ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


PROCESSO
1114/09.7PAOLH.S1
DATA DO ACÓRDÃO 10/20/2011
SECÇÃO 3.ª SECÇÃO

RE
MEIO PROCESSUAL RECURSO PENAL
DECISÃO PROVIDO EM PARTE
VOTAÇÃO UNANIMIDADE

RELATOR SANTOS CABRAL

DESCRITORES CONCURSO DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
PENA ÚNICA
PENA PARCELAR
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DIREITO AO RECURSO
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
PREVENÇÃO ESPECIAL
PREVENÇÃO GERAL
FURTO QUALIFICADO
ROUBO
BEM JURÍDICO PROTEGIDO

SUMÁRIO I -O direito ao recurso constitui uma das mais importantes dimensões das garantias de defesa do arguido em processo penal. Este direito ao recurso, como garantia de defesa, é de há muito identificado com a garantia do duplo grau de jurisdição, quanto a decisões penais condenatórias e, ainda, quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais. Consequentemente, é inadmissível uma interpretação da lei que, perante a impetração do recorrente, deixe sem resposta o seu pedido de que, para além da pena única resultante do cúmulo jurídico operado, sejam também sindicadas as penas parcelares ainda que não superiores a 5 anos de prisão.
II - Se a pretensão do recorrente é dirigida ao STJ, a ampliação da sua competência às penas parcelares sempre se poderá fundamentar numa regra de interpretação jurídica afirmando a existência de um poder-dever implícito que não é mais do que a regra elementar da hermenêutica segundo a qual quando se concede a determinado órgão ou instituição uma função (actividade-fim), implicitamente está concedendo os meios necessários para que esse fim seja atingido. Numa linguagem menos elaborada, dir-se-á que “quem pode o mais pode o menos”, ou seja, quem tem competência para apreciar a pena conjunta deve ter competência para decidir sobre as penas parcelares que lhe estão subjacentes. Motivo pelo qual, se entende que o STJ pode, e deve, proceder à sindicância de penas parcelares e pena conjunta aplicadas.
III - O regime consagrado no DL 401/82, fundamentado na especial situação do jovem em termos de estruturação da personalidade, estrutura-se numa dupla perspectiva, procurando, por um lado, evitar a pena de prisão e impondo a atenuação especial sempre que se verifiquem as condições prognósticas que prevê (art. 4.º), e por outro, pelo estabelecimento de um quadro específico de medidas ditas de correcção (arts. 5.º e 6.º). Em última análise, o legislador concede o seu empenho a uma aposta decidida no processo de socialização, tornando este factor na ponderação da pena a aplicar.
IV - O jovem, pelo simples facto de o ser, pode afirmar que o seu início de percurso de vida merece uma visão de esperança e de um juízo de prognose positiva, o qual, porém, poderá ser desmentido pelas suas concretas circunstâncias de condução de vida, bem como pelas exigências de prevenção geral evidenciadas pela prática do facto. Caso tal juízo exista, o mesmo pode e deve ter necessário reflexo numa pena que, embora privativa de liberdade, assume uma tonalidade quantitativamente diferente em relação à sua dimensão, bem como também o deverá assumir qualitativamente em relação à forma de execução, pois que se trata de um jovem para quem a prisão poderá constituir uma oportunidade para adquirir competências.
V - A avaliação das vantagens da atenuação especial da pena para a reinserção social do arguido tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso, e do percurso de vida do arguido, e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade. Tal juízo terá de arrancar de um pressupostos incontornável, do qual também arranca o legislador do DL 401/82, ou seja, o da existência de uma mais intensa capacidade de ressocialização, que é pressuposto incontornável, sobretudo quando o delinquente se encontra ainda no limiar da sua maturidade.
VI -Pressupondo no arguido essa aptidão natural, derivada da idade, no sentido de se reintegrar socialmente, a questão a formular será a de saber se existe motivo que invalide aquela presunção. No caso concreto, o alinhar da motivação que desenha a relevância de um juízo de prognose surge esbatido e consubstancia-se no facto de o arguido ser delinquente primário. Tal elemento não é suficiente para concluir que a atenuação especial cumpre os objectivos da prevenção a nível especial, dando o arguido (que foi condenado pela prática de crimes de furto qualificado e roubo) o sinal da inadmissibilidade nesta, como em qualquer sociedade evoluída, de comportamentos que colocam em causa bens jurídicos importantes.
VII - O regime especial dos jovens delinquentes contende, no caso concreto, com as necessidades de prevenção a nível geral, pois o peso das exigências de prevenção geral aumenta em paralelo com a gravidade dos factos. Quando, como no caso vertente, se identifica um percurso de vida marcado pela indiferença pelas normas, pelos comportamentos desviantes e disfuncionais, não se vislumbra como é que, simultaneamente, se pode conjugar uma aposta decidida num futuro comportamento positivo pelo arguido. Tal desconfiança em relação a um juízo de prognose positivo é ainda mais esbatido quando nos deparamos com crimes que, não obstante a forma artesanal de execução, implicam a colocação em causa de valores fundamentais como a própria integridade física.


DECISÃO TEXTO INTEGRAL Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

AA veio interpor recurso da decisão que o condenou nas seguintes penas:

Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, nº 1, e 204.º, nº 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.º, todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (caso da casa BB – NUIPC 469/10.6PAOLH);

Pela prática de um crime de furto qualificado sob a forma tentada, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 203.º, nº 1, e 204.º, nº 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.º, todos do Código Penal na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão (residência de CC – NUIPC 1025/10.3PAOLH);

Pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão – (ofendida DD - NUIPC 1107/10.1PAOLH); 

Pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do Código Penal na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão (ofendida EE – NUIPC 1123/10.3PAOLH);

Pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do Código Penal (ofendida FF – NUIPC 1131/10.4PAOLH) na pena de 2 (dois) anos de prisão;

Procedendo ao cúmulo jurídico das penas condenar o arguido AA na pena conjunta de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que:

1 - Estabelece o artigo 4° do Decreto-Lei nº 401/82 de 23 de Setembro que "Se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.° e 74.° do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado." 2- Nesta medida, deverá aplicar-se o regime de atenuação especial dos jovens delinquentes quando for possrvel fazer-se um juizo de prognose positiva sobre o efeito da atenuação especial da pena relativamente à reinserção social do arguido.

3 - Entendemos que, no caso dos autos, existem razões para crer que, da atenuação especial, resultam vantagens para a reinserção social do arguido. Pois,

4 - A data da prática de alguns dos factos, o arguido tinha 20 anos.

5 - Não obstante o seu percurso de vida, o arguido não tem antecedentes criminais.

6 - A mãe do arguido mostrou-se disposta a recebê-lo e dar-lhe o seu apoio incondicional.

7 - Além disso, na adolescência a criminalidade afigura-se como um fenómeno efémero, revestindo carácter transitório, razões que nos levam a crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do arguido, evitando-se que uma reacção penal demasiado severa possa comprometer definitivamente a sua socialização.

8 - Em face do que não podemos deixar de concluir que, no caso em apreço, ainda se justifica um juízo de prognose positiva favorável ao arguido uma vez que da atenuação da pena, por aplicação do regime especial para jovens delinquentes previsto no Decreto-Lei nº 401/82 de 23 de Setembro, resultam vantagens para a sua reinserção social, no sentido de conformar a sua personalidade à ordem social.

9 - Aplicando-se ao arguido o regime penal dos jovens adultos, sendo a pena de prisão prevista para os crimes pelos quais o arguido foi condenado especialmente atenuada nos termos do disposto nos artigos 72° e 73° do Código Penal, a moldura penal abstracta prevista para os crimes é a seguinte:

- furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203°/1 e 204°/2 e) do Código Penal com referência ao artigo 202° e) do mesmo diploma legal, é de 1 mês a 5 anos e 4 meses de prisão;

- furto qualificado na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22°, 23°, 203°/1 e 204°/2 e) do Código Penal com referência ao artigo 202° e) do mesmo diploma legal, é de 1 mês a 3 anos 6 meses e 21 dias de prisão; e

- os roubos simples, p. e p. pelo artigo 210°/1 do Código Penal, é de 1 mês a 5 anos e quatro meses de prisão. Pelo que,

10 - O acórdão recorrido violou o disposto no Decreto-Lei n.o 401/82 de 23 de Setembro ao afastar a aplicação do regime especial para jovens delinquentes ao arguido AA.

Por outro lado, dir-se-á que,

11 - A determinação da medida da pena, dentro dos limites da lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (artigos 710 nº 1 e 400 nº 2, ambos do Código Penal).

12 - Na determinação concreta da medida da pena, o tribunal tem de atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do agente ou contra ele, designadamente as que a título exemplificativo estão enumeradas naquele preceito mas sem perder de vista que a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. Pelo que,

13 - Importa apreciar a medida concreta das penas parcelares aplicadas ao arguido AA na medida em que as mesmas se mostram excessivas. Porquanto,

14 - As consequências pessoais dos factos foram de pequena monta dado que, no caso das ofendidas EE e FF, não ocorreram lesões e, na situação da ofendida DD, as lesões fisicas são insignificantes sendo que em nenhum dos casos houve necessidade de intervenção hospitalar,

15 - As consequências materiais assumiram escassa relevância em virtude do valor dos objectos subtraídos ser diminuto e também pelo facto de, alguns dos objectos, terem sido recuperados, mostrando-se reduzida a gravidade das consequências,

16 - No caso em que foi ofendida EE, apesar de o arguido ter praticado os factos mediante a exibição de uma faca, a verdade é que o arguido não fez uso da mesma, não tendo causado quaisquer ferimentos à ofendida,

17 - O arguido AA confessou os factos quanto à situação em que é ofendida FF,

18 - O mesmo sucedendo no caso da BB, em que a confissão se afigurou relevante para a descoberta do montante subtraido,

19 - A mãe do arguido mostra-se disposta a recebê-lo e apoiá-lo na sua integração social. 

20 - O arguido à data da prática dos factos tinha 20 e 21 anos

21 - O arguido não tem antecedentes criminais.

22 - Por tudo isto, ao arguido AA não deveriam ter sido aplicadas penas concretas superiores a:

um ano de prisão, quanto ao crime de furto qualificado no caso da BB;

- quatro meses de prisão, quanto ao crime de furto qualificado na forma tentada no caso do CC;

- um ano e quatro meses de prisão quanto ao crime de roubo simples no caso da ofendida DD;

- dois anos de prisão, quanto ao crime de roubo simples no caso da ofendida EE;

- um ano de prisão, quanto ao crime de roubo simples no caso da ofendida FF.

23 - Assim sendo, o acórdão recorrido violou os princípios básicos de determinação da medida da pena, ao arrepio dos critérios previstos nos artigos 71 ° e 40° do Código Penal.

24 - No que concerne à medida da pena única, há que atender-se ao disposto na parte final do n. ° 1 do artigo 77° do Código Penal que estabelece que "Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente

25 - Sendo que I nos termos do nº 2 do mesmo normativo legal, "A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.1I

26 - As penas parcelares aplicadas ao arguido são desadequadas e desproporcionais, mostrando-se adequadas e suficientes as penas de:

- um ano de prisão, pela prática do crime de furto qualificado no caso da ofendida BB;

- quatro meses de prisão, pela prática do crime de furto qualificado na forma tentada no caso do ofendido CC;

- um ano e quatro meses de prisão, pela prática do crime de roubo simples no caso da ofendida DD;

- dois anos de prisão, pela prática do crime de roubo simples no caso da ofendida EE;

- um ano de prisão, pela prática do crime de roubo simples no caso da ofendida FF.

27 - Desta forma, a pena única a aplicar ao arguido AA terá como limite máximo a pena de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão e como limite mínimo a pena de 2 (dois) anos de prisão.

28 - Na determinação da medida concreta da pena a aplicar em função da culpa do agente e das exigências de prevenção há que considerar "todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele", Nessa medida,

29 - Quanto à censurabilidade da conduta ilícita do arguido, julgamos que ela reflecte a mediania deste tipo de ilicito.

30 - O grau de ilicitude é baixo, tendo em conta o valor dos bens subtraídos e a circunstância de alguns deles terem sido recuperados.

31 - As necessidades de prevenção especial, atento o facto de esta ser a única condenação do arguido. pouco exigem da pena a aplicar.

32 - Atento o exposto, a pena única aplicada ao arguido afigura-se claramente excessiva e em total desacordo com a culpa do agente. não tendo havido adequação.

