Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1104/17.6BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:06/14/2018
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE NORMAS
REGULAMENTO PARA TRANSPORTES DE ÍNDOLE E FRUIÇÃO TURÍSTICA NO MUNICÍPIO DE SINTRA
Sumário:I – A apreciação do concreto pedido cautelar de suspensão de eficácia de normas haverá de ser feita por consideração simultânea dos critérios decisórios previstos no artigo 120º do CPTA e do particularmente previsto no artigo 130º do mesmo Código CPTA, tendo por referência, atenta a natureza instrumental dos processos cautelares, a pretensão impugnatória que lhes é dirigida em sede de ação administrativa, a que atualmente se referem os artigos 37º nº 1 alínea d) e 72º ss. do CPTA, cuja utilidade a providência cautelar se destinará a assegurar.
II – Com a providência cautelar requerida visa-se evitar os efeitos das normas do Regulamento que exigem às empresas que exercem atividade de animação turística no Município de S..., com uso de meios de transporte através de veículos incluídos nas tipologias elencadas no artigo 2º nº 2 do Regulamento (a saber: “a) Motociclos com e sem side-car e "moto-quatros"; b) Triciclos (vulgo tuk-tuk); c) Automóveis tipo "jeep" e de todo o terreno; d) Veículos automóveis ligeiros de passageiros de utilização turística (excluindo táxis); e) Automóveis elétricos”) a obtenção de «licença» para aqueles seus veículos, a qual haverá de ser requerida no prazo estabelecido após a afixação do Edital (cfr. artigo 33º nº 1 do Regulamento).
III – É o DL. nº 108/2009, de 15 de maio que estabelece as condições de acesso e de exercício da atividade das empresas de animação turística (e dos operadores marítimo-turísticos), entendidas estas como “…as atividades lúdicas de natureza recreativa, desportiva ou cultural, que se configurem como atividades de turismo de ar livre ou de turismo cultural e que tenham interesse turístico para a região em que se desenvolvam” (cfr. artigo 3º nº 1 do DL. nº 108/2009), e compreendendo as «atividades de turismo cultural», as “…atividades pedestres ou transportadas, que promovam o contacto com o património cultural e natural através de uma mediação entre o destinatário do serviço e o bem cultural usufruído, para partilha de conhecimento” (cfr. artigo 3º nº 2 alínea b) do DL. nº 108/2009).
IV – Tem que reconhecer-se, mesmo em termos perfuntórios, próprios da sede cautelar, que o procedimento previsto no Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no Município de S..., ao submeter a um processo de «licenciamento», nos termos em que o faz, designadamente com as exigências estabelecidas no seu artigo 4º, supra percorrido, o desenvolvimento das atividades de animação turística no Município de S... sempre que nas mesmas sejam utilizados veículos para transporte de passageiros «não pesados», contende com o regime legal que rege a atividade da animação turística constante do DL. nº 108/2009, invadindo um âmbito de regulação legal ocupado por este.
V – Mostra-se verificado o requisito do periculum in mora se as empresas que desenvolvem a atividade de animação turística com recurso aos identificados veículos de transporte verão de imediato condicionado o seu exercício ao cumprimento daquelas exigências, às quais se haverão de submeter (e cumprir) através do procedimento de licenciamento, a que devem dar início no prazo fixado, sendo a concessão da «licença» (com a emissão do respetivo alvará, após o pagamento da correspondente taxa) condição necessária, e se, concomitantemente, face ao número limitado de «licenças» passíveis de ser atribuídas ao abrigo do Regulamento, considerando o contingente máximo de veículos que nele foi fixado (100), e ao número de veículos de animação turística que atualmente circulam em S... (mais de 100 veículos), serão excluídos, por efeito de aplicação das regras constantes no Regulamento, operadores que agora se encontram a atuar.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A R.... - APECATE (devidamente identificada nos autos) instaurou em 25/08/2017 no Tribunal Administrativo e Fiscal de S...... o presente Processo Cautelar contra o M........, requerendo a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do Edital n.º .../2017, de 2 de Agosto de 2017 e das normas constantes do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 134, de 13/07/2017, designadamente, os artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º, assim como os artigos 1.º, 3.º e 5.º do respetivo Anexo.
Por sentença de 19/02/2018 o Tribunal a quo, julgando procedente o pedido, suspendeu a eficácia do Edital n.º .../2017, de 02/08/2017, do Presidente da Câmara Municipal de S........, e dos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, bem como dos artigos 1.º, 3.º e 5.º do respetivo Anexo.
Inconformado o M........ dela interpõe o presente recurso pugnando pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que julgue improcedente o pedido cautelar, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1ª Mal andou a sentença recorrida, incorrendo num patente erro de julgamento, ao julgar verificado, no caso concreto, o requisito do fumus boni iuris previsto no artigo 120º n.º 1 do CPTA, ao decidir que é de admitir que o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ e o Edital nº .../2017, violem o regime de acesso e exercício da atividade de animação turística.

2ª O regulamento e ato suspendendos apenas visam a regulação do trânsito e a proteção do ambiente numa zona determinada do território municipal, que pela sua sensibilidade e pela pressão existente obriga à criação de restrições.

3ª O regulamento e o ato suspendendos criaram um modelo de controlo que visa e permite uma gestão racional, em termos exequíveis, do trânsito na zona definida.

4ª Pelo que, deve a sentença recorrida ser revogada, julgando-se improcedente o requerimento de decretamento da providência cautelar.

5ª A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao considerar verificado o requisito do periculum in mora, em virtude da potencialidade de geração de prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação.

6ª Com efeito, a sentença recorrida assentou a sua decisão em factos meramente eventuais, cuja verificação é meramente possível, para além de depender das opções de gestão que venham a ser tomadas pelos operadores que exercem a atividade de operação turística.

7ª A execução dos atos suspendendos não constitui, sequer, condição necessária e suficiente para os efeitos eventuais que são elencados na sentença.

8ª A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento não recusar o decretamento das providências cautelares requeridas, em virtude de os danos que resultam da sua concessão se mostrarem mais graves do que aqueles que resultam da sua recusa, nos termos do artigo 120º n.º 2 do CPTA.

9ª Constituem factos públicos e notórios e o Tribunal a quo tinha elementos suficientes para os apreciar, os factos que estiveram na origem da emissão do regulamento e da prática do ato suspendendos.

10ª Os danos que resultam para o interesse público de segurança rodoviária, ambientais, de saúde pública e da qualidade de vida dos cidadãos, constituirão um facto consumado de impossível reconstituição e de inviável compensação.

11ª Os danos que possam recusar da recusa de decretamento das providências cautelares requeridas, não determinam a constituição de factos consumados e são suscetíveis de avaliação e compensação.

A recorrida contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida.

Remetidos os autos em recurso a este Tribunal Central Administrativo Sul e neste notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu Parecer no sentido da procedência do recurso, com revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que indefira a providência cautelar, nos seguintes termos fundamentais:
«(…)
A douta sentença, para deferir a providência considerou provados a verificação dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, previstos no art. 1202, n2s 1 e 2 do CPTA.
Por outro lado, o juízo a que se refere o artigo 120.º, n.º1, do CPTA, sobre a provável procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, será apenas de molde a que, face à factualidade indiciariamente provada no processo cautelar, se afigure como plausível e provável a procedência da pretensão.
Face a este quadro legal, concorda-se com a entidade recorrente no sentido de que não se mostram suficientemente provados os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, previstos no art. 120º, nºs 1 e 2 do CPTA, na medida em que a matéria de facto não permite dar como provados tais requisitos, tal como é sustentado no recurso e cujos argumentos aqui acolhemos, com o devido respeito.
(…)»

Sendo que, dele notificadas as partes, nenhuma se apresentou a responder.

