ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


PROCESSO
14/09.5TELSB.L1.S1
DATA DO ACÓRDÃO 10/26/2011
SECÇÃO 3.ª SECÇÃO

RE
MEIO PROCESSUAL RECURSO PENAL
DECISÃO PROVIDO EM PARTE
VOTAÇÃO UNANIMIDADE

RELATOR SANTOS CABRAL

DESCRITORES ACORDÃO DA RELAÇÃO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
IMAGEM GLOBAL DO FACTO
CULPA
PREVENÇÃO ESPECIAL
PREVENÇÃO GERAL
COMPRESSÃO

SUMÁRIO I -A decisão de 1.ª instância, no caso vertente, foi proferida em 2011. Nessa data estava já em vigor a versão do CPP resultante das alterações que nele foram introduzidas pela Lei 48/07, de 29-08, como decorre do seu art. 7.º. Assim, sendo essa a versão do Código aplicável ao caso em apreço, tudo se resume a saber se, e em que medida, é recorrível a decisão do Tribunal da Relação em análise.
II - É o art. 432.º do CPP que define a recorribilidade das decisões penais para o STJ. De forma directa, nas als. a), c) e d), do seu n.º 1; de modo indirecto, na al. b) do mesmo número, através da referência às decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas Relações, em recurso, nos termos do n.º 1 do art. 400.º.

III -Estando aqui em causa um recurso interposto de um acórdão de um Tribunal da Relação proferido em recurso, perante um recurso em segundo grau, portanto, a norma a ter em conta é a daquela al. b).

IV -Ora, o Tribunal da Relação confirmou as penas parcelares fixadas pelo tribunal de 1.ª instância, tendo diminuído de 9 anos para 8 anos e 8 meses a pena conjunta aplicada. Assim, a al. b) do n.º 1 do art. 432.º remete-nos para a al. f) do n.º 1 do art. 400.º.

V - A Lei 48/07 alterou substancialmente esta disposição legal: se antes, era a pena aplicável o pressuposto (um dos pressupostos) da (ir)recorribilidade dos acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações, agora esse pressuposto passou a ser o da pena concretamente aplicada.

VI -No caso de concurso de crimes, pena aplicada é tanto a pena parcelar cominada para cada um dos crimes como é a pena conjunta. Assim, no caso de concurso de crimes, só são recorríveis as decisões das decisões das Relações que, incidindo sobre cada um dos crimes e das correspondentes penas parcelares, ou sobre a pena conjunta, apliquem ou confirmem pena de prisão superior a 8 anos.

VII - No caso sub judice, o Tribunal da Relação confirmou as penas parcelares que se situam num patamar inferior àquele limite. Nessa sequência, e na lógica do que vem exposto, a mesma decisão não é recorrível no que concerne às penas parcelares e apenas será admissível em relação à pena conjunta.

VIII - A pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares. Para a determinação da pena conjunta o decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos, acentuando-se a relação dos mesmos factos entre si e no seu contexto; a maior ou menor autonomia; a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão, bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento; também a receptividade à pena pelo agente deve ser objecto de nova discussão perante o concurso; ou seja, a sua culpa com referência ao acontecer conjunto, da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa.

IX -Porém, assumindo como aquisição fundamental a necessidade de uma visão global que procure detectar aquela culpa e a personalidade indiciada pelos factos, o certo é que tal perspectiva tem como pressuposto um conjunto de penas parcelares que carece de ser integrado numa única pena conjunta perdendo a sua individualidade. E, para além da diversidade genética dos factos que estão na origem das penas, está também em causa o facto de as regras de punição traçarem, no art. 77.º do CP, uma regra de aferição que corresponde ao máximo que é a soma material das penas, com o limite de 25 anos e o limite mínimo que é a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos crimes.

X - A realização e efectivação do princípio do Estado de Direito, no nosso quadro constitucional, impõe que seja assegurado um certo grau de calculabilidade e previsibilidade dos cidadãos sobre as suas situações jurídicas, ou seja, que se mostre garantida a confiança na actuação dos entes públicos.

XI - Em nosso entender, a certeza e segurança jurídica estão em causa quando existe uma tão grande margem de discricionariedade que equivale a uma completa indefinição em termos de aferição da pena aplicável, como é o caso de entre a mais grave das penas parcelares e a soma destas existir uma diferença que pode ir do mínimo de prisão até ao seu máximo. Assim, admite-se como critério complementar, e meramente indiciário na formulação da pena conjunta, se aponte que, na ponderação da imagem global dos crimes imputados e da personalidade, se considera que, tratando-se de uma personalidade mais gravemente desconforme com o Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave entre 1/2 (ou, em casos de grande intensidade da culpa ou gravidade dos factos, 2/3) e 1/3 de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes, em concurso; tratando-se de uma personalidade menos gravemente desconforme ao Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave entre 1/3 e, nos casos excepcionais de menor culpa ou gravidade 1/4, de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso.

XII - Conforme tem sido afirmado pelo STJ, ao proceder-se ao cúmulo jurídico de penas, não pode deixar de se considerar a natureza e gravidade dos crimes praticados, não sendo a mesma coisa cometer determinado número de crimes de natureza patrimonial e o mesmo número de crimes contra a vida ou a integridade física das pessoas: daí que nos crimes contra a propriedade se torne necessário, ao fixar a medida da pena única, usar de um factor de compressão mais elevado. Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência. Igualmente deve ser expressa a determinação da tendência para a actividade criminosa expresso pelo número de infracções; pela sua perduração no tempo; pela dependência de vida em relação àquela actividade.

XIII - Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio, pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade que deve ser ponderado. Recorrendo à prevenção importa verificar em termos de prevenção geral o significado do conjunto de actos praticados em termos de perturbação da paz e segurança dos cidadãos e, num outro plano, o significado da pena conjunta em termos de ressocialização do delinquente para o que será eixo essencial a consideração dos seus antecedentes criminais e da sua personalidade expressa no conjunto dos factos.

XIV - No caso dos autos, e analisando a decisão recorrida, constata-se que o teor impressivo da consideração sobre o passado criminal do recorrente é por alguma forma conflituante com o interregno que sucedeu entre o ano de 2003 e a data em que tiveram lugar os factos dos presentes autos. Durante esse período o arguido constituiu uma empresa de consultadoria financeira e prosseguiu a sua formação com a conclusão de um mestrado e do doutoramento em economia financeira e contabilidade, encontrando-se presentemente a tirar o doutoramento em gestão de empresas. No ano de 2008 o arguido iniciou carreira como docente universitário e um negócio de comercialização de automóveis que adquire na Bélgica, pela venda dos quais recebe uma comissão.

XV - Por igual forma, uma apreciação do percurso do arguido em termos sociais e profissionais transmite-nos a conclusão de que o arguido é dinâmico, empreendedor, sociável, solidário, impulsivo com tendência ao descontrolo, tem facilidade de comunicação e apresenta permeabilidade à influência de terceiros e consciência crítica dos seus actos; estabeleceu relação adequada com a família, tendo laços afectivos privilegiados com a mãe e irmã; vive, desde 2003, com uma companheira, com quem mantém relação estável e gratificante, tendo o agregado familiar que formam uma situação económica desafogada. O mesmo é pessoa conceituada entre os seus amigos e familiares, com cujo apoio conta. Em termos de cumprimento de reclusão, o arguido tem comportamento adequado às regras institucionais e apoia o estudo de outros reclusos nas áreas de economia e matemática.

XVI - Assim, se é certo que não se pode ignorar o passado criminal do arguido, igualmente é certo que tem relevância o facto de os ilícitos praticados surgirem em contradição com uma evolução social, familiar e económica que apontavam exactamente em sentido contrário. Considerando globalmente todo o quadro indicado e valorando, também, o segmento positivo do itinerário de vida do arguido, entende-se por adequada a pena conjunta de 8 anos de prisão (tendo presente que o arguido foi condenado em duas penas de 4 anos de prisão, pela prática de dois crimes de roubo agravado, nas penas, respectivamente, de 3 anos e 2 anos e 8 meses de prisão, pela prática de dois crimes de sequestro, 2 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo simples, 10 meses de prisão, pela prática de um crime de sequestro, e 4 meses de prisão, pela prática de um crime de coacção na forma tentada).


