspondendo o objecto da impugnação judicial às liquidações adicionais de IVA resultantes da não aceitação da dedução do imposto com fundamento na alínea a), do nº2, do artigo 19º do CIVA, esta incursão inicial pelo IRC e pelo CIRC mostra-
-se absolutamente desajustada, não fazendo sentido que nela nos detenhamos. Aliás, como é patente, nem tal discurso argumentativo foi adoptado pela Impugnante, nem o recurso jurisdicional interposto lhe faz a menor referência.

Avancemos, então, para um segundo plano de análise adoptado pela sentença relativamente à questão suscitada.

Para que melhor se perceba a questão que aqui nos irá ocupar, importa ter presente, desde já, o teor das três apontadas facturas, considerando-se, para tal, os pontos 9) a 13) dos factos provados. Assim:

“9) A sociedade identificada em 8) emitiu as facturas com os números 32, 52 e 66, respectivamente em 18/11/2004, 22/12/2005 e 30/10/2006;

10) Em cada uma, correspondentemente, foram apostos os valores totais de 36.890,00 €, 41.238,25 € e 17.279,00 € e em todas incorporado IVA a 21%;

11) Nas facturas nºs 32 e 52 foi aposta a seguinte menção: Serviços prestados na Herdade das ... Campanha 2004 Lavouras, Mondas, Debulha, Secagem”;

12) Na factura nº 66, por sua vez, foi aposto Serviço de Máquinas na Preparação da Lavra para Cultura de Arroz;

13) As mencionadas facturas indicam como destinatário / beneficiária da citada prestação de serviços o ora impugnante”.

Lê-se, então, na decisão recorrida – que não deixou de convocar o disposto nos artigos 7º e 35º do CIVA - o seguinte:

“Invoca – leia-se, a AT - a tal respeito que as facturas não apresentam a temporização, a discriminação e valorimetria dos serviços nelas descritos.

(…)

Vistas as normas impõe-se fazer menção quanto à validade e relevância do contrato de prestação de serviços que ficou assente existir entre o impugnante e a sociedade prestadora dos serviços que são enunciados nas facturas desconsideradas pela Administração Fiscal. Ora, neste aspecto não vem referida uma linha no relatório da inspecção. Daqui não se pode extrair consequências mas tal não invalida que o Tribunal o venha agora a apreciar e considerar relevante na medida em que atesta o relacionamento existente entre o impugnante com aquele prestador de serviços em concreto, nomeadamente desde Janeiro de 2004. Nomeadamente daí decorrem as designações das operações inerentes aos serviços necessários para a exploração do impugnante, no caso a cultura do arroz.

Retomando os motivos que sustentaram a desconsideração dos valores apostos nas facturas e sua coadunação com as normas aplicáveis aponta-se, desde logo, para um diverso entendimento do Tribunal relativamente àquele que vem processado no relatório do procedimento de inspecção.

Apreciando separadamente cada um daqueles aspectos, temos, em primeiro lugar, que enunciar que quanto à falta de temporização dos serviços defende a AT no relatório que ocorre violação da norma imposta pela al. b) do nº 1 do art. 7º do CIV. Mais, rejeita a caracterização dos serviços em questão como continuados e, assim, a aplicação do disposto no nº 3 do mesmo preceito legal. Sucede que, com o devido respeito, tal conclusão é contrária à natureza da actividade em questão, composta por sucessivas fases tendentes ao fim último, a debulha do arroz. Entende-se que o legislador não exigiu uma dispersão na facturação quando a própria natureza das actividades a ela não conduz e sempre que as prestações dos serviços em questão sejam conexos entre si. Posto isto configura o Tribunal como uma exigência desconforme com a actividade em questão e a pretensão do legislador que sempre terá que ser harmonizada com a realidade. É, pois, entendimento do Tribunal que se aplica ao caso vertente o nº 3 do art. 7º do CIVA na medida em que os serviços prestados pela sociedade emissora das facturas são continuados no tempo, não sobrevindo prejuízo para o Estado a facturação a final da época de cultura.

