Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12072/15
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:05/28/2015
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL – ENTIDADE A DEMANDAR – CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
Sumário:I – Numa ação administrativa especial em que esteja em causa ato do «órgão de gestão do programa operacional factores de competitividade» deve ser demandado o Ministério em que o mesmo se integrava (o Ministério da Economia e do Emprego - cfr. Decreto-Lei n.º 54-A/2000, de 7 de abril, Resolução do Conselho de Ministros n.º 27/2000, de 16 de maio, na Resolução do Conselho de Ministros n.º 58/2002, de 15 de julho e Resolução de Conselho de Ministros n.º 101/2003, de 8 de agosto) e não o Estado Português.

II – A possibilidade de o juiz providenciar, mesmo oficiosamente, pelo suprimento de pressuposto processuais, a que aludia o nº 2 do artigo 265º do CPC antigo, a que corresponde, grosso modo, ao nº 2 do artigo 6º do atual CPC (aprovado pela Lei nº 41/2013), depende desde logo de se estar perante pressuposto processual suscetível de sanação.

III – Na falta de disposição diversa prevista para o contencioso administrativo deve neste também valer tal princípio regra. O que deve valer igualmente para o que se encontra disposto no artigo 88º CPTA, no âmbito da ação administrativa especial, de modo que só perante exceção dilatória suprível, nos termos legalmente previstos, pode haver lugar a convite à sua supressão (cfr. nº 2 do artigo 88º do CPTA).

IV – Tendo a autora expressamente indicado como demandado o Estado Português, resultando ter sido essa a sua vontade, e não ocorrendo imprecisão na identificação da parte demandada, não se justifica um convite ao aperfeiçoamento da petição inicial para melhor explicitação de quem é que a autora pretendia efetivamente demandar.

V – À luz do disposto no nº 2 do artigo 89º do CPTA quando não tenha sido feito convite ao aperfeiçoamento de petição inicial de ação administrativa especial, com supressão da exceção dilatória, por a mesma não ser suprível, e o Tribunal se tenha abstido, com tal fundamento, de conhecer do mérito da ação, dela absolvendo o demando, sempre pode o autor apresentar nova petição (agora com observância das prescrições em falta), considerando-se esta apresentada na data em que o tinha sido a primeira para efeitos da tempestividade da sua apresentação. Assegurando-se assim, por esta via, a tutela jurisdicional efetiva constitucionalmente consagrada.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. RELATÓRIO

S…….. – G……… E………., Lda. (devidamente identificada nos autos), autora na Ação Administrativa Especial (Proc. nº 200/10.5BELRA) que instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria inconformada com a decisão proferida no despacho-saneador de 07/03/2014 pelo Mmº Juiz daquele Tribunal, mantida por Acórdão de 24/11/2014 do mesmo Tribunal pela qual, julgando-se procedente a exceção dilatória de ilegitimidade do demandado Estado Português, foi o mesmo absolvido da instância, vem interpor o presente recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida, com sua substituição por outra que a convide a aperfeiçoar a sua Petição Inicial ou que julgue a ação regularmente proposta nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10º nº 4 do CPTA.

Nas suas alegações a aqui Recorrente formula as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1. O Douto Tribunal julgou verificada a exceção dilatória de ilegitimidade passiva do Estado Português por entender que o Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático de Competitividade é uma estrutura temporária do (atual) Ministério da Economia e, como tal, conclui que a legitimidade passiva na presente ação pertence ao aludido Ministério e não ao Estado Português.

2. A Recorrente, tal como faz alusão na sua Petição Inicial, não foi notificada da decisão de não elegibilidade que determinou a presente demanda, somente dela tomou conhecimento via consulta do site digital web disponível na Internet,

3. Tal facto impede que a Recorrente consiga, com rigor, identificar qual a entidade de que depende o Autor do Ato, já que, quanto a este, conforme se extrai da petição, designadamente do seu introito, a Recorrente o identificou corretamente.

4. Da análise da Portaria 1464/2007 de 15.11, que disciplina o Concurso e que determina como entidade decisória o Órgão de Gestão, resulta que a mesma foi produzida pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e pelo Ministério da Economia e da Inovação, razão pela qual,

5. Não era possível concluir que tal órgão (de Gestão do Programa) estivesse inserido na orgânica de qualquer um dos sobreditos Ministérios, deixando claro que não poderia a Ação ter sido proposta contra qualquer um deles.

6. Como se disse na PI. e resulta da decisão ora em crise, o órgão decisório que produziu o ato administrativo impugnado assume a natureza de Estrutura de Missão nos termos do disposto no art. 28.º/1 da L 4/2004 de 15.01 (cfr. art. 44.º/1 e 3 e art. 31.º/3 do DL 312/2007 de 17.09), e esse mesmo órgão decisório e inerente estrutura de missão foram criados por Resolução do Conselho de Ministros (cfr. art. 44.º/3 do DL 312/2007 de 17.09).

7. A dita estrutura de missão, por força do disposto art. 28.º/1 e 4 da Lei 4/2004 de 15.01, sempre decorreu de Resolução do Conselho de Ministros e não de um ato de um qualquer Ministério isolado,

8. Acresce ainda que, do aludido DL 312/2007 de 17.09, resulta a criação das Comissões Ministeriais de Coordenação dos PO (cfr. art.º 40.º), sendo que, relativamente aos Fatores de Competitividade a comissão integra: Ministro da Economia e da Inovação, que coordena, Ministro da Presidência, Ministro da Justiça, e Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (cfr. n.º 2 al. b)),

9. Razão pela qual, igualmente do exposto, não é possível aferir a que Ministério tal estrutura temporária pertence, entendendo a recorrente não poder ser o demandado Estado Português absolvido da instância por não ser parte legítima nos presentes autos, denotador de erro de julgamento na aplicação do Direito legal aplicável aos factos.

10. Por força do que no quadro do art. 88.º do CPTA se determina e impõe ao julgador, em sede do dever de conhecer obrigatoriamente de «todas as questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo», do mesmo ressalta, em decorrência do princípio da cooperação processual (arts. 08.º CPTA e 265.º CPC/07 - atuais arts. 06.º e 411.º do CPC/2013), a existência dum dever de providenciar pela prévia correção dos articulados e do suprimento das exceções dilatórias.

11. Na verdade, admite-se no art. 88.º do CPTA não apenas a correção oficiosa de deficiências ou irregularidades de caráter formal de que as peças processuais eventualmente padeçam mas também o suprimento de exceções dilatórias e de irregularidades dos articulados ainda que com anulação de atos processuais caso não possam ser aproveitados, no que configura regime de regularização mais amplo que aquele que se mostrava previsto na LPTA (cfr. seu art.40º).

12. Configura tal despacho de aperfeiçoamento um convite que o julgador dirige à parte ativa para que esta supra ou corrija o vício de que padeça o articulado inicial em termos de assim se assegurar o prosseguimento do processo.

13. Estando em questão exceção dilatória o seu suprimento e possibilidade de correção na sequência de convite está dependente do facto do vício que as gera não inviabilizar a substituição da petição inicial.

14. Com efeito, o convite não será admissível e como tal haverá proferimento de decisão de absolvição da instância quando estejamos em presença da exceção dilatória insuprível que não consente a renovação da instância (v.g., a inimpugnabilidade do ato, a ineptidão da petição inicial, a caducidade do direito ele ação, a litispendência, o caso julgado).

