Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4239/20.4T8STB.E1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANA RESENDE
Descritores: COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
TRIBUNAIS PORTUGUESES
REQUISITOS
DOMICÍLIO PROFISSIONAL
DOMICÍLIO
PRINCÍPIO DA COINCIDÊNCIA
PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE
PRINCÍPIO DA NECESSIDADE
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
DIREITO DE PERSONALIDADE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
JOGADOR DE FUTEBOL
DIREITO À IMAGEM
DIREITO AO NOME
JOGO
INCONSTITUCIONALIDADE
Data do Acordão: 02/15/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA PROCEDENTE.
Sumário :

I- Sobre o Tribunal impende a obrigação de julgar, na devida obediência à lei, não se podendo obliterar que nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito, numa tutela dos vetores da certeza e da segurança jurídica na aplicação da lei e na resolução dos conflitos, mas sem questionar o primado da lei sobre a jurisprudência.

II- A competência do tribunal, como medida da sua jurisdição é fixada em função dos termos em que a ação é proposta, considerando o pedido do autor, isto é, o direito a que se arroga e que quer ver reconhecido ou declarado judicialmente, não estando dependente de outros pressupostos processuais, dos termos da contestação ou oposição deduzida.

III- Estabelecida uma hierarquia entre as fontes da atribuição da competência internacional dos tribunais portugueses, prevalece o que se acha estabelecido em tratados, convenções e regulamentos comunitários, sobre as normas internas da regulação da competência em termos internacionais, não existindo nenhum instrumento internacional que vincule o Estado Português em matéria de competência judiciária, será à luz do disposto do aludido art. 62.º, do CPC que deve ser aferida.

IV- O critério da causalidade, constante da alínea b) do art. 62.º, diz-nos que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes desde que tenha sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação ou algum dos factos que a integram, resultando de forma clara da parte final desta norma, a plena aplicação aos casos em que haja uma causa de pedir complexa, constituída por uma pluralidade de atos ou factos jurídicos relevantes com ligação a mais do que um ordenamento jurídico ou jurisdição nacional.

V- Enunciado na petição inicial que o A. pretende efetivar a responsabilidade da Ré por facto ilícito, decorrente da violação dos direitos à sua imagem e nome, enquanto jogador futebol, a nível nacional e mundial, por utilização daqueles em jogos de vídeo pertencentes à Ré, que os produz e desenvolve, sendo vendidos em Portugal e em todo o mundo, e os conteúdos utilizados em plataformas informáticas, configura-se a existência de uma causa de pedir complexa.

VI- Os danos decorrentes da apontada violação de direitos de personalidade correspondem ao aproveitamento económico da personalidade do Autor e assim a lesão verifica-se no local onde o bem da personalidade é explorado economicamente, na vertente patrimonial, de forma plurilocalizada, em Portugal e no resto do Mundo, e os danos não patrimoniais, da afetação do mesmo pela utilização não autorizada da sua imagem e nome.

VII- Para a atribuição da competência internacional do Tribunal Português configura-se adequado o critério da causalidade, alínea b), do art.º 62, do CPC, tendo em conta a alegada concretização da violação do direito ao nome e imagem do Autor. assim como a verificação, pelo menos em parte, dos danos patrimoniais e não patrimoniais, e o desenvolvimento da sua profissão de jogador de futebol, invocada como seu sustento, em Portugal.

Decisão Texto Integral:


REVISTA n.º 4239/20.4T8STB.E1.S1

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I - Relatório

1. AA veio interpor contra ELETRONICS ARTS INC. a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a título de indemnização por danos patrimoniais de personalidade, pela utilização indevida da sua imagem e do seu nome, a quantia de 324.000,00€ de capital, acrescida de juros vencidos no montante de 97.630,68€, tudo no total de 421.630,68€ e dos juros que se vencerem até integral pagamento, devendo ainda ser condenada na quantia não inferior a 5.000,00€, a título de danos não patrimoniais acrescida dos juros vencidos no montante de 2.559,45€, tudo no total de 7.559,45€, e dos juros que se vencerem até integral pagamento, à taxa legal.

1.1. Alega para tanto que a R, através do desenvolvimento e fornecimento de jogos, conteúdos e serviços online para consolas com ligação à internet, dispositivos móveis, e computadores pessoais, é uma empresa líder em entretenimento digital interativo, com várias subsidiárias, assumindo a responsabilidade pela venda dos produtos perante todos os consumidores não residentes nos Estados Unidos, Canadá e Japão.

O A. é um jogador de futebol Português, representando atualmente uma equipa em Portugal, mantendo uma longa carreira de jogador de futebol profissional, tendo exercido a sua profissão, maioritariamente, em clubes portugueses, na Seleção Nacional AA de Futebol, e alcançado bastante notoriedade internacional.

Teve conhecimento que a sua imagem, o seu nome e as suas características pessoais e profissionais foram, e continuam a ser, utilizados nos jogos denominados FIFA, também com as designações FIFA Football ou FIFA Soccer, nas edições de 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2017, 2018 e 2019, FIFA MANAGER, nas edições 2008, 2009, 2010, 2011, 2013 e 2014, FIFA ULTIMATE TEAM – FUT, nas edições 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2017, 2018 e 2019 e FIFA MOBILE, na edição de 2018, todos propriedade da Ré.

Jamais concedeu autorização expressa, ou sequer atribuição tácita, a quem quer que fosse, para ser incluído nos indicados jogos eletrónicos, jogos de vídeo e aplicativos, em tão pouco conferiu poderes aos Clubes, para que estes negociassem a licença para o uso da sua imagem e do seu nome, especificamente para jogos eletrónicos, jogos de vídeo, aplicativos, ou quaisquer outros jogos online ou offline, em qualquer tipo de plataforma.

As atividades exploradas através dos jogos de vídeo identificados, tornados mundialmente conhecidos, resulta que a repercussão da imagem do A. não se insere apenas no âmbito nacional, mas é utilizada pela R. a nível global, sendo a mesma uma poderosa multinacional com largos lucros resultantes das vendas.

A exploração indevida da imagem e do nome do jogador A. é renovada todos os anos por via do lançamento de novas versões dos jogos, procedendo a R. ao relançamento das versões mais antigas e recorrentemente os jogos são utilizados para a realização de torneios a nível nacional e internacional, organizados pelas mais diversas entidades, caso da R. que organiza e patrocina um desses torneios internacionais.

Quanto à indemnização a fixar, para além do possível recurso à equidade, deverão ser ponderados os proventos económicos que a R, em resultado da sua atuação, vem auferindo à custa do A., assumindo uma expressão significativa com relevo no quadro de vida do lesado e com repercussão sancionatório para a lesante.

1.2. A R. veio contestar, defendendo-se por exceção, prescrição do direito do A, licenciamento dos direitos de imagem a favor da R., abuso de direito, e por impugnação, afastando a invocada ilicitude da sua conduta, assim como os demais pressupostos da obrigação de indemnizar, bem como a verificação de enriquecimento sem causa.

1.3. A R. veio suscitar a questão de conhecimento oficioso da competência internacional dos Tribunais Portugueses para conhecerem do litígio, determinando a incompetência absoluta do tribunal, que deveria ser declarada.

1.4. O A. veio responder, concluindo pela improcedência da deduzida exceção da incompetência internacional do Tribunal.

1.5. Foi proferida decisão, que declarou a incompetência absoluta do Tribunal por infração das regras de competência internacional dos tribunais portugueses, absolvendo a R. da instância.