Transcorrendo daqui para os seguintes critérios impostos pela AT, isto é, discriminação e valorimetria dos serviços temos que concluir da mesma forma. Ou seja, desconsiderando a AT as facturas daquelas prestações de serviços mediante a invocação de que a lei impõe a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, apresenta entendimento desgarrado da concreta realidade em que se insere o impugnante e actividade que o mesmo explora. Com efeito, a destrinça que ao caso podia ser exigida vem exposta nas facturas em termos de fases da cultura em que interveio o prestador do serviço e actividade concretamente prestada. Nos demais requisitos impostos pela lei, nomeadamente no art. 35º, nº 1 do CIVA verifica-se existir absoluta conformidade.

Pelo exposto, não logrando a AT demonstrar a inverdade material das facturas e resultando afastados os motivos formais que vinham opor-se à consideração das mesmas porque contrários às normas aplicáveis, considera-se procedente a impugnação”.

A Fazenda Pública, nos termos que resultam das conclusões da alegação de recurso, insurge-se contra o assim decidido, defendendo, em síntese, que: o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por não observância da alínea b), do n.º 1, do artigo 7º, do artigo 8º e do 36º, todos do CIVA; as facturas em causa não podem ser tidas "como passadas em forma legal", para efeitos do disposto na alínea a), do n.º 2, do artigo 19.º do CIVA; o "facto gerador'' do IVA, não se compatibiliza nem com o clima, nem com as fases ou sequências, nem com a melhor oportunidade de facturar, ou com facturação unicamente a final de uma campanha completa; toda a prestação de serviços deve ter liquidação de IVA no momento da sua realização; as prestações de serviços em causa não podem ser consideradas como "prestações de serviços continuados " por se tratar de serviços distintos, não se aplicando ao caso vertente o nº 3 do artigo 7º do CIVA; nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 7º do VIVA, nas prestações de serviços, o imposto torna-se exigível no momento da realização, independentemente do disposto na Cláusula Quarta do contrato de prestação de serviços junto pela Impugnante; não existe verdade temporal nas facturas; não existe verdade na descrição nas facturas; não existe quantificação dos serviços; o IVA liquidado não é dedutível, nos termos do disposto no artigo 19º, nº2, alínea a) do CIVA.

Vejamos, então, o que se nos oferece dizer a este propósito, tendo presente que a questão que constitui o núcleo do presente recurso jurisdicional consiste em saber se as facturas emitidas pela “Herdeiros de ... – Sociedade Agro Pecuária, Lda”, com os nºs 32, 52 e 66, preenchem, ou não, os requisitos previstos no artigo 35º, nº 5, alíneas b) e f) do CIVA (actual artigo 36º do CIVA, na redacção posterior à revisão do articulado, efectuada pelo Decreto-Lei n.º102/2008, de 20/06).

Como sabemos, o IVA é um imposto geral sobre o consumo que incide sobre as transmissões de bens, as prestações de serviços, as importações e as operações intracomunitárias efectuadas no território nacional – cfr. artigo 1º do CIVA.

Dispõe o artigo 19º, nº 1, alínea a), do CIVA, que, para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos.

Por seu turno, resulta do nº 2, alínea a), do mesmo preceito que só confere direito a dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal.

Importa evidenciar que, nos termos do nº 6 do referido artigo 19º, “para efeitos do exercício do direito à dedução, consideram-se passados em forma legal as facturas ou documentos equivalentes que contenham os elementos previstos no artigo 35.º” (hoje, a menção é ao artigo 36º).

Como se escreveu no acórdão do STA de 31/01/08, no recurso nº 902/07, “para evitar a fraude fiscal, o legislador determinou que só seria dedutível o imposto mencionado em facturas, documentos a estas equivalentes passados em forma legal ou no recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, e desde que tais documentos estivessem em nome e na posse do sujeito passivo.