DECISÃO TEXTO INTEGRAL Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

Por acórdão de 17 de Agosto de 2010, proferido pelo Tribunal Colectivo da 1.ª Vara Mista do Tribunal da Comarca de Loures, o arguido AA [e outros] foi condenado na pena única de nove (9) anos de prisão resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas pelos também seguintes crimes: duas penas de quatro (4) anos de prisão pela autoria material de dois crimes de "roubo agravado", da previsão normativa dos arts. 26.º e 210.º, n.º 2 b) do Código Penal; três (3)anos e dois (2)anos e oito (8)meses de prisão, respectivamente, pela autoria material de dois crimes de "sequestro", nos termos dos arts. 26.º e 158.º, n.º 2/b) do Código Penal; dois (2)anos de prisão pela autoria material de um crime de "roubo simples", nos termos dos arts. 26.º e 210.º, n.º1 do Código Penal; dez (10) meses de prisão pela prática de um crime de "sequestro", nos termos dos arts. 26.º e 158.º, n.º 1 do Código Penal; sete (7) meses de prisão pela prática de um crime de "coacção", nos termos dos arts. 26.º e 154.º, n.º 1 do Código Penal; quatro (4)meses de prisão pela autoria material de um crime de "coacção", na forma tentada, nos termos dos arts. 22.º, 26.º e 154.º, n.º 1, todos do Código Penal.
Desta decisão, entre outros, recorreu o arguido AA para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 16 de Março de 2011, exarado a fls. 4029 e segs., e
no que a este arguido diz respeito, decidiu o seguinte:
a) - Modificar a decisão de facto proferida quanto ao crime de "coacção" supra identificado em consequência do que o absolveu da prática desse crime (fls. 4168 e 4169];
b) - Confirmar todas as outras penas parcelares aplicadas ao arguido, e bem assim o demais decidido pela 1.ª Instância;
c) - Reformular o cúmulo jurídico efectuado ao arguido AA, por força da absolvição quanto ao crime referido em a), e nessa medida condená-lo agora na pena única de 8 anos e 8 meses de prisão.
As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que:
A) O presente recurso visa questionar a douta decisão recorrida quanto à matéria de direito relativamente a: 1) Das intercepções telefónicas/ violação do disposto no artigo 187 nº 1 do p.p. com referência ao disposto nos artigos 18º e 34 da C.R.P.; 2) Da árvore do fruto envenenado" ou do efeito à distância; 3) Interpretação dada pelo Tribunal violou o artigo 147 nº7 do C.P.P. e artigo 32 da CRP; 4) Violação do princípio da livre apreciação da prova; 5) Da inexistência de responsabilidade penal pela alegada prática de crimes de coacção, previstos e punidos nos artigos 154 nº 1 e 2 do CP.; 6) Da medida da pena aplicável - Pena excessiva; 7) Da existência de fundamento para a suspensão da execução da pena relativamente ao arguido AA
1) A primeira questão que o arguido AA levanta prende-se, forçosamente, com a violação dos princípios da necessidade, subsidiariedade e proporcionalidade resultantes do artigo 187, nº 1 do C.P.P.
Importa ter presente que os presentes autos tiverem a sua génese noutros autos em que era arguido o também arguido nos presentes, BB por alegada informação da existência de uma "guerra entre gangues."
Nunca será demais referir que o arguido AA foi detido pela alegada prática de crimes de associação criminosa; de terrorismo e de tráfico de droga e de armas, d. auto de detenção e acta primeiro interrogatório judicial de arguido detido, a fIs ...
Este elemento indiciário, resultante de Um outro processo em que o investigador titular acabou por ser o mesmo dos correntes autos, foi e é, salvo o devido respeito, manifestamente insuficiente para se deferir a realização de escutas telefónicas.
Recorde-se que o arguido AA não foi detido nem preso preventivamente pela alega da prática de crimes de sequestro e/ou roubos agravados.
Refere-se que não havia qualquer outro meio probatório que possibilitasse o avanço das investigações.
A questão é a de saber se para Sé autorizar urna intercepção telefónica ao Tribunal basta a indicação do crime de catálogo, ou sé é imperativo invocar e demonstrar, pelo menos, a existência de indícios objectivos e consistentes da prática desse crime.
Relembre-se que a matéria alegadamente em causa que deu origem à extracção de certidões de uma escuta telefónica noutro processo para o presente padece de dois elementos a saber:
- O referido processo em que o arguido BB foi suspeito e constituído arguido não passou, quanto a este, do inquérito, tendo sido proferido despacho de arquivamento
- A alegada guerra entre gangues não passou de uma mera informação anónima desprovida de qualquer fundamento, tanto mais que, nos correntes autos, nenhum dos arguidos foi condenado pelos factos que motivaram a intercepção das escutas telefónicas.
Assim tal decisão com base nas informações recolhidas é manifestamente insuficientes atentos os interesses em conflito.
O despacho judicial autoriza inicialmente as intercepções telefónicas, sem, como lhe competia, proceder à avaliação prévia dos indícios e da necessidade das aludidas escutas telefónicas.
Daqui resulta, salvo melhor opinião, que não existia fundamento legal para proceder a uma escuta telefónica com base nos indícios existentes os quais, recorde-se, não vieram a ser provados em Tribunal.
Na verdade, não ficou demonstrado, no douto despacho, a impossibilidade de prossecução do objectivo almejado por meio menos gravoso.
Com o devido respeito, os autos fazem fé pelo aquilo que está lá escrito e não por aquilo que não está lá escrito.
Na estrita aplicação do direito torna-se imperativo a verificação dos requisitos que presidem à autorização de uma escuta telefónica. Tal ponderação dos requisitos é feita, ou deverá se feita, antes da sua autorização e não à posterior aquando da análise. dos seus resultados.
Daqui resulta que, no momento da autorização da intercepção da escuta telefónica, os requisitos que presidem a autorização não se encontravam preenchidos.
Diferente interpretação ao disposto no nº 1 do artigo 187 do CP.P. representa uma clara inconstitucionalidade, por força dos artigos 182 e 342 da CRP. a qual, desde já, se arguiu.
De tal forma que a final o arguido BB, suspeito nas intercepções telefónicas que originaram a informação e posterior extracção de certidão não foi acusado por qualquer dos crimes em que era suspeito no anterior processo (ao que foi classificado pelo próprio M.P, como um processo de intenções caso seguisse para a fase de julgamento, cf. despacho de fIs ... ) tendo sido com este arguido que todo o processo se iniciou.
Tal facto vem a corroborar a tese da defesa do arguido AA, de que as intercepções telefónicas, tal como vieram a ser autorizadas, careciam de comprovação, através de outros meios de prova, nomeadamente a continuação de vigilâncias para a percepção da existência ou não de movimentações suspeitas (nomeadamente de guerras entre gangues) para poderem ser devidamente valoradas para a necessidade de autorizar um meio de prova, tão invasivo da vida provada, como são as intercepções telefónicas.
Por outro lado o arquivamento (no primeiro processo que correu os seus termos no Algarve) e à posteriori, a absolvição do arguido BB nos presentes autos no que concerne aos alegados factos relativos às guerras entre gangues, permite concluir pela inutilidade das intercepções telefónicas.
Por conseguinte foi violado o princípio da subsidiariedade que impõe, além do mais, a demonstração de indícios fortes da prática de um dos crimes mencionados no artigo 187 C do C.P.P., pelo que e por falta da sua fundamentação se argui a nulidade de todas as intercepções telefónicas.
Dispõe ainda o artigo 262 nº1 do CP.P. que o inquérito compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação.
Atenta a natureza dos actos praticados e ao tempo - vasto e prolongado - em que ocorrem e com a relação intrínseca existente entre os actos em si, torna-se imperativo determinar se a simples declaração de vicio respeitante a um desses actos deve, ou não estender aos demais que lhe sejam subsequentes.
A limitação da descoberta inevitável baseia-se no principio que o efeito da prova proibida não impossibilita a admissão de outras provas derivadas quando essas mesmas provas tenham sido descobertas através de outra actividade investigatória legal e só nestes casos.
No caso de limitação de mácula dissipada o princípio é de que uma prova! não obstante derivada de outra prova ilegal possa vir a ser aceite, sempre que os meios para a alcançar tenham autonomia relativamente a esta, de tal modo que possam produzir uma atenuação decisiva da ilegalidade precedente.
Ora forçoso somos de concluir que, no caso em apreço! as escutas realizadas ao arguido BB mostraram-se infrutíferas e! pelo exposto, as consequentes intercepções padecem de legalidade razão pela se arguiu a nulidade de todas elas.
Já em sede de fundamentação do acórdão recorrido, a fIs ... , verifica-se que o depoimento dos ofendidos DD e FF não são corroborados por demais elementos de prova legalmente admissíveis.
Não existem provas produzidas em audiência de discussão e julgamento que possam por exemplo, aferir qual o destino dos alegados bens furtados ainda assim o Tribunal considerou como provado que os mesmos se destinavam a desmantelamento e venda; De igual modo não resulta provado que o arguido AA tenha participado nos crimes de sequestro e de roubo existindo, isso sim, a certeza que algo terá se passado na habitação de Odivelas entre o arguido EE e o ofendido que levou à intervenção do arguido AA no intuito de os separar; de igual modo o arguido AA não foi reconhecido, por fotografia e/ou pessoalmente! em Tribunal pelo ofendido GG e as testemunhas melhor identificadas a fls... (funcionárias da residencial V...) não sendo, tão pouco perceptível nos fotogramas de fls... a identidade dos sujeitos (relembre-se que os foto gramas estiveram disponíveis nos órgãos de comunicação social momentos imediatamente posteriores à apreensão das imagens por parte dos inspectores da P.J. não tendo existido, em qualquer fase processual, o pedido de consulta e/ou de certidão dos fotogramas por parte dos órgãos de comunicação social nem tão pouco existe no processo a extracção de certidão para efeitos de apuramento das eventuais responsabilidades disciplinares e criminais das referidas gravações).
Assim e tal como já defendido supra, admitida que seja a dúvida, o Tribunal recorrido deveria ter aberto mão do instituto do in dubio pro reo, como medida de mais elementar prudência e decorrente dos princípios constitucionais e sagrados na ponderação e apreciação da prova, o que, salvo o devido respeito, não sucedeu.
Resulta inequivocamente provado através dos depoimentos das testemunhas GG e HH, que os reconhecimentos realizados na P.J. não cumpriram os requisitos impostos pelo artigo 147 nº1 do CP.P ..
Ainda que não seja dito explicitamente parece-nos da leitura atenta do acórdão que o Tribunal ora recorrido optou por desvalorizar os reconhecimentos pessoais efectuados na P.J. por não existirem garantias de os mesmos terem sido obtidos de modo isento e não orientado.
No caso em concreto dúvida não existem que o reconhecimento efectuado na PJ. não cumpriu com as formalidades exigidas pelo artigo 147º nº 1 e 2 do C.P.P. razão pela qual, nos termos do n.2 7 do mesmo artigo: "o reconhecimento que mio obedecer ao disposto neste artigo não tem valor como meio de prova, seja qual for a fase do processo em que ocorrer."
Pelo exposto a interpretação dada pelo Tribunal no douto acórdão, de desvalorizar o conteúdo dos autos de reconhecimento, violou o disposto no nº 7 do artigo 147 do CPP. uma vez que o Tribunal tinha, obrigatoriamente, que declarar que os reconhecimentos de pessoas de fls ... não tinham valor como meio de prova com as demais consequências que daí se retiram.
Na apreciação das provas o julgador deve nortear a sua actividade, procurando analisar de forma lógica as provas, todas as provas produzidas, através de um juízo de normalidade das coisas, de onde resulte a reconstituição dos factos com um certo grau de certeza.
O que está em causa neste caso resulta da conjugação de dois princípios fundamentais a saber: o dever de fundamentação e o da livre apreciação da prova. Como se referiu supra a douta fundamentação é irrazoável, denota falta de clareza e não valorou as provas relevantes em termos legais, entre elas o depoimento do arguido. Por outro lado, também foi violado o princípio da livre apreciação da prova, dado que não apreciaram as provas de acordo com as regras da experiência.
Assim, resulta inequivocamente demonstrado que, pese embora o Tribunal tenha desvalorizado os reconhecimentos pessoais de fis ... não declarou que os mesmos não tinham qualquer valor como meio de prova.
A interpretação dada pelo Tribunal- ou a ausência de interpretação conforme o disposto no nº 7 do artigo 147 nº1 do C.P.P. como se impunha - traduz, claramente numa violação do princípio da livre apreciação da prova.
Também sobre esta matéria se reitera e reproduz, ipsis verbis, o já referido no ponto 2 da impugnação da matéria de direito, sobre a teoria da árvore do fruto envenenado.
Efectivamente e ao contrário do afirmado pelo Tribunal recorrido não existe qualquer meio de prova e/ou prova que possa, com a segurança que se lhe exige, afirmar que "são evidentemente os sujeitos que aparecem nas fotografias retiradas do vídeo de vigilância da residencial que se encontram juntas ao processo" não traduzindo tal expressão do que a clara violação do princípio da livre apreciação da prova, senão vejamos:
As testemunhas explicaram o modo em que ocorreram os reconhecimentos pessoais na P.J. e que, tal como o Tribunal admitiu não garantem a isenção e, nossa afirmação, a legalidade que se lhes impõe;
As testemunhas de acusação GG, HH não reconheceram o arguido AA em julgamento;
Nas fotografias retiradas da residencial V..., juntas a fls .. " não é perceptível que um dos suspeitos seja o arguido AA;
Importa realçar que, tal corno já referido anteriormente, tais fotogramas foram publicados em diversos órgãos de comunicação social durante o decurso do processo sem que tenha existido qualquer despacho a autorizar a sua divulgação e/ou tenha existido qualquer despacho posterior a ordenar a instauração de processo-crime por quebra do segredo de justiça;
Existe na legenda elaborada pela PJ dos fotogramas retirados das câmaras de videovigilância da residencial V... a identificação de alegados arguidos que não o arguido AA, os quais, registe-se, vieram a ser absolvidos precisamente por causa dos reconhecimentos efectuados, conforme refere o douto acórdão a fIs ... ;
Inexiste qualquer prova produzida em julgamento de onde se extraia que "A confirmá-lo surge o facto de a viatura de GG ter sido, indocumentada, apreendida no II -Stand M..., onde, segundo indicação do responsável feita constar no auto cautelar, foi deixada pelo arguido AA/ bem como a circunstância de a facturação detalhada respeitante às comunicações deste mostrar que na data em apreço fez deslocações no território consonantes com o item da situação. "
Muito pelo contrário. Tal como já referido supra os documentos juntos pela P.J. referentes às localizações celulares dos telemóveis alegadamente pertença do arguido não reproduzem qualquer documento técnico (o raio da alegada cobertura de cada uma das antenas de localização foi aposto pelos próprios inspectores da P.J. não se trata de um documento da própria operadora de telemóveis com a indicação expressa da área/ raio de cobertura que, como é comummente sabido varia consoante a densidade populacional e a própria demografia do terreno, não sendo crível que um documento junto pela P.I,. extraído da ferramenta Google Earth, com uma escala escolhida pelo próprio O.P.C. e aposto um círculo - alegadamente para justificar a cobertura de rede e, por conseguinte, a alegada presença daquele telemóvel no território consonante com a situação. Veja-se que precisamente para demonstrar a incoerência dos referidos meios de prova a BTS que foi accionada pelo telemóvel do arguido AA no dia 27.02.2009, pelas 09H45 coloca o arguido precisamente num local diverso do local onde ocorreram os factos que, curiosamente, não foi apreciado pelo Tribunal a favor do arguido).
De igual modo não resultou provado, sequer, que o arguido AA tivesse qualquer actividade ilícita relacionadas com automóveis. Reitera-se que pelo arguido AA foi livremente dito que tinha, como actividade secundária, a venda de veículos automóveis, tendo, inclusive, justificado a relação comercial com o II -Stand M... por anteriores vendas de veículos automóveis que nada tiveram de ilícito.
No caso da alegada coacção a DD:
