PROCESSO |
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DATA DO ACÓRDÃO | 11/03/2011 | ||
SECÇÃO | 5ª SECÇÃO |
RE | |
MEIO PROCESSUAL | RECURSO PENAL |
DECISÃO | DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA |
VOTAÇÃO | MAIORIA COM * VOT VENC |
RELATOR | RODRIGUES DA COSTA |
DESCRITORES | ACÓRDÃO DO TRIBUNAL COLECTIVO ADMISSIBILIDADE DE RECURSO COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA |
SUMÁRIO | I - No presente caso está-se em face de um acórdão do tribunal colectivo e de um recurso que visa exclusivamente o reexame da matéria de direito: o recorrente foi condenado pela prática de vários crimes (roubo simples e qualificado, violação, sequestro e condução sem habilitação legal), em várias penas que não ultrapassam e em penas que ultrapassam ligeiramente os 5 anos de prisão e, em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 12 anos de prisão. II - Como vem sendo entendimento da jurisprudência, expresso numa parte significativa da jurisprudência, nos casos de recurso directo do tribunal colectivo para o STJ, foi restringida significativamente a possibilidade desse recurso, pois, para além da exigência – que vinha da anterior reforma introduzida pela Lei 59/98, de 25-08 –, de o recurso visar exclusivamente matéria de direito passar agora a estender-se ao recurso da decisão final do tribunal de júri, foi acrescentado o pressuposto relativo à pena, que não constava do texto legal, a não ser de modo implícito, pela referência ao tribunal colectivo e à competência deste, resultante do art. 14.º do CPP, em especial da al. b) do n.º 2: processos respeitantes a crimes, cuja pena aplicável fosse superior a 5 anos de prisão, mesmo no caso de concurso de infracções em que fosse inferior a esse limite a pena aplicável a cada a crime. III - Com a redacção actual, passou a exigir-se, como pressuposto do recurso directo para o STJ, que a pena aplicada seja superior a 5 anos de prisão; com efeito, só são recorríveis para o STJ os acórdãos do tribunal colectivo ou do tribunal de júri, que, visando exclusivamente matéria de direito, tenham aplicado pena superior a 5 anos de prisão. IV - Na perspectiva dessa jurisprudência – que tem a nossa adesão –, mesmo considerando que a expressão pena aplicada tanto pode referir-se à pena singular, como à pena conjunta, o certo é que, tendo em mente o focado desígnio de redução drástica dos recursos para o STJ, ou de reserva deste para os casos mais graves, a referida expressão (pena aplicada) só alcança projecção relevante, nesse enquadramento, quando entendida na sua dupla faceta de referência quer a penas singulares, quer à pena conjunta, estando em causa um concurso de crimes. V - Só serão passíveis de recurso directo para o STJ as decisões do tribunal colectivo ou de júri que isoladamente tenham aplicado por um crime pena superior a 5 anos de prisão ou que, num concurso de crimes, tenham aplicado uma pena única superior àquele limite, ainda que as penas parcelares aplicadas sejam iguais ou inferiores a 5 anos de prisão. VI - Neste caso, porém, o recurso será restrito à medida da pena única, a menos que alguma das penas parcelares seja também superior a 5 anos, caso em que o recurso abrange essas penas parcelares e a pena conjunta. VII - Na verdade, seria um contra-senso, na perspectiva da reforma introduzida, que o legislador, ao falar de pena aplicada em concreto, pretendesse referir-se tão-somente à pena a cumprir ou à pena única, num caso de concurso de infracções, levando o STJ a conhecer de todos os crimes que formam esse concurso, mesmo que tais crimes correspondessem àquela noção que normalmente se designa de criminalidade bagatelar ou a que tivesse sido aplicada uma pena de gravidade não superior a determinado limite, a que, em geral, se associa a pequena e média criminalidade. VIII - Este contra-senso tornar-se-ia mais saliente se, levando às últimas consequências tal tese (a de que a pena conjunta e só esta é que, por ser superior a 5 anos de prisão, determinaria a competência do STJ), se tivesse que admitir que era possível o recurso directo para o STJ mesmo que não se pusesse em questão a pena única, superior àquele limite, mas só qualquer das penas parcelares, inferiores a 5 anos de prisão, ou questões relativas aos respectivos crimes, com eventual reformulação consequencial da pena única. IX - Isto é, nos casos em que a pena única só indirectamente e por via da impugnação de qualquer das penas singulares inferiores a 5 anos de prisão viesse a ser posta em causa, e não como decorrência da violação dos critérios de determinação desta. X - Por outro lado, a lei, ao referir-se, nas alíneas e) e f) do art. 400.