ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


PROCESSO
30/11.7YFLSB
DATA DO ACÓRDÃO 10/20/2011
SECÇÃO CONTENCIOSO

RE
MEIO PROCESSUAL RECURSO DE CONTENCIOSO
DECISÃO NEGADO PROVIMENTO
VOTAÇÃO UNANIMIDADE

RELATOR ISABEL PAIS MARTINS

DESCRITORES JUIZ
CLASSIFICAÇÃO PROFISSIONAL
CUMULAÇÃO DE PEDIDOS
EXERCÍCIO TEMPORÁRIO DA FUNÇÃO DE JUÍZ
QUESTÃO NOVA
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
FUNDAMENTAÇÃO
CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
COMPETÊNCIA
PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

SUMÁRIO


I - A recorrente cumula com o pedido de anulação da deliberação o pedido de condenação do CSM à prática de um acto (ser-lhe atribuída a classificação de Bom com Distinção): este segundo pedido é legalmente inadmissível, já que o recurso previsto no art. 168.º do EMJ tem por objecto a anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência do acto administrativo impugnado (a deliberação do CSM), nos termos do art. 50.º, n.º 1, do CPTA.
II -O CPTA prevê a cumulação de pedidos, admitindo a possibilidade de cumular com o pedido de anulação ou declaração de nulidade ou inexistência de um acto administrativo o pedido de condenação da Administração à prática de um acto administrativo legalmente devido [art. 4.º, n.º 2, al. c)].
III -Também o art. 47.º, n.º 2, al. a), do CPTA, se refere à possibilidade de cumular com o pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência de um acto administrativo «o pedido de condenação à prática do acto administrativo devido, em substituição, total ou parcial, do acto praticado», sendo certo que os pressupostos estão estabelecidos no art. 67.º.
IV -Não obstante, há que recordar que, mesmo nos casos de admissibilidade de cumulação do pedido de condenação à prática de acto administrativo legalmente devido, «quando a emissão do acto pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do acto a praticar» apenas devendo «explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto omitido» (art. 71.º, n.º 2, do CPTA).
V - Sendo assim, não tem cabimento legal, em recurso interposto de deliberação do CSM, o pedido da recorrente no sentido de que «os autos sejam devolvidos ao plenário do CSM a fim de (…) lhe ser atribuída a notação de “Bom com Distinção”».
VI -A recorrente funda o pedido de anulação da deliberação do Plenário do CSM – que manteve a notação de Bom que lhe tinha sido atribuída por acórdão do Conselho Permanente – na existência de dois vícios:
1) a deliberação conter matéria nova, relativamente à qual não lhe foi dada oportunidade de contraditório; e
2) a falta de fundamentação da manutenção da notação de Bom, limitando-se a deliberação a citar o aresto anterior e o relatório da inspecção.
VII - Pretende a recorrente que o facto de o acórdão conter uma menção a que «não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado as funções de juiz» constitui matéria nova, sem oportunidade de contraditório, que deve levar à anulação da deliberação.
VIII - No entanto foi a recorrente que convocou o período de tempo em que exerceu funções, por efeito de nomeação ao abrigo da Lei 3/2000, de 20-03, e, independentemente da intenção nela pressuposta, produziu, objectivamente, a afirmação de que «No princípio da sua carreira começou, assim, por exercer funções equivalentes às de magistrado judicial jubilado, ou seja, com competência para as pendências cíveis ….».
IX -Daí a pertinência da análise do regime dessa Lei, estabelecendo-se a distinção entre o regime excepcional de nomeação de licenciados em Direito para o exercício temporário de funções de juiz nos tribunais de 1.ª instância e o regime excepcional de afectação de magistrados judiciais jubilados, a que o acórdão procede.
X -A imposição do dever de fundamentação, expressa e acessível, estabelecida no art. 268.º, n.º 3, da CRP, em relação a todos os actos administrativos, quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, é um importante sustentáculo da legalidade administrativa e instrumento fundamental da respectiva garantia contenciosa.
XI -Na crítica à deliberação, por ter fundamentado a manutenção da notação de Bom, por remissão para o acórdão do Conselho Permanente e para o relatório do Exmo. Inspector Judicial, a recorrente manifestamente desconsidera que a fundamentação, por remissão, tem suporte legal, no art. 125.º, n.º 1, 2.ª parte, do CPA.
XII - A recorrente questiona o acerto ou adequação da decisão, pondo em causa os factos e as razões que relevaram para a não atribuição da reclamada notação de Bom com Distinção, o que respeitará, não ao vício de falta de fundamentação, mas a outro, o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto ou de direito.
XIII - Este também não se detecta: deve ter-se presente que, em sede de apreciação do mérito dos magistrados judiciais, o CSM, embora vinculado aos princípios da justiça, da imparcialidade e da proporcionalidade, actua com larga margem de discricionariedade técnica no que respeita à apreciação da prova e à aplicação dos critérios ou factores legais.
XIV - O juízo de apreciação do mérito ou demérito do desempenho dos juízes pelo CSM não pode, portanto, em regra, ser sindicado judicialmente porque o Tribunal não pode substituir-se à Administração na reponderação daqueles juízos valorativos que integram materialmente a função administrativa.
XV - No caso, os critérios utilizados pelo CSM não se apresentam como flagrante ou ostensivamente desajustados ou como violadores dos princípios da justiça, da imparcialidade e da proporcionalidade; aquele atendeu aos critérios das alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 16.º do RIJ e foi em função dos elementos recolhidos relativos aos atrasos registados nas comarcas de A e M e às deficiências técnicas detectadas no desempenho da recorrente, que concluiu que esta, tendo desenvolvido uma prestação globalmente positiva, não atingiu o patamar de mérito justificativo da classificação de Bom com Distinção.