E, atento aquele objectivo, o legislador foi especialmente exigente – n.º 6 do dito artigo 19.º: “para efeitos do exercício do direito à dedução, consideram-se passados em forma legal as facturas ou documentos equivalentes que contenham os elementos previstos no artigo 35.º…

A factura ou documento equivalente deve ser emitida pelo sujeito passivo “por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º do presente diploma, bem como pelos pagamentos que lhe sejam efectuados antes da data de transmissão de bens ou prestação de serviços” – artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do CIVA…

Na verdade, é reconhecido o carácter formalista do IVA, em ordem nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que as respectivas formalidades o são ad substanciam, que não meramente ad probationem”.

Estas, aliás, são ideias consistentemente presentes na jurisprudência dos Tribunais Superiores produzida a propósito desta temática, na qual se escreve, a título de exemplo, que:

- “(…) Estas exigências, como outras, foram estabelecidas como forma de evitar a fuga e evasão fiscais e, porque «a exigência de tais documentos [facturas ou documentos equivalentes] assim apercebidos tem como finalidade apetrechar a entidade pública Administração Fiscal do controlo da situação tributária, e não somente a de obter prova segura dos factos a controlar, os mesmos são formalidades substanciais, que não meramente probatórias, (…)” – cfr. acórdão do TCA Sul, de 25/06/02, processo nº 6721/02;

- “Por isso, porque a exigência de tais documentos assim apercebidos tem também esta finalidade de apetrechar a entidade pública (AF) do controlo da situação tributária, e não somente a de obter prova segura dos factos a controlar, os mesmos são formalidades substanciais, que não meramente probatórias (…)” - cfr. acórdão do TCA Sul, de 21/11/06, processo nº 1438/06;

- “É que, a exigência desses requisitos nos referidos documentos facturas — “tem como escopo permitir à Administração tributaria o controlo da situação tributaria, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo por que as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade “ad substantiam”, insusceptível de substituição por um qualquer outro meio de prova” – cfr. acórdão do TCA Norte, de 19/01/06, processo nº 00027/06.

Tem sido, pois, reconhecido o carácter formalista do IVA, destacando-se o papel central desempenhado pela factura e pela necessidade de a mesma ser passada segundo a forma legal – ou seja, preenchendo-se todos os requisitos do artigo 35º, nº5 do CIVA – como pressuposto da dedução do imposto suportado (e isto, aliás, independentemente da materialidade da operação a que uma concreta factura respeita).

Percorrendo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, resulta evidenciada a relevância da factura, na medida em que permite ao adquirente justificar o exercício do direito à dedução mas, também, como elemento imprescindível à Administração Tributária, por ser demonstrativo da operação sobre a qual o IVA incide e permitir o controlo do imposto/ base tributável.

A este propósito, importa dizer que não se desconhece a jurisprudência do Tribunal de Justiça que apela à consideração de elementos adicionais perante a incompletude de uma factura, concretamente em situações de reverse charge, ou por apelo expresso à rectificação da factura. Tão-pouco se desconhece o sentido do recente acórdão do Tribunal de Justiça, de 15/09/16, proferido no processo nº C-518/16 (Acórdão Barlis), nos termos do qual se refere a consideração/relevância de documentos que contenham uma apresentação mais detalhada dos serviços em causa no processo e que possam ser equiparados a uma factura, na qualidade de documentos que alteram a factura inicial e a ela façam referência específica e inequívoca.

Recuperando o que neste TCA já se escreveu, no acórdão de 21/01/06, no processo nº 1438/06, “(…) Embora a expressão "factura" surja com frequência nos textos legais(…), não existe na lei definição do que seja uma factura.

Mas a arrumação do artigo 476° do Código Comercial no título consagrado à compra e venda, e o teor da sua letra - "o vendedor não pode recusar ao comprador a factura das cousas vendidas e entregues" - logo permite concluir que se trata de um documento emitido pelo vendedor, destinado ao adquirente, que deve, ao menos, identificar os intervenientes e as mercadorias objecto de transacção».

É então bom de ver que, conforme o fim a que a destina o comprador, será necessário que a factura contenha mais ou menos elementos; na maioria dos casos, o preço das mercadorias será imprescindível; em muitos casos, não poderão faltar as condições de entrega e pagamento - etc., etc..