33 - De facto. perante o circunstancialismo do caso concreto, considerando a idade do arguido à data da prática dos factos e a sua condição social e económica. entende-se adequada à culpa do arguido e suficiente para realizar a tutela dos bens jurídicos protegidos pena de prisão em medida não superior a 3 (três) anos e 8 (oito) meses.

34 - Impõe-se. por isso. a redução da pena única aplicada ao arguido para uma pena de prisão em medida não superior a três anos e oito meses uma vez que a aplicação de tal pena realizará de forma adequada e suficiente o objectivo de prevenir a prática de futuros crimes da mesma natureza pelo arguido.

35 - Face à violação do disposto no artigo 77° do Código Penal, justifica-se a revogação do douto acórdão condenatório, devendo fixar-se a pena privativa da liberdade, aplicada ao arguido, em medida não superior a três anos e oito meses de prisão, porque se mostra adequada à culpa do agente e satisfaz as necessidades de prevenção. geral e especial.

Acresce que,

36 - Por ter fixado a pena única em sete anos e seis meses de prisão, o tribunal não ponderou se tal pena devia ou não ser substituída por outra pena, dentro do leque das respectivas penas de substituição previstas na lei.

37 - Mas, adequada que se mostra a aplicação de pena de prisão em medida não superior a três anos e oito meses, há que ponderar as razões de prevenção especial que se fazem sentir no caso concreto. Com efeito,

38 - Dispõe o nº 1 do artigo 50.0 do Código Penal que "O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição",

39 - São dois os pressupostos para a suspensão da execução da pena de prisão: um de ordem formal e que consiste em a pena de prisão não ser superior a 5 anos; e outro de ordem material, e que consiste em o tribunal concluir que, face à personalidade do arguido, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

40 - Por se considerar justa e adequada a aplicação de pena de prisão em medida não superior a três anos e oito meses, devendo ser essa a pena a aplicar, encontra-se verificado o pressuposto de ordem formal.

41 - Também o pressuposto de ordem material se verifica uma vez que é possível fazer uma prognose social favorável ao arguido, existindo a esperança de que sentirá a sua condenação como uma advertência e que de futuro não cometerá nenhum crime e, em consequência, assumirá outro comportamento mais consentâneo com os valores violados.

42- Nesse juízo de prognose deverá atender-se à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido. Nomeadamente,

43 - A circunstância de, à, data da prática dos factos, o arguido ter apenas 20 anos de idade. .

44 - Os factos terem sido praticados, todos eles, num determinado periodo da sua vida e num curto espaço temporal, entre o dia 3 de Abril de 2010 e o dia 20 de Setembro de 2010.

45 - As consequências dos factos não revestiram grande gravidade.

46 - O arguido ter admitido alguns dos factos, tendo colaborado com o tribunal para a descoberta da verdade.

47 - A maior parte dos 'objectos subtraídos serem de reduzido valor e, inclusivamente, alguns deles terem sido recuperados.

48 - O arguido não ter sofrido qualquer condenação anterior, não tendo antecedentes criminais.

49 - As condições de vida do arguido e a sua situação pessoal.

50 - O arguido contar com o apoio da progenitora na sua inserção social.

51 - Assim, afigura-se-nos que a censura dos factos praticados e a ameaça da prisão serão ainda suficientes para advertir o arguido contra a prática de novos crimes da mesma natureza, sendo que a consideração das exigências de prevenção geral, apesar da sua intensidade, no caso concreto não impõem a prisão efectiva do arguido.

52 - Em simultâneo, a pena de prisão que vier a ser aplicada ao arguido, em medida não superior'a três anos e oito meses, suspensa na sua execução, irá contribuir para a consolidação da sua personalidade, atendendo à tenra idade deste, e para a plena assunção das suas responsabilidades como membro da sociedade.

53- É, pois, possível fazer-se uma prognose social favorável ao arguido em termos que permitem suspender-lhe a execução da pena de prisão que vier a ser-lhe aplicada, em medida não superior a três anos e oito meses, afastando-se, desse modo, o arguido do efeito estigmatizante da prisão, por se verificarem os pressupostos de que o artigo 50° n. °1 do Código Penal faz depender a suspensão da execução da pena de prisão.

54 - Pelo que deverá, ainda, conceder-se ao arguido uma oportunidade de reinserção social, afastando-o dos efeitos criminógenos de estigmatização e de marginalização associados às penas de prisão.

55 - Temos que só a aplicação de uma pena privativa da liberdade, em medida não superior a três anos e oito meses, suspensa na sua execução por idêntico período, reflectirá e tomará em consideração as circunstâncias atinentes à medida da culpa.

56 - E, ainda que se considere que a simples suspensão da execução da pena de prisão não é suficiente, sempre aquela poderá ser subordinada ao cumprimento de deveres ou de regras de conduta e, bem assim, sujeita a regime de prova assente num plano individual de readaptação social, sendo que em tal plano poderá prever-se a procura activa de colocação profissional por parte do arguido, nomeadamente junto do Centro de Emprego e Centro Distrital de Segurança Social, ou integração em acção de formação profissional.

57 - O acórdão recorrido violou, assim, o disposto nos artigos 50º, 51°, 52°, 530 e 54° do Código Penal, motivo pelo qual deverá proceder-se à sua revogação.

Conclui pedindo que:

a) Aplique ao caso concreto o regime especial dos jovens deliquentes, devendo as penas parcelares aplicadas ao arguido AA ser especialmente atenuadas. E,

b) Reduza as penas parcelares concretamente aplicadas ao arguido AA, não devendo a pena única exceder os três anos e oito meses de prisão. E,

c) Proceda à suspensão da execução da pena de prisão, em medida não superior a três anos e oito meses de prisão, por idêntico período, sem  sujeição a qualquer condição.

Ou, subsidiariamente,

d) Aplique ao arguido AA pena única de prisão, em medida não superior a três anos e oito meses, suspensa na sua execução por idêntico período subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta que se entendam adequados ou, ainda, determinar-se que a suspensão seja acompanhada de regime de prova assente num plano de reinserção social a elaborar pelos serviços de reinserção social.

Por fim, caso assim não se entenda,

e) Reduza a pena única concretamente aplicada ao arguido AA, de sete anos e seis meses de prisão, para pena de prisão em medida não superior a cinco anos de prisão.

Respondeu o Ministério Publico referindo que:

1 - Face à factualidade apurada não é de aplicar o regime jurídico especial para jovens delinquentes a que se reporta o artigo 9°, do Código Penal e o Dec.Lei nº 401/82, de 23 de Setembro - cfr, fls. 77 e seguintes do douto acórdão, aqui dadas por reproduzidas para todos os efeitos legais;

2 - As penas parcelares e única em que o arguido foi condenado mostram-se criteriosa e judiciosamente aplicadas, de acordo com os critérios estabelecidos no artigo 71º e 77°, do Código Penal- cfr. fis. 79 e seguintes do douto ac6rdão; ;

3 - Não se verifica nenhuma das violações legais mencionadas pelo recorrente;

4 - Deve, pois, ser negado provimento ao recursos interposto pelo arguido, mantendo-se, na integra o douto acórdão recorrido.

O Exº Mº Sr Procurador Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça emitiu parecer referindo que:

       Nenhuma das penas parcelares aplicadas ao arguido/recorrente por cada um dos crimes é superior a 5 anos e por isso, parece-nos que poderia ser o Tribunal da Relação hierárquica e materialmente competente para apreciar o recurso.

        Nos termos do art. 432º nº 1 al. e) do Código de Processo Penal, o recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões do tribunal do júri ou do tribunal colectivo só pode ter por objecto penas aplicadas que sejam superiores a 5 anos de prisão e desde que vise exclusivamente o reexame da matéria de direito.

       No caso em apreço apenas a pena única é superior a 5 anos de prisão e todas as demais são inferiores mas o recorrente suscita, relativamente a todos os cinco crimes de furto e roubo por que foi condenado, questões de direito – aplicação do regime penal para jovens adultos e consequente medida das penas parcelares e única, pretendendo que a graduação das penas pelos cinco crimes sejam muito inferiores e a pena única seja fixada em 3 anos e 8 meses.

      Como o recurso para o Supremo Tribunal está limitado às questões de direito e a penas de prisão superiores a 5 anos, tem sido entendido que a competência para o conhecimento do recurso pertence ao Tribunal da Relação, embora não unanimemente.

      1. Se assim não for entendido então parece-nos que, eventualmente algumas das medidas das penas poder vir a ser diminuída, embora também consideremos que a aplicação do regime penal para jovens adultos não deva ser aplicada, tal como foi decidido na 1ª instância.

      É que tal medida de atenuação especial das penas só seria aplicável a um dos cinco crimes que o arguido /recorrente AA cometeu o crime de furto qualificado ocorrido no dia 3 de Abril de 2010, o único que poderia estar abrangido pelo disposto no dec.lei 401/82, uma vez que o arguido nasceu em 15 de Maio de 1989 e os três crimes de roubo e o furto tentado ocorreram em fins de Agosto e em Setembro de 2010.

       1.1 O arguido/recorrente tenta defender nas conclusões da sua motivação não só a atenuação especial da pena como também que sejam reduzidas todas as penas e consequentemente a pena única seja fixada abaixo dos 5 anos, devendo ainda e por isso ser suspensa na sua execução tendo ou não  acompanhada de regime de prova.

       1.2 Parece-nos no entanto que só as medidas das penas de furto poderão/deverão ser alteradas, pois são poucas as circunstâncias que poderão beneficiar o arguido/recorrente, apesar da sua pouca  idade.

      Na graduação de cada uma das penas dever-se-á olhar as funções da sua prevenção geral especial, sem se poder perder de vista a culpa do arguido e só depois de estabelecidos os parâmetros da culpa e da prevenção é que é possível passar à sua dosiometria, devendo estas exigências ser a base da sua graduação entre o mínimo e o máximo estabelecido.

      O mínimo da pena deverá ser imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias e o seu máximo a culpa do arguido.

     1.3 A pena do crime de furto qualificado do artº 204 nº 2 do C.P. aplicável vai de 2 a 8 anos e a de furto qualificado tentado a pena aplicável é de 1 mês a 5 anos e 4 meses, por isso parece-nos que a pena aplicada pelo primeiro crime de furto, poderá ser de 2 anos e pelo segundo crime de furto tentado a pena poderá ser fixada em 11 meses, quer devida à confissão quer devida à idade.

     1.4 Quanto ao crime de roubo é um crime “complexo que ofende quer bens jurídicos patrimoniais – o direito de propriedade e de detenção de coisas móveis – quer bens jurídicos pessoais – a liberdade individual de decisão e acção (em certos casos, a própria liberdade de movimentos) e a integridade física… (Conceição Ribeiro da Cunha, comentário Conimbricense do CP, fls. 160), parecendo-nos que as medidas das penas aplicadas por cada um dos crimes de roubo, não deverão ser alteradas.

     De qualquer modo consideramos a possibilidade da pena única vir a ser alterada eventualmente também devido à alteração das penas pelos crimes de furto.

     2. A fixação da pena do concurso depende da consideração do conjunto dos factos e da personalidade do agente nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 77, pois o critério para a pena unitária dele resultante tem de assumir-se como um critério especial.

     A pena única, tem de socorrer-se dos parâmetros da fixação das penas parcelares, podendo funcionar como guias” na fixação da medida da pena do concurso (As Consequências Jurídicas do Crime, Figueiredo Dias, fls. 420).

     A sua fixação, tal como resulta da lei, não se determina com a soma dos crimes cometidos e das penas respectivas, mas da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do arguido, pois tem de ser considerado e ponderado um conjunto dos factos e a sua personalidade “como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado” (Figueiredo Dias, cit, pag. 290,292).

     Na pena conjunta a aplicar ao arguido/recorrente AA terá de relevar a medida da pena de prisão determinada em concreto para cada um dos crimes de furto e de roubo e ainda que a pena mínima na moldura penal abstracta (artº 77º nº 2) se mantenha nos 3 anos e 9 meses e pena máxima poderá ser de 11 anos e 2 meses (com a alteração das penas referidas).

    Todas as circunstâncias, que expressamente foram dadas como provadas parece-nos poder levar a que a medida da pena seja fixada próxima dos 5 anos e 6 meses, o que não poderá suscitar a aplicação da suspensão da execução da pena de prisão e ainda que baixasse para 5 anos os juízos de prognose não seriam favoráveis ao arguido/recorrente AA, pois além da idade actual de 22 anos, nenhuma circunstância favorável surge quanto às suas condições de vida.

