ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


PROCESSO
1961/09.0TBSTB.E1.S1
DATA DO ACÓRDÃO 10/25/2011
SECÇÃO 1ª SECÇÃO

RE
MEIO PROCESSUAL REVISTA
DECISÃO NEGADA A REVISTA
VOTAÇÃO UNANIMIDADE

RELATOR ALVES VELHO

DESCRITORES SOCIEDADE POR QUOTAS
REPRESENTAÇÃO EM JUÍZO
DESISTÊNCIA DO PEDIDO
PROCURAÇÃO IRREVOGÁVEL

SUMÁRIO


A procuração conferida também no interesse do procurador deve ser lavrada por instrumento público.
Trata-se de exigência ou requisito de forma que deve considerar-se uma formalidade ad substantiam.
Se desrespeitada a forma legal exigida para o negócio jurídico unilateral que é a procuração, a mesma é inválida para efeitos de se poder buscar nela, por interpretação, o interesse do mandatário, por válidas não serem as declarações de vontade constantes do escrito particular.
Não qualificada a procuração como outorgada no interesse do procurador ou mandatário, vale a regra geral da liberdade de revogação, quer da procuração quer do substabelecimento dos poderes nela contidos.
Nada dispondo em especial sobre a matéria os “Estatutos” de uma sociedade comercial por quotas, não pode uma pessoa, mediante simples invocação da qualidade de gerente na procuração forense, desistir validamente do pedido em que a sociedade pretende ver declarada a ineficácia da alienação de imóveis do seu património, reclamando poderes de representação social sem demonstrar estar autorizado pela assembleia geral da sociedade para, mediante desistência, dispor do direito cujo reconhecimento fora peticionado.


DECISÃO TEXTO INTEGRAL

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. - “Sociedade AA, Lda.” intentou, em 31.03.2009, acção declarativa ordinária contra “BB – Investimentos Imobiliários, Lda.” e CC, pedindo que fosse reconhecida a ineficácia do contrato de compra e venda celebrado entre a Autora e a Ré, declarando-se o mesmo como não escrito e de nenhum efeito e que seja cancelada a inscrição da aquisição da propriedade dos prédios objecto de compra e venda a favor da 1ª Ré.
Alegou, em resumo, que em 13.03.2009 foi outorgada escritura pública de compra e venda entre a Autora, que figura nesse acto como representada pelo Réu CC, outorgando na qualidade de gerente, e a Ré, nos termos da qual esta comprou àquela sete prédios. Porém, o Réu CC não era gerente da A. nem detinha poderes de representação da mesma, sendo que a invocada qualidade teve por base um substabelecimento sem reserva, por parte de DD, dos poderes de representação que a este haviam sido conferidos pela sociedade “T......I...... B.V.”, titular de 100% das participações sociais na Autora, apesar de a procuração não conferir poderes ao mandatário para representar a mandante nas assembleias gerais das suas participadas, nem poderes para se nomear gerente da A., nem para substabelecer.

Após ter sido apresentada contestação pela Ré “BB”, foi apresentado requerimento, em nome da Autora, subscrito por mandatária judicial, instruído com procuração forense emitida em nome da Autora e assinada pelo Réu CC, em 29/12/2009, outorgando na qualidade de “gerente com poderes para o acto” e conferindo poderes especiais para desistir dos pedidos formulados na acção.

Na sequência do requerido, foi proferida sentença, por via da qual foi julgada válida a desistência do pedido.

A Autora, impugnou a decisão, mediante recurso de apelação, que obteve procedência, em consequência do que foi revogada a sentença e determinado o prosseguimento do processo.

A Ré “BB, Lda.” interpõe agora recurso de revista para pedir a revogação do acórdão, reconhecendo-se como plenamente válido o substabelecimento em favor do Réu e como válida a desistência do pedido, ou, subsidiariamente, que se sustenha a decisão sobre esta questão até à decisão de fundo que há-de vir a ser tomada pelo Tribunal da Relação de Évora.