2. Inconformado veio o A. interpor recurso de apelação, que por Acórdão da Relação de Évora a julgou improcedente, confirmando a decisão recorrida.

3. Novamente inconformado veio o A. interpor recurso de revista, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: (transcritas)

a) Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido nos autos que julgou o recurso interposto, pelo Autor, improcedente e, em consequência, manteve a decisão recorrida, que julga os tribunais portugueses internacionalmente incompetentes para o conhecimento da ação e, em consequência, absolve a ré da instância.

b) Assim, salvo diferente entendimento, o Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Évora, objeto do presente recurso, incorre em manifesta violação das regras de competência internacional, mais concretamente, na violação das disposições firmadas no artigo 7.º, n.º 2 do Regulamento 1215/2012 e no artigo 62.º, alíneas a), b) e c) do Código de Processo Civil.

c) A decisão recorrida é, salvo o devido respeito, que aliás é muito, injusta e precipitada, tendo partido de pressupostos errados.

d) Entende o ora Recorrente que as suas legítimas pretensões saem manifestamente prejudicadas pela manutenção da decisão recorrida.

e) No que respeita ao caso concreto e ao uso indevido da imagem do Autor, os jogos da ré, com o conteúdo lesivo, são difundidos por esta, para serem utilizados e guardados em vários instrumentos tecnológicos, de diversas pessoas, a qualquer momento, em qualquer lugar.

f) É o que sucede, por exemplo, com a colocação dos jogos em linha/ambiente digital, altamente potenciada com a expansão do uso da Internet e da qual a ré beneficia largamente para aumentar a divulgação e exploração comercial dos seus jogos e, bem assim, os avultados lucros daí advenientes.

g) Acresce que, conforme demonstrado nos autos, inclusive, através de diversa documentação junta com a petição inicial, os jogos da ré são comercializados em suporte físico em Portugal, nas mais variadas lojas, como por exemplo, nas lojas da especialidade, nas grandes superfícies, na W....., na F..., na M.........., entre tantas outras.

h) E imagine-se que, alguém escrevia um livro em sua casa denegrindo ou simplesmente fazendo uso não autorizado da imagem da personalidade “A” ou até que esse alguém pintava um quadro com uma imagem menos abonatória dessa mesma personalidade “A”.

i) Apenas não poderia ser invocado qualquer dano pela personalidade “A” pela utilização ilícita da sua imagem, se tal livro e tal quadro não saíssem nunca da casa do seu autor.

j) O mesmo já não se pode afirmar se tal livro e/ou tal quadro fossem promovidos, divulgados e comercializados por todo o mundo, inclusive, no local de residência daquela personalidade “A”, nomeadamente, em estabelecimentos de toda a espécie.

k) É assim, manifesto que os danos ocorreriam em todos os locais onde essa comercialização e divulgação tivesse lugar.

l) Esta lógica é, pois, plenamente aplicável aos jogos da ré, pelo que estando os jogos disponíveis a nível mundial, o dano não é provocado só nos Estados Unidos.

m) Por isso, a tese sufragada no acórdão recorrido, apenas faria sentido, salvo o devido respeito, se os jogos, com a imagem do Autor, apenas fossem produzidos em solo norte-americano e não transpusessem as suas fronteiras, para ser comercializados pela ré por todo o mundo sob todas as formas disponíveis, ou seja, online e em suporte físico.

n) E, é evidente que o tribunal do lugar onde a “vítima” (in casu, o Autor) tem o centro dos seus interesses, pode apreciar melhor o impacto de um conteúdo ilícito colocado em jogos de vídeo físicos e online sobre os direitos de personalidade, pelo que lhe deverá ser atribuída competência segundo o princípio da boa administração da justiça.

o) Para além disso, não pode ser descurado o princípio da previsibilidade das regras de competência, sendo que a ré, enquanto autora da difusão do conteúdo danoso, encontra-se manifestamente, aquando da colocação da imagem, nome e demais características das “vítimas” da sua ação, nos jogos de que é proprietária com vista à sua divulgação mundial, em condições de conhecer os centros de interesses das pessoas afetadas por este.

p) O que releva, in casu, é o país onde ocorre o dano, independentemente do país onde tenha ocorrido o facto que deu origem ao dano e independentemente do país ou países onde ocorram as consequências indiretas do facto desencadeador da obrigação de indemnização.

q) E Tribunal de Justiça já elaborou orientações para a interpretação do artigo 7.º, n.º 2, do Regulamento no que diz respeito ao «lugar da materialização do dano», sendo que quanto a determinados domínios específicos (por exemplo, a responsabilidade por violação de direitos de personalidade na Internet) admitiu o critério do centro de interesses principais do lesado.

r) Neste sentido, e no que respeita a situações análogas já analisadas pelo TJUE quanto a esta matéria salientam-se os acórdãos Shevill e eDate Advertising GmbH, cujos textos, para efeitos de argumentação, aqui se dão por reproduzidos e ainda a doutrina já fixada no douto acórdão desse Supremo Tribunal de Justiça de 25-10-2005.

s) É este o contexto que nos encontramos, mas que o Tribunal a quo desconsidera totalmente, desvalorizando, de igual modo a proteção que a pessoa humana e a sua imagem merecem no ciberespaço.

t) O Julgador não pode deixar de estar atento à evolução tecnológica e à expansão dos fenómenos dela resultantes, de forma a evitar decisões totalmente desfasadas da realidade em que vivemos atualmente.

u) O facto constitutivo essencial desta causa reporta-se à produção e divulgação dos jogos utilizando a imagem e o nome do Autor, sem sua autorização, mas – ao contrário do referido no acórdão recorrido - a sua divulgação e exploração comercial não se localiza, exclusivamente, em solo norte-americano.

v) Conforme demonstrado, essa divulgação ocorre em todo o mundo e, também, em Portugal, pelo que há, obviamente, uma repercussão do facto danoso, também, em todo o território nacional.

w) O centro de interesses do Autor é em Portugal, pelo que estão os Tribunais portugueses melhor posicionados para conhecer do mérito da ação.

x) E, estando em causa a violação, pela ré, de direitos de personalidade do Autor, com tratamento e proteção constitucional e infraconstitucional, cfr. artigo 26.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e artigos 70.º e 72.º do Código Civil e sendo arguida pelo Autor, aqui Recorrente, a inconstitucionalidade do artigo 38.º n.º 4 do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre o Sindicato de Jogadores Profissionais de Futebol e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional, por se considerar que o mesmo é ofensivo do conteúdo de um direito fundamental (o já invocado artigo 26.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa) não se concebe como o poderia o julgamento da causa nestes autos ser atribuído a uma jurisdição estrangeira de um outro país.

y) Mais se diga ainda que, eventuais, dificuldades de aplicação do critério da materialização do dano não podem por em causa a gravidade da lesão que possa vir a sofrer o titular de um direito de personalidade que constata que um conteúdo ilícito está disponível em qualquer ponto do globo, como sucede in casu.

z) Não podia, pois, o Tribunal a quo deixar de concluir, in casu, pela verificação dos fatores de conexão previstos no artigo 7.º, n.º 2 do Regulamento 1215/2012 e nas alíneas a), b) e c) do artigo 62.º do Código de Processo Civil.

aa) Teria, assim, de improceder a deduzida exceção de incompetência internacional do Tribunal a quo, aduzida pela ré, por verificação dos elementos de conexão referidos.

bb) A obrigação de reparação, in casu, decorre de um uso indevido de um direito pessoalíssimo, não sendo de exigir - ao menos na componente de dano não patrimonial – a prova da alegação da existência de prejuízo ou dano, porquanto o dano é a própria utilização não autorizada e indevida da imagem.

cc) Face ao que antecede, o acórdão em crise violou o disposto nos artigos 7.º, n.º 2 do Regulamento 1215/2012, nas alíneas a), b) e c) do artigo 62.º e no artigo 71.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil, o artigo 26.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e ainda os artigos 70.º, 72.º e 79.º do Código Civil.

dd) O Recorrente, requer a junção e consideração do douto Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 24 de Maio de 2022, no âmbito do Processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1, ao abrigo do artigo 651.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, pela relevância que, enquanto Decisão de Tribunal Português, assume na questão decidenda deste recurso.