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Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/ das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, a qual não vem impugnada.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelo recorrente as conclusões de recurso, as questões essenciais a decidir são as de saber: i) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar verificado o requisito do fumus boni iuris; ii) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar verificado o requisito do periculum in mora; iii) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento no que toca à ponderação a que alude o nº 2 do artigo 120º do CPTA.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade nos seguintes termos:
a) A requerente é uma associação civil, sem fins lucrativos, que tem por objecto a promoção, representação e defesa dos interesses globais e comuns das pessoas singulares ou colectivas organizadoras profissionais de congressos e eventos e das empresas de animação turística [documento n.º3 junto com o requerimento inicial].

b) Entre os associados da requerente, constam mais de 120 associados que são operadores na área da animação turística [facto admitido por acordo].

c) Em 15/05/2017, a Assembleia Municipal de S……., sob proposta da Câmara Municipal, aprovou o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística [documento de fls. 512 do processo administrativo apenso].

d) No dia 13/07/2017, foi publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º134, o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, cujos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º têm o seguinte teor:

[Texto Integral]

[documento n.º1 junto com o requerimento inicial].

e) Os artigos 1.º, 3.º e 5.º do Anexo I do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ têm o seguinte teor:

[Texto Integral]

[documento n.º1 junto com o requerimento inicial].

f) No procedimento de elaboração do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ constituíram-se como interessados as seguintes entidades/pessoas:

i) ATSM – Associação de Turismo de S……;

Auto Transportadora Progresso de A……., Unipessoal, Lda.;

ii) Turis….;

iii) Muitaventura;

iv) G……………. F………..;

v) M………….. L……………;

vi) M……………. M………… [documentos n.ºs 1 a 7 juntos com a oposição].

g) Que foram notificados para se pronunciarem sobre o Projecto de Regulamento [documentos n.ºs 23 a 35 juntos com a oposição].

h) Foram consultadas as seguintes entidades: ANTRAL – A…………L…………., F.P.T. e A.E.S….. [documentos n.ºs 36 a 38 juntos com a oposição].

i) A Turis….; , a F.P.T., A.E.S….. e G…………. pronunciaram-se sobre o Projecto de Regulamento [documentos n.ºs 39 a 42 juntos com a oposição].

j) No dia 02/08/2017, pelo Edital n.º.../2017, o Presidente da Câmara Municipal de S........ decidiu que era aberto, a partir do dia 07/08/2017, um período de 25 dias úteis para a apresentação por parte dos operadores interessados dos pedidos de licença referidos no artigo 33.º do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ para a zona referida no n.º2 do artigo 12.º e no anexo I ao Regulamento – Vila de S……, incluindo o Centro Histórico, S. P. de S…., P….. e E……. [documento n.º2 junto com o requerimento inicial].

k) O Edital n.º.../2017 tem o seguinte teor:

[Texto Integral]

[documento n.º2 junto com o requerimento inicial].

l) De acordo com o Registo Nacional de Turismo, há 267 agentes de animação turística cuja sede social se situa no concelho de S….., 1913 agentes de animação turística inscritos e registados com sede social no distrito de L…. e 4287 agentes de animação turística inscritos e registados com sede em Portugal [facto admitido por acordo].

m) Actualmente, circulam em S….. mais do que 100 veículos de animação turística [depoimento testemunhal].

n) O número limitado de licenças excluirá de S….. operadores que aí se encontram a actuar [depoimento testemunhal].

o) Tais operadores, se excluídos, ficarão com a sua operação e investimento comprometidos [depoimento testemunhal].

p) Podendo perder os investimentos aí já realizados, incluindo os investimentos realizados em veículos e demais infra-estruturas [depoimento testemunhal].

q) Ficarão também prejudicados pela perda de lucros do seu negócio e pela perda de clientela [depoimento testemunhal].

r) Sendo possível a extinção de vários postos de trabalho [depoimento testemunhal].


E consignou não resultarem indiciariamente provados nos autos outros factos com relevância para a decisão da causa, designadamente os seguintes:
a) A limitação criada pelo regime de licenciamento e outras condicionantes previstas no Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ implicará, necessariamente, a perda de associados para a requerente.

b) Os operadores que ficarão impedidos de exercer actividade em S...... perderão interesse em manter-se na Associação.

c) A sobrecarga originada pela exploração de circuitos turísticos, com a obstrução à normal circulação, o estacionamento e ruído provocado por alguns dos veículos afectos a actividades de animação turística tem sido objecto de reclamações por parte das populações.

d) Também a Guarda Nacional Republicana reportou ao M........ que a circulação não regulada dos veículos especialmente afectos ao transporte de turistas tem vindo a criar constrangimentos diversos para o trânsito, com o consequente risco para a segurança pública.