Para tanto, argumenta nas conclusões da alegação que apresentou:
I – A questão essencial e a que subjazem todas as demais é a do controlo da sociedade T......I...... B.V. na medida em que:
a. esta entidade de direito holandês era a única acionista da G......, SGPS, S. A., que por sua vez controlava integralmente a autora;
b. se discute se devem prevalecer os poderes conferidos por essa sociedade T......I...... B. V. ao seu acionista ultra-maioritário (o Sr. DD, titular de 90% do seu capital social), ou os poderes exercidos em nome daqueIa contra este (incluindo a revogação daqueIes poderes, em 17 de março de 2009) por parte de um seu auto-denominado Conselho de Administração.
II - Os documentos juntos aos autos, e designadamente o Doc. 4 mencionado peIa autora a fls. 150 e 163 (Conclusão 23), comprovam que, até 12 de novembro de 2009, o Sr. DD era detentor de 90% das ações da T......I...... B. V.
I I I - O que foi igualmente admitido peIa autora, que foi quem juntou ao processo o referido documento, comprovativo dessa transação (o que é reIevante, caso a autora pretenda - através do incumprimento do compromisso de tradução assumido - evitar que o tribunal tenha em conta esse documento em língua estrangeira).
IV - A procuração que a sociedade controlada pelo Sr. DD lhe conferiu em 24 de junho de 2008 não podia, portanto, ter sido revogada em 17 de março de 2009 contra o seu consentimento, uma vez que era passada no seu interesse (art. 265°, n.º 3 CC).
IV - E o seu sub-estabelecimento cor respondeu à sua vontade e interesse, ta I como resuItante do conteúdo da reIação jurídica subjacente (art. 264°, n° 1 CC, in fine).
V - o deferimento de uma providência cauteIar (por insuficiência de representação do réu CC) apenas impede que este fique transitoriamente impedido de Invocar a sua condição de gerente da sociedade. De modo aIgum se repercute no exercício de poderes que não pressupõem esse estatuto de gerência.
VI - Tendo em conta que o fundamento essencial da decisão recorrida foi a revogação da procuração conferida ao Sr. DD, e que esta não podia ter ocorrido (por ter sido passada também no seu interesse, atento o seu comprovado controlo da T......I......, B. V.), e que, atenta a natureza da reIação subjacente, era juridicamente admissível o sub­estabeIecimento, a decisão recorrida assentou num défice de informação que importa corrigir,
VII Não deixa de ser significativo que, muito embora tenha anteriormente clamado contra a intervenção processual do réu no sentido de pôr termo à demanda (instruindo a autora para desistir da ação), a procuração forense que a autora finaImente juntou aos autos tenha uma data posterior à alienação da participação de controle do Sr. DD na T......I......, B. V.
VIII - Só que, pelo facto de se ter obtido a total idade do capital da T......I...... B. V. em novembro de 2009, não se pode ­evidentemente - pôr em causa as alienações de património feitas por uma sua controlada em março de 2009.


A Recorrida respondeu em apoio do julgado e pediu a condenação da Recorrente por litigância de má fé.

2. - Em causa neste recurso, como começa por reconhecer a Recorrente, está a questão única de saber se aquando da apresentação da desistência do pedido, CC, também Réu na acção, tinha ou não poderes de representação da Autora.

3. - A Relação considerou assente a factualidade que segue, resultante de prova documental junta aos autos:

1) O réu CC foi nomeado gerente da autora na assembleia geral desta que teve lugar em 02.03.2009, nomeação essa que foi objecto de registo, pela (acta de fls. 49 a 51 e certidões de fls. 114 e sgs e de fls. 228 e sgs);
2) Nessa assembleia foram destituídos da gerência os então gerentes EE, FF e JJ (documentos já referidos);
3) A sociedade G...... - SGPS, S.A. é detentora da totalidade das quotas da autora (referida certidão);
4) A G...... intentou, em 20.03.2009, contra a ora autora, no 4º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa (procº. nº. 436/09.1TYLSB-A) procedimento cautelar de suspensão das deliberações sociais tomadas na dita assembleia geral de 02.03.2009 (certidões já referidas);
5) Por decisão de 26.03.2010, ali proferida, foi determinada a suspensão da execução das deliberações tomadas nessa assembleia, decisão essa que foi igualmente objecto de registo (certidão de fls. 228 e sgs);
6) Entretanto a G...... intentou acção contra a sociedade autora, acção essa igualmente objecto de registo, que se encontra pendente, e na qual a ali autora pede que sejam declaradas nulas as deliberações tomadas na dita assembleia geral;
7) A presente acção deu entrada em 31.03.2009 (fls. 30);
8) O requerimento de desistência dos pedidos deu entrada em 30.12.2009 (fls. 134).
9) O réu CC, conforme se alcança da respectiva acta, interveio na referida assembleia geral da autora de 02.03.2009 (vide fls. 49 e sgs), sendo (por ele) nomeado gerente, invocando “poderes legais para o acto de representação da única sócia G...... SGPS, S.A.”;
10) Tal representação teve por base o substabelecimento a que se refere o documento de fls. 65 e seguintes, com base na procuração a que alude o documento de fls. 59 e seguintes;
11) Com efeito, por procuração de 24.06.2008, a T..... I......... BV nomeou seu mandatário DD, conferindo-lhe poderes, para além do mais, para a representar em qualquer assembleia geral de accionistas das sociedades G...... SGPS, SA.
12) E, por substabelecimento de 18.02.2009, o referido DD substabeleceu, sem reservas, no réu CC todos os poderes que lhe foram conferidos por T......I...... BV.
13) Por deliberação do Conselho de Administração da T......I...... BV de 17 de Março de 2009, foi revogada a dita procuração de 24 de Junho de 2008, referida em 11) supra, na qual DD havia sido designado como representante legal da sociedade, assim como os substabelecimentos por ele outorgados, “nomeadamente o dito substabelecimento de 18.02.2009, referido no número anterior, onde os poderes de representação foram delegados a CC”.

