Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08190/11
Secção:CA-2 º JUÍZO
Data do Acordão:03/15/2018
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:REGIME ESPECIAL DE APOSENTAÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário:I. Aplicam-se às condições da aposentação o regime legal que estiver em vigor à data da apresentação do pedido, não lhe sendo aplicável as alterações legislativas posteriores, salvo no respeitante a normas de conteúdo transitório.

II. À data da apresentação do pedido de aposentação vigorava a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, aprovada pelo D.L. n.º 275-A/2000, de 09/11, na sua sétima alteração, introduzida pelo DL n.º 43/2003, de 13/03, que previa no seu artigo 148.º, n.º 1, que o requerente tivesse completado 55 anos de idade.

III. Com base nesse regime era consentida a aposentação, sem penalização, com 55 anos de idade, independentemente do número de anos de serviço prestado.

IV. Esse diploma veio a sofrer alterações pelo D.L. n.º 235/05, de 30/12, (passando a prever 60 anos de idade), o qual entrou em vigor em 01/01/2006, o qual por ser em data posterior à da apresentação do pedido de aposentação, não é aplicável.

V. Não reunindo o Autor o requisito de 55 anos de idade à data do pedido, não se poderia aposentar sem penalização, nem antes, nem depois da entrada em vigor do D.L. n.º 235/05, de 30/12, mas apenas nos termos do regime geral da aposentação antecipada, previsto no artigo 37.º-A do Estatuto da Aposentação, na redacção em vigor à data da apresentação do pedido, que permitia a aposentação com 36 anos de serviço, mas com uma redução no quantum da pensão.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

António ……………., devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 28/01/2011 que, no âmbito da acção administrativa especial, instaurada por Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (ASFIC/PJ), António ……………., Francisco ………, Maria …………., Jorge ……………. e António ……….., contra a Caixa Geral de Aposentações e o Estado português (por si e através do Ministério da Justiça), julgou improcedente o pedido de reconhecimento aos representados da 1.ª Autora e aos 2.º a 6.º Autores, o direito de obterem a aposentação sem quaisquer penalizações na pensão e a consequente condenação da 2ª R. (CGA) à prática dos atos concernentes a obter a realização de tais situações jurídicas subjetivas e, julgou manifestamente improcedente o pedido de responsabilização do 1.º R., por todos os prejuízos causados aos 2.º a 6.º Autores com os atos praticados, indeferindo a petição inicial quanto a este pedido, nos termos do artigo 234.º-A do CPC.


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Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações (cfr. fls. 361 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem:

“I. A douta sentença proferida pelo tribunal a quo é ilegal por falta de fundamento válido que a sustente.

II. Desde logo, porque não ponderou devidamente os factos alegados pelos Autores, entre eles o ora Recorrente, nem deles fez a devida e acertada aplicação do Direito.

III. Uma correcta aplicação do Direito aos factos provados e arguidos pelo Recorrente só poderia concluir de forma diferente, concretamente, pela procedência da presente acção.

IV. O regime legal em vigor em 31.12.2005 obrigava a que se conjugasse o teor da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, então em vigor, com o artigo 37º-A do Estatuto da Aposentação que dava a possibilidade de ser contabilizado um ano de bonificação na idade por cada três anos de serviço acima dos 36 exigidos legalmente.

V. Assim, e nesta senda, um funcionário que tivesse 36 anos de serviço reunia as condições para se aposentar, não estando em causa se teria 55 anos de idade, cfr. n.º 4 do artigo 37º-A do E.A.

VI. A penalização, a existir, resultaria do facto do funcionário não ter tempo de serviço, para além dos 36 anos, suficiente que lhe permitisse “alcançar” a idade legalmente exigida para a aposentação (55 anos).

VII. Aliás, foi sob a aplicação do supra exposto que dezenas de funcionários, por sua livre e exclusiva vontade, se aposentaram, a maior parte dos quais sem qualquer penalização, porquanto o tempo excedente compensava a idade.