15. Ora para além das enunciadas exemplificativamente no art. 89.º, nº 3 CPTA contam-se, nomeadamente, entre as situações passíveis de suprimento ou correção a ilegitimidade passiva do demandado, a coligação ilegal, a falta de identificação dos contra-interessados em preterição de litisconsórcio necessário passivo e a cumulação ilegal pretensões (cfr. art. 89.º mº 1, als. D), e), f) e g) do CPTA) (vide M. Aroso Almeida e Carlos A. Fernandes Cadilha in: ob. Cit, págs, 584/585).

16. Atente-se, ainda, que a regularização da instância neste quadro não está dependente de qualquer juízo sobre a desculpabilidade ou não do erro cometido.

17. Daí que na situação vertente impunha-se ao julgador “a quo” que tivesse formulado, previamente à emissão da decisão de absolvição da instância nos termos em que veio a ocorrer, convite dirigido à A. no sentido desta vir a suprir a exceção através da apresentação de nova petição inicial dirigida ao ente administrativo dotado de efetiva legitimidade passiva, aperfeiçoando dessa forma aquele articulado.

18. Não o tendo feito incorreu também aqui em erro de julgamento com consequente revogação da decisão judicial em crise.

19. Assim, salvo melhor e Douta Opinião, entende-se que mal andou o Douto Tribunal ao proferir saneador-Sentença sem convidar a Recorrente a aperfeiçoar a sua Petição, tanto mais que, o facto de Ministério e Estado Português terem representação (em juízo) diferente nada interfere com este entendimento.

20. Acresce ainda que a demandante e aqui Recorrente não deixou de fazer abundante indicação, na propositura da Ação, à entidade que praticou o ato decisório impugnado, o que sempre permitiria ao Tribunal convolar qualquer possível ilegitimidade.

21. Assim, Entendendo o Douto Tribunal que parte legítima seria o Ministério da Economia, sempre haveria que convolar a petição, tendo por parte passiva tal Ministério em que se considere integrado o órgão de gestão a quem se apresentou a pretensão administrativa, que praticou o ato e que se indicou na peça processual.

22. O que se impunha, razão pela qual deverá ser o Douto Despacho Saneador revogado e, substituído por outro que, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 4 do art.º 10.º do CPTA, considere a ação regularmente proposta, seguindo os demais trâmites até final.


O Recorrido Estado Português contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida.
Concluiu as suas contra-alegações formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1. Assumindo, o órgão decisório que produziu o ato administrativo, objeto de impugnação na presente ação, Órgão de Gestão do Programa Operacional (OGPO), natureza de Estrutura de Missão, que se encontra sob da tutela e integrado no atual Ministério da Economia, é esse Ministério que detém legitimidade passiva para a ação e não o Estado, contra quem foi intentada;

2. Tal irregularidade apenas deverá ser sanada quando ocorra um erro na identificação de órgão da pessoa coletiva e mesmo um erro na identificação da pessoa coletiva, e não em casos em que o autor demanda a parte que convictamente quer ver chamada, como sucedeu na vertente situação;

3. Como, em caso de desconhecimento dos ministérios, a que pertencem os órgãos, autores dos atos a impugnar, não poderá implicar uma competência residual do Estado, enquanto pessoa jurídica, pois só através dos respetivos órgãos o Estado poderá proceder;

4. No caso de ilegitimidade singular, em que o sujeito da relação jurídica processual não é titular de qualquer interesse em conflito, ela é insanável;

5. Donde, nenhuma censura merece, a nosso ver, a decisão recorrida já que aplicou acertada e criteriosamente as atinentes normas legais à situação em apreço, devendo a mesma ser mantida.


Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.


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2. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO (das questões a decidir)
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho), ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, a questão a decidir é a de saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, ao julgar verificada a exceção dilatória de ilegitimidade passiva do demandado Estado Português, e se deve a mesma ser revogada e substituída por outra que a convide a aperfeiçoar a sua Petição Inicial nos termos dos artigos 8º, 88º, 89º nº 3 do CPTA e artigo 6º e 411º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), ou que julgue a ação regularmente proposta nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10º nº 4 do CPTA.

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3. FUNDAMENTAÇÃO
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Da decisão recorrida
Julgando procedente a exceção dilatória de ilegitimidade do demandado Estado Português, foi o mesmo absolvido da instância nos termos da decisão proferida no despacho-saneador de 07/03/2014 (prolatado pelo Mmº Juiz relator) mantida, após reclamação para a conferência, pelo Acórdão de 24/11/2014 daquele Tribunal.
Decisão que se suportou na seguinte fundamentação, ali assim vertida, que se transcreve:
Vejamos.
A questão de saber qual é a entidade que deve ser indicada como ré ou demandada numa ação administrativa é, as mais das vezes, encarada como sendo exclusivamente reportada a um problema de legitimidade processual passiva. Isto porque é desde logo o próprio artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos que, sob a epígrafe «legitimidade passiva», estabelece quais os critérios que permitem determinar qual a entidade pública a demandar.
Mas a epígrafe do artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é enganadora. Na verdade, este preceito não consagra, em exclusivo, o critério de determinação da legitimidade passiva; também consagra, outrossim, os critérios de atribuição da personalidade judiciária às entidades públicas (VIEIRA DE A NDRADE, 2006: 298-299; PEREIRA DA SILV A, 2005: 25 0 e passim; FERNANDES CADILHA, 2006: 353; MEALHA, 2010: 6-7 ). Isso mesmo
se deixa, desde já, estabelecido.
Tendo em vista o ponto de partida previamente fixado, importa agora, antes de mais, enunciar os escopos visados, nesta sede, pelo legislador do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Assim, em primeiro lugar, realça-se que a alteração do critério de determinação do ente público a demandar foi, antes de mais, uma solução dirigida a promover o acesso à justiça administrativa (FREITAS DO A MARAL & A ROSO DE A LMEIDA, 2002: 77), ditada pela necessidade de adequação desse critério ao novo princípio da livre cumulação de pedidos previsto no artigo 4.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Além disso, o regime introduzido pelo artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos resulta de uma nova conceção de todo o processo administrativo (e, em especial, dos meios impugnatórios), como verdadeiro «processo de partes» (VIEIRA DE ANDRADE, 2006: 299), com o consequente abandono da distinção entre «ações», onde o demando era a pessoa coletiva pública, e «recursos contenciosos», onde quem defendia a legalidade do ato impugnado era o próprio órgão que o praticara (MEALH A , 201 0: 6).
Finalmente, as regras inovatórias introduzidas no artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos visaram, além do mais, resolver o problema do erro na identificação do autor do ato recorrido que, durante a vigência da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA), constituiu com frequência um obstáculo ao conhecimento de mérito. Nesse sentido é esclarecedor, de resto, o próprio teor do n.º 4 da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 92/VIII, que esteve, como é consabido, na origem da Lei n.º 1 5 /2002, de 22 de fevereiro, que aprovou o Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Tendo estes três escopos em vista, percebe-se a solução plasmada no n.º 2 do artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no qual se estabelece um novo critério de determinação da entidade pública demandada: o réu nas ações administrativas que tenham por objeto ações ou omissões de uma entidade pública deixou de ser o órgão autor do ato recorrido (como acontecia no antigo recurso contencioso de anulação e na ação para reconhecimento do direito ou interesse legítimo) e passou a ser a pessoa coletiva de direito público ou o ministério, quando esteja em causa a pessoa coletiva Estado.
Posto isto, recuperemos então o teor do artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, segundo o qual «[c]ada ação deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor» (n.º 1 ), acrescentando ainda que «[q]uando a ação tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é a pessoa coletiva de direito público, ou, no caso do Estado, o Ministério a cujos órgãos seja imputável o ato jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os atos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos » (n.º 2) — sublinhado s nossos. Por seu turno, de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo, «[o]s processos que tenham por objeto atos ou omissões de entidade administrativa independente, destituída de personalidade jurídica, são intentados contra o Estado ou a outra pessoa coletiva de direito público a que essa entidade pertença».
Como explica a doutrina, «[e]ste interesse pessoal – tanto o interesse em demandar como o interesse em contradizer – tem [de] ser um interesse direto, pois as vantagens ou utilidades ou, por outro lado, as desvantagens ou as perdas repercutem -se invariavelmente na esfera jurídico -patrimonial de quem está a litigar como autor ou como réu . Há, assim, necessidade de a ação correr entre as pessoas que não são estranhas à situação jurídica controvertida, v isto que, somente dessa maneira a sentença resolve definitivamente o litígio, impedindo, tanto quanto possível, que volte a discutir –se a mesma questão» (REMÉDIO MA RQUES , 2009: 35 9) — sublinhados nossos.
O ato impugnado nos presentes autos é o despacho do Órgão de Gestão do Programa Operacional Fatores de Competitividade, de 04.09.2009, que apreciou a candidatura da autora ao Sistema de Incentivos à Inovação.
Deste modo, a apreciação da legitimidade passiva envolve a apreciação da natureza jurídica do Gestor do Programa. Para tanto, torna-se mister atender ao quadro normativo à data vigente, e que decorre dos seguintes preceitos normativos:
× artigos 30.º e ss., 40.º e ss., 57 .º, 5 8.º, 60.º e ss., todos do Decreto-Lei n.º 312/07, de 1 7 de setembro (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 7 4/08, de 22 de abril, e pelo Decreto -Lei n.º 99/09, de 28 de abril) — diploma que define o modelo de governação do QREN;
× artigo 25 .º, n.os 1 e 4 do Decreto-Lei n.º 5 4—A /2000, de 7 de abril;
× artigos 8.º a 1 0.º do Decreto Regulamentar n.º 84—A /07 , de 1 0 de dezembro, diploma que contém o regime jurídico de gestão, acesso e financiamento no âmbito dos programas operacionais financiados pelo FSE;
× artigos 5 .º e 7 .º do Decreto Regulamentar n.º 1 2—A /2000, de 1 5 de setembro, entretanto revogado pelo Decreto Regulamentar n.º 84 —A/07 , aludido supra, e mantendo vigência condicionada;
× artigos 5 .º, e 20.º a 24.º da Portaria n.º 7 99-B/2000, de 20 de dezembro, também revogado pelo Decreto Regulamentar n.º 84—A /07 e com vigência condicionada);
× artigos 1 .º e 2.º do Decreto-Lei n.º 1 40/07 , de 27 de abril, diploma que veio definir nova orgânica e atribuições aos IAPMEI em articulação com os respetivos Estatutos, publicados em anexo à Portaria n.º 5 38/07 , de 30 de Abril;
× Resolução do Conselho Ministros n.º 1 62/07, de 12 de outubro, que criou as estruturas de missão responsáveis pelo exercício das funções de autoridade de gestão dos programas operacionais;
× Resolução do Conselho Ministros n.º 25 /08, de 13 de fevereiro, e seu Anexo II (que veio aprovar a configuração definitiva das referidas estruturas de missão de forma a garantir uma gestão e execução dos programas operacionais eficiente e eficaz).