Deve o presente recurso ser julgado procedente e revogado o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, substituindo-se o mesmo por outro que declare a competência internacional dos Tribunais Portugueses.

3.1. A R. apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: (transcritas)

a) O presente recurso de revista, interposto pelo autor, visa a revogação do acórdão de 12.05.2022, pelo qual se declarou procedente a exceção de incompetência internacional, porque esta ação não reúne os necessários elementos de conexão com a ordem jurídica Portuguesa.

b) O recurso interposto pelo autor deverá ser rejeitado, improcedendo o único fundamento invocado: erro na aplicação da lei, por alegada violação das regras de competência internacional.

c) In casu, a exceção de incompetência internacional submetida à apreciação deve ser dirimida, exclusivamente, à luz do regime interno, por inexistir qualquer instrumento internacional de regulação do foro aplicável, incluindo de fonte europeia.

d) A ré tem sede nos Estados Unidos da América (e não num Estado-Membro da União Europeia), não lhe podendo ser aplicados os normativos europeus.

e) De igual modo, são inaplicáveis aos presentes autos as considerações e princípios desenvolvidos pela jurisprudência europeia, destinados a interpretar os conceitos dos regulamentos europeus em matéria de competência dos tribunais: “A Jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia tem considerado que os conceitos expressos nos Regulamentos têm carácter autónomo, ou seja, têm um significado e uma leitura no contexto do Direito da União Europeia e não como suporte densificador do Direito Nacional de cada um dos seus Estados-Membros.” - - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.12.2020, Proc. 1608/19.6T8GMR.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt.

f) Por outro lado, a aplicação analógica de jurisprudência europeia redundaria na efetiva aplicação de direito europeu, em contravenção das disposições nacionais e europeias.

g) Acresce que não se identifica qualquer lacuna na regulamentação nacional que careça de “aplicação analógica” de jurisprudência europeia.

h) São inaplicáveis os conceitos relativos ao domicílio e centro de interesses do autor e, bem assim, quaisquer presunções judiciais ou factos que não estejam referidos na petição inicial, sob pena de interpretação inconstitucional dos art.º 351.º, do CC, art.º 5.º, n.º 1, 608.º, n.º 2 do CPC, 674.º, n.º 1 e 3 do CPC e 38.º, n.º 1 da LOSJ, por violação nos termos detalhados nas alegações de recurso – aqui dados por reproduzidos e para os quais se remete –, entre outros, dos seguintes princípios:

– princípio do Estado de Direito (na vertente do princípio da proteção da confiança ou da tutela da confiança, princípio de separação dos poderes, princípio da soberania (artigo 2.º da CRP);

– princípio da tutela jurisdicional efetiva, na vertente do princípio do processo equitativo e da igualdade das partes (art.º 20.º, n.º 4 da CRP); e

– princípio do dever de obediência dos tribunais à lei (art.º 203.º da CRP e art.º 22.º da LOSJ) e princípio da igualdade (art.º 13.º, n.º 1 da CRP).

i. Esta questão relativa à inconstitucionalidade da aplicação dos artigos 351.º, do CC, art.º 5.º, n.º 1, 608.º, n.º 2 do CPC, 674.º, n.º 1 e 3 do CPC e 38.º, n.º 1 da LOSJ é suscitada para conhecimento expresso deste Tribunal, nos termos e para os efeitos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), 72.º, n.º 2 e 75.º-A, n.º 2, todas da Lei n.º 28/82.

j) Verificada a não aplicação do regulamento comunitário ou dos conceitos desenvolvidos pela jurisprudência do TJUE, para a apreciação os fatores de conexão consagrados nas alíneas do art.º 62.º do CPC, temos a seguinte factualidade relevante:

Quanto ao autor:

i. O autor refere ser jogador de futebol (artigo n.º 3 da petição inicial);

Quanto à ré:

(ii) A ré é uma sociedade norte-americana, com sede no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos da América;

(iii) A ré dedica-se à exploração, distribuição e venda de jogos, sendo que o autor não alega que a ré o faz em Portugal (artigo 1.º e 2.º da petição inicial);

(iv) O autor refere que “…a ré conta com várias subsidiárias, entre as quais se destaca, na Europa, a EA Swiss Sàrl…” (artigo 2.º da petição inicial), o que evidencia que a ré não atua em Portugal ou, sequer, na Europa;

Quanto ao facto ilícito imputado à ré:

(v) Em parte alguma da petição inicial, o autor afirma que a ré vende, em Portugal, os jogos FIFA e FIFA MANAGER, chegando mesmo a reconhecer, quanto a versões antigas dos jogos que os mesmos são comercializados por terceiros (artigos n.º 27.º e 38.º da petição inicial).

(vi) Nenhum dano é alegado ou concretizado, pelo autor, na petição inicial, como ocorrendo em Portugal.

k) Contra este quadro factual e com vista ao preenchimento do fator de conexão previsto na alínea a) do art.º 62.º do CPC – critério da coincidência –, o autor sustenta que o facto ilícito ocorre também em Portugal, porque os jogos FIFA são vendidos em Portugal por terceiros que não a ré.

l) Sucede que o facto ilícito imputado à ré não consiste na venda de jogos em Portugal, mas sim na produção dos mesmos que, reconhecidamente, ocorre no estrangeiro.

m) É o próprio autor quem declara, no já identificado art.º 2.º da petição inicial, que a ré não tem atividade em Portugal e, quanto à comercialização dos jogos, a ré apenas se dedica aos mercados dos EUA, Canadá e Japão.

n) O que significa que a ré não pratica qualquer ato lícito ou ilícito em Portugal e, nessa medida, mesmo em abstrato, o lugar do alegado facto ilícito não ocorre em Portugal.

o) Quanto ao fator de conexão previsto na alínea b) do art.º 62.º do CPC – critério da causalidade –, impunha-se ao autor identificar factos integradores da causa de pedir ocorridos nosso país.

p) No entanto, nem os factos alegados na petição inicial, nem os documentos juntos são, em tese, aptos a tal.

q) Quanto ao facto ilícito atribuível à ré, o mesmo ocorre – centrados na tese do autor – nos Estados Unidos da América, não bastando, neste contexto, sustentar que foram alegados factos praticados em território nacional com base na afirmação que os jogos FIFA são vendidos em todo o mundo, incluindo Portugal, porque tais vendas são imputadas a terceiros e não à ré.

r) De igual modo, não foi concretizado qualquer dano sofrido pelo autor, tampouco em território nacional.

s) Na tese do autor, vertida na petição inicial, se o dano equivale ao facto ilícito, então o dano ocorreu no local da produção dos jogos.