VIII. Ou seja, bastou que tivessem atingido os 36 anos de serviço, independentemente da idade, para se terem aposentado sem quaisquer impedimentos.

IX. Pois, e repita-se, era este o regime legal em vigor, o qual também deveria ter sido aplicado no caso do Recorrente e dos restantes autores, mas não sucedeu, porque a ali Ré e ora Recorrida CGA assim não entendeu, violando, assim as suas legítimas expectativas e direitos.

X. O DL n.º 235/05 na redacção da Declaração de Rectificação n.º 110/2006 não é aplicável à situação do ora Recorrente.

XI. A data, 31.12.2005, o regime legal aplicável era o da conjugação obrigatória da LOPJ com o então artigo 37°-A do EA.

XII. Mais, não pode ser efectuada, na situação do Recorrente, uma conjugação de aplicação do artigo 37º-A do EA com o DL n.º 235/05, na versão rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 110/2006, incluindo a Lei n.º 60/2005, já que aquele entrou em vigor somente em 01.01.2006 e não era o regime legal em vigor em 31.12.2005.

XIII. Ao entender de forma diferente a decisão ora recorrida é ilegal e por tal facto deverá ser anulada por falta de fundamento legal válido, e substituída por outra que atenda a pretensão do ora Recorrente, nomeadamente, de lhe ser concedida a pensão de aposentação completa, tudo nos termos e com as respectivas consequências legais.”.

Termina pedindo que seja concedido provimento ao recurso e em consequência, seja revogada a sentença recorrida.


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A ora Recorrida, Caixa Geral de Aposentações, notificada, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 397 e segs.), tendo concluído do seguinte modo:

“1.ª O regime especial de aposentação previsto na LOPJ, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, encontra-se definido nos artigos 146.º a 150.º daquele diploma.

2.ª Na redacção anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 235/2005, o pessoal de investigação criminal que não se encontrasse provido em comissão de serviço em cargos dirigentes passava à situação de disponibilidade, obrigatoriamente, quando atingisse os 60 anos de idade, ou mediante autorização especial do Ministro da Justiça, a requerimento do interessado que, alternativamente, tivesse completado 55 anos de idade ou 36 anos de serviço - cfr. artigo 146.º, n.º 1, da LOPJ, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 235/2005, de 30.12.

3.ª Apenas podiam renunciar à situação de disponibilidade, passando imediatamente à situação de aposentação, os funcionários em condições de passar àquela mesma situação de disponibilidade - ou seja, aqueles que completaram 60 anos de idade - cfr. artigo 146.º, n.º 2, da LOPJ, na redacção anterior ao Decreto­ Lei n.º 235/2005, de 30.12.

4.ª No que respeita à aposentação, dispunha o artigo 148.º, n.º 1, da LOPJ, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 235/2005, de 30.12, que o «pessoal de investigação criminal que não se encontre provido em comissão de serviço em cargos dirigentes passa à situação de aposentado, se o requerer, quando tenha completado 55 anos de idade, 90 dias depois de apresentado o requerimento».

5.ª Portanto, e sem prejuízo da aplicação do regime geral de aposentação aplicável a todos os subscritores da CGA, os funcionários da PJ podiam, até 31 de Dezembro de 2005, aposentar-se com 55 anos de idade, independentemente do tempo de serviço prestado, sendo que o montante da pensão seria, nestes casos, proporcional ao tempo de serviço prestado, sendo que a pensão completa ou por inteiro exigiria sempre uma carreira contributiva de 36 anos, idêntica à prevista no regime geral - artigo 37.º, n.º 1, e 53.º, n.º l, do EA.

6.ª O artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 235/2005, de 30.12, veio dar nova redacção à alínea b) do n.º 1 do artigo 146.º e ao n.º l do artigo 148.º da LOPJ, deles resultando que a passagem à situação de disponibilidade, a requerimento do interessado, passou a depender deste reunir cumulativamente (e não alternativamente) 55 anos de idade e 36 anos de serviço; e a idade para requerer a passagem à aposentação, independentemente do tempo de serviço prestado, passou a ser de 60 anos de idade, sendo que a pensão por inteiro corresponderá a uma carreira contributiva completa (que em 2013 será de 40 anos de serviço).

