Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2260/17.9 BELRS
Secção:CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO
Data do Acordão:06/07/2018
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:INDEFERIMENTO DE DISPENSA DE GARANTIA
DIREITO DE AUDIÇÃO
DISPENSA AO ABRIGO ARTIGO 198º, Nº5 DO CPPT/ DÍVIDAS DE BAIXO VALOR
Sumário:I - Independentemente do entendimento que se subscreva relativamente à natureza jurídica do acto correspondente ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia – isto é, acto materialmente administrativo praticado no processo de execução fiscal ou acto predominantemente processual – é de concluir que não há, no caso, lugar ao exercício do direito de audiência previsto no artigo 60º da LGT.

II - O artigo 198º, nº5 do CPPT surgiu como uma norma inovadora que criou um regime excepcional de dispensa de garantia para as dívidas de origem fiscal de baixo valor, surpreendendo-se aí uma clara intenção do legislador de não onerar especialmente os devedores ao Estado de quantias de valor reduzido.

III - De acordo com este normativo, nos processos de execução fiscal referentes a dívidas fiscais, em que é requerido o pagamento em prestações, é dispensada a prestação de garantia, ficando o processo automaticamente suspenso, sempre que cumulativamente se verifiquem os seguintes pressupostos: (i) à data do pedido, o requerente tenha dívidas fiscais, legalmente não suspensas; (ii) o valor das dívidas fiscais não suspensas ser inferior a € 5.000 ou € 10.000 para as pessoas singulares e colectivas, respectivamente.

IV – No caso, a dívida exigida no processo nº 1106201701286…, no montante de € 27.573,33, excede claramente o montante em causa, de € 10.000,00, razão pela qual nunca lograria acolhimento, no artigo 198º, nº5 do CPPT, a pretendida dispensa de prestação de garantia.

V - Entre a actual formulação da norma correspondente ao nº 5 do artigo 198º do CPPT (Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro) e a redacção anterior, apenas um aspecto mudou: na redacção anterior apenas se permitia a dispensa da prestação de garantia quando o devedor tivesse dívidas fiscais, legalmente não suspensas, de valor global inferior a € 10 000 euros (no caso das pessoas colectivas), enquanto que, nos termos da actual redacção, a verificação do pressuposto do valor para a dispensa de prestação de garantia é feita dívida a dívida.

VI - Em comum, num e noutro caso, está o facto de este regime excepcional se dirigir a dívidas de baixo valor.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

G… (PORTUGAL) – ............. DE ………….., SA, apresentou reclamação, nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), do despacho, datado de 17/10/2017, proferido pelo Órgão de Execução Fiscal/ Divisão de Execuções Fiscais da Câmara Municipal ………… (CM……..), no âmbito do processo de execução fiscal nº 1…., que indeferiu o pedido de dispensa de prestação da garantia.

A reclamação foi julgada improcedente pelo Tribunal Tributário (TT) de Lisboa.

Inconformada com a sentença proferida, a Reclamante, ora Recorrente, interpôs o presente recurso jurisdicional para este TCA Sul, formulando as seguintes conclusões:

I. A ora Recorrente impugna a decisão sobre a matéria de facto, na medida em que o Tribunal "a quo" dá por provado que "Em 05/02/2017, é remetido à G…. Portugal ............., SA., o ofício nº 924/SG/DJ/DEF/2017, em que se dá a conhecer a esta que a EF nº 1106201701286374 (a cuja Oposição o Município de Lisboa atribuiu o nº 19871/CML/17) foi arquivada tendo a documentação original ingressado na Oposição nº ………………………..", mas, em simultâneo, dá por não provado exactamente o mesmo, ou seja, "que o processo de execução nº ………….…, a que corresponde o processo de oposição com nº …………………….., tenha sido arquivado".

II. Ora, o facto alegado no artigo 11º da petição inicial e demonstrado pelo doc. 20, também da p.i., deve ser dado como provado, acrescentando-se uma nova alínea ao elenco dos Factos Provados com o teor daquele artigo 11º.

III. Mas também todos os factos elencados nas alíneas a) a o) do nº 19 das presentes alegações foram documentalmente provados (doc.s 3 a 16 e doc. 20 da p.i.), sem que tenham sido impugnados pelo Município de ………………...

IV. Daqui resulta que todos aqueles factos devem ser dados por provados (doc.s 3 a 16 e doc. 20 da p.i.), acrescentando-se ao elenco dos Factos Provados novas alíneas com o teor das já mencionadas alíneas a) a o) do nº 19 das presentes alegações.

V. A ora Recorrente imputa ainda à sentença recorrida os vícios de:

a) Omissão de pronúncia;

b) Contradição entre os fundamentos e a decisão;

c) Erro na aplicação do Direito.

VI. Sobre a omissão de pronúncia, o Tribunal "a quo" omitiu a apreciação das questões a que respeitam os factos elencados nas alíneas a) a o) do nº 19. supra, e que se prendem com o efeito da interposição da acção de impugnação judicial dos actos tributários de liquidação das taxas municipais que foram objecto do presente PEF.

VII. Por este motivo, a sentença aqui posta em crise é nula por padecer de vício de omissão de pronúncia, previsto na alínea d) do nº 1do artigo 615º do CPC, o que gera a sua nulidade.

VIII. Mas o Tribunal "a quo" veio ainda a dar por provado o facto de a ora Recorrente ter dívidas fiscais não suspensas ou não garantidas ao Município de …….., o que impossibilitaria o deferimento do pedido de dispensa de garantia.

IX. O Tribunal considerou provado que:

a) O PEF ………..…, no valor de € 2.667,60, não estava suspenso nem havia sido dispensada a prestação de garantia;

b) O PEF ..…, não estava suspenso;

c) O PEF ……..…, não estava suspenso mas também ainda não tinha ocorrido a citação da ora Recorrente.

X. Sucede que o PEF …….…… não pode servir de fundamento à decisão de indeferimento, porquanto é no âmbito deste próprio processo que foi deduzido o pedido de dispensa de garantia, o que significa que o Município de .… não pode indeferir um pedido de dispensa de garantia com fundamento de que quem o requer tem em dívida o montante sobre o qual se está a pedir a dispensa de garantia!!!

XI. Mas, à data em que foi praticado o acto administrativo de indeferimento, o Município de ............. já havia determinado o arquivamento do PEF ……………

XII. Quanto ao PEF ………………..…, o facto de não ter ainda sido praticado o acto processual de citação da Executada, ora Recorrente, impede que possa ser tomado como fundamento para o indeferimento do pedido de prestação de garantia, porquanto nele ainda não havia sido dada oportunidade à Executada para exercer o direito a opor-se ou a pagar ou a prestar garantia.

XIII. Sendo que este facto - a não citação da aqui Recorrente - foi dado por provado pelo Tribunal de 1ª Instância.

XIV. Daqui resulta que existe flagrante contradição entre os fundamentos - na verdade a Recorrente não têm dividas superiores a € 10.000,00 (mas apenas no valor de € 2.667,60) - e a decisão - que considera não poder ser deferido o pedido de dispensa de garantia porque existem dívidas fiscais superiores a € 10.000,00.

XV. A ora Recorrente alegou e fez prova documental que a Execução Fiscal nº ……………. (Procº nº 19…/CML/17) havia sido arquivada (doc . 20 da p.i.).