No caso concreto, a factura não se destina, só, ao uso do comprador, mas constitui um elemento essencial, também, para o fisco, pois é o documento demonstrativo das operações sobre que incide o imposto. Assim, fácil é entender que a factura válida para efeito de IVA terá de identificar do modo mais completo possível os comprador e vendedor, as mercadorias, o preço, e a data da transacção. Trata-se de elementos todos eles relevantes para permitir identificar a operação de modo bastante para que possam extrair-se as devidas consequências quanto ao imposto (sua incidência, sujeitos, taxa, cobrança, reembolsos, etc.). A falta de algum destes elementos pode pôr em risco o mecanismo concebido com o objectivo de arrecadar o imposto.

Natural é, pois, que o legislador tenha entendido que, para que o sistema, aliás, complexo, do IVA, possa funcionar, para facilitar o controlo das operações sujeitas e isentas, e para obstar à evasão fiscal, se tornava necessária, não apenas a emissão de facturas ou documentos equivalentes, na forma que entendesse cada um dos intervenientes, mas a sua emissão com um conteúdo e rigor definidos pela lei. Daí a exigência de uma forma legal.»

O certo é que a norma do artigo 19° do CIVA não nos esclarece sobre qual é a "forma legal" que exige. Mas o diploma diz-nos, adiante, nas várias alíneas do n° 5 do artigo 35°, que as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto; conter a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; conter o preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável; e conter as taxas aplicáveis e o montante de imposto devido.

Daqui resulta, pois, que, para o CIVA, uma factura passada em forma legal é a que respeite o estatuído no seu artigo 35°, ou seja, que para tal efeito, a factura que não respeite todas estas exigências não é uma factura passada em forma legal.

Neste conspecto, nem pode dizer-se que este art. 35º permite distinguir entre falta de forma legal e falta de elementos meramente acessórios, não essenciais, que só podem levar ao suprimento da falta.

É que, o legislador estabeleceu, no artigo 19° n° 2 do CIVA, duas condições para a dedução do imposto: que ele esteja mencionado em factura ou documento equivalente e que essa factura ou documento equivalente esteja "em forma legal".

Ora, a forma legal, já se viu, é a do artigo 35° n° 5. Como também se expende no citado acórdão acima «Não se vêm elementos que permitam ao intérprete separar, de entre as exigências da norma, as essenciais das acessórios. A "forma legal" é a que satisfaça todas as imposições da norma legal que as indica».

Assim sendo, a factura ou documento equivalente que não respeite integralmente o artigo 35° n° 5 do CIVA não está passada "em forma legal" e, consequentemente, não permite deduzir o respectivo imposto”.

Com isto dito, centremo-nos no quadro legal aplicável.

Dispunha o artigo 35º (Prazo de emissão e formalidades das facturas e documentos equivalentes), nº5, alíneas b) e f), do CIVA, que:

“ (…)

5 - As facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos:

(…)

b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efectivamente transaccionadas deverão ser objecto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução;

(…)

f) A data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efectuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da factura.

Ora, centrando-nos no conteúdo das alíneas b) e f) do nº5 do artigo 35º do CIVA (as que foram expressamente invocadas no relatório de inspecção), há que reconhecer que as facturas em causa não contêm os elementos referentes à quantidade dos serviços prestados, nem tão-pouco a data em que os serviços foram realizados (note-se, esclarecendo, que a AT expressamente admite que a descrição constante das facturas é suficiente para efeitos de denominação dos serviços, conforme resulta do fls. 6 do relatório).

Com efeito, a referência a “Serviço de Máquinas na Preparação da Lavra para Cultura de Arroz” é, para os efeitos aqui em análise, pouco mais que nada.

No caso, ficamos sem saber quando foram prestados os serviços de máquinas (em Janeiro de 2006? Em Dezembro desse ano?), onde foram prestados, além de se desconhecerem quaisquer elementos que permitam quantificar os serviços em causa, concretamente os valores envolvidos na relação horas/máquina.