7.ª À semelhança do que sucedeu noutros regimes especiais da função pública, foi estabelecido um regime transitório para a aplicação gradual do novo regime de aposentação e disponibilidade previsto na LOPJ, de acordo com o qual os funcionários que, em 31 de Dezembro de 2005, nos termos da LOPJ, tivessem 55 anos de idade e 36 anos de tempo de serviço, podem, em qualquer momento, aposentar-se, de acordo com essas mesmas condições - cfr. artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 235/2005, de 30 de Dezembro, na redacção da Declaração de Rectificação n.º 10/2006, de 15 de Fevereiro.

8.ª Porém, os funcionários que, como os Rects, em 31 de Dezembro de 2005, não possuíam 55 anos de idade, não podem lógica e legalmente beneficiar do regime especial de aposentação previsto no artigo 148.º da LOPJ em vigor àquela data, muito embora até possam ter 36 anos de tempo de serviço.

9.ª Por essa razão, o legislador no n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 235/2005 previu que até 2014, à semelhança do que sucedeu com outros regimes especiais da função pública, a idade para efeitos de aposentação ao abrigo da LOPJ fosse aumentada seis meses em cada ano, de acordo com a tabela anexa a esse diploma.

10.ª Para além do regime específico de aposentação previsto na LOPJ, os funcionários e agentes da PJ, à semelhança de todos os outros subscritores da CGA, podem ainda lançar mão dos mecanismos de aposentação antecipada previstos na lei geral, isto é, no Estatuto da Aposentação.

11.ª A especificidade da aplicação deste artigo aos funcionários da PJ prende­ se unicamente com um dos factores de formação da taxa global de redução da pensão de aposentação, que é a idade legalmente exigida para a aposentação dos funcionários da PJ, prevista no artigo 148.º, n.º 1, da LOPJ.

12.ª Até 31 de Dezembro de 2005, essa idade fixava-se, como vimos, nos 55 anos de idade - cfr. art.º 148.º n.º 1, da LOPJ. E, a partir de 1 de Janeiro de 2006, é a idade prevista na tabela anexa ao Decreto-Lei n.º 235/2005, de 30.12, que aumenta seis meses em cada ano até atingir, em 2015, os 60 anos de idade.

13.ª Assim, os funcionários da PJ que, até 31 de Dezembro de 2005, possuíssem as condições para se aposentarem antecipadamente, ao abrigo do Estatuto da Aposentação, por contarem, pelo menos, 36 anos de serviço, independentemente da idade, beneficiam do regime de aposentação em vigor até àquela data, com as especificidades próprias decorrentes de terem limites de idade inferiores aos previstos no regime geral para efeitos de determinação de penalizações na pensão, isto é, a sua pensão de aposentação é calculada, em princípio, com base na fórmula em vigor em 31 de Dezembro de 2005, com a eventual penalização que resultar da redução de um ano na idade legal de aposentação constante da tabela anexa ao Decreto-Lei n.º 235/2005 por cada grupo de três anos completos que o tempo de serviço do subscritor ultrapassar os 36 anos de serviço, à data em que seja proferido o despacho de aposentação.

14.ª Porém, no caso de ser mais favorável, a pensão será calculada de acordo com o n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, com a eventual penalização que resultar da redução de 6 meses na idade legal de aposentação da tabela anexa ao DL 235/2005 por cada ano completo que o tempo de serviço do subscritor ultrapasse o correspondente à carreira completa, constante da tabela anexa II à Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, à data do despacho de aposentação.

15.ª Sendo certo que, da aplicação desta modalidade não pode, em nenhuma circunstância, resultar a aposentação com pensão por inteiro, sem penalização, em momento anterior àquele em que o funcionário se aposentaria, com pensão completa, se lhe tivesse sido aplicado o regime em vigor em 31 de Dezembro de 2005.