XVI. Esse facto foi, aliás, dado como provado (Ponto 9. do elenco dos Factos Provados).

XVII. Mas, no seu decisório, o Tribunal a quo entendeu que este processo está activo, daí resultando, para o Tribunal, a legalidade do Despacho reclamado. Com efeito

XVIII. Na sentença ora recorrida escreve-se que "...havendo arquivamento do processo de execução necessário seria existir um despacho do órgão competente a determinar essa ocorrência, o que não resulta dos autos".

XIX. Sucede que o Tribunal dá por provado que "Em 05/02/2017, é remetido à G… Portugal ............., SA., o oficio nº 924/SG/ DJ/DEF/2017, em que se dá a conhecer a esta que a EF nº ………………….… (a cuja Oposição o Município de Lisboa atribuiu o nº ……………foi arquivada tendo a documentação original ingressado na Oposição nº……………'' .

XX. Mas se a execução fiscal onde foi proferido o Despacho reclamado foi arquivada, como ficou demonstrado, então isso é razão suficiente para inibir o Município de ............. de aí praticar quaisquer actos administrativos.

XXI. É, pois, evidente que a sentença aqui posta em crise padece de vício de contradição entre os fundamentos e a decisão, porquanto, num primeiro momento, dá por provado que o PEF onde foi proferido o Despacho reclamado havia sido previamente arquivado pelo Município de Lisboa e, num segundo momento, conclui pela legalidade desse Despacho.

XXII. Sobre o invocado erro na aplicação do Direito, o Tribunal de 1ª Instância decidiu que as decisões proferidas pelo Município de ............. na sequência de um pedido de dispensa de garantia não estão sujeitas ao formalismo de audiência prévia, escudando­ se, para tanto, se no argumento de que se está perante um verdadeiro acto processual sujeito a uma celeridade incompatível com o cumprimento daquele formalismo.

XXIII. A ora Recorrente, contudo, pugna pela evidência, própria do princípio da separação de poderes e elemento essencial de um Estado de Direito Democrático, de que o Município de Lisboa é e sempre será, um componente da organização administrativa integrado na estrutura executiva de uma autarquia local e não um órgão judicial ou integrado na administração judiciária.

XXIV. Aliás, se o legislador quis que este tipo de acto administrativo de natureza tributária pudesse ser sujeito a controlo jurisdicional, mediante a dedução da competente Reclamação, então é porque a sua prática se integra na esfera das competências de um órgão administrativo, o que tem por efeito necessário que deve ser respeitado o edifício normativo que regula a sua prática - in casu, o artigo 60º da Lei Geral Tributária (embora se reconheça que este efeito não é pacífico).

XXV. Concluindo-se, assim, pela violação do artigo 60º do Lei Geral Tributária que deve ser interpretado no sentido de que o projecto de acto administrativo de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, na medida em que contende com direitos dos contribuintes, deve ser objecto de audiência prévia.”


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O recorrido apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

I. O presente recurso vem apresentado por G… Portugal, ............., S.A., Reclamante nos autos acima identificados, contra a douta Sentença proferida nos mesmos, em 12 de Fevereiro de 2018, a qual julgou totalmente improcedente a Reclamação por aquela interposta, mantendo, consequentemente, na ordem jurídica o acto praticado pelo Chefe da Divisão de Execuções Fiscais, de 17-10-2017, que indefere o pedido de dispensa de prestação de garantia, no âmbito do Processo de Execução Fiscal(PEF) n…………….….

II. A Recorrente discorda da Decisão do Tribunal a quo objeto do presente, a qual, na ótica da Recorrida e no que aos vícios invocados respeita, não merece qualquer reparo, devendo manter-se na ordem jurídica.

III. A Recorrente deduz o presente Recurso, descurando, contudo e em absoluto, o ónus que sobre si impende de o finalizar, com a formulação de conclusões, que delimitam o objecto do mesmo.

IV. Não obstante a possibilidade legal, consignada no n.º 5 do artigo 282º do CPPT, certo é que compete à Recorrente o cumprimento daquela disposição legal, importando a sua inobservância o não conhecimento do recurso pelo Tribunal ad quem.

V. Entende a Recorrente estar a Decisão Recorrida ferida de vício de omissão de pronúncia (cfr. artigo 21 das Alegações), porquanto não aprecia os factos antecedentes do acto reclamado, cfr. artigos 4º a 6º da PI e artigo 19º das Alegações.

VI. Dos factos referidos nos artigos 4º a 6ºº da PI nenhuma questão é sindicada pela Recorrente, limitando-se a afirmar, na Petição Inicial, ter apresentado contra os actos de liquidação das taxas de publicidade reclamações graciosas e alegadamente do indeferimento tácito daquelas, deduzido junto do Tribunal Tributário de Lisboa, Impugnação Judicial, remetendo para a peça processual que junta sob doc .nº 16.

VII. A Recorrente confunde claramente as questões que submete a julgamento, com as razões que entende justificá-las, sendo certo que, o invocado nesta sede para justificar a pretensa omissão de pronúncia, não assume qualquer relevância na causa de pedir ou pedido formulado na Reclamação deduzida.

VIII. Ao Tribunal a quo impunha-se que apreciasse a (i)legalidade do acto que indeferiu a dispensa de prestação de garantia, causa de pedir e pedido da Recorrente, não que se debruçasse sobre toda a matéria alegada, designadamente quando, a não ser na tese da Recorrente, esta não influi na discussão que é levada à julgamento.

IX. A ser intenção da Recorrente ver discutida a matéria elencada nos artigos 4º a 6º da PI (nesta sede, artigo 19º das Alegações), tal deveria resultar do seu excurso argumentativo, o que peremptoriamente não resulta.

X. Não obstante as considerações meramente conclusivas, invocadas nos identificados artigos da P.I. e artigo 16º das Alegações, não poderá deixar de se afirmar, por referência àqueles, que a Recorrente requer o pedido de dispensa de prestação de garantia em sede que não é a própria, como também, a competência para a análise daquele pedido é exclusiva do Órgão de Execução Fiscal, tal como, aliás, é assinalado e bem na douta Sentença Recorrida.

XI. Ao contrário do alegado pela Recorrente, o Tribunal a quo, quanto à questão da interposição de impugnação judicial versus pedido de dispensa de garantia e alegado efeito suspensivo daí decorrente, teceu o seu julgamento, decidindo pela improcedência de tal argumento {a fls. 11da Douta Sentença Recorrida).

XII. Improcede pois a alega nulidade da Sentença a quo.

XIII. Da matéria de facto que a Recorrente pretende ver discutida no presente {cfr. artigos 23º a 24º das Alegações), extrai-se a conclusão de que aquela entende dever ser considerado provado o facto que alega em 11º da PI; facto absolutamente descontextualizado e dissonante da prova documenta junta aos autos (cfr. fls. 162 dos mesmos), espelhando, salvo o devido respeito, não o conteúdo do documento que fundamenta o probatório (cfr. Ponto 9 Dos Factos Provados), mas antes a interpretação da Recorrente sobre o referido documento, o Ofício n.º 924/SG/DJ/DEF/2017.

XIV. Aliás, as considerações pessoais a Recorrente trespassam não só a leitura que faz do Ofício n.º 924/SG/DJ/ DEF/2017, a fls. 162 dos autos, como também, do facto dado como provado no ponto 9 do Probatório.