t) O autor, órfão de factos para sustentar a conexão com Portugal, procura compensar esse vazio, retratando, como um único facto, realidades autónomas e com diferentes esferas de imputação, a saber:

(i) alegação de vendas, por terceiros, em Portugal; e

(ii) alegação de atos praticados pela ré no estrangeiro.

u) Partindo dessa conjugação artificial, num único facto, o autor imputa à ré a produção de danos, de forma conclusiva e sem os localizar territorialmente.

v) Sucede que tais factos têm de ser apreciados como realidades individuais e não forjando-se uma síntese entre ambos. Ou seja, tais factos não se podem confundir porque (i) os atos praticados pela ré ocorrem no estrangeiro e (ii) os atos de comercialização em Portugal não são atribuídos à ré.

w) Nenhum destes factos permitindo associar a atuação da ré a Portugal.

x) Trata-se de factos ou conclusões sem conexão com o território nacional e muito menos em termos relevantes, para permitir que os nossos tribunais avoquem a competência internacional para este pleito.

y) A comercialização plurilocalizada dos jogos e, na Europa, por entidades que não a ré, não pode ser tida como um fator distintivo no contexto da causa de pedir e que atribua relevância suficiente para a afirmação da competência dos nossos tribunais.

z) Acresce que para que se estabeleça a competência internacional dos tribunais portugueses é necessário que os factos materiais localizados em Portugal apresentem uma conexão relevante com o ordenamento nacional.

aa) O que manifestamente não se verifica neste pleito, já que a comercialização dos jogos FIFA, a nível mundial, revela ligação identicamente ténue com todos esses territórios e, nessa medida, não assume particular conexão que justifique a atribuição de competência internacional a Portugal.

bb) Na verdade, a consideração da venda, por terceiros, como fator de conexão geraria uma situação de conflito positivo de competência internacional, já que qualquer tribunal do mundo, considerar-se-ia competente para esta lide, hipótese que as normas de competência internacional visam evitar.

cc) A alegação do autor, posterior à petição inicial, acerca da ocorrência de danos globalmente e, por isso, também no seu domicílio, apelando aos conceitos de centro de interesses, boa administração da justiça e previsibilidade das normas de competência, não permite colmatar a falta de invocação de quaisquer danos em Portugal, por vários motivos:

i. antes de mais, trata-se de conceitos incorretamente importados da jurisprudência europeia densificadora das normas europeias e que, como se viu, não têm aplicabilidade no caso dos autos;

ii. a tese do autor que faz equivaler o dano ao facto ilícito levará à conclusão de que o dano ocorreu no local da produção dos jogos, no estrangeiro e não no local do seu centro de interesses;

iii. os conceitos desenvolvidos pela jurisprudência europeia para efeitos da aferição do tribunal competente para a lide são claros em afirmar a irrelevância do dano subsequente ocorrido no domicílio do autor;

iv. os conceitos de centro de interesses, boa administração da justiça e previsibilidade das normas de competência não encontram um mínimo de correspondência com a letra ou com o espírito dos critérios de conexão estabelecidos no art.º 62.º do CPC;

v. apenas a factualidade constante da petição inicial é relevante para a averiguação da competência;

vi. não são alegados danos concretos, tampouco verificados em Portugal; e

(vii) a alegação de que o dano ocorre em todo o mundo e também na residência do autor não traduz, como vimos, uma conexão suficiente ou relevante com a jurisdição portuguesa.

dd) Quanto à alínea c) do art.º 62.º do CPC – critério da necessidade – o autor não invocou quaisquer razões objetivas que evidenciem uma dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro.

ee) Pelo contrário, sabendo-se que a matéria dos direitos de imagem é amplamente reconhecida nas várias jurisdições, o autor informou os autos ter conhecimento de casos em que direitos dessa natureza foram exercidos, na jurisdição da sua sede.

ff) A circunstância de se tratar de direitos com assento constitucional também não releva para efeitos da determinação do tribunal internacionalmente competente, inexistindo qualquer norma que ressalve a competência dos tribunais portugueses quando em causa estejam direitos protegidos pela Constituição.

gg) O conceito de centro de interesses ou o princípio da boa administração da justiça, que o autor pretende sustentar para interpretar o critério da necessidade, não são aptos a abrigar o conceito de “necessidade” de tutela por razões de conveniências logísticas relacionadas com a proximidade da vida familiar do autor.

hh) Daí que se conclua que não se verifica nenhum dos fatores de conexão previstos nas alíneas a), b) e c) do art.º 62.º do CPC, já que inexiste alegação factual sobre a prática de ilícito em Portugal, sobre a causa de pedir ou qualquer facto que a integre, praticado em Portugal ou sobre a necessidade de demandar a ré em território nacional.

ii) Em suma, o recurso de revista interposto deve improceder in totum, nos termos já apontados pelo Tribunal a quibus, na medida em que os factos alegados pelo autor não revelam a verificação de quaisquer fatores de conexão relevantes que atribuam competência internacional à ordem jurídica Portuguesa.

jj) Devem por isso improceder todas as conclusões do recurso do autor.

4. Cumpre apreciar e decidir.

*

II – Enquadramento facto-jurídico

1. Como se sabe, o objeto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente, importando em conformidade decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, com exceção daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, artigos 635.º, 608.º, 663.º e 679.º, do CPC1 , não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo que, quanto ao enquadramento legal, não está sujeito às razões jurídicas invocadas pelas mesmas, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, artigo 5.º, n.º 3.

Por sua vez o recurso de revista é o recurso ordinário que cabe dos acórdãos do Tribunal da Relação, tendo assim como fundamento, art.º 674, n.º1, a violação da lei substantiva – nas modalidades de erro de interpretação, de aplicação, ou da determinação da norma aplicável -, ou a violação da lei processual, incluindo aquela de que possa resultar alguma nulidade de decisão prevista no art.º 615, ex vi art.º 666, pelo que a competência deste Tribunal, Supremo Tribunal de Justiça (STJ) está assim confinada à matéria de direito, enquanto tribunal de revista, que aplica definitivamente o regime jurídico tido pelo o adequado ao factualismo que ao mesmo seja trazido, como alude o n.º1, do art.º 682.

Retenha-se que não se questiona a admissibilidade da revista, por preenchido o disposto na alínea a) do n.º 2, do art.º 629, questionadas que se mostram as regras de competência internacional.

1. O objeto do presente recurso, tal como surge configurado, prende-se em aferir da competência internacional dos tribunais portugueses para apreciar e decidir a presente ação declarativa instaurada com base no instituto da responsabilidade civil extracontratual ou por factos ilícitos.

2. As instâncias convergiram, no sentido de julgar verificada a incompetência internacional dos Tribunais Portugueses.

1. Em sede de sentença, foi entendido que o A. estruturava a ação como uma típica ação de responsabilidade civil por facto ilícito, o facto gerador de responsabilidade civil não ocorrera em Portugal, inexistindo qualquer elemento da causa de pedir conexa com o território português, podendo o direito tornar-se efetivo por meio de ação proposta fora de território português, bem como não se verificava qualquer impossibilidade ou dificuldade apreciável no que concerne à propositura da ação no estrangeiro.

2. No âmbito do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, ora em crise, afastada a aplicação de qualquer instrumento internacional, convenção ou regulamento (EU), nomeadamente o regime definido pelo Regulamento (UE) n.º 1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, (que revogou o Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 22/12/2000), e assim arredada a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, referenciada pelo A., a competência internacional dos tribunais portugueses teria que ser determinada em função dos elementos de conexão previstos nas alíneas a), b), ou c) do artigo 62.º.