Quanto às facturas de 2004 (nº32) e 2005 (52), nas quais a “designação” corresponde,

respectivamente, a “Serviços prestados na Herdade das ... Campanha Arroz 2004, Lavouras, Mondas, Debulha, Secagem e Transporte” e “Serviços prestados na Herdade das ... Campanha 2004, Lavouras, Mondas, Debulha, Secagem”, há que concluir, igualmente, que as mesmas não cumprem os apontados requisitos do artigo 35º, nº5 do CIVA.

Uma vez mais, a indicação adoptada não permite, em qualquer dos casos, aferir a data em que os serviços foram realizados, ou seja, não é possível aferir em que momento teve lugar cada um dos serviços que surgem discriminados nas facturas, não sendo questionável que cada um destes serviços são distintos entre si e ocorreram em momentos temporais diversos.

Acresce que, também aqui, se desconhecem os elementos que permitiram quantificar os serviços em causa, sejam eles os valores envolvidos na relação horas/máquina ou na relação horas/homem, o que impossibilita aferir do acerto dos valores envolvidos/ base tributável. Na verdade, não se extraem das facturas elementos que permitam saber a razão pela qual as facturas se apresentam com os valores de X e não de Y.

No que toca à exigência de que a factura contenha a data em que foi efectuada (ou concluída) a prestação de serviços, percebe-se, desde logo, que a mesma visa habilitar a AT a controlar o pagamento do imposto devido e, sendo esse o caso, a existência do direito a dedução do IVA. Nesta linha, a data da prestação dos serviços objecto da factura possibilita o controlo quanto ao momento em que ocorreu o facto gerador do imposto, permitindo determinar as disposições fiscais aplicáveis à operação a subjacente ao documento em causa.

Conclui-se, pois, em face de tudo quanto vem dito, que, como os serviços inspectivos apontaram, os termos utilizados nas facturas em causa são omissos, não preenchendo, assim, os requisitos legais a que se referem as apontadas alíneas b) e f) do nº 5 do artigo 35º do CIVA.

Deve dizer-se, aliás, que se trata aqui dos mesmos requisitos a que alude o artigo 226º, nºs 6 e 7 da Directiva 2006/112, a que o Impugnante faz expressa referência, ou seja, “a extensão (…) dos serviços prestados” e a “a data em que foi efetuada, ou concluída, a (…) a prestação de serviços”.

Nos termos expostos, entendemos, pois, que as facturas em causa não preenchem as exigências decorrentes do CIVA (assim como da Directiva supra identificada).

É certo que a Impugnante vinha invocar o contrato de prestação de serviços celebrado entre si e a emitente das facturas, a “Herdeiros de ... – Sociedade Agro Pecuária, Lda”, pondo em especial enfoque no facto de as facturas aqui em causa se inserirem numa prestação de serviços continuada e facturada anualmente (e no final de cada ano), evidenciando, em particular, o disposto na cláusula quarta desse contrato (cfr. ponto 16 do probatório) e os moldes em que daí resultaria o valor das prestações de serviços facturadas.

A verdade, porém, é que, do nosso ponto de vista, não cremos que se possa afirmar, como fez a sentença, que estamos perante um caso de prestações de serviços de carácter continuado, entendidas estas como as prestações que se prolongam no tempo em função da natureza do próprio serviço (exº avença) e que dão lugar a pagamentos sucessivos – cfr. artigo 7º, nº3 do CIVA.

Daí que, em nossa opinião, façam aqui sentido as considerações expendidas pela AT no sentido de que as prestações de serviços identificadas nas facturas em causa não se confundem (a monda distingue-se, por exemplo, da debulha ou do transporte) e ocorrem necessariamente em momentos temporais diferentes.

Daí, também, o acerto das considerações feitas a propósito do facto gerador do imposto e da exigibilidade do mesmo, por referência expressa ao artigo 7º, nº1, alínea b), do CIVA, no sentido de que, nas prestações de serviços, o imposto é devido no momento da sua realização.