XV. Na realidade, o Julgado Recorrido não dá como provado o alegado pela Recorrente na alínea a) do artigo 23º das suas Alegações, sendo a citação aí referida desconforme com o teor do facto assente e provado a quo, basta para o efeito atentar no ponto 9 dos Factos Provados.

XVI. Não existe qualquer correspondência verbal, material ou de conteúdo entre o facto considerado assente a quo e a citação que do mesmo é feita, pela Recorrente, alínea a) do artigo 23º das Alegações de Recurso.

XVII. Não corresponde à verdade o alegado na alínea b) do Ponto 23 das Alegações, não sendo plausível o aditamento, à matéria provada, pretendido pela Recorrente em 24 daquelas, por distorcer, em absoluto, o conteúdo do documento junto aos autos a fls. 162, que fundamenta o ponto 9 Probatório.

XVIII. Quanto ao invocado em 25º e 26º das Alegações, não demonstra a Recorrente como é seu ónus, a razão de ser do aditamento pretendido, não Invocando razões sejam factuais, sejam jurídicas para o fundamentar e, assim, justificar a discussão da matéria de facto que, nesta sede, almeja.

XIX. Improcede na sua totalidade a impugnação da matéria de facto preconizada pela Recorrente.

XX. Alega a Recorrente, a contradição no Julgado Recorrido entre os fundamentos e a decisão que preconiza. Com efeito, a Recorrente apela aos processos de execução fiscal que elenca em 28 das Alegações e que fundamentaram a decisão do Órgão de Execução Fiscal, posta em escrutínio, para daí aferir que o Tribunal a quo não poderia sentenciar, como sentenciou, entendendo que não ter dívidas superiores a €10.000,00 nem que o PEF a que subjaz a presente reclamação poderia suster a decisão reclamada, porquanto arquivado.

XXI. Como decorre dos autos; e analisa a douta Sentença Recorrida, a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, funda-se, como bem sabe a Recorrente, na existência de dívidas exequendas, legalmente não suspensas, no valor de €37.683,31, nos processos de execução fiscal - PEF n.º ……….., PEF n.º …………… e PEF n.º …………….… – concretamente identificados no documento a fls. 33 dos autos.

XXII. Ao contrário do alegado nas alíneas g) e h) do artigo 14º das presentes Alegações, a Recorrente não fez prova de que tinha a sua situação tributária regularizada.

XXIII. Da leitura da Certidão apresentada pela Recorrente (cfr.Doc. n.º 18 e 19 da PI e a fls. 160 e 161 dos p. autos) verifica-se, como assente no ponto 6 dos Factos Provados, que a mesma atesta a inexistência de dívidas à Autoridade Tributária e Aduaneira.

XXIV. Como bem analisa a douta Sentença Recorrida, a certidão em causa (ponto 6 do Probatório) não atesta a regularidade da situação tributária da Recorrente relativamente a dívidas ao Município de Lisboa. Com efeito, é ao Município de Lisboa, no exercício das suas competências regulamentares e tributárias [constitucional e legalmente cometidas] que lhe compete averiguar a existência, ou não, de dívidas quanto aos tributos que lhe são próprios, como é o caso, e que, no uso das mesmas, assim o fez.

XXV. Ao contrário do que a Recorrente afirma, a douta Sentença Recorrida não dá como provado o arquivamento do PEF n.º ……….…. a que respeita a Reclamação subjacente ao presente, como claramente decorre do ponto 9 dos Factos Provados e dos Factos Não Provados, nem o poderia fazer, porquanto tal não decorre do teor do documento junto que os fundamenta.

XXVI. Comprovado pela documentação junta aos autos e reproduzida no ponto 9 do Probatório, o PEF n.º ……….…, subjacente ao Processo de Oposição n.º ………….. não foi arquivado.

XXVII. Infere-se do documento reproduzido no ponto 9 do Probatório, ter sido a Oposição deduzida, desentralhada do Processo n.º ………………. (e este arquivado), e ingressada no Processo de Oposição n.º …………….. que tem subjacente o Processo de Execução Fiscal nº …………,a que se refere Reclamação e o acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, sob o qual esta recaiu.

XXVIII. Não se verifica, assim e como bem analisa o Tribunal a quo, a nulidade do acto de indeferimento de dispensa de prestação de garantia por ter sido praticado, num processo de execução fiscal arquivado, não existindo pois, qualquer contradição entre os factos e os fundamentos que alicerçam a Decisão em recurso.

XXIX. Por outro lado, no que concerne PEF n.º ………….… e concretamente quanto ao efeito suspensivo da execução decorrente da admissão liminar da impugnação judicial, pretensão da Recorrente, improcede, como sentenciado a quo, na sua totalidade.

XXX. A suspensão da execução fiscal não opera pela mera distribuição de acção de impugnação judicial, nem, tão pouco, pela sua admissão liminar, pois, para tal, é necessário que seja constituída ou prestada garantia ao abrigo do disciplinado no artigo 169º do PPT, sendo esta posição assente e pacífica, quer dos nossos Tribunais Superiores, quer da nossa doutrina, como sentenciado e bem no Julgado Recorrido.

XXXI. Doutra feita, não prossegue o fundamento invocado quanto à falta de citação no âmbito da execução fiscal com o nº …………………….

XXXII. Para o efeito de dispensa da prestação de garantia com fundamento no artigo 198º, nº 5 do CPPT, deverão ser contabilizadas todas as dívidas tributárias que não estejam legalmente suspensas, independentemente de se encontrarem em cobrança coerciva, considerando-se que essas dividas existem a partir do momento em que seja ultrapassado o prazo para pagamento voluntário das mesmas e que, entretanto, não tenha sido declarada a sua suspensão uma vez verificados os requisitos previstos no artigo 169º do CPPT.

XXXIII. Determina o n.º 5 do artigo 198º do CPPT, que deverá ser aferido o valor das dividas tributárias que não estejam legalmente suspensas, independentemente do facto de se ter, ou não, efectivado a citação.

XXXIV. Bem decidiu o Tribunal a quo.

XXXV. Defende a Recorrida erro na aplicação do direito pelo Tribunal a quo ao decidir que as decisões proferidas pelo Município de Lisboa na sequência de um pedido de dispensa de prestação de garantia não estão sujeitas ao formalismo de audiência prévia.

XXXVI. O Tribunal a quo limita-se, e bem, recorrendo à jurisprudência que se tem firmado neste campo, a acompanhar aquela que é a posição dominante e reiterada dos nossos doutos Tribunais Superiores e nesse conspecto, de que não há lugar, em casos como o dos presentes autos, ao exercido do direito de audiência previamente à decisão do pedido de dispensa prestação de garantia, porque a isso obsta quer a natureza urgente deste procedimento, bem patente no n.º 4 do artigo 170º do CPPT, quer a própria natureza judicial do processo de execução fiscal, absolutamente distinta do procedimento administrativo tributário onde se consagra o artigo 60º da LGT.

XXXVII. A posição assumida pelo Órgão de Execução Fiscal e cuja legalidade foi asseverada pelo Tribunal a quo alicerça-se na jurisprudência dominante do STA quanto a esta matéria, vale isto por dizer que não foi violado o preceito legal referido pela Recorrente, pela simples razão de que, o mesmo, se não aplica no processo executivo, nem tão pouco, é compatível com urgência impressa pelo legislador fiscal no n.º 4 do artigo 170º do CPPT.