DECISÃO TEXTO INTEGRAL

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I

            1. AA, juíza de direito, veio interpor recurso contencioso de anulação, ao abrigo dos artigos 168.º e ss., do Estatuto dos Magistrados Judiciais[1], da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura[2], de 18/01/2011, no processo (de inspecção ordinária) n.º 5/2010, que lhe manteve a notação de "Bom", que já lhe tinha sido atribuída por anterior acórdão do Conselho Permanente, de 23/03/2010.
            Fá-lo, nos seguintes termos:
«1. Refere o Douto Acórdão do Conselho Plenário de que se recorre, em sede de "Apreciação da Reclamação (III)”, a fls. 33-34, in fine:
«(...) Salvo o devido respeito, embora com o objectivo comum de combater pendências acumuladas, não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz, mesmo com comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais. Isso mesmo se reflectiu no relatório da inspecção que foi feita à Ex.ª Juíza tendo por objecto o exercício dessas funções temporárias, escrevendo o Exm.º Inspector, a dado passo:
«”O que mais se nota no desempenho da Dr.ª AA é a falta de uma preparação teórlco-prática, designadamente de um estágio de formação, pois os conhecimentos científicos da Academia, sendo pano de fundo necessário para o exercício da função judicante, não eliminam as espinhosas dificuldades que eriçam o percurso de qualquer Juiz, especialmente no momento solitário da decisão”. O resultado dessa Inspecção – que não consta do registo biográfico – não é equiparável ao da primeira que ocorreu quando a Sr.ª Dr.ª AA já era Juíza de Direito e daí que se tenha sublinhado no Acórdão do Conselho Permanente que estamos perante a segunda classificação nesta qualidade.
«De acordo com o disposto no art. 16.º, n.º 3 do Regulamento das Inspecções Judiciais, a melhoria de classificação deve ser gradual, não se subindo mais de um escalão de cada vez, sem prejuízo dos casos excepcionais, não podendo, porém, em caso algum, ser decorrência da antiguidade do juiz.
«Nada Impedia que se atribuísse à Exm.ª Juíza, com uma anterior classificação de "Bom" como Juíza de Direito, a nota de "Bom com distinção", tal como esta não decorreria da inscrição no certificado de registo Individual da classificação atribuída na qualidade de juíza em regime temporário.
«Na verdade, embora se tenham sempre de considerar a antiguidade e as classificações anteriores, a razão de ser da não atribuição, pelo Conselho Permanente, da notação de "Bom com distinção" emerge, primacialmente, da consideração dos atrasos registados nas comarcas de ... e ... – alguns significativos, tendo em conta o volume de serviço de tais comarcas (mesmo não olvidando as dificuldades decorrentes da agregação e as distâncias entre as sedes de uma e outra) – e das deficiências técnicas apontadas.
«Se, relativamente a ..., o Exm.º Inspector destacou o número significativo de sentenças proferidas, já no que concerne a ... e ... (onde a Exm.ª Juíza esteve colocada um ano, antes de exercer funções em ...), a prestação foi diferente.
«O Exm.º Inspector escreveu, no relatório, que, nas comarcas de ... e ..., o número de processos findos, na jurisdição criminal, andou sensivelmente na média de outros tribunais da mesma categoria e competência, mas em níveis mais baixos na jurisdição cível, considerando que a Exm.ª Juíza não fez uma gestão equilibrada no serviço, tendo dado prioridade aos processos-crime em detrimento dos cíveis. Fazendo uma análise, em termos globais, destas duas comarcas agregadas, o Exm.º inspector considerou o seguinte:
«”(...) vemos que na jurisdição cível entraram nesses tribunais um total de 129 processos e terminaram 120 e que na jurisdição criminal entraram 229 processos e terminaram 208 (não levando em conta as deprecadas, em ambos os casos), ou seja, em termos globais, o saldo é ligeiramente negativo”.
«Por outro lado, registaram-se deficiências técnicas (remete-se, nesse aspecto para o teor do acórdão do Conselho Permanente) que, naturalmente, o desenvolvimento da carreira debelará.
«Para além das qualidades da Exm.ª Juíza, está em causa um concreto desempenho, num período de cerca de 2 anos e 8 meses, nas aludidas comarcas (...).
«Ora,
2. Salvo o muito e devido respeito, é perfeitamente fora de contexto que o Acórdão do Conselho Plenário tenha apreciado que " não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz (...)"
«Isto porque,
«3. Nunca a recorrente alegou tal matéria, nem a pretensão da recorrente, pugnando pelo " Bom com distinção" contém qualquer "arrière pensée" de se comparar a magistrado jubilado (caso contrário, viria pugnar pela nota máxima de "Muito Bom", em vez do simples “Bom com distinção", que pertence, ainda assim, a uma escala intermédia de notação).
«4. A simples menção à equivalência ou comparação a magistrado jubilado constitui matéria nova, sem oportunidade de contraditório, que deve levar à anulação do Douto Acórdão, sem mais.
«Por outro lado,
«5. Refere-se, citando o Relatório do Ex.º Inspector que, "a Exa Juíza não fez uma gestão equilibrada no serviço, tendo dado prioridade aos processos crime em detrimento dos cíveis".
«Ora,
«6. Nas comarcas de ... e ... havia, efectivamente, mais processos crime do que cível, daí que a gestão da recorrente foi no sentido de não deixar quaisquer processos conclusos para o colega que viesse a seguir, como de facto aconteceu.
«7. E nem se diga que os processos crime eram da maior simplicidade. É que nessas comarcas, a recorrente era, também, Juiz de Instrução Criminal (cf. doc. n.º 1, sentença instrutória proferida no processo n.º 148/01.4GBADV, tendo sido acusados dois arguidos pela prática, cada um, como autor, de um crime de violação das regras técnicas a observar no planeamento de construção, p. e p. no artº 277º nº 1 al a) e 2 e 285º do CPenal, quando caiu a estrutura provisória da auto estrada do Algarve, cuja certidão foi entregue à Inspecção).
«Aliás,
«8.
«E no que concerne ao cível, a recorrente já tinha dado provas anteriormente da sua capacidade técnica nessa área,
«Razão pela qual,
«9. O CSM a afectou ao 1.º Juízo Cível de Faro, para acudir a uma situação crítica, quando ainda era apenas "Juiz estagiária" (doc. nº 2).
«Com efeito,
«10. A recorrente tomou Posse como Juiz ao abrigo do Despacho nº 20728/01 (DR II n.º 230 de 3/10/2001)[3] em 04/10/2001 – Doc. n.º 3
«11. Nessa qualidade, foram-lhe distribuídas pendências cíveis de todo o Algarve – consta do seu processo individual e das reclamações anteriores – Doc. n.º 4
«12. Ainda nessa qualidade, foi nomeada Juiz substituta do 3.º Juízo Cível da Loulé, por impedimento do M° Juiz Titular – idem
«13. Foi inspeccionada pela 1.ª vez em Dezembro de 2002, tendo sido classificada com a notação de "Bom" – cf. Relatório de Inspecção do Ex.º Sr. Cons.º ..., processo individual
«14. Frequentou o 1º Curso especial do Cej para Magistrados Judiciais e foi colocada como Juiz estagiária em Faro – consta do seu processo individual e dos Acórdãos anteriores
«15. Sendo estagiária, foi logo determinado pelo CSM afectá-la ao 1º Juízo Cível de Faro, para acudir a uma situação crítica – Doc. n.º 2 e n.º 5
«16. Tal desempenho, ainda que irrelevante para efeitos de antiguidade e progressão na carreira, não pode deixar de ser levado em consideração, para efeitos de notação.»
            Para concluir:
«O Douto Acórdão do Conselho Plenário de 18/01/2011 do CSM que manteve a notação de " Bom" trouxe matéria nova, sem oportunidade de contraditório, alegando uma “equivalência entre as funções de juiz temporário e magistrado jubilado" que a recorrente nunca alegou.
«Não fundamentou a manutenção da notação de "Bom", limitando-se a citar o aresto anterior e o Relatório do Exº Inspector Judicial.»
Terminou a pedir que seja «anulado, nos termos do disposto no art.º 135.º CPA, devolvendo-se os autos ao Conselho Plenário do CSM, a fim de, reapreciando-se todo o seu processo, desde o que consta do seu processo individual, passando pelo Relatório do M.º Inspector, lhe ser atribuída a notação de "Bom com Distinção"».
2. Cumprido o disposto no artigo 174.º, n.º 1, do EMJ, o CSM sustentou a improcedência do recurso.
3. Ordenou-se a notificação, nos termos e para os efeitos do artigo 176.º do EMJ.
4. A recorrente não alegou[4].
Vindo requerer a junção aos autos de deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de 11 de Maio de 2011, que determinou que a antiguidade da recorrente, «na jurisdição administrativa e fiscal, para efeitos sociais, compreende o tempo de serviço prestado nas funções de delegada do procurador da República e nas funções de juiz de nomeação temporária».
5. O CSM produziu as suas alegações, nos seguintes termos:
«1º
«A Exmª Juíza, pelo que se retira dos elementos recebidos neste Conselho, não ofereceu alegações nos termos do mencionado art. 176º, tendo, no entanto, requerido a junção aos autos de uma deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, datada de 11 de Maio de 2011, na qual se concluiu que a antiguidade da Mmª Juíza Dra. AA na jurisdição administrativa e fiscal, para efeitos sociais, compreende o tempo de serviço prestado nas funções de delegada do Procurador da República e nas funções de juiz de nomeação temporária.
«2º
«Foi, pela Exmª Juíza, interposto recurso do Acórdão do Plenário do CSM, datado de 18-01-2011, que, no âmbito da Inspecção Ordinária n.º 5/2010, manteve a notação de "Bom" que lhe havia sido atribuída em deliberação do Conselho Permanente.
«3º
«A Exmª Recorrente centrou a sua discordância em duas questões (reportamo-nos às alegações iniciais):
«– O Acórdão impugnado trouxe matéria nova, sem oportunidade de contraditório, alegando uma "equivalência entre as funções de juiz temporário e magistrado jubilado " que a recorrente nunca alegou;
«– Não fundamentou a manutenção da notação de " Bom", limitando-se a citar o aresto anterior e o Relatório do Exº Inspector Judicial.
«Considera que, em consequência, deve o Acórdão ser anulado, nos termos do disposto no artº 135º CPA, para que, reapreciando-se todo o processo, desde o que consta do seu processo individual, passando pelo Relatório do Exmº Inspector, lhe seja atribuída a notação de "Bom com Distinção".
«4º
«Não nos parece correcta a afirmação de que se tratou, no Acórdão do Plenário, sem possibilidade de contraditório, de matéria nova (não suscitada pela Exm.ª Juíza).
«É verdade que se rejeitou a ideia de que se pudesse estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, temporariamente, as funções de juiz, o que se fez nos seguintes termos:
«”Salvo o devido respeito, embora com o objectivo comum de combater pendências acumuladas, não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz, mesmo com comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais. Isso mesmo se reflectiu no relatório da inspecção que foi feita à Exmª Juíza tendo por objecto o exercício dessas funções temporárias, escrevendo o Exmº Inspector, a dado passo:
«”O que mais se nota no desempenho da Drª AA é a falta de uma preparação teórico-prática, designadamente de um estágio de formação, pois os conhecimentos científicos da Academia, sendo pano de fundo necessário para o exercício da função judicante, não eliminam as espinhosas dificuldades que eriçam o percurso de qualquer Juiz, especialmente no momento solitário da decisão.
«Sucede, porém, que houve motivo para estes considerandos, como, salvo melhor opinião, é patenteado pelos termos em que foi deduzida a reclamação para o Plenário, pois, nela, a Exmª Juíza escreveu, além do mais, o seguinte:
«”2. A carreira de Magistrado Judicial da inspeccionada não teve o percurso normal da maioria dos inspeccionados com 5 anos, 6 meses e 15 dias, porquanto a signatária reingressou na Magistratura ao abrigo da Lei nº 3/2000, de 20 de Março, que conferiu a esse CSM "capacidade reforçada de intervenção (...) visando a eliminação de pendências acumuladas nos tribunais judiciais", mais lhe concedendo poderes para "nomear magistrados judiciais jubilados (...) em comissão de serviço, que para o efeito manifestassem disponibilidade junto do Conselho Superior da Magistratura" (cf. artigos 1.º e 3.º da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março).
«”3. Vale isto por dizer que, com o objectivo de eliminar pendências (cíveis) acumuladas nos tribunais judiciais, esse CSM procedeu ao escrutínio de pessoas com capacidades e preparação académica superior às pessoas que normalmente ingressam no CEJ para começar uma carreira.
«”4. Foi nesse contexto que a juiz inspeccionada ingressou na Magistratura, tendo tomado Posse em Loulé em 4/10/2001 (doc. n.º 1).
«5. No princípio da sua carreira começou, assim, por exercer funções equivalentes às de magistrado judicial jubilado, ou seja, com competência para as pendências cíveis para todo o Algarve.
«Crê-se, assim, que se compreendem as considerações expendidas no Acórdão do Plenário, no qual não se fez mais que estabelecer, face a estas alegações, a devida destrinça entre o desempenho de funções por um juiz jubilado e por um juiz temporário, mesmo tendo este comprovada idoneidade, competência e experiências profissionais (sucedendo que a Lei n.º 3/2000, de 20-03, com objectivo de combater pendências, criou um regime excepcional de afectação de juízes jubilados e de nomeação de licenciados em Direito possuidores dos enunciados atributos). E, no seguimento dessa reflexão, chamou-se a atenção para o que o Exmº Inspector, que procedeu a uma inspecção ao trabalho da Exmª Juíza desenvolvido ainda no exercício das ditas funções temporárias, exarou no respectivo relatório, no que tange aos efeitos da falta de preparação teórico-prática, designadamente de um estágio de formação, independentemente dos conhecimentos científicos da Academia.
«Não se vê, pois, que se tenha, no Acórdão recorrido, tratado, com prejuízo para Exmª Juíza, de matéria nova.
«5º
«No que se refere à falta de fundamentação, quanto à manutenção da notação de "Bom", também se discorda da Exmª Recorrente.
«Conforme se retira das suas alegações, a própria Recorrente citou um trecho da parte do Acórdão a que foi dado o título de "APRECIAÇÃO DA RECLAMAÇÃO", passando, em seguida, a expressar o seu inconformismo quanto ao que aí está escrito.
«Nesse ponto (APRECIAÇÃO DA RECLAMAÇÃO), estão, salvo melhor opinião, suficientemente explicitadas as razões pelas quais é mantida a nota de "Bom", em detrimento da de "Bom com Distinção".
«Sem que se pudessem ignorar quer os elementos constantes do relatório de Inspecção, quer do Acórdão do Conselho Permanente, sobre o qual incidia a reclamação – citados na medida do necessário, até para uma cabal informação dos membros do Plenário, sobretudo os que não haviam participado na deliberação do Permanente –, não se deixou, no referido capítulo, de fazer a análise das questões colocadas pela douta reclamação apresentada.
«Não foi, designadamente, posto de parte o percurso anterior da Exmª Juíza e, sopesando todos os elementos constantes do processo, entendeu-se manter a classificação de "Bom", pelos fundamentos que aqui se têm por reproduzidos, explicando-se, entre o mais, que “embora se tenham sempre de considerar a antiguidade e as classificações anteriores, a razão de ser da não atribuição, pelo Conselho Permanente, da notação de "Bom com distinção" emerge, primacialmente, da consideração dos atrasos registados nas comarcas de ... e ... – alguns significativos, tendo em conta o volume de serviço de tais comarcas (mesmo não olvidando as dificuldades decorrentes da agregação e as distâncias entre as sedes de uma e outra) – e das deficiências técnicas apontadas”.
«6º
«Crê-se, com todo o respeito por opinião diversa, que a douta deliberação do CSTAF não contraria o que foi exarado no Acórdão recorrido, no qual, como se disse, não se ignorou o percurso anterior da Exmª Juíza.
«Simplesmente, havia que estabelecer a distinção entre uma classificação de "Bom" obtida pela Exmª Recorrente enquanto Juíza de Direito e outra nota de "Bom" (que não figura no registo biográfico) que lhe fora atribuída na qualidade de Juíza de nomeação temporária.
«A deliberação do CSTAF também não considera as funções exercidas pelos juízes de nomeação temporária equivalentes às dos juízes de direito, mas apenas “materialmente conexas, similares e, ou, auxiliares das funções exercidas pelos juízes” e conclui, à luz do art. 180º, nº 1 do EMJ, que “o tempo de serviço prestado em funções materialmente próximas e antecedentes do ingresso na magistratura judicial ou dos tribunais administrativos e fiscais deve ser assimilado ao tempo de serviço na magistratura judicial ou dos tribunais administrativos e fiscais, para efeitos sociais” (aposentação, diuturnidades...), diferenciando-os dos “efeitos estritamente profissionais (progressão na carreira, vencimento na categoria...”.
«Dispõe o art. 16º, nº 3, do Regulamento das Inspecções Judiciais (RIJ) que a melhoria da classificação deve ser gradual, não se subindo mais de um escalão de cada vez, sem prejuízo dos casos excepcionais, não podendo, porém, em caso algum, ser decorrência da antiguidade do juiz.
«Tendo a Exmª Recorrente, como se viu, sido classificada uma vez com a notação de "Bom", não havia qualquer impedimento a que se lhe atribuísse, havendo fundamento para isso, a de "Bom com Distinção", independentemente de a nota de "Bom" conferida na sequência da inspecção ao seu trabalho como juíza de nomeação temporária constar, ou não, do registo biográfico. Na verdade, conforme resulta do Acórdão impugnado, não foi essa circunstância a responsável pela atribuição da nota de "Bom".
«Por outro lado, estando aqui em causa a avaliação do desempenho da Exmª Recorrente enquanto Juíza de Direito, no âmbito da inspecção em apreço, não tem o reconhecimento da antiguidade a que se reporta o art. 180º, nº 1 do EMJ a virtualidade de alterar o juízo feito no Acórdão, no qual – como decorre da sua leitura – se tomaram em consideração os elementos relevantes para a atribuição da classificação, de acordo com o EMJ e o RLJ.
«7º
«Conforme se exarou no Ac. do STJ datado de 21-04-2010 (Rel. Cons. Oliveira Mendes), publicado em www.dgsi.pt, “É jurisprudência unânime do Supremo Tribunal que o recurso interposto para o STJ que atribuiu determinada classificação a um magistrado judicial é um recurso de mera legalidade, razão pela qual o pedido terá de ser sempre de anulação ou a declaração de nulidade ou de inexistência do acto recorrido, não cabendo ao STJ sindicar o juízo valorativo formulado pelo CSM, a menos que o mesmo enferme de erro manifesto, crasso ou grosseiro, ou se os critérios utilizados na avaliação forem ostensivamente desajustados.”
«8º
«Julga-se, sempre respeitando opinião diversa, num domínio consabidamente eivado de dificuldades, que o CSM fez, face aos elementos recolhidos, uma análise que não desrespeitou os critérios constantes quer do Estatuto dos Magistrados Judiciais, quer do Regulamento das Inspecções Judiciais, não havendo, por isso, razões para anular o Acórdão proferido, como é defendido pela Exmª Recorrente.»
Concluindo, em consequência, por dever o recurso ser julgado improcedente.
            6. O Exm.º Procurador-geral-adjunto emitiu parecer, no qual, depois de proficientemente se pronunciar sobre a questão prévia da ilegalidade do segundo pedido cumulativamente formulado (condenação do CSM à prática de acto administrativo legalmente devido) e sobre as questões invocadas pela recorrente (1. A deliberação conter «matéria nova», sem oportunidade de contraditório; 2. Falta de fundamentação), concluiu pela improcedência dos vícios invocados e, não se divisando quaisquer outros, pela negação de provimento ao recurso.
            7. Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II
A deliberação do CSM, de 18/01/2011, contém a transcrição dos elementos de facto que foram considerados no acórdão do Conselho Permanente, por sua vez já constantes do relatório de inspecção, e nomeadamente, a seguinte apreciação e conclusões do Sr. Inspector:
«2.3.4. Apreciação dos dados expostos.
«Produtividade:
«Estando apenas em causa a avaliação do mérito do serviço prestado pela Dr.ª AA, parece-nos correcto e conveniente que relativamente às comarcas agregadas de ... e ... façamos a análise do movimento processual global como se de uma só comarca se tratasse, isto por referência ao exercício entre 15 de Setembro de 2005 e 31 de Agosto de 2006.
«Partindo desse pressuposto, vemos que na jurisdição cível entraram nesses tribunais um total de 129 processos e terminaram 120 e que na jurisdição criminal entraram 229 processos e terminaram 208 (não levando em conta as deprecadas, em ambos os casos), ou seja, em termos globais, o saldo é ligeiramente negativo.
«O número de processos findos, na jurisdição criminal anda sensivelmente na média doutros tribunais da mesma categoria e competência (206 processos: entre outros, 55 comuns singulares; 23 sumaríssimos; 18 sumários; 19 abreviados; 64 recursos de contra-ordenação e 10 instruções), mas em níveis mais baixos na jurisdição cível (120 processos: entre outros, 13 ordinárias; 12 acções sumárias; 10 sumaríssimas; 3 especiais; 12 inventários e 6 procedimentos cautelares);
