ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


PROCESSO
2026/07.4TTPRT.P1.S1
DATA DO ACÓRDÃO 11/16/2011
SECÇÃO 4ª SECÇÃO

RE
MEIO PROCESSUAL REVISTA
DECISÃO NEGADA A REVISTA
VOTAÇÃO UNANIMIDADE

RELATOR PEREIRA RODRIGUES

DESCRITORES TRABALHO SUPLEMENTAR
PROVA
DOCUMENTO IDÓNEO

SUMÁRIO I. A doutrina e a jurisprudência têm convergido no entendimento de que o “documento idóneo”, para prova do trabalho suplementar, realizado há mais de cinco anos, terá de consistir num documento escrito, emanado da própria entidade empregadora e que, por si só, tenha força probatória bastante para demonstrar a existência dos factos constitutivos do crédito, sem necessidade de recurso a outros meios de prova, designadamente a prova testemunhal.

II. Se o documento oferecido como prova do trabalho suplementar, realizado há mais de cinco anos, por si só, não faz a demonstração da prestação do trabalho desta natureza, por ser necessário complementá-la com outros meios de prova, tal documento não poderá ser havido como “documento idóneo”.


III. Tendo o trabalhador apresentado, para prova do trabalho suplementar, "registos de entradas e saídas" na empresa, manuscritos pelos próprios trabalhadores, por não serem da autoria da entidade empregadora e por carecerem de ser complementados, esclarecidos ou interpretados através da prova testemunhal, não podem constituir documentos idóneos para prova do trabalho suplementar, pretensamente prestado pelo trabalhador há mais de cinco anos.



DECISÃO TEXTO INTEGRAL            

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A SOLUCIONAR.

No Tribunal do Trabalho do Porto, AA intentou a presente acção, com processo comum, contra Município do Porto, pedindo que o réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 165.474,28, a título de trabalho suplementar, trabalho prestado em dia de descanso semanal obrigatório, descansos compensatórios, trabalho prestado em dias feriados, trabalho nocturno e crédito de formação, com juros legais desde a data de vencimento das respectivas quantias.

Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que:

Foi admitido pela "BB" em 01/06/1997, que foi extinta, tendo o réu ficado responsável pelo passivo daquela Associação;

O seu período de trabalho semanal era de 35 horas, de 2.ª a 6.ª feira, tendo prestado muitas horas para além do período diário e semanal de trabalho, que a "BB" não lhe pagou;

A "BB" não lhe pagou o acréscimo pelo trabalho nocturno prestado;

O regime de isenção de horário a que ficou sujeito a partir de 01/06/1999 não prejudica o direito aos dias de descanso semanal e complementar e aos feriados;

A "BB" não lhe deu formação profissional nem lhe pagou a crédito de formação dos anos 2004 a 2006.

O réu contestou, impugnando parcialmente a factualidade alegada pelo autor, e alegando, por sua vez, em síntese, que:

Os fins-de-semana e feriados eram dias normais de trabalho;

O autor estava isento de horário de trabalho e o mesmo gozou todos os dias de descanso semanal e feriados que lhe assistiam;

Já em 2004 gozava o descanso semanal à Segunda-feira e era o próprio autor quem agendava o gozo do descanso semanal;

Contanto que estivesse presente nos espectáculos ou assegurasse quem o substituísse, o autor podia escolher as horas de entrada e saída, o tempo de permanência e o período de gozo do descanso semanal;

A actividade desenvolvida no RTM pela "BB" é uma actividade de espectáculo e de diversão pública;

Em 2006 promoveu duas acções de formação.

Invocou ainda a ré a prescrição do trabalho suplementar anterior a 2003.

O autor respondeu, concluindo pela improcedência das excepções e como na petição inicial.

 Procedeu-se a audiência preliminar, na qual foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a excepção de prescrição invocada pelo réu.

Foi ainda proferido, na mesma diligência, despacho de selecção da matéria de facto assente, tendo-se aí decidido não proceder à fixação de Base Instrutória.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova produzida, foi, posteriormente, proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente e condenando o Réu a pagar ao autor as seguintes quantias: «€ 1.000,66, a título de acréscimo de retribuição por trabalho prestado em dias feriados no ano de 2004, acrescido de juros de mora, à taxa legal desde a data de vencimento das prestações em falta; - € 730,40, a título de acréscimo de retribuição por trabalho prestado em dias feriados no ano de 2005, acrescido de juros de mora, à taxa legal desde a data de vencimento das prestações em falta; - € 522,66, a título de acréscimo de retribuição por trabalho prestado em dias feriados no ano de 2006, acrescido de juros de mora, à taxa legal desde a data de vencimento das prestações em falta; - € 162,80, por crédito de formação relativo ao ano de 2004, acrescido de juros de mora, à taxa legal desde 6/02/2007; - € 166,05, por crédito de formação relativo ao ano 2005, acrescido de juros de mora à taxa legal desde 6/02/2007; - € 235,96, por crédito de formação relativo ao ano 2006, acrescido de juros de mora à taxa legal desde 6/02/2007».

Quanto ao mais, foi o réu absolvido dos pedidos deduzidos.