XXXVIII. Bem decidiu o Tribunal a quo amparado pela jurisprudência dominante nos nossos Tribunais Superiores!

XXXIX. Dúvidas não restam, assim, da correcção da Sentença alvo do presente, que deve manter-se na ordem jurídica, estando isenta de qualquer reparo,

XL. Pelo exposto ao longo, deverá ser negado provimento ao Recurso, DESTE MODO SE FIXANDO A MAIS SÁBIA JURISPRUDÊNCIA, COMO APANÁGIO DESSE DOUTO TRIBUNAL SUPERIOR.”


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O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu Parecer onde concluiu no sentido de não ser concedido provimento ao recurso.

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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso.


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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

Examinados os autos e vista a prova documental produzida, com interesse para a decisão, resultaram provados os seguintes factos:

1. Em 15/07/2017, a Camara Municipal de ………… instaurou o processo de execução fiscal com nº ………… em que figura como executada a sociedade G…………… Portugal, ............., SA. – cfr. fls. 1 do processo de execução fiscal em apenso aos autos;

2. A dívida exequenda reporta-se a diversas taxas de ocupação da via publica e publicidade do ano de 2017 – cfr. fls. 2 a 25 do processo de execução fiscal em apenso aos autos;

3. Em 31/07/2017, no âmbito do processo de execução fiscal com nº ………… foi emitida Citação‖ e remetida por meio de aviso postal registado à G…Portugal, ............., SA., para esta proceder até 04/09/2017, ao pagamento da divida exequenda e acrescidos no valor de € 27.781,33 – cfr. fls. 28 a 31 do processo de execução fiscal em apenso aos autos;

4. Em 30/08/2017 a ora reclamante deduz oposição à execução fiscal, identificada no ponto anterior – cfr. fls. 32 do processo de execução fiscal em apenso e fls. 160 e 161 dos autos;

5. No mesmo requerimento, referido no ponto anterior, a ora reclamante requer ― (...) a dispensa de prestação de garantia nos termos do disposto no nº 5 do art. 198º do CPPT, juntando certidão em como tem a situação tributária regularizada ― – cfr. fls. 32 do processo de execução fiscal em apenso aos autos;

6. A certidão a que se refere o ponto anterior, emitida pelo Serviço de Finanças de Lisboa-2, em 21/08/2017, é proferida nos seguintes termos:

( Texto no Original)

- cfr. fls. 161 dos autos;

7. Em 17/10/2017, é proferido pelo Chefe de Divisão das Execução Fiscais da CML, despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia determinando, também, a notificação da executada para prestar a garantia no valor de € 35.590,39 – cfr. fls. 35 do processo de execução fiscal em apenso aos autos;

8. À G… Portugal, ............., SA., foram instaurados os seguintes processos de execução que, à data do despacho reclamado, se encontravam na seguinte situação:


(Texto no Original)

- cfr. fls. 33 e 34 do processo de execução fiscal em apenso aos autos;

9. Em 05/02/2017, é remetido à G… Portugal ............., SA., o oficio nº 924/SG/DJ/DEF/2017, com o seguinte teor:

(Texto no Original)

- cfr. fls. 162 dos presentes autos.

FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provou que o processo de execução nº ……………… a que corresponde o processo de oposição com nº ……………..…, tenha sido arquivado uma vez que não existe nenhum elemento documental de onde se possa extrair essa ocorrência. Antes, o contrário decorre do teor do ofício nº 924/SG/DJ/DEF/2017, facto a que corresponde o ponto 9 do probatório.

Não existem outros factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.

MOTIVAÇÃO

A convicção do Tribunal sobre toda a matéria de facto resultou da análise crítica aos documentos juntos aos autos pela reclamante e, ainda, dos documentos integrantes da cópia certificada do processo de execução fiscal, para eles se fazendo referência de modo individualizado em cada uma das alíneas do probatório.”


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2.2. De direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Ora, lidas as conclusões da alegação de recurso, temos por seguro que este Tribunal foi chamado a decidir as seguintes questões:

- erro de julgamento da matéria de facto;

- omissão de pronúncia e consequente nulidade da sentença;

- contradição entre os fundamentos e a decisão e consequente nulidade da sentença;

- erro de julgamento de direito.

Não obstante a ordem pela qual as questões vêm elencadas no recurso, não será esta a ordem que seguiremos na apreciação que faremos seguidamente.

Com efeito, e como facilmente se percebe, há uma precedência lógica incontornável quanto à apreciação das invocadas nulidades da sentença, já que a sua verificação, afectando toda a decisão, deixa prejudicado, por inútil, o conhecimento das demais questões.

Assim sendo, é pelas invocadas nulidades da sentença que iniciaremos a análise que se segue.

Antes, porém, deve dizer-se que a questão suscitada pela Recorrida nas conclusões III e IV das contra-alegações, quanto à omissão de formulação de conclusões por banda da Recorrente, se mostra já ultrapassada em face cumprimento do despacho proferido a fls. 555 dos autos.

Importa, então, prosseguir com as apontadas nulidades da sentença.

Nas conclusões VI e VII, a Recorrente imputa à sentença omissão de pronúncia, reputando-a de nula.

Efectivamente, defende a Recorrente que “o Tribunal "a quo" omitiu a apreciação das questões a que respeitam os factos elencados nas alíneas a) a o) do nº 19. supra, e que se prendem com o efeito da interposição da acção de impugnação judicial dos actos tributários de liquidação das taxas municipais que foram objecto do presente PEF”. Por este motivo, conclui a Recorrente que “a sentença aqui posta em crise é nula por padecer de vício de omissão de pronúncia, previsto na alínea d) do nº 1do artigo 615º do CPC, o que gera a sua nulidade”.

Importa esclarecer, desde já, que as apontadas alíneas a) a o) do nº 19 das alegações de recurso respeitam à indicação das diversas (treze) reclamações graciosas apresentadas contra liquidações de taxas relativas à afixação de mensagens em passagem pedonal, ao facto de tais reclamações não terem sido objecto de decisão no prazo legal e, bem assim, à circunstância de ter sido deduzida a correspondente impugnação judicial.

Como é sabido, a nulidade por omissão de pronúncia só se verifica perante uma violação dos deveres de pronúncia do Tribunal sobre questões que este deva apreciar. Tal significa, no que concerne aos deveres de cognição do Tribunal, que ao juiz se impõe a obrigação de conhecer todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas, naturalmente, aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Assume, assim, especial importância o conceito de questões, o qual, nas palavras de J. Lopes de Sousa (in CPPT, anotado e comentado, 6º edição, II Volume, Áreas Editora, págs. 363 e 364) “abrange tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e à controvérsia que as partes sobre elas suscitem”.

O conhecimento de todas as questões não equivale à exigência imposta ao Tribunal de conhecer de todos os argumentos e razões invocadas pela parte, pois que, como ensinava Alberto dos Reis, “são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer questões de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal qualquer questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CPC, anotado, I Vol. págs. 284, 285 e V Vol. pág. 139).

No caso, as questões colocadas ao tribunal eram as de saber se havia sido ilegalmente preterido o direito de audição e se se verificavam os pressupostos para a dispensa de prestação de garantia, daí decorrendo, em qualquer dos casos, a ilegalidade da decisão reclamada.