Não existiu qualquer comportamento por banda do arguido AA que não o admitido por si em sede de audiência de discussão e julgamento, nomeadamente que acudiu o arguido EE quando este estava a ser agredido pelo ofendido DD após ter-se iniciado uma discussão entre os dois em circunstâncias que o arguido não conseguiu determinar;
Não foi produzida qualquer prova que ateste a existência do alegado documento bem C como, admitindo por mera hipótese académica a existência desse documento, que o mesmo tivesse sido escrito nas circunstâncias descritas pelo ofendido;
Não foi inquirida qualquer testemunha apelidada de "João da Tasca" com relevo para a decisão da causa;
o ofendido mentiu, por diversas vezes nos correntes autos, inventando histórias; corrigindo a alterando factos à posterior, numa clara tentativa de enganar as autoridades do que realmente terá acontecido na fracção sita em Odivelas;
No que concerne à testemunha FF:
O mesmo admitiu que mentiu às autoridades por mais do que uma vez;
O mesmo admitiu que mentiu aos próprios arguidos dando-lhes informações falsas e que sabia não corresponderem à verdade;
O seu depoimento foi marcado por contradições, respostas evasivas, resultado do seu estado de saúde visivelmente alterado (em consequência de substâncias aditivas), não garantindo sequer tecer qualquer consideração adicional sobre a credibilidade do seu depoimento
A testemunha admitiu dedicar-se, regularmente, a actividades ilícitas, mormente, tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º da Lei da Droga, permanecendo impune (tendo referido perante a P.J.; tendo o M.P. titular do inquérito tido acesso às suas declarações; mesmo após a audiência de discussão e julgamento) pois não foi requerido e/ou ordenado a extracção de certidão das suas declarações para efeitos criminais, ao arrepio das mais elementares regras de um Estado de Direito.
Ao invés o depoimento desta testemunha - que se dedica à actividades ilícitas a coberto das autoridades policiais, que apresenta diversas versões sobre os factos mediante as autoridades sem que seja sequer advertido de que presta falsas declarações quando apresenta duas Versões distintas para os mesmos factos - foi considerado isento, coerente e credível ao ponto de considerar, em toda a história criada pela testemunha, a existência de um crime de coacção, na forma tentada.
Em suma o Tribunal julgou, salvo o devido respeito, erradamente quando condenou o arguido AA pela prática de dois crimes de coacção, sendo um deles na forma tentada.
Pelo exposto supra é notório que não existiu qualquer crime de coacção praticado pelo arguido AA razão pela qual impunha-se decisão diversa da ora recorrida por não se considerar como provados os factos melhor descritos a fls ...
O arguido AA foi condenado na pena única de 9 (nove) anos pela alegada prática de: - dois crimes agravados de roubo, nos termos dos artigos 200 e 210, nº9 2 aI. b) do C.P., na pena de 4 anos de prisão por cada um deles;
- dois crimes agravados de sequestro nos termos do artigo 269 e 158, nº 2, alínea b) do C.P. na pena de 3 anos de prisão por um deles e na pena de 2 anos e oito meses de prisão pelo outro;
- Um crime de roubo nos termos do artigo 262 e 210, n.o 1 do C.P. na pena de dois anos de prisão;
- Um crime de sequestro, nos termos do artigo 262 e 15S, n.° 1 do C.P. na pena de 10 meses de prisão;
- Um crime de coacção nos termos dos artigos 261 e 154, nº 1 do C.P. na pena de 7 meses de prisão;
- 1 (um) crime de coacçãol na forma tentada, no caso do ofendido FF. Também pelo já exposto e por mero princípio de economia processual reproduz-se, na íntegra, os comentários já elaborados ao depoimento e provas conexas com o alegado episódio com a testemunha FF.
Importa ainda ter presente que o arguido AA encontra-se detido, preventivamente, à ordem dos presentes autos d. despacho de fIs desde 19 de Março de 2009, ou seja, 19 meses a esta parte.
Resulta portanto demonstrado que o arguido AA deveria ter sido absolvido.
Pelo exposto e salvo o devido respeito considera-se as penas aplicadas excessivas.
Podemos concluir que é uma pena justa aquela que responda, adequadamente, às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa.
Oral no caso em apreço e atenta a posição assumida pelo arguido AA no presente recurso é peremptório que o mesmo pugna pela sua absolvição em todos os crimes em que foi condenado.
Contudo e ainda que assim não se entenda, no todo ou em parte, é liquido afirmar que as penas são aplicadas com a finalidade primeira de restabelecer a confiança colectiva na validade de uma norma violada e, em segundo lugar, na análise da eficácia do próprio sistema jurídico-penal. Por sua vez, a função da culpa é designadamente, a de estabelecer o máximo de pena concretamente aplicável - toda a pena tem um suporte axiológico normativo a culpa concreta.
Parece-nos que no presente caso estão satisfeitas as exigências estatuídas, razão pela qual as penas fixadas apresentam-se, salvo o devido respeito, altamente exageradas face ao grau de culpa imputável ao recorrente.
Termos em que se peticiona a absolvição do arguido AA ou, caso assim não se entenda, seja o mesmo condenado na pena única de 5 (cinco) anos, o que se considera justo e adequado, em face à moldura penal aplicável e do conjunto de factos dados como não provados e provados.
O douto acórdão recorrido considerou que a pena aplicável a este arguido (de acordo com o cúmulo jurídico efectuado) não deveria ser suspensa na sua execução.
O arguido encontra-se detido, preventivamente, à ordem dos correntes autos, desde 19.03.2009, cerca de 19 meses a esta parte estando completamente convictos que o contacto com o sistema prisional poderá desde já ter acautelado o arguido, quanto às consequências eventualmente emergentes da sua revogação;
De igual sorte, inexistem notícias nos autos que levem a crer em que o arguido não se encontre socialmente integrado, muito pelo contrário, ex:iste o relatório social de fIs ... , o qual demonstra, salvo o devido respeito, que o arguido encontra-se fortemente inserido socialmente e profissionalmente (tendo inclusivamente continuado os estudos doutoramento - no E.P.);
Somos de crer que a mera censura do fado e, muito em especial, a ameaça da pena, serão factores suficientemente inibitórios da prática de novas condutas criminosas e, por essa razão, a opção deveria ter sido - e deverá sê-lo - pela redução da pena e consequente suspensão da sua execução por se revelar adequado à salvaguarda das finalidades das penas.
Mostram-se verificados os requisitos estabelecidos no artigo 502 do CP., uma vez que está preenchida a prevenção especial nem tão pouco resulta demonstrado que a efectiva execução da pena seja indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização das expectativas comunitárias.
D) Norma jurídicas violadas:
O douto acórdão recorrido, na parte impugnada, violou o disposto no artigo 187 e artigos 18º e 34 da CRP; dado que considerou intercepções telefónicas no seguimento de uma certidão extraída noutro processo, ao arguido BB, o qual não veio a ser acusado e/ou condenado;
2) O douto acórdão recorrido, na parte impugnada, violou o disposto no artigo374º,nº 2 e 127 nº2 do C.P.P dado que não valorou a favor do arguido as provas produzidas em audiência de discussão e julgamento
3) O douto acórdão violou o disposto no nº 7, do artigo 147 do C.P.P. e artigo 32º da CRP urna vez que não reconheceu que os reconhecimentos pessoais realizados na P.J. não têm qualquer valor como meio de prova, não se podendo aproveitar os actos posteriores que foram praticados;
4) O douto acórdão violou o disposto nos artigos 40º, n.º 1 e 2 e 71ºdo C.P. dado que impunha-se a absolvição do arguido AA ou, pelo menos, a condenação de uma pena de prisão mais baixa daquela que foi aplicada, nomeadamente, de 5 anos de pena de prisão;
5) O douto acórdão violou o disposto no artigo 50º do C.P. dado que se impunha, atenta as circunstâncias que rodeiam o arguido AA e atento o princípio da prevenção especial, a suspensão da execução de pena privativa da liberdade com, se necessário, o cumprimento de injunções
Termos em que deverá ser concedido provimento ao recurso e, em consequência:
1) Ser este arguido absolvido pela prática dos crimes de que foi condenado.
6) Ser decretada a violação dos artigos 187º, n.º 1 e artigos 18º e 34º da CRP; dos artigos
374º, n.º 2 e 127º do C.P.P; do nº 7, do artigo 1479 do C.P.P. e artigo 32 da CRP dos artigos 40º, n.º 1 e 2 e 71 do C.P.; do artigo 50º do C.P. atenta a interpretação do Tribunal ora recorrido.
Foi produzida resposta advogando a manutenção da decisão recorrida.
O Exº Sr.Procurador Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça emitiu parecer concluindo que
- Deve ser rejeitado o recurso nos segmentos em que o recorrente convoca a reapreciação das questões - supra identificadas em 1., ponto 1.3 [proibições de prova, validade da prova por reconhecimento, violação do princípio da livre apreciação da prova, inexistência de responsabilidade penal e medida de cada uma das penas parcelares -, porque todas relativas aos crimes e penas parcelares cuja condenação viu confirmada pelo Acórdão da Relação, ora recorrido, por inadmissibilidade legal, nos termos dos arts. 432.º, n.º1b), 400.º, n.º 1f) e 420.º, n.º1/b), com referência ao art. 414.º, n.ºs 2 e 3, todos do CPP;
- Na improcedência do mesmo recurso é de confirmar a pena única aplicada pelo concurso de crimes: 8 anos e 8 meses de prisão, ou em qualquer caso, assim se não entendendo, de a graduar em medida não inferior a 8 anos de prisão.
Os autos tiveram os vistos legais.
*
A instância mantém-se regular.
Em sede de decisão recorrida considerou-se provada a seguinte factualidade:
1) Como consequência de um disparo que o atingiu, CC sofreu lesão corporal cuja extensão não se apurou e que o levou a ser submetido a tratamento no Hospital de Faro, onde deu entrada cerca das 18H IBM do dia 10.12.2008 e lhe foi extraído um projéctil de 9mm;
2) DD conhecia os arguidos EE, BB e JJ, tendo durante a primeira quinzena de Dezembro de 2008 tentado contactar o primeiro deles;
3) Pelo menos os arguidos EE, AA e BB estavam convencidos de que através de DD podiam obter muito dinheiro;
4) Assim, com esse propósito, no dia 16.12.2008, por volta da hora do almoço, em execução do determinado pelo arguido EE e colaborando com aqueles, o arguido BB telefonou a DD dando-lhe conta de que se podia encontrar com o arguido EE na habitação sita na Rua J... E..., nº. ..., R/c F..., em Odivelas, a qual por si era utilizada;
5)Seguidamente, conforme combinado, cerca das 18H do mesmo dia, DD dirigiu-se a Odivelas e, mediante indicações do arguido BB dadas telefonicamente, deslocou-se ao local referido em 4);
6) Então, junto ao prédio onde se situa a habitação dita em 4), o arguido AA acercou-se de DD dizendo-lhe que o arguido EE estava na aludida residência, onde o acompanhou;
7) No apartamento, onde também esteve o arguido JJ, o arguido EE disse a DD que se sentasse e, acto contínuo, atingiu-o por forma não concretamente apurada, deixando-o atordoado;
8) Então, não obstante desejar abandonar o local, DD viu-se impossibilitado de o fazer;
9) Seguidamente, ao longo de cerca de três horas e meia, pelo menos os arguidos EE e AA desferiram em DD socos, pontapés, amarraram-­no, deitaram-no dentro da banheira e verteram cera de velas acesas sobre o seu corpo, queimando-o;
10) A seguir, os arguidos EE e AA obrigaram DD a assinar um papel onde estava escrito que teria que entregar € 15 000 ao João da Tasca, no Areeiro;
11) Na ocasião em referência, os arguidos EE e AA apropriaram-se de um telemóvel Nokia, de um relógio Camel, de € 12 e do BI pertença de DD;
12) Em consequência do referido em 7) e 9) DD sofreu traumatismo facial com escoriações da hemiface direita e esquerda, ferida incisa do lábio superior com hematoma, traumatismo dos punhos com marcas circulares, equimose extensa do dorso da mão e edema, hematomas dos ombros com equimose extensa, sendo a do ombro esquerdo de maiores dimensões, lesões circulares bilaterais ao nível dos tornozelos com equimose circular, hematomas nas coxas mais extensos à direita, lesões circulares com cera nas coxas esquerda, direita e pé esquerdo e enfisema subcutâneo torácico direito, lesões que lhe determinaram directa e necessariamente 10 dias de doença, 8 com incapacidade para o trabalho geral;
13) Ao actuar da forma descrita, os arguidos EE e AA agiram com intenção de privar de liberdade DD, causar-lhe sofrimento físico, receio e obter quantia em dinheiro, do que o arguido BB estava ciente;
14) FF conhecia o arguido BB;
15) Na primeira quinzena de Janeiro de 2009, FF contactou o arguido BB tendo em vista adquirir € 2 500 de cocaína;
16) Em resposta, alguns dias depois o arguido BB enviou a FF uma mensagem escrita para o telemóvel onde dizia "o meu amigo vai entrar em contacto contigo";
17) Algum tempo volvido, dando sequência à mensagem remetida pelo arguido BB, o arguido EE contactou FF combinando ambos encontrar-se;
18) Na data aprazada e local acordado, FF entrou no automóvel F...F..., cinzento, de matrícula ...-...-XP, conduzido pelo arguido EE, em que se encontravam outros dois indivíduos, um deles o arguido JJ, os quais saíram do automóvel e ficaram de fora a vigiar a eventual aproximação de terceiros;
19) No decurso do encontro dito em 18), FF e o arguido EE acordaram encontrar-se à noite, mediante prévia combinação telefónica;
20) Mais tarde nesse dia, depois de contactos de e para o telemóvel do arguido EE com o nº. ---------------, o dito arguido e FF combinaram encontrar-se ao pé do Alvaláxia, junto ao estádio do Sporting;
21) Assim, cerca das 22H 30M, FF chegou ao local combinado onde o arguido EE já o esperava, junto à rotunda perto do Holmes Place, no interior de uma carrinha escura de matrícula estrangeira, encontrando-se o arguido JJ no interior;
22) Então, mediante combinação foi acordado que a transacção pretendida por FF se concretizaria, por volta das 20H, no dia 20.1.2009, no parque de estacionamento do hipermercado F... N..., em Alverca;
23) Assim, no dia 20.1.2009, cerca das 20H 15M, levando consigo € 2500, a fim de efectuar o pagamento do produto que pretendia adquirir, FF deslocou-se ao local combinado, conduzindo o automóvel de marca V..., modelo P..., de matrícula ...-...-..., pertença de MM, e estacionou;
24) Após dirigiu-se para o veículo cinzento, de marca F..., modelo F..., de matrícula ...-...-XP e sentou-se no banco traseiro ao lado do arguido AA, enquanto que à frente estavam os arguidos EE, ao volante, e JJ no lugar do pendura;
25) Alegando a eventual existência de câmaras de vigilância, o arguido EE sugeriu que saíssem daquele local e arrancou com o automóvel, com o qual deu várias voltas pela zona de Alverca, ao mesmo tempo que FF era questionado sobre o destino do produto que pretendia adquirir e sobre o perfil sócio económico de um seu amigo;
26) Ao tomarem conhecimento de que o indivíduo aludido em 25) era um engenheiro, que tinha um M... SLK e que vivia bem, residindo na Urbanização M..., os arguidos EE, AA e JJ mostraram-se interessados em ir a casa dele;
27) Então, o arguido JJ passou para o banco traseiro da viatura e, colocando o braço por cima do ombro de FF, disse-lhe: ·olha, isto ou é na boa ou é na má";
28) Simultaneamente o arguido AA, revistou os pertences de FF e retirou-lhe, pelo menos, o telemóvel, as chaves do V... P... e € 2 500;
29) Na mesma altura os arguidos EE, AA e JJ exigiram a FF que lhes indicasse onde ficava a casa do amigo, deslocando­-se mediante a sua resposta à Urbanização da M..., onde pararam no prédio junto à CGD;
30) Aí chegados, o arguido EE ordenou a FF que tocasse à campainha da casa do amigo, para que a porta fosse aberta a fim de os arguidos entrarem e assaltarem a residência;
31) Então FF, acompanhado do arguido EE, dirigiu-se à porta do prédio e, com o dito arguido afastado e encoberto para não ficar registado na câmara de videovigilância, simulou que tocava à campainha de casa do amigo;
32) Após, FF informou os arguidos que o amigo não atendeu, alegando que provavelmente ainda não tinha regressado do trabalho;
33) Acto contínuo, o arguido EE decidiu que iriam dar uma volta e mais tarde regressariam àquele local;
34) Assim, utilizando a viatura de marca F... referida em 24), os arguidos EE, AA e JJ, levando FF, dirigiram-se para a zona de Santa Iria e aí, depois de entrarem na Rua Dr. ... M... e passarem o túnel nela existente, pararam o automóvel;
35) Na ocasião aludida em 34) o arguido JJ desferiu socos na cabeça e cara de FF;
36) Após abandonarem o local dito em 34), o arguido EE telefonou ao arguido NN a quem disse: "olha, aquilo que eu não ia precisar, afinal vai ser necessário e vou aí buscar", dirigindo-se em seguida para Loures, para casa deste;