16.ª No caso de os funcionários da PJ não reunirem em 31 de Dezembro de 2005, 36 anos de serviço completos, só poderão beneficiar do regime de pensão antecipada nos termos do actual artigo 37.º-A do EA, isto é, desde que contem como tempo de serviço relevante para a determinação da carreira completa o que consta do anexo II da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, sendo as penalizações determinadas unicamente em função da idade legal de aposentação do pessoal da PJ, prevista na tabela anexa ao DL 235/2005, em vigor à data do despacho de aposentação.

17.ª Visto o regime específico decorrente da LOPJ e o regime geral de aposentação antecipada previsto no EA, igualmente aplicável aos funcionários da PJ, há ainda que referir que a CGA, de modo a não penalizar qualquer subscritor pela maior ou menor celeridade na conclusão da instrução dos processos de aposentação, adoptou o procedimento genérico de apreciar os pedidos de aposentação enviados à CGA até 31.12.2005 de acordo com o quadro normativo existente nessa data, situação que foi observada na apreciação dos pedidos de aposentação de cada um dos Rectes, como aqueles bem sabem.

18.ª A sentença recorrida não produziu, pois, qualquer agravo aos Rectes devendo manter-se na íntegra.”.

Termina pedindo que o recurso seja julgado improcedente e que seja confirmada a sentença recorrida.


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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

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O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento, de facto e de direito, aplicando-se a Lei Orgânica da Polícia Judiciária e o artigo 37.º-A do Estatuto da Aposentação, que permite a contabilização de um ano de bonificação na idade por cada três anos acima dos 36 anos exigidos para a aposentação.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

“1. António …………….., em 22.12.05, na data em que requereu a aposentação tinha 37 anos de serviço e 53 anos de idade.

2. Francisco ……………., em 29.12.05, data em que requereu a aposentação tinha 38 anos de serviço e 50 anos de idade.

3. Maria da ………….., em 29 de Dezembro de 2005, data em que requereu a aposentação, tinha 36 anos de serviço e 52 anos de idade.

4. Jorge ………….., em 15 de Dezembro de 2005, data em que requereu a aposentação, tinha 36 anos de serviço e 52 anos de idade.

5. António ………, em 20 de Dezembro de 2005, data em que requereu a aposentação, tinha 38 anos e 10 meses de serviço e 51 anos de idade.

6. No segundo semestre do ano de 2005 surgiu um anteprojecto de diploma legal (alteração à LOPJ) que lançava para a discussão pública a matéria de alteração do regime legal da aposentação, não contendo qualquer regime transitório relativo a tal instituto jurídico.

7. Preenchendo os requisitos para se aposentarem (36 ou mais anos de serviço), decidiram, à cautela, receando a publicação de um Decreto-Lei imprevisível, como era anunciado, que poderia vir a existir para os finais do ano de 2005, requerer a aposentação na segunda quinzena de Dezembro de 2005, a poucos dias do final do ano, sendo certo que estariam a tempo de optar pela desistência, caso a futura alteração às LOPJ lhes não fosse desfavorável.

8. O Governo publicou, a 30 de Dezembro de 2005, a alteração à LOPJ para entrar em vigor no dia 1 de Janeiro de 2006, diploma (Decreto-Lei nº 235/05, de 30.12) segundo o qual a aposentação apenas ocorreria aos 60 anos de idade, não contendo, aquando da sua publicação, qualquer tabela de tempo de serviço ou idade para efeito de aposentação que exprimisse um período transitório face à brusca alteração na idade da aposentação.

9. Perante tal situação, os AA., com excepção da primeira A., pediram, em 30.01.06, a suspensão temporária do requerimento para aposentação (cfr. doe.de fls. 43 a 46).

10. A CGA indeferiu o pedido, com fundamento no facto de não haver base legal para o fazer, nos termos do artigo 39º, nº 4 e artigo 43º, nº 1 do EA. Informou ainda a CGA que apenas a desistência de pedidos de aposentação definitiva poderia ser considerada com os condicionalismos previstos pela legislação invocada, nomeadamente “que a desistência só poderia ocorrer enquanto não for publicado diploma legal que estabeleça alteração geral de vencimentos do funcionalismo” (cfr. doc. de fls. 47).