Inconformado com esta decisão, dela recorreu o Autor, e tendo os autos prosseguido seus termos veio a ser proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto, no qual se acordou, por unanimidade, em conceder parcial provimento ao recurso, condenando o Réu a pagar ao Autor, no tocante ao trabalho prestado em dias feriados nos anos de 2005 e 2006, as quantias de € 733,40 e € 528,10, respectivamente, acrescidas dos juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento das prestações em falta. No demais foi confirmada a sentença recorrida.

Mais uma vez inconformado, o Autor interpor recurso de Revista para este STJ, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES:
«1ª A decisão recorrida entendeu não dar como provado o trabalho prestado nos anos de 1998 a 2003, por falta de documento idóneo nos termos do art. 381°, n° 2, do CT (e, embora não o diga, do correspondente preceito pretérito, o art. 38°, n° 2, da LCT).
2ª Não considerou, para esse efeito, os «registos de entradas e saídas» manuscritos pelos próprios trabalhadores (facto 20 do acórdão), por não serem da autoria da empregadora, consoante justificou com base na sentença de 1.ª instância (fls. 1648/9).
3ª Quanto a esses registos, o que se apurou é que os trabalhadores assinalavam nas folhas a sua presença e horas de entrada e de saída do trabalho e a empregadora procedia ao controlo das entradas e saídas dos trabalhadores, ou seja, ao apuramento dos tempos de trabalho, por esses registos, que a partir de certa altura ou passou a registar informaticamente, por transposição dos dados deles constantes, que aceitava como bons.
4ª Eram pois estes os registos que a empregadora tinha e adoptava como seus, para efeitos de controlo de presenças/assiduidade e dos tempos de trabalho.
5ª Não pode agora declinar-se a prova deles constante com o argumento de que não eram da autoria da empregadora, pois provou-se que a empregadora os aceitava como bons, qua tale, sem mais, e os controlava, ao menos esporadicamente (facto 20 do acórdão).
6ª A própria lei permitia, como permite (art. 231°, n° 2, CT de 2009) que o registo do trabalho suplementar possa ser efectuado pelo próprio trabalhador: O que a lei pretende é que a empregadora possua os registos, seja elaborados pela própria, seja pelos trabalhadores.
7ª Ora, assumindo os registos como seus, como não pode deixar de se entender, pela verificação da conformidade (facto 20 do acórdão) e transposição para registo informático (como a própria empregadora confessou na acta de 10.2.2010 e reiterou no requerimento de 22.2.2010), tem de se concluir que emanam e têm origem na empregadora e não podem deixar de ser entendidos como sendo documentos idóneos à prova do art. 19° da p.i., que era a matéria cuja prova o A. se propunha com eles, e que portanto deve ser dado como provado, na parte documentada por esses registos.
8ª Tem-se, pois, por incorrectamente julgado o art. 19° da p.i., na parte em que não foi considerada provada pelo teor dos registos juntos aos autos pelo R., no período de 1998 a 2002, por se ter desvalorizado a sua força probatória material, tendo-se feita incorrecta aplicação do art. 38°, n° 2, da LCT e 381°, n° 2, do CT;
9ª Por maioria de razão, no período de 19.12.2002 a Dezembro de 2003, não sendo necessário o «documento idóneo», deve ser considerado provado o trabalho que resulta desses documentos.
10ª Em relação aos dias de descanso, tendo-se provado apenas que o A. usualmente gozava os seus descansos semanais à 2.ª feira a que acrescia outro dia da semana, de acordo com a conveniência e necessidade do serviço (facto 15 do acórdão) e que o A. tinha um período de trabalho semanal de 35 horas [factos 6/7 e 11 do acórdão] e que não gozou os dois dias de descanso semanal a que tinha direito, como se colhe dos registos dos tempos de trabalho e do facto 22 do acórdão, deve a empregadora ser condenada no pagamento dos valores em falta a esse título e correspondentes descansos compensatórios;
11ª E isso independentemente dos dias em que calhavam os dias de descanso ou em que eles foram gozados e de a empregadora estar ou não dispensada de encerrar ao domingo ou noutro dia da semana.
12ª A fundamentação da decisão recorrida, ao fazer depender a concessão do trabalho suplementar não da prova efectiva de que o A. não gozou os dois dias de descanso semanal a que tinha direito mas sim de que não gozou os descansos ao sábado e domingo, com ele tinha alegado, além de uma injustiça chocante, é errónea, pois que o que a lei tutela é o direito à remuneração pelo trabalho prestado e o pagamento do trabalho suplementar.
13ª E, assim, tendo ficado provado que o A. não teve o descanso devido, devia ser a empregadora obrigada a pagar o trabalho suplementar daí decorrente e os descansos compensatórios, como peticionou, nos termos próprios das normas relativas ao trabalho suplementar.
14ª A actividade da empregadora era uma actividade de espectáculo e de diversão pública (facto 3 do acórdão), o que não consubstancia a prova de uma actividade exclusiva ou predominantemente nocturna [para efeitos do art. 1º do DL 348/73 e do art. 257°, n° 3, a) do CT];
15ª Logo, errada a falta de consideração do trabalho nocturno do A., para efeitos de condenação no acréscimo devido.
NESTES TERMOS DEVE O RECURSO MERECER PROVIMENTO, COM AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS».