Ora, do cotejo dos preceitos normativos citados, temos que, no essencial e no que releva, a gestão técnica, administrativa e financeira de cada uma das intervenções operacionais sectoriais incluídas no então «QCA III» e no atual «QREN» incumbe a um Gestor, o qual constitui autoridade de gestão nos termos e para os efeitos do anterior Regulamento (CE) n.º 1 260/99 e atual Regulamento (CE) n.º 1 083/06. É esse mesmo Gestor que lidera e gere uma estrutura de missão a cujo secretariado técnico «que integra a autoridade de gestão do PO Fatores de Competitividade compete desempenhar as funções que lhe forem conferidas pelo gestor do ¯PO […]» e em que o «apoio logístico e administrativo à autoridade de gestão do PO Fatores de Competitividade é assegurado pelo Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas do Ministério da Economia e da Inovação […]», entidade esta que é configurada e qualificada como instituto público integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio e que prossegue atribuições do Ministério da Economia e do Emprego sob superintendência e tutela do respetivo ministro — cf. artigos 1.º do Decreto-Lei n.º 140/2007, e 5 .º, n.º 1 , al. a) do Decreto-Lei n.º 126-C/2011, de 29 de dezembro.
Vejamos agora em termos sumários o enquadramento jurídico, sincrónico e diacrónico, que informa o Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático dos Fatores de Competitividade.
O Gabinete de Gestão do PRIME foi criado nos termos previstos no artigo 25 .º do Decreto -Lei n.º 54-A/2000, de 7 de abril, e no artigo 9.º do Anexo à Resolução de Conselho de Ministros n.º 101/2003, de 8 de agosto, sendo-lhe atribuído o estatuto de encarregado de missão, junto do Ministério da Economia, nos termos do artigo 37 .º da Lei n.º 49/99, de 22 de junho. Tal estrutura tinha à data dos factos a designação de COMPETE - Programa Operacional Fatores de Competitividade.
Significa isto que o COMPETE tem a natureza jurídica de estrutura de missão.
As estruturas de missão encontram -se previstas no artigo 28.º da Lei n.º 4/2004, de 15 de janeiro, a qual estabelece os princípios e normas a que deve obedecer a organização da administração direta do Estado. Decorre da citada norma, conjugada com o artigo 4.º, a contrario sensu, da Lei n.º 4/2004, de 15 de janeiro, que as estruturas de missão, por serem estruturas temporárias dos ministérios criadas para a prossecução de missões que não possam, fundamentadamente, ser desenvolvidas pelos serviços existentes, não estão definidas nas leis orgânicas de cada ministério, sendo criadas por resoluções do Conselho de Ministros (in casu, pela Resolução de Ministro s n.º 1 01 /2003, de 8 de agosto ).
A estrutura de missão corresponde, portanto, à instituição de um órgão administrativo ad hoc, não inserido na estrutura orgânica normal dos departamentos ministeriais e de carácter não permanente. A característica distintiva fundamental da estrutura de missão é o seu carácter temporário e não integrado nas estruturas tradicionais dos departamentos ministeriais. Tirando essa particularidade, a estrutura de missão pertence, em sentido material e orgânico, à administração direta do Estado. Não é administração indireta, nem administração autónoma, nem exercício privado de funções materialmente administrativas.
Efetivamente, o problema da vida administrativa a que se responde com este instrumento é o de executar tarefas cuja transversalidade, interdisciplinaridade ou conveniência de gestão integrada desaconselhem cometê-las às estruturas administrativas formais e permanentes. Procura-se, simplesmente, uma adequação da estrutura organizativa dos ministérios a uma tarefa temporária específica; já não a adequação da distribuição dos poderes administrativos por forma a regular certos sectores sensíveis evitando a intervenção governamental direta, como sucede, por exemplo, com a instituição de autoridades administrativas independentes.
Do exposto é possível concluir que as estruturas de missão pertencem à administração direta do Estado.
Neste sentido se tem pronunciado o órgão de cúpula desta jurisdição. Hoc sensu, vide, inter alia, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 04.06.2003 (Pleno), proferido no processo n.º 0905/02, e de 06.07.2004, proferido no processo n.º 01 340/03, ambos integralmente disponíveis para consulta em http:/ / www.dgsi.pt/ jsta.
No primeiro dos arestos aludidos, deixou-se consignado em sede de fundamentação fáctico -jurídica, no que interessa apurara com relevância para a economia do presente despacho, o seguinte: «[o] primeiro e decisivo elemento a reter destas disposições legais é que os gestores de programas do QCA , embora com um quadro de competências próprias, têm o estatuto de encarregados de missão, aplicando-se-lhes o regime previsto no regime jurídico dos cargos dirigentes, que constava, ao tempo da publicação do diploma, […]do art.º 37 ° da Lei n.º 49/99 , de 22 de Junho. […]
» Pela sua natureza não permanente, a posição do órgão na cadeia hierárquica não tem de ser espelhada na estrutura orgânica do Ministério respetivo. Seria mesmo ignorar essa natureza ou a função das leis orgânicas colocar no organigrama do Ministério um órgão desta espécie, como órgão de linha. É no regime jurídico dos encarregados de missão, que é o estatuto fundamental dos gestores de programas, e não nas leis orgânicas do Ministério, que há -de buscar-se a resposta para a existência ou não de relação de hierarquia. […]
» Com a estrutura de projeto e a administração de missão acolheu-se uma solução organizativa já experimentada noutros sistemas administrativos da mesma matriz (v g. em França; cfr. JEAN RIVERO, Direito Administrativo, 1981, trad. Rogério Soares, pag. 382) que consiste em, a par dos órgãos dirigentes dos departamentos estruturais dos Ministérios, encarregados de forma contínua da gestão dos serviços, confiar a grupos pouco numerosos de agentes de alta qualidade missões, limitadas no tempo em função do cumprimento de um certo objetivo, que se sobrepõem às atribuições de vários serviços ou exigem integração ou afetação especial de meios.
» A característica distintiva fundamental da administração de missão é o seu carácter temporário e não integrado nas estruturas tradicionais dos departamentos ministeriais. Fora isso, a estrutura de missão ou de projeto pertence, em sentido material e orgânico, à administração direta do Estado. Não é administração indireta, nem administração autónoma, nem exercício privado de funções materialmente administrativas.
» Seja ou não recrutado de entre pessoal dirigente e seja qual for a natureza do vínculo – as tarefas de administração de missão podem ser cometidas a já titulares de cargos dirigentes, a outros altos funcionários ou a cidadãos de reconhecido mérito — o encarregado de missão não fica, com essa nomeação, constituído em entidade administrativa independente. É, apenas, o chefe ou o dirigente da respetiva estrutura de projeto e, como tal, desempenha funções "Junto dos membros do Governo interessados" […]. Prossegue as atribuições do respetivo Ministério, com as competências que lhe forem endossadas na respetiva "carta de missão", sujeito ao poder de direção e supervisão, que é o essencial da hierarquia. Não deixa de haver hierarquia por faltarem outros poderes que normalmente a integram, designadamente o poder disciplinar substituído por uma medida estatutária de cessação de funções.
» E nenhuma razão, seja no texto da lei, seja na razão de ser da consagração legal da figura, justifica que a natureza dos poderes dos dirigentes investidos em administração de missão seja, na articulação com os poderes do respetivo membro do Governo, diversa daquela que a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo considera ser a que corresponde aos dirigentes da administração de gestão […]».
Do exposto decorre que o Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático de Competitividade, para efeitos de aplicação dos critérios de apuramento da legitimidade processual passiva, não é uma pessoa coletiva de direito público, nem uma entidade administrativa independente.
Logo, no caso dos presentes autos a legitimidade passiva não se afere pelo n.º 3 do artigo 10.º, mas sim pelo n.º 2 do aludido artigo, o qual dispõe que no caso do Estado deve ser demandado o ministério ao qual o órgão pertence. Deste modo, há que apurar em que ministério se insere o Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático de Competitividade.
Ora, como se deixou estabelecido adrede, esse ministério era, à altura dos factos, o Ministério da Economia e do Emprego – cf. Decreto -Lei n.º 54-A/2000, de 7 de abril, Resolução do Conselho de Ministros n.º 27 /2000, de 16 de maio, na Resolução do Conselho de Ministros n.º 58/2002, de 15 de julho e Resolução de Conselho de Ministros n.º 101/2003, de 8 de agosto .
Tudo v isto e sopesado, conclui-se que o Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático de Competitividade é uma estrutura temporária do (atual) Ministério da Economia (cf. Decreto-Lei n.º 1 19/201 3, de 21 de agosto), pelo que a legitimidade passiva na presente ação pertence ao aludido Ministério, e não ao Estado português.
A ilegitimidade processual é uma exceção dilatória nominada [alínea d) do n.º 1 do artigo 89.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos], que tem de ser conhecida, no âmbito da ação administrativa especial, necessariamente no despacho saneador (cf. n.º 2 do artigo 87.º do mesmo diploma), insuprível, quando singular, cuja verificação obsta ao conhecimento do mérito da causa e que importa a absolvição da instância – cf. artigos 278.º, 571.º, 576.º e 577.º, alínea e), do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi artigo 1 .º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Em face do exposto, julgando procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva da entidade demandada, impõe -se absolvê-la da instância. Isso mesmo se determinará a final, na parte dispositiva do presente despacho.»