37) Ali chegados, o arguido NN, entregou ao arguido EE uma bolsa contendo um objecto que aparentava ser uma arma de fogo;
38) Na ocasião, o arguido JJ era igualmente portador de um objecto que aparentava ser uma arma de fogo;
39) Depois de deslocação a outros locais, os arguidos foram abastecer a viatura em que se deslocavam na bomba da R... sita na rotunda de Rio de Mouro, seguindo depois pelo IC 19, 28 Circular e eixo Norte/Sul até Sacavém, tomando em seguida a estrada nacional até Alverca;
40) Durante o percurso os arguidos iam dizendo a FF que devia colaborar no roubo à casa do amigo, enquanto o arguido JJ continuou a dar-lhe socos;
41) Chegados a Alverca os arguidos voltaram junto ao prédio da casa do amigo de FF, sem que também então tivessem logrado que a porta fosse aberta, o que os deixou irritados;
42) De imediato os arguidos colocaram novamente FF na viatura de marca F..., onde o arguido JJ lhe disse que iriam matar a sua mulher e arrancar a cabeça da sua filha e jogar à bola com ela;
43) De seguida os arguidos seguiram em direcção à estrada do ADARSE e pararam o automóvel numa zona descampada;
44) Aí, os arguidos fizeram FF sair do carro e, depois de o atirar para o chão, o arguido EE pontapeou-o no corpo e na cabeça ao mesmo tempo que lhe dizia que se não abrisse a porta do amigo morria ali;
45) Seguidamente o arguido EE levou FF para o interior do automóvel, sacou do objecto semelhante a uma arma de fogo dito em 41) e, obrigando FF a abrir a boca, colocou o cano daquele objecto no interior da mesma e disse-lhe que se não abrisse a porta do amigo seria morto;
46) Posteriormente os arguidos regressaram de novo ao prédio onde reside o amigo de FF;
47) Então, quando FF tocou às campainhas, um morador abriu a porta de entrada, altura em que ele pediu ajuda por estar a ser vítima de roubo;
48) Nesse momento, os arguidos puseram-se em fuga do local levando o automóvel de marca W..., modelo P..., bem como € 2 500 e uma carteira contendo documentos de identificação, cartões de crédito, livro de cheques e € 200 a € 300;
49) Ao actuar da forma descrita os arguidos EE, AA e JJ agiram com intenção de privar de liberdade FF e causar-lhe dor física durante esse período de tempo, bem como, com os meios e modos descritos, fazer seus os bens indicados em 48);
50) Quiseram, ainda obrigar FF a dar-lhes acesso à casa do amigo, bem sabendo que o que lhe fizeram e disseram era susceptível de provocar nele medo e inquietação, prejudicando a sua liberdade de determinação, objectivo aquele que não lograram alcançar por razões alheias às suas vontades;
51) O veículo de marca W..., modelo P..., de matrícula ...-...-SG, foi entregue num stand de automóveis com vista à sua venda ou desmantelamento;
52) Em consequência das agressões descritas FF sofreu escoriações a nível da face, dor ao nível da grelha costal e pescoço e contusão torácica, que lhe determinaram directa e necessariamente três dias de doença, com incapacidade para o trabalho;
53) Na noite de 26.2.2009, cerca das 23H, GG e PP foram encontrar-se com QQ no Posto de Abastecimento da BP, em Alvalade, a fim de este lhes arranjar pólen de haxixe que pretendiam levar para o Algarve;
54) Então, QQ contactou telefonicamente com um outro indivíduo e, cerca de 20 minutos depois, apareceram naquele local dois indivíduos a quem GG e PP, por cerca de € 75, fizeram a aquisição de 50 gramas de pólen de haxixe;
55) Seguidamente QQ convenceu GG e o amigo a irem tomar um copo ao Bairro Alto, ao que estes acederam, e, cerca das 2H 30M, do dia 27.2.2009, convenceu-os a pernoitarem na residencial V..., sita na Rua C... do T..., nO...., em Camarate, e a seguirem para o Algarve apenas pela manhã;
56) Por forma não apurada, os arguidos AA e JJ, tiveram conhecimento de que GG e PP se instalaram na residencial V...;
57) Assim, cerca das 8H 15M do dia 27.2.2009, os arguidos AA e JJ e outros dois indivíduos que não foi possível identificar, reuniram-se e, no veículo de marca F..., modelo M..., de matrícula ...-AE-..., que o arguido AA tinha ido buscar ao II -Stand M..., dirigiram-se para a residencial V...;
58) Cerca das 9H 45M, no parque de estacionamento junto àquela Residencial, os arguidos referidos em 57) e os seus acompanhantes abordaram GG quando este se dirigia ao seu automóvel de marca A..., modelo A..., de matrícula ...­...-lN;
59) Então, simulando a qualidade de agentes da autoridade e para melhor conseguirem os seus intentos, os ditos arguidos e os indivíduos que os acompanhavam algemaram GG com cintas plásticas e meteram-no no automóvel de marca F..., modelo M..., mantendo-o com a cabeça para baixo, e tiraram-lhe a chave do veículo referido em 58);
60) Na altura da abordagem, os ditos arguidos identificaram-se como agentes da autoridade exibindo o que aparentavam ser carteiras profissionais de Polícia, sendo que o arguido AA vestia um colete que ostentava a palavra polícia nas costas, o que levou GG a crer que estaria a ser alvo de uma acção policial;
61) Sempre que GG tentava levantar o olhar para perceber o que se passava era agredido por um dos arguidos referidos em 57) ou dos indivíduos que os acompanhavam;
62) Entretanto, os arguidos JJ e AA entraram na Residencial, onde o segundo se identificou como polícia, ostentando o que parecia ser uma carteira policial, trazendo o primeiro as chaves do quarto 214 onde GG pernoitara;
63) Posteriormente, depois de um dos indivíduos não identificado que acompanhava os arguidos ter abandonado o local levando o veículo de marca A..., modelo A..., de GG, os arguidos JJ e AA e o outro indivíduo que com eles se encontrava entraram na viatura de marca F..., modelo F..., sentando-se um ao lado de GG, a quem foi tapada a cabeça com um casaco, e arrancaram;
64) Durante cerca de duas horas os indivíduos ditos em 63) circularam por diversos locais e foram questionando GG acerca das suas posses e da sua família, agredindo-o com socos ou estaladas sempre que hesitava nas respostas ou demorava a dá-las;
65) Depois, já na serra de Sintra, retiraram-no da viatura, tiraram-lhe as cintas plásticas que lhe prendiam os pulsos e, quando lhe tiraram o casaco que lhe tapava a cabeça, pulverizaram-lhe a zona dos olhos com um spray, deram-lhe um soco no estômago e deixaram-no caído no chão com meia garrafa de água e € 20 para um táxi;
66) Os arguidos AA e JJ e os indivíduos que os acompanharam fizeram seus, pelo menos a viatura de marca A..., modelo A..., com a matrícula ...-...-lN, no valor de cerca de € 17 684, uma carteira, documentos pessoais e chaves da casa de GG e de duas outras viaturas;
67) A viatura referida em 66) foi entregue num stand de automóveis com vista ao seu desmantelamento e venda;
68) Cerca das 19H 12M do dia 27.2.2009, o arguido AA levou o automóvel de marca F..., modelo M..., de matrícula ...-AE-..., à oficina M... para alinhamento da direcção;
69) Pelo menos os arguidos EE, AA e JJ foram confiando que as vítimas nunca denunciariam os factos por si executados às autoridades, não só pelo receio de serem descobertas relativamente ao consumo de estupefacientes mas, também, pelo facto de a violência utilizada e as ameaças que lhes eram feitas as deixarem com receio de virem a sofrer represálias;
70) Para não serem localizados os arguidos referidos em 68) rodeavam-se de cautelas, designadamente, desligando, com habitualidade, os telemóveis no momento em que efectuavam os sequestros;
71) Quando existiam automóveis entre os bens subtraídos pelos aludidos arguidos, os mesmos eram colocados no II -Stand M..., sito no L..., em Sintra, para aí serem desmontados e/ou vendidos, como sucedeu com as viaturas mencionadas em 48) e 66);
72) Os arguidos utilizavam os seguintes telemóveis e IMEl's: EE - ---------------, ------------; AA ------------, ------------; JJ --------, -----------; BB -------------, ------------; RR ---------------; OO -----------, ---------------- e NN ------------------;
73) Os arguidos AA e JJ agiram com intenção de subtrair bens e dinheiro a GG;
74) Em 18.3.2009, na sua residência sita na Rua Prof. E... M..., nº. ..., ...°. ...., Póvoa de Santo Adrião, o arguido EE guardava o bilhete de identidade de DD, um colete anti-bala e três gorros com orifícios para a boca e olhos;
75) Em 18.3.2009, na sua residência sita na Rua da C..., nº. ..., ...° ...., Bobadela, o arguido JJ guardava, entre outros artigos, diversos gorros e bonés, luvas em material sintético, dois pares de matraca, duas tonfas, objectos estes relacionados com a sua prática desportiva, e uma soqueira em metal, cuja detenção sabia ser proibida;
76) Em 18.3.2009, na residência sita na Rua A... T... P..., T... nº...., ...° , em Santo António dos Cavaleiros, foi apreendido um aerossol de defesa com gás cujo princípio activo é clorobenzalmalononitrilo, com 37ml da marca WEINEN;
77) Em 18.3.2009, no seu automóvel de marca F..., modelo P..., de matrícula ...-BH-..., o arguido AA guardava documentos relativos ao veículo de marca F..., modelo M..., de matrícula ...-AE-... e um aerossol de defesa com gás cujo princípio activo é capsaicina;
78) Em 18.3.2009, na residência sita no C... do L..., P... M..., nO...., em Vilamoura, o arguido SS guardava uma pistola preta, de marca Savage, modelo 1905, de calibre 7,65mm, com munição na câmara e respectivo carregador com três munições de calibre 7,65mm, em boas condições de funcionamento, cuja posse sabia ser proibida;
79) Na mesma data, nos bolsos do seu casaco o arguido SS guardava seis munições de calibre .32S&W longo, com projéctil expansível e quatro munições de calibre.32curto com projéctil expansível, em boas condições de funcionamento;
80) Ao actuar da forma descrita de 2) a 79) os arguidos EE, AA, JJ, BB e SS agiram livre, voluntária e conscientemente, sabendo que as suas apuradas condutas eram proibidas por lei;
81) No dia 16.10.2009, cerca das 15H 26M, o arguido BB telefonou do posto fixo nº.----------- do Estabelecimento Prisional anexo à Polícia Judiciária para o telemóvel nº. ---------- de FF;
82) Nesse telefonema o arguido BB disse a FF que o arguido EE não estava contente com a postura dele no processo e que se retirasse a queixa ele acalmaria;
83) No Processo Comum Colectivo n°.366197.8GCTVD do 3° Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática, em 27.7.1997, de um crime de homicídio, uso de arma proibida e outros, o arguido JJ foi condenado, por acórdão de 12.3.1999, transitado em julgado em 4.8.2000, na pena de 16 anos de prisão, da qual lhe foi concedida em liberdade condicional em 20.6.2008;
84) No Processo Comum Colectivo nO.171/02.1JDLSB do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Leiria, pela prática, em 2001, de crimes de furto qualificado, detenção de arma proibida e falsificação de documentos, o arguido RR foi condenado, por acórdão de 18.2.2004, transitado em julgado em 4.8.2004, na pena de 8 anos de prisão que cumpriu até 20.2.2009;
85) A anterior condenação não serviu ao arguido JJ de suficiente advertência contra o crime;
Mais se provou que:
86) Os arguidos SS, BB e OO são pri--s;
87) O arguido OO desenvolveu-se no agregado familiar dos pais, organizado de forma funcional e economicamente sustentado;
88) O arguido OO concluiu o 10° ano de escolaridade e frequentou o curso de operador de máquinas agrícolas;
89) Com 17 anos o arguido OO iniciou percurso laboral, tendo desenvolvido desde então diversas actividades indiferenciadas;
90) O arguido OO autonomizou-se da família paterna com 19 anos, residindo desde 2006 com uma companheira de quem tem uma filha;
91) O arguido OO tem interesse na prática desportiva e aderiu ao movimento skinhead;
92) O arguido BB desenvolveu-se no agregado familiar dos progenitores de remediada condição económica e adequado relacionamento interpessoal;
93) O arguido BB concluiu o 10° ano de escolaridade, tendo posteriormente abandonado o ensino para iniciar percurso laboral e obter autonomia;
94) Ao longo do seu percurso laboral o arguido BB exerceu diversas actividades indiferenciadas;
95) Na adolescência o arguido BB aderiu aos ideais nacionalistas e ao movimento skinhead, tendo sido membro do grupo Hells Angels de que foi expulso em 2008;
96) No início da idade adulta o arguido BB cumpriu pena de prisão;
97) O arguido BB é impulsivo, tem dificuldade de auto-controlo e é permeável à influência externa;
98) O arguido BB tem um filho e conta com o apoio da progenitora, irmã e amigos;
99) Enquanto preso o arguido BB manteve comportamento institucional adequado manifestando interesse em, quando em liberdade, integrar a empresa da mãe e abrir uma loja de tatuagens;
100) O arguido SS viveu com os progenitores até aos 5 anos de idade, altura em que estes se separaram e ocorreu um afastamento quase total do pai;
101) A infância do arguido SS foi marcada pela violência familiar motivada pela toxicodependência do irmão e pela permissividade e sobreprotecção da mãe, de quem depende afectivamente;
102) O arguido SS concluiu o 9° ano de escolaridade, após o que abandonou o ensino, mantendo-se desde então, à excepção de dois curtos períodos em que desenvolveu actividade laboral, desocupado e economicamente dependente de mãe e avó;
103) Aos 15 anos o arguido SS manifestou simpatia pelos ideais nacionalistas e pelo movimento skinhead, a que aderiu;
104) O arguido SS é imaturo e influenciável;
105) Em 29.4.2003, por factos de 17.8.1999, o arguido RR foi condenado pela prática de um crime de receptação na pena de dois anos de prisão, cuja execução foi suspensa por 4 anos;
106) Em 14.7.2004, por factos de 7.8.2001, 10.9.2001, 27.9.2001 e 7.3.2002, o arguido RR foi condenado pela prática de crime de furto qualificado, falsificação agravada de documentos e detenção de arma proibida na pena única de 8 anos de prisão;
107) Em 12.3.2007, por factos de 3.12.1998, o arguido RR foi condenado pela prática de um crime tentado de burla na pena de 170 dias de multa, à taxa diária de € 2, que cumpriu;
108) Em 13.3.2007, por factos de 20.9.2000, o arguido RR foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado na pena de três anos de prisão;
109) Em 20.2.2009 o arguido RR foi colocado em liberdade condicional até 5.3.2011;
110) O arguido RR desenvolveu-se numa família tradicional que lhe incutiu o sentido do dever e da responsabilidade;
111) O arguido RR concluiu o 6° ano de escolaridade, tendo aos 13 anos abandonado o ensino para iniciar actividade laboral como aprendiz de mecânico;
112) Mais tarde o arguido RR desenvolveu actividade como segurança e posteriormente, com a cônjuge, abriu um estabelecimento de venda e distribuição de peças para automóveis;
113) No período em que esteve recluso em cumprimento de pena, o arguido RR dedicou-se à prática desportiva, que sempre o interessou, mantendo institucionalmente comportamento adequado;
114) O arguido RR vive com a mulher e dois filhos com quem estabeleceu uma relação sólida e afectivamente forte;
115) O arguido RR é pessoa conhecida e conceituada no meio de residência;
116) Em 1.3.2000, por factos de 10.6.1995, o arguido NN foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física e homicídio na pena única de 17 anos de prisão;
117) Em 3.12.2008 o arguido NN foi colocado em liberdade condicional até 11.6.2011;
118) O arguido NN desenvolveu-se no seio da família paterna, de mediana condição económica, que o educou num contexto estruturante;
119) Após concluir o 9° ano de escolaridade o arguido NN iniciou percurso laboral indiferenciado;
120) O arguido NN frequenta a licenciatura de Arqueologia e História;
121) Na adolescência o arguido NN integrou um grupo de jovens com vivência punk e consumiu estupefacientes, tendo aos 18 anos de idade aderido ao ideário nacionalista e ao movimento skinhead;
122) O arguido NN reside com os progenitores, desenvolve de forma irregular actividade como segurança e mantém relação afectiva gratificante;
123) O arguido NN é impulsivo e agressivo;
124) Em 17.12.1993, por factos de 25.2.1993, o arguido JJ foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física na pena de 245 dias de multa, à taxa diária de 300$00;
125) Em 2.7.1998, por factos de 24.6.1996, o arguido JJ foi condenado pela prática de um crime de detenção e uso de arma proibida na pena de 5 meses de prisão, substituída por igual período de multa à razão diária de 400$00, a qual lhe foi perdoada;
126) Em 17.12.1998, por factos de 13.8.1995, o arguido JJ foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física na pena de um ano e seis meses de prisão, da qual lhe foi perdoado um ano;
127) Em 7.1.1999, por factos de 16.12.1994, o arguido JJ foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 300$00, a qual foi amnistiada;
128) Em 4.7.2000, por factos de 27.7.1997, o arguido JJ foi condenado pela prática de um crime qualificado de homicídio na pena de 17 anos de prisão;