O R. contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida e concluindo:
«1. O fundamento do recurso de revista é a violação da lei substantiva, cabendo ao Supremo Tribunal de Justiça a aplicação do Direito aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, estando-lhe vedada a reapreciação das provas e a fixação de tais factos, sendo precisamente isto que o Recorrente pede nas suas alegações, impondo-se, assim, salvo o respeito por melhor entendimento, que não se conheça do presente recurso de revista, por inadmissibilidade processual.
2. Registos de entrada e saída das instalações de um teatro elaborados pelos próprios trabalhadores sem prévia determinação da empregadora, não sujeitos a qualquer tratamento administrativo, nem análise, ou controlo sistemático por parte desta e que por esta nem sequer foram solicitados não constituem documento idóneo para os fins do disposto no n.° 2 do artigo 381.° do Código de Trabalho de 2003 (ou do n.° 2 do artigo 38.° do DL n.° 49.408, de 24.ll.1969), mais a mais quando as testemunhas referem que os "trabalhadores se controlavam uns aos outros":
3. Bem andaram as instâncias, por isso, ao declarar que "os documentos juntos aos autos, nomeadamente os registos de entradas e saídas manuscritos pelos próprios trabalhadores e, não da autoria da entidade empregadora, são insusceptíveis de integrar tais pressupostos" (i.e., de constituírem documento idóneo) "pelo que os factos que fundamentam os créditos em causa não foram objecto de prova nos termos previstos na citada disposição legal", pois que, bem ao invés, "documento idóneo será o documento escrito com origem na própria entidade empregadora, que demonstre a existência dos factos constitutivos do crédito e que seja suficientemente elucidativo, de molde a dispensar a sua integração ou dilucidação através de outros meios probatórios, designadamente testemunhas, pois que, de contrário, já não seria o documento que constituiria o meio idóneo de prova (...)";
4. Sem prescindir, sempre teria de sucumbir a crítica do recorrente ao Acórdão em crise, pois que o mesmo prestava serviço ao abrigo do regime de isenção de horário de trabalho, sendo certo que quase todo o pedido que formulara assentara na suposta prestação de trabalho suplementar nos dias de descanso que dizia serem o Sábado e o Domingo, o que não se provou, antes se tendo demonstrado, sem mácula, serem tais dias jornadas normais de trabalho e que o descanso sucedia sempre à 2. ª feira e em outro dia da semana, livremente escolhido pelo recorrente;
5. Em decorrência da anterior conclusão, também impeditivo das pretensões do recorrente é o facto de se ter provado que a concreta duração da jornada do trabalho (tal como do descanso) não advinha, sequer, de determinação da entidade empregadora, mas do próprio trabalhador, que dispunha, para tanto, de ampla liberdade, sendo ele quem auto-determinava o início e fim do seu dia de trabalho, a carga horária associada e, bem assim, a calendarização do seu descanso semanal (embora com a 2.ª feira como dia de descanso sistemático, ou quase);
6. Ao contrário do que o recorrente pretende, a matéria de facto prova demonstra, à saciedade, ter o mesmo gozado todas as folgas a que tinha direito, gozo que, de resto, nos termos dessa mesma factualidade, era definido pelo próprio - e sendo certo que o recorrente nem sequer demonstrou terem as partes acordado na existência de um dia de descanso complementar fixo (cfr. por exemplo, o sintomático teor dos 15.° e 16.° factos julgados provados elencados no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, em especial quando cotejados com o impressivo teor de toda a documentação junta aos autos) ...
7. Aliás, o recorrente pede ao Supremo Tribunal de Justiça que se abstraia, em violação da lei processual vigente, das regras da estabilidade da instância e dos limites do peticionado em 1.ª instância, pois que o recorrente formulou, na petição inicial pedido atinente ao trabalho suplementar pretensamente prestado aos Sábados e Domingos enquanto dias de descanso semanal, não podendo agora, em sede de recurso, alterar essa causa de pedir para outros dias da semana;
8. A decisão tomada na sentença e que o Acórdão em crise doutamente manteve em matéria de nocturno afigura-se, também, inatacável, pois que, conforme se demonstrou e consta da matéria de facto provada, a actividade da BB não só era predominantemente realizada à noite (tal como a do recorrente), como era uma actividade que, pela sua natureza - espectáculos de Teatro - deve ser realizada à noite, além de que não tendo a prestação de trabalho nocturna sido obrigatória, nunca haveria lugar ao pagamento da retribuição respectiva;
9. Ainda que assim não fosse, cumpre aqui, com base no disposto no artigo 684.°-A do CPC e por existir manifesta pluralidade de fundamentos da defesa, requerer, a título subsidiário, a ampliação do âmbito do recurso a pedido do recorrido, assim prevenindo eventual necessidade da sua apreciação, o que faz nos termos das três conclusões seguintes;
10. Caso - por mera hipótese e sem conceder - algum direito em matéria de trabalho suplementar fosse reconhecido ao recorrente quanto ao período anterior a Junho de 1999 (data em que a situação de Isenção de Horário de Trabalho mereceu autorização por parte da Inspecção-Geral do Trabalho), então o exercício do direito a receber esse valor seria abusivo na modalidade venire contra factum propriurn, por ter o recorrente beneficiado, nesse mesmo período, da retribuição especial pela isenção de horário de trabalho;
11. Ainda sem prescindir e quanto ao período anterior a Junho de 1999, sempre deveria ser deduzido, por compensação de créditos, a qualquer valor que se reconhecesse ao recorrente o valor das retribuições especiais pela isenção de horário de trabalho, ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa e atenta a obrigação de restituição dos montantes com os quais o enriquecido se locupletou que o caracteriza;
12. Por fim, também a alegação do recorrente a respeito do descanso semanal - a vingar, no que de modo algum se concede - sempre deveria improceder por configurar manifesto abuso do direito, uma vez que se demonstrou ser o recorrente quem, com toda a liberdade, compunha a sua jornada de trabalho, as horas de entrada e saída e, bem assim, o dia em que, para além do sistemático descanso à 2ª feira, desfrutava do 2º dia de descanso semanal.
Nestes termos, e nos que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso de revista interposto pelo recorrente, mantendo-se na íntegra a douta decisão injustamente em crise, com o que farão, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA!».