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B – De direito
1. Da decisão recorrida
A sentença recorrida julgando procedente o pedido cautelar formulado pela requerente suspendeu a eficácia do Edital n.º.../2017, de 02/08/2017, do Presidente da Câmara Municipal de S........, e dos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, bem como dos artigos 1.º, 3.º e 5.º do respetivo Anexo. E fê-lo por considerar verificados os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora previstos no nº 1 do artigo 120º do CPTA e por entender não ser de concluir, na ponderação a que alude o nº 2 do artigo 12º do CPTA, que os danos que resultariam da concessão da providência são superiores àqueles que podem resultar da sua recusa.
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2. Da tese do recorrente
Insurge-se o recorrente M........ contra o assim decidido, seja no que tange ao juízo feito na sentença recorrida sobre os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, seja no que se refere à ponderação dos danos para os interesses em presença, pugnando pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que indeferida a requerida providência de suspensão de eficácia.
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3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 Do enquadramento das questões
3.1.1 Cumpre começar por observar que a pretensão cautelar formulada pela requerente R.... - APECATE foi a de decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do Edital n.º.../2017, de 2 de Agosto de 2017 e das normas constantes do Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º134, de 13/07/2017, designadamente, os artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º, assim como os artigos 1.º, 3.º e 5.º do respetivo Anexo.
3.1.2 A segunda nota é a de que a apreciação do concreto pedido cautelar de suspensão de eficácia de normas haverá de ser feita por consideração simultânea dos critérios decisórios previstos no artigo 120º do CPTA e do particularmente previsto no artigo 130º do mesmo Código CPTA, tendo por referência, atenta a natureza instrumental dos processos cautelares, a pretensão impugnatória que lhes é dirigida em sede de ação administrativa, a que atualmente se referem os artigos 37º nº 1 alínea d) e 72º ss. do CPTA, cuja utilidade a providência cautelar se destinará a assegurar. A este propósito vide acórdão deste TCA Sul de 09/11/2017, Proc. 55/15.3BEPDL, em que fomos relatores, disponível in, www.dgsi.pt/jtca, assim sumariado: «I – Atenta a sua natureza e o seu caráter instrumental e provisório, a apreciação do pedido cautelar de suspensão de eficácia de normas deve, por um lado, sujeitar-se, ao particularmente previsto no artigo 130º do CPTA e simultaneamente aos critérios decisórios previstos no artigo 120º do CPTA, e por outro haverá que ter por referência o pedido impugnatório das normas a que aludiam os artigos 46º nº 1 alínea c) e 72º ss. do CPTA (na versão anterior à resultante da revisão operada pelo DL. n.º 214-G/2015) e a que atualmente se referem os artigos 37º nº 1 alínea d) e 72º ss. do mesmo Código. II – À luz do nº 5 do artigo 286º da CRP, que assegura o direito dos cidadãos a impugnarem as normas administrativas com eficácia externa lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, o CPTA admite a impugnação direta de normas no contencioso administrativo com vista à declaração da ilegalidade de normas emanadas ao abrigo de disposições de direito administrativo, por vícios próprios ou derivados da invalidade de atos praticados no âmbito do respetivo procedimento de aprovação” (cfr. artigo 72º nº 1). III – Nesse âmbito pode ser pedida a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral de norma imediatamente operativa por quem seja diretamente prejudicado pela vigência da norma ou possa vir previsivelmente a sê-lo em momento próximo, independentemente da prática de ato concreto de aplicação (cfr. artigo 73º nº 1) e bem assim pode ser pedida a declaração da sua ilegalidade com efeitos circunscritos ao seu caso, por quem seja diretamente prejudicado ou possa vir previsivelmente a sê-lo em momento próximo pela aplicação de norma imediatamente operativa que incorra em qualquer dos fundamentos de ilegalidade previstos no n.º 1 do artigo 281.º da Constituição da República Portuguesa (artigo 73º nº 2). IV – Também o artigo 130º do CPTA revisto exige o caráter imediatamente operativo da norma a suspender ao estatuir que “…o interessado na declaração da ilegalidade de norma emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo cujos efeitos se produzam imediatamente, sem dependência de um ato administrativo ou jurisdicional de aplicação, pode requerer a suspensão da eficácia dessa norma, com efeitos circunscritos ao seu caso” (nº 1).».
3.1.3 Atenha-se neste conspecto que o artigo 120º do CPTA revisto (DL n.º 214-G/2015), dispõe o seguinte:
Artigo 120º
Critérios de decisão
1 — Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
2 — Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências”.

E que o artigo 130º do mesmo CPTA revisto (DL n.º 214-G/2015), em sede de disposições particulares (capítulo II), dispõe o seguinte:
“Artigo 130º
Suspensão da eficácia de normas
1 — O interessado na declaração da ilegalidade de norma emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo cujos efeitos se produzam imediatamente, sem
dependência de um ato administrativo ou jurisdicional de aplicação, pode requerer a suspensão da eficácia dessa norma, com efeitos circunscritos ao seu caso.
2 — O Ministério Público e as pessoas e entidades referidas no n.º 2 do artigo 9.º podem pedir a suspensão, com força obrigatória geral, dos efeitos de qualquer norma em relação à qual tenham deduzido ou se proponham deduzir pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral.
3 — [Revogado].
4 — Aos casos previstos no presente artigo aplica-se, com as adaptações que forem necessárias, o disposto no capítulo I e nos dois artigos precedentes.”