4. - Mérito do recurso.

4. 1. - A Recorrente apresenta-se a defender, em primeiro lugar, que a procuração conferida a DD, ao abrigo da qual, mediante substabelecimento, agiu o (Réu) CC, invocando representação da Autora, não podia ter sido revogada, em Março de 1999, contra o seu consentimento, uma vez que era passada no seu interesse (do Mandatário DD), então detentor de 90% das acções da Mandante.
Depois, rebatendo o segundo fundamento invocado pela Relação, sustenta que o deferimento do procedimento cautelar que suspendeu a deliberação pela qual CC foi nomeado gerente da Autora não se repercute no exercício de poderes que não pressupõem esse estatuto de gerência.

Na decisão impugnada considerou-se que “conforme se alcança da factualidade enunciada, (…), os poderes de representação da sociedade autora, por parte do réu CC, com base nos quais interveio na assembleia geral da autora de 02.03.2009 (independentemente de tais poderes serem bastantes para a destituição da anterior gerência e para a sua nomeação como gerente único – questão essa que, conforme atrás referido, tem a ver com o mérito da causa) tiveram por base o substabelecimento (em 18.02.2009), por parte de DD, dos poderes de representação a este conferidos pela T......I...... BV, em 24 de Junho de 2008.
Todavia o certo é que tais poderes de representação (relativos quer à procuração, quer ao substabelecimento) vieram a ser revogados pelo Conselho de Administração da T......I...... BV de 17 de Março de 2009.
Tal significa que, a partir dessa data, o réu CC, deixou de ter poderes de representação da autora.
Assim e porque o requerimento de desistência dos pedidos deu entrada em juízo em data posterior (30.12.2009) a outra conclusão se não poderá chegar que não seja a de considerar que o réu CC, quando em 29 de Dezembro de 2009 emitiu procuração a favor da Exma Dra. (…) com base na qual foi apresentado o requerimento (fls. 134) de desistência dos pedidos, já não tinha poderes de representação da autora.
E assim sendo, face a tal falta de poderes de representação, não podia tal requerimento de desistência dos pedidos ser tido, para os devidos efeitos, como válido e eficaz.


4. 2. - A Recorrente invoca, como referido, a irrevogabilidade da procuração, porque passada no interesse do procurador.

Trata-se de questão não colocada e, consequentemente, não apreciada na decisão recorrida.

Apesar disso, perante a natureza e desenvolvimentos, de facto e de direito, verificados no recurso e respectivo objecto, em que tudo surge, no essencial, tratado ex novo pela Relação, apreciar-se-á o problema proposto, tanto mais que se está perante a averiguação dos termos em que deve valer a procuração à volta da qual giram as questões de direito processual e substantivo suscitadas nos autos.

Como estabelece o art. 265º-2 C. Civil, a procuração é livremente revogável pelo representado, não obstante convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação. Porém, se tiver sido conferida também no interesse do mandatário ou de terceiro, a procuração não pode ser revogada sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa – n.º 3 do mesmo artigo.

A procuração junta aos autos, a que aludem os pontos de facto 10) a 12) consta de um escrito particular emitida pelo administrador único da “T......I...... B.V.”, nomeando seu Mandatário DD “para, individualmente, representar a Mandante” nos actos que enuncia, dela constando ser “válida por um ano de calendário a contar da data da emissão, ou em data anterior, caso o presente documento seja revogado pela sociedade”.