«Os elementos estatísticos não têm nem poderiam ter uma exacta correspondência no número de sentenças de mérito efectivamente proferidas, mas além de darem uma ideia do estado geral dos serviços, deixam também antever o que foi a prestação da Senhora Juíza nessa área, quer em termos globais quer por referência aos diversos tipos de processos. Enquanto no âmbito da jurisdição criminal produziu 184 decisões (43 em comuns singulares; 14 em processos abreviados; 19 em processos sumários; 17 em processos sumaríssimos; 62 em recursos judiciais de contra-ordenações e 10 decisões instrutórias), já na jurisdição cível, além dos 19 despachos saneadores com selecção da matéria de facto, proferiu apenas 23 sentenças (7 em acções cíveis contestadas e 12 não contestadas; 3 em processos de regulação paternal e 1 num processo de adopção).
«A menor expressividade dos números no cível prende-se naturalmente e desde logo com a circunstância de se tratarem de tribunais com pendências controladas e baixas distribuições, mas também decorre duma gestão pouco equilibrada do serviço, sendo óbvia a prioridade dada pela Srª Juíza aos processos-crime em detrimento dos processos cíveis.
«Na comarca de ..., nos cerca de 20 meses de exercício em apreciação (1.09.06 a 21.05.08), além das 19 deprecadas, foram distribuídos na jurisdição criminal 835 processos, tendo terminado 741. Nesse mesmo período, a Senhora Juíza proferiu 25 sentenças na jurisdição cível (7 delas em acções contestadas e 4 em acções não contestadas [as restantes são decisões meramente homologatórias – 11; extintivas de execuções – 1, e procedimentos cautelares – 2)]; e um total de 428 sentenças na jurisdição criminal (238 em comuns singulares, 28 em abreviados, 111 em sumários, 37 em sumaríssimos, 12 em recursos de contra-ordenação e 2 cúmulos jurídicos), respeitando grande parte a crimes de condução de veículo em estado de embriaguez (125) e sem habilitação legal (64). Na vertente da produtividade, considerados e confrontados os diversos índices, as intervenções como vogal em tribunal colectivo, as especificidades inerentes à competência genérica dos tribunais, as condicionantes do exercício nas comarcas agregadas de ... e ... (distam entre si cerca de 40 km), e sabendo-se que na comarca de ... teve de partilhar com a juíza titular a utilização da única sala de audiências para a realização dos julgamentos (manhãs para o crime e tardes para o cível), cremos haver boas e suficientes razões para se poder concluir, como concluímos, que o desempenho da Dr.ª AA foi positivo (mais na jurisdição criminal que na cível) em particular na comarca de ..., só possível com uma constante assiduidade, pontualidade, dedicação e capacidade de trabalho da Dr.ª AA.
«À data da em que cessou funções, a pendência estatística dos referidos tribunais (A..., M... e ...) era globalmente superior à que havia encontrado no início dos respectivos exercícios, mas importa sublinhar que a Exmª Juíza não deixou qualquer processo concluso para despacho ou decisão.
«Metodologia/celeridade/capacidade de simplificação processual:
«Numa apreciação global, como resulta da factualidade já enunciada, podemos dizer que foi cuidadosa e organizada na direcção dos processos e na planificação das diligências, e que se esforçou em fazer a correcta e eficiente gestão do tempo e dos actos processuais. Nos processos-crime, os despachos de recebimento da acusação apresentam-se bem estruturados e completos na análise das questões respeitantes ao objecto da causa e ao estatuto processual dos arguidos, e determinavam expressamente que as notificações fossem efectuadas com 3 meses de antecedência, obviando assim a alguns inconvenientes das longas dilações.
«Calendarizou de forma planificada as audiências de julgamento (compreendemos as dilações mais alargadas na comarca de ..., em função das pendências processuais e da agenda herdada) e mostrava-se atenta à prioridade que a natureza de cada processo reclamava, mas também reparámos que no processo de recurso de contra-ordenação 47/05.0, da comarca de ..., em 06.10.2005 marcou a audiência para 17.01.2006, sem atentar que a prescrição do respectivo procedimento ocorreria necessariamente em 08.01.2006 (se aplicado ao caso o regime vigente à data dos factos, pois com a posterior entrada em vigor do DL 44/2005, de 23.02, que aditou ao Código da Estrada o artigo 188º, a prescrição para as contra-ordenações rodoviárias passou para 2 anos) data em que se perfazia dois anos, reportados à data da prática dos factos, como efectivamente veio a decidir como questão prévia.
«As audiências e outras diligências, diariamente agendadas em número considerável, eram efectivamente realizadas, conciliando os interesses da averiguação da verdade material e os direitos da defesa, optando pelo seu adiando (sic) na falta do arguido ou de testemunhas, apenas se a sua presença fosse absolutamente indispensável para uma boa decisão da causa.
«A leitura pública das sentenças era normalmente agendada para dentro dos 10 dias seguintes ao encerramento da discussão da causa, mas também verificámos que nalguns recursos de contra-ordenação, realizada a audiência, optou por ordenar que os autos lhe fossem conclusos para elaboração da decisão por escrito, quando a leitura pública era um acto legalmente exigido e que por isso dele não poderia prescindir (cfr. disposições conjugadas dos artigos 66ª do R.G.C.O., 13ª do DL17/91 e 373ª do CPP).
«Na jurisdição cível acompanhou com cuidado a tramitação dos diferentes tipos de processos e resolvia correctamente as questões incidentais. Na acção sumária nº. 51/04.6TB (...), embora com cerca de 9 meses de atraso, andou bem ao ordenar a suspensão da instância nos termos do artigo 3º, nº 1, a) e b), do CRP; na divisão de coisa comum 63/04.0TB (...), convidou os autores a aperfeiçoarem a petição inicial, embora sendo discutível a bondade do fundamento invocado ("dadas as sucessivas alterações da causa de pedir"); no processo de recurso contencioso nº. 70/05.5TB (...), não oferece reparo o despacho de 02.02.2006 onde ordena o cumprimento do artigo 123º, nº 2, do C.Reg.Civil, já o mesmo não podemos dizer do tempo que levou a lavrar o despacho (os autos estavam conclusos desde 20/10/05).
«Nas acções sumárias e sumaríssimas não contestadas, procedendo totalmente, uma vez identificadas as partes e o objecto do processo, poderia depois limitar-se a proferir condenação do réu no pedido, aderindo aos fundamentos da petição, nos casos em que esta se se apresentava devidamente estruturada. Porém, em vez dessa via processual mais simplificada e por isso também mais célere, optava por fazer previamente a apreciação do mérito da causa, antes de concluir pela viabilidade da remissão para os fundamentos da petição.
«Igualmente com prejuízo da celeridade, em acções que seguiam os termos do processo sumaríssimo, quando na contestação era alegada matéria de excepção, mandava notificar o A. para, querendo, responder. Porém, salvo as situações em que o estado da causa lhe permitisse decidir imediatamente das excepções e/ou nulidades, deveria relegar para sede de audiência o exercício do contraditório.
«Nesse tipo de processos, encerrada a discussão, se a complexidade das questões ou o adiantado da hora não permite a prolação imediata da decisão, os princípios da continuidade da audiência e do contraditório impõem que seja agendado dia para a respectiva leitura (pelo menos no tocante à fixação da matéria de facto). Porém, a Sr.ª Juíza tomou opções diferentes, mandando concluir os autos para proceder à elaboração da sentença por escrito.
«Pontualidade e capacidade de direcção das audiências:
«Os actos documentados permitem-nos concluir que a Senhora Juíza realizava as audiências com toda a pontualidade. Os advogados enfatizam quer a correcção quer o clima elevado e respeitoso imposto na direcção dos trabalhos, bem como uma incansável procura da verdade material dos factos. Contudo, pelo que nos é permitido extrair do exame das actas, não decidiu da forma tecnicamente mais correcta questões suscitadas pelas partes em sede de audiência de julgamento:
«a.  No sumário 264/04.0VRS, estando o arguido acusado do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, do Código Penal, o MP começa por defender que os factos integravam não esse tipo legal de crime mas uma contra-ordenação muito grave ("atenta a informação da D.G.V. relativa às margens de erro dos alcoolímetros, bem como o teor da taxa apresentada pelo arguido de 1,26 g/l"), e aderiu à posição do defensor que ia no sentido da prescrição do respectivo procedimento contra-ordenacional. Sobre essa questão, a Senhora Juíza fez recair o seguinte despacho: "Atenta a convolação operada pelo MP e a evidente ocorrência da prescrição da contra-ordenação estradal, julgo por prescrição o procedimento contra-ordenacional do arguido ....quanto a contra-ordenação de condenação de veículo em estado de embriaguez". Ora, parece-nos incontroverso que a convolação não está na disponibilidade das partes, antes depende de decisão do tribunal; em segundo lugar, a declaração da prescrição não se basta com a mera constatação duma evidência; exige-se a indicação dos fundamentos concretos da prescrição e, procedendo, a expressa declaração da extinção do procedimento.
«b. No comum singular 84/01.4PAVRS, na sessão de julgamento de 22.11.06, deveria ter sido mais clara e menos hesitante na decisão duma simples questão processual suscitada pelo MP, secundada pelo assistente, tratando-se de saber se o arguido tinha ou não confessado, integralmente e sem reservas, os factos da acusação, para aplicabilidade ou inaplicabilidade do normativo contido no artigo 344º, nº 2, alínea a), do C.P.P. Na mesma sessão, validou a rectificação feita pelo MP dos factos da acusação, erradamente, porque estava em causa a modificação em sede de julgamento da versão inicialmente apresentada, por isso só ao tribunal cabia avaliar e decidir, uma vez produzida a prova, se no caso ocorria ou não qualquer alteração dos factos da acusação.
«c. No comum singular 478/04.3PAVRS fez consignar em audiência de 31.07.07: "o tribunal, após a análise da prova produzida em julgamento, concluiu que só o arguido (…) é susceptível de ser punido como autor, sendo que os arguidos (…) são susceptíveis de ser punidos como cúmplices, pelo que se verifica uma alteração não substancial dos factos em relação à acusação, determinando-se a sua comunicação nos termos do artigo 358º, do CPP". Ora, se da prova produzida resultava a alteração dos factos da acusação, deveria dizer em que se traduziu essa modificação, e não quedar-se pela referência conclusiva de que os arguidos responderiam não como co-autores mas como cúmplices. Essa exigência era ditada pelo contraditório e pelo dever de fundamentação dos despachos.
«3. Preparação técnica.
«3.1. A Dr.ª AA é uma juíza dotada de boa craveira intelectual.
«3.2. Todo o seu trabalho na Jurisdição criminal e civil revela apreciável preparação e maturidade jurídicas, não obstante ter incorrido em imprecisões de natureza técnica e práticas processuais menos correctas.
«3.3. Nível jurídico do trabalho inspeccionado.