3.1.4 Estas notas prévias assumem utilidade e relevância para a apreciação do presente recurso, seja no que tange ao requisito do fumus boni iuris seja no que respeita ao requisito do periculum in mora por sempre importar ter-se presente o sentido e conteúdo das normas ou conjunto de normas regulamentares relativamente às quais é pretendida a respetiva suspensão de efeitos (suspensão de eficácia) até que seja definitivamente decidida na ação principal a sua invocada ilegalidade.
3.1.5 Vejamos, então, se ocorrem os erros de julgamento imputados à sentença recorrida.
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3.2 Do apontado erro de julgamento quanto ao requisito do fumus boni iuris
3.2.1 No requerimento inicial da providência a requerente suportou a invocada ilegalidade das normas do Regulamento nas seguintes causas de invalidade:
- preterição de formalidade essencial, com violação do direito de participação, por falta de consulta pública, com violação dos artigos 101º do CPA - (vide artigos 67º a 79º do RI);
- violação do princípio da legalidade, por violação do artigo 11º nº 6 do DL. nº 108/2009, de 15 de maio; do artigo 11º nº 1 alínea a) do DL. nº 92/2010, de 26 de julho; do artigo 143º e 138º do CPA - (vide artigos 80º a 115º do RI);
- violação dos princípios da proporcionalidade, proteção da confiança e igualdade - (vide artigos 116º a 134º do RI);
- inconstitucionalidade por violação do artigo 47º nº 1 da CRP - (vide artigos 135º a 141º do RI).
3.2.2 Enfrentando a questão de saber se, no caso, se apresentava como provável a procedência da pretensão impugnatória a formular na ação principal (fumus boni iuris), a sentença recorrida, explanou o seguinte, que se passa a transcrever:
«(…)O Decreto-lei n.º108/2009, de 15 de Maio, alterado pelo Decreto-lei n.º95/2013, de 19 de Julho, e pelo Decreto-lei n.º186/2015, de 3 de Setembro, estabelece as condições de acesso e de exercício da atividade das empresas de animação turística e dos operadores marítimo-turísticos.
Nos termos do artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do referido diploma legal, “1. São atividades de animação turística as atividades lúdicas de natureza recreativa, desportiva ou cultural, que se configurem como atividades de turismo de ar livre ou de turismo cultural e que tenham interesse turístico para a região em que se desenvolvam, tais como as enunciadas no anexo ao presente decreto-lei, que dele faz parte integrante. 2. Para efeitos do presente decreto-lei, consideram-se: a) «Atividades de turismo de ar livre», também denominadas por «atividades outdoor», de «turismo ativo» ou de «turismo de aventura», as atividades que, cumulativamente: i) Decorram predominantemente em espaços naturais, traduzindo-se em vivências diversificadas de fruição, experimentação e descoberta da natureza e da paisagem, podendo ou não realizar-se em instalações físicas equipadas para o efeito; ii) Suponham organização logística e ou supervisão pelo prestador; iii) Impliquem uma interação física dos destinatários com o meio envolvente; b) «Atividades de turismo cultural”, as atividades pedestres ou transportadas, que promovam o contacto com o património e natural através de uma mediação entre o destinatário do serviço e o bem cultural usufruído, para partilha de conhecimento”.
Atento o disposto no artigo 5.º, n.º1, do Decreto-lei n.º108/2009, de 15 de Maio, alterado pelo Decreto-lei n.º95/2013, de 19 de Julho, e pelo Decreto-lei n.º186/2015, de 3 de Setembro, “Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 a 4 do artigo 29.º, apenas as empresas que tenham realizado a mera comunicação prévia ou a comunicação prévia com prazo através do Registo Nacional de Agentes de Animação Turística (RNAAT), acessível ao público através do balcão do empreendedor previsto nos Decretos-Leis n.ºs 92/2010, de 26 de Julho, e 48/2011, de 1 de Abril, disponível através do Portal do Cidadão, e do sítio na Internet do Turismo de Portugal, I.P., nos termos previstos nos artigos 11.º e 13.º, podem exercer e comercializar, em território nacional, as atividades de animação turística definidas no artigo 3.º e nos n.ºs 1 e 2 do artigo anterior”.
Relativamente ao acesso à atividade de animação turística, o artigo 11.º, n.ºs 1, 2 e 6, do referido diploma legal estabelece o seguinte: “1. O exercício de atividades de animação turística depende de: a) Inscrição no RNAAT pela regular apresentação de mera comunicação prévia, tal como definida na alínea b) do n.º2 do artigo 8.º do Decreto-lei n.º92/2010, de 26 de Julho, sem prejuízo do disposto no artigo 29.º; b) Contratação dos seguros obrigatórios ou dos seguros, garantias financeiras ou instrumentos equivalentes, nos termos dos artigos 27.º a 28.º-A. 2. A inscrição no RNAAT das empresas estabelecidas em território nacional é realizada através de formulário eletrónico acessível ao público através do balcão do empreendedor previsto nos Decretos-leis n.ºs 92/2010, de 26 de Julho, e 48/2011, de 1 de Abril, disponível através do Portal do Cidadão, e do sítio na Internet do Turismo de Portugal, I.P., e deve incluir: a) A identificação do interessado; b) (Revogada); c) A localização da sede, ou do domicílio no caso de se tratar de pessoa singular, e dos estabelecimentos em território nacional; d) A indicação do nome adoptado para o estabelecimento e de marcas que a empresa pretenda utilizar; e) As atividades de animação turística que a empresa pretenda exercer, especificando, no caso das atividades marítimo-turísticas, as modalidades a exercer; f) A indicação do interesse em obter o reconhecimento de atividades como turismo de natureza, quando se verifique. (…) 6. Nos termos da alínea a) do n.º1 do artigo 11.º do Decreto-lei n.º92/2010, de 26 de Julho, não pode haver duplicação entre as condições exigíveis para o cumprimento dos procedimentos previstos no presente decreto-lei e os requisitos e os controlos equivalentes, ou comparáveis quanto à finalidade, a que o requerente já tenha sido submetido em território nacional ou noutro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu”.
O artigo 11.º, n.º1, alínea a), do Decreto-lei n.º92/2010, de 26 de Julho, para que remete o n.º6 da norma citada, estabelece que: “Os pressupostos, os requisitos ou as condições para o acesso e o exercício de uma atividade de serviços não podem: a) Determinar a verificação de outras permissões administrativas, de pressupostos, de requisitos, de condições, de obrigações ou de controlos equivalentes ou que visem essencialmente a mesma finalidade a que o prestador de serviços já tenha sido submetido em território nacional ou noutro Estado membro”.
Ora, tendo presente que o exercício da atividade de animação turística pode implicar a utilização de meios de transporte, designadamente para a realização de passeios turísticos e para o transporte de clientes, o regime legal supra exposto não tem o alcance de proibir que sejam estabelecidas regras relativamente à circulação dos veículos utilizados para o exercício da referida atividade – veículos de animação turística.
Contudo, analisado o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, verifica-se que o mesmo não se limita a regular a circulação dos veículos de animação turística em determinadas zonas da Vila de S......, antes faz depender a circulação de tais veículos da atribuição de uma licença, limitando o número de licenças que podem ser emitidas para a circulação naquela zona e estabelecendo que, um ano após a sua entrada em vigor, os veículos utilizados devem ter determinadas características.
Com efeito, o referido Regulamento define, no seu artigo 4.º, o procedimento para atribuição de licença, estando a apresentação do pedido sujeita ao pagamento de uma taxa e podendo o mesmo ser indeferido com um dos fundamentos previstos no artigo 7.º do mesmo Regulamento, onde se inclui o esgotamento do contingente de licenças ou de viaturas especificamente previsto para a zona [artigo 7.º, n.º1, alínea f), do Regulamento].
Por outro lado, a licença que vier a ser atribuída caduca quando, um após a entrada em vigor do Regulamento, o veículo a que disser respeito não cumprir o critério de emissões previsto no artigo 34.º.
Aceitando-se que a Câmara Municipal de S...... pode, por força do disposto no artigo 33.º, n.º1, alíneas ee), qq) e rr) do Regime Jurídico das Autarquias Locais, aprovado pela Lei n.º75/2013, de 12 de Setembro, bem como do disposto no artigo 10.º do Código da Estrada, estabelecer restrições à circulação de determinados veículos na Vila de S......, é, no entanto, de admitir que o procedimento previsto no Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ contenda com o regime legal que rege a atividade da animação turística, na exata medida em que faz depender a circulação dos veículos de animação turística da atribuição de uma licença e o número de licenças é limitado, sem que, refira-se, resulte claro do já referido Regulamento qual o critério de atribuição de tais licenças dentro do contingente definido no anexo I.
De facto, por força do regime de licenciamento previsto no Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística, será a Câmara Municipal de S...... a decidir quais os veículos de animação turística elencados no artigo 2.º, n.º2, do mesmo Regulamento que podem circular na Vila de S......, o que é diferente do estabelecimento de regras de circulação daqueles veículos.
Assim sendo, considerando que, como já referimos, o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ faz depender a circulação dos veículos de animação turística da titularidade de uma licença, que não é exigida pelo regime legal da atividade da animação turística [cfr. artigo 26.º do Decreto-lei n.º108/2009, de 15 de Maio], não se limitando a estabelecer regras de circulação aplicáveis a todos os veículos de animação turística, é de admitir que o mesmo Regulamento, bem como o Edital n.º.../2017, violem aquele regime legal.(…)»

Tendo então concluído o seguinte:
«(…)Com este fundamento, e numa apreciação sumária, concluímos que é provável a procedência da pretensão formulada na ação principal, o que é suficiente, sem que se mostre necessário apreciar os demais vícios invocados pela requerente, para que se considere preenchido o requisito do fumus boni juris.»