Tais questões – bem ou mal, por ora não releva – foram apreciadas, como resulta da análise da sentença, na qual se concluiu, em síntese, que “o direito de audição prévia não se encontra previsto na lei nos casos em que a administração tem de proferir decisão sobre pedido de dispensa de garantia e, por isso, não se verifica o invocado vício alegado pela reclamante” e, bem assim, que “bem andou o órgão de execução fiscal ao decidir pelo indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia”, por não estarem preenchidos os requisitos legais para tal.

Portanto, omissão de pronúncia não se verifica.

As questões, nos termos expostos, não se confundem com factos.

Precisamente os factos a que a Recorrente se reporta nas apontadas alíneas “a) a o) do nº 19” são os mesmos que suportam (em parte) a impugnação da matéria de facto e o alegado erro de julgamento.

É, pois, nessa sede – de erro de julgamento de facto – que tal questão logrará apreciação, mas não como omissão de pronúncia.

Em suma, improcede esta primeira questão que nos vinha dirigida.


*

Avancemos para a nulidade seguinte: contradição entre os fundamentos e a decisão.

A tal nulidade se reportam as conclusões VIII a XXI, sendo para nós claro que o que se pretende sustentar é, efectivamente, um erro de julgamento e não uma nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão.

Nos termos do preceituado no artigo 615, nº1, alínea c), do CPC, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão está previsto no artigo 125º, nº1, do CPPT.

Encontramo-nos, como se entende, perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral, consagrado no artigo 154º, nº1, do CPC.

O vício em análise terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada (cfr. Prof. Alberto dos Reis, CPC anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.141 e 142; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.689 e 690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36 e 37).

No caso em análise, é claro que a sentença não padece da nulidade que lhe vem apontada, ou seja, não comporta nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, já que, tendo-se decidido pela improcedência da reclamação apresentada, a fundamentação jurídica adoptada pelo Tribunal a quo vai no mesmo sentido, considerando-se, em concreto, que não estão reunidos os pressupostos para a dispensa de garantia.

Isto é assim e não se confunde - como parece suceder nas alegações recursórias - com a circunstância de o Tribunal eventualmente ter errado no julgamento da matéria de facto e/ou na aplicação do direito aos factos. A ser assim, este é um aspecto que se reconduzirá a um erro de julgamento e não a uma nulidade.

É, pois, nessa perspectiva (de erro de julgamento) que o suscitado será adiante apreciado.

Improcede, assim, a segunda questão que nos vinha dirigida.


*

Avançando na análise, deparamo-nos com a terceira questão que nos cumpre apreciar: erro de julgamento da matéria de facto.

Vejamos, por partes.

Na conclusão I) defende a Recorrente uma contradição entre o que consta dos factos provados e não provados, já que – nas suas palavras – “o Tribunal "a quo" dá por provado que "Em 05/02/2017, é remetido à G…Portugal ............., SA., o ofício nº 924/SG/DJ/DEF/2017, em que se dá a conhecer a esta que a EF nº ……………… (a cuja Oposição o Município de Lisboa atribuiu o nº 19871/CML/17 foi arquivada tendo a documentação original ingressado na Oposição nº ……………..", mas, em simultâneo, dá por não provado exactamente o mesmo, ou seja, "que o processo de execução nº ……………, a que corresponde o processo de oposição com nº …………..…, tenha sido arquivado".

Mais sustenta a Recorrente que “o facto alegado no artigo 11º da petição inicial e demonstrado pelo doc. 20, também da p.i., deve ser dado como provado, acrescentando-se uma nova alínea ao elenco dos Factos Provados com o teor daquele artigo 11º”.

Esclareça-se, desde já, que o artigo 11º da petição corresponde à afirmação seguinte: “Posteriormente, em 07.09.2017, a ora Reclamante foi notificada pelo OEF que a sobredita Execução Fiscal foi arquivada (doc. 20 cuja cópia se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos)”.

A Recorrente nenhuma razão tem naquilo que defende a este propósito.

A contradição existiria se da matéria de facto provada constasse o arquivamento do processo de execução fiscal nº 110620170128… e dos factos não provados constasse não ter ficado demonstrado o arquivamento da referida execução.

Porém, como é evidente da leitura da sentença, não é isso que dela resulta.

Na verdade, o que a sentença considerou provado, no ponto 9 da matéria de facto, foi que, em 05/02/2017, foi remetido à G…. Portugal ............., SA., o oficio nº 924/SG/DJ/DEF/2017, com o teor que reproduziu e do qual constava o seguinte:

“Of. Nº 924/SG/DJ/DEF/2017

Assunto: P 19871/CML/17

Informa-se V/ Exa. que o Processo nº 19871/CML/17 foi arquivado e a documentação original ingressou na oposição nº ………..………….

(…)”.

Ou seja, neste ponto, a sentença limitou-se a dar como provado o envio à Reclamante, numa certa data, de um ofício com um determinado conteúdo, sendo para nós claro que, de tal ofício, não consta a menção ao arquivamento da execução nº …………………. O que daí consta é o arquivamento do “Processo nº 19871/CML/17” e a remessa da documentação atinente a este processo à oposição nº ………………………….

Quanto aos factos não provados, a sentença considerou que “Não se provou que o processo de execução nº ……………………, a que corresponde o processo de oposição com nº ……………...., tenha sido arquivado uma vez que não existe nenhum elemento documental de onde se possa extrair essa ocorrência. Antes, o contrário decorre do teor do ofício nº 924/SG/DJ/DEF/2017, facto a que corresponde o ponto 9 do probatório”.

E o que a sentença considerou nos factos não provados não merece censura, pois que, vistos os autos, inexiste qualquer elemento demonstrativo de o processo executivo nº ………………, ter sido arquivado, o que a Recorrente pretende que se dê como provado.

O que se verifica é que, como a Reclamada explicou (na informação oficial que precedeu a subida da reclamação ao TT de Lisboa), o número de processo “19871/ CML/ 17” corresponde a uma numeração interna criada para efeitos de recepção de correspondência dirigida à CML, não equivalendo a um número de processo executivo. No caso, foi esse tal processo “nº 19871/ CML/ 17” que foi arquivado e não o processo de execução fiscal nº ……………..…, no âmbito do qual foi proferido o acto objecto de reclamação.

Com efeito, lê-se na informação oficial proferida o seguinte:

“(…)

Efectivamente, aquando da apresentação pela Reclamante da documentação relativa à oposição foi atribuído um número de processo interno pelo serviço que receciona toda a correspondência do Município de Lisboa – Proc. nº 19871/CML/17. Uma vez rececionada a referida documentação pelo Órgão da Execução Fiscal, e atento o seu teor, foi a documentação original retirada do mencionado Proc. nº 19871/CML/17, o qual foi arquivado, e ingressou a mesma no Processo de Oposição à execução, o qual foi autuado com o número ………………………. Foram estes factos que foram devidamente notificados à executada através do Ofício nº 924/SG/DJ/DEF/2017, documento que a Reclamante junta como Doc. 20, a fls. 162 dos presentes autos”.

Por conseguinte, e sem prejuízo de se conceder que atribuição de uma numeração extra (e interna) a um processo que se destina apenas a recepcionar documentos pode ser geradora de equívocos, a verdade é que a situação se mostra absolutamente esclarecida, sendo para nós certo – e esse era o ponto fundamental que aqui importava apurar – que a execução fiscal nº ………………………… jamais foi arquivada.