     Assim parece-nos que o recurso do arguido AA se não for remetido ao Tribunal da Relação de Évora, poderá merecer provimento parcial apenas quanto a algumas penas aplicadas, podendo a pena única vir a ficar próxima dos 5 anos e 6 meses.

                               Os autos tiveram os vistos legais

                                                            *

                                           Cumpre decidir.

Em sede de decisão recorrida encontra-se provada a seguinte factualidade:

Inquérito nº 498/08.9PAOLH

No dia 23 de Abril de 2008, cerca da 01H00, o arguido GG acedeu ao interior do estabelecimento comercial denominado Núcleo do S… C… de Portugal, localizado na Rua da S…, na cidade e comarca de Olhão, através da destruição da grade em metal que servia de protecção à porta da entrada.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, o arguido GG retirou quantia não concretamente apurada, mas não superior a € 65,00 que estava acondicionada no interior de uma caixa registadora e num recipiente junto ao balcão.

Após, o arguido GG colocou-se em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 1114/09.7PAOLH (processo principal)

No dia 14 de Setembro de 2009, cerca das duas horas, o arguido GG, em conjugação de esforços e de forma concertada com pelo menos mais quatro indivíduos, não concretamente identificados, acederam ao interior da residência pertencente a HH e II, localizada no nº XXX, 2º, Apartamentos S…, na cidade e comarca de Olhão, empunhando cada um armas de fogo.

Uma vez no interior da mencionada residência, o arguido GG, conjuntamente com outro indivíduo, manietaram o HH e um dos outros indivíduos desferiu uma coronhada com uma arma no rosto da II.

Em acto contínuo, o arguido GG conjuntamente com os restantes indivíduos, retiraram os seguintes objectos do interior da mencionada residência e pertencentes a HH e II:

→ 2 (dois) casacos, um marca Adidas e outro marca Nike, modelo senhora, no valor um de € 50,00 e outro de € 60,00;

→ 1 (uma) mala, marca Adidas, no valor de 35€;

→ 1 (um) mala, marca Adidas, no valor de 35€;

→ 1 (um) casaco, marca Liki Liki, no valor de 50€, objectos pertença de II;

→ um casaco da marca Springfield;

→ um casaco de marca não apurada mas para circular de moto;

→ 1 (um) telemóvel, marca Nokia, adquirido há cerca de um ano, pelo montante de € 420,00;

→1 (um) telemóvel, marca Motorola, adquirido há cerca de um ano poir valor não apurado;

→ 2 (duas) alianças em ouro, no valor de € 200,00

→ 1 (uma) pulseira em ouro, de criança, no valor de €90;

→→ 1 (um) fio em ouro, em valor não apurado, objectos pertença de HH.

Ao PP, no âmbito do inquérito nº 1434/09.0PAOLH, foram-lhe apreendidos os seguintes objectos:

→ 1 (uma) pistola, com a inscrição Police; Kal 8mm, com o nº de série E-200599;

→ 1 (um) casaco marca Springfield, pertencente a HH, que havia sido subtraído no dia 14 de Setembro de 2009.

Inquérito nº 1431/09.6PAOLH

No 23 de Novembro de 2009, em hora não concretamente apurada, durante o período nocturno, indivíduo não concretamente apurado acedeu ao interior do estabelecimento comercial denominado I…, localizado na A… da R…, nº XXX-A, nesta cidade e comarca de Olhão, através da quebra do vidro inferior da porta de entrada.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ 3 (três) computadores portáteis, marca Toshiba, no valor global de € 3300,00[1].

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Os três computadores foram apreendidos em 2 de Dezembro de 2009 e entregues ao seu proprietário em 7 de Dezembro do mesmo ano.

Inquérito nº 1450/09.2PAOLH

No dia 26 de Novembro de 2009, cerca das 00H30[2], indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento comercial denominado E…, localizado na Avenida da R…, E… M…, Loja X-A, na cidade e comarca de Olhão, através da quebra do vidro da porta de entrada[3].

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, o referido indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ 20 (vinte) blusões e sweat-shirt´s, das marcas Hangloose e O’Neill;

→ 25 (vinte) blusas, marcas Hangloose e O’Neill;

→ 1 (uma) bolsa, marca O’Neill, com diversos cheques.

Perfazendo um valor global de €1400,00.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Foram recuperadas sete peças de roupa e entregues ao seu proprietário.

Para colocação de novo vidro a proprietária do estabelecimento despendeu cento e trinta euros.

Inquérito nº 1481/09.2PAOLH

No período compreendido entre as 18H30 do dia 4 de Dezembro de 2009/09H30 do dia 5 de Dezembro de 2009[4], pessoa que não se logrou identificar acedeu ao interior das instalações da sede dos escuteiros, na Rua C… da M…, na cidade e comarca de Olhão, através do estroncamento do portão da entrada.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, a referida pessoa retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ A quantia monetária de 50€[5];

→ 2 (duas) tendas, no valor global de 160€;

→ 12 (doze) medalhas comemorativas, valor desconhecido;

→ 1 (uma) salva, em prata;

→ 2 (dois) machados, com um valor unitário de 30€/cada;

→ 8 (oito) cheques em branco.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Foram recuperadas duas medalhas e uma tenda[6].

Inquérito nº 1517/09.7PAOLH

No período compreendido entre as 15H00 do dia 9 de Dezembro de 2009/09H00 do dia 10 de Dezembro de 2009[7], indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento de restauração denominado Á… na B…, localizado na Rua do C…, nº XXX, na cidade e comarca de Olhão através da quebra da janela da cozinha após ter acedido ao primeiro andar[8].

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ Quantia monetária de montante não concretamente apurado;

→ 1 (uma) aparelhagem Hi-Fi, de marca Philips, no valor de € 80,00;

→ 10 (dez) garrafas de bebidas;

→ 5 (cinco) facas de cozinha;

→ 3 a 4 fondue’s, cujo valor era de €15,00 a € 20,00, cada um.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Nenhum dos objectos foi recuperado.

Inquérito nº 1573/09.8PAOLH

No dia 18 de Dezembro de 2009, cerca das 05H20[9], indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento comercial denominado C… de P…, localizado na Rua V… da G…, nº X, na cidade e comarca de Olhão da Restauração, através da fractura do vidro inferior da porta.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ 3 (três) blusões, no valor de 120€.

→ 8 (oito) parkas, no valor de 284€.

→ 11 (onze) pares de calças, no valor de 137,50€

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 1590/09.8PAOLH

No dia 22 de Dezembro de 2009, cerca das 02H25, o arguido GG, em conjugação de esforços e de forma concertada com os arguidos LL, MM abeiraram-se da porta de entrada do estabelecimento comercial denominado K… S… S…, localizada na Rua dos L…, na cidade e comarca de Olhão, e de modo que em concreto não se conseguiu identificar, forçaram a porta, arrombando a mesma, e por aí entraram no estabelecimento.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, os arguidos GG, LL, MM, retiraram do seu interior os seguintes objectos:

→ Variadas peças de roupa (pullover’s, calças, T-shirt’s, saias, camisolas, vestidos, skate’s e sapatilhas), com um valor global de € 964,00[10].

Inquérito nº 1612/09.2PAOLH

No período temporal compreendido entre as 00H00 do dia 29 de Dezembro de 2009/04H05 do dia 29 de Dezembro de 2009[11], indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento de diversão nocturna denominado C… C…, localizado nas traseiras dos mercados municipais – sitos nesta localidade –, partindo o vidro inferior da porta de entrada[12].

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ Uma quantia em dinheiro, não concretamente apurada, mas entre os € 60,00 e os € 80,00, acondicionada na caixa registadora.

→ 1 (um) leitor de CD’S, com o valor de €300,00 a € 400,00.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 1623/09.8PAOLH

No período compreendido entre as 00H30 do dia 31 de Dezembro de 2009/08H00 do dia 31 de Dezembro de 2009, indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento de restauração denominado A R…, localizado na A… X de O…., loja nº 2, na cidade e comarca de Olhão, através da quebra do vidro da porta[13].

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ Várias garrafas de bebidas, de colecção e para consumo no estabelecimento de valor não concretamente apurado;

→ 1 (um) mealheiro, contendo € 20,00.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Com a substituição do vidro da porta o queixoso despendeu a quantia de cerca de € 15,00.

Inquérito nº 21/10.5PAOLH

No dia 4 de Janeiro de 2010, em hora não concretamente apurada, durante o período nocturno[14], pessoa que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento denominado C.. Y.., localizado na Rua T… B.., nº .., sito na cidade e comarca de Olhão da Restauração, através da quebra dos vidros da porta.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ dois casacos de valor não apurado;

→ um cartão de telemóvel

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Para substituição do vidro o proprietário despendeu € 108,17[15].

Inquérito nº 49/10.5PAOLH

No período compreendido entre as 23H00 do dia 10 de Janeiro de 2010 / 10H00 do dia 11 de Janeiro de 2010[16], indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento de restauração denominado P… na P…, localizado na A… . de O…, na cidade e comarca de Olhão da Restauração, através do rompimento do toldo situado no tecto da esplanada e subsequente entrada por uma janela.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esse indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ A quantia global de €1200,00, acondicionada numa caixa registadora;

→ 1 (um) telemóvel, marca Nokia[17], no valor de € 20,00.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 348/10.6PAOLH

No dia 16 de Março de 2010, cerca das 04H25[18], o arguido GG acedeu ao interior do estabelecimento de restauração denominado P… na P…, localizado na A… . de O… – sita nesta localidade –, através da quebra do vidro da porta.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, o arguido GG retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ 1 (uma) máquina registadora, no valor de 200€;

→ 1 (um) telemóvel, marca Alcatel, no valor de 70 euros;

Após, o arguido GG colocou-se em fuga para parte incerta[19].

A caixa registadora foi entregue ao proprietário[20].

Inquérito nº 429/10.6PAOLH

No dia 2 de Abril de 2010, em hora não concretamente apurada[21], durante o período nocturno, indivíduo que não se logrou identificar acedeu ao interior do estabelecimento denominado Y…, localizado na P… da R…, na cidade e comarca de Olhão da Restauração, através da quebra do vidro da porta[22].

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, o referido indivíduo retirou do seu interior os seguintes objectos:

→ 1 (uma) máquina registadora, no valor de 1800€, contendo a quantia monetária de 80€.

Após, o que se colocou em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 469/10.5PAOLH

No período temporal compreendido entre as 21H30 do dia 3 de Abril de 2010/02H10 do dia 4 de Abril de 2010[23], em conjugação de esforços e de forma concertada, os arguidos GG e AA acederam ao interior da residência pertença de BB, localizada na Rua de S…, nº xx – sita nesta localidade –, escalando o muro traseiro e subsequente quebra do vidro da porta da cozinha.

Uma vez no interior da mencionada residência, os arguidos GG e AA retiraram do seu interior os seguintes objectos:

→ 1 (um) computador[24];

→ A quantia monetária de € 1500,00;

Após, os arguidos GG e AA colocaram-se em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 483/10.0PAOLH

No 18 de Abril de 2010, entre as 00horas e as 8 horas da manhã[25], em conjugação de esforços e de forma concertada, indivíduo ou indivíduos que não se lograram identificar acederam ao interior do estabelecimento de ensino denominado Snack-Bar A C…, localizado na Rua D... J.. J… M… C…, nesta cidade e comarca de Olhão da Restauração, partindo o vidro da porta de entrada.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, esses indivíduos retiraram do seu interior os seguintes objectos:

→ 8 (oito) garrafas de bebidas de Whisky, com um valor aproximado de 180€;

→ Vários maços de tabaco, com um valor aproximado de 423,36€.

Após, o que se colocaram em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 510/10.1PAOLH

No dia 24 de Abril de 2010, a hora não concretamente apurada, mas cerca das 2 horas[26], indivíduo que não se logrou identificar dirigiu-se ao estabelecimento denominado T…, localizado na A… dos C… da G… G… – sita nesta localidade –, e quebrou o vidro da montra da porta com vista a aceder ao seu interior e retirar objectos que aí estivessem expostos[27].

Porém, por se aperceber do proprietário, esse indivíduo colocou-se em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 535/10.7PAOLH

No 28 de Abril de 2010, cerca das 03H45[28], o arguido GG acedeu ao interior do estabelecimento de ensino denominado J… da R…, localizado na Rua .. J.. José M…C…, em Olhão, saltando o seu gradeamento e entrando através de uma janela que estava entreaberta.