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Da tese do recorrente
Pugna a recorrente pela revogação da decisão recorrida, com sua substituição por outra que a convide a aperfeiçoar a sua Petição Inicial nos termos dos artigos 8º, 88º, 89º nº 3 do CPTA e artigo 6º e 411º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), ou que julgue a ação regularmente proposta nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10º nº 4 do CPTA.
Sustenta para tanto que tal como fez alusão na sua Petição Inicial, não foi notificada da decisão de não elegibilidade que determinou a instauração da ação, tendo dela apenas tomado conhecimento através de consulta do site digital web disponível na Internet; que tal facto impediu que conseguisse identificar, com rigor, qual a entidade de que depende o autor do ato impugnado, já que, quanto a este, conforme se extrai da petição, designadamente do seu introito, o identificou ali corretamente; que da análise da Portaria 1464/2007 de 15.11, que disciplina o Concurso e que determina como entidade decisória o Órgão de Gestão, resulta que a mesma foi produzida pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e pelo Ministério da Economia e da Inovação, razão pela qual não era possível concluir que tal órgão (de Gestão do Programa) estivesse inserido na orgânica de qualquer um dos sobreditos Ministérios, deixando claro que não poderia a ação ter sido proposta contra qualquer um deles; que tal como disse na Petição Inicial e resulta do decidido pelo Tribunal a quo, o órgão decisório que produziu o ato administrativo impugnado assume a natureza de Estrutura de Missão nos termos do disposto no art. 28.º/1 da L 4/2004 de 15.01 (cfr. art. 44.º/1 e 3 e art. 31.º/3 do DL 312/2007 de 17.09), e esse mesmo órgão decisório e inerente estrutura de missão foram criados por Resolução do Conselho de Ministros (cfr. art. 44.º/3 do DL 312/2007 de 17.09); que a dita estrutura de missão, por força do disposto art. 28.º/1 e 4 da Lei 4/2004 de 15.01, sempre decorreu de Resolução do Conselho de Ministros e não de um ato de um qualquer Ministério isolado; que do aludido DL nº 312/2007 de 17.09, resulta a criação das Comissões Ministeriais de Coordenação dos PO (cfr. art.º 40.º), sendo que, relativamente aos Fatores de Competitividade a comissão integra: Ministro da Economia e da Inovação, que coordena, Ministro da Presidência, Ministro da Justiça, e Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (cfr. n.º 2 al. b)), razões que invoca para sustentar que não é possível aferir a que Ministério tal estrutura temporária pertence, e que por tal motivo não pode ser o demandado Estado Português absolvido da instância com fundamento na sua ilegitimidade, e que ao tê-lo decidido o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na aplicação do Direito legal aplicável aos factos.
Invoca ainda que por força do que no quadro do artigo 88º do CPTA tem o julgador o dever de conhecer obrigatoriamente de «todas as questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo», e que em decorrência do princípio da cooperação processual (cfr. arts. 8º CPTA e 265º CPC/07 - atuais arts. 06.º e 411.º do CPC/2013), a existência dum dever de providenciar pela prévia correção dos articulados e do suprimento das exceções dilatórias; que no artigo 88º do CPTA admite-se não apenas a correção oficiosa de deficiências ou irregularidades de caráter formal de que as peças processuais eventualmente padeçam mas também o suprimento de exceções dilatórias e de irregularidades dos articulados ainda que com anulação de atos processuais caso não possam ser aproveitados, no que configura regime de regularização mais amplo que aquele que se mostrava previsto na LPTA (cfr. seu art.40º); que configura tal despacho de aperfeiçoamento um convite que o julgador dirige à parte ativa para que esta supra ou corrija o vício de que padeça o articulado inicial em termos de assim se assegurar o prosseguimento do processo; que estando em questão exceção dilatória o seu suprimento e possibilidade de correção na sequência de convite está dependente do facto do vício que as gera não inviabilizar a substituição da petição inicial; que o convite não será admissível e como tal haverá proferimento de decisão de absolvição da instância quando estejamos em presença da exceção dilatória insuprível que não consente a renovação da instância (v.g., a inimpugnabilidade do ato, a ineptidão da petição inicial, a caducidade do direito ele ação, a litispendência, o caso julgado) mas que para além das enunciadas exemplificativamente no art. 89.º, nº 3 CPTA contam-se, nomeadamente, entre as situações passíveis de suprimento ou correção a ilegitimidade passiva do demandado, a coligação ilegal, a falta de identificação dos contra-interessados em preterição de litisconsórcio necessário passivo e a cumulação ilegal pretensões (cfr. art. 89.º nº 1, als. D), e), f) e g) do CPTA); que a regularização da instância neste quadro não está dependente de qualquer juízo sobre a desculpabilidade ou não do erro cometido e que assim na situação vertente se impunha ao Tribunal a quo que tivesse formulado, previamente à emissão da decisão de absolvição da instância nos termos em que veio a ocorrer, convite dirigido à autora no sentido desta vir a suprir a exceção através da apresentação de nova petição inicial dirigida ao ente administrativo dotado de efetiva legitimidade passiva, aperfeiçoando dessa forma aquele articulado, e que não o tendo feito incorreu também aqui em erro de julgamento.
Defende, por último, que não deixou de fazer abundante indicação, na Petição Inicial pela qual propôs a ação, à entidade que praticou o ato decisório impugnado, o que sempre permitiria ao Tribunal convolar qualquer possível ilegitimidade; que assim, entendendo o Tribunal que parte legítima seria o Ministério da Economia, sempre haveria que convolar a petição, tendo por parte passiva tal Ministério em que se considere integrado o órgão de gestão a quem se apresentou a pretensão administrativa, que praticou o ato e que se indicou na peça processual; o que se impunha, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 4 do art.º 10.º do CPTA, considerando-se a ação regularmente proposta, seguindo a mesma os seus demais trâmites até final.
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Da análise e apreciação das questões a decidir
Na situação dos autos temos que a recorrente instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria através da Petição Inicial remetida àquele Tribunal em 26/01/2010 (cfr. fls. 1 ss.) uma ação administrativa especial visando a impugnação de ato administrativo (como expressamente nela indicou), formulando a final o seguinte pedido nos seguintes termos:
«Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve ser:
a) Anulado o Ato Administrativo ora Impugnado (Decisão de Ineligibilidade da demandante);
b) Condenado o Estado Português (órgão de Gestão do Programa Operacional Factores de Competitividade) a reconhecer a demandante como elegível para o Programa Operacional Factores de Competitividade relativo ao Aviso de Concurso 19/2008 SI Inovação (Geral), seguindo-se o procedimento de atribuição e contratualização do Incentivo, nos termos legais;
Tudo com as legais consequências.»