Na verdade, não apenas tal arquivamento é contrariado pela entidade exequente, como inexiste qualquer documento que o ateste, para além de que toda a actividade produzida nos autos é, claramente, de sentido contrário a uma situação de arquivamento da execução fiscal.

Assim sendo, e como bem concluiu o TT de Lisboa, não se prova que o processo de execução fiscal nº ……………………… tenha sido arquivado, o que, sublinhe-se, não é posto em causa pelo documento nº 20 junto com o articulado inicial. Tal documento, aliás, só poderia ser considerado nos termos em que o Tribunal a quo o fez no ponto 9 dos factos provados.

Em suma, quanto a este ponto, improcede a pretensão da Recorrente de ver alterada a matéria de facto.

Prossigamos quanto ao demais alegado em sede de erro de julgamento de facto – cfr. conclusões III e IV.

Defende a Reclamante que a matéria de facto provada deve incluir os factos a que respeitam as alíneas a) a o) do nº 19 das alegações recurso, suportados nos documentos que indica, na linha, aliás, daquilo que já vinha invocado no articulado inicial.

Em síntese, pretende a Recorrente que fique a constar da matéria de facto que, em 20/06/17 e 21/06/17, apresentou 13 diferentes reclamações graciosas contra taxas referentes à afixação de mensagens na passagem pedonal, as quais não obtiveram decisão dentro do prazo legal, o que determinou a dedução da impugnação judicial que corre termos no TT de Lisboa sob o nº 1838/17.5 BELRS.

Em causa, nos apontados processos, estão as liquidações das taxas que correspondem à dívida exequenda exigida no processo de execução fiscal nº …………., o mesmo em que foi praticado o acto reclamado.

No entendimento da Recorrente, tal circunstancialismo de facto assume relevância para a boa decisão da causa, “pelo efeito da interposição da acção de impugnação judicial dos actos tributários de liquidação das taxas municipais que foram objecto do presente PEF”.

Considerando o dever de atender a todos os factos relevantes, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito e, como tal, independentemente dos concretos factos que, a final, venham a suportar a solução da questão de direito que o Tribunal considera aplicável, julga-se pertinente aditar aos factos provados a seguinte factualidade:

10 – Em 20/06/17 e em 21/06/17, a G…. apresentou reclamações graciosas contras diversas taxas respeitantes à afixação de mensagens na passagem pedonal, taxas essas liquidadas nas facturas nºs ……………., …………., ……………., …………., ……………., …………., ……………., …………., ……………., …………., …………., ……………., …………., (cfr. docs. 3 a 15 juntos à p.i)

11 – Na sequência de tais reclamações, em 19/09/17, foi deduzida impugnação judicial, a qual corre termos no TT de Lisboa sob o nº ………… (cfr. doc. 16 junto à p.i)

Assim, e nos termos expostos, atende-se parcialmente a pretensão da Recorrente quanto ao erro de julgamento de facto/ impugnação da matéria de facto.


*

Estabilizada a matéria de facto, avancemos para o erro de julgamento de direito.

E aqui, neste ponto, a primeira questão a decidir prende-se com a circunstância de não ter sido concedido o direito de audição à Executada previamente ao indeferimento do pedido de dispensa de garantia.

Com efeito, vemos que a Recorrente não se conforma com esta actuação por parte do Órgão da Execução Fiscal, defendendo, ao invés, que “se o legislador quis que este tipo de acto administrativo de natureza tributária pudesse ser sujeito a controlo jurisdicional, mediante a dedução da competente Reclamação, então é porque a sua prática se integra na esfera das competências de um órgão administrativo, o que tem por efeito necessário que deve ser respeitado o edifício normativo que regula a sua prática - in casu, o artigo 60º da Lei Geral Tributária (embora se reconheça que este efeito não é pacífico)”. Daí conclui, portanto, “pela violação do artigo 60º do Lei Geral Tributária que deve ser interpretado no sentido de que o projecto de acto administrativo de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, na medida em que contende com direitos dos contribuintes, deve ser objecto de audiência prévia.”

Já vimos que a sentença recorrida não acolheu tal entendimento e, apoiada em jurisprudência do STA que invocou, concluiu que “o direito de audição prévia não se encontra previsto na lei nos casos em que a administração tem de proferir decisão sobre pedido de dispensa de garantia e, por isso, não se verifica o invocado vício alegado pela reclamante”.

Vejamos, então, desde já se adiantando que a posição do TT de Lisboa é de sufragar.

Trata-se, aliás, de matéria que foi muito discutida nos Tribunais Superiores, sendo possível actualmente afirmar que, independentemente do entendimento que se subscreva relativamente à natureza jurídica do acto correspondente ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia – isto é, acto materialmente administrativo praticado no processo de execução fiscal ou acto predominantemente processual – é de concluir que não há, no caso, lugar ao exercício do direito de audiência previsto no artigo 60º da LGT.

Este é, aliás, o entendimento que reiteradamente vem sendo assumido pelos Tribunais Superiores, como é exemplo, entre muitos outros, o acórdão do STA, de 07/10/15, proferido no processo nº 1070/15, no qual se pode ler, além do mais, o seguinte:

“(…)

Tal é, aliás, o entendimento acolhido pela jurisprudência desta Secção em julgamento ampliado nos termos do art. 148.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), e expresso no Acórdão de 26 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 708/12, publicado no Diário da República n.º 204, I Série, de 22 de Outubro de 2012, podendo concluir-se hoje que constitui jurisprudência consolidada na Secção que não se verifica, relativamente ao pedido de dispensa de prestação de garantia, a obrigatoriedade legal de cumprir o disposto no artigo 60.º da LGT - cf. neste sentido os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 12.12.2012, recurso 944/12, de 23.01.2013, recurso, 945/12 e de 20.01.2013, recurso 974/12, e ainda, por mais recentes, os Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário, proferidos em recursos idênticos e interpostos pela mesma recorrente, de 13.03.2013, recurso 288/13, de 10.04.2013, recurso 364/13, de 23.04.2013, recurso 520/13, de 30.04.2013, recurso 521/13, de 26.06.2013, recurso 1016/13, de 10.12.2014, recurso 1314/14, de 08.04.2015, recurso 334/15, e de 29.07.2015, recurso 875/15, todos in www.dgsi.pt.

Trata-se jurisprudência que também aqui se acolhe e se reitera.

Daí que, não existindo razões para alterar o entendimento fixado naquele acórdão 708/12, que responde às questões suscitadas pela recorrente nas conclusões das suas alegações, se conclua que improcedem as conclusões A a P das alegações de recurso”.

Efectivamente, a jurisprudência já não discute actualmente – tratando-se, pois, de questão consolidada – se, previamente ao indeferimento da dispensa de prestação de garantia, é, ou não, legalmente exigida a notificação para efeitos de audição prévia.

A resposta dos Tribunais Superiores não sofre dúvidas no sentido de não ser exigida tal notificação.

Por conseguinte, inexistindo elementos novos que a este propósito devam ser ponderados, há que concluir, sem hesitações, que o decidido em 1ª instância se mostra correcto e, como tal, deve ser mantido.

Em suma, e sem necessidade de nos alongarmos, improcede a questão que vimos de analisar, respeitante à invocada ilegalidade do despacho reclamado resultante da não observância do direito de audição prévia ao indeferimento da dispensa de garantia.