Uma vez no interior do mencionado estabelecimento, o arguido GG retirou do seu interior os seguintes objectos:

- 3 (três) garrafas de bebidas e

- Vários artigos alimentares, em valor não concretamente apurado, mas inferior a € 102,00[29].

No interior do mencionado estabelecimento, encontrava-se um computador e respectivo monitor, com um valor aproximado de 800€, cujos cabos haviam sido tentados retirar, sem sucesso[30].

Após, o arguido GG colocou-se em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 549/10.7PAOLH

No dia 29 de Abril de 2010, cerca das 10H00[31], em conjugação de esforços e de forma concertada, indivíduos que não se lograram identificar acederam ao interior da residência pertença de OO, localizada na Rua A… L…, nº X – sita nesta localidade –, através do escalamento do muro traseiro e posterior quebra do vidro da janela.

Uma vez no interior da mencionada residência, esses indivíduos retiraram do seu interior os seguintes objectos:

→ 1 (uma) televisão, com o valor de € 50,00;

→ 1 (um) leitor DVD, com o valor de € 60,00;

→ 1 (uma) Mini Hi-FI, com o valor de € 40,00[32];

Após, colocaram-se em fuga para parte incerta.

Inquérito nº 638/10.8PBFAR

No dia 4 de Maio de 2010, cerca das 20H10[33], no Estabelecimento Prisional de Olhão da Restauração, na sequência do mandado de condução para cumprimento de medida de coacção de prisão preventiva, o arguido transportava como seu haver a quantidade de 1,377/gramas de heroína, acondicionada sob a forma de oito panfletos, por altura da sua revista pelos agentes dos serviços prisionais[34].

O arguido GG conhecia a natureza estupefaciente do produto (heroína), destinando-o para o seu consumo pessoal.

Inquérito nº 1025/10.3PAOLH

No dia 30 de Agosto de 2010, cerca das 17H45[35], em conjugação de esforços e de forma concertada, o arguido AA, juntamente com um indivíduo cuja identidade não foi apurada, dirigiram-se uma residência sita no Sítio de B…, Quelfes, pertença de CC.

Uma vez nas imediações dessa residência, o arguido e o referido indivíduo saltaram o muro e entraram no interior da zona vedada.

De seguida o arguido AA, juntamente com o indivíduo não identificado, começaram a desmontar a janela da cada de banho com vista a acederem ao interior da residência de CC para daí retirarem bens.

Entretanto, o arguido AA, bem como o outro indivíduo referenciado, foram surpreendidos pelo CC.

De imediato colocaram-se em fuga.

O arguido AA foi interceptado por um vizinho, tendo sido entregue aos agentes da Polícia de Segurança Pública chamados ao local.

Inquérito nº 1107/10.1PAOLH

No 15 de Setembro de 2010, cerca das 12H45[36], na Rua A… K…, nesta cidade e comarca de Olhão da Restauração, o arguido AA aproximou-se, num velocípede, da transeunte DD que trazia a tiracolo uma mala de senhora contendo os seguintes objectos:

→ quantia não apurada em dinheiro;

→ 1 (uma) cruz em material não concretamente apurada,

→ 1 (uma) caneta em prata;

→ Variada documentação, incluindo cheques;

→ 1 (um) telemóvel, com um valor aproximado de € 20,00.

Ao passar junto da ofendida, o o arguido AA puxou com força a mencionada mala que DD trazia debaixo do braço, e colocou-se em fuga levando a mala.

Inquérito nº 1123/10.3PAOLH

No 19 de Setembro de 2010, cerca das 20H05[37], na Rua C… da M…, na cidade de Olhão, em conjugação de esforços e de forma concertada, o arguido AA, juntamente com outro indivíduo de identidade desconhecida, acederam ao interior do estabelecimento de panificação denominado N…[38].

Nessa sequência, o arguido AA, bem como o outro indivíduo, manietaram EE, empregada do referido estabelecimento, tendo o arguido exibido uma faca na direcção dela, ordenando-lhe a abertura da caixa registadora.

Seguidamente, o arguido AA e o outro indivíduo, retiraram do interior da respectiva caixa registadora a quantia de €101,00.

Após, colocaram-se em fuga.

Inquérito nº 1131/10.4PAOLH

No 20 de Setembro de 2010, cerca das 19H20[39], na Rua M… de P…, na cidade de Olhão, o arguido AA aproximou-se da transeunte FF que trazia a tiracolo uma mala de senhora contendo os seguintes objectos:

→ 70€;

→ 40£;

→ Variada documentação, incluindo um cartão de crédito;

→ 1 (um) telemóvel, com um valor aproximado de 20€[40].

Nesse instante, o arguido AA puxou com força a mencionada mala que FF trazia a tiracolo, tendo, inclusivamente, a empurrado para libertar a mencionada mala.

Seguidamente, o arguido colocou-se em fuga.

O arguido GG agiu sempre voluntária, livre e consciente, no intuito conseguido de se apropriar dos bens supra descritos e que se encontravam no N… S… C…, na Escola J… da R… e no estabelecimento P… na P… sem o consentimento e contra a vontade dos seus respectivos donos.

O arguido GG tinha perfeito conhecimento que todas as suas descritas condutas eram proibidas e sancionadas por lei.

                                                             *

O arguido GG, em conjugação e comunhão de esforços com outros indivíduos, agiu como descrito de forma livre, deliberada e consciente, visando aceder ao interior da residência de HH e de II sem o consentimento dos proprietários, bem como fazerem seus o dinheiro e valores que aí se encontravam pertença de HH e II.

Sabia que os objectos acima descritos não lhes pertenciam e que ao retirá-los o faziam contra a vontade e sem o consentimento dos donos.

O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida, não se inibindo de actuar pela forma descrita.

Para poder levar a cabo os seus intentos o arguido e os indivíduos que o acompanhavam utilizaram armas de fogo com o intuito de amedrontar HH e II colocando estes numa situação de incapacidade de qualquer reacção.

                                                              *

Os arguidos GG, MM e LL actuaram livre, deliberada e conscientemente, por acordo pelo menos entre os três estabelecido e em conjugação de esforços, sabedores de que não lhes pertenciam os objectos que queriam fazer, e fizeram, seus do estabelecimento K… S… S… e de que procediam contra a vontade dos respectivos donos e sem a autorização destes.

Sabiam ainda estes arguidos GG, MM e LL que a sua conduta era proibida e punida por lei.

                                                            *

Os arguidos GG e AA actuaram livre, deliberada e conscientemente, por acordo pelo menos entre os dois estabelecido e em conjugação de esforços, sabedores de que não lhes pertenciam os objectos que queriam fazer, e fizeram, seus da residência de BB e de que procediam contra a vontade dos respectivos donos e sem a autorização destes.

Sabiam ainda estes arguidos GG e AA que a sua conduta era proibida e punida por lei.

                                                               *

O arguido AA, nos moldes descritos supra, agiu de uma forma deliberada, livre e consciente, sabendo e querendo agir na forma descrita, com o propósito de fazer seus os objectos referidos supra, pertença de DD, de FF e da empresa N…, bem sabendo que eram pertença de outrem e que actuava contra a vontade dos respectivos proprietários.

Para poder levar a cabo os seus intentos utilizou uma faca, com o intuito de amedrontar a empregada do estabelecimento comercial Nu…, colocando esta numa situação de incapacidade de qualquer reacção.

Devido ao medo com que ficou de ser atingida na sua integridade física ou até de perder a própria vida, ao ver uma faca na iminência de poder ser usada contra si, EE não conseguiu esboçar qualquer reacção à conduta do arguido, acabando este por mais facilmente levar a cabo a sua conduta.

                                                                *

O arguido AA agiu voluntária, livre e consciente, no intuito, tentado no que respeita aos bens que se encontravam na residência de CC de se apropriar dos bens descritos sem o consentimento e contra a vontade dos seus respectivos donos.

O arguido tinha conhecimento de que a sua conduta não era permitida por lei.

                                                               *

Das condições pessoais do arguido GG

O arguido é originário de um grupo familiar detentor de estrato sócio económico avaliado como carenciado.

O falecimento do pai aos 15 anos de idade e o estabelecimento de uma nova relação marital da mãe, de cariz instável com subsequente nascimento de mais um descendente, parece ter-se constituído como factor de stress psico-emocional com subsequente prejuízo do já fragilizado relacionamento intra-familiar do arguido.

O arguido apresenta um percurso escolar pouco significativo, revelando progressivamente absentismo generalizado e desmotivação, com subsequente abandono aos 14 anos, aquando da frequência do 6.º ano de escolaridade.

Posteriormente assumiu uma cabal desvinculação por qualquer proposta de retoma da escolaridade com vista à integração em curso de formação profissional, vindo contudo a concluir o 9.º ano, por unidades capitalizáveis, no âmbito do cumprimento de medida tutelar de internamento em Centro educativo, obtendo ainda neste contexto, curso de jardinagem.

O arguido foi sujeito a duas medidas de internamento em Centro Educativo com duração de 2 anos e sete meses respectivamente (Novembro de 2004 a Julho de 2007), após o que reintegrou novamente o agregado da mãe.

Em termos sócio afectivos o arguido estabeleceu aos 14 anos relação marital com uma jovem de 16 anos de idade, sem ocupação e mãe adolescente de uma criança de 2 anos, então institucionalizada, na sequência de outra relação amorosa da mesma, vindo o casal a ter uma filha actualmente com 6 anos de idade.

Neste contexto a (pseudo)-autonomia habitacional / vivencial do arguido e companheira revelou-se sobretudo valorada pela permissividade, dependendo o casal economicamente dos respectivos agregados familiares de origem.

À data do factos do presente processo e desde 2007, aquando da saída do Centro Educativo o arguido integrava o agregado do avô materno, abrangente da mãe, de um irmão uterino menor, do avô e duas tias maternas, partilhando o grupo familiar casa térrea arrendada de tipologia T4, descrita com detentora de satisfatórias condições de habitabilidade.

Há cerca de três anos, o arguido retomou a relação de cariz amoroso com a anterior companheira e mãe do seu filho menor, caracterizando-se contudo a vivência marital como instável, alternando entre a vivência conjunta no agregado do arguido e períodos de separação, retomando aquela ao respectivo agregado de origem conjuntamente com a filha comum ao casal, e mais dois filhos menores da companheira, gémeos de dois anos de idade.

De igual modo e na sequência de uma crescente tensão relacional intra-familiar associado ao desestruturado modo de vida do arguido, tanto mais agravado no último ano, pelo consumo em crescendo de estupefacientes, o mesmo viria a ser expulso do habitat familiar, pelo avô.

Em termos laborais o arguido regista após a saída institucional e por um curto período de tempo, o desempenho da actividade como jardineiro em complexo turístico em Albufeira, vindo a abandonar o posto de trabalho, alegando deficientes condições de trabalho, como salários em atraso e a saída de elementos do seu grupo de pares também ali inseridos.

Há cerca de um ano e por iniciativa da mãe o arguido terá comparecido numa consulta da equipa técnica do IDT em Olhão, não tendo contudo cumprido a medicação, nem comparecido a posteriores consultas, mantendo o comportamento aditivo, o que se constituiu como significativo factor de risco comportamental.

Actualmente e face à sua problemática comportamental evidencia exígua consciência crítica do desvalor da sua conduta delituosa, que justifica como associada a factores externos ao próprio nomeadamente à sua toxicodependência e à influência de terceiros, com subsequentes prejuízos de um potencial processo de mudança.

Revela ainda dificuldades no reconhecimento dos danos provocado a eventuais vítimas ou à sociedade em geral.

O seu discurso pauta-se alguma ligeireza e imaturidade na forma como encara o futuro revelando dificuldades no delinear de um plano de vida alternativo.

Em termos pessoais o arguido ainda que detentor de algumas capacidades relacionais, revela acentuado constrangimento na caracterização de índices situacionais pertinentes para uma tomada de decisão assertiva, sobressaindo para o efeito uma insuficiente mediação/elaboração cognitiva em contextos de inter pessoalidade conflitual.

Denota assim um auto controlo deficitário e acentuada dificuldades na auto-regulação comportamental coadunante à previsão antecipada dos resultados.