º do CPP, a pena aplicada não adopta critério diferente do aqui consignado, pois, também aí, é possível distinguir (e assim se tem distinguido) entre pena singular e pena conjunta, nomeadamente para efeitos de se não incluírem no recurso de revista que tenha sido interposto da decisão final as questões relativas a crimes em que foram aplicadas penas singulares iguais ou inferiores a 8 anos de prisão que tenham sido confirmadas pela Relação, num concurso de crimes, ou relativas a uma pena não privativa de liberdade, também numa situação de crimes concorrentes. XI - Já, pelo contrário, tem-se considerado que podem ser incluídas nesse recurso as questões de direito relativas a penas singulares (e só estas) que ultrapassem 8 anos de prisão, bem como a pena conjunta, necessariamente superior. |
DECISÃO TEXTO INTEGRAL | I. Relatório 1. AA foi julgado pelo tribunal colectivo de Gondomar, no âmbito do processo n.º 69/09.2PAGDM e, por acórdão de 1-06-2011, foi condenado, para além do mais: a) Pela prática, em autoria material, de um crime de roubo simples, p. e p. pelo art. 210/1, 2, b), e 4, com referência ao art. 204/2, f), ambos do Código Penal, e ao art. 4.º do DL n.º 48/95, de 15.03, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão (factos de lI.l a II. 12); Com a redacção actual, passou a exigir-se, como pressuposto do recurso directo para o STJ, que a pena aplicada seja superior a 5 anos de prisão. Com efeito, só são recorríveis para o STJ os acórdãos do tribunal colectivo ou do tribunal de júri, que, visando exclusivamente matéria de direito, tenham aplicado pena superior a 5 anos de prisão. Na perspectiva da jurisprudência a que começámos por aludir e que tem a nossa adesão, mesmo considerando que a expressão pena aplicada tanto pode referir-se à pena singular, como à pena conjunta, o certo é que, tendo em mente o focado desígnio de restrição drástica dos recursos para o STJ, ou de reserva deste para os casos mais graves, como objectivo visado pelas alterações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, e afirmado na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 109/X, a referida expressão – pena aplicada - só alcança projecção relevante, nesse enquadramento, quando entendida na sua dupla faceta de referência quer a penas singulares, quer à pena conjunta, estando em causa um concurso de crimes. Por outras palavras: só serão passíveis de recurso directo para o STJ as decisões do tribunal colectivo ou de júri que isoladamente tenham aplicado por um crime pena superior a 5 anos de prisão ou que, num concurso de crimes, tenham aplicado uma pena única superior àquele limite, ainda que as penas parcelares aplicadas sejam iguais ou inferiores a 5 anos de prisão. Neste caso, porém, o recurso será restrito à medida da pena única, a menos que alguma das penas parcelares seja também superior a 5 anos, caso em que o recurso abrange essas penas parcelares e a pena conjunta (entre muitos outros, cf. Acórdão de 02-04-2008, Proc. n.º 415/08, da 3.ª Secção, de 15/07/2008, Proc. n.º 816-08, da 5.ª Secção, este do mesmo relator deste processo, Acórdãos de 15-04-2011, Proc. n.º 33-10.9GDSNT.S1, também da 5.ª Secção). Como se conclui no recente acórdão de 21-09-2011, Proc. n.º 7406/04.4TDPRT.P1.S1, da 5.