129) Em 20.6.2008 o arguido JJ foi colocado em liberdade condicional até 30.7.2013;
130) Em 14.3.2002, por factos de 16.10.1996, o arguido JJ foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física na pena de 250 dias de multa, à taxa diária de € 2, a qual lhe foi perdoada;
131) O arguido JJ é oriundo de uma família tradicional e conservadora, com uma dinâmica relacional equilibrada que procurou incutir ao arguido os valores do trabalho e da responsabilidade, regras e disciplina;
132) O arguido JJ concluiu o 8° ano de escolaridade e abandonou o ensino aos 14 anos a fim de iniciar actividade laboral que desenvolveu enquanto em liberdade, a par da actividade desportiva em que investiu enquanto recluso;
133) O arguido JJ é independente e impulsivo e estabelece fortes vinculações afectivas, de protecção e lealdade com quem se liga;
134) O arguido JJ vive com a mulher e com o enteado a quem trata como um filho, tendo-se afastado da família biológica;
135) O arguido JJ mantém comportamento institucional adequado, contando com o apoio afectivo e económico da cônjuge;
136) O arguido JJ projecta, uma vez em liberdade, dedicar-se profissionalmente à área do desporto;
137) Em 19.7.2006, por factos de 11.12.2003 e 14.1.2003, o arguido EE foi condenado pela prática de crimes de extorsão tentada, sequestro e detenção de arma proibida na pena única de 3 anos de prisão, cuja execução foi suspensa por 4 anos;
138) Em 16.7.2007, por factos de 5.6.2006, o arguido EE foi condenado pela prática de crimes de detenção ilegal de arma na pena única de 8 meses de prisão, cuja execução foi suspensa por 5 anos;
139) O arguido EE desenvolveu-se no agregado familiar dos progenitores de condição socio-económica estável, os quais investiram afectiva e educacionalmente na sua formação e que continuam a apoiá-lo;
140) O arguido EE frequentou o 11° ano de escolaridade, tendo depois de abandonar o ensino, como voluntário, integrado a Força Aérea Portuguesa;
141) O arguido EE partilha a ideologia nacionalista e desde a adolescência a cultura skinhead, tendo dirigido o movimento Frente Nacional durante dois anos, após o que passou a ser membro e activista do Partido Nacional Renovador, e fundou em Portugal o movimento Harmmerskins;
142) Ao nível laboral o arguido EE desenvolveu diversos trabalhos indiferenciados e a actividade de segurança;
143) O arguido EE tem três filhos, dois de um anterior casamento, e outro da relação que mantém com a actual companheira, sendo um pai afectivo e responsável;
144) O arguido EE tem como projecto futuro explorar o estabelecimento comercial do pai e reatar a sua vida marital;
145) O arguido EE é afectuoso na relação com os que lhe são próximos, obstinado e impulsivo, com tendência à perda de controlo, apresentando-se como racional e calculista e com elevada auto-estima;
146) O arguido EE revela comportamento institucional adequado no EP onde se encontra preso e conta com o apoio e visitas de familiares e amigos;
147) Em 29.11.1996, por factos de Janeiro de 2004, o arguido AA foi condenado pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 600$00, a qual lhe foi perdoada;
148) Em 15.10.1997 o arguido AA foi condenado pela prática de crimes de associação criminosa e extorsão na pena única de 14 anos de prisão, da qual lhe foram perdoados um ano e seis meses;
149) Em 14.10.2003 o arguido AA foi colocado em liberdade condicional até 29.8.2008;
150) O arguido AA desenvolveu-se no agregado familiar dos progenitores, de desafogada condição económica, bem estruturado, com dinâmica relacional adequada e afectuosa entre os seus membros, que investiu na formação escolar e ético moral do filho, transmitindo-lhe os valores do trabalho, do esforço pessoal como forma de alcançar o sucesso profissional, da solidariedade e entreajuda;
151) O arguido AA é dinâmico, empreendedor, sociável, solidário, impulsivo com tendência ao descontrolo, tem facilidade de comunicação e apresenta permeabilidade à influência de terceiros e consciência crítica dos seus actos;
152) O arguido AA teve um percurso escolar empenhado e de sucesso, tendo desde a adolescência trabalhado na empresa do pai, onde, entre 1990 e 1996, após obter um bacharelato em contabilidade, assumiu a gestão do departamento comercial;
153) Entre 1996 e 2003 o arguido encontrou-se em cumprimento de pena de prisão, tendo nesse período completado o 12° ano e formação universitária em gestão financeira;
154) Uma vez em liberdade o arguido AA constituiu uma empresa de consultoria financeira e prosseguiu a sua formação com a conclusão de um mestrado e do doutoramento em economia financeira e contabilidade, encontrando-se presentemente a tirar um doutoramento em gestão de empresas;
155) No ano de 2008 o arguido AA iniciou carreira como docente universitário e um negócio de comercialização de automóveis que adquire na Bélgica, pela venda dos quais recebe uma comissão;
156) O arguido AA estabeleceu relação adequada com a família, tendo laços afectivos privilegiados com a mãe e irmã;
157) O arguido AA vive, desde 2003, com uma companheira, com quem mantém relação estável e gratificante, tendo o agregado familiar que formam uma situação económica desafogada;
158) O arguido AA é pessoa conceituada entre os seus amigos e familiares, com cujo apoio conta;
159) O arguido AA tem comportamento adequado às regras institucionais e apoio o estudo de outros reclusos nas áreas de economia e matemática;
2. Factos não provados com relevância para a decisão do processo.
160) Que o arguido EE tenha constituído e chefiado um grupo de indivíduos que, actuando de forma estável, reiterada, concertada e em comunhão de esforços, sequestrava e assaltava outros indivíduos, algumas vezes com a promessa prévia de venda de produtos estupefacientes às vítimas;
161) Que o grupo referido em 160) se dedicasse também à venda de substâncias estupefacientes;
162) Que da organização, com excepção do arguido SS, fizessem parte os demais arguidos, que nela assumiam diferentes graus na respectiva hierarquia;
163) Que o arguido EE fosse o líder do grupo referido em 160) e imediatamente abaixo dele, mas ainda com funções de chefia, se situassem os arguidos JJ e AA;
164) Que os arguidos, com excepção do arguido SS, fossem conhecedores da existência do grupo dito em 160) e dos respectivos fins e que tivessem aceite fazer parte do dito grupo e executar as tarefas e prestar a colaboração que com vista àquele fim lhes viessem a caber, designadamente levando as vítimas a locais preestabelecidos, guardando armas e participando activamente nos sequestros e roubos;
165) Que, aproveitando o contacto com as vítimas proporcionado, designadamente, pela vontade destas em adquirir estupefacientes, bem como o conhecimento privilegiado que através dessas vendas obtinham da situação económica das mesmas, o referido grupo marcasse encontros com elas e as conduzisse a locais determinados para aí as sequestrar e roubar;
166) Que para o cometimento dos crimes os elementos do grupo possuíssem e utilizassem armas, algumas de fogo, bem sabendo que a respectiva posse era proibida por lei;
167) Que, no âmbito da organização referida de 160) a 166), fosse o arguido AA quem habitualmente tratava junto de EE B..., sócio do II -Stand M..., da entrega das viaturas roubadas;
168) Que o arguido EE tivesse um conflito com CC, conhecido por Thor, relacionado com o facto de o primeiro liderar a organização Portugal Hammerskins e o segundo ser o presidente do Chapter Nomads, com sede em Faro, da organização Internacional Hells Angels, em particular pela circunstância de os segundos serem intransigentes em aceitar a existência de um grupo dos primeiros na zona do Algarve;
169) Que, no dia 10.12.2008, com o propósito de impor a presença de membros dos Hammerskin no Algarve, os arguidos EE e OO se tenham deslocado àquela região onde se encontraram com o arguido BB;
170) Que após o referido em 169) os arguidos aí mencionados se tenham dirigido à zona do Patacão, à rua C... B..., próximo do nº,..., e que nesse local, cerca das 17H 30M, tenham abordado CC que ali chegou acompanhado pela namorada TT;
171) Que estivesse decidido entre os arguidos ditos em 169) que, caso CC não aceitasse um acordo relativo à presença dos Hammerskins no Algarve, o baleariam;
172) Que, ao verificar que não conseguia dialogar com CC, o arguido EE tenha sacado de uma arma de fogo 9mm e tenha disparado um tiro em direcção às pernas de CC, atingindo-o no joelho direito;
173) Que, de seguida, o arguido EE e seus companheiros tenham abandonado o local dito em 170);
174) Que os arguidos referidos em 169), com utilização de uma arma de fogo, tenham querido ofender a integridade física de CC;
175) Que os factos descritos de 2) a 77) tenham sido praticados no âmbito da organização referida de 160) a 167);
176) Que o interesse de DD em contactar o arguido EE fosse a intenção de realizar um negócio;
177) Que na ocasião referida em 7) o arguido EE tenha atingido DD pulverizando-o com um spray na cara, fazendo com que ele ficasse momentaneamente sem conseguir ver;
178) Que o arguido JJ tenha permanecido na habitação referida em 4) no decurso dos factos aí ocorridos e que estivesse convencido do referido em 3);
179) Que na ocasião dita em 9) DD tenha sido pendurado numa cruz improvisada em madeira;
180) Que na ocasião dita em 9) o arguido AA, utilizando um serrote, tenha cortado DD de forma superficial, em diversas partes do corpo, incluindo no pénis;
181) Que os arguidos EE, AA e JJ se tenham apoderado de um telemóvel Samsung, no valor de € 75, pertença de DD;
182) Que dos objectos referidos em 11) o telemóvel tivesse o valor de € 200 e o relógio fosse da marca Camel e valesse € 250;
183) Que os arguidos JJ e BB tenham agido com intenção de privar de liberdade DD, causar-lhe sofrimento físico, receio e obter quantia em dinheiro;
184) Que o encontro referido em 17) tenha sido marcado para o parque de estacionamento do hipermercado J..., em Alverca;
185) Que na ocasião referida em 18) o arguido EE tenha entregue a FF, como amostra, cerca de um quarto de grama de cocaína para aquele e os amigos verificarem se estavam interessados;
186) Que a carrinha referida em 21) fosse preta, da marca B... e ostentasse matrícula do Luxemburgo;
187) Que na ocasião referida em 25), quando se encontrava no interior do automóvel conduzido pelo arguido EE, FF tenha manifestado intenção de adquirir 50 gramas do produto cuja amostra levara, ficando estabelecido que o grama custaria € 50;
188) Que após o encontro referido em 21) os arguidos tenham ficado de contactar FF;
189) Que no dia 18.1.2009 FF se tenha encontrado com os arguidos EE e BB e que então tenha sido marcado o encontro referido em 22);
190) Que estivesse previsto que o produto que FF pretendia adquirir fosse pago, em metade, pelo seu amigo referido em 25);
191) Que na ocasião referida em 37) o arguido NN tivesse conhecimento de tudo o que se estava a passar;
192) Que o objecto referido em 37) fosse uma pistola que se encontrava municiada;
193) Que o arguido NN soubesse que o objecto referido em 37) iria servir para agredir e assustar FF;
194) Que o objecto referido em 38) fosse uma arma de fogo;
195) Que na ocasião referida em 41) FF tenha tocado à campainha e que o amigo não tenha atendido;
196) Que após o referido em 42) os arguidos se tenham dirigido para o parque de estacionamento do hipermercado J..., em Alverca, onde o arguido AA se encontrava ao volante da viatura da marca V..., modelo P..., de matrícula ...-...-SG, para a qual passaram todos deixando ali estacionado o automóvel de marca F..., modelo F...;
197) Que na ocasião referida em 44) FF tenha sido retirado da viatura à força pelo arguido EE;
198) Que na situação dita em 44) o arguido EE se tenha dirigido a FF apelidando-o de cabrão e filho da puta;
199) Que na ocasião referida em 44), não obstante ver FF a gritar de dor e medo, o arguido EE o tenha avisado de que se tentasse fugir levava um tiro na perna;
200) Que na ocasião mencionada em 45) o arguido EE tenha desferido coronhadas na cabeça de FF;
201) Que os arguidos BB e NN tenham agido com intenção de privar de liberdade FF e causar-lhe dor física durante esse período de tempo, bem como, com os meios e modos descritos, fazer seus os bens indicados em 48);
202) Que os arguidos BB e NN tenham querido obrigar FF a dar-lhes acesso à casa do amigo, bem sabendo que o que lhe foi feito e dito era susceptível de provocar nele medo e inquietação, prejudicando a sua liberdade de determinação e que esse objectivo tenha sido alcançado por razões alheias à sua vontade;
203) Que tenha sido o arguido EE a proceder à entrega referida em 51);
204) Que os arguidos EE e RR tenham tido conhecimento de que GG e PP se instalaram na residencial V...;
205) Que o spray referido em 65) fosse de gás pimenta;
206) Que os arguidos AA e JJ tenham feito seus € 2 300 em dinheiro pertença de GG;
207) Que os arguidos EE e RR sejam os indivíduos mio identificados referidos de 57) a 66) e que tenham tido a intenção de subtrair bens e dinheiro a GG;
208) Que o local referido em 76) fosse a residência do arguido AA e que o spray aí referido fosse sua pertença;
209) Que no automóvel de matrícula ...-...-RL, que utilizava, o arguido RR guardasse na bagageira um aríete metálico, objecto muitas vezes utilizado para arrombar portas;
210) Que no dia 18.4.2009, cerca das 11H 30M, o arguido OO e outro indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, se tenham dirigido, a casa de FF com o propósito de o avisar de que se testemunhasse em tribunal contra f)S arguidos lhe fariam mal, designadamente, agredindo-o;
211) Que o arguido OO e o indivíduo que o acompanhava tenham tocado à campainha e que FF não tenha aberto a porta de casa, fazendo de conta que não se encontrava ninguém no interior;
212) Que o telefonema referido em 80) tenha sido feito a mando do arguido EE;
213) Que no telefonema referido em 80) o arguido BB tenha dito a FF que os arguidos achavam que estavam presos por causa dele e que o mesmo tinha de retirar a queixa e ainda que o arguido EE sabia que ia cumprir pena de prisão, mas que, mal saísse, iria à procura de FF para se vingar, caso este mantivesse em tribunal a sua versão dos factos;
214) Que antes de desligar o arguido BB tenha dito que voltaria a contactar FF para não o deixar esquecer que não podia testemunhar contra os arguidos;
204) Que os arguidos EE e RR tenham tido conhecimento de que GG e PP se instalaram na residencial V...;
205) Que o spray referido em 65) fosse de gás pimenta;
206) Que os arguidos AA e JJ tenham feito seus € 2 300 em dinheiro pertença de GG;
207) Que os arguidos EE e RR sejam os indivíduos não identificados referidos de 57) a 66) e que tenham tido a intenção de subtrair bens e dinheiro a GG;
208) Que o local referido em 76) fosse a residência do arguido AA e que o spray aí referido fosse sua pertença;
209) Que no automóvel de matrícula ...-...-RL, que utilizava, o arguido RR guardasse na bagageira um aríete metálico, objecto muitas vezes utilizado para arrombar portas;
210) Que no dia 18.4.2009, cerca das 11H 30M, o arguido OO e outro indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, se tenham dirigido a casa de FF com o propósito de o avisar de que se testemunhasse em tribunal contra os arguidos lhe fariam mal, designadamente, agredindo-o;
211) Que o arguido OO e o indivíduo que o acompanhava tenham tocado à campainha e que FF não tenha aberto a porta de casa, fazendo de conta que não se encontrava ninguém no interior;
212) Que o telefonema referido em 80) tenha sido feito a mando do arguido EE;
213) Que no telefonema referido em 80) o arguido BB tenha dito a FF que os arguidos achavam que estavam presos por causa dele e que o mesmo tinha de retirar a queixa e ainda que o arguido EE sabia que ia cumprir pena de prisão, mas que, mal saísse, iria à procura de FF para se vingar, caso este mantivesse em tribunal a sua versão dos factos;
214) Que antes de desligar o arguido BB tenha dito que voltaria a contactar FF para não o deixar esquecer que não podia testemunhar contra os arguidos;
215) Que os arguidos EE, OO e BB ao proceder do modo referido de 81) a 82) e 210) a 214), tenham agido livre, voluntária e conscientemente, com intenção de, através de ameaças de agressão, levar FF a não testemunhar contra os arguidos em tribunal, cientes de que a sua conduta não era permitida por lei;
216) Que os arguidos RR, OO e NN tenham agido livre, voluntária e conscientemente, sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei;
217) Que a anterior condenação que o arguido RR sofreu não lhe tenha servido de suficiente advertência contra o crime;