3.2.3 Pugna o recorrente que a sentença recorrida errou ao considerar verificado o requisito do fumus boni iuris com fundamento em que o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........ e o Edital nº .../2017, violam o regime de acesso e exercício da atividade de animação turística, por estes apenas visarem a regulação do trânsito e a proteção do ambiente numa zona determinada do território municipal, que pela sua sensibilidade e pela pressão existente obriga à criação de restrições, e criarem um modelo de controlo que visa e permite uma gestão racional, em termos exequíveis, do trânsito na zona definida.
3.2.4 Em causa nos autos está o Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 134, de 13/07/2017 (Aviso n.º 7945/2017) em especial os seus artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º, bem como os artigos 1.º, 3.º e 5.º do respetivo Anexo, cuja suspensão de eficácia é pretendida.
3.2.5 Resulta efetivamente que na origem deste Regulamento, está a necessidade de disciplinar a circulação, estacionamento e paragem de veículos afetos à atividade de animação turística, no M........ (em especial no Centro Histórico, em S. Pedro de S......, na P...... e na E.......) – (cfr. designadamente, artigos 1º, 2º, 12º nºs 1 e 2; 13º, 15º, 22º e 23º do Regulamento). Necessidade que foi espelhada no Preâmbulo do Regulamento nos seguintes termos:
A Câmara Municipal de S...... tem constatado o elevado interesse a ampla solicitação pelo aumento da oferta turística ao nível dos circuitos e roteiros com meios de transporte alternativos, sendo que os mais identificados são designadamente os transportes de turistas em motociclos, triciclos vulgo "tuk-tuk", carros elétricos, jeeps e veículos ligeiros.
Ora, não obstante a mais-valia de algumas propostas e considerando que as mesmas constituem um contributo valido para o desenvolvimento do turismo no Município, importa efetuar o devido reconhecimento e acompanhamento das diversas atividades sem descurar que a capacidade de S...... enquanto destino turístico no presente âmbito é finita.
Assim, a imposição do Direito Estradal bem como as particulares características da atividade que se pretende implementar e a prudência na boa gestão das atribuições do Município, impõem a criação de um Regulamento Municipal sobre a matéria.
Também no n.º 2 do artigo 10.º do Código da Estrada vem prevista a possibilidade de ser condicionado o trânsito com caráter temporário ou permanente a diverso tipo de veículos em todas ou só algumas vias públicas, sendo a matéria melhor concretizada por força dos artigos 5.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de fevereiro, na sua redação vigente.
A Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres, aprovada pela Lei n.º 10/90, de 17 de março, prevê no seu artigo 23.º que os transportes públicos rodoviários de passageiros regulares e ocasionais, especificamente destinados à realização de viagens turísticas coletivas podem ser objeto de normas a definir em regulamentação especial, sendo que, com exceção do Decreto-Lei n.º 249/2000, de 13 de outubro, na redação vigente, o qual estabelece o regime jurídico de aprovação e de circulação na via pública dos comboios turísticos, até à presente data tal não se concretizou.
A sobrecarga originada pela exploração de circuitos turísticos, com a obstrução à normal circulação, o estacionamento, paragem e o ruído provocado por alguns dos veículos afetos a atividades de animação turística tem sido objeto de justificadas reclamações por parte das populações.
Incumbe aos Municípios promover e salvaguardar os interesses próprios das populações, nos termos do n.º1 do artigo 23.º do Regime Jurídico aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, harmonizando a qualidade de vida dos habitantes com a instalação e exercício de atividades nos respetivos territórios, nos domínios públicos municipais.
Os Municípios dispõem especialmente de atribuições nos domínios dos transportes e comunicações, ambiente, ordenamento do território e polícia municipal, como preceituam as alíneas c), k), n) e o) do n.º 2 do artigo 23.º do Regime Jurídico aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro.
Sem prejuízo do que precede, destaque-se ainda que é uma competência da Câmara Municipal de S......, ao abrigo das alíneas qq) e rr) do n.º 1 do artigo 33.º, administrar o domínio público municipal e deliberar sobre o estacionamento de veículos nas vias públicas e demais lugares públicos.
Por todo o exposto, pelo facto do trânsito e circulação dever fluir de forma regular e ordenada e porque o espaço para estacionamento e paragem das diversas tipologias de veículos é um recurso cada vez mais escasso que importa regular e racionalizar, impõe-se ao Município uma atitude interventiva em prol do interesse público que lhe incumbe defender.
Foi assim entendido por necessário disciplinar - atenta a questão do estacionamento e de paragem de todos os meios de transporte e fruição turística - a questão dos circuitos turísticos em diferentes meios de transporte, bem como a respetiva circulação na área do Município, por forma a assegurar o quadro regulamentar adequado a uma correta exploração turística e económica, salvaguardando uma imagem condigna e de qualidade e garantido a observância dos princípios da concorrência e da igualdade no acesso às atividades.
Também numa perspetiva ambiental considerou-se do mais elementar bom senso criar Zonas de "Zero Emissões" e "Zonas de Emissões Reduzidas "onde os Transporte de Índole e Fruição Turística motorizados não possam circular ou só possam circular se cumprirem limites máximos de emissões poluentes e de ruído.
Sem prejuízo da matéria se encontrar intimamente conexa com o disposto no Regulamento de Trânsito e Estacionamento do M........, aprovado pela Assembleia Municipal se S...... em 23 de novembro de 2011, foi entendimento que esta problemática fosse tratada em sede regulamentar própria. (…)”
3.2.6 Sendo que, como aliás, foi reconhecido pela sentença recorrida, nos termos do disposto no artigo 33º nº 1 alíneas ee), qq) e rr) do Regime Jurídico das Autarquias Locais, aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, bem como do disposto no artigo 10.º do Código da Estrada, a Câmara Municipal de S...... pode estabelecer restrições à circulação de determinados veículos na área do Município.
3.2.7 Sucede é que aquele Regulamento não se limita a estabelecer regras ordenativas para a circulação de veículos dos transportes de índole e fruição turística, nomeadamente aquelas que assumam as tipologias elencadas no artigo 2º nº 2 do Regulamento, a saber:
“a) Motociclos com e sem side-car e "moto-quatros";
b) Triciclos (vulgo tuk-tuk);
c) Automóveis tipo "jeep" e de todo o terreno;
d) Veículos automóveis ligeiros de passageiros de utilização turística (excluindo táxis);
e) Automóveis elétricos”.
Dos quais se encontram excluídos “…os veículos de transporte de índole e fruição turística pesados, os veículos autoconduzidos e os trens de S......”, os quais se regem “…pelo Regulamento Municipal dos Trens de S......, aprovado pela Assembleia Municipal em 4 de julho de 2003, normativo que é aplicável, com as devidas adaptações, às charretes e outros veículos com tração animal” (cfr. artigo 2º nº 6 do Regulamento).
Na verdade aquele Regulamente faz depender a circulação de veículos afetos à atividade de animação turística à atribuição de uma «licença» (cfr. artigos 3º e 4º do Regulamento), cujo número é limitado em resultado da contingentação de licenças ou de viaturas, a qual se encontra estabelecida num número máximo de 100 viaturas (cfr. artigos 7º nº 1 alínea f), 12º nº 2 do Regulamento e artigo 3º do Anexo I). Sendo que, concomitantemente, como bem evidenciou a sentença recorrida, não se estabelece qualquer critério de atribuição de tais licenças dentro do contingente definido.
3.2.8 Por outro lado, em face dos termos em que se encontra previsto naquele Regulamento a atribuição das «licenças» àqueles veículos de transportes de índole e fruição turística, será a Câmara Municipal de S...... a decidir quais daqueles veículos podem circular na V... S......, o que, como é dito na sentença recorrida “…é diferente do estabelecimento de regras de circulação daqueles veículos”.
Atenha-se que a permissão para acesso às zonas ZER e ZEZ (respetivamente, «Z.E.R.», entendida como a zona definida pelo Município na qual apenas é permitida a circulação de determinados veículos de animação turística que cumpram normas de emissão de poluentes, a qual se encontra delimitada nos termos do artigo 2º do Anexo I ao Regulamento, cuja respetiva representação gráfica consta do Anexo I-A, e «Zona de Emissões Zero», entendida como a zona definida pelo Município na qual não é permitida a circulação de veículos de animação turística que emitam poluentes – cfr. artigos 2º nº 5 alíneas e) e f) e 3º nº 2) depende da emissão da «licença», e pagamento da respetiva taxa, após a qual é emitido o correspondente «alvará».
E que, para obter a necessária «licença» devem os interessados acompanhar o seu requerimento com os seguintes elementos (cfr. artigo 4º nºs 2 e 3 do Regulamento):
- dados de identificação, morada e contactos do requerente;

- o período de funcionamento e horário, o qual tem que respeitar o disposto no presente regulamento;

- as freguesias abrangidas pela sua atividade;