«Além do que resulta do enunciado ao longo deste relatório, trazemos à colação outros aspectos da actuação desta magistrada em fases cruciais dos processos:
«Findos os articulados, fez correctas opções quando marcou audiência preliminar em acções sumárias (v.g. 51/05.9TB) e quando a dispensou em acções ordinárias (v.g. 77/05.2TB; 157/05.4TB; 165/05.1TB;87/05.0TB.
«Nos despachos-saneadores, oficiosamente ou mediante arguição das partes, apreciou e decidiu fundadamente excepções, nulidades ou questões prévias, designadamente as relacionadas com a competência do tribunal, legitimidade das partes, caso julgado e a modificação objectiva ou subjectiva da instância.
«Nos despachos de selecção da matéria de facto, proferidos nas acções sumárias e ordinárias contestadas, quer em sede de audiência preliminar quer elaborados por escrito no final dos articulados, elaborou peças de razoável qualidade técnica.
«Não obstante reparámos que adopta por sistema um critério demasiado elástico na atendibilidade da matéria alegada nos articulados (o que deixa transparecer menor rigor na selecção da factualidade relevante para a decisão e na observância do princípio de repartição do ónus de prova. O inconveniente não é grave, se exceptuarmos a circunstância de isso poder levar as partes à apresentação, por mera cautela, de extensos requerimentos probatórios, tornando assim mais morosas as audiências de discussão e julgamento), daí termos visto bases instrutórias onde é incluída matéria conclusiva e/ou inócua, e factos que só por documento poderiam ser provados (técnica desaconselhada face ao disposto nos artigos 659º, nº 3, e 646º, nº 4, do CPC).
«A fundamentação das decisões sobre a matéria de facto, cumprem as exigências do n.º 2 do artigo 374.º, do Código de Processo Penal. Na exposição dos motivos começa por indicar os elementos de prova relevantes para formar a sua convicção e, num segundo momento, passa à análise crítica, podendo dizer-se que o faz sempre de forma clara e transparente, permitindo aos seus destinatários uma fácil compreensão das concretas razões do sentido da decisão relativamente aos factos provados e aos não provados.
«As sentenças proferidas em processos-crime apresentadas como trabalhos pela Dr.ª AA obedecem ao referido arquétipo de decisão, são depositárias fiéis daquelas qualidades e dizem bem da atenção que a Sr.ª Juíza presta à produção da prova, à importância que concede em verter toda a factualidade apurada (sendo por isso frequente indicar nos factos provados não apenas matéria da acusação e da contestação, mas também a que resultava da audiência de discussão e julgamento), bem como aos pequenos mas relevantes sinais e mensagens captados (v.g. comuns singulares 114/06.3PAVRS, 4/03.1TAORQ, 122/01.OTAVRS e abreviado 336/06.7PAVRS).
«Não obstante, quiçá pelo volume de serviço e não propriamente por incapacidade, omitiu factos do objecto do processo e incorreu em contradições na fundamentação (entre a factualidade e entre esta e a própria motivação de facto e ou de direito).
«Entre as situações flagrantes estão as decisões proferidas nos comuns singulares n.os 63/04.0GBADV e 83/05.7GBADV (o Tribunal da Relação anulou as sentenças nos termos do artigo 379º, n.º 1, alínea a), CPP); 169/03.2GTBJA (homicídio por negligência p. e p. pelo artigo 137º, 1, do CP: com fundamento nos vícios do artigo 410.º, n.º 2, a) e c) – insuficiência da matéria de facto e por erro notório na apreciação da prova, o TRE anulou o julgamento e ordenou o reenvio do processo para novo julgamento), 6/06.6GATVR (sentença anulada pelo TRE por contradição entre factos provados e factos não provados), 140/04.7GAVRS (homicídio por negligência p. e p. pelo artigo 137.º, n.º 1, do CP: o TRE encontrou contradições entre a matéria de facto provada e a insuficiência da matéria de facto para a decisão, ordenando novo julgamento), 61/03.0EAFAR (anulado o julgamento e decretado o reenvio para novo julgamento), 106/05.0GBADV, 81/03.5GBADV12, abreviado 103/05.5GBADV13, sumário 92/05.6GAMTL14 e contra-ordenação 131/05.0TBADV.
«Nas decisões instrutórias avalia criticamente os elementos probatórios, descreve com clareza os factos indiciados (na maioria das decisões em que pronuncia os arguidos, utiliza a remissão para as razões de facto e de direito enunciadas na acusação, nos termos do artigo 307.º, n.º 1, do CPP: cfr. n.os 3/04.6GBADV, 45/05.4GBADV, 61/05.6TAADV, 104/05.3GBADV e 52/05.7GBADV) e dos não enunciados, e as medidas de coacção fixadas obedecem aos princípios da legalidade, proporcionalidade e necessidade.
«A instrução nº. 148/01.4GBADV de ... (trabalho apresentado à inspecção), era de facto de grande complexidade a todos os níveis, justificando por isso o tempo e o estudo que a Senhora Juíza lhe dedicou. A decisão final de não pronúncia, que é de elevada qualidade, reflecte isso mesmo, sendo também acertada e juridicamente correcta a comunicação ao MP dos factos que envolviam uma alteração substancial dos factos da acusação nos termos do artigo 303º, nº 4, do CPP.
«Os textos das sentenças são processados em computador, têm estrutura processual correcta. Na jurisdição criminal, após o enquadramento jurídico dos factos provados, identifica o bem jurídico tutelado, analisa com toda a minúcia os elementos objectivos e subjectivos da infracção, e fundamenta a opção pelo regime concretamente mais favorável, havendo sucessão de leis penais no tempo. Justifica a escolha da espécie da pena, se previstas penas não privativas ou privativas da liberdade, e fixa a medida concreta após ponderar os motivos, inclusive os atinentes à culpa e à ilicitude e, sendo o caso, pronuncia-se sobre a aplicabilidade das penas substitutivas de prisão. Os trabalhos apresentados à inspecção evidenciam essas qualidades, destacando-se as dos comuns singulares 114/06.3PAVRS (ofensas à integridade física simples e ameaça); 125/99.3TAVRS (abuso de confiança em relação à Segurança Social); 4/04.1TAORS (crime de difamação através de comunicação social) e 122/01.OTVRS (dano qualificado, p. e p. pelo artigo 213.º, n.º 1, alínea d), com referência aos artigos 2.º, n.os 1, 3 e 6, e 74.º, 1 e 2, da Lei 107/2001, de 08.09), mas produziu outras de idêntico nível técnico, designadamente nos autos de recurso de contra-ordenação 162/07.6TBVRS e comuns singulares 147/03.1G; 304/06.9PAVRS; 17/05.9FAVRS; 2/05.0GDVRS e 263/03.OTAVRS17, e 4/03.1TAMTL e 9/05.8GAMTL.
«Nas sentenças cíveis enuncia bem e sinteticamente as questões essenciais a decidir, resolvendo-as com senso prático e jurídico, e revela na fundamentação assinaláveis conhecimentos jurídicos e capacidade argumentativa, constituindo bons exemplos os trabalhos apresentados.
«III. CONCLUSÕES.
«A Dr.ª AA tem excelentes qualidades humanas para o exercício da judicatura (cfr. item II.1);
«Obteve uma produtividade globalmente positiva. Contudo, não fez uma gestão equilibrada do serviço nas comarcas de ... e ... (deu prioridade aos processos-crime em detrimento dos processos cíveis).
«Destacamos o número expressivo de sentenças proferidas na comarca de ..., só ao alcance de juízes que exercem a função de forma assídua, pontual e dedicada.
«Trata-se duma magistrada com assinalável preparação jurídica, tendo produzido trabalho de boa qualidade. Não obstante incorreu em imprecisões técnicas que não podem ser desprezadas na avaliação, embora também não invalidem o que de positivo foi dito sobre as suas competência profissional e preparação jurídica;
«Está em apreciação o serviço prestado pela Sr.ª Juíza Dr.ª AA desde a última inspecção até ingressar no curso especial para os Tribunais Administrativos; ou seja, a inspecção abrange um período de cerca de 2 anos e 8 meses, o primeiro ano nas comarcas agregadas de ... e ... e o tempo restante na comarca de ...;
«Ponderando tudo o que ficou exposto – serviço prestado, anterior classificação e antiguidade na função –, sem perdermos de vista desempenhos doutros juízes em tribunais da idêntica categoria e competência, entendemos que a Ex.ma Juíza DR.ª AA deve ser classificada com a notação de "BOM"».
            A deliberação reproduz, ainda, o que, no capítulo da apreciação dos dados do relatório da inspecção e da atribuição da classificação, foi exarado no acórdão do Conselho Permanente. Como segue:
«Entende a Exm.ª Juíza que deveria ser-lhe atribuída a classificação de "Bom com Distinção". Face ao conteúdo do Relatório Inspectivo, não se colocando em causa que se está perante desempenho positivo, importa definir o alcance do mesmo, se restrito ao reconhecimento de que a juíza revelou possuir qualidades a merecerem realce para o exercício daquele cargo nas condições em que desenvolveu a actividade (Bom – art 16ª-1-c) do RI]), ou se se pode reconhecer um desempenho meritório ao longo da carreira (Bom com distinção – art. 16º-1-b) do RIJ).
«Enquanto Juíza de Direito, esta é a sua 2ª inspecção classificativa (a abranger um período de desempenho de cerca de 2 anos e 8 meses). Na primeira inspecção enquanto Juíza de Direito fora classificada de "Bom" (período relativo entre 15/9/2004 e 14/9/2004).
«A 26/9/2001 tomou posse como Juíza (temporária) no TJ Loulé, ao abrigo da Lei n.º 3/2000, de 20/3, para o exercício temporário de funções de Juiz.
«O relatório Inspectivo dá-nos conta de qualidades pessoais e de desempenho dignas de realce por parte da Exmª Juíza, como por exemplo:
«– íntegra, civicamente idónea e de comportamento digno no exercício da função; no relacionamento interpessoal tem uma postura irrepreensível;
«– espírito aberto e comunicativo, modos correctos, urbanos e respeitosos com os demais magistrados, oficiais de justiça, mandatários judiciais e público em geral;
«– dotada de boa craveira intelectual;
«– apreciável preparação e maturidade jurídicas;
«– postura independente, isenta e imparcial;
«– no meio forense das diversas comarcas onde exerceu funções deixou uma imagem muito positiva sobre as suas qualidades humanas;
«– magistrada leal, dedicada e pontual, e muito atenta e sensível aos problemas sociais e à dignidade da pessoa humana;
«– integrou-se com facilidade no meio social e cultural das comarcas onde exerceu funções;
«– assiduidade, pontualidade, dedicação e capacidade de trabalho;
«– cuidadosa e organizada na direcção dos processos e na planificação das diligências, e esforçou-se em fazer a correcta e eficiente gestão do tempo e dos actos processuais;
«– realizava as audiências com toda a pontualidade;
«– correcção e clima elevado e respeitoso imposto na direcção dos trabalhos, bem como uma incansável procura da verdade material dos factos;
«As sentenças cíveis enunciam bem e sinteticamente as questões essenciais a decidir, resolvendo-as com senso prático e jurídico, revelando na fundamentação assinaláveis conhecimentos jurídicos e capacidade argumentativa.