Considerando cada um dos fatores de atribuição da competência internacional, decorrentes desta última disposição legal, não subsistindo dúvidas que a ação se destinava a efetivar a responsabilidade civil da R. por factos ilícitos, estes últimos, utilização sem autorização da imagem, do nome e das suas características pessoais e profissionais, do A., ocorrendo no estrangeiro com a produção dos jogos, mostravam-se afastadas as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa para os tribunais portugueses, não constituindo também fator de conexão relevante a invocada residência do A. em Portugal.

Por sua vez, quanto à alínea b) do artigo 62, a alegada violação do direito ao nome e imagem do A., enquanto dano como causa adequada do facto ilícito imputado à R, isto é, a produção dos aludidos jogos e aplicativos com a utilização não consentida pelo mesmo do nome e imagem daquele, não se concretizara, nem localizara, por qualquer forma, em território nacional Português.

Quanto ao critério previsto na alínea c) do artigo 62, não resultava da petição inicial qualquer indício de que o direito invocado pelo A., a saber, o direito a ser indemnizado por invocada violação de um direito de personalidade, não pudesse ser exercido através de ação proposta em território norte-americano, onde a R. desenvolvia a sua atividade e se teriam produzido conteúdos utilizando indevidamente a imagem e nome do A.

3. O A., no presente recurso, visando contrariar o decidido, invoca que o uso indevido sua da imagem nos jogos da R. com o conteúdo lesivo, são difundidos pela mesma para serem utilizados e guardados em vários instrumentos tecnológicos, de diversas pessoas, a qualquer momento, em qualquer lugar, ocorrendo os danos em todos os locais onde essa comercialização e divulgação se realize.

Assim o tribunal do lugar onde o lesado, o A., tem o centro dos seus interesses, pode apreciar melhor o impacto de um conteúdo ilícito colocado em jogos de vídeo físicos e online sobre os direitos de personalidade, pelo que lhe deverá ser atribuída competência, segundo o princípio da boa administração da justiça, relevando assim o país onde ocorre o dano, independentemente do país onde tenha ocorrido o facto que deu origem ao dano.

Desse modo, ocorrendo a divulgação em todo o mundo e, também, em Portugal, existe uma repercussão do facto danoso, no território nacional, onde está o centro de interesses do A, estando os Tribunais portugueses melhor posicionados para conhecer do mérito da ação, até porque na obrigação de reparação, decorrendo de um uso indevido de um direito pessoal, não será de exigir, ainda que seja só na componente de dano não patrimonial, a prova da alegação da existência de prejuízo ou dano.

Não podia, pois, o Tribunal a quo deixar de concluir, pela verificação dos fatores de conexão previstos no artigo 7.º, n.º 2 do Regulamento 1215/2012 e nas alíneas a), b) e c) do artigo 62.º.

4. Contrapõe a R., ora recorrida, que a incompetência internacional deve ser dirimida, exclusivamente, à luz do regime interno, por inexistir qualquer instrumento internacional de regulação do foro aplicável, incluindo de fonte europeia, sendo inaplicáveis aos presentes autos as considerações e princípios desenvolvidos pela jurisprudência europeia, destinados a interpretar os conceitos dos regulamentos europeus em matéria de competência dos tribunais, pelo que a aplicação analógica da jurisprudência europeia traduzir-se-ia na aplicação de direito europeu, em contravenção das disposições nacionais e europeias.

São inaplicáveis os conceitos relativos ao domicílio e centro de interesses do autor e, bem assim, quaisquer presunções judiciais ou factos que não estejam referidos na petição inicial, sob pena de interpretação inconstitucional dos art.º 351.º, do CC, art.º 5.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, 674.º, n.º 1 e 3, e 38.º, n.º 1 da LOSJ, por violação dos princípios, do Estado de Direito, art.º 2.º da CRP; da tutela jurisdicional efetiva, na vertente do princípio do processo equitativo e da igualdade das partes, art.º 20.º, n.º 4 da CRP; e do dever de obediência dos tribunais à lei, art.º 203.º da CRP e art.º 22.º da LOSJ; da igualdade, art.º 13.º, n.º 1 da CRP, questão suscitada para conhecimento expresso deste Tribunal, nos termos e para os efeitos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), 72.º, n.º 2 e 75.º-A, n.º 2, todas da Lei n.º 28/82.

Mais invoca que a R. não praticou qualquer ato lícito ou ilícito em Portugal, impondo-se quanto ao fator de conexão previsto na alínea b) do art.º 62.º identificar factos integradores da causa de pedir ocorridos nosso país, não sendo os factos alegados na petição inicial, aptos a tal, pois não foi concretizado qualquer dano sofrido pelo A., tampouco em território nacional, acrescendo ser necessário que os factos materiais localizados em Portugal apresentem uma conexão relevante com o ordenamento nacional, o que não se verifica.

O A. não invocou quaisquer razões objetivas que evidenciem uma dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, não sendo conceito de centro de interesses ou o princípio da boa administração da justiça, aptos a abrigar o conceito de “necessidade” de tutela por razões de conveniências logísticas relacionadas com a proximidade da vida familiar do autor.

5. Após a prolação do despacho de admissão do recurso de revista pelo Desembargador, vieram as partes juntar decisões judiciais entretanto prolatadas2, que por não se destinarem a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa, antes se entendendo que visam contribuir para o esclarecimento e procura da melhor solução de direito, consideram-se sujeitas às regras dos “pareceres”, com a respetiva admissão nos autos, nos termos dos artigos 680, n.º2 e 651, n.º2.

De igual modo se entendem os considerandos formulados pelas partes, na apresentação das decisões, sendo que o pedido de pronúncia expressa da invocada inconstitucionalidade fora já formulado em sede de contra-alegações.

2. A questão ora colocada a este Tribunal, como as próprias partes dão notícia, tem vindo a ser apreciada e decidida, de forma consolidada, num mesmo sentido, isto é, a atribuição da competência internacional aos Tribunais Portugueses para conhecer de ações similares3, considerando verificado o fator atributivo dessa competência segundo o critério da causalidade estabelecido na alínea b) do artigo 62.°4 .

Ora, se sobre o Tribunal impende a obrigação de julgar, na devida obediência à lei, não podemos obliterar que nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito, art.º 8, n.º 3, do CC5, numa tutela dos vetores da certeza e da segurança jurídica na aplicação da lei e na resolução dos conflitos, mas sem questionar o primado da lei sobre a jurisprudência6, importa reter o decidido, com o qual se concorda, adianta-se, face à ponderação das razões trazidas aos autos, que não determinam, contudo, entendimento divergente, percorrendo-se assim o caminho já delineado.

3. Tem-se como bom o entendimento, que a competência do tribunal, como medida da sua jurisdição7, é fixada em função dos termos em que a ação é proposta, considerando o pedido do autor, isto é, o direito a que se arroga e que quer ver reconhecido ou declarado judicialmente.

Assim, da estruturação da causa, tal como é estabelecida pelo autor ou requerente, nomeadamente do pedido formulado, e dos factos donde derivam o direito para o qual se pretende a tutela, resulta não só o tema a decidir, mas também a definição do âmbito da competência, não estando esta dependente de outros pressupostos processuais, dos termos da contestação ou oposição deduzida, e maxime da procedência da pretensão.