- o local ou locais físicos para atendimento dos clientes, na zona ou na sua envolvente direta, com indicação do(s) responsável(eis) e respetivo(s) contacto(s) telefónico(s) direto(s);

- fotocópia do Cartão de Cidadão, Bilhete de Identidade ou Passaporte acompanhado de título que permita a residência em território nacional e Cartão de Contribuinte, se o interessado for pessoa singular e certidão do registo comercial atualizada, ou código de acesso à mesma através de meios informáticos, se o interessado for pessoa coletiva;

- documento comprovativo de que o interessado se encontra em situação regularizada relativamente a dívidas por impostos ao Estado e por contribuições para a Segurança Social, ou documento de autorização de consulta de situação tributária e contributiva à Segurança Social e às Finanças;

- termo de responsabilidade, emitido pelo requerente, referindo que se compromete a verificar que todos condutores estão habilitados para a condução dos veículos de transporte turístico em causa, nos termos do artigo 121.º do Código da Estrada;

- documento comprovativo do seguro de responsabilidade civil, quanto ao desenvolver da atividade e quanto a ocupantes e a terceiros atualizado à data do pedido;

- o número, as tipologias, marcas e modelos de todos os veículos a utilizar no Município e cópia da respetiva documentação, bem como comprovativo do seguro automóvel obrigatório de cada viatura e da inspeção periódica legalmente exigível;

- nos veículos a motor de combustão, o documento comprovativo de que os veículos afetos à animação turística cumprem as normas de emissão (emissão de CO2 e ruído), previstas para a ZER da respetiva zona;

- o Título de Registo junto do Turismo de Portugal IP, para as Empresas de Animação Turística no âmbito do Decreto-Lei n.º 108/2009 de 15 de maio, com as alterações vigentes;

- o mapa representando os percursos pretendidos, bem como os locais de paragem, e de estacionamento pretendidos de entre os constantes de deliberação prévia do executivo municipal;

- a licença ou autorização prévia do ICNF, IP quando o veículo a tenha de obter face à legislação especial;

- tabela de preços a praticar por circuito no primeiro ano.


Sendo que a não junção de algum destes documentos, ou a inobservância das exigências a que se referem, conduzem ao indeferimento do pedido de emissão da licença (cfr. artigo 7º nº 1 alíneas a) e d) do Regulamento).
3.2.9 Ora, como bem sustentou a requerente no requerimento inicial da providência, é o DL. nº 108/2009, de 15 de maio que estabelece as condições de acesso e de exercício da atividade das empresas de animação turística (e dos operadores marítimo-turísticos), entendidas estas como “…as atividades lúdicas de natureza recreativa, desportiva ou cultural, que se configurem como atividades de turismo de ar livre ou de turismo cultural e que tenham interesse turístico para a região em que se desenvolvam” (cfr. artigo 3º nº 1 do DL. nº 108/2009), e compreendendo as «atividades de turismo cultural», as “…atividades pedestres ou transportadas, que promovam o contacto com o património cultural e natural através de uma mediação entre o destinatário do serviço e o bem cultural usufruído, para partilha de conhecimento” (cfr. artigo 3º nº 2 alínea b) do DL. nº 108/2009).
Diploma que apenas permite o exercício e a comercialização, em território nacional, daquelas atividades de animação turística “…às empresas que tenham realizado a comunicação prévia ou a comunicação prévia com prazo através do Registo Nacional de Agentes de Animação Turística (RNAAT), acessível através do balcão único eletrónico de serviços, a que se refere o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e do sítio na Internet do Turismo de Portugal, I. P., nos termos previstos nos artigos 11.º e 13.º” (cfr. artigo 5º nº 1 do DL. nº 108/2009), onde o interessado deve incluir os seguintes elementos (cfr. artigo 11º do DL. nº 108/2009):
- a identificação do interessado;
- a localização da sede, ou do domicílio no caso de se tratar de pessoa singular, e dos estabelecimentos em território nacional;
- a indicação do nome adotado para o estabelecimento e de marcas que a empresa pretenda utilizar.
Sendo que a respeito da utilização de meios de transporte no exercício da atividade de animação turísticas este diploma dispõe que quando utilizem veículos automóveis com lotação superior a nove lugares “…as empresas de animação turística devem estar licenciadas para a atividade de transportador público rodoviário de passageiros ou recorrer a entidade habilitada para o efeito nos termos da legislação aplicávele os veículos “…devem ser sujeitos a prévio licenciamento pelo Instituto de Mobilidade e dos Transportes, I. P. (IMT, I. P.), ou estar abrangidos por licença europeia emitida em qualquer Estado-Membro de estabelecimento, nos termos do Regulamento (CE) n.º 1073/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro” (cfr. artigo 26º nºs 1 e 2 do DL. nº 108/2009). E quando os veículos automóveis utilizados tenham lotação até nove lugares esse transporte “…pode ser efetuado pelas próprias empresas de animação turística, desde que os veículos utilizados sejam da sua propriedade, ou objeto de locação financeira, aluguer de longa duração ou aluguer operacional de viaturas (renting), se a empresa de animação turística for a locatária, ou ainda quando recorram a entidades habilitadas para o transporte” (cfr. artigo 26º nº 3 do DL. nº 108/2009). Neste caso o motorista “…deve ser portador do seu horário de trabalho e de documento que contenha a identificação da empresa, a especificação do evento, iniciativa ou projeto, a data, a hora e o local de partida e de chegada, que exibirá a qualquer entidade competente que o solicite”.
E prevendo ainda o DL. nº 108/2009 que as empresas de animação turística devem celebrar os seguintes seguros obrigatórios “…que cubram os riscos para a saúde e segurança dos destinatários dos serviços ou de terceiros decorrentes da sua atividade”:
- um seguro de acidentes pessoais para os destinatários dos serviços;
- um seguro de assistência para os destinatários dos serviços que viajem do território nacional para o estrangeiro no âmbito ou por força do serviço prestado;
- um seguro de responsabilidade civil que cubra os danos patrimoniais e não patrimoniais causados por sinistros ocorridos no decurso da prestação do serviço (cfr. artigo 27º nº 1 do DL. nº 108/2009).

Não podendo as empresas de animação turística, iniciar ou exercer a sua atividade, sem fazer prova junto do Turismo de Portugal, I. P., de ter contratado os seguros exigidos, devendo informar o Turismo de Portugal, I. P., da revalidação das apólices de seguro obrigatório acompanhada de documento comprovativo, no prazo de 30 dias a contar da data do respetivo vencimento, ou da subscrição de novo instrumento de seguro e a respetiva validade, se for o caso (cfr. artigo 27º nºs 5, 6 e 7 do DL. nº 108/2009).
E estabelecendo ainda aquele diploma competir à ASAE - Autoridade de Segurança Alimentar e Económica a fiscalização da observância do que é nele disposto (cfr. artigo 30º do DL. nº 108/2009).
3.2.10 Tudo isto foi considerado na sentença recorrida.
3.2.11 E feita a confrontação entre o que é exigido no Regulamento municipal para efeito da atribuição da identificada «licença», aqui em causa, e o regime legal de acesso e de exercício da atividade das empresas de animação turística, constante do DL. nº 108/2009, tem efetivamente que reconhecer-se, mesmo em termos perfuntórios, próprios da sede cautelar, que o procedimento previsto no Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, ao submeter a um processo de «licenciamento», nos termos em que o faz, designadamente com as exigências estabelecidas no seu artigo 4º, supra percorrido, o desenvolvimento das atividades de animação turística no M........ sempre que nas mesmas sejam utilizados veículos para transporte de passageiros «não pesados», contende com o regime legal que rege a atividade da animação turística constante do DL. nº 108/2009, invadindo um âmbito de regulação legal ocupado por este, como foi invocado pela requerente.
O que, consubstancia, também, a invocada violação do artigo 11º nº 6 do DL. 108/2009, que expressamente estatui que “…nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, não pode haver duplicação entre as condições exigíveis para o cumprimento dos procedimentos previstos no presente decreto-lei e os requisitos e os controlos equivalentes, ou comparáveis quanto à finalidade, a que o requerente já tenha sido submetido em território nacional ou noutro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu.”.
3.2.12 Foi, pois, correto, o entendimento feito nesse sentido pela sentença recorrida. Devendo, ter-se por verificado, o requisito do fumus boni iuris.
3.2.13 Não colhe, pois, neste aspeto o recurso.