I
Questão prévia
Na génese da questão encontra-se a peculiaridade da situação em que estão em causa, em sede de recurso, as penas parcelares aplicadas, bem como a pena conjunta que das mesmas resulta, sendo certo que as primeiras são inferiores ao limite do artigo 432 alínea c) do Código de Processo Penal e a segunda superior ao mesmo limite.
A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem tido oportunidade para salientar, por diversas vezes, que o direito ao recurso constitui uma das mais importantes dimensões das garantias de defesa do arguido em processo penal. Mesmo antes de o artigo 32.°, nº1, da Constituição da República Portuguesa ter passado a especificar o recurso como uma das garantias de defesa, o que sucedeu com a Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, constituía jurisprudência pacífica e uniforme do Tribunal Constitucional que uma das garantias de defesa, de que fala o nº1 do artigo 32.°, é, justamente, o direito ao recurso.
Este direito ao recurso, como garantia de defesa, é de há muito identificado pelo Tribunal Constitucional com a garantia do duplo grau de jurisdição, "quanto a decisões penais condenatórias e, ainda, quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais" .
O exposto significa que, embora valha no processo penal português o princípio da recorribilidade das decisões judiciais, plasmado no artigo 399.° do Código de Processo Penal (CPP), do ponto de vista jurídico-constitucional não são ilegítimas, à luz do artigo 32.°, nº 1, da CRP, restrições do direito ao recurso relativamente a decisões penais não condenatórias ou que não afectem a liberdade ou outros direitos fundamentais do arguido. Esta disposição constitucional não imporá, portanto, a concessão ao arguido do direito de recorrer de toda e qualquer decisão judicial que lhe seja desfavorável.
Segundo o Tribunal Constitucional, o duplo grau de jurisdição, imposto pelo artigo 32.°, nº 1, da CRP, abrange tanto o recurso em matéria de direito, como o recurso em matéria de facto, com a salvaguarda de que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não tem, porém, de "implicar renovação de prova perante o tribunal ad quem, nem tão-pouco que conduzir à reapreciação de provas gravadas ou registadas (Acórdão nº 573/98 tirado em plenário). Como se refere ainda nesta decisão “o tribunal colectivo tendo em conta as regras do seu próprio modo de funcionamento e as que comandam a audiência de discussão e julgamento, constitui, ele próprio, uma primeira garantia de acerto no julgamento da matéria de facto. Depois, no recurso de revista alargada, há também lugar a uma audiência de julgamento, sujeita às regras respectivas, nela podendo haver alegações orais. E, embora esse recurso de revista alargada vise, em regra, tão-só o reexame da matéria de direito, o Supremo Tribunal de Justiça pode, não apenas anular a decisão recorrida, como decretar o reenvio do processo para novo julgamento. Questão (para este último efeito) é que detecte erros grosseiros no julgamento do facto (a saber: insuficiência da matéria de facto, contradição insanável da fundamentação ou erro notório na apreciação da prova) e que o vício detectado resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”.
Não tendo o direito ao recurso sobre a matéria de facto - como decidiu o Tribunal Constitucional no acórdão n.º 401/91 (publicado no Diário da República, I série-A, de 8 de Janeiro de 1992) - que implicar renovação de prova perante o tribunal ad quem, nem tão-pouco que conduzir à reapreciação de provas gravadas ou registadas - Acórdão n.º 253/92 (publicado do Diário da República, II série, de 27 de Outubro de 1992) -, a garantia do duplo grau de jurisdição sobre o facto tem fatalmente que circunscrever-se a uma verificação pelo tribunal de recurso da coerência interna e da concludência de tal decisão; e sendo certo que a efectividade de tal reapreciação do acerto da decisão sobre a matéria de facto pelo tribunal ad quem depende, de forma decisiva, da circunstância de ela estar substancialmente fundamentada ou motivada - não através de uma mera indicação ou arrolamento dos meios probatórios, mas de uma verdadeira reconstituição e análise crítica do iter que conduziu a considerar cada facto relevante como provado ou não provado.
O sistema da revista alargada preserva, assim, o núcleo essencial do direito ao recurso, em matéria de facto, contra sentenças penais condenatórias - direito que, recorda-se, está compreendido no princípio das garantias de defesa, consagrado no artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. Não deixa de se afirmar que o persistente apostrofar pelas virtualidades do duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto ignora a actualidade das palavras de Figueiredo Dias quando, em 1983, chamava a atenção para que "a jurisdição de apelação - diz-se -, qualquer que seja a perfeição e a fidelidade técnicas do registo da prova, e mesmo perante uma renovação da julgamento, será sempre 'de segunda mão', não tem as mesmas possibilidades de descoberta da verdade material que o juiz de 1ª instância; quanto mais não seja porque está temporalmente mais distanciada dos factos, sendo estes de mais difícil acesso para ela: os princípios da oralidade e da imediação dão os seus melhores frutos somente no decurso de uma audiência e, na verdade, da primeira. Ao que acresce a circunstância de a possibilidade de apelação contribuir inevitavelmente para a diminuição da qualidade da justiça prestada na 1ª instância: ela representa, na verdade, um convite implícito, tanto a um menor cuidado na apreciação dos factos a troco de um ganho de tempo, como a uma injustificável atitude sistemática de favor reum com que o tribunal de 1.a instância procurará antecipar a situação, sem dúvida mais favorável, em que o arguido se apresentará perante o tribunal de apelação"