Com efeito, importa reter que os pressupostos processuais constituem as condições, tidas por necessárias, para que possa ser formulado um juízo decisório sobre a pretensão formulada pela parte, variando a sua fundamentação em função do processualmente exigível, e desde logo no que concerne à competência do Tribunal, destina-se a garantir o adequado exercício da função jurisdicional8.

Não surge também como questionável a possibilidade de o tribunal de um Estado exercer funções jurisdicionais que ultrapassem as respetivas fronteiras, sendo assim transnacionais, nem que as normas que atribuem tal competência internacional sejam de natureza interna, mas também de fonte supraestadual.

Assim, no que concerne à competência internacional direta9, enquanto à atribuída aos tribunais de um Estado, a mesma pode configurar-se como exclusiva, na medida em que a nenhum tribunal de outra ordem jurídica é atribuída para o conhecimento da causa, mas também concorrente, se a ordem jurídica do foro aceitar a apreciação por outra ordem jurídica10

3.1. Concretizando, o artigo 37.º n.º 2 da Lei 62/2013, de 26 de agosto (Lei de Organização do Sistema Judiciário) remete para a lei do processo a definição dos critérios de atribuição de competência internacional dos Tribunais portugueses, isto é, o esclarecimento das circunstâncias em que o Estado Português assume ser da sua competência, no eventual confronto com outras jurisdições nacionais, regular jurisdicionalmente os conflitos e definir o direito aplicável ao caso concreto, quando tal lhe seja requerido11.

Assim, determina o art. 59.º, que sem prejuízo o que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e outros instrumentos internacionais, a competência internacional dos tribunais portugueses deve resultar da existência de algum dos elementos de conexão previstos, para o que nos agora interessa, no art. 62.º, para além da que as partes hajam atribuído nos pactos atributivos de jurisdição, na medida da respetiva admissibilidade, art. 94.º.

3.1.1.Estabelecida uma hierarquia entre as fontes da atribuição da competência internacional dos tribunais portugueses, prevalece o que se acha estabelecido em tratados, convenções e regulamentos comunitários, sobre as normas internas da regulação da competência em termos internacionais, vigorando na ordem interna enquanto vincular o Estado Português, na consideração dos ditames constitucionais, art.º 8 da CRP.

Neste âmbito, retém-se o Regulamento Bruxelas I bis, Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 201212, aplicando-se, em termos objetivos à matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição, enquanto no âmbito subjetivo, estabelece como critério geral de competência, mas também de condição para aplicar as regras de competência direta previstas no próprio Regulamento13, o do domicílio do Réu, o art. 4º do Regulamento, e dessa forma, por regra, as pessoas domiciliadas num Estado-Membro devem ser demandadas nos tribunais desse Estado-Membro, independentemente da sua nacionalidade.

Desse modo, quanto à matéria contratual e extracontratual, previstas na competências especiais, do art. 7.º, do Regulamento, o critério do domicílio do autor não é afastado, mas sim fornecidos critérios alternativos, que o não substituindo, permitem ao autor fazer uma opção pelo foro nos parâmetros indicados, sem prejuízos das exceções aqui não relevantes.

No entanto, nos termos do art. 6.º do Regulamento, se o requerido não tiver domicílio num dos Estados-Membros, para além dos casos expressamente aludidos que não se verificam nos autos, a competência de cada Estado-Membro é regida pela lei desse Estado-Membro, o que se configura nos autos, pois é indicado pelo autor que a sede da R. se situa nos Estados Unidos da América.

3.1.2. Afastando-se a aplicação ao caso sob análise das regras constantes do Regulamento indicado, como tem vindo a ser o entendimento uniforme deste Tribunal, ainda assim tem o mesmo trazido à colação a Jurisprudência desenvolvida pelo Tribunal da Justiça da União Europeia, TJUE, no concerne à responsabilidade civil por violação de direitos de personalidade, caso do direito ao nome e à imagem, através de uma exposição universal, no âmbito dos normativos aplicáveis em termos europeus, como o aludido regulamento 1215/2012.

Porque tal chamamento não se traduz, necessariamente na sua aplicação, servem contudo de quadro de referência, como se entendeu neste Tribunal“(…) no sentido de proporcionar uma interpretação e aplicação de direito interno de forma sistematicamente coerente, evitando que as mesmas normas nacionais sejam entendidas de modo diverso consoante aplicadas no âmbito do Direito Europeu ou fora dele14(…), remetendo-se para a explanação15, que pela sua clareza se expõe aqui: “(…)Não só o conteúdo das normas internas sobre competência internacional não devem conduzir a soluções díspares com os princípios que regem o direito europeu nessa matéria, o que tem sido objeto de preocupação do legislador nacional, como a sua interpretação deve ter em consideração a leitura que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem efetuado das normas europeias que estabeleçam critérios idênticos às normas de direito interno. A harmonia do ordenamento jurídico pede que critérios idênticos na definição da competência internacional dos tribunais, apesar de provirem de fontes distintas, tenham uma aplicação coincidente, sendo certo que a jurisprudência do TJUE tem um papel fundamental na interpretação do direito europeu (…)”.

Aliás, surge-nos como relevante mencionar o já atrás aludido, no que concerne ao disposto no art.º 8, n.º3, do CC, na necessária abrangência que esta temática implica, no sentido da aludida e tendencial, aplicação uniforme do direito, em prol da certeza e seguranças jurídicas.

Assim sendo, não se configura como despicienda a indicação de uma nota quanto à evolução jurisprudencial dos acórdãos do TJUE em matéria de competência internacional relativa à responsabilidade civil extracontratual, por violação dos direitos de personalidade na vertente do direito ao nome, imagem e honra através de exposições a título global, como se mencionou, tendo em consideração as normas, aliás, já apontadas, por reporte ao amplamente descrito no último aresto referenciado (Acórdão do STJ de 24.06.2022, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1).

Deste modo, indica-se o Acórdão do TJUE, de 7.03.199516, quanto uma ação em que se pedia o pagamento de uma indemnização por difamação cometida através de um artigo publicado num jornal, à venda em vários países europeus, incluindo onde a vítima residia, “(…) começou por sustentar que a expressão “lugar onde ocorreu o facto danoso”, utilizada no artigo 5.º, n.º 3, da Convenção de Bruxelas de 27.09.1968, deveria ser interpretada no sentido de que a vítima pode intentar uma ação de indemnização contra o editor da publicação difamatória quer nos órgãos jurisdicionais do Estado onde se situa o estabelecimento da editora, quer nos órgãos jurisdicionais de cada Estado em que a publicação foi divulgada e onde a vítima alega ter sofrido um atentado à sua reputação, os quais seriam competentes para conhecer apenas dos danos causados no Estado do tribunal onde a ação foi proposta (…)”.

Posteriormente, (…) no Acórdão de 25.10.2011, e-Date Adverting. GmbH contra X e Martinez contra MGM Limited17 relativamente à propositura de ações de responsabilidade civil pela publicação em portais noticiosos na Internet de referências à condenação de X pelo homicídio de um conhecido ator e aos encontros amorosos de Kyllie e Martinez, já se entendeu (…) em caso de alegada violação dos direitos de personalidade através de conteúdos colocados em linha num sítio na Internet, a pessoa que se considerar lesada tem a faculdade de intentar uma ação fundada em responsabilidade extracontratual pela totalidade dos danos causados, quer nos órgãos jurisdicionais do Estado-Membro do lugar onde se situa o estabelecimento da pessoa que emitiu esses conteúdos, quer nos órgãos jurisdicionais do Estado-Membro onde se encontra o centro dos interesses do lesado”.