O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido da negação da Revista.

Foram colhidos os legais vistos, pelo que cumpre enunciar as questões que se colocam à apreciação, que se passam a discriminar, pela ordem em que abaixo se conhecerão, e que são as relativas:

1. À prova do trabalho suplementar prestado.

2. Ao trabalho suplementar prestado em dia de descanso, obrigatório e complementar e ao trabalho nocturno.

II.   FUNDAMENTOS DE FACTO.

Os factos considerados provados nas instâncias são os seguintes:

1. A "BB" era uma associação sem fins lucrativos, de utilidade sedeada no Teatro Rivoli, tendo por objecto a programação, a organização e a produção das actividades do Rivoli-Teatro Municipal, a programação e produção ou co-produção do programa anual de animação recreativa e cultural, que se desenvolvesse em espaços públicos ou espaços culturais, pertencentes ou não aos associados, a gestão de quaisquer outras infra-estruturas que os associados queiram entregar-lhe, desde que aceitasse o compromisso, cabendo-lhe estimular e divulgar a criação artística em todas as suas expressões, apoiar novos artistas e novas formas de criação e de expressão artísticas, apostar na formação de novos públicos, contribuir para a revitalização do centro da cidade, promover a animação da cidade como elemento essencial do seu desenvolvimento turístico e social e fomentar o intercâmbio cultural a nível nacional e internacional, podendo igualmente, com vista ao equilíbrio económico-financeiro da sua actividade e sem prejuízo dos seus fins estatutários, desenvolver actividades rentabilizadoras do património de que fosse proprietário ou possuidor.

2. Aos Auditórios do Rivoli foi atribuído alvará de licença de recinto, conforme documentos de fls. 194 a 200, […].

3. A actividade desenvolvida, no RTM pela "BB", era uma actividade de espectáculo e de diversão pública.

4. O autor foi admitido pela "BB - …", com sede no Teatro Municipal Rivoli, Praça D. João I, Porto, no dia 01/06/1997, por contrato denominado de trabalho a termo certo, com a categoria de "Frente da Casa" e com funções de supervisão do serviço prestado pelo concessionário dos bares, restaurante e café-concerto, zelando pela qualidade do mesmo, articulação entre a programação do teatro e o serviço de restauração e bares, organização e coordenação dos serviços de atendimento ao público (porteiros, arrumadores, etc.), coordenação do sector de bilheteira e de informação ao público, supervisão de limpeza e manutenção dos espaços públicos do teatro, articulação entre a frente da casa e o palco através do Director Técnico e Director de Cena e como relações públicas, conforme documento de fls. 130 a 131, […].

5. Nos termos da cláusula terceira, ponto 3.1. de tal contrato, o autor auferia a remuneração base mensal ilíquida de Esc. 180.000$00 (cento e oitenta mil escudos), a que acresce um valor de Esc. 54.000$00 (cinquenta e quatro mil escudos) a título de isenção de horário.

6. Com início em 01/06/1999 o autor celebrou com a "BB" novo contrato denominado "de trabalho por tempo indeterminado", conforme documento de fls. 132 a 133, […].

7. Foi estipulado na cláusula quarta de tal contrato que o autor exercerá as suas funções em regime de isenção de horário, sem prejuízo de ter que garantir um mínimo de trinta e cinco horas semanais.

8. Foi ainda estipulado na cláusula quinta, n.° 1, do mesmo contrato, que a "BB" pagará ao autor a retribuição mensal ilíquida de 212.700$00 (duzentos e doze mil e setecentos escudos), a que acrescerá a quantia de 63.810$00 (sessenta e três mil oitocentos e dez escudos) a título de isenção de horário.

9. Na qualidade de "Frente da Casa" no RTM, o autor era entendido como um cicerone da referida casa de espectáculos, desempenhando, nessa medida, funções de relações públicas do Teatro perante os frequentadores dos espectáculos e um intermediário entre estes e o palco.

10. O autor trabalhou inicialmente para a "BB" na Rua de Entreparedes, fazendo-o aí transitoriamente, enquanto decorriam as obras do Teatro Rivoli e se aguardava a sua abertura.