O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 4/2009 de 18.02.09, publicado no DR, 1ª Série, de 19.03.09 fixou jurisprudência no sentido de que, em matéria de recursos penais, no caso de sucessão de leis processuais penais, é aplicável a lei vigente à data da decisão proferida em 1ª instância.
A decisão de primeira instância no caso vertente foi proferida em 2011. Nessa data estava já em vigor a versão Código de Processo Penal resultante das alterações que nele foram introduzidas pela Lei nº 48/07 de 29 de Agosto, como decorre do seu artº 7º.Assim, sendo essa a versão do Código aplicável ao caso vertente tudo se resume a saber se, e em que medida, é recorrível a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa ora em análise.
Como bem se refere na decisão deste Supremo Tribunal de Justiça de 19-11-2009 Relator Juiz Conselheiro Sousa Fonte é o artº 432º do CPP que define a recorribilidade das decisões penais para o Supremo Tribunal de Justiça. De forma directa, nas alíneas a), c) e d), do seu nº 1; de modo indirecto, na alínea b) do mesmo número, através da referência às decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do nº 1 do artº 400º.
Estando aqui em causa um recurso interposto de um acórdão de um tribunal da relação proferido em recurso, perante um recurso em segundo grau, portanto, a norma a ter em conta é a daquela alínea b) – “Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça … b) das decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pela relações, em recurso, nos termos do artº 400º”.
Ora, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou as penas parcelares fixadas pelo Tribunal de Loures bem como diminuiu de nove anos para oito anos e oito meses a pena conjunta aplicada. Como assim, a alínea b) do nº 1 do artº 432º remete-nos para a alínea f) do nº 1 do artº 400º.
A Lei nº 48/07 alterou substantivamente esta disposição legal: se antes, era a pena aplicável o pressuposto (um dos pressupostos) da (ir)recorribilidade dos acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, agora esse pressuposto passou a ser o da pena concretamente aplicada.
No caso de concurso de crimes, pena aplicada é tanto a pena parcelar cominada para cada um dos crimes como é a pena conjunta. Assim, no caso de concurso de crimes, só são recorríveis as decisões das relações que, incidindo sobre cada um dos crimes e das correspondentes penas parcelares, ou sobre a pena conjunta, apliquem ou confirmem pena de prisão superior a 8 anos.
No caso sub judice, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou as penas parcelares que se situam num patamar inferior àquele limite. Assim, na lógica do que vem exposto, a mesma decisão não é recorrível no que concerne e apenas será admissível em relação á pena conjunta.