Mais tarde, no Acórdão de 17.10.2017 (…)18, relativamente à propositura de uma ação de responsabilidade civil pela publicação numa página da Internet de dados incorretos e comentários difamatórios sobre uma sociedade comercial estónia, entendeu-se que o artigo 7.º ponto 2, do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, deveria ser interpretado no sentido de que uma pessoa coletiva que alega que os seus direitos de personalidade foram violados pela publicação de dados incorretos a seu respeito na Internet e pela não supressão de comentários a ela relativos pode intentar uma ação destinada a obter a retificação desses dados, a supressão desses comentários e a reparação da totalidade do dano sofrido nos tribunais do Estado-Membro no qual se situa o seu centro de interesses. (...)

Finalmente, no recente Acórdão de 21-12-202119, Gtflix Tv contra DR, relativamente à propositura de uma ação de responsabilidade civil pela publicação em sítios e fóruns Internet de afirmações depreciativas da sociedade Gtflix Tv que se dedica à produção e difusão de conteúdos audiovisuais para adultos, voltou a ser reafirmada a jurisprudência dos acórdãos anteriormente mencionados.(…)”.

Do brevemente enunciado, pode-se retirar o entendimento sufragado por este Tribunal que: “ (…) As questões inerentes à especificidade do evento danoso resultante da violação dos direitos de personalidade através de meios de divulgação global têm encontrado resposta normativa no sentido de uma configuração desse tipo de dano e da determinação da sua localização ajustada aos novos meios tecnológicos através dos quais se propagam os efeitos lesivos potenciados pelos comportamentos ilícitos e veiculados em dimensões virtuais até se materializarem onde podem ser concretamente verificados e mais facilmente provados (…)20.

Daí que ressalta no concerne à Jurisprudência apontada, que nos termos definidos, não deverá ser considerada despicienda, uma indicada preferência pelo “centro de interesses do lesado” como o local onde se materializa o dano resultante da violação de direitos de personalidade, com divulgação global pelos meios tecnológicos atualmente disponíveis, e desse modo produzindo uma conexão, relevante para a atribuição de competência ao respetivo órgão jurisdicional, para dirimir o conflito21, no atendimento até do critério da causalidade constante da alínea b) do art.º 6222, o qual melhor à frente se verá, no reporte até aos elementos essenciais da causa de pedir nas ações de responsabilidade extracontratual, caso do dano, e respetiva localização, caso a mesma tenha ocorrido em Portugal.

3.2. Aqui chegados, e não desconsiderando os ensinamentos da Jurisprudência do TJUE, na medida que possam ser atendidos, na necessária hermenêutica a realizar, retém-se que não existe nenhum instrumento internacional que vincule o Estado Português em matéria de competência judiciária aplicável à presente ação, por remissão do artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento (EU) n.º 1215/2012, será à luz do disposto do aludido art. 62.º que deve ser determinado se assiste competência aos tribunais portugueses para a decidir.

3.2.1. O art.º 62 procede à indicação dos fatores legais de atribuição da competência aos tribunais portugueses, enunciando os três critérios atendíveis, o critério da coincidência, alínea a), da causalidade, alínea b) e o da necessidade, alínea c), sendo defendido23 que a aplicação do critério da causalidade só se justifica se não verificado o critério da coincidência, e o critério da necessidade apenas se aqueles dois não forem passíveis de aplicação, bem como os critérios da causalidade e o critério da necessidade apenas atribuem competência aos tribunais, em termos globais.

Sempre se dirá que a escolha dos critérios elencados visou corresponder à exigência de uma tutela efetiva dos direitos e interesses legalmente protegidos, conferindo competência aos tribunais portugueses quando, no entendimento24 até, pela sua proximidade com as partes e com as provas, se encontrem em condições de melhor dirimirem os litígios que necessitam de uma intervenção jurisdicional.

3.2.1.1. Quanto ao critério da coincidência, de acordo com o qual os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes para o julgamento da causa desde que, segundo as regras de atribuição da competência em razão do território, a ação pudesse ser proposta em tribunal português, alínea a) do art. 62.º, são convocados os critérios estabelecidos no que concerne à competência em razão do território, artigos 70.º e segs., reveladores da existência de uma estreita ligação entre o Estado português e a causa.

A regra geral em termos de competência territorial, mostra-se consignada no n.º1 do art. 80.º, no sentido que não se verificando um caso não previsto nos artigos anteriores ou em disposição especial, o tribunal competente para a ação é o do domicílio do réu.

Para o caso que nos interessa, não surgindo questionado que o A. visa efetivar a responsabilidade civil por facto ilícito, o tribunal competente para tanto seria, conforme o n.º 1, do art. 71.º, n.º 2, o correspondente aonde o facto ocorreu, afastada ficando a regra geral, constante do aludido art. 80.º.

Recorrendo a uma técnica legislativa designada de remissão intrasistemática25 no sentido de os tribunais portugueses serem competentes sempre que a ação pudesse ser proposta em Portugal, segundo as regras específicas da competência territorial, estabelecidas também na lei portuguesa, a justificação pela opção por um critério instrumental, assentaria no facto de ser o lugar onde o facto foi praticado que devem encontrar-se as melhores provas da ocorrência e dos danos por ele produzidos, pelo que a proximidade do tribunal com as provas dos factos que integrassem os diferentes elementos da causa de pedir de uma ação de responsabilidade extracontratual, seria determinante da escolha do forum delicti comissi26.

No entanto, a aplicação acrítica deste critério, para além de suscitar dificuldades relevantes, quando a conduta ilícita ocorresse em lugar diverso da produção dos danos, bem como quando a ação fosse plurilocalizada27, mesmo afastando da sua aplicação a regra do n.º 3, do art. 80.º28, enquanto foro necessário, sob pena de os tribunais portugueses serem competentes para todas as possíveis ações29, poderia importar numa competência exorbitante, pelo que deveria exigir-se, que os elementos da causa de pedir se traduzissem numa conexão suficientemente forte entre o caso e o Estado Português, caso de um significativo acervo das provas a produzir, presumivelmente, se situasse em Portugal30.

3.2.1.2. O critério da causalidade, constante da alínea b) do art. 62.º, diz-nos que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes desde que tenha sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação ou algum dos factos que a integram, resultando de forma clara da parte final desta norma, a plena aplicação aos casos em que haja uma causa de pedir complexa, constituída por uma pluralidade de atos ou factos jurídicos relevantes com ligação a mais do que um ordenamento jurídico ou jurisdição nacional.

Sublinhando-se que não se visa a direta e imediata aplicação da jurisprudência do TJUE, mas sim como elemento essencial à atual e plena compreensão dos fatores de conexão estabelecidos no art. 62.º, no caso a alínea b), repetindo que o direito comunitário faz parte do direito interno, a interpretação sistemática e atualista da norma em causa também deve ser realizada, em termos de sistema, com recurso a direito comunitário, bem como a da orientação jurisprudencial do TJUE, e assim na observância da respetiva conformidade31, indo aliás, ao encontro das regras interpretativas do art. 9.º do CC.