11. Nesse período de transição, o autor trabalhava cerca de trinta e cinco horas semanais, de Segunda a Sexta-feira, das 10.00 às 18.00, com intervalo para almoço.

12. A partir de Outubro de 1997, concluídas aquelas obras e aberto o Teatro ao público, houve necessidade de ajustar os períodos diários e semanais de trabalho do autor e demais trabalhadores, atendendo ao seu período de funcionamento e espectáculos aí realizados.

13. O Rivoli estava aberto ao público aos Sábados e Domingos, dias em que acolhia diversos espectáculos, o que era do conhecimento do autor, sabendo este que tal iria suceder desde que foi contratado.

14. Assim, a partir Outubro de 1997 o autor passou a iniciar o seu período de trabalho diário usualmente às 14.00 horas.

15. O autor gozava usualmente os seus descansos semanais às Segundas-feiras a que acrescia um outro dia da semana, sendo que era ele quem agendava tais dias de descanso semanal, fazendo-o também em Terças, Quartas e Quintas-feiras, bem como por varias vezes em Sábados e Domingos, de acordo com a conveniência e necessidade do serviço, acumulando dias de folga se necessário.

16. O autor podia marcar os seus dias de descanso semanal com liberdade, desde que assegurasse quem o substituísse durante os espectáculos, como efectivamente sucedeu, tendo-os alternado, pelo menos durante algum tempo, com a colega de trabalho CC.

17. A Direcção da "BB" deliberou em 28/02/2005 que o RTM encerraria às Segundas-feiras as actividades de palco, conforme documento de fls. 201 a 202, […].

18. Pelo menos desde 02/06/1999 foi autorizado pelo IDICT o regime de isenção de horário de trabalho do autor, conforme documento de fls. 304 a 305, […].

19. Desde que estivesse assegurado o normal funcionamento do serviço, o autor podia escolher as horas de entrada e de saída e o tempo de permanência no local de trabalho.

20. O autor assinalava a entrada e a saída do trabalho em folhas denominadas "Registo de Entradas e Saídas" e, mais tarde, também mediante registo através de registo magnético, sendo que o controlo da conformidade dos registos manuais com a realidade apenas esporadicamente foi efectuado.

21. Em benefício da "BB" e da sua actividade, com o seu conhecimento e sem a sua oposição, a fim de suprir necessidades do serviço, o autor prestou trabalho, pelo menos nos dias constantes dos documentos juntos a fls. 1565 a 1598, […] bem como constantes do CD Rom com eles apresentado, de Janeiro de 2004 a Dezembro de 2006, gozando as folgas neles mencionadas.

22. Em Janeiro de 2007, o autor gozou pelo menos 12 dias de folga.

23. Em 09 de Janeiro de 2007, a Assembleia-Geral de associados deliberou, por unanimidade, a extinção da "BB", conforme documento de fls. 248 a 253, […].

24. Por deliberação de 22/06/2007 o réu ficou responsável por todos os passivos supervenientes, e ainda contingentes ou pendentes de decisão judicial daquela Associação, conforme documento de fls. 254 a 259, […].

25. Por carta datada em 09/01/2007, a "BB" comunicou ao autor que o seu contrato de trabalho tinha caducado, com a alegação de que tinha sido deliberada nessa data a sua extinção, em assembleia-geral de associados, conforme documento de fls. 134 a 138, […].

26. Em 05/02/2007 o autor recebeu nova carta da "BB", datada de 01/02/2007, a comunicar que, terminando, no dia 04/02/2007, o espectáculo Miss Daisy, programação pendente a cujo cumprimento estava afecto, os efeitos laborais da carta de 09/01/2007 se produziam a 06/02/2007, conforme documento de fls. 140, […].

27. O autor continuou a trabalhar e a "BB" pagou-lhe o mês de Janeiro (de 2007) por inteiro.

28. As retribuições mensais ilíquidas que o autor auferiu da "BB" foram as seguintes: - em 1997, 180.000$00; - em 1998, 207.500$00; - em 1999, 212.700$00; - em 2000, 220.145$00; - em 2001, 231.531$00; - em 2002, 1.186,63 euros; - em 2003, 1.216,30 euros; - em 2004, 1.234,54 euros; - em 2005, 1259,23 euros; - em 2006 e 2007, 1.278,12 euros.

29. As retribuições do autor eram pagas no fim de cada mês a que respeitavam.

30. No ano de 2006, a "BB" promoveu duas acções de formação subordinadas aos temas Combate a Incêndios e Primeiros Socorros, cuja duração ascendeu, no seu cômputo, às 7 horas, nos dias 30 e 31 de Marco de 2006, ministradas pela "Atlanticare, Serviços de Saúde, S.A.".

31. O autor compareceu a uma das acções de formação, a de 31 de Marco de 2006, tendo faltado à ministrada no dia 30 de Marco de 2006.

32. A "BB" teve sempre durante o período de 1998 a 2007 mais de 10 trabalhadores ao seu serviço.

III.  FUNDAMENTOS DE DIREITO.

a) Quanto à prova do trabalho suplementar.