«Mas no período em avaliação, como aspectos menos conseguidos, o relatório inspectivo revela alguns atrasos na prolação de sentenças e outros despachos.
«Em ..., ocorreram 7 situações com tempos de despacho entre os 3,08 meses e os 7,22 meses. Já em ... houve 12 casos com tempos de despacho entre os 2,15 meses e os 9,19 meses (com 2 a ultrapassar os 9 meses, 1 os 8 meses e 1 os 6 meses). Os atrasos encontrados em VR Santo António encontram boa justificação no número de julgamentos crime já marcados aquando do acordo de distribuição do serviço cível e a circunstância de apenas ter tomado contacto com os mesmos na fase de decisão.
«Quanto à produtividade, em ... e ..., na área criminal, o saldo foi ligeiramente negativo enquanto que na jurisdição cível esteve ao nível da média de outros tribunais semelhantes.
«A predominância de decisões crime em detrimento das cíveis deveu-se a gestão pouco equilibrada do serviço em que se deu demasiada prioridade aos processos-crime.
«Em ... o desempenho foi positivo, só possível com uma constante assiduidade, pontualidade, dedicação e capacidade de trabalho exibindo um expressivo número de decisões.
«Embora não tenha deixado qualquer processo concluso para despacho ou decisão em qualquer dos 3 tribunais, a pendência estatística que deixou também em qualquer dos 3 tribunais foi superior à que encontrou à chegada.
«Detectadas também algumas deficiências técnicas:
«– Nas acções sumaríssimas não contestadas não se limitava à condenação do réu no pedido;
«– Nas acções sumaríssimas, havendo alegação matéria de excepção, determinava a notificação do autor para responder em vez de relegar o conhecimento para a audiência;
«– Depois da audiência nas acções sumaríssimas mandava concluir os autos para proceder à elaboração escrita da sentença;
«– Em despachos proferidos em audiência (sumário 264/04.0VRS; CS nº 84/01.4PAVRS; CS 478/04.3PAVRS);
«– Pouco rigor na selecção da factualidade relevante para a decisão levando a extensos requerimentos probatórios e a morosas audiências de julgamento;
«– Bases Instrutórias com matéria conclusiva e/ou inócua e com factos que só podem ser provados por documento;
«– Omissão de factos do objecto dos processos;
«– Contradições na fundamentação entre esta e a própria motivação de facto e ou de direito;
«Contrapondo os atrasos e deficiências técnicas detectados com os outros aspectos funcionais positivos, resulta claro que se está perante um desempenho positivo, como já atrás se assinalara.
«Porém, não se alcançou uma prestação com dimensão de mérito, mas sim unicamente reveladora que a Exmª Juíza possui qualidades a merecerem realce para o exercício do cargo, como aliás o Exmº. Inspector também concluiu.
«Entende-se, pois, mais adequada à prestação da Exma. Juíza a notação de "Bom".»
Especificamente, quanto à apreciação da reclamação, consta da deliberação o seguinte:
«III – APRECIAÇÃO DA RECLAMAÇÃO
«Retira-se da reclamação apresentada que a Exmª Juíza considera que não foi dado o devido relevo ao seu desempenho de funções ao abrigo do disposto na Lei n.º 3/2000, de 20 de Março e à classificação (de "Bom") que lhe foi dada nesse âmbito, em inspecção efectuada em 2002.
«No acórdão do Conselho Permanente, fez-se constar que:
«”Enquanto juíza de Direito, esta é a sua 2ª inspecção classificativa (a abranger um período de desempenho de cerca de 2 anos e 8 meses). Na primeira inspecção enquanto Juíza de Direito fora classificada de "Bom" (…).
«”A 26/9/2001 tomou posse como Juíza (temporária) no TJ Loulé, ao abrigo da Lei nº 3/2000 de 20/3, para o exercício temporário de funções de Juiz”.
«Na verdade, no certificado do registo individual da Exmª Juíza faz-se menção apenas a uma classificação antes da presente Inspecção, relativamente ao período compreendido entre 15-09-2004 e 14-09-2005, por serviço prestado, como Juíza de Direito, no 1.º Juízo do Tribunal Cível de Faro.
«Também se retira dos autos que a Sr.ª Dr.ª AA foi nomeada Juíza de Direito em regime de estágio em 07-10-2003. Antes disso, havia sido Juíza em regime temporário, ao abrigo da Lei n.º 3/2000 de 20/03, conforme se exarou no acórdão reclamado.
«A Lei n.º 3/2000, de 20/03, criou “três novos instrumentos de gestão destinados a conferir aos conselhos superiores capacidade reforçada de intervenção, nomeadamente no âmbito das acções visando a eliminação de pendências acumuladas nos tribunais judiciais”, consistindo um deles – previsto no seu art. 4º – no regime excepcional de nomeação de juízes.
«O dito art. 4º é do seguinte teor:
«”1 – Em circunstâncias excepcionais de serviço, resultantes, designadamente, do número ou complexidade dos processos, pode ainda o Conselho Superior da Magistratura proceder à nomeação de licenciados em Direito, de comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais, para o exercício temporário de funções de juiz nos tribunais de 1.ª instância.
«2 – A nomeação é precedida de selecção mediante concurso público, com avaliação curricular e prestação de provas públicas, nos termos de regulamento a aprovar por decreto-lei, precedendo proposta do Conselho Superior da Magistratura, nos termos da alínea c) do artigo 149.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
«3 – A nomeação para exercício de funções previstas no n.º 1 é sujeita a termo certo, não superior a quatro anos, sendo em regime de comissão de serviço se o nomeado tiver vínculo à função pública.
«4 – Os juízes nomeados nos termos dos números anteriores serão preferencialmente colocados no exercício de funções de juiz auxiliar ou em regime de substituição.
5 – O número de lugares a concurso é fixado, precedendo proposta do Conselho Superior da Magistratura, por portaria conjunta dos Ministros das Finanças, da Justiça e da Reforma do Estado e da Administração Pública.
«6 – Os juízes nomeados em regime excepcional são remunerados pelo índice 100 da escala indiciária dos magistrados judiciais, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 3 deste artigo.”
«Outro dos instrumentos foi o do regime excepcional de afectação de magistrados judiciais jubilados (art. 3º).
«Salvo o devido respeito, embora com o objectivo comum de combater pendências acumuladas, não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz, mesmo com comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais, isso mesmo se reflectiu no relatório da inspecção que foi feita à Exmª Juíza tendo por objecto o exercício dessas funções temporárias, escrevendo o Exm.º Inspector, a dado passo:
«”O que mais se nota no desempenho da Dr.ª AA é a falta de uma preparação teórico-prática, designadamente de um estágio de formação, pois os conhecimentos científicos da Academia, sendo pano de fundo necessário para o exercício da função judicante, não eliminam as espinhosas dificuldades que eriçam o percurso de qualquer Juiz, especialmente no momento solitário da decisão.”
«O resultado dessa Inspecção – que não consta do registo biográfico – não é equiparável ao da primeira que ocorreu quando a Sr.ª Dr.ª AA já era Juíza de Direito e daí que se tenha sublinhado no acórdão do Conselho Permanente que estamos perante a segunda classificação nesta qualidade.
«De acordo com o disposto no art. 16.º, n.º 3 do Regulamento das Inspecções Judiciais, a melhoria de classificação deve ser gradual, não se subindo mais de um escalão de cada vez, sem prejuízo dos casos excepcionais, não podendo, porém, em caso algum, ser decorrência da antiguidade do juiz.
«Nada impedia que se atribuísse à Exm.ª Juíza, com uma anterior classificação de "Bom" como Juíza de Direito, a nota de "Bom com distinção", tal como esta não decorreria da inscrição no certificado de registo individual da classificação atribuída na qualidade de juíza em regime temporário.
«Na verdade, embora se tenham sempre de considerar a antiguidade e as classificações anteriores, a razão de ser da não atribuição, pelo Conselho Permanente, da notação de "Bom com distinção" emerge, primacialmente, da consideração dos atrasos registados nas comarcas de ... e ... – alguns significativos, tendo em conta o volume de serviço de tais comarcas (mesmo não olvidando as dificuldades decorrentes da agregação e as distâncias entre as sedes de uma e outra) - e das deficiências técnicas apontadas.
«Se, relativamente a ..., o Exmº Inspector destacou o número significativo de sentenças proferidas, já no que concerne a ... e ... (onde a Exmª Juíza esteve colocada um ano, antes de exercer funções em ...), a prestação foi diferente.
«O Exmº Inspector escreveu, no relatório, que, nas comarcas de ... e ..., o número de processos findos, na jurisdição criminal, andou sensivelmente na média de outros tribunais da mesma categoria e competência, mas em níveis mais baixos na jurisdição cível, considerando que a Exm.ª Juíza não fez uma gestão equilibrada no serviço, tendo dado prioridade aos processos-crime em detrimento dos cíveis.
«Fazendo uma análise, em termos globais, destas duas comarcas agregadas, o Exmº Inspector considerou o seguinte:
«”[...] vemos que na jurisdição cível entraram nesses tribunais um total de 129 processos e terminaram 120 e que na jurisdição criminal entraram 229 processos e terminaram 208 (não levando em conta as deprecadas, em ambos os casos), ou seja, em termos globais, o saldo é ligeiramente negativo.”
«Por outro lado, registaram-se deficiências técnicas (remete-se, nesse aspecto para o teor do acórdão do Conselho Permanente) que, naturalmente, o desenvolvimento da carreira debelará.
«Para além das qualidades da Exm.ª Juíza, está em causa um concreto desempenho, num período de cerca de 2 anos e 8 meses, nas aludidas comarcas.
«A Exm.ª Juíza, centrando a sua atenção na problemática da consideração ou valoração das funções que desempenhou enquanto juíza em regime temporário, não pôs em causa, na reclamação, quer o registo quantitativo expresso no acórdão quer os reparos feitos à qualidade do seu trabalho.
«Nos termos do art. 16.º, n.º 1, b) do Reg. das Inspecções Judiciais, a atribuição de Bom com distinção equivale ao reconhecimento de um desempenho meritório ao longo da respectiva carreira e, de acordo com a al. c) do mesmo número, a atribuição de Bom equivale ao reconhecimento de que o juiz revelou possuir qualidades a merecerem realce para o exercício daquele cargo nas condições em que desenvolveu a actividade.
«Concordando-se com a análise feita no acórdão do Conselho Permanente, será de concluir, como ali se concluiu, que a Exmª Juíza tendo desenvolvido uma prestação globalmente positiva, não atingiu o patamar do mérito justificativo da classificação de "Bom com distinção". Ao seu desempenho, revelando qualidades a merecerem realce para o exercício do cargo (sem atingir ainda o qualificativo de "meritório"), é adequada, sim, a notação de "Bom", que, assim, se mantém, indeferindo-se a douta reclamação.»
III