*

Avancemos na análise e, agora, para a última questão que nos ocupa.

E aqui, tal como resulta das conclusões da alegação de recurso, importa apreciar e decidir se a sentença errou ao concluir que a Reclamante, ora Recorrente, não reunia os requisitos para a dispensa de prestação de garantia, pedido este formulado ao abrigo do disposto no artigo 198º, nº5 do CPPT, no âmbito do processo de execução fiscal nº ………………….

Vejamos, então.

Uma das razões pelas quais a Recorrente insiste que a decisão contestada é ilegal funda-se na circunstância de ter sido determinado o arquivamento do processo executivo nº ……………

Com efeito, para a G…, “com o arquivamento do processo (…) deixa de ser possível ao OEF praticar quaisquer outros actos no âmbito do processo arquivado”, o que, aliás, redundaria numa “inutilidade superveniente do próprio pedido de dispensa de prestação de garantia”. Nas palavras da Reclamante, “um acto tributário praticado no âmbito de processo inexistente, porque previamente arquivado, carece de objecto e é, por isso, nulo”.

Ora, como está bem de ver, em face da resposta que demos ao erro de julgamento da matéria de facto, a Recorrente nenhuma razão tem ao insistir neste ponto, pois que, como ficou esclarecido, o processo executivo nº ………….…. jamais foi arquivado.

Sobre isto nos debruçámos suficientemente em momento anterior, sendo desnecessário retomar tais considerandos. Bastará lembrar que, como a sentença não deixou de evidenciar, o acto reclamado foi proferido numa execução fiscal que se encontra activa.

Avançando.

Sustenta a Recorrente que, contrariamente ao que foi decidido, o OEF deveria ter concedido a dispensa de prestação da garantia por, no caso, estarem preenchidos os requisitos previstos no artigo 198º, nº5 do CPPT, preceito ao abrigo do qual o pedido de dispensa foi requerido.

A sentença assim não entendeu, tendo considerado que:

“(…)

Considerando o pedido apresentado pela ora reclamante, nos termos do nº 5 do art. 198º do CPPT e, feita a aferição dos documentos que esta carreou para os autos, afigura-se-me que tal prova não é adequada para os fins pretendidos na situação sub judicie, no âmbito do processo de execução movido pela CML.

Com efeito, a certidão que atesta a situação regularizada da reclamante destina-se à concreta circunstância da Administração Tributária e Aduaneira, o mesmo é dizer que aquela certidão foi emitida pela A.T., órgão da administração central do Estado, que apenas pode asseverar a situação tributária da reclamante perante a mesma, não já perante a administração local.

Apenas o município de ............. poderá alvitrar sobre a (i)regularidade da situação tributária da reclamante no que ao município respeita.

E, nesse conspecto, os autos revelam que à data do pedido de dispensa de prestação de garantia, nos precisos termos do disposto no nº 5 do art. 198º do CPPT, a reclamante possuía dividas tributárias não garantidas. Não obstante, a reclamante deter naquele município processos de execução fiscal suspensos, outros existiam que não estavam suspensos, orçando a quantia exequenda, não suspensa, o valor total de € 37.683,31 (€ 2.667,60, € 27.573,33 e € 7.442,38), concernente aos processos de execução nº 110620170128…; nº 110620170128… e nº 11062017012…, respetivamente (ponto 8 do probatório).

Perante este circunstancialismo, facilmente se conclui que a reclamante, à data do despacho recorrido, não tinha a situação tributária regularizada perante o município de ..............

E, não se diga que nalguns desses processos ainda não teria ocorrido a suspensão na medida em que, tendo sido deduzida impugnação judicial e peticionada a dispensa de garantia, o tribunal não se havia pronunciado sobre aquele pedido.

É que, a competência para decidir sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia pertence unicamente ao órgão de execução fiscal, atenta a disciplina ínsita nos arts. 52º, nº 4 da LGT e 170º e 198º do CPPT.

O Tribunal, apenas, pode apreciar a legalidade da decisão de indeferimento do pedido, pois o conhecimento do pedido de dispensa de garantia é sempre e exclusivamente do órgão de execução fiscal, como se conclui do disposto no n.º 4 do artigo 52º da LGT, motivo por que «não pode ser exercido pelo tribunal em substituição daquela, tendo a atividade deste de resumir-se à verificação da ofensa ou não dos princípios jurídicos que condicionam toda a atividade administrativa e será um controle pela negativa, não podendo o tribunal substituir-se à Administração na ponderação das valorações que integram nessa margem [de livre apreciação]» - Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 11 ao art. 52.º, pág. 429.

Para além disso, o valor da dívida tributária não suspensa é superior a € 10.000,00, o que permite concluir como no despacho sindicado, i.e., a ser concedida a dispensa de garantia tal decisão sempre violaria o disposto no art. 198º, nº 5 do CPPT (ponto 8 do probatório).

Conclui-se, assim, que bem andou o órgão de execução fiscal ao decidir pelo indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia”.

Vejamos, então, começando por deixar devida nota do disposto no artigo 198º do CPPT, na redacção em vigor à data que aqui releva.

Assim:


Artigo 198.º

Requisitos do pedido


1 - No requerimento para pagamento em prestações o executado indicará a forma como se propõe efectuar o pagamento e os fundamentos da proposta.

2 - Após recepção e instrução dos pedidos com todas as informações de que se disponha, estes são imediatamente apreciados pelo órgão da execução fiscal ou, sendo caso disso, imediatamente remetidos após recepção para sancionamento superior, devendo o pagamento da primeira prestação ser efectuado no mês seguinte àquele em que for notificado o despacho.

3 - Caso o pedido de pagamento em prestações obedeça a todos os pressupostos legais, deve o mesmo ser objecto de imediata autorização pelo órgão considerado competente nos termos do artigo anterior, notificando-se o requerente desse facto e de que, caso pretenda a suspensão da execução e a regularização da sua situação tributária, deve ser constituída ou prestada garantia idónea nos termos do artigo seguinte ou, em alternativa, obter a autorização para a sua dispensa.

4 - Caso se apure que o pedido de pagamento em prestações não obedece aos pressupostos legais de que depende a sua autorização, o mesmo será indeferido de imediato, com notificação ao requerente dos fundamentos do mesmo indeferimento.

5 - É dispensada a prestação de garantia quando, à data do pedido, o devedor tenha dívidas fiscais, legalmente não suspensas, de valor inferior a (euro) 5000 para pessoas singulares, ou (euro) 10 000 para pessoas coletivas. (sublinhado nosso)

Para o TT de Lisboa, na linha do decidido pelo OEF, nunca a Executada/ Reclamante poderia beneficiar da dispensa prevista no nº5 do artigo 198º do CPPT, uma vez que, à data do pedido em causa, tinha as seguintes dívidas (não suspensas), num total de € 37.683,31:

- a dívida proveniente do processo nº ……………, no montante de € 27.573,33;

- a dívida proveniente do processo nº ……………, no montante de € 2.667,60;

- a dívida proveniente do processo nº ……………, no montante de € 7.442,38;

Efectivamente, o que os autos mostram é que a executada tinha, desde logo, a dívida de € 27.573,33, em cobrança coerciva no processo nº ………….…, montante este bem superior ao valor máximo previsto no citado nº5 do artigo 198º do CPPT, para as dívidas de pessoas colectivas, de € 10.000,00.