Ora, antes de mais, deve notar-se que as procurações conferidas também no interesse do procurador devem ser lavradas por instrumento público, do mesmo passo que as que confiram poderes gerais de administração civil ou de gerência comercial, para fins que envolvam confissão, desistência ou transacção em pleitos judiciais, ou representação em actos que devam realizar-se por escritura pública ou para cuja prova seja necessário documento autêntico, devem ser conferidas, no mínimo, por documento autenticado por notário, estando os respectivos substabelecimento sujeitos à mesma forma – art. 116º C. Notariado.

O requisito de forma, exigido pelo n.º 3 desse art. 116º para as procurações conferidas também no interesse do procurador ou de terceiro, nada refere ou esclarece sobre a necessidade de constar do instrumento público a declaração relativa ao interesse do procurador.

Assim, tem-se entendido que a existência ou não do interesse do mandatário ou de terceiro, que deva ter-se por relevante para efeitos da irrevogabilidade do mandato, não decorre pura e simplesmente de uma tal declaração constar ou não da procuração, antes havendo que apreciar, designadamente por via interpretativa, se concreta e efectivamente ela foi conferida no interesse do mandatário (ou de terceiro), pois que “a concessão da representação voluntária tem de ter um fundamento, uma relação que lhe subjaz, mas com ele não se confunde. Seja ele uma relação de mandato (a representação não é essencial ao mandato) seja outra relação, nem a representação é este fundamento nem este é aquela” (Ac. STJ, de 3/6/1997, BMJ- 468º-361).

No caso sob apreciação, seja pelo conteúdo dos poderes conferidos, seja para efeito da ora pretendida irrevogabilidade, a procuração estava submetida por lei a determinada forma.
Trata-se de formalidade não destinada apenas a fazer prova da declaração, antes pretende garantir a ponderação, além de colaborar na formação da vontade do representado, devendo, por isso, considerar-se o cumprimento do preceituado no art.º 116º do C. N. uma formalidade ad substantiam (cfr. CALVÃO DA SILVA, “Procuração”, in ROA – 2007-II-731/753).

Consequentemente, porque desrespeitada a forma legal exigida para o negócio jurídico unilateral que é a procuração, a mesma é inválida, designadamente para efeitos de se poder buscar nela, por interpretação, nos termos dos arts. 236º e 238º C. Civil, o interesse do mandatário, pela óbvia razão de válidas não serem as declarações de vontade constantes do escrito particular – art. 220º C. Civil.

Acresce que, mesmo que assim não fosse, isto é, ainda que não se revelassem contrariadas as razões da forma especial exigida, não se vislumbra no texto do documento a mínima expressão, ainda que imperfeita, no sentido de a vontade do declarante ir no sentido daquele interesse, tutelado com a irrevogabilidade unilateral.
Bem pelo contrário, do texto do documento constam, como descrito expressões a apontar em sentido diferente do defendido pela Recorrente como a alusão a poderes conferidos «individualmente», à fixação de um prazo preciso de validade da procuração e ainda (sobretudo) à expressa previsão de poder ser «revogado pela sociedade», ou seja, unilateralmente, antes de decorrido o prazo de caducidade de um ano.

Nada autoriza, assim, que se qualifique a procuração como outorgada no interesse do procurador ou mandatário, pelo que, valendo a regra geral da liberdade de revogação prevista no art.º 265 nº2 do C. Civil, não há fundamento para retirar eficácia à revogação quer da procuração quer do substabelecimento dos poderes nela contidos, como considerado no acórdão recorrido.

Nesta conformidade, nada mais resta que reiterar a conclusão da Relação no sentido de que com a revogação dos poderes conferidos pela procuração, em 17 de Março de 2009, deixou CC de ter poderes de representação da autora, ausência de poderes que se mantinha quando, em 29 de Dezembro de 2009, emitiu a procuração forense com base na qual foi apresentado o requerimento de desistência dos pedidos, e que decorria também de ter decorrido o prazo de caducidade da procuração nela própria fixado.