11. No dia 15.02.06 foi publicada a declaração de rectificação nº 10/2006, de 15.12.06, no DR, I Série, nº 33, de 15.02.06.

12. Houve negociação colectiva no que respeita às alterações ao sistema de aposentações, a qual foi conduzida pelo Gabinete do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça (cfr. doc. de fls. 138 a 140).

13. A A. Maria ………….., por deliberação da CGA de 02.03.05 veio a ser aposentada com penalizações na pensão fazendo a CGA tábua rasa ao pedido de suspensão e à correcta interpretação do regime legal transitório ínsito no DL nº 235/05.

14. O A. Jorge ……………., por deliberação da CGA de 08.09.05 veio a ser aposentado com penalizações na pensão fazendo a CGA tábua rasa ao pedido de suspensão e à correcta interpretação do regime legal transitório ínsito no DL nº 235/05.

15. Já o funcionário Fernando ………………., por deliberação da CGA, de 15 de Maio de 2006 foi aposentado sem quaisquer penalizações.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise do fundamento do presente recurso jurisdicional.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento, de facto e de direito, porque segundo o Recorrente a sentença recorrida não ponderou devidamente os factos, nem procede a uma correta aplicação do direito, por ser aplicada à situação do Recorrente o regime previsto na Lei Orgânica da Polícia Judiciária, conjugado com o disposto no artigo 37.º-A do Estatuto da Aposentação, que permitem que se contabilize um ano de bonificação na idade, por cada três anos de serviço acima dos 36 anos exigidos, independentemente da idade.

Nesse sentido, alega o Recorrente que se pode aposentar desde que tivesse atingido 36 anos de serviço, independentemente da idade.

Para tanto, no que respeita ao direito aplicável, considera o Recorrente que o D.L. n.º 235/05, na redacção da Declaração de Retificação n.º 110/2006 não é aplicável à sua situação, nem é aplicável tal regime em conjugação com o artigo 37.º-A do Estatuto da Aposentação.

Vejamos.

O Recorrente vem a juízo interpor o presente recurso, discordando da sentença recorrida, quer quanto à ponderação que foi feita da matéria de facto, quer do julgamento de direito, desde logo, quanto à determinação do direito aplicável, entendendo que estão reunidas as condições legais para ver reconhecido o seu direito à aposentação sem penalização.

Em função da alegação do Recorrente e respectivas conclusões do recurso, é possível perceber que o Recorrente não vem impugnar o julgamento de facto constante da sentença recorrida, não pondo em crise os factos considerados relevantes pelo Tribunal a quo, não invocando a sua insuficiência, contradição ou incongruência, mas antes discorda da valoração que foi feita dos factos dados por assentes.

Tendo presente a matéria de facto dada por provada, é então possível saber que o ora Recorrente, na data em que requereu a aposentação, em 22/12/2005, tinha 37 anos de serviço e 53 anos de idade.

Mais resulta apurado que, em 01/01/2006, entrou em vigor uma alteração legislativa à Lei Orgânica da Polícia Judiciária, pelo D.L. n.º 235/05, de 30/12, segundo a qual a aposentação ocorreria aos 60 anos de idade, não prevendo qualquer período transitório.

O Autor, em 30/01/2006, pediu a suspensão temporária do requerimento da aposentação, mas tal pedido foi indeferido pela Caixa Geral de Aposentações, com o fundamento em não ter base legal para tanto.

Em 15/02/2006 foi publicada a Declaração de Rectificação n.º 10/2006, que rectifica o D.L. n.º 235/05, de 30/12.

Tendo presente a factualidade apurada, com relevo para a situação jurídica do Recorrente, vejamos agora o julgamento de direito, considerando aquela que é a pretensão material requerida em juízo, o reconhecimento do direito do Autor, ora Recorrente, a ser aposentado sem qualquer penalização na pensão, e a condenação da Caixa Geral de Aposentações à prática dos atos necessários à realização desse direito.