Contudo, no caso concreto, e independentemente da natureza do contrato celebrado entre as partes, a verdade é que, contrariamente ao que pretende a impugnante, dos termos em que as partes acordaram o pagamento dos serviços a prestar – cfr. cláusula quarta do contrato, segundo a qual “1. Como contrapartida dos serviços prestados pela Segunda Outorgante, e identificados na Cláusula Primeira deste Contrato, a Primeira Outorgante pagará à Segunda, um valor que será liquidado após apurado o valor final obtido com a colheita. 2. Para o cálculo desse valor, será tido em conta o preço médio corrente no mercado para cada operação ponderado pela real produção obtida por ha” – nada de útil se retira para efeitos de evidenciar a concreta quantificação/ extensão dos serviços prestados pela emitente da factura.

E, repete-se, já vimos – o que aqui é absolutamente decisivo – que as facturas em causa, nos termos em que se apresentam, não revelam tal quantificação/extensão das prestações de serviços, o que, nos termos já expostos, compromete definitivamente a possibilidade de a AT controlar a base tributável e o apuramento do imposto.

É, pois, por esta razão que o IVA liquidado nas facturas em causa não pode ser deduzido, sendo claro que não se mostram preenchidos todos os requisitos formais que as facturas, nos termos legais, devem conter – cfr. artigo 19º, nº2 do CIVA.

Neste conspecto, é absolutamente inconsequente a pretensão da Impugnante de se aplicar ao caso concreto o disposto no artigo 100º, nº1 do CPPT, nos termos do qual “Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado”.

A regra contida neste nº 1 do artigo 100º do CPPT mais não é que a aplicação ao processo judicial da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário, constante do artigo 74º, nº1 da LGT (idêntica à regra prevista no nº1 do artigo 342º do CC), nos termos da qual o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração e dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

Compete ao contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do artigo 19.º do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o artigo 100.º do CPPT não tem aplicação – neste sentido, o acórdão TCA Norte 24/01/08 (processo 01834/04 Viseu); os acórdãos da 2.ª secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 17/04/02 (processo n.º 26.635) e do Pleno, de 7/5/03 (processo 1026/02).

Retomando argumentação avançada na p.i, em abono da tese da Impugnante, há que dizer com clareza que, na economia dos autos, se afigura irrelevante a questão suscitada em torno da interpretação e aplicação do conceito de prestação de serviços (por referência ao contrato de prestação de serviços exibido na p.i), a reclamar, segundo a Recorrida, o recurso ao mecanismo do reenvio prejudicial, já que a questão a decidir se situa num outro plano – não confundível com o da natureza do contrato – isto é, com as formalidades das facturas.

Também não se vê em que medida é que o entendimento da AT, sufragado por este Tribunal, pode representar uma violação da Lei Fundamental, em concreto do disposto nos artigos 80º, alíneas c) e e), 81º, f), 82º, nº1 e 86º, nº2, da CRP, preceitos estes respeitantes à liberdade de iniciativa e de organização empresarial no âmbito de uma economia mista, ao planeamento democrático do desenvolvimento económico e social, à incumbência dirigida ao Estado de assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, à coexistência de três sectores de propriedade dos meios de produção e, bem assim, à limitação de o Estado intervir na gestão de empresas privadas.

Não está subjacente à actuação da AT qualquer posição (e, por isso, ofensa) relativa os princípios que enformam a organização económica e social do Estado, mas tão-só a aplicação das regras do CIVA, em matéria de formalidades das facturas para efeitos do exercício à dedução.

Por último, uma breve referência para um derradeiro argumento da impugnante: do seu ponto de vista, não é admissível que a AT não aceite a dedução do IVA liquidado nas facturas em causa e, ao mesmo tempo, se “mantenha absolutamente inactiva em relação ao emissor das facturas”, por daí resultar um enriquecimento sem causa da AT (“duplicação de colecta”, nas palavras também constantes da petição inicial).

Trata-se de uma linha argumentativa inconsistente para os efeitos pretendidos de anulação das liquidações impugnadas, bastando, para afastar tal linha de defesa, ter presente que são sujeitos passivos de IVA as pessoas singulares ou colectivas que, em factura ou documento equivalente, o mencionem ainda que indevidamente – cfr. alínea c) do nº 1 do artigo 2º do CIVA.

Quer isto dizer, portanto, que a simples menção do IVA em factura ou documento equivalente, mesmo que porventura imprópria, por não haver lugar ao mesmo, origina obrigação de imposto.

Como se sublinha, entre outros, nos acórdãos do STA, de 26/9/2012 e de 24/4/2002, respectivamente nos processos. n.ºs 0555/12 e 26636, «este resultado deriva tanto do carácter rígido e formalista do IVA como do facto de o sujeito passivo destinatário da factura ter o direito de dedução respectivo.

Nas palavras de XAVIER DE BASTO (Cfr. “A harmonização Fiscal na CEE”, Ciência e Técnica Fiscal, nº 362, p. 44), cada factura com menção de imposto, constitui “um cheque sobre o tesouro, pois atribui ao destinatário que seja sujeito passivo o direito de deduzir o IVA nela contido. Por isso, (...) a simples menção do IVA em factura (mesmo que porventura descabida, por não haver lugar a imposto naquele caso, por qualquer razão) origine obrigação de pagar, independentemente da qualidade do emissor, isto é, seja ele ou não um sujeito passivo. Tornar-se-á, pelo simples facto da menção, um “devedor de imposto”. Só assim se consegue que ao direito à dedução, que a factura atribui ao destinatário sujeito passivo, corresponda sempre uma obrigação de pagar. Assim se assegura o funcionamento regular do sistema de pagamentos fraccionados.»

Tanto basta, pois, para concluir que as liquidações adicionais de IVA impugnadas são legais e devem manter-se na ordem jurídica, contrariamente ao decidido em 1ª instância.

Do mesmo modo, são de manter as liquidações de juros compensatórios (também objecto de impugnação), na consideração de que os mesmos visam, nos termos da lei (cfr. artigo 35º, nºs 1 e 2 da LGT), compensar o Estado quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária ou quando, por facto a si imputável, o contribuinte tenha recebido reembolso superior ao devido.

Se bem lermos a petição inicial, constatamos que a Impugnante jamais alega no sentido de pôr em causa os pressupostos de facto e de direito da liquidação de juros compensatórios, limitando-se a concluir que é a Impugnante que “se apresenta, por longos interregnos temporais, como credor, ou seja, se existe legitimidade para cobrar juros compensatórios, é ao Rte, na medida em que é este quem sempre é reembolsado muito para além do prazo legalmente estatuído”.

Como está bem de ver, pela formulação transcrita, a discordância quanto à liquidação dos juros compensatórios não vem formulada enquanto ataque aos pressupostos dos mesmos mas antes - isso sim - pela afirmação de que é a impugnante que, em vários momentos, deveria ser compensada por atrasos no reembolso do imposto.

Ora, a questão dos pressupostos para ressarcir a Impugnante por atrasos da AT em nada contende com a compensação da Administração pelos atrasos a que se reporta o artigo 35º da LGT, pois que se trata de realidades distintas e que não se confundem (num caso, poderão estar em causa juros indemnizatórios; noutro, juros compensatórios).

Pelo que, sem necessidade de outras considerações, não resta senão concluir pela ineficácia da argumentação esgrimida, na medida em que daí se pretenda retirar qualquer efeito anulatório da liquidação dos juros em causa.


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Face a tudo quanto vem dito, e dispensando-nos de maiores considerações, há que julgar procedentes as conclusões do presente recurso jurisdicional e, nessa medida, conceder provimento ao mesmo.

Tal equivale a dizer, no caso, que a sentença recorrida deve ser revogada, julgando-se improcedente a impugnação judicial deduzida pelo ora Recorrido e mantendo-se na ordem jurídica as liquidações adicionais impugnadas.


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3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao recurso e, em consequência:

- revogar a sentença recorrida;

- julgar improcedente a impugnação judicial;

- manter as liquidações impugnadas.

Custas pelo Recorrido, em ambas as instâncias.

Lisboa, 11/01/18


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Lurdes Toscano)

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(Joaquim Condesso)