1. Como, antes, se viu, a recorrente terminou a pedir a anulação da deliberação, nos termos do artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo, com devolução dos autos ao Plenário do CSM, a fim de, reapreciando-se todo o seu processo, desde o que consta do seu processo individual, passando pelo relatório de inspecção, lhe ser atribuída a classificação de “Bom com Distinção”.
            Temos, assim, que a recorrente cumula com o pedido de anulação da deliberação o pedido de condenação do CSM à prática de um acto (reapreciar todo o seu processo a fim de lhe ser atribuída a classificação de “Bom com Distinção”).
            Este segundo pedido cumulativamente formulado é legalmente inadmissível.
            1.1. O regime de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça das deliberações do CSM (artigo 168.º do EMJ) tem de ser conjugado com o modelo de impugnação definido pelo Código de Processo nos Tribunais Administrativos[5] (artigos 191.º e 192.º deste diploma), do qual continua a resultar, no respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, a opção legislativa da delimitação dos poderes dos tribunais administrativos ao julgamento do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação (artigo 3.º, n.º 1, do CPTA).
            O recurso previsto no artigo 168.º do EMJ tem por objecto a anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência do acto administrativo impugnado (a deliberação do CSM), nos termos do artigo 50.º, n.º 1, do CPTA.
            “A competência da secção do contencioso encontra-se limitada a anular, declarar nulo ou inexistente o acto impugnado – para tanto pronunciando-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas, podendo, ainda, oficiosamente conhecer de outras (artigo 95.º, n.º 2, do CPTA).”[6]
            Por isso, “no recurso contencioso de mera anulação, cuja regulamentação consta dos artigos 168.º e ss do EMJ, regime esse ressalvado pelo artigo 192.º do CPTA, o pedido terá sempre de ser o de anulação, declaração de nulidade ou de inexistência do acto recorrido[7]”.
             1.2. O CPTA prevê a cumulação de pedidos, no artigo 4.º, admitindo a possibilidade de cumular com o pedido de anulação ou declaração de nulidade ou inexistência de um acto administrativo o pedido de condenação da Administração à prática de um acto administrativo legalmente devido (n.º 2, alínea c), do referido artigo 4.º).
            Também o artigo 47.º, n.º 2, alínea a), do CPTA, se refere à possibilidade de cumular com o pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência de um acto administrativo «o pedido de condenação à prática do acto administrativo devido, em substituição, total ou parcial, do acto praticado».
            Porém, como estabelece o artigo 67.º do CPTA, são os seguintes os pressupostos do pedido de condenação à prática de acto administrativo legalmente devido.
«A condenação à prática de acto administrativo legalmente devido pode ser pedida quando:
            «a) Tenha sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido;
            «b) Tenha sido recusada a prática do acto devido; ou
            «c) Tenha sido recusada a apreciação de requerimento dirigido à prática do acto.»
            Pressupostos que, manifestamente, não se verificam, no caso.
            Não obstante, será, ainda, pertinente recordar que, mesmo nos casos de admissibilidade de cumulação do pedido de condenação à prática de acto administrativo legalmente devido, «quando a emissão do acto pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do acto a praticar» apenas devendo «explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto omitido» (artigo 71.º, n.º 2, do CPTA).
            1.3. Como se escreveu no acórdão deste Tribunal de 11/10/2001, no processo n.º 507/01, mantendo plena actualidade:
            «Os recursos contenciosos são, salvo disposição expressa em contrário, de mera legalidade, tendo por objecto a declaração de invalidade (inexistência, nulidade ou mera anulação dos actos administrativos recorridos).
«Aos tribunais não cabe fazer administração activa, já que se limitam a decretar ou declarar tal invalidade, cabendo depois à Administração extrair sponte sua das decisões judiciais as correspondentes ilações legais.
 «No âmbito de recurso contencioso é – salvo disposição expressa – inadmissível ao particular pedir a revogação, modificação ou substituição do acto impugnado, lesivo dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, a condenação da Administração a praticar determinado acto ou, ainda, a substituição do tribunal à autoridade administrativa na prática do acto administrativo que se repute adequado.»
Como resulta de tudo o exposto, não tem cabimento legal, em recurso interposto de deliberação do CSM, o pedido da recorrente no sentido de que «os autos sejam devolvidos ao plenário do CSM a fim de (…) lhe ser atribuída a notação de “Bom com Distinção”».  
            2. Como emerge do recurso, a recorrente funda o pedido de anulação da deliberação do Plenário do CSM, de 18/01/2011 – que manteve a notação de “Bom” que lhe tinha sido atribuída por acórdão do Conselho Permanente, de 23/03/2010 – na existência de dois vícios.
Segundo a recorrente, são eles:
1) – a deliberação conter matéria nova, relativamente à qual não lhe foi dada oportunidade de contraditório; e
2) – a falta de fundamentação da manutenção da notação de “Bom”, limitando-se a deliberação a citar o aresto anterior e o relatório da inspecção.
Deles passamos a conhecer.
2.1. A introdução de matéria nova, sem oportunidade de contraditório
Pretende a recorrente que o facto de o acórdão conter uma menção a que «não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado as funções de juiz» constitui matéria nova, sem oportunidade de contraditório, que deve levar à anulação da deliberação.
2.1.1. Na reclamação para o Plenário, do acórdão do Conselho Permanente, alegou a recorrente, designadamente:
            «1. O Venerando Sr. Inspector Judicial, ao propor a notação de " BOM" considerou que a antiguidade da inspeccionada era apenas de 5 anos, 6 meses e 15 dias, de acordo com o Registo Biográfico (cf. fls. 7/8 do Acórdão reclamado).
«Porém,
«2. A carreira de Magistrado Judicial da inspeccionada não teve o percurso normal da maioria dos inspeccionados com 5 anos, 6 meses e 15 dias, porquanto a signatária reingressou na Magistratura ao abrigo da Lei nº 3/2000, de 20 de Março, que conferiu a esse CSM "capacidade reforçada de intervenção (...) visando a eliminação de pendências acumuladas nos tribunais judiciais", mais lhe concedendo poderes para "nomear magistrados judiciais jubilados (...) em comissão de serviço, que para o efeito manifestassem disponibilidade junto do Conselho Superior da Magistratura" (cf. artigos 1.º e 3.º da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março).
«3. Vale isto por dizer que, com o objectivo de eliminar pendências (cíveis) acumuladas nos tribunais judiciais, esse CSM procedeu ao escrutínio de pessoas com capacidades e preparação académica superior às pessoas que normalmente ingressam no CEJ para começar uma carreira.
«4. Foi nesse contexto que a juiz inspeccionada ingressou na Magistratura, tendo tomado Posse em Loulé em 4/10/2001 (doc. n.º 1)
«5. No princípio da sua carreira começou, assim, por exercer funções equivalentes às de magistrado judicial jubilado, ou seja, com competência para as pendências cíveis para todo o Algarve.»
                Na apreciação da reclamação, o acórdão do Plenário, a propósito da alegação antes transcrita, contém, efectivamente, as seguintes considerações (já, antes transcritas):
«Retira-se da reclamação apresentada que a Exmª Juíza considera que não foi dado o devido relevo ao seu desempenho de funções ao abrigo do disposto na Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e à classificação (de "Bom") que lhe foi dada nesse âmbito, em inspecção efectuada em 2002.
«No acórdão do Conselho Permanente, fez-se constar que:
«”Enquanto juíza de Direito, esta é a sua 2ª inspecção classificativa (a abranger um período de desempenho de cerca de 2 anos e 8 meses). Na primeira inspecção enquanto Juíza de Direito fora classificada de "Bom" (..).
«A 26/9/2001 tomou posse como Juíza (temporária) no TJ Loulé, ao abrigo da Lei n.º 3/2000 de 20/3, para o exercício temporário de funções de Juiz”.
«Na verdade, no certificado do registo individual da Exmª Juíza faz-se menção apenas a uma classificação antes da presente Inspecção, relativamente ao período compreendido entre 15-09-2004 e 14-09-2005, por serviço prestado, como Juíza de Direito, no 1º Juízo do Tribunal Cível de Faro.
«Também se retira dos autos que a Sr.ª Dr.ª AA foi nomeada Juíza de Direito em regime de estágio em 07-10-2003. Antes disso, havia sido Juíza em regime temporário, ao abrigo da Lei nº 3/2000, de 20/03, conforme se exarou no acórdão reclamado.
«A Lei nº 3/2000, de 20/03, criou “três novos instrumentos de gestão destinados a conferir aos conselhos superiores capacidade reforçada de intervenção, nomeadamente no âmbito das acções visando a eliminação de pendências acumuladas nos tribunais judiciais”, consistindo um deles – previsto no seu art. 4º – no regime excepcional de nomeação de juízes.
«O dito art. 4º é do seguinte teor:
«(…)
«Outro dos instrumentos foi o do regime excepcional de afectação de magistrados judiciais jubilados (art. 3º).
«Salvo o devido respeito, embora com o objectivo comum de combater pendências acumuladas, não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz, mesmo com comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais, isso mesmo se reflectiu no relatório da inspecção que foi feita à Exmª Juíza tendo por objecto o exercício dessas funções temporárias, escrevendo o Exm.º Inspector, a dado passo:
«”O que mais se nota no desempenho da Dr.ª AA é a falta de uma preparação teórico-prática, designadamente de um estágio de formação, pois os conhecimentos científicos da Academia, sendo pano de fundo necessário para o exercício da função judicante, não eliminam as espinhosas dificuldades que eriçam o percurso de qualquer Juiz, especialmente no momento solitário da decisão.”
«O resultado dessa Inspecção – que não consta do registo biográfico – não é equiparável ao da primeira que ocorreu quando a Sr.ª Dr.ª AA já era Juíza de Direito e daí que se tenha sublinhado no acórdão do Conselho Permanente que estamos perante a segunda classificação nesta qualidade.»
                2.1.2. Vê-se, assim, que as considerações, antes transcritas, foram suscitadas pela alegação da recorrente, nos pontos também antes transcritos, contida na sua reclamação.
Com efeito, a recorrente convocou o período de tempo em que exerceu funções, por efeito de nomeação ao abrigo da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, e, independentemente da intenção nela pressuposta, produziu, objectivamente, a afirmação de que «No princípio da sua carreira começou, assim, por exercer funções equivalentes às de magistrado judicial jubilado, ou seja, com competência para as pendências cíveis para todo o Algarve».
Daí a pertinência da análise do regime da Lei n.º 3/2000, de 20 de Março, estabelecendo-se a distinção entre o regime excepcional de nomeação de licenciados em Direito para o exercício temporário de funções de juiz nos tribunais de 1.ª instância e o regime excepcional de afectação de magistrados judiciais jubilados, a que o acórdão procede.
Sendo, nesse contexto, que se vem a considerar que, «embora com o objectivo comum de combater pendências acumuladas, não se pode estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz, mesmo com comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais», sendo, a propósito, convocado um excerto do relatório da inspecção que abrangeu o exercício temporário, pela recorrente, das funções de juiz.
Não se trata, pois, de matéria nova. Mas, antes, do conhecimento de matéria alegada na reclamação, sobre ela sendo emitido juízo fundamentado.
                2.1.3. Por outro lado, a apreciação dessa matéria não influenciou o juízo de notação. Ou, dito de outro modo, para a não atribuição da pretendida classificação de “Bom com Distinção” não relevou a consideração sobre não se poder estabelecer equivalência entre as funções de um magistrado judicial jubilado e as de alguém nomeado para exercer, por tempo limitado, as funções de juiz.
            Como resulta do seguinte passo da deliberação:
«Nada impedia que se atribuísse à Exmª Juíza, com uma anterior classificação de "Bom" como Juíza de Direito, a nota de "Bom com distinção", tal como esta não decorreria da inscrição no certificado de registo individual da classificação atribuída na qualidade de juíza em regime temporário.
«Na verdade, embora se tenham sempre de considerar a antiguidade e as classificações anteriores, a razão de ser da não atribuição, pelo Conselho Permanente, da notação de "Bom com distinção" emerge, primacialmente, da consideração dos atrasos registados nas comarcas de ... e ... – alguns significativos, tendo em conta o volume de serviço de tais comarcas (mesmo não olvidando as dificuldades decorrentes da agregação e as distâncias entre as sedes de uma e outra) – e das deficiências técnicas apontadas.»
2.2. A Falta de Fundamentação
2.2.1. A imposição do dever de fundamentação, expressa e acessível, estabelecida no artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República, em relação a todos os actos administrativos, quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, é um importante sustentáculo da legalidade administrativa e instrumento fundamental da respectiva garantia contenciosa.
            Com efeito, “a exigência de fundamentação dos actos administrativos prossegue dois objectivos essenciais: um, de natureza endoprocessual – permitir aos interessados o conhecimento dos reais fundamentos de facto e de direito que determinaram a entidade decidente a emitir a estatuição autoritária pela forma concreta como o fez, em ordem a possibilitar aos administrados uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a justificação da interposição de um recurso contencioso –; outro, de feição extraprocessual determinado pelos princípios da legalidade, da justiça e da imparcialidade que deve reger toda a actuação jurídico-administrativa, como enformadores de um processo lógico, coerente e sensato que culmine num exame sério e imparcial dos factos e das disposições legais aplicáveis em cada situação concreta”[8].
            Nos termos do artigo do 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo: “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto”.
            Dispondo o n.º 2 do mesmo artigo que: “Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto”.
            2.2.2. Ora, a deliberação impugnada – para cuja transcrição, antes efectuada, remetemos –, analisou criticamente e com referência aos critérios legais de avaliação, segundo os factores de ponderação que julgou adequados e pertinentes, de forma suficiente, o desempenho funcional da recorrente. Tudo através de um raciocínio cuja lógica e coerência não oferecem quaisquer dúvidas, convocando dados factuais recolhidos pelo inspector, mas sem deixar de reflectir a ponderação dos factos alegados pela recorrente na reclamação.
            Mostra-se, portanto, cabalmente cumprida a exigência legal de fundamentação, uma vez que a deliberação, além da exposição das razões de facto e jurídicas ponderadas, esclarece o raciocínio lógico em que se baseia o reconhecimento de que ao desempenho da recorrente é adequada a notação de “Bom” e não a reclamada notação de “Bom com Distinção”.
            Por outro lado, na crítica à deliberação, por ter fundamentado a manutenção da notação de “Bom”, por remissão para o acórdão do Conselho Permanente e para o relatório do Ex.mo Inspector Judicial, a recorrente manifestamente desconsidera que a fundamentação, por remissão, tem suporte legal, no artigo 125.º, n.º 1, 2.ª parte, do Código de Procedimento Administrativo, antes transcrito.
            2.2.3. Mas, bem vistas as coisas – concretamente factos alegados no recurso do ponto 5 a final –, a recorrente não põe verdadeiramente em causa a falta de fundamentação da deliberação, ou seja, a adopção de fundamentos que não esclareçam concretamente a motivação do acto.
            O que, realmente, questiona – como o Ex.mo Procurador-geral-adjunto, bem observa – é o acerto ou adequação da decisão, pondo em causa os factos e as razões que relevaram para a não atribuição da reclamada notação de “Bom com Distinção”.
            O que respeitará, não ao vício de falta de fundamentação, mas a outro, o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto ou de direito.
            O qual também não se detecta.
            Devendo ter-se presente que, em sede de apreciação do mérito dos magistrados judiciais, o CSM, embora vinculado aos princípios da justiça, da imparcialidade e da proporcionalidade, actua com larga margem de discricionariedade técnica no que respeita à apreciação da prova e à aplicação dos critérios ou factores legais.
O juízo de apreciação do mérito ou demérito do desempenho dos juízes pelo CSM não pode, portanto, em regra, ser sindicado judicialmente porque o Tribunal não pode substituir-se à Administração na reponderação daqueles juízos valorativos que integram materialmente a função administrativa.
No caso, os critérios utilizados pelo CSM não se apresentam como flagrante ou ostensivamente desajustados ou como violadores dos princípios da justiça, da imparcialidade e da proporcionalidade.
Na verdade, o CSM atendeu aos critérios das alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 16.º do Regulamento das Inspecções Judiciais e foi, em função dos elementos recolhidos relativos aos atrasos registados nas comarcas de ... e ... e às deficiências técnicas detectadas no desempenho da recorrente, que concluiu que a recorrente, tendo desenvolvido uma prestação globalmente positiva, não atingiu o patamar de mérito justificativo da classificação de “Bom com Distinção”.
3. Finalmente, a deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, cuja junção aos autos foi requerida pela recorrente, é anódina na perspectiva do recurso.
            Nessa deliberação, de 11 de Maio de 2011, o que se determina é, tão só, que a antiguidade da recorrente «na jurisdição administrativa e fiscal, para efeitos sociais, compreende o tempo de serviço prestado nas funções de delegado do Procurador da República e nas funções de juiz de nomeação temporária». 
            Ora, esse reconhecimento da antiguidade não tem a virtualidade de afectar os fundamentos da deliberação impugnada. Tanto mais quanto, como estabelece o n.º 3 do artigo 16.º do Regulamento das Inspecções Judiciais, a melhoria da classificação não pode, em caso algum, ser decorrência da antiguidade do juiz.
IV
            Termos em que, se acorda em julgar o recurso improcedente.
            Custas pela recorrente, com 5 UC de taxa de justiça.