4. 3. - Reportando-nos, agora, especificamente ao caso da desistência do pedido na acção, haverá que convocar a norma do art. 297º CPC, a estabelecer que os representantes das pessoas colectivas só podem desistir nos precisos limites das suas atribuições ou precedendo autorização especial.
A desistência do pedido tem como efeito, de resto declarado na decisão da 1ª Instância, a extinção do direito que se pretendia fazer valer, ou seja, a relação de direito material em litígio (art. 295º CPC).

Ora, através da acção a A. pretende recuperar bens imóveis que foram alienados em seu nome, alegadamente sem poderes de representação.
A desistência de tais pedidos implica, como consequência directa e necessária, a perda definitiva dos prédios a favor do comprador, a Ré, vale dizer, a disposição do respectivo direito de propriedade.

Daí as cautelas acolhidas no citado art. 297º, a remeter para o regime substantivo regulador da representação, no caso, a norma do n.º 2 do art. 246º do CSC, a atribuir aos sócios, que não apenas à gerência, a competência para deliberar sobre a alienação ou oneração de imóveis, salvo diversa disposição do pacto social.

Assim, nada dispondo em especial sobre a matéria os “Estatutos” da Autora, juntos com a petição inicial, torna-se incontornável concluir que, dada a natureza dos direitos em lide e seus efeitos patrimoniais sobre a Sociedade Autora, jamais poderia CC, mediante simples invocação da qualidade de gerente, reclamar poderes de representação social sem demonstrar estar autorizado pela assembleia geral da A. para, mediante desistência, dispor do direito cujo reconhecimento fora peticionado (cfr., neste sentido, LEBRE DE FREITAS, “CPC, Anotado”, vol. 1º, 527).


Não poderia, por isso, o requerimento de desistência do pedido ser tido, como foi, “pela qualidade do interveniente”, julgada válida, não merecendo censura a decisão que revogou tal decisão.

4. 4. - A solução encontrada dispensa a apreciação do segundo fundamento, ou sub-questão, relativo às consequências da providência cautelar sobre os poderes do (Réu) CC, pronúncia que se tem por prejudicada, nos termos do n.º 2 do art. 660º CPC.

4. 5. – A Recorrida pede a condenação da Recorrente como litigante de má fé, por fazer afirmações de conteúdo não verdadeiro, não sendo o recurso mais que uma manobra dilatória.

As afirmações de factos que a Recorrida qualifica de inverdades, sem pudor e risíveis dizem respeito a questões cuja apreciação não cabe no âmbito deste recurso e cuja veracidade ou falsidade, no confronto com a matéria de facto disponível - que este Tribunal não pode alterar -, não se conhece.

No mais, ao menos em face da solução adoptada para a questão colocada no recurso, estar-se-á perante erros de natureza puramente técnico-jurídica que, enquanto tais, também não permitem imputar à Parte as condutas tipificadas no n.º 2 do art. 456º CPC, designadamente por preenchimento da previsão das suas alíneas a) e b), a título de dolo ou negligência grave.

De desatender, portanto, a pretensão manifestada.

5. - Respondendo, em síntese final, à questão colocada poderá concluir-se:

- A procuração conferida também no interesse do procurador deve ser lavrada por instrumento público.
- Trata-se de exigência ou requisito de forma que deve considerar-se uma formalidade ad substantiam.
- Se desrespeitada a forma legal exigida para o negócio jurídico unilateral que é a procuração, a mesma é inválida para efeitos de se poder buscar nela, por interpretação, o interesse do mandatário, por válidas não serem as declarações de vontade constantes do escrito particular.
- Não qualificada a procuração como outorgada no interesse do procurador ou mandatário, vale a regra geral da liberdade de revogação, quer da procuração quer do substabelecimento dos poderes nela contidos.
- Nada dispondo em especial sobre a matéria os “Estatutos” de uma sociedade comercial por quotas, não pode uma pessoa, mediante simples invocação da qualidade de gerente na procuração forense, desistir validamente do pedido em que a sociedade pretende ver declarada a ineficácia da alienação de imóveis do seu património, reclamando poderes de representação social sem demonstrar estar autorizado pela assembleia geral da sociedade para, mediante desistência, dispor do direito cujo reconhecimento fora peticionado.

6. - Decisão.

Nesta conformidade, acorda-se em:
- Negar a revista;
- Manter, embora com fundamentos não totalmente coincidentes com os do acórdão recorrido, a decisão impugnada; e,
- Condenar a Recorrente nas custas.


Lisboa, 25 Outubro de 2011

Alves Velho (Relator)
Paulo Sá
Garcia Calejo