Há que considerar duas situações: uma relativa ao trabalho suplementar prestado há mais de cinco anos e outra ao prestado há menos de cinco anos.

Nos termos do n.º 2, do artigo 38.º, da LCT e n.º 2, do artigo 381°, do Código do Trabalho de 2003 (aplicáveis, sucessivamente, no caso dos autos) os créditos resultantes da realização de trabalho suplementar, vencidos há mais de cinco anos, só poderão ser provados por documento idóneo.

Dizem, a propósito deste normativo, Mário Pinto, Pedro Martins e Nunes de Carvalho que:

«Introduz-se assim uma verdadeira limitação dos meios de prova, com o afastamento da prova testemunhal e da prova por presunção, e a imposição de um requisito particular para a prova documental. O legislador quis, por certo, acautelar a posição do empregador relativamente a débitos vencidos há já bastante tempo e relativamente aos quais sempre poderia ser difícil a prova de que os mesmos haviam sido satisfeitos. Note-se que durante cinco anos não existe qualquer limitação quanto à prova dos créditos referidos neste preceito (…)»[1].

Seja como for, estamos em face de uma opção do legislador, segundo a qual, a prova dos aludidos créditos não poderá ser efectuada por qualquer meio de prova, mas apenas através de “documento idóneo”.

Tenha-se presente que, com vista, entre o mais, a facilitar a prova da realização do trabalho suplementar, nos termos dos n.ºs 1 a 5 do artigo 204.° do CT de 2003, o empregador deve possuir um registo de trabalho suplementar onde, antes do início da prestação e logo após o seu termo, são anotadas as horas de início e termo do trabalho suplementar,  o qual deve ser visado pelo trabalhador imediatamente a seguir à sua prestação. De tal registo deve constar sempre a indicação expressa do fundamento da prestação de trabalho suplementar, além de outros elementos fixados em legislação especial e ser anotados os períodos de descanso compensatório gozados pelo trabalhador.

Além disso, o empregador deve possuir e manter durante cinco anos a relação nominal dos trabalhadores que efectuaram trabalho suplementar, com discriminação do número de horas prestadas e indicação do dia em que gozaram o respectivo descanso compensatório.

Da conjugação dos normativos citados, conclui-se que havendo registo do trabalho suplementar, como a lei o impõe e cuja violação até sanciona (n.º 7 do citado art. 204.º), esse registo constituirá, indubitavelmente, o “documento idóneo” para prova da realização do trabalho suplementar.

Porém, pode suceder que o empregador viole a lei e não proceda ao registo a que está obrigado e nessa hipótese o trabalhador não pode ser penalizado pelo comportamento omissivo daquele.

No entanto, mesmo nessa situação e relativamente aos créditos resultantes da realização de trabalho suplementar vencidos há mais de cinco anos, a lei determina que só poderão ser provados por “documento idóneo”.

E a doutrina e a jurisprudência têm convergido no entendimento de que o “documento idóneo” terá de consistir num documento escrito, emanado da própria entidade empregadora e que, por si só, tenha força probatória bastante para demonstrar a existência dos factos constitutivos do crédito, sem necessidade de recurso a outros meios de prova, designadamente a prova testemunhal[2].

Assim, se o documento oferecido como prova do trabalho suplementar, realizado há mais de cinco anos, por si só, não faz a demonstração da prestação do trabalho desta natureza, por ser necessário complementá-la com outros meios de prova, tal documento não poderá ser havido como “documento idóneo”.

Relativamente ao trabalho suplementar prestado há menos de cinco anos, já a lei não exige que a prova se faça através de documento idóneo, permitindo que se realize através de qualquer outro meio legal de prova, nomeadamente por meio de prova testemunhal.

 Ora, os documentos juntos aos autos, que o Autor apresentou para prova do trabalho suplementar, designadamente os "registos de entradas e saídas" manuscritos pelos próprios trabalhadores, por não serem da autoria da entidade empregadora e por carecerem de ser complementados, esclarecidos ou interpretados através da prova testemunhal, não podem constituir documentos idóneos para prova do trabalho suplementar, pretensamente prestado pelo Autor há mais de cinco anos.

E tais registos, pela mesma razão, também, por si sós, não fazem prova da prestação do trabalho suplementar, alegadamente prestado há menos de cinco anos, mas relativamente a este período já poderiam ser havidos como elementos de prova, auxiliares de outras provas, designadamente testemunhal.

Sucede que as instâncias consideram que os depoimentos testemunhais não confirmaram de forma concreta, segura e exacta a conformidade daqueles registos com a realidade, sendo que dos depoimentos resultou que não existiu, a não ser de forma esporádica, o controlo da sua conformidade com a real e efectiva prestação de trabalho, bem como que chegaram a ser constatados abusos no que respeita ao seu preenchimento, sendo que as próprias testemunhas do Recorrente não produziram depoimentos seguros sobre a forma como, na BB, se controlava a prestação do trabalho.

Note-se que saber se determinado documento é, ou não, idóneo para a prova de determinado facto é questão de que, nos termos do artigo 722.º/2 do CPC, o Supremo Tribunal de Justiça pode conhecer, por estar em causa eventual ofensa de uma disposição expressa de lei que exige certa espécie de prova para a demonstração do facto.