ª Secção: «Por isso, no caso de ser aplicada mais do que uma pena de prisão, verificando-se, relativamente a uma delas (ou mais do que uma), o pressuposto de recorribilidade para o Supremo, a competência do Supremo só deve ser afirmada se o recurso tiver por objecto, justamente, questões de direito relativas aos crimes por que essa ou essas penas (de medida concreta de prisão superior a 5 anos) foram aplicadas. Daí que, se na decisão final do tribunal de júri ou do tribunal colectivo forem aplicadas penas de prisão iguais ou inferiores a 5 anos e penas de prisão superiores a 5 anos, mas o objecto do recurso se referir – ou, também, se referir – a questões de direito relativas aos crimes por que foram aplicadas as penas de prisão iguais ou inferiores a 5 anos, a competência para conhecer do recurso caiba à relação.» Na verdade, seria um contra-senso, na perspectiva da reforma introduzida, visando a restrição do recurso para o Supremo Tribunal, que o legislador, ao falar de pena aplicada em concreto, pretendesse referir-se tão-somente à pena a cumprir ou à pena única, num caso de concurso de infracções, levando o STJ a conhecer de todos os crimes que formam esse concurso, mesmo que tais crimes correspondessem àquela noção que normalmente se designa de criminalidade bagatelar ou a que tivesse sido aplicada uma pena de gravidade não superior a determinado limite, a que, em geral, se associa a pequena e média criminalidade. Esse contra-senso tornar-se-ia mais saliente se, levando às últimas consequências tal tese – a de que a pena conjunta e só esta é que, por ser superior a cinco anos de prisão, determinaria a competência do STJ – se tivesse que admitir que era possível o recurso directo para o STJ mesmo que não se pusesse em questão a pena única, superior àquele limite, mas só qualquer das penas parcelares, inferiores a cinco anos de prisão, ou questões relativas aos respectivos crimes, com eventual reformulação consequencial da pena única. Isto é, nos casos em que a pena única só indirectamente e por via da impugnação de qualquer das penas singulares inferiores a cinco anos de prisão viesse a ser posta em causa, e não como decorrência da violação dos critérios de determinação desta. Seria o caso, por exemplo, de um arguido ter sido condenado por 2 crimes de violação, dos artigos 164.º, n.º 1, alínea a) e 177.º, n.º 5 do CP, nas penas de 8 anos de prisão por cada um deles e por detenção de arma proibida, do artigo 86.º, alínea d), com referência ao art. 2.º, n.º 1, alínea m) da Lei n.º 5/2006, de 23/02, na pena de 60 dias de multa e, em cúmulo jurídico, na pena única de 10 anos e 6 meses de prisão e 60 dias de multa, e o Ministério Público ter interposto recurso da decisão, pretendendo a aplicação de uma pena de prisão para este último crime. Ou então ter sido aplicada, no mesmo caso, uma pena de 6 meses de prisão pelo crime de detenção de arma proibida e o arguido ter impugnado esta pena, pretendendo a aplicação de pena de multa. Em qualquer das situações, estaria em causa apenas a contestação de uma pena por um crime menor, embora, por efeito de reajustamento, caso viesse a proceder o recurso, tal tivesse reflexo na pena única (não impugnada directa ou explicitamente). Ora, seria completamente ilógico e contrário ao objectivo declarado de reservar para o STJ os casos de maior gravidade, obrigar aquele tribunal a conhecer de situações que tais. Por outro lado, a lei, ao referir-se, nas alíneas e) e f) do art. 400.º do CPP, a pena aplicada não adopta critério diferente do aqui consignado, pois, também aí, é possível distinguir (e assim se tem distinguido) entre pena singular e pena conjunta, nomeadamente para efeitos de se não incluírem no recurso de revista que tenha sido interposto da decisão final as questões relativas a crimes em que foram aplicadas penas singulares iguais ou inferiores a 8 anos de prisão que tenham sido confirmadas pela relação, num concurso de crimes, ou relativas a uma pena não privativa de liberdade, também numa situação de crimes concorrentes. Já, pelo contrário, tem-se considerado que podem ser incluídas nesse recurso as questões de direito relativas a penas singulares (e só estas) que ultrapassem 8 anos de prisão, bem como a pena conjunta, necessariamente superior. Sendo assim, como, no caso sub judice se põem em causa as penas parcelares e não só a pena única, tem de seguir-se a regra geral, segundo a qual «exceptuados os casos em que há recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça, o recurso da decisão proferida por tribunal de 1.ª instância interpõe-se para a relação». III. DECISÃO |