Alegou na Petição Inicial que apresentou candidatura perante os Órgãos de Gestão no âmbito do Concurso ao Sistema de Incentivos à Inovação aberto pelo Aviso nº 19/SI/2008 (tendo juntado, sob Docs. nºs 1 e 2, respetivos documentos de prova); que os órgãos de gestão propuseram decisão de não-elegibilidade (que juntou sob Doc. nº 3) a que respondeu (através do Doc. nº 4 que juntou com a Petição Inicial) e que não tenso sido acolhidos os seus argumentos, foi a sua candidatura considerada não-elegível, negando-se (através da decisão que juntou sob Doc. nº 5 com a Petição Inicial) apoio ao plano de investimentos apresentado, não prosseguindo o procedimento de concessão e contratualização do apoio. É, pois, esta a decisão impugnada na ação administrativa especial, que se mostra vertida no Doc. nº 5 junto pela autora com a Petição Inicial (que verteu no artigo 6º daquele seu articulado): a decisão de não-elegibilidade da candidatura da autora, aqui recorrente, ao identificado sistema de incentivos.
Sucede que a autora, aqui recorrente, procedeu na sua Petição Inicial, à identificação do réu/demandado na ação administrativa especial do seguinte modo:

Não há dúvida, nem é objeto de controvérsia, que o meio processual de que a autora lançou mão – a ação administrativa especial – é o adequado em face do objeto da ação, à luz do disposto no artigo 46º do CPTA, de acordo com o qual seguem a forma da ação administrativa especial “os processos cujo objeto sejam pretensões emergentes da prática ou omissão ilegal de atos administrativos, bem como de normas que tenham ou devessem ter sido emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo” (nº 1), nelas se abarcando as seguintes pretensões (nº 2):
“a) Anulação de um ato administrativo ou declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica;
b) Condenação à prática de um ato administrativo legalmente devido;
c) Declaração da ilegalidade de uma norma emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo;
d) Declaração da ilegalidade da não emanação de uma norma que devesse ter sido emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo.

De harmonia com o disposto no artigo 78º nº 2 do CPTA na petição inicial da ação administrativa especial “deve o autor:
a) Designar o tribunal em que a ação é proposta;
b) Indicar o seu nome e residência;
c) Indicar o domicílio profissional do mandatário judicial;
d) Identificar o ato jurídico impugnado, quando seja o caso;
e) Indicar o órgão que praticou ou devia ter praticado o ato, ou a pessoa coletiva de direito público ou o ministério a que esse órgão pertence;
f) Indicar o nome e a residência dos eventuais contrainteressados;
g) Expor os factos e as razões de direito que fundamentam a ação;
h) Formular o pedido;
i) Declarar o valor da causa;
j) Indicar a forma do processo;
l) Indicar os factos cuja prova se propõe fazer, juntando os documentos que desde logo provem esses factos ou informando que eles constam do processo administrativo;
m) Identificar os documentos que acompanham a petição”. (sublinhado nosso)

Sendo que dispõe o artigo 10º do CPTA o seguinte:

Artigo 10.º
Legitimidade passiva
1 - Cada ação deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor.
2 - Quando a ação tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é a pessoa coletiva de direito público ou, no caso do Estado, o ministério a cujos órgãos seja imputável o ato jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os atos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos.
3 - Os processos que tenham por objeto atos ou omissões de entidade administrativa independente, destituída de personalidade jurídica, são intentados contra o Estado ou a outra pessoa coletiva de direito público a que essa entidade pertença.
4 - O disposto nos dois números anteriores não obsta a que se considere regularmente proposta a ação quando na petição tenha sido indicado como parte demandada o órgão que praticou o ato impugnado ou perante o qual tinha sido formulada a pretensão do interessado, considerando-se, nesse caso, a ação proposta contra a pessoa coletiva de direito público ou, no caso do Estado, contra o ministério a que o órgão pertence.
5 - Havendo cumulação de pedidos, deduzidos contra diferentes pessoas coletivas ou ministérios, devem ser demandados as pessoas coletivas ou os ministérios contra quem sejam dirigidas as pretensões formuladas.
6 - Nos processos respeitantes a litígios entre órgãos da mesma pessoa coletiva, a ação é proposta contra o órgão cuja conduta deu origem ao litígio.
7 - Podem ser demandados particulares ou concessionários, no âmbito de relações jurídico-administrativas que os envolvam com entidades públicas ou com outros particulares.
8 - Sem prejuízo da aplicação subsidiária, quando tal se justifique, do disposto na lei processual civil em matéria de intervenção de terceiros, quando a satisfação de uma ou mais pretensões deduzidas contra a Administração exija a colaboração de outra ou outras entidades, para além daquela contra a qual é dirigido o pedido principal, cabe a esta última promover a respetiva intervenção no processo.”