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3.3 Do apontado erro de julgamento quanto ao requisito do periculum in mora
3.3.1 Analisando o requisito do periculum in mora, a sentença recorrida deu-o por preenchido em face da circunstância de resultar provado nos autos “…que, atualmente, circulam em S...... mais do que 100 veículos de animação turística e que o número limitado de licenças excluirá de S...... operadores que aí se encontram a atuar, sendo que tais operadores, se excluídos, ficarão com a sua operação e investimento comprometidos, podendo perder os investimentos já realizados e ficando prejudicados pela perda de lucros do seu negócio e pela perda de clientela [alíneas m) a r) dos factos provados].”. E que assim sendo “…impõe-se concluir que, se não for decretada a providência cautelar requerida, os associados da requerente, que esta representa e cujos interesses defende, sofrerão prejuízos de difícil reparação, na medida em que se mostra difícil proceder à reintegração da sua situação no plano dos factos caso a ação principal venha a ser julgada procedente, atenta a dificuldade na quantificação dos prejuízos resultantes da provável perda de lucros do negócio e pela perda de clientela.”
3.3.2 Defende o recorrente a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao considerar verificado o requisito do periculum in mora, por ter assentado a sua decisão em factos meramente eventuais, cuja verificação é meramente possível, para além de depender das opções de gestão que venham a ser tomadas pelos operadores que exercem a atividade de operação turística, nem constituindo a execução dos atos suspendendos condição necessária e suficiente para os efeitos eventuais que são elencados na sentença – (vide conclusões 5ª a 7ª das alegações de recurso).
3.3.3 Antecipe-se desde já que deve ser mantido o juízo de verificação do requisito do periculum in mora, não colhendo o recurso também nesta parte.
Vejamos porquê.
3.3.4 Importa recordar que na situação dos autos a pretensão cautelar formulada é a de decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia das normas constantes do identificado Regulamento para Transportes de Índole e Fruição Turística no M........, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º134, de 13/07/2017, designadamente, dos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 25.º, 33.º, 34.º e 39.º, assim como dos artigos 1.º, 3.º e 5.º do respetivo Anexo, bem como do Edital n.º.../2017, de 2 de Agosto de 2017.
3.3.5 Significando, assim, que a requerente visa evitar os efeitos das normas do Regulamento que exigem às empresas que exercem atividade de animação turística no M........, com uso de meios de transporte através de veículos incluídos nas tipologias elencadas no artigo 2º nº 2 do Regulamento (a saber: “a) Motociclos com e sem side-car e "moto-quatros"; b) Triciclos (vulgo tuk-tuk); c) Automóveis tipo "jeep" e de todo o terreno; d) Veículos automóveis ligeiros de passageiros de utilização turística (excluindo táxis); e) Automóveis elétricos”) a obtenção de «licença» para aqueles seus veículos, a qual haverá de ser requerida no prazo estabelecido após a afixação do Edital (cfr. artigo 33º nº 1 do Regulamento).
Deste modo, tornaram-se já operativas as normas do Regulamento que estabelecem, fora de enquadramento legal, as exigências do referido «licenciamento». Incluindo quanto aos contigentes máximos de veículos, que foram fixados.
3.3.6 E se assim é, não só as empresas que desenvolvem a atividade de animação turística com recurso aos identificados veículos de transporte verão já condicionado o seu exercício ao cumprimento daquelas exigências, às quais se haverão de submeter (e cumprir) através do procedimento de licenciamento, a que devem dar início no prazo fixado, sendo a concessão da «licença» (com a emissão do respetivo alvará, após o pagamento da correspondente taxa) condição necessária; como é fundada a conclusão de que, face ao número limitado de «licenças» passíveis de ser atribuídas ao abrigo do Regulamento, considerando o contingente máximo de veículos que nele foi fixado, e ao número de veículos de animação turística que atualmente circulam em S...... (mais de 100 veículos), serão excluídos, por efeito de aplicação das regras constantes no Regulamento, operadores que agora se encontram a atuar.
3.3.7 O que basta para ter-se por verificado, no caso, o requisito do periculum in mora já que não será possível, ou pelo menos não será plena, a reconstituição da situação atual hipotética conforme com a legalidade na decorrência da declaração da ilegalidade das normas quando venha a ser decidida na ação principal.
3.3.8 Não merecendo, pois, acolhimento, também neste aspeto, o recurso, devendo ter-se por verificado o requisito do fumus boni iuris.
~
3.4 Do apontado erro de julgamento quanto à ponderação dos danos para os interesses em presença
3.4.1 Propugna o recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao não recusar o decretamento da providência cautelar requeridas ao abrigo do artigo 120º nº 2 do CPTA, defendendo que os danos que resultam da sua concessão se mostram mais graves do que aqueles que resultam da sua recusa. Sustenta neste âmbito, que constituem factos públicos e notórios e o Tribunal a quo tinha elementos suficientes para os apreciar, os factos que estiveram na origem da emissão do regulamento e da prática do ato suspendendos; que os danos que resultam para o interesse público de segurança rodoviária, ambientais, de saúde pública e da qualidade de vida dos cidadãos, constituirão um facto consumado de impossível reconstituição e de inviável compensação e que os danos que possam recusar da recusa de decretamento das providências cautelares requeridas não determinam a constituição de factos consumados e são suscetíveis de avaliação e compensação.
3.4.2 Já se viu que na origem do Regulamento aqui em causa, esteve a necessidade, ali identificada, de disciplinar a circulação, estacionamento e paragem de veículos afetos à atividade de animação turística, no M........ (em especial no Centro Histórico, em S. P. de S......, na P...... e na E.......) – (cfr. designadamente, artigos 1º, 2º, 12º nºs 1 e 2; 13º, 15º, 22º e 23º do Regulamento). A qual foi espelhada no Preâmbulo do Regulamento nos seguintes termos:
A Câmara Municipal de S...... tem constatado o elevado interesse a ampla solicitação pelo aumento da oferta turística ao nível dos circuitos e roteiros com meios de transporte alternativos, sendo que os mais identificados são designadamente os transportes de turistas em motociclos, triciclos vulgo "tuk-tuk", carros elétricos, jeeps e veículos ligeiros.
Ora, não obstante a mais-valia de algumas propostas e considerando que as mesmas constituem um contributo valido para o desenvolvimento do turismo no Município, importa efetuar o devido reconhecimento e acompanhamento das diversas atividades sem descurar que a capacidade de S...... enquanto destino turístico no presente âmbito é finita.
Assim, a imposição do Direito Estradal bem como as particulares características da atividade que se pretende implementar e a prudência na boa gestão das atribuições do Município, impõem a criação de um Regulamento Municipal sobre a matéria.
Também no n.º 2 do artigo 10.º do Código da Estrada vem prevista a possibilidade de ser condicionado o trânsito com caráter temporário ou permanente a diverso tipo de veículos em todas ou só algumas vias públicas, sendo a matéria melhor concretizada por força dos artigos 5.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de fevereiro, na sua redação vigente.
A Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres, aprovada pela Lei n.º 10/90, de 17 de março, prevê no seu artigo 23.º que os transportes públicos rodoviários de passageiros regulares e ocasionais, especificamente destinados à realização de viagens turísticas coletivas podem ser objeto de normas a definir em regulamentação especial, sendo que, com exceção do Decreto-Lei n.º 249/2000, de 13 de outubro, na redação vigente, o qual estabelece o regime jurídico de aprovação e de circulação na via pública dos comboios turísticos, até à presente data tal não se concretizou.
A sobrecarga originada pela exploração de circuitos turísticos, com a obstrução à normal circulação, o estacionamento, paragem e o ruído provocado por alguns dos veículos afetos a atividades de animação turística tem sido objeto de justificadas reclamações por parte das populações.
Incumbe aos Municípios promover e salvaguardar os interesses próprios das populações, nos termos do n.º1 do artigo 23.º do Regime Jurídico aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, harmonizando a qualidade de vida dos habitantes com a instalação e exercício de atividades nos respetivos territórios, nos domínios públicos municipais.
Os Municípios dispõem especialmente de atribuições nos domínios dos transportes e comunicações, ambiente, ordenamento do território e polícia municipal, como preceituam as alíneas c), k), n) e o) do n.º 2 do artigo 23.º do Regime Jurídico aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro.
Sem prejuízo do que precede, destaque-se ainda que é uma competência da Câmara Municipal de S......, ao abrigo das alíneas qq) e rr) do n.º 1 do artigo 33.º, administrar o domínio público municipal e deliberar sobre o estacionamento de veículos nas vias públicas e demais lugares públicos.
Por todo o exposto, pelo facto do trânsito e circulação dever fluir de forma regular e ordenada e porque o espaço para estacionamento e paragem das diversas tipologias de veículos é um recurso cada vez mais escasso que importa regular e racionalizar, impõe-se ao Município uma atitude interventiva em prol do interesse público que lhe incumbe defender.
Foi assim entendido por necessário disciplinar - atenta a questão do estacionamento e de paragem de todos os meios de transporte e fruição turística - a questão dos circuitos turísticos em diferentes meios de transporte, bem como a respetiva circulação na área do Município, por forma a assegurar o quadro regulamentar adequado a uma correta exploração turística e económica, salvaguardando uma imagem condigna e de qualidade e garantido a observância dos princípios da concorrência e da igualdade no acesso às atividades.
Também numa perspetiva ambiental considerou-se do mais elementar bom senso criar Zonas de "Zero Emissões" e "Zonas de Emissões Reduzidas "onde os Transporte de Índole e Fruição Turística motorizados não possam circular ou só possam circular se cumprirem limites máximos de emissões poluentes e de ruído.
Sem prejuízo da matéria se encontrar intimamente conexa com o disposto no Regulamento de Trânsito e Estacionamento do M........, aprovado pela Assembleia Municipal se S...... em 23 de novembro de 2011, foi entendimento que esta problemática fosse tratada em sede regulamentar própria. (…)”
3.4.3 Não se põe em causa, nem há razões para o fazer, o caráter sério das justificações que motivaram a necessidade, sentida e identificada pelos órgãos municipais competentes, de regular a circulação (nas vias públicas do município) dos veículos afetos a atividades de animação turística.
Resulta, aliás, dos termos constantes do Regulamento aprovado que os órgãos municipais competentes pretenderam evitar a sobrecarga dos veículos de animação turística, com as consequências daí resultantes, designadamente a obstrução à normal circulação nas vias municipais.
3.4.4 Já se disse, e assim também o entendeu também a sentença recorrida, que nada obsta a que os órgãos municipais competentes estabeleçam regras ordenativas para a circulação de veículos na sua área de competência, mormente dos veículos de transportes de índole e fruição turística. Isso desde o logo o permite, designadamente, o artigo 10º nºs 1 e 2 do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio, na sua redação em vigor, nos termos do qual “…sempre que ocorram circunstâncias anormais de trânsito, pode proibir-se temporariamente, por regulamento, a circulação de certas espécies de veículos ou de veículos que transportem certas mercadorias” (nº 1), podendo ainda “…ser condicionado por regulamento, com caráter temporário ou permanente, em todas ou apenas certas vias públicas, o trânsito de determinadas espécies de veículos ou dos utilizados no transporte de certas mercadorias” (nº 2).
3.3.5 Percebe-se que os órgãos competentes reconhecem a importância da atividade turística. Mas são simultaneamente sensíveis, e pretendem não descurar, os demais interesses públicos em presença, que lhes incumbe também salvaguardar. Nomeadamente o direito à segurança, ao repouso, à saúde e aos bem-estar dos que circulam e habitam no Centro Histórico de S...... (conforme alegou – vide designadamente artigos 82º e 83º da sua oposição)
Mas a questão não está na impossibilidade de ser regulado, por regulamento municipal, o modo pelo qual haverá de fazer-se a circulação de veículos, nas suas diferentes espécies, nas vias municipais. A questão está nas concretas exigências a que, em concreto, os órgãos do M........, pretendem sujeitar os agentes de animação turística (nos termos supra vistos) com vista à obtenção de «licenças» para que possam fazer ali circular cada um dos veículos que afetam à atividade.
3.3.6 Assim, e para tanto, os órgãos municipais competentes poderão adotar as medidas adequadas à prossecução dos interesses públicos em causa, designadamente para a adequada regulação da circulação do trânsito e das pessoas, e proteção da segurança, nada impedindo, por exemplo, que sejam estabelecidas as ruas ou vias onde determinadas categorias de viaturas possam ou não circular, ou cuja circulação esteja proibida ou condicionada em determinados dias da semana ou dentro de determinado período horário ou que sejam determinados os locais para estacionamento e tomada ou largada de passageiros.
3.3.7 A exigência de proporcionalidade que a ponderação prevista no nº 2 do artigo 120º do CPTA reivindica, não se mostra, assim, perigada na situação concreta. Não se justificando a recursa da providência.
3.3.8 Pelo que que colhe, também neste aspeto o recurso.

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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso jurisdicional, confirmando-se, pelos fundamentos expostos, a decisão recorrida.
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Custas pelo recorrente – artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (Lei nº 41/2013), artigo 338º nº 3 da LTFP (Lei nº 35/2014) e artigo 4º nº 1 alínea f) e nº 6 do RCP e 189º nº 2 do CPTA.
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Notifique.
D.N.
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Lisboa, 14 de junho de 2018

Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)
Maria Cristina Gallego dos Santos
Ana Celeste Catarrilhas da Silva Evans de Carvalho