Com base na factualidade apurada, relativa à situação de facto do Autor, de imediato se pode afirmar que procedeu a sentença recorrida à análise da pretensão material requerida, em termos que se traduzem num correto enquadramento de direito.

Como enunciado, está em causa saber se assiste o direito ao Autor de ser aposentado sem qualquer penalização, considerando as condições que reunia à data da apresentação do pedido de aposentação, em 22/12/2005, em que contava com 37 anos de serviço e 53 anos de idade.

Tal pretensão não se apresentava tutelada pelo direito à data em que o Autor apresentou o pedido de aposentação e muito menos logo depois, em consequência da alteração legislativa ocorrida, entrada em vigor em 01/01/2006.

Não devem existir dúvidas de que se aplica ao pedido de aposentação do Autor, ora Recorrente, o regime legal que se encontrava em vigor à data da apresentação do pedido, não lhe sendo aplicável as alterações legislativas posteriores, salvo no respeitante a normas de conteúdo transitório.

Porém, assim sendo, ainda assim não assiste razão ao Recorrente quanto ao erro de julgamento de direito que assaca à sentença recorrida, pois à data do pedido embora contasse com 37 anos de serviço, não tinha 55 anos de idade, mas apenas 53 anos.

À data da apresentação do pedido de aposentação vigorava a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, aprovada pelo D.L. n.º 275-A/2000, de 09/11, na sua sétima alteração, introduzida pelo DL n.º 43/2003, de 13/03.

Esse diploma veio a sofrer alterações pelo D.L. n.º 235/05, de 30/12, o qual entrou em vigor em 01/01/2006, em data posterior à da apresentação do pedido de aposentação.

Segundo o D.L. n.º 275-A/2000, de 09/11, na versão em vigor à data da apresentação do requerimento de aposentação pelo Autor, vigorava o seguinte regime em matéria de aposentação:

Aposentação

Artigo 148.º

Passagem à situação de aposentação

1 - O pessoal de investigação criminal que não se encontre provido em comissão de serviço em cargos dirigentes passa à situação de aposentado, se o requerer, quando tenha completado 55 anos de idade, 90 dias depois de apresentado o requerimento.

2 - O disposto no número anterior é aplicável ao pessoal na situação de disponibilidade.”.

Significa que, com base no regime legal aplicável à situação jurídica do Autor, era consentida a aposentação com 55 anos de idade, independentemente do número de anos de serviço prestado.

Ora, o Autor à data do pedido contava apenas com 53 anos de idade, pelo que, é manifesto que não reunia as condições legais para poder ser aposentado sem penalização, como reclama em juízo.

Acresce que tal regime aprovado pelo D.L. n.º 235/05, de 30/12 veio a introduzir uma alteração ao disposto no citado artigo 148.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, passando a prever o seguinte:

1 - O pessoal de investigação criminal, mesmo quando provido em comissão de serviço em cargos dirigentes, passa à situação de aposentado, se o requerer, quando tenha completado 60 anos de idade.”.

O que teve por efeito que a idade da aposentação, a partir de 01/01/2006 deixou de ser aos 55 anos de idade, para passar a ser aos 60 anos.

Nesse sentido, não existe fundamento para convocar a aplicação do regime aprovado pelo D.L. n.º 235/05, de 30/12, não só porque não se encontrava em vigor à data da apresentação do pedido de aposentação pelo Autor, como também o regime transitório que criou exigia e tinha por pressuposto que à data da sua entrada em vigor os interessados reunissem as condições para a aposentação, o que não se verificava no caso do Autor.

É o que decorre do disposto no n.º 1 do artigo 4.º do citado D.L. n.º 235/05, de 30/12, nos termos do qual:

1 – O pessoal da Polícia Judiciária que até 31 de Dezembro de 2005 reúna as condições nesse momento em vigor para requerer a passagem à situação de disponibilidade ou de aposentação pode fazê-lo a qualquer tempo, sendo o requerimento decidido nos termos do regime em vigor até àquela data.” (sublinhado nosso).