Após constatar que o ato impugnado na ação é o despacho do Órgão de Gestão do Programa Operacional Fatores de Competitividade, de 04/09/2009, que apreciou a candidatura da autora ao Sistema de Incentivos à Inovação, e considerando que a apreciação da legitimidade passiva envolvia a apreciação da natureza jurídica do Gestor do Programa o Tribunal a quo passou a analisar o quadro normativo, enunciado na decisão recorrida, tendo concluído, com base nele, que o Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático de Competitividade não é uma pessoa coletiva de direito público nem uma entidade administrativa independente, e que assim a legitimidade passiva para a ação deve ser aferida à luz do disposto no nº 2 do artigo 10º do CPTA. Afastando, assim, quer o nº 1 quer o nº 3 do artigo 10º do CPTA.
De modo que a legitimidade passiva para a ação haveria de pertencer ao Ministério em que aquele se integrasse e não ao Estado Português.
E passando a apurar em que ministério se insere o identificado Órgão de Gestão do Programa Operacional Temático de Competitividade, autor do ato impugnado, concluiu que esse ministério era, à altura dos factos, o Ministério da Economia e do Emprego (cfr. Decreto-Lei n.º 54-A/2000, de 7 de abril, Resolução do Conselho de Ministros n.º 27/2000, de 16 de maio, na Resolução do Conselho de Ministros n.º 58/2002, de 15 de julho e Resolução de Conselho de Ministros n.º 101/2003, de 8 de agosto), atual Ministério da Economia (cfr. Decreto-Lei n.º 119/2013, de 21 de agosto).
Sem pôr propriamente em causa o juízo assim feito pelo Tribunal a quo, que, diga-se, é o correto, a recorrente sustenta que não lhe é possível aferir a que Ministério tal estrutura temporária pertence, e que por tal motivo não pode ser o demandado Estado Português absolvido da instância com fundamento na sua ilegitimidade, e que ao tê-lo decidido o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na aplicação do Direito legal aplicável aos factos.
O recorrido Estado Português sustenta nas suas contra-alegações que o alegado desconhecimento dos ministérios a que pertencem os órgãos, autores dos atos a impugnar, não implica uma competência residual do Estado Português, enquanto pessoa jurídica.
A questão de saber qual a entidade pública que deve ser demandada como ré numa ação administrativa é a maior parte das vezes encarada apenas como um problema de legitimidade passiva, desde logo, porque essa é a epígrafe do artigo 10º do CPTA: “legitimidade passiva”.
Mas, como se disse no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Sul, de 15/01/2015, Proc. n.º 11.502/14, in, www.dgsi.pt, de que fomos relatores, que se passa a reproduzir:
«…tal epígrafe pode ser enganadora, já que, na verdade, as regras ali previstas respeitam não apenas à determinação da legitimidade passiva, mas também às respeitantes à personalidade judiciária das entidades públicas.
Quando, como é bom de ver, uma e outra constituem pressupostos processuais distintos entre si, não se podendo confundir, sendo pois essencial ao correto enquadramento da questão a compreensão dos pressupostos processuais, de personalidade judiciária e de legitimidade processual. Sendo certo que, um e outro, também não se confundem com a capacidade judiciária, (que consiste na suscetibilidade de estar por si em juízo, a qual tem por base e por medida a capacidade do exercício direitos - cfr. artigo 9º nºs 1 e 2 do CPC antigo, correspondente ao artigo 15º do CPC novo).
Com efeito, enquanto a “personalidade judiciária” consiste na suscetibilidade de ser parte em juízo (cfr. artigo 5º nº 1 do CPC antigo, correspondente ao artigo 11º nº 1 do CPC novo), traduzindo-se assim numa qualidade pessoal da parte, a “legitimidade processual” não é um atributo do sujeito, em si mesmo, mas uma qualidade do sujeito em relação a uma determinada ação com um certo objeto, consistindo na suscetibilidade de ser parte numa ação aferida em função da relação dessa parte com o objeto daquela ação, tratando-se, por conseguinte, de um conceito de relação (vide, entre outros, V. ANTUNES VARELA,J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA, in, Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra Editora, 1985, 179 e ss.).
Ora, no que tange à personalidade judiciária cumpre evidenciar que o CPTA não autonomizou tal pressuposto, o que não facilita a resolução das questões respeitantes à personalidade judiciária das entidades administrativas em sede de contencioso administrativo.
Pode, no entanto, retirar-se do disposto na 1ª parte do nº 2 do artigo 10º do CPTA o princípio da coincidência entre personalidade jurídica e personalidade judiciária das entidades públicas, ao estatuir ali que “quando a ação tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é a pessoa coletiva de direito público”. Princípio da coincidência que é acolhido, também, no processo civil, dispondo o nº 2 do artigo 5º nº 2 do CPC antigo (a que corresponde o nº 2 do artigo 11º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013), de aplicação subsidiária nos Tribunais Administrativos (cfr. artigo 1º do CPTA), que “quem tiver personalidade jurídica tem igualmente personalidade judiciária”.
Porém, a 2ª parte do mesmo nº 2 daquele artigo 10º salvaguarda logo uma exceção, nos termos da qual “quando a ação tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é (…), no caso do Estado, o ministério a cujos órgãos seja imputável o ato jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os atos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos”. Trata-se, aqui, na verdade, de um caso de extensão de personalidade judiciária (ainda que para alcançar tal desiderato não seja sido usada técnica idêntica à que foi seguida para os casos de extensão de personalidade judiciária previstos nos artigos 6º e 7º do CPC antigo, correspondentes aos atuais artigos 12º e 13º do CPC novo) atribuindo-se personalidade judiciária aos ministérios, em vez do Estado.
Assim, consubstanciam ilegitimidade passiva em sentido próprio os casos em que o autor demanda uma entidade pública que não é a contraparte na relação material controvertida, tal como esta é configurada na petição inicial.
E consubstanciam situação de falta de personalidade judiciária da entidade pública demandada aquelas em que a ação é instaurada contra uma entidade sem personalidade jurídica para a qual a lei não estende (excecionalmente), a suscetibilidade de ser parte em juízo.
A extensão de personalidade jurídica aos ministérios, prevista na 2ª parte do nº 2 do artigo 10º do CPTA, apenas ocorre quando se esteja perante processo que “tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública”, como expressamente ali se prevê. Do que tem que entender-se que não se estabeleceu ali uma cláusula geral de extensão da personalidade judiciária aos ministérios.
Importa, pois, definir o alcance deste segmento normativo, precisando para que situações se encontra reservada a excecional extensão da personalidade judiciária aos ministérios (os quais não têm personalidade jurídica).
Não pode ser inócuo, antes constituindo um importante contributo para a solução da questão, o segmento inserto na parte final do nº 2 do artigo 10º do CPTA, nos termos do qual, em tal situação (quando a ação tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública), parte demandada é, no caso do Estado, o ministério “a cujos órgãos seja imputável o ato jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os atos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos”. Com efeito, daqui deve retirar-se que a expressão “ação ou omissão de uma entidade pública”, usada no nº 2 do artigo 10º do CPTA, está desde logo associada às ações ou omissões de entidade pública que impliquem o exercício de poderes de autoridade para a emissão de normas ou atos administrativos. Pelo que tal regra é de aplicar, desde logo, no âmbito da ação administrativa especial prevista no Título III do CPTA, a qual constitui o meio processo processual a utilizar (forma de processo a seguir) para as ações judiciais “cujo objeto sejam pretensões emergentes da prática ou omissão ilegal de atos administrativos, bem como de normas que tenham ou devessem ter sido emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo” (cfr. artigo 46º nº 1 do CPTA). Meio processual a usar para a formulação dos seguintes pedidos principais: anulação de um ato administrativo ou declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica; condenação à prática de um ato administrativo legalmente devido; declaração da ilegalidade de uma norma emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo; declaração da ilegalidade da não emanação de uma norma que devesse ter sido emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo (cfr. nº 2 do artigo 46º do CPTA).»
A esta luz, e com estes fundamentos, importa desde logo explicitar que na situação presente o que está propriamente em causa, em primeira linha, não é a questão de saber a quem pertence a legitimidade passiva para a ação, que passa por saber quem é a contraparte na relação material controvertida, mas a de quem detém personalidade judiciária para estar em juízo (em concreto, e no caso, saber se é o Estado Português ou um Ministério, quem deve estar em juízo).
E concomitantemente concluir que não vale aqui o princípio da coincidência entre personalidade jurídica e personalidade judiciária das entidades públicas contido na 1ª parte do nº 2 do artigo 10º do CPTA, mas a exceção prevista na 2ª parte do mesmo nº 2 daquele artigo 10º, a qual consubstancia uma situação de extensão de personalidade judiciária aos ministérios (em vez do Estado) “quando a ação tenha por objeto a ação ou omissão de uma entidade pública”, como é o caso.
De modo que o Estado Português, que foi identificado como demandado na Petição Inicial da presente ação administrativa especial, tinha que ser absolvido da instância por falta de verificação do pressuposto processual da personalidade judiciária, que no caso da ação administrativa especial (e fora da situação prevista no nº 3 do artigo 10º do CPTA), não lhe cabe por força do disposto na 2ª parte do nº 2 do artigo 10º do CPTA, e não por ilegitimidade passiva, como foi entendido pelo Tribunal a quo.
Mas será que, como propugna a recorrente, deveria o Tribunal a quo tê-la convidado a aperfeiçoar a sua Petição Inicial nos termos dos artigos 8º, 88º, 89º nº 3 do CPTA e artigo 6º e 411º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) ou julgado a ação regularmente proposta nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10º nº 4 do CPTA?
É já reiterada, e maioritária, a jurisprudência no sentido de que a falta de personalidade judiciária (ainda que, em alguns casos, entendida como ilegitimidade passiva) não é suprível, não admitindo correção, seja oficiosamente, pelo Tribunal, seja pelo autor, após convite para o efeito – nesse sentido veja-se, designadamente, os Acórdãos TCA Norte de 24/05/2007, Proc. 00184/05.1BEPRT, de 11/01/2007, Proc. 00534/04.8BEPNF; de 19/07/2007, Proc. 00805/05.6BEPRT, os acórdãos deste TCA Sul, de 23/04/2009, Proc. 04053/08, de 15/01/2015, Proc. 11.502/14; de 12/02/2015, Proc. 11740/14 e de 26/02/2015, Proc. nº 08987/12, todos in www.dgsi.pt e o Acórdão do STA de 03/03/2010, Proc. 0278/09.
Ainda que com ela coexista jurisprudência em sentido contrário, que considera que o autor deve ser convidado a aperfeiçoar a petição quando, em ação administrativa comum de responsabilidade civil tenha demandado o ministério em vez do Estado (nesse sentido, vide, designadamente, o Acórdão deste TCA Sul de 22/04/2010, Proc. 05901/10, e o Acórdão do TCA Norte de 23/01/2015, Proc. 00442/13.1BEPNF, in www.dgsi.pt/jtcan, este com um voto de vencido)
Entendendo-se também, de modo reiterado e uniforme, no âmbito das regras processuais constantes do Código de Processo Civil que a falta de personalidade judiciária constitui exceção dilatória insuprível, desde logo por não se encontrar nas normas do processo civil qualquer norma que permita a sua sanação (fora da situação excecional prevista no artigo 8º do CPC antigo, correspondente ao artigo 14º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013, a qual que permite a sanação da falta de personalidade judiciária das sucursais, agências, filiais, delegações ou representações quando estas sejam demandadas em ação procedente de facto praticado pela administração principal, sanação que nesse caso é efetuada através da intervenção da administração principal e a ratificação ou repetição do processado) – vide, a este respeito, por todos, António Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, Vol I, 2ª. ed., 1998, pág. 258.
De modo que a possibilidade de o juiz providenciar, mesmo oficiosamente, pelo suprimento de pressuposto processuais, a que aludia o nº 2 do artigo 265º do CPC antigo, e que corresponde, grosso modo, ao nº 2 do artigo 6º do atual CPC, aprovado pela Lei nº 41/2013, depende desde logo de se estar perante pressuposto processual suscetível de sanação.
Pelo que na falta de disposição diversa prevista para o contencioso administrativo deve neste também valer tal princípio regra.
O que deve valer igualmente para o que se encontra disposto no artigo 88º CPTA, no âmbito da ação administrativa especial, que é o seguinte:

“Artigo 88.º
Suprimento de exceções dilatórias e aperfeiçoamento dos articulados
1 - Quando, no cumprimento do dever de suscitar e resolver todas as questões que possam obstar ao conhecimento do objeto do processo, verifique que as peças processuais enfermam de deficiências ou irregularidades de carácter formal, o juiz deve procurar corrigi-las oficiosamente.
2 - Quando a correção oficiosa não seja possível, o juiz profere despacho de aperfeiçoamento, destinado a providenciar o suprimento de exceções dilatórias e a convidar a parte a corrigir as irregularidades do articulado, fixando o prazo de 10 dias para o suprimento ou correção do vício, designadamente por faltarem requisitos legais ou não ter sido apresentado documento essencial ou de que a lei faça depender o prosseguimento da causa.
3 - Nos casos previstos nos números anteriores, são anulados os atos do processo entretanto praticados que não possam ser aproveitados, designadamente porque do seu aproveitamento resultaria uma diminuição de garantias para o demandado ou os demandados.
4 - A falta de suprimento ou correção, nos termos previstos no n.º 2, das deficiências ou irregularidades da petição determina a absolvição da instância, sem possibilidade de substituição da petição ao abrigo do disposto no artigo seguinte.”

De modo que só perante exceção dilatória suprível, nos termos legalmente previstos, pode haver lugar a convite à sua supressão (cfr. nº 2 do artigo 88º do CPTA).
Sendo certo que à luz do disposto no nº 2 do artigo 89º do CPTA “a absolvição da instância sem prévia emissão de despacho de aperfeiçoamento não impede o autor de, no prazo de 15 dias contado da notificação da decisão, apresentar nova petição, com observância das prescrições em falta, a qual se considera apresentada na data em que o tinha sido a primeira, para efeitos da tempestividade da sua apresentação”. De modo que quando não tenha sido feito convite ao aperfeiçoamento da Petição Inicial, com supressão da exceção dilatória, por a mesma não ser suprível, e o Tribunal se tenha abstido, com tal fundamento, de conhecer do mérito da ação, dela absolvendo o demando, sempre pode o autor apresentar nova petição (agora com observância das prescrições em falta), considerando-se esta apresentada na data em que o tinha sido a primeira para efeitos da tempestividade da sua apresentação. Assegurando-se assim, por esta via, a tutela jurisdicional efetiva constitucionalmente consagrada (cfr. artigo 20º nº 5 da CRP).
Aqui chegados, e à luz do entendimento assim sufragado, tem de concluir-se que não cabia ao Tribunal a quo convidar a autora a suprir a exceção dilatória verificada, através da indicação da parte que deveria ter sido demandada, à luz do disposto no nº 2 do artigo 10º do CPTA (o Ministério em que se integrava o órgão autor do ato impugnado), em vez daquela que o foi (o Estado Português).
Importa ainda dizer que se é certo que o nº 4 do artigo 10º do CPTA expressamente ressalva que o disposto no nº 2 daquele artigo 10º (e no nº 3) “não obsta a que se considere regularmente proposta a ação quando na petição tenha sido indicado como parte demandada o órgão que praticou o ato impugnado ou perante o qual tinha sido formulada a pretensão do interessado, considerando-se, nesse caso, a ação proposta contra a pessoa coletiva de direito público ou, no caso do Estado, contra o ministério a que o órgão pertence”. O que vai de encontro ao disposto no artigo 78º nº 2 alínea e) do CPTA de acordo com o qual na petição inicial da ação administrativa especial deve o autor “indicar o órgão que praticou ou devia ter praticado o ato, ou a pessoa coletiva de direito público ou o ministério a que esse órgão pertence”, no caso a autora, aqui recorrente, expressamente indicou como demandado o Estado Português, tendo sido essa a sua vontade, o que aliás reitera no presente recurso.
Sendo que a menção que fez na petição inicial ao órgão que praticou o ato impugnado foi precisamente para justificar que, no seu entender, por o «órgão de gestão do programa operacional factores de competitividade» assumir a natureza jurídica de estrutura de missão como manifestamente decorre do inciso «…o Estado Português por o ato impugnado ter sido praticado pelo órgão de gestão do programa operacional factores de competitividade (…), entidade que assume a natureza jurídica de estrutura de missão (arts. 44º/2 e 31º/3 do DL 312/2007 de 17.09 e art. 28º/1 da L 4/2004 de 15.01)…» (sublinhado nosso)
Pelo que não só não se está perante situação a que alude o nº 4 do artigo 10º do CPTA como não ocorreu imprecisão na identificação da parte demandada que justificasse um convite ao aperfeiçoamento para melhor explicitação de quem é que a autora pretendia efetivamente demandar.
Na situação presente a autora, aqui recorrente, visou explicitamente demandar o Estado Português (pelas razões que explicitou na ação e renovou no recurso). Pelo que foi o Estado Português que foi o demandado. Mal, como se viu, mas foi este o demandado.
Improcede, por conseguinte, em toda a linha, o presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
O que se decide.

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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em julgar improcedente o recurso jurisdicional, mantendo-se, a decisão recorrida.
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Custas pela Recorrente – artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
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Notifique.
D.N.
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Lisboa, 28 de Maio de 2015

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Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)


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António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos


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Pedro José Marchão Marques DECLARAÇÃO DE VOTO
Votei vencido, entendendo que a tese que logrou vencimento é ancorada em premissas que atendendo ao caso concreto se revelam extremamente formalistas.
Faria antes actuar o princípio in dúbio pro actione, expressamente acolhido no artigo 7.° do CPTA e segundo o qual em caso de dúvida a interpretação jurídica deve favorecer a emissão de pronúncia de mérito, em nome da tutela jurisdicional efectiva (art. 20.°, n.°s 4 e 5, da CRP). O princípio pró actione aponta, pois, para uma interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal, neste caso particular na obtenção de uma decisão de mérito quanto ao pedido condenatório formulado.
De resto, a posição que subscrevo é aquela que consta do acórdão deste TCAS de 22.04.2010, no proc. 5901/10 e que me permito transcrever na parte aqui relevante:
“ (…)
A falta de personalidade judiciária, fora do caso regulado pelo art. 8º. do C.P. Civil [actualmente o art. 14.°], tal como a ilegitimidade singular, activa ou passiva, constituem excepções dilatórias insupríveis (cfr. António Abrantes Gera/dês in 'Temas da Reforma do Processo Civil", Vo lI, 2a. ed., 1998,pág. 258).
Porém, como nota este autor (ob. cit., Vol. ll,pág. 66, nota 104 e pág. 67), das situações de verdadeira falta de personalidade judiciária devem distinguir-se aquelas em que a falta desse pressuposto é aparente, como sucede nos casos de errada identificação dos sujeitos processuais, onde se mostra "inteiramente apropriada a prolação de um despacho de convite ao aperfeiçoamento, com base na irregularidade da petição inicial, tio que respeita a um dos seus requisitos legais correspondente à identificação (correcta) das partes, nos termos do art. 508º, nº2, conjugado com o art. 467°., nº 1 , al. a)", ambos do C.P. Civil [os actuais art.s 590.° e 552.°].
Efectivamente, seria excessivamente Jornalista e contrário ao princípio "pro actione", consagrado no art. 7°. do CPTA de acordo com o qual o Tribunal deva interpretar as normas processuais num sentido que favoreça a emissão de uma pronúncia sobre o mérito das pretensões formuladas , proferir uma decisão de absolvição da instância quando a falha da petição inicial se traduz unicamente na errada identificação do sujeito processual.
Ora, no caso em apreço, a única irregularidade que a petição inicial apresenta consiste numa errada identificação do R, o qual, de acordo com os factos nela alegados, deveria ser a pessoa colectiva Estado e não um dos seus órgãos".
Por outro lado, na linha da doutrina que emana do acórdão do Tribunal Constitucional n.° 179/2007, sempre se terá que efectuar um juízo de proporcionalidade que tome em linha de conta: (i) a justificação da exigência processual em causa; (ii) a maior ou menor onerosidade na sua satisfação por parte do interessado; e (iii) a gravidade das consequências ligadas ao incumprimento do ónus. Ora, feita essa ponderação, deveria prevalecer desde logo o princípio da economia processual, permitindo o aproveitamento da petição inicial com a correcção do demandado e permitindo aproveitar os actos de distribuição e de autuação do processo, promovendo a contínua tramitação do autos, tanto mais que o único erro verificado respeita à identificação da entidade pública demandada (e que ademais até já se encontra esclarecido).
Assim sendo, teria concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, com a consequente baixa dos autos ao TAF, a fim de aí ser proferido despacho a convidar a ora Recorrente a aperfeiçoar a sua petição inicial no que concerne à identificação da Entidade Demandada, prosseguindo os autos em conformidade.
Lisboa, 28 de Maio de 2015
PEDRO MARCHÃO MARQUES