Durante o período de reclusão tem, contudo, protagonizado comportamento de acordo com as regras institucionais, tendo vindo a usufruir do apoio da mãe e companheira, em termos de visitas, verbalizando estas disponibilidade para a manutenção do suporte que têm vindo a protagonizar, nomeadamente a mãe, detentora actualmente de condições a tal permissíveis.

                                                            *

Das condições pessoais do arguido AA

O arguido foi educado pela mãe, após a separação dos pais ocorrida durante ao período de gestação do mesmo. Integrou o agregado familiar constituído, para além do próprio, pela respectiva progenitora e dois irmãos uterinos.

A progenitora do arguido revelou durante a sua infância e adolescência uma inoperância tendencial para supervisão parental.

O arguido frequentou a escola com progressivo absentismo e abstenção que levou ao precoce abandono escolar quando frequentava turma de currículos alternativos (7.º/8.º anos).

Em 2005 foi-lhe aplicada a medida tutelar de internamento em centro educativo.

Casou em Fevereiro de 2006, ainda durante o cumprimento da medida referida, tendo nascido uma filha do casal, actualmente, com 5 anos de idade.

Após uma evolução considerada positiva da medida que lhe foi aplicada, apresentava planos de reinserção social que passavam pela exploração conjunta de um café com a mulher, situação que se verificou por pouco tempo.

O casal veio a separar-se cerca de 3 anos depois e a filha foi entregue a familiares com cerca de 2 anos de idade. O relacionamento entre o casal era conf1ituoso, tendo-se verificado diversos períodos de separação.

O arguido iniciou consumo de produtos estupefacientes aos 14 anos.

Em 2008 começou a frequentar programa de substituição com metadona, que tem mantido.

Após a separação do casal, ocorrida cerca de 2009, AA integrou o agregado da mãe, mantendo no entanto reduzidos contactos, ali se deslocando apenas para dormir, mantendo um relacionamento conflituoso que conduziria à sua saída de casa, passando desde então viver numa casa que "ocupou".

Em termos profissionais manteve sempre uma ocupação indiferenciada e irregular.

A mãe mostra-se disposta a recebê-lo de novo, sendo que a sua atitude sempre fui de apoio ao filho e de desculpabilização dos seus comportamentos.

Demonstra dificuldade em reconhecer os factores que contribuem para a sua actual situação, não apresentando quaisquer planos para alterar a sua vida.

O arguido já sofreu medida disciplinar no decurso da medida de coacção de prisão preventiva.

                                                                   *

Das condições pessoais do arguido PP.

O processo de socialização de PP, único filho de um casal de estatuto sócio-económico médio-baixo, decorreu nas proximidades de um bairro social conotado com práticas sociais transgressivas.

A dinâmica intra-familiar caracterizou-se pela existência de laços afectivos fortes entre os seus membros, procurando os progenitores transmitir os valores e as práticas sociais normativas com a matriz social vigente.

O percurso escolar, iniciado em idade própria, decorreu com irregularidade; no primeiro ciclo, PP assumia uma postura de desafio aos professores que se foi agravando com a entrada no segundo ciclo, altura em que apresentou absentismo e insucesso académico progressivos.

Integrou turma de currículos alternativos no 7.º ano com aparente sucesso comportamental mas sem sucesso académico, pelo que as suas habilitações actuais são apenas o 6.º ano de escolaridade.

Aos 16 anos foi-lhe aplicada de uma Medida Tutelar Educativa de Internamento em Centro Educativo em Regime Fechado, com a duração de 18 meses.

Antes da reclusão o arguido vivia junto da mãe, tendo o progenitor regressado ao País de origem - Angola - há cerca de 4 anos para exercício de actividade laboral no sector da construção civil, mantendo contactos telefónicos regulares com o agregado.

A dinâmica intra-familiar é descrita como positiva pese embora seja evidente um discurso de desculpabilização e vitimização do comportamento do jovem por parte da figura materna com evidentes dificuldades na sua supervisão.

A subsistência da família é assegurada pelo rendimento decorrente do exercido laboral do progenitor, encontrando-se a progenitora desempregada.

O arguido mantinha-se laboralmente activo, junto do "cunhado" num viveiro de amêijoa, situação temporária uma vez que aguardava a inscrição num curso profissional.

                                                                *

Das condições pessoais do arguido LL

O processo de desenvolvimento do arguido decorreu num contexto sócio-económico e familiar caracterizado pela instabilidade. Único descendente de um relacionamento marital efémero - os pais separaram-se quando tinha um ano de idade -, a progenitora envidou esforços no sentido de assegurar, sem qualquer apoio, o seu bem-estar e do primogénito (co-arguido AA), o quer viria a traduzir-se numa sobrecarga laboral, em detrimento de um adequado acompanhamento/controlo educativo.

Ao nível escolar, e desde o primeiro ciclo, o arguido registou acentuadas dificuldades de adaptação à nova realidade/espaço, tendo, inclusive, a mãe recorrido ao acompanhamento psicológico proporcionado pelo Centro de Saúde da área de residência, onde fui elaborado plano de regras educativas que não se concretizaria dado a entretanto desvinculação institucional do técnico responsável pelo caso.

Durante a frequência do 2.º ciclo de escolaridade, para além da instabilidade comportamental em sala de aula, o arguido registou um acentuado absentismo, episódios de agressividade para com colegas, passando a privilegiar o convívio com elementos socialmente estigmatizados com a assumpção de comportamentos desviantes.

Na sequência do descrito foi acompanhado pela Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, tendo o arguido integrado o Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF), sem registar alterações do padrão comportamental.

À data dos factos subjacentes ao processo em causa, LL integrava o agregado de origem, que englobava o avô materno e uma irmã consanguínea (cujo poder paternal fui atribuído em Janeiro p.p. ao progenitor, passando a menor a residir com o mesmo), residente num apartamento de tipologia T4, inserido num bairro camarário, situação que se mantém na actualidade.

No ano lectivo de 2008/2009, o arguido ainda integrava o PIEF, mas mantendo o padrão de absentismo já mencionado. Sem uma ocupação de tempos livres estruturada, mantinha um convívio privilegiado com elementos socialmente estigmatizados, sendo referidos hábitos de consumo de haxixe desde os catorze anos de idade.

No momento, e por forma a evitar qualquer confronto / admoestação por parte da mãe, regista maiores períodos de ausência do domicílio, sendo de salientar a extrema reactividade emocional do arguido face às chamadas de atenção da ascendente, tendo, inclusive, aquela lhe proporcionado uma oportunidade para trabalhar em part-time, relativamente à qual o arguido não denotou qualquer interesse.

Embora o grupo familiar em causa se movimente num quadro económico precário, assente basicamente no vencimento da mãe do arguido - estimado em cerca de 460 Euros, acrescido de valores variáveis decorrentes do desenvolvimento paralelo de actividades indiferenciadas -, o arguido sempre teve as suas necessidades básicas asseguradas, tendo ainda sido mencionada uma situação de endividamento por cartões de crédito na sequência da aquisição das peças de vestuário eleitas pelo arguido.

O arguido denota acentuadas dificuldades ao nível da elaboração de uma análise crítica, quer no que concerne aos factos subjacentes ao processo em causa, quer relativamente ao padrão de irresponsabilidade que registou em termos escolares e tem registado em termos sócio-familiares e laborais.

Apesar das diligências da mãe, o arguido não se inscreveu no Centro de Emprego.

                                                            *

Das condições pessoais do arguido QQ

O arguido nasceu numa família desestruturada – os pais eram consumidores de produtos estupefacientes -, tendo após o seu nascimento e na sequência da reclusão da mãe e negligência/desinteresse do pai relativamente aos seus deveres paternais, integrado o agregado de um casal que se disponibilizou para o acolher, com quem residiu até aos 14 anos de idade.

Esta fase foi recordada globalmente de forma positiva, na medida em que usufruiu de uma ambiência familiar isenta de conflitos relacionais significativos, tendo beneficiado de um processo educacional de cariz tradicional

Neste quadro ingressou no sistema escolar na idade adequada, concluindo ao 4.º ano de escolaridade com 10 anos de idade. Posteriormente, transitou para o Ciclo Preparatório, fase em que começou a relacionar-se com jovens sem interesse pela actividade escolar, registando neste contexto dificuldades de inserção no meio escolar.

Desta forma alterou negativamente a sua postura escolar, passando a apresentar elevado absentismo, associado a problemas disciplinares decorrentes de uma postura agressiva perante os colegas/professores, contexto que esteve na génese de diversos episódios reprovativos.

Aos 14 anos de idade, e na sequência de alguns problemas relacionais com os ''pais adoptivos" optou por reintegrar o agregado da mãe biológica que entretanto tinha retomado ao meio livre.

Ao nível da saúde, aos 15 anos iniciou o consumo de haxixe de forma ocasional, durante as confraternizações com os amigos com quem se relacionava preferencialmente.

Em termos escolares, em Setembro de 2009 iniciou a frequência do curso de assistente comercial na Escola Dr. A… I… em Olhão, com equivalência ao 9.º ano de escolaridade.

À data dos factos o arguido residia com a mãe, padrasto e o irmão mais velho, numa casa térrea, antiga, arrendada, de tipologia T4, com suficientes condições de habitabilidade. Posteriormente e na sequência de um desentendimento familiar, nomeadamente com o padrasto, saiu de casa, residindo com um amigo e família deste durante alguns meses.

Em termos escolares frequentava e frequenta o curso de assistente comercial na Escola Dr. A…. Iria em Olhão, denotando a este nível um maior empenho e motivação, pelo que apresenta na actualidade melhores resultados escolares e um comportamento conforme as normas vigentes naquele Estabelecimento Escolar.

Paralelamente, durante o período nocturno encontra-se a frequentar um curso na FORMAR, por forma a adquirir a cédula marítima.

Ao nível da ocupação dos tempos livres estes foram referidos como escassos, decorrentes da sua elevada carga horária escolar - razão pela qual abandonou temporariamente as actividades desportivas, nomeadamente futebol e boxe que praticava anteriormente -, sendo utilizados preferencialmente na companhia da namorada, jovem sem ligações ao sistema judicial e colega da sua Escola e ainda na prática de jogos de computador e playstation.

Ao nível pessoal é de salientar ainda que o arguido nos últimos tempos aparenta um maior sentido de responsabilidade e maturidade, tendo neste quadro, abandonado as companhias mal referenciadas socialmente com quem se relacionava no passado.

                                                               *

Das condições pessoais do arguido MM

O arguido vive em casa do arguido LL, por se encontrar incompatibilizado com a sua irmã e com os seus pais.

Possui o 6.º ano de escolaridade.

Começou a trabalhar há uma semana como servente de pedreiro, desconhecendo quanto vai auferir.

Nos últimos três anos tem trabalhado em moldes descontínuos.

                                                           *

Dos antecedentes criminais do arguido PP

No âmbito do Processo Comum Singular nº 1236/09.4TDPRT, do 3.º Juízo Criminal do Porto o arguido foi condenado, em 17 de Dezembro de 2010, pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada na pena de 140 dias de multa.

O arguido foi condenado no âmbito do Processo Comum Colectivo nº 1434/09.0PAOLH, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Olhão, no dia 20 de Dezembro de 2010, por acórdão transitado em julgado no dia 2 de Maio de 2011, pela prática de um crime de roubo agravado, na pena de cinco anos de prisão e pela prática de um crime de detenção de arma proibida na pena de um ano e oito meses de prisão e em cúmulo jurídico das aludidas penas o arguido foi condenado na pena única de cinco anos e dez meses de prisão., cuja decisão transitou em julgado no pretérito dia 2 de Maio de 2011.

                                                      *

2. Factos não provados

Nada mais se provou constante da acusação, designadamente que:

O indivíduo cuja identidade não se logrou identificar nos pontos referidos nos factos provados fosse o arguido GG, ou o arguido AA;

O arguido PP tenha acedido no dia 14 de Setembro de 2009 ao interior da residência de HH e II;

O arguido QQ tenha acedido com os arguidos GG, MM e LL ao interior do estabelecimento K… S… S…, através do rompimento da porta;

O arguido AA, quando se deslocou a casa de CC se fizesse acompanhar por um indivíduo cuja alcunha fosse “N…”;

O arguido AA juntamente com o outro indivíduo, começaram a chamar pelo ocupante da residência de CC e respectiva vizinhança[41];

O arguido GG destinasse a heroína apreendida também à cedência a terceiros[42];

As armas de fogo que empunhavam os indivíduos que entraram na residência de HH eram semelhantes às de calibre 6.35[43].

O arguido GG e os indivíduos que o acompanhavam tivessem subtraído 2 (duas) malas, marca Stradivarius, no valor global de €40;1 (um) casaco, em nylon, no valor de € 200,00; e 1 (um) casaco, no valor de €15, e a quantia monetária de € 200,00 pertença de II e de HH;

O casaco da marca Springfield tivesse o valor de 40€;

Do estabelecimento C… Y… foram subtraídos vários artigos de vestuário, com um valor aproximado de 150€; 10 (dez) relógios, com um valor unitário de 7,50€, 10 (dez) óculos, com um valor unitário de 4€, 5 (cinco) telefones, com um valor unitário de 5€;

A cruz pertença de DD fosse de platina e tivesse o valor de três mil euros;

Na mesma ocasião tivesse sido subtraída a DD uma caixa de ouro no montante de três mil euros, um anel em ouro no valor de duzentos euros, e a quantia de duzentos e oitenta euros;

O telemóvel subtraído a DD tivesse o valor de quarenta euros;

O arguido AA tenha atingido, previamente, o joelho da perna direita de DD para a fragilizar e facilitar o seu intento[44].

O arguido AA tenha ordenado a EE a abertura da caixa registadora ao mesmo tempo que ele e/ ou o indivíduo que o acompanhava proferiam as seguintes expressões: “Tá calada! Não faças barulho porque senão fazemos-te mal!”

                                                            *

…………..os arguidos GG e AA usaram da faculdade de não prestar declarações, inexistindo quaisquer vestígios objectivos que permitissem identificar os autores dos factos, e não tendo os mesmos sido presenciados qualquer pessoa.

                                                          *

À data da prática dos factos:

- o arguido GG tinha 19, 20 e 21 anos de idade;

- o arguido AA tinha 20 e 21 anos de idade;

- o arguido MM tinha 18 anos de idade;

- o arguido LL tinha 16 anos de idade.

I

Questão prévia

            Na génese da questão encontra-se a peculiaridade da situação em que estão em causa, em sede de recurso, as penas parcelares aplicadas, bem como a pena conjunta que das mesmas resulta, sendo certo que as primeiras são inferiores ao limite do artigo 432 alínea c) do Código de Processo Penal e a segunda superior ao mesmo limite.

            Sobre tal questão importa precisar que, com a Lei 48/2007, que introduziu a denominada Reforma de Processo Penal, alterou-se o teor do artigo 432 do respectivo Código determinando-se que, dos acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri, ou pelo tribunal colectivo, apenas é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito, caso tenha sido aplicada pena de prisão superior a cinco anos.

             A redacção impressa na reformulação legal suscita a questão, directamente equacionada nos presentes autos, que se prende com a formação da pena conjunta no caso da realização de cúmulo jurídico em que alguma, ou algumas, das penas parcelares são inferiores a cinco anos de prisão e a pena conjunta resultante do cúmulo é superior a tal limite. Interposto recurso qual o segmento da decisão proferida em relação ao qual deverá ser aferida a competência para o conhecimento do recurso?

           -Como já se enunciou em anteriores decisões a questão em apreço tem de ser resolvida com o apelo aos princípios de determinação da pena de concurso e aí, desde logo, deverão distinguir-se dois momentos: o primeiro é a determinação da pena que concretamente caberia a cada um dos crimes em concurso como se crimes singulares, objecto de cognições autónomas se tratasse, seguindo, para tanto, o processo normal de determinação da pena. O segundo momento consiste na definição da pena de concurso que resultará de uma moldura penal proveniente da conjunção das penas parcelares e, da determinação da pena dentro dos limites relativos aquela moldura penal e que se efectivará em função das exigências gerais de culpa e de prevenção.

            Importa, porém, acentuar, como refere Figueiredo Dias, em relação é definição de pena conjunta que “Nem por isso se dirá com razão, no entanto, que estamos aqui perante uma hipótese normal de determinação da medida da pena. Com efeito, a lei fornece ao tribunal, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art. 72.°-1, um critério especial: «na determinação concreta da pena [do concurso] serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente» (art. 78.°-1, 2.a parte). 

            No caso de concurso de infracções temos, assim, dois momentos de definição de pena com sujeição a critérios diferentes: a definição das penas parcelares que modelam a moldura penal dentro da qual será aplicada a pena conjunta resultante do cúmulo jurídico e, posteriormente, a definição da pena conjunta dentro dos limites propostos por aquela. A primeira daquelas operações, concretização das penas parcelares constitui um prius, um pressuposto; um antecedente lógico do segundo momento pois que, como refere o mesmo Mestre, a formação da pena conjunta opera no quadro de uma combinação de penas parcelares que não perdem a sua natureza de fundamento da pena de concurso.

 Maximizando tal entendimento pode-se dizer que se pode recorrer da pena conjunta sem colocar em causa as penas parcelares, mas o contrário já não acontece, ou seja, alterada a pena, ou as penas parcelares, necessariamente que está afectado o quadro dentro do qual foi encontrada a pena conjunta que, por tal forma, terá de ser, necessariamente, sindicada

   Assim,

            o primeiro passo para aferição da competência para o conhecimento do recurso, nas circunstâncias do caso vertente, deve ser a própria interpretação do acto processual que se consubstancia na interposição de recurso. Como refere Roxin a declaração, qualquer que seja o seu momento, deve assumir um sentido fácil de reconhecer. Caso necessário o seu conteúdo objectivo deve ser determinado através da interpretação a qual se deve basear não só no sentido literal, mas, essencialmente, no sentido reconhecivelmente pretendido pelo requerente.

            Reconhecido o sentido da pretensão dos recorrentes, a emergência de uma situação de ambivalente, como no caso vertente, depende da circunstância de o mesmo impetrar que o tribunal superior ao qual se dirige conheça de objecto de recurso para o qual pode, simultaneamente, e numa perspectiva meramente literal, ter, e não ter, competência para conhecer.

            Na verdade, suponhamos que o recurso é dirigido directamente ao Supremo Tribunal de Justiça visando o conhecimento em termos de direito de uma pena conjunta superior a cinco anos, bem como de penas parcelares inferiores a tal limite inscrito no artigo 432 c) do diploma citado. Em tal situação o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do referido dispositivo, apenas tem competência para conhecer do recurso na estrita medida em que se trate de uma pena de prisão superior a cinco anos.

            Porém, com este raciocínio levado ás últimas consequências, fica afastado o conhecimento do recurso no especifico das penas parcelares aplicadas, ou seja, o exercício do recurso em relação àquela especifica dimensão das penas parcelares fica sem conteúdo.

            Sucede, porém, que, como a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem tido oportunidade de salientar, por diversas vezes, o direito ao recurso constitui uma das mais importantes dimensões das garantias de defesa do arguido em processo penal. Mesmo antes de o artigo 32.°, nº1, da Constituição da República Portuguesa ter passado a especificar o recurso como uma das garantias de defesa, o que sucedeu com a Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, constituía jurisprudência pacífica e uniforme do mesmo Tribunal que uma das garantias de defesa, de que fala o nº1 do artigo 32.°, é, justamente, o direito ao recurso.

Este direito ao recurso, como garantia de defesa, é de há muito identificado com a garantia do duplo grau de jurisdição, "quanto a decisões penais condenatórias e, ainda, quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais" Consequentemente é inadmissível uma interpretação da lei que, perante a impetração do recorrente, deixe sem resposta o seu pedido de que também as penas parcelares sejam sindicadas.

            Aqui, surgem como possíveis duas interpretações cuja divergência reside na atribuição ao Tribunal da Relação ou ao Supremo Tribunal de Justiça da competência para o conhecimento das penas parcelares e da pena conjunta. Em qualquer uma dessas possibilidades o fundamento da ampliação do conhecimento do recurso fundamenta-se no artigo 402 nº1 do Código de Processo Penal. Porém, são diversas as consequências numa e noutra interpretação pois, como se refere no Acórdão de 7 de Outubro de 2009 (Processo 611/07.3) , a aceitar-se a primeira orientação, ficaria precludida a possibilidade de recurso para o STJ, por força da al. f) do n° 1 do art. 400 do CPP, dos acórdãos das Relações que aplicassem (confirmando) penas (conjuntas) entre 5 e 8 anos de prisão. Ainda na perspectiva da mesma decisão “Tal resultado que entra em conflito com o regime-regra dos pressupostos de recurso para o STJ, que está definido no art. 432° do CPP, cuja al. c) do nº1 estabelece como patamar de recorribilidade, quando o recurso visa exclusivamente o reexame da matéria de direito, a pena concreta superior a 5 anos de prisão.

Esse "conflito" não pode deixar de ser resolvido a favor desta última norma que é, insiste-se, a que define o regime de recurso para o STJ.

O "alargamento" da competência do STJ à apreciação das penas parcelares (não superiores a 5 anos de prisão) nada tem de incongruente, pois se trata de questão exclusivamente de direito, compreendida (isto é, integrada) na questão mais geral da fixação da pena conjunta, a qual, nos termos do art. 77° do CP, deve considerar globalmente os factos e a personalidade do agente”.

Sem embargo das considerações constantes daquela decisão pensamos que um outro elemento poderá ser aduzido no sentido de consagrar uma ampliação da competência do Supremo Tribunal de Justiça quando estejam verificados os restantes pressupostos enumerados no caso vertente ou seja:

a) Pretensão do recorrente em que, por este Supremo Tribunal de Justiça, seja sindicada a pena conjunta aplicada.

b) Pretensão de que, para além da pena conjunta superior a cinco anos-cuja competência para apreciação se encontra inscrita no artigo 432 mº1 alínea c) do diploma citado- sejam apreciadas penas parcelares inferiores àquele limite.

Na verdade, se a pretensão do recorrente é dirigida a este Supremo Tribunal a referida ampliação sempre se poderá fundamentar numa regra de interpretação jurídica afirmando a existência de um poder-dever implícito que não é mais do que a regra elementar da hermenêutica segundo a qual quando se concede a determinado órgão ou instituição uma função (actividade-fim), implicitamente está concedendo os meios necessários para que esse fim seja atingido. Numa linguagem menos elaborada dir-se-á que “quem pode o mais pode o menos”, ou seja, quem tem competência para apreciar a pena conjunta também deve ter competência para decidir sobre as penas parcelares que lhe estão subjacentes.  

            Assim, entende-se que este Supremo Tribunal de Justiça pode, e deve, proceder á sindicância de penas parcelares e pena conjunta aplicada.

II

            A sindicância da medida da pena aplicada sugere uma análise da fundamentação que a mesma originou em sede de decisão recorrida. Refere-se ali, em relação á aplicação do Regime de Jovens Delinquentes previsto no Decreto Lei 401/82, que:

No caso em apreço, os factos provados são de molde a obstaculizar o funcionamento da mencionada atenuação especial em relação a todos os arguidos, tendo em conta que o percurso de vida dos quatro arguidos (em maior ou menor grau) denota inconsistência e imaturidade na estruturação de um projecto de vida.

Com efeito, no caso dos quatro arguidos o seu percurso laboral é pautado pela instabilidade, como já o foi o percurso escolar na sequência da manutenção de uma atitude de irresponsabilidade e/ou dificuldades no cumprimento de regras.

Do que resulta, de forma evidente personalidades mal estruturadas, sem estável integração, no meio social, relevando ainda dificuldades de relacionamento com os outros, bem como que estão pouco sedimentados os valores sociais.

Deste modo, tem-se por evidente que não existem sérias razões para crer que, da atenuação especial no referido artigo 4.º do D.L. nº 401/82, resultem vantagens para a reinserção social dos arguidos.

Razão pela qual se afasta a aplicação do referido regime.

     Mais se refere em relação aos factores de medida da pena aplicada:

Relativamente aos crimes de roubo impõe-se ponderar em relação aos arguidos GG e AA:

- as exigências de prevenção geral são elevadas, tratando-se de um tipo de crime que se generalizou e que, sendo cometido também em pleno dia (no caso das ofendidas EE, DD e FF), cria um forte sentimento de insegurança nas pessoas, provocando grande alarme social. O mesmo se diga em relação à situação em que são ofendidos HH e II, abordados no interior da sua residência, espaço de privacidade e tranquilidade. Na verdade, dada a crescente tendência de aumento desta criminalidade que lesa para além do património, bens eminentemente pessoais, a qual dada a moldura em causa, no tipo agravado está definida na alínea l), do artigo 1.º, do Código de Processo Penal, como especialmente violenta.

- a intensidade do dolo, elevada, pois existiu na modalidade de dolo directo em todos os casos;

- o grau de ilicitude dos factos, o que implica ponderar o modo de execução e a gravidade das consequências:

- as consequências pessoais foram diversas, sem lesões e sem necessidade de intervenção hospitalar por parte dos ofendidos HH, EE e FF, mas já com lesões físicas por parte de II e DD; quanto às consequências materiais, verifica-se que foram subtraídos objectos de montante diferente, assumindo pouca relevância (com excepção do caso do interior da residência de HH); note-se em relação a esta última situação que releva ainda o envolvimento de, pelo menos, de mais quatro indivíduos para além do arguido o que torna a vítima mais indefesa e gera uma quase impossibilidade de reacção, tendo os factos ocorrido no interior da residência, onde não se encontravam outras pessoas a quem os ofendidos pudesse pedir ajuda ou ser auxiliados (vide sobre a medida concretamente da pena, no caso dos crimes de roubo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Novembro de 2010 - Relator: Raul Borges - , disponível para consulta em www.dgsi.pt);

- foram recuperados parcialmente os bens no caso da ofendida FF, a implicar que apesar de intenso o grau de ilicitude dos factos a gravidade das consequências, nesse caso, mostra-se reduzida atenta a recuperação, no que tange aos demais casos os bens não foram recuperados, com excepção do casaco no caso do HH;

- no caso da situação em que foi ofendida EE, uma vez que houve lugar à desqualificação da conduta e, consequentemente, esta situação não foi valorada ao nível do tipo legal de crime, é de valorar, nesta sede de determinação da medida da pena, a circunstância de o arguido ter praticado os factos com recurso à utilização de uma faca, que usou para a ameaçar;

- o arguido AA confessou os factos no que se refere à ofendida FF;

- a situação pessoal de cada um dos arguidos, precária, com tendência a desresponsabilizar-se sobre as condutas e sem capacidade reflexiva e crítica sobre os mesmos, o que demonstra que se encontram pouco preparados para manter condutas conformes ao Direito;

- a idade dos arguidos, à data da prática dos factos e actualmente, o que pode justificar alguma imaturidade,

- mas o percurso de vida dos arguidos AA e GG rejeitando activamente a imposição de regras familiares, abandonando os cursos em que se encontravam inscritos, sem qualquer alternativa e sem justificações consistentes, organizando o seu quotidiano em moldes imediatistas, sem demonstrar capacidade crítica sobre os factos e ainda o desenvolvimento de um processo de dependência aditiva de produtos estupefacientes, não obstante as medidas tutelares educativas a que foram ambos sujeitos, mostram que os mesmos prescindiram de procurar uma adequada inserção comunitária;

- a ausência de antecedentes criminais dos arguidos.

Relativamente aos crimes de furto

- a intensidade do dolo, elevada, pois existiu na modalidade de dolo directo;

- o valor dos objectos que estavam ao alcance de ser apropriados pelo arguido AA no interior de uma habitação (caso CC); 

- os valores dos objectos que foram efectivamente apropriados pelo arguido GG não superior a € 65,00 no primeiro caso, no valor de € 964,00, no caso K… S… S…, no montante de € 270,00 no caso do estabelecimento P… na P…, e de valor não apurado mas inferior a € 102,00 no caso das garrafas e bens alimentares da Escola, e de € 1500,00 e um computador no que tange à residência de BB, sendo relevante neste último caso que é pequeno no primeiro e no último casos;

- as consequências dos factos: apenas foram recuperadas as três garrafas na escola e os objectos do estabelecimento K… S… S…;

- os arguidos  GG e AA confessaram os factos relativos à residência de BB, sendo com relevo para a descoberta da verdade no que tange ao valor do montante em dinheiro subtraído;

- quanto à situação da sede do N… do S…, temos que o arguido GG com a sua conduta preencheu a agravante do arrombamento sendo desqualificado em razão do valor;

- a situação pessoal de cada um dos arguidos, precária, com tendência a desresponsabilizar-se sobre as condutas e sem capacidade reflexiva e crítica sobre os mesmos, o que demonstra que se encontram pouco preparados para manter condutas conformes ao Direito;

- a idade dos arguidos, à data da prática dos factos e actualmente, o que pode justificar alguma imaturidade, maxime nos casos dos arguidos LL e MM, o que não se garantindo um tratamento privilegiado quanto à moldura penal, pelas razões já aduzidas, deve contudo ser atendida na medida concreta da pena a aplicar;

- os arguidos não têm antecedentes criminais.

                                                               *

Assim, tudo visto e ponderado, e tendo em conta a intensidade do dolo na prática dos factos, atento o modo de execução supra referido em todas as situações, as condições pessoais, as condutas anteriores e posteriores aos factos, que revelam serem prementes as exigências de prevenção social, as elevadas exigências de prevenção geral no que tange aos crimes de roubo e de furto, o que reclama a necessidade de confiança comunitária na reposição contrafáctica das normas violadas, não obstante limitada pela culpa dos arguidos afiguram-se-nos adequadas ao caso as seguintes penas concretas:

……………………………….

Arguido AA

- quanto ao crime de furto qualificado (caso BB) dois anos e seis meses de prisão;

- quanto ao crime de furto qualificado na forma tentada (caso CC) um ano e seis meses de prisão;

- quanto ao crime de roubo simples (em que é ofendida DD), a pena de dois anos e 6 meses de prisão;

- quanto ao crime de roubo simples (em que é ofendida EE), a pena de três anos e 9 meses de prisão;

- quanto ao crime de roubo simples (em que é ofendida FF), a pena de dois anos de prisão.

Arguidos MM e LL

- quanto ao crime de furto qualificado (caso K… S… S…) dois anos e nove meses de prisão;

                                                      *

            Do cúmulo jurídico das penas impostas aos arguidos GG e AA

……………………

Relativamente ao arguido AA

No caso impõe-se salientar a homogeneidade (com claro pendor para os crimes em que em que se ofendem bens jurídicos pessoais) e o lapso temporal nos crimes praticados (3 de Abril, 30 de Agosto, 15, 19 e 20 de Setembro de 2010) e a personalidade do arguido expressa designadamente, nas suas condutas, em momento anterior e posterior aos factos, maxime o desprezo pelas regras e valores sociais, o que indicia uma carreira criminosa. Sublinhe-se que o arguido foi sujeito à medida de coacção de prisão preventiva em 4 de Maio de 2010 e desde essa data tem estado recluso.

O percurso do arguido demonstra grande precariedade na estruturação de um projecto de vida, marcado notoriamente por adesão a práticas desviantes, e sem qualquer inflexão não obstante o internamento na sequência de medidas tutelares.

Mostram-se, pois, limitadas as perspectivas de vida, face ao desenquadramento familiar, a baixa escolaridade e falta de preparação para enfrentar o mercado de trabalho.

Milita a favor do arguido a sua idade, o que permite ainda acreditar na sua capacidade de ressocialização e o facto de estar abstinente de consumos.

Assim, tudo visto e ponderado tem-se como adequada fixar a pena conjunta do arguido AA em 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.

III

             Face ao exposto importa a consideração das circunstâncias singulares que o caso vertente revela face ao regime legal abstractamente cominado. Tal consideração deve ser dirigida em primeiro lugar para a verificação dos pressupostos de atenuação especial a que alude o artigo 4º do Decreto Lei 401/82 e, nomeadamente, da existência de razões sérias para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do arguido.

O regime consagrado neste diploma, fundamentado na especial situação do jovem em termos de estruturação da personalidade, estrutura-se numa dupla perspectiva procurando evitar a pena de prisão e impondo a atenuação especial sempre que se verifiquem as condições prognósticas que prevê (artigo 4°), e por outro, pelo estabelecimento de um quadro específico de medidas ditas de correcção (artigos 5° e 6°).

Em última análise o legislador concede o seu empenho a uma aposta decidida no processo de socialização tornando este factor essencial na ponderação da pena a aplicar.

            O regime penal especial aplicável aos jovens entre os 16 e os 21 anos consubstancia, assim, uma opção de politica criminal que se impõe, por si e nos respectivos fundamentos, à modelação interpretativa dos casos concretos objecto de apreciação e julgamento. Tal perspectiva mantém a sua actualidade como se pode ver na Proposta de Lei n° 45/VIII,  ("Diário da Assembleia da República", II série-A, de 21 de Setembro de 2000) e, na respectiva Exposição de Motivos desta Proposta de Lei assenta-se na necessidade, indiscutida, de encontrar as respostas e reacções que melhor parecem adequar-se à prática por jovens adultos de factos qualificados pela lei como crime. «O direito penal dos jovens adultos surge, assim, como categoria própria, envolvendo um ciclo de vida», correspondendo «a uma fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório. Observa-se, com efeito, nas sociedades modernas, que o acesso à idade adulta não se processa como antigamente, através de ritos de passagem, como eram o fim da escolaridade, o serviço militar ou o casamento que representavam um "virar de página" na biografia individual. O que ocorre, hoje, é uma fase de autonomia crescente face ao meio parental e de dependência crescente face à sociedade que faz dos jovens adultos uma categoria social heterogénea, alicerçada em variáveis tão diversas como são o facto de o jovem ter ou não autonomia financeira, possuir ou não uma profissão, residir em casa dos pais ou ter casa própria».

«Este período de latência social - em que o jovem escapa ao controlo escolar e familiar sem se comprometer com novas relações pessoais e profissionais - potencia a delinquência, do mesmo modo que, a partir do momento em que o jovem assume responsabilidades e começa a exercer os papéis sociais que caracterizam a idade adulta, regride a hipótese de condutas desviantes».«É este carácter transitório da delinquência juvenil que, se quer evitar a estigmatização, deve ter-se presente ao modelar o sistema de reacções».

            Como se refere em decisão deste Supremo Tribunal (Acórdão de 7 de Janeiro de 2004 ) nesta intencionalidade de política criminal quanto ao tratamento pelo direito penal deste fenómeno social, uma das ideias essenciais é, como se salientou, a de evitar, na medida do possível, a aplicação de penas de prisão aos jovens adultos. Na verdade, «comprovada a natureza criminógena da prisão, sabe-se que os seus malefícios se exponenciam nos jovens adultos, já porque se trata de indivíduos particularmente influenciáveis, já porque a pena de prisão, ao retirar o jovem do meio em que é suposto ir inserir-se progressivamente, produz efeitos dessocializantes devastadores» (cfr. Proposta de Lei, cit.), constituindo um sério factor de exclusão.

Uma das traves mestras do regime de jovens delinquentes cruza-se com conceitos base do direito criminal como é o caso da intimidação e ressocialização, ou seja, a consideração do fim concreto que se pretende atingir na pessoa do arguido. Na verdade, por vezes é ténue a linha divisória que se pode traçar entre um efeito meramente intimidatório da pena como factor determinante de uma educação para o cumprimento da lei, o que conforma uma intervenção preventiva a nível do próprio arguido, da constatação da necessidade de recurso a um instrumento punitivo que coloque o jovem em contacto com a instituição de controle social reforçado que é a instituição prisional.

            A delimitação entre intimidação e ressocialização depende do facto de o autor se encontrar na situação de realizar uma conduta socialmente conforme e que, consequentemente só requeira uma chamada enérgica ao cumprimento das suas obrigações (função de advertência) ou que tal objectivo só possa ser atingido por meio de um processo especial dirigido com tal objectivo (ressocialização) ocorra ele através de uma forma ambulatória (suspensão condicional da pena) ou estacionária (execução da pena). No primeiro caso a pena é suficiente enquanto factor de oposição a um eventual impulso delictivo, não existindo o temor da comissão de novos factos puníveis; em tais casos o meio de reacção primário é a pena pecuniária.

Porem, face ao agente que não se encontra socialmente reinserido requerer-se uma transformação de todas as suas capacidades de motivação no sentido da inibição perante o delito; neles existe a necessidade de um processo estacionário ou ambulatório de realização. O  ponto de partida será, então, a necessidade de uma enérgica chamada ao cumprimento das obrigações para alcançar uma conduta livre de penas. Só quando, de acordo com a personalidade do autor e a sua carreira criminal anterior se conclua pela necessidade de um tratamento ressocializador é possível recorrer a este fim da pena.

            Por alguma forma tal ordem de considerações torna-se mais impositiva quando a alternativa se centrar numa decisão sobre a possibilidade de aplicação de uma pena de substituição. Esta dependerá sempre daquela expectativa optimista sobre o futuro do jovem.