Ora, por o Autor não reunir o requisito da idade de 55 anos na vigência da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, na redacção anterior ao D.L. n.º 275-A/2000, de 09/11, não pode beneficiar do seu regime transitório.

Isso mesmo se extrai do disposto do artigo 4.º, n.º 2 do citado D.L. n.º 235/05, de 30/12, na redacção da Declaração de Retificação n.º 10/2006, de 15/02, nos termos do qual, onde a propósito do “Regime transitório”, se deve ler: “Até 31 de Dezembro de 2014, pode ainda requerer a passagem à situação de disponibilidade ou de aposentação o pessoal que complete as idades previstas na tabela anexa ao presente diploma, que dele faz parte integrante, sem que lhe seja aplicável o regime previsto nos artigos 147.º, 147.º-A e 148.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, na redacção introduzida pelo presente diploma.”.

Mais se retifica a Tabela anexa a que se refere o n.º 2 do artigo 4.º, sob a menção de se referir ao “Regime transitório de aposentação e de acesso ao regime de…”.

No caso do Recorrente não se coloca a questão da falta do tempo de serviço, ao qual se aplica o disposto no n.º 1 do artigo 87.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, que prevê o acréscimo de 20% na contagem do tempo serviço, mas apenas a falta do número de anos de idade, por o Autor não possuir 55 anos à data do pedido de aposentação.

Nestes termos, carece de fundamento a censura contra a sentença recorrida, pois o Autor não reunia o requisito do número de anos de idade à data da apresentação do pedido de aposentação, nem antes da alteração ocorrida à Lei Orgânica da Polícia Judiciária, entrada em vigor em 01/01/2006, nem depois, da entrada em vigor do novo regime de aposentação.

No demais, o Autor apenas se poderia aposentar nos termos do regime geral, previsto no Estatuto da Aposentação, para a aposentação antecipada, com as condições previstas no disposto no seu artigo 37.º-A, em vigor à data da apresentação do pedido, que permitia a aposentação com 36 anos de serviço, mas com uma redução no quantum da pensão.

Nestes termos, é totalmente infundado o presente recurso, por o Autor à data do pedido de aposentação não ter 55 anos de idade, o que só por si afasta a possibilidade de ser aposentado ao abrigo do n.º 1 do artigo 148.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, na redacção anterior ao D.L. n.º 235/2005, de 30/12.

Pelo que, será de negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos.


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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. Aplicam-se às condições da aposentação o regime legal que estiver em vigor à data da apresentação do pedido, não lhe sendo aplicável as alterações legislativas posteriores, salvo no respeitante a normas de conteúdo transitório.

II. À data da apresentação do pedido de aposentação vigorava a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, aprovada pelo D.L. n.º 275-A/2000, de 09/11, na sua sétima alteração, introduzida pelo DL n.º 43/2003, de 13/03, que previa no seu artigo 148.º, n.º 1, que o requerente tivesse completado 55 anos de idade.

III. Com base nesse regime era consentida a aposentação, sem penalização, com 55 anos de idade, independentemente do número de anos de serviço prestado.

IV. Esse diploma veio a sofrer alterações pelo D.L. n.º 235/05, de 30/12, (passando a prever 60 anos de idade), o qual entrou em vigor em 01/01/2006, o qual por ser em data posterior à da apresentação do pedido de aposentação, não é aplicável.

V. Não reunindo o Autor o requisito de 55 anos de idade à data do pedido, não se poderia aposentar sem penalização, nem antes, nem depois da entrada em vigor do D.L. n.º 235/05, de 30/12, mas apenas nos termos do regime geral da aposentação antecipada, previsto no artigo 37.º-A do Estatuto da Aposentação, na redacção em vigor à data da apresentação do pedido, que permitia a aposentação com 36 anos de serviço, mas com uma redução no quantum da pensão.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos e em manter a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Registe e notifique.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Helena Canelas)

(António Vasconcelos)