II
Fundamental na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação «desse bocado de vida criminosa com a personalidade. A pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares.
Para a determinação da dimensão da pena conjunta o decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos, acentuando-se a relação dos mesmos factos entre si e no seu contexto; a maior ou menor autonomia a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento mas também o receptividade á pena pelo agente deve ser objecto de nova discussão perante o concurso ou seja a sua culpa com referência ao acontecer conjunto da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa.
Também Jeschek se situa no mesmo registo referindo que a pena global se determina como acto autónomo de determinação penal com referência a princípios valorativos próprios. Deverão equacionar-se em conjunto a pessoa do autor e os delitos individuais o que requer uma especial fundamentação da pena global. Por esta forma pretende significar-se que a formação da pena global não é uma elevação esquemática ou arbitrária da pena disponível mas deve reflectir a personalidade do autor e os factos individuais num plano de conexão e frequência. Por isso na valoração da personalidade do autor deve atender-se antes de tudo a saber se os factos são expressão de uma inclinação criminosa ou só constituem delito ocasionais sem relação entre si.

Assim, é o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade - unitária - do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)
Importa ainda precisar que merece inteira sintonia o entendimento de que a substituição daquela operação valorativa por um processo de índole essencialmente aritmética de fracções e somas torna-se incompatível com a natureza própria da segunda fase do processo. Com efeito, fazer contas indica voltar às penas já medidas, ao passo que o sistema parece exigir um regresso aos próprios factos. Na verdade as operações aritméticas podem fazer-se com números, não com valorações autónomas.
Porém, assumindo como aquisição fundamental a necessidade de uma visão global que procure detectar aquela culpa e a personalidade indiciada pelos factos o certo é que tal perspectiva tem como pressuposto um conjunto de penas parcelares que carece de ser integrado numa única pena conjunta perdendo a sua individualidade. Porém, para além da diversidade genética dos factos que estão na origem das penas está também em causa o facto de as regras da punição traçarem, no artigo 77 uma única regra de aferição que corresponde ao máximo que é a soma material das penas, com o limite 25 anos e o limite mínimo que é a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos crimes.
Na prática, em situações de uma maior pluralidade de crimes de menor gravidade ou de um diminuto número de crimes de maior gravidade os limites da pena conjunta a aplicar têm uma vasta amplitude que pode, em casos limites ir do mínimo da pena de prisão até aos vinte e cinco anos de prisão. A questão que então se coloca é a de saber se o critério legal por si não é demasiado exíguo e vago conduzindo a uma situação de ampla incerteza ou seja saber se a invocação dos factos e personalidade não é insuficiente para esbater a sensação de margem discricionária que se estende sobre um leque que vai de um ano a vinte e cinco anos de prisão.
Na verdade, a vida num Estado de Direito Democrático terá de estar ancorada necessariamente nos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança. O princípio da segurança jurídica, enquanto implicado no princípio do Estado de Direito Democrático, comporta a ideia da previsibilidade que, no essencial se «reconduz à exigência de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos jurídicos dos actos normativos».
Daí que a realização e efectivação do princípio do Estado de Direito, no nosso quadro constitucional, impõe que seja assegurado um certo grau de calculabilidade e previsibilidade dos cidadãos sobre as suas situações jurídicas, ou seja, que se mostre garantida a confiança na actuação dos entes públicos. É, assim, que o princípio da protecção da confiança e segurança jurídica pressupõe um mínimo de previsibilidade em relação aos actos do poder, de molde a que a cada pessoa seja garantida e assegurada a continuidade das relações em que intervém e dos efeitos jurídicos dos actos que pratica. Assiste aos cidadãos o direito de poderem confiar que as decisões sobre os seus direitos ou relações/posições jurídicas tenham os efeitos previstos nas normas que os regulam e disciplinam.
A propósito da “segurança jurídica” e da “protecção da confiança” refere o J.J. Gomes Canotilho que “… a segurança jurídica está conexionada com elementos objectivos da ordem jurídica - garantia da estabilidade jurídica, segurança de orientação e de realização do direito - enquanto a protecção da confiança se prende mais com as componentes subjectivas da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos dos poderes públicos. A segurança e a protecção da confiança exigem, no fundo: (1) fiabilidade, clareza, racionalidade e transparência dos actos do poder; (2) de forma que em relação a eles o cidadão veja garantida a segurança nas suas disposições pessoais e nos efeitos jurídicos dos seus próprios actos. Deduz-se já que os postulados da segurança jurídica e da protecção da confiança são exigíveis perante qualquer acto de qualquer poder - legislativo, executivo e judicial. O princípio geral da segurança jurídica em sentido amplo (abrangendo, pois, a ideia de protecção da confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo tem do direito poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçados em normas jurídicas vigentes e válidas por esses actos jurídicos deixado pelas autoridades com base nessas normas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico …” (in: “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, 7.ª edição, pág. 257)
Os cidadãos têm direito a um mínimo de certeza e de segurança quanto aos direitos e expectativas que, legitimamente, forem criando no desenvolvimento das relações jurídicas. Por isso que « não é consentida uma normação tal que afecte, de forma inadmissível, intolerável, arbitrária ou desproporcionadamente onerosa, aqueles mínimos de segurança que as pessoas, a comunidade e o direito devem respeitar.» (Cf. Ac. TC nº 365/91, DR II Série, de 27.09.91).
Em nosso entender a certeza e segurança jurídica estão em causa quando existe uma tão grande margem de discricionariedade que equivale a uma completa indefinição em termos de aferição da pena aplicável como é caso de entre a mais grave das penas parcelares e a soma destas existir uma diferença que pode ir do mínimo de prisão até ao seu máximo. Assim admite-se como critério complementar, e meramente indiciário na formulação da pena conjunta, se aponte que, na ponderação da imagem global dos crimes imputados e da perso­nalidade, se considera que, tratando-se de uma personalidade mais gravemente desconforme com o Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave entre metade (ou, em casos grande intensidade da culpa ou gravidade dos factos dois terços) e um terço de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso; tratando-se de uma personalidade menos gravemente desconforme ao Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave entre um terço e, nos casos excepcionais de menor culpa ou gravidade um quarto, de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso.

Será pois dentro de tais limites que se deverá definir a pena concreta. Um dos critérios fundamentais em sede deste sentido de culpa em sentido global dos factos é o da determinação da intensidade da ofensa, e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que, em nosso entender, assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados á dimensão pessoal em relação a bens patrimoniais.
Conforme tem sido afirmado por este Supremo Tribunal, ao proceder-se ao cúmulo jurídico de penas, não pode deixar de se considerar a natureza e gravidade dos crimes praticados, não sendo a mesma coisa cometer determinado número de crimes de natureza patrimonial e o mesmo número de crimes contra a vida ou a integridade física das pessoas: daí que nos crimes contra a propriedade se torne necessário, ao fixar a medida da pena única, usar de um factor de compressão mais elevado. Por outro lado importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência.
Igualmente deve ser expressa a determinação da tendência para a actividade criminosa expresso pelo número de infracções; pela sua perduração no tempo; pela dependência de vida em relação àquela actividade.

Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo dessocialização e de inserção, ou de repúdio, pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade que deve ser ponderado.
Recorrendo á prevenção importa verificar em termos de prevenção geral o significado do conjunto de actos praticados em termos de perturbação da paz e segurança dos cidadãos e, num outro plano, o significado da pena conjunta em termos de ressocialização do delinquente para o que será eixo essencial a consideração dos seus antecedentes criminais e da sua personalidade expressa no conjunto dos factos.
Serão esses factores de medida da pena conjunta que necessariamente deverão ser tomados em atenção na sua determinação sendo, então, sim o pressuposto de uma adição ao limite mínimo do quantum necessário para se atingir as finalidades da mesma pena.

No caso concreto pronunciando-se sobre a medida da pena refere a decisão recorrida que:
Reapreciando os factos em globo e a personalidade dos arguidos, entendemos dever ponderar-se nesta sede que os crimes foram cometidos em ocasiões muito próximas e os praticados pelo arguido BB na mesma ocasião e através de uma actuação conjunta, havendo uma estreita conexão dos que eram praticados na mesma data e alguma conexão (similitude de modus operandi) entre os que foram praticados em datas distintas (mas também no espaço relativamente próximo de dois meses).
Os antecedentes criminais que os arguidos EE , AA e JJ (este muito graves) têm, denotam uma propensão para comportamentos criminosos e desconsideração pelas penas já sofridas que exacerbam as necessidades de prevenção especial, demandando do sistema de justiça penal uma reacção com um peso suficiente para fazer entender aos arguidos o que eles parecem ter dificuldade em compreender.
Finalmente, tem que estar presente na ponderação da pena única a finalidade primeira da aplicação de qualquer pena: a protecção de bens jurídicos (cfr. o artigo 40.° do Código Penal). Neste tipo de criminalidade a defesa do ordenamento jurídico e os sentimentos de confiança e de segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais que urge satisfazer, demandam uma punição com alguma expressão.
Assim, tendo em consideração o disposto nos artigos 77.° e 78.° do Código Penal e visto, agora em termos unitários, o circunstancialismo agravativo e atenuativo já ponderado na determinação das penas parcelares e, em geral, o conjunto dos factos praticados, com o denominador comum constituído pelas personalidades dos arguidos, tem-se por justo e adequado fixar:
• em 8 anos e 8 meses de prisão a pena única a suportar pelo arguido AA;

Os itens apresentados pela decisão recorrida são sufragados pela prova produzida e não oferecem qualquer contestação. Sem embargo, o teor impressivo da consideração sobre o passado criminal do recorrente é por alguma forma conflituante com o interregno que sucedeu entre o ano de 2003 e a data em que tiveram lugar os presentes autos. Durante esse período o arguido AA constituiu uma empresa de consultoria financeira e prosseguiu a sua formação com a conclusão de um mestrado e do doutoramento em economia financeira e contabilidade, encontrando-se presentemente a tirar um doutoramento em gestão de empresas. No ano de 2008 o arguido AA iniciou carreira como docente universitário e um negócio de comercialização de automóveis que adquire na Bélgica, pela venda dos quais recebe uma comissão.
Por igual forma uma apreciação do percurso do arguido em termos sociais e profissionais transmite-nos a conclusão de que o arguido AA é dinâmico, empreendedor, sociável, solidário, impulsivo com tendência ao descontrolo, tem facilidade de comunicação e apresenta permeabilidade à influência de terceiros e consciência crítica dos seus actos; estabeleceu relação adequada com a família, tendo laços afectivos privilegiados com a mãe e irmã; vive, desde 2003, com uma companheira, com quem mantém relação estável e gratificante, tendo o agregado familiar que formam uma situação económica desafogada;
O mesmo é pessoa conceituada entre os seus amigos e familiares, com cujo apoio conta. Em termos de cumprimento de reclusão o arguido AA tem comportamento adequado às regras institucionais e apoia o estudo de outros reclusos nas áreas de economia e matemática.
Existe, assim, uma contradição patente num percurso de vida pautado, num largo período de tempo, por uma postura de cidadão empenhado em se inserir na comunidade e assumir-se na família e os actos ilícitos praticados. Tal contradição tem, a nosso ver, alguma explicação na permeabilidade á referida influência de terceiros e, ainda, e, também, entrando em terreno algo especulativo, numa pretensa superioridade ética, pretensamente legitimadora dos factos praticados, que adviria da circunstância de os crimes sucedidos terem como alvo indivíduos que se dedicavam, ou pretendiam dedicar, ao negócio da droga.
Na verdade esse é o denominador comum das vítimas das infracções praticadas ou seja a sua disponibilidade para a prática de actos ilícitos relacionados com o tráfico
Assim, se é certo que não se pode ignorar o passado criminal do arguido igualmente é certo que tem relevância o facto de os ilícitos praticados surgirem em contradição com uma evolução social, familiar e económica que apontavam exactamente em sentido contrário.
Considerando globalmente todo o quadro indicado e valorando, também, o segmento positivo do itinerário de vida do arguido entende-se por adequada a pena de oito anos de prisão.

Termos em que se julga parcialmente procedente o recurso interposto e se condena o arguido AA na pena conjunta de oito anos de prisão
Sem custas.

Supremo Tribunal de Justiça,
Lisboa, 26-10-2011,

Santos Cabral (relator)

Oliveira Mendes