Assim, e já como se aludiu na breve nota Jurisprudencial do TJUE, vem-se consolidando um critério de interpretação segundo o qual o impacto da violação dos direitos de personalidade através de meios de exposição globais que lhe conferem conexão com mais do que um ordenamento jurídico e jurisdição nacional, verifica-se predominantemente no Estado onde o autor alega ter sofrido o atentado à sua reputação a sede da sua vida pessoal organizada, com atribuição da competência ao tribunal desse país para conhecer a totalidade dos prejuízos sofridos.

3.2.1.3. O critério da necessidade, alínea c) do art. 62.º, configura-se na verdade, como um critério de salvaguarda, de natureza excecional, destina-se a permitir o efetivo exercício do direito invocado, nos casos em que a impossibilidade de exercício do direito de ação seja decorrência de um conflito negativo de jurisdição ou quando a instauração da ação no tribunal estrangeiro redunde em clara denegação de justiça.

No entanto para que tal critério possa ser atendido como um fator de atribuição de competência internacional aos tribunais portugueses é necessário que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um ponderoso elemento de conexão, seja de ordem pessoal, caso da nacionalidade ou residência das partes, ou de natureza real, no caso de se situar em território nacional o bem que é objeto imediato ou mediato da ação32.

4. Reportando aos autos, revertendo os considerandos para a situação sob análise, como já enunciado, em sede de aferição dos pressuposto para a atribuição da competência, não há lugar a qualquer apreciação sobre o mérito da causa nem tão pouco sobre a (in)suficiência do que tenha sido alegado pelo A., importa sim atentar aos contornos factuais e jurídicos da pretensão deduzida na estrita medida do necessário para aferir da existência do fator legal de atribuição de competência dos tribunais portugueses para o conhecimento da causa.

1. O Autor veio alegar na petição inicial:

A Ré Electronic Arts Inc., através do desenvolvimento e fornecimento de jogos, conteúdos e serviços online para consolas com ligação à Internet, dispositivos móveis e computadores pessoais, é uma empresa líder global em entretenimento digital interativo. (art.º 1).

Por sua vez, pelo mundo, a Ré conta com várias subsidiárias, entre as quais se destaca, na Europa, a EA Swiss Sàrl, pessoa coletiva registrada no Registo de Pessoas Coletivas de Genebra com o número C............... e sede em 8 ..., 1204 ..., ..., a qual é uma empresa que opera como subsidiária (subdivisão) daquela, e que assume a responsabilidade pela venda dos produtos perante todos os consumidores não residentes nos Estados Unidos da América, Canadá e Japão (art. 2.º)

O Autor é um jogador de futebol Português, nascido a ... de ... de 1982 em ..., Portugal (art. 3.º)

Atualmente representa C. .... .. ....... em Portugal (art 4.º).

O Autor mantém já uma longa carreira como jogador de futebol profissional, sobejamente conhecido no meio do futebol, tendo exercido a sua profissão, maioritariamente, em clubes portugueses, dedicando-se inteiramente à prática desportiva do futebol, com a qual sempre se sustentou a si e à sua família (art. 5.º).

Na qualidade de jogador profissional de futebol, como é normal, o Autor conta com a exposição pública da sua imagem, tanto nos espetáculos desportivos, como fora deles, em participações televisivas, de radiodifusão, meios virtuais etc. (art. 6.º).

(…) o Autor atuou, em mais de 400 partidas oficiais como profissional e sempre se destacou na posição de ..., como é conhecido internacionalmente, tendo atuado no S....... ..... .. ..... (Portugal), F. ..... .. ........ (Portugal), V...... ....... ..... (Portugal), G.. ....... ....... ..... (..., Portugal), A........ .. ....... (Portugal), A.. ...... (...) entre outros, (…) demonstrando a notoriedade do Autor (…) (art. 7.º).

O Autor atuou pela Seleção Nacional AA de Futebol tendo representado Portugal por 6 (seis) vezes, inclusivamente participado na qualificação para o Campeonato Mundial de Futebol, alcançando, também dessa forma, bastante notoriedade internacional (art. 8.º).

(…) o Autor esteve vinculado em aos seguintes clubes e nas seguintes épocas:

2019/20 - C. .... .......; 2018/19 – ...; 2017/18 - ...; 2016/17 - ...: 2015/16 - ... – ...; 2014/15 - K...... ........... – ...; 2013/14 - K...... ........... – ..., S. .....; 2012/13 - A........ ...; 2011/12 - A........ ...; 2010/11 – M......., M... – ...; 2009/10 - P... – ..., M..... – ...; 2008/09 - A.. – ...; 2007/08 - A.. – ..., - ...; 2006/07 - G.. .......; 2005/06 - P.... .. ........; 2004/05 - S. ..... - …[B]; 2003/04 - S. ..... -- S. .......]; 2002/03 – B..........; 2001/02 – ... (art. 9.º).

Na sua extensa carreira, o Autor destaca a conquista da Taça de Portugal, ao serviço da A........ .. ......., da Taça da Liga ao serviço do V...... ....... ..... e as participações na UEFA Europa League, ao serviço da A........ .. ....... e do S....... ..... .. .....; para além do facto de ter representado Portugal ao serviço da principal Seleção Nacional (art. 10.º)

O Autor teve conhecimento que a sua imagem, o seu nome e as suas características pessoais e profissionais foram e continuam a ser utilizados nos jogos denominados FIFA (também com as designações FIFA Football ou FIFA Soccer), nas edições 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2017, 2018 e 2019; FIFA MANAGER, nas edições 2008, 2009, 2010, 2011, 2013 e 2014, FIFA ULTIMATE TEAM – FUT nas edições 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2017, 2018 e 2019 e FIFA MOBILE na edição de 2018; todos propriedade da Ré (art. 11.º)

O Autor jamais concedeu autorização expressa, ou sequer autorização tácita, a quem quer que fosse, para ser incluído nos supra identificados jogos eletrónicos, jogos de vídeo e aplicativos, i.e., FIFA, FIFA MANAGER, FIFA ULTIMATE TEAM – FUT e FIFA MOBILE (art. 12.º)

(…) tão pouco conferiu poderes aos Clubes, para que estes negociassem a licença para o uso da sua imagem e do seu nome, especificamente para jogos eletrónicos jogos de vídeo, aplicativos, ou quaisquer outros jogos online ou offline, em qualquer tipo de plataforma (art. 13.º).

A R. é uma empresa mundialmente reconhecida pela produção e desenvolvimento de jogos para computadores, jogos de vídeo e aplicações diversas (…) (art. 14.º)

(…) resultados financeiros da R, decorrentes das atividades exploradas, entre elas, através dos jogos de vídeo identificados na petição inicial e que se tornaram mundialmente conhecidos, de modo que a repercussão da imagem do Autor não se insere apenas no âmbito nacional, mas é utilizada pela Ré, a nível global (art.º 16.º).

O Autor viu a sua imagem ser retratada e o seu nome divulgado, sem o seu consentimento, em milhões de jogos de vídeo (por exemplo o jogo FIFA 18 vendeu 24 milhões de unidades em todo o mundo, (art. 19.º)

A Ré é uma poderosa multinacional (…) que vem a utilizar a imagem e do nome do Autor, para divulgar e disseminar a venda dos jogos FIFA, FIFA MANAGER, FIFA ULTIMATE TEAM – FUT e FIFA MOBILE, sem a devida autorização. (art. 20.º)

(…) os jogos eletrónicos FIFA, FIFA MANAGER e FIFA ULTIMATE TEAM – FUT são lançados anualmente, pelo que novas versões são lançadas no mercado todos os anos, permitindo atualizações semanