Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2074/17.6BELSB-R1
Secção:CA
Data do Acordão:05/24/2018
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÃO - CONVITE A APRESENTAR,
COMPLETAR OU ESCLARECER AS CONCLUSÕES DO RECURSO
Sumário:I- O artigo 7º do CPTA é um preceito complementar do artigo 9º do CC e não visa, nem poderia visar, o desrespeito pelos preceitos legais processuais injuntivos, nem permite que o juiz se substitua à lei no que ao Direito adjetivo diz respeito.
II- O artigo 146º, nº 4, do CPTA, de acordo com o artigo 9º do CC, aplica-se apenas aos processos administrativos impugnatórios como tal previstos no CPTA.
III- O processo previsto nos artigos 104º ss do CPTA não tem natureza impugnatória, visando sim a prestação de um facto.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

I – RELATÓRIO
Em intimação prevista nos artigos 104º ss do CPTA, tendo como REQUERENTE B……………. e ENTIDADE REQUERIDA M...... J......... (P.J.), foi proferida sentença de provimento em 20-12-2017.
A Entidade Requerida interpôs recurso, sem formular quaisquer conclusões.
Em consequência, o TAC não admitiu o requerimento de interposição do recurso, invocando os artigos 144º/2 e 145º/2-b) do CPTA.
*
Inconformado com tal decisão, o recorrente M……… J………… interpôs a presente reclamação prevista no artigo 145º/3 do atual CPTA, formulando as seguintes conclusões:
1. A falta de conclusões nas alegações de recurso não tem como consequência imediata o indeferimento do recurso, devendo, antes, aplicar-se o disposto no n.º 4 do artigo 146 do CPTA, convidando-se o Recorrente a apresentá-las;
2. O disposto no n 4 do artigo 146 do CPTA não é aplicável somente no âmbito de processos impugnatórios, mas a todas as impugnações de sentenças proferi­das em processos regulados no CPTA;
3. Tal norma contém uma consagração do princípio geral pro actione, vertido no artigo 7 do CPTA, que impõe uma interpretação que se apresente como a mais favorável ao acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, surgindo, pois, como corolário do direito constitucionalmente consagrado no artigo 20 da CRP;
4. A existir quaisquer dúvidas interpretativas nesta área, o julgador deve interpre­tar e aplicar as normas processuais no sentido de optar por aquela que favoreça a ação;
5. A norma do n. 4 do art. 146 do CPTA aplica-se ao Recorrente, mesmo quando este não interveio na ação como Autor.
*
Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.
*
II – FUNDAMENTAÇÃO
Já vimos que a Entidade Requerida interpôs recurso sem formular quaisquer conclusões.
O recurso é interposto mediante requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão, que inclui ou junta a respetiva alegação e no qual (i) são enunciados os vícios imputados à decisão e (ii) formuladas conclusões – artigo 144º/2 do CPTA.
O requerimento é indeferido quando:
a) Se entenda que a decisão não admite recurso, que este foi interposto fora do prazo ou que o requerente não tem as condições necessárias para recorrer;
b) Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 146.º - artigo 145º/2. Corresponde ao artigo 641º/2 do CPC, ressalvada a referência à ação administrativa impugnatória e ao caso especificado no artigo 146º/4 cit.
Quando o recorrente, na alegação de recurso contra sentença proferida em processo impugnatório, (i) se tenha limitado a reafirmar os vícios imputados ao ato impugnado, (ii) sem formular conclusões ou (iii) sem que delas seja possível deduzir quais os concretos aspetos de facto que considera incorretamente julgados ou as normas jurídicas que considera terem sido violadas pelo tribunal recorrido, o relator deve convidá-lo a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de não se conhecer do recurso na parte afetada – artigo 146º/4.
Diferente é a situação prevista no artigo 639º/3 do CPC, aplicável em geral.
Ora, o presente processo é da espécie urgente regulada nos artigos 104º ss do CPTA.
Não é, claramente, um processo de impugnação de uma decisão administrativa. Os processos impugnatórios no CPTA são os previstos nas als. a) e d) do artigo 37º/1 do CPTA.
Aqui estamos perante um processo declarativo impositivo, em que o autor pretende efetivar um direito à informação, exigindo da A.P. uma prestação de facto.
Aliás, ainda que relevasse autonomamente a recusa pela A.P. – o que o CPTA não tolera, nunca poderia haver aqui lugar a um processo impugnatório, pois, como o recorrente e reclamante alega, houve um requerimento e a A.P. recusou-o (cf. artigos 66º ss do CPTA). Mais: o recorrente não se limitou a reafirmar vícios de (?) um ato impugnado (?).
Em síntese:
-o artigo 7º do CPTA invocado pelo reclamante é um preceito complementar do artigo 9º do CC e não visa, nem poderia visar, o desrespeito pelos preceitos legais processuais injuntivos, nem permite que o juiz se substitua à lei no que ao Direito adjetivo diz respeito;
-o artigo 146º/4 do CPTA, de acordo com o artigo 9º do CC, aplica-se apenas aos processos administrativos impugnatórios como tal previstos no CPTA;
-o processo previsto nos artigos 104º ss do CPTA não tem natureza impugnatória, visando sim a prestação de um facto.
Cf. assim: MÁRIO AROSO/C.C., Comentário ao CPTA, 4ª ed., p. 856; ANTONIO GERALDES, Recursos no Novo CPC.
Portanto, ante a absoluta falta de conclusões, o TAC decidiu bem, de acordo com o Direito.
*
III - DECISÃO
Por tudo quanto vem de ser exposto e de harmonia com os poderes conferidos no artigo 202º da Constituição, acordam os juizes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento à presente reclamação, assim se confirmando o despacho de rejeição do requerimento de interposição de recurso.
Custas a cargo do reclamante.
Registe-se e notifique-se.
Lisboa, 24-05-2018

Paulo Pereira Gouveia - Relator

Catarina Jarmela

Maria da Conceição Silvestre