Situação distinta é aquela outra em que as exigências de protecção do bem jurídico e, consequentemente, as exigências de prevenção geral positiva exigem a privação de liberdade. Aqui a situação é distinta pois que, embora se evidencie o intuito de incutir no arguido a procura de uma atitude recta e conforme ao Direito, perfilando um realinhar com os valores comunitários e a assunção de um caminho de ressocialização, igualmente é certo é que exigências de uma outra raiz, que não de prevenção especial, exigem o cumprimento de pena privativa de liberdade.

            Tal perspectiva dual, que é também orientada no sopesar das necessidades de prevenção geral, conjuga a gravidade do ilícito e a densidade da culpa na perspectiva de satisfação das expectativas da comunidade no cumprimento da lei e na tutela dos bens jurídicos e, por outro, o próprio percurso de vida do jovem e na crença de que o mesmo pode e vai inflectir no seu rumo de vida pelo que é ajustado um juízo positivo na sua regeneração. Neste juízo de prognose conta essencialmente a personalidade do jovem e a sua circunstância pois que o mesmo é produto de um determinado contexto.

Pode-se objectar que, considerando-se por essa forma, o juízo negativo de prognose é informado por um parâmetro que o menor não domina, ou seja, as suas condições de socialização. Porém, tal argumento só será atendível se arrancarmos de uma noção de determinismo inultrapassável, o que na realidade não sucede pois que muitas vezes aqueles que são poderiam ser condicionados pelos valores mais negativos que os rodeiam não só os ultrapassam como constituem modelos em termos de afirmação social e profissional

É, assim, evidente que o jovem, pelo simples facto de o ser, pode afirmar que o seu inicio de percurso de vida merece uma visão de esperança e de um juízo de prognose positiva, o qual, porém, poderá ser desmentido pelas suas concretas circunstâncias de condução de vida bem como pelas exigências de prevenção geral evidenciadas pela prática do facto. Caso tal juízo exista o mesmo pode e deve ter necessário reflexo numa pena que, embora privativa de liberdade, assume uma tonalidade quantitativamente diferente em relação á sua dimensão, bem como também o deverá assumir qualitativamente em relação á forma de execução pois que se trata de um jovem para quem a prisão poderá constituir uma oportunidade para adquirir competências

Face a esta explanação, que apenas pode relevar como premissa na lógica que nos leva á individualização da pena no caso concreto, impõe-se, agora, a consideração das circunstâncias singulares que este revela face ao regime legal abstractamente cominado.

Aqui chegado a questão fundamental será a de avaliar das vantagens da atenuação especial da pena para a reinserção social. Mas a avaliação de tal reinserção social tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso, e do percurso de vida do arguido, e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade.

Tal juízo terá, a nosso ver, de arrancar de um pressuposto incontornável do qual também arranca o legislador da Lei 401/82 ou seja o da existência de uma mais intensa capacidade de ressocialização, que é pressuposto incontornável, sobretudo quando o delinquente se encontra ainda no limiar da sua maturidade.

Pressupondo no arguido essa aptidão natural derivada da idade no sentido de se reintegrar socialmente a questão a formular será a de saber se existe motivo que invalide aquela presunção e que alimente a conclusão de que uma atenuação especial da pena não tem relevância em termos da sua reinserção. No caso concreto o alinhar da motivação que desenha a relevância de um juízo de prognose surge esbatido e consubstancia-se no facto de o arguido ser delinquente primário. Tal elemento não é, a nosso ver, suficiente para concluir que a atenuação especial cumpre os objectivos da prevenção a nível especial, dando ao arguido o sinal da inadmissibilidade nesta, como em qualquer sociedade evoluída, de comportamentos que colocam em causa bens jurídicos importantes

Por outro lado, e naquela que é a tese mais coerente a nível dos requisitos de aplicabilidade, e como se referiu, o regime contido no citado diploma legal contende, no caso concreto, com as necessidades de prevenção a nível geral. Na verdade, o peso das exigências de prevenção geral  aumenta em paralelo com a gravidade dos factos.

As considerações sobre a função da pena na prevenção da prática do crime, inibindo futuros infractores, ou, numa linguagem mais gongórica, a manutenção da fidelidade ao direito por parte da população assumem um importância acrescida perante crimes que reflectem um patamar já elevado de culpa e ilicitude.

É uma questão de confiança da população na Administração da Justiça ou reprovação da comunidade perante a tolerância injustificada pelas circunstâncias do caso concreto.

            Quando, como no caso vertente, se identifica um percurso de vida marcado pela anomia; pela indiferença pelas normas; pelos comportamentos desviantes e disfuncionais não se vislumbra como é que, simultaneamente, se pode conjugar uma aposta decidida num futuro comportamento positivo pelo arguido. Tal desconfiança em relação a um juízo de prognose positivo ainda é mais esbatido quando nos deparamos com crimes que, não obstante a forma artesanal de execução, implicam a colocação em causa de valores fundamentais como a própria integridade física

    Considerando por esta forma entende-se por correcta a não aplicação ao arguido da medida  de atenuação especial contida no Decreto-lei 401/82.

Ultrapassado este momento prévio de aplicação do regime cominado no citado diploma lela-D.L.401/82- resta agora verificar da medida das penas parcelares aplicadas ao arguido.

            A primeira ideia a reter é a de que não merecem qualquer censura os factores elencados na decisão recorrida os quais evidenciam os itens relevantes á face do artigo 70 e seguintes do Código Penal.

            A densidade da ilicitude considerada global e parcelarmente é elevada e a culpa apresenta-se sob a forma directa. A favor do arguido apenas se poderá elencar a idade que atento o facto de o mesmo se encontrar no patamar da idade adulta deverá assumir um peso relevante.

            A estratégia de não prestação de declarações não pode, nem deve, ser minimamente valorada em sentido negativo para o arguido atento o seu direito ao silêncio mas invalida qualquer consideração sobre uma postura de arrependimento e colaboração que, essa sim, seriam objecto de avaliação positiva.

            Nesta conformidade relativamente ás penas parcelares, considerando os referidos factores de medida de pena em que relevam no sector atenuativo a idade e o facto de ser delinquente primário, entendem-se por adequadas as seguintes penas:

Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, nº 1, e 204.º, nº 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.º, todos do Código Penal na pena de 2 (dois) anos de prisão (caso da casa BB – NUIPC 469/10.6PAOLH);

Pela prática de um crime de furto qualificado sob a forma tentada, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 203.º, nº 1, e 204.º, nº 2, al. e), com referência à al. e) do art. 202.º, todos do Código Penal na pena de 1 (um) ano de prisão (residência de CC – NUIPC 1025/10.3PAOLH);

Pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do Código Penal na pena de 2 (dois) anos de prisão – (ofendida DD - NUIPC 1107/10.1PAOLH); 

Pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do Código Penal na pena de 3 (três) anos de prisão (ofendida EE – NUIPC 1123/10.3PAOLH);

Pela prática de um crime de roubo simples, p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do Código Penal (ofendida FF – NUIPC 1131/10.4PAOLH) na pena de 2 (dois) anos de prisão;

Considerando as penas parcelares indicadas e a culpa global em que se salienta uma persistente e reiterada opção desvaliosa em termos de vida condena-se o arguido AA na pena conjunta de seis anos de prisão

Termos em que se julga parcialmente procedente o recurso do arguido AA.

Sem custas

Lisboa, 20 de Outubro de 2011


Santos Cabral (relator)
Oliveira Mendes


[1] Teve-se em consideração para apuramento da data e hora dos factos o auto de notícia de fls. 3, a reportagem fotográfica de fls. 28 e 45, os autos de apreensão de fls. 34 e de fls. 41, os autos de exame e avaliação de 46, as facturas de fls. 69 a 71 dos autos em apenso e auto de entrega de fls. 72.
[2] Para apuramento da data e hora dos factos teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 3 conjugado com as declarações prestadas pela testemunha RR.
[3] Teve-se em consideração a reportagem fotográfica de fls. 30, 51 a 54, os autos de apreensão de fls. 35, 38, 47, 49, termo de entrega de fls. 78 e factura de fls. 82, dos autos em apenso.
[4] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2
[5] Teve-se em consideração a lista de objectos de fls. 4 confirmada de modo impressivo pela testemunha JJ, chefe de alcateia, o auto de busca e de apreensão de fls. 12, a reportagem fotográfica de fls. 23, do inquérito apenso identificado.
[6] Foram entregues como resulta do auto de fls. 318, dos autos principais.
[7] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 4.
[8] Teve-se em consideração a reportagem fotográfica de fls. 9 a 14, autos em apenso.
[9] Para apuramento da data e hora teve em consideração o auto de notícia de fls. 3 do apenso respectivo.
[10] Como resulta do auto de apreensão de fls. 7 e 8 e auto de entrega de fls. 9 e 10, do referido apenso.
[11] Para apuramento da data e hora teve-se em, consideração o auto de notícia de fls. 3.
[12]  Como resulta da reportagem fotográfica de fls. 7, dos autos apensos.
[13] Como resulta da reportagem fotográfica de fls. 6, dos autos apensos.
[14] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 3.
[15] Como resulta da factura de fls. 6 dos autos apensos.
[16] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2 do respectivo apenso.
[17] Ancorou-se o tribunal no auto de apreensão de fls. 410 e 411, reportagem fotográfica de fls. 412 (telemóvel), 412, e auto de exame e avaliação – constante a fls. 418, dos autos principais.
[18] Para apuramento da data e hora dos factos teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 3 do respectivo apenso.
[19] Teve-se em consideração a reportagem fotográfica de fls. 8 a 16.
[20] Como resulta do termo de entrega de fls. 6 do respectivo apenso.
[21] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2 do respectivo apenso.
[22] Teve-se em consideração a reportagem fotográfica de fls. 4 e 23, o Auto de busca e apreensão de fls. 12 e 13, autos em apenso.
[23] Para apuramento da date e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 3 do respectivo apenso.
[24] Teve-se em consideração a factura de fls. 282 dos autos principais.
[25] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2 do respectivo apenso.
[26] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2 do respectivo apenso conjugado com o depoimento da testemunha NN que referiu que se encontrava já com o estabelecimento encerrado – a hora de encerramento é à meia-noite – e em limpezas quando os factos ocorreram.
[27] Reportagem fotográfica – constante a fls. 194, autos principais.
[28] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2.
[29] Tendo em conta que as garrafas já se encontravam abertas e que os bens foram embalagens de leite e de bolachas.
[30] Teve-se em consideração o auto de apreensão de fls. 5 e a reportagem fotográfica de fls. 7 e 8 dos autos apensos, mas não se prova que o arguido tenha tentado retirar os cabos e transportar o computador e monitor.
[31] Para apuramento da data e hora dos factos teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2 do respectivo apenso.
[32] Ancorou-se o tribunal no auto de apreensão de fls. 254 dos autos principais e na reportagem fotográfica – constante a fls. 14 e 15, auto de exame e avaliação de fls. 16, dos autos apenso e no auto de reconhecimento de objectos de fls. 392 e do termo de entrega de fls. 396 dos autos principais.
[33] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 3.
[34] Ancorou-se o tribunal no auto de apreensão de fls. 5 e no mandado de condução de fls. 6 dos autos apenso. O exame do Laboratório de Polícia Científica encontra-se a fls. 391 dos autos principais.
[35] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia por detenção de fls. 4.
[36] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de denúncia de fls. 3 do respectivo apenso.
[37] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia de fls. 2 do apenso respectivo.
[38] Ancorou-se o tribunal na reportagem fotográfica – constante de fls. 9, autos em apenso; auto de reconhecimento – constante de fls. 12, autos em apenso; autos em apenso; Auto de apreensão – constante de fls. 7, autos em apenso.
[39] Para apuramento da data e hora teve-se em consideração o auto de notícia por detenção de fls. 3 do apenso respectivo.
[40] Auto de reconhecimento – constante de fls. 12/14/16, autos em apenso; Auto de apreensão – constante de fls. 9, autos em apenso.
[41] Não foi confirmado pela testemunha CC.
[42] Não foi produzida qualquer prova sobre esse facto.
[43] Não se produziu prova sobre este facto, na medida em que ninguém descreveu as características das armas.
[44] Nenhuma das testemunhas inquiridas a esta situação nem a própria ofendida confirmam o referido facto, sendo certo que a mesma apresentava lesões fotografadas a fls. 27 do apenso.