A pendência de tal dívida não suspensa, por si só, bastaria para sustentar o indeferimento do pedido formulado, como se verificou, aliás.

A Recorrente opõe-se a tal entendimento, defendendo que “o PEF ………..…. não pode servir de fundamento à decisão de indeferimento, porquanto é no âmbito deste próprio processo que foi deduzido o pedido de dispensa de garantia, o que significa que o Município de ............. não pode indeferir um pedido de dispensa de garantia com fundamento de que quem o requer tem em divida o montante sobre o qual se está a pedir a dispensa de garantia!!!”

Ora, ainda que este Tribunal perceba o alcance da afirmação feita pela Recorrente, não é de aceitar tal entendimento, ou seja, o de excluir do cômputo do valor das “dívidas fiscais, legalmente não suspensas”, o valor da dívida exigida no processo executivo em que é formulado o pedido de pagamento em prestações.

Vejamos as razões para assim entendermos.

O artigo 198º, nº5 do CPPT surgiu como uma norma inovadora que criou um regime excepcional de dispensa de garantia para as dívidas de origem fiscal de baixo valor.

De acordo com este normativo, nos processos de execução fiscal referentes a dívidas fiscais, em que é requerido o pagamento em prestações, é dispensada a prestação de garantia, ficando o processo automaticamente suspenso, sempre que cumulativamente se verifiquem os seguintes pressupostos: (i) à data do pedido, o requerente tenha dívidas fiscais, legalmente não suspensas; (ii) o valor das dívidas fiscais não suspensas ser inferior a € 5.000 ou € 10.000 para as pessoas singulares e colectivas, respectivamente.

Portanto, para efeitos da aplicação da norma em questão (na redacção considerada) o que importa verificar é o valor global das dívidas fiscais, legalmente não suspensas, do executado, valor este que – repita-se – tinha como limite máximo o montante de € 10.000 para as pessoas colectivas, como é o caso da executada.

Relembre-se - e sublinhe-se - que este regime excepcional de dispensa de garantia (até pelos seus termos simplificados e quase automáticos com que se apresenta) se dirige apenas a dívidas de pequeno valor, surpreendendo-se aí uma clara intenção do legislador de não onerar especialmente os devedores ao Estado de quantias de valor reduzido.

Ora, como dissemos, a dívida exigida no processo nº ………..…, no montante de € 27.573,33, excede claramente o montante em causa, de € 10.000,00, razão pela qual nunca lograria acolhimento, no artigo 198º, nº5 do CPPT, a pretendida dispensa de prestação de garantia.

Deve dizer-se que, excluir, como pretende a Recorrente, o valor da dívida exequenda correspondente ao processo nº ……….…, para afeitos da aferição do valor de € 10.000,00, seria abrir a porta à subversão total da lógica subjacente a este regime excepcional de dispensa de prestação de garantia, o que se traduziria em admitir que, independentemente do valor da dívida exigida no processo em que fosse pedido o pagamento em prestações, o executado obtivesse sempre a dispensa da garantia, desde que a totalidade das restantes dívidas não excedesse os € 10.000,00.

Nesta lógica, ainda que o executado pedisse o pagamento em prestações de uma dívida de um milhão, desde que não apresentasse (outras) dívidas fiscais que ultrapassassem os € 10,000,00, sempre poderia obter a dispensa de prestação da garantia, ao abrigo do artigo 198º, nº5 do CPPT.

Como está bem de ver, se assim fosse, o propósito do legislador – de facilitar o pagamento prestacional de dívidas fiscais de montante reduzido – seria claramente contornado e subvertido, o que não é aceitável, nem pode ter sido o propósito do legislador do CPPT.

Aliás, em defesa do nosso entendimento e da interpretação feita no despacho reclamado, deve chamar-se à colação a nova redacção do mesmo nº 5 do artigo 198º do CPPT, redacção esta conferida pela Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro. É a seguinte a actual redacção do nº 5 do artigo 198º do CPPT: “É dispensada a prestação de garantia para dívidas em execução fiscal de valor inferior a € 5000 para pessoas singulares, ou € 10 000 para pessoas coletivas”.

Ora, como está bom de ver, entre uma e outra formulação da norma, apenas um aspecto mudou: na redacção anterior apenas se permitia a dispensa da prestação de garantia quando o devedor tivesse dívidas fiscais, legalmente não suspensas, de valor global inferior a € 10 000 euros (no caso das pessoas colectivas), enquanto que, nos termos da actual redacção, a verificação do pressuposto do valor para a dispensa de prestação de garantia é feita dívida a dívida.

Em comum, num e noutro caso, está o facto de este regime excepcional se dirigir a dívidas de baixo valor.

Por conseguinte - repete-se - cifrando-se o processo de execução fiscal nº ………….… (no âmbito do qual foi requerida a dispensa de prestação de garantia, ao abrigo do disposto no nº 5 do artigo 198º do CPPT) no montante de € 27.573,33, ou seja, em valor claramente superior ao limite máximo de € 10.000, dúvidas não restam que o pedido de dispensa só podia ser indeferido, como efectivamente aconteceu.

Ainda a propósito do processo executivo nº …………..… e da circunstância de estar pendente a impugnação judicial nº …………. BELRS, da qual – se bem interpretamos a posição da Recorrente – decorreriam relevantes efeitos quanto à suspensão da dívida, há que, sem hesitações, contrariar tal entendimento.

Na verdade, por si só, a dedução de impugnação judicial (ou a sua admissão liminar) não determina qualquer efeito suspensivo, sendo ainda de realçar que, no caso, o pedido de dispensa de garantia que aqui analisamos foi requerido em momento bem anterior à apresentação da impugnação judicial, em concreto aquando da dedução de oposição à execução fiscal nº ………………

Por conseguinte, ponderando tudo o que antes dissemos, deve concluir-se ser absolutamente irrelevante apreciar as questões suscitadas a propósito dos processos de execução nºs …………..… e ………….…, no sentido de saber se os seus valores entram, ou não, para o cômputo do valor de € 10,000,00, pois que este valor é já largamente ultrapassado pela consideração da dívida em cobrança no PEF nº ……………………

Com efeito, para a presente decisão torna-se irrelevante saber se o facto de no processo nº …………… não ter ocorrido ainda a citação faz com que a dívida exequenda correspondente não possa ser incluída para efeitos da verificação do montante de € 10.000, a que alude o nº5 do artigo 198º do CPPT.

De igual modo, não relevam também as considerações (e consequências) que a Recorrente pretende extrair da circunstância de estar pendente a impugnação judicial que visa a apreciação da legalidade das taxas correspondentes à dívida em cobrança no processo de execução fiscal nº …………………

Nestes termos, improcedem as conclusões da alegação de recurso que vínhamos analisando, respeitantes ao erro de julgamento correspondente à invocada verificação dos requisitos de aplicação do nº 5 do artigo 198º do CPPT.

Em face de tudo o que vem dito, e entendendo-se despiciendas ponderações adicionais a este propósito, importa concluir, tal como a sentença decidiu, que o despacho reclamado é legal e, por isso, é de manter.

De manter é, também e consequentemente, a sentença objecto do presente recurso jurisdicional.

Há, pois, que negar provimento ao presente recurso jurisdicional, o que ficará consignado no dispositivo infra.


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3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 07/06/18


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Lurdes Toscano)

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(Joaquim Condesso)