Porém, nos termos do mesmo normativo, já não é da competência do Supremo conhecer da questão de saber se determinado documento, que, por si só, não seja idóneo para a prova do facto, completado com outros meios de prova, nomeadamente testemunhal, conduziu à prova desse mesmo facto. Nesse caso o documento é da livre apreciação, que incumbe às instâncias fazer e não ao Supremo Tribunal de Justiça.

Por isso, no poder cognitivo deste tribunal não cabe apreciar se em face de determinado documento que admita contraprova ou prova em contrário, a apreciar livremente pelo julgador, se verificou, ou não, erro de julgamento na fixação dos factos, como não cabe averiguar se a convicção firmada pelos julgadores nas instâncias em relação a determinado facto, em prova de livre apreciação, se fez no sentido mais adequado.

Em suma: os documentos apresentados pelo Recorrente para prova do trabalho suplementar alegado não são documentos idóneos para tal prova, pelo que tal trabalho não podia ser considerado provado relativamente ao trabalho suplementar, alegadamente prestado há mais de cinco anos, sendo que, no tocante ao pretensamente prestado há menos de cinco anos, tais documentos, complementados com a prova testemunhal, também não conduziram a tal prova, como foi decidido nas instâncias.

Assim sendo sucumbe o pedido do Recorrente nesta parte, como bem se decidiu no Acórdão recorrido.

2. Quanto ao trabalho suplementar prestado em dia de descanso, obrigatório e complementar e de trabalho nocturno.

A 1.ª instância julgou improcedente o pedido do Autor, relativamente a este alegado trabalho suplementar, com a seguinte fundamentação:
«Decorre de tal factualidade que no mencionado período, o autor prestou trabalho em Sábados, Domingos e em dias feriados, bem como em período nocturno de harmonia com a previsão do art. 192° Código do Trabalho de 2003, aplicável e em vigor nesse período.
Porém, encontra-se provado de igual modo que aos Auditórios do Rivoli foi atribuído alvará de licença de recinto, conforme documentos de fls. 194 a 200, que aqui se dão por reproduzidos, bem como que a actividade desenvolvida no RTM pela "BB", era uma actividade de espectáculo e de diversão pública.
Encontra-se provado ainda que o Rivoli estava aberto ao público aos Sábados e Domingos, dias em que acolhia diversos espectáculos, o que era do conhecimento do autor, sabendo este que tal iria suceder desde que foi contratado.
Nestes termos, face a tal factualidade e atenta a natureza da actividade exercida, o empregador do autor encontrava-se dispensado de encerrar ou de suspender a laboração um dia por semana, pelo que nos termos do art. 205°/2 do Código do Trabalho de 2003 (como já anteriormente sucedia no âmbito do DL 409/71 de 27/9, nos termos do seu art. 37°), o dia de descanso semanal obrigatório não tinha de coincidir com um Domingo.
Ora, encontra-se de igual modo provado que o autor trabalhou inicialmente para a "BB" na Rua de Entreparedes, fazendo-o aí apenas de forma transitória, enquanto decorriam as obras do Teatro Rivoli e se aguardava a sua abertura, sendo que, nesse período de transição, o mesmo trabalhava cerca de trinta e cinco horas semanais, de Segunda a Sexta-feira, das 10.00 às 18.00, com intervalo para almoço.
Deste modo, nesse período de transição, o autor usufruía dos Sábados e Domingos como descansos semanais.
Contudo, provou-se que, a partir de Outubro de 1997, concluídas aquelas obras e aberto o Teatro ao público, houve necessidade de ajustar os períodos diários e semanais de trabalho do autor e demais trabalhadores, atendendo ao seu período de funcionamento e espectáculos aí realizados.
Assim, a partir Outubro de 1997 o autor passou a iniciar o seu período de trabalho diário usualmente às 14.00 horas, sendo que gozava usualmente os seus descansos semanais às Segundas-feiras a que acrescia um outro dia da semana, sendo que era ele quem agendava tais dias de descanso semanal, fazendo-o também em Terças, Quartas e Quintas-feiras, bem como por várias vezes em Sábados e Domingos, de acordo com a conveniência e necessidade do serviço, acumulando dias de folga se necessário.
Acresce que se provou que o autor podia marcar os seus dias de descanso semanal com liberdade, desde que assegurasse quem o substituísse durante os espectáculos, como efectivamente sucedeu.
Além disso, como decorre da decisão da matéria de facto, não logrou o autor demonstrar que após Outubro de 1997 o seu período de trabalho continuou a ser de Segunda a Sexta-feira e de sete horas por dia.
Nestes termos, da factualidade provada decorre que os dias de descanso semanal do autor deixaram desde aquela altura de coincidir necessariamente com Sábados e Domingos, como permitido por aquelas disposições legais.
Em conformidade, na medida em que a sua pretensão se fundamenta no facto alegado de prestação de trabalho em dias de descanso semanal coincidentes com esses dias da semana, o qual não resultou demonstrado, a sua pretensão relativa ao respectivo pagamento, bem como ao pagamento dos correspondentes descansos compensatórios alegadamente não gozados, terá nesta parte necessariamente de improceder.
Do mesmo modo, tratando-se de actividade de espectáculos e diversão, que necessariamente obriga em concreto a prestação de trabalho durante a noite, por forca do disposto no art. 257°/3 do citado Código do Trabalho, nos mesmos termos em que já dispunha o art. 1o do DL 348/73 de 11/7 (conjugado com o disposto no Decreto 349/73 de 11/7), encontra-se excluída a retribuição acrescida por trabalho nocturno.
Em conformidade, entendemos que a pretensão do autor no sentido da condenação do réu no pagamento de acréscimo retributivo por trabalho nocturno, carece de fundamento, pelo que terá necessariamente de improceder».