 Supremo Tribunal de Justiça, 20/10/2011

           
Isabel Pais Martins (relatora)

Fernandes da Silva

Paulo Sá

Maia Costa

Maria dos Prazeres Beleza

Fonseca Ramos

Oliveira Vasconcelos

Henriques Gaspar

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[1] Aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de Julho e alterado pelo Decreto-Lei n.º 342/88, de 28 de Setembro, e pelas Leis n.os 2/1990, de 20 de Janeiro, 10/94, de 5 de Maio, 44/96, de 3 de Setembro, 81/98, de 3 de Dezembro, 143/99, de 31 de Agosto, 3-B/2000, de 4 de Abril, 42/2005, de 29 de Agosto, 26/2008, de 27 de Junho, 52/2008, de 28 de Agosto, 63/2008, de 18 de Novembro, e 37/2009, de 20 de Julho, doravante designado pelas iniciais EMJ. 
[2] Doravante designado pelas iniciais CSM.
«[3] Pelo período de 4 anos, com efeitos retroactivos a 26/09/2001.»
[4] Esta omissão não tem actualmente efeito cominatório, diversamente do regime anterior em que implicava a deserção do recurso (artigos 67.º, § único do RSTA, 291.º, n.º 2, e 690.º, n.º 3, do CPC.)
Como decorre do disposto nos artigos 78.º, n.º 4, e 91.º, n.os 4, 5 e 6, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a dispensa de apresentação de alegações, quando requerida, ou a sua não apresentação, na sequência de notificação para o efeito, apenas prejudica a faculdade de o autor  invocar novos fundamentos do pedido, de conhecimento superveniente, ou restringi-los expressamente, e de   ampliar o pedido.
[5] Aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro, daqui em diante abreviadamente designado pelas iniciais CPTA.
[6] Acórdão, desta secção, de 07/07/2010 (processo n.º 11/10.8YFLSB).
[7] Acórdão, desta secção, de 26/10/2007 (processo n.º 184/07).
[8] Como se escreveu no acórdão deste Tribunal de 14/10/2004 (processo n.º 1498/04).