O Tribunal da Relação subscreveu esta fundamentação e também não atendeu o pedido do Autor no concernente às causas de pedir invocadas.

Porém, o Autor, ora Recorrente, continua a manifestar o seu dissentimento, alegando que:
10ª Em relação aos dias de descanso, tendo-se provado apenas que o A. usualmente gozava os seus descansos semanais à 2.ª feira a que acrescia outro dia da semana, de acordo com a conveniência e necessidade do serviço (facto 15 do acórdão) e que o A. tinha um período de trabalho semanal de 35 horas [factos 6/7 e 11 do acórdão] e que não gozou os dois dias de descanso semanal a que tinha direito, como se colhe dos registos dos tempos de trabalho e do facto 22 do acórdão, deve a empregadora ser condenada no pagamento dos valores em falta a esse título e correspondentes descansos compensatórios;
11ª E isso independentemente dos dias em que calhavam os dias de descanso ou em que eles foram gozados e de a empregadora estar ou não dispensada de encerrar ao domingo ou noutro dia da semana.
12ª A fundamentação da decisão recorrida, ao fazer depender a concessão do trabalho suplementar não da prova efectiva de que o A. não gozou os dois dias de descanso semanal a que tinha direito mas sim de que não gozou os descansos ao sábado e domingo, com ele tinha alegado, além de uma injustiça chocante, é errónea, pois que o que a lei tutela é o direito à remuneração pelo trabalho prestado e o pagamento do trabalho suplementar.
13ª E, assim, tendo ficado provado que o A. não teve o descanso devido, devia ser a empregadora obrigada a pagar o trabalho suplementar daí decorrente e os descansos compensatórios, como peticionou, nos termos próprios das normas relativas ao trabalho suplementar.
14ª A actividade da empregadora era uma actividade de espectáculo e de diversão pública (facto 3 do acórdão), o que não consubstancia a prova de uma actividade exclusiva ou predominantemente nocturna [para efeitos do art. 1º do DL 348/73 e do art. 257°, n° 3, a) do CT];
15ª Logo, errada a falta de consideração do trabalho nocturno do A., para efeitos de condenação no acréscimo devido.

Mas o Recorrente carece de razão.

As instâncias decidiram acertadamente a questão em apreço.

Com efeito, o Recorrente prestava serviço ao abrigo do regime de isenção de horário de trabalho, sendo certo que quase todo o pedido que formulara assentara na suposta prestação de trabalho suplementar nos dias de descanso, que dizia serem o Sábado e o Domingo, o que não se provou, antes se tendo demonstrado serem tais dias jornadas normais de trabalho e que o descanso sucedia sempre à segunda-feira e em outro dia da semana, livremente escolhido pelo recorrente.

Por outro lado, está provado que a concreta duração da jornada do trabalho, bem como do descanso, não advinha, sequer, de determinação da entidade empregadora, mas do próprio trabalhador, que dispunha, para tanto, de ampla liberdade, sendo ele quem auto-determinava o início e fim do seu dia de trabalho, a carga horária associada e, bem assim, a calendarização do seu descanso semanal, ainda que com a segunda-feira como dia de descanso sistemático.

Ao contrário do que o Recorrente pretende, a matéria de facto provada não demonstra que o Autor não tenha gozado todas as folgas a que tinha direito, gozo que, de resto, nos termos dessa mesma factualidade, era definido pelo próprio.

Como acima se viu, os documentos juntos aos autos, que o Autor apresentou para prova do trabalho suplementar e em dias de descanso, designadamente os "registos de entradas e saídas" manuscritos pelos próprios trabalhadores, não foram considerados idóneos ou bastantes para fazer a prova daquele trabalho.

Acresce que a decisão eleita na sentença e que o Acórdão sindicado manteve em matéria de trabalho nocturno é, também, incensurável, pois que, estando em causa uma actividade de espectáculos e de diversão, que necessariamente obriga a prestação de trabalho durante a noite, encontra-se excluída a retribuição acrescida por trabalho nocturno.

Deste modo, também nesta parte a decisão recorrida não merece reparo.

Improcedem, por isso, as conclusões do recurso, sendo de manter a decisão recorrida.

IV.  DECISÃO:

Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se a Revista e confirma-se a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 16 de Novembro de 2011. 

        

Pereira Rodrigues (Relator)

Pinto Hespanhol

Fernandes da Silva

________________________
[1] In Comentário às Leis do Trabalho, I, pg. 188.
[2] Vd Monteiro Fernandes, em Direito do Trabalho, 12.ª edição, pg. 482 e Ac do STJ, de 19.12.2007, acessível em http://www.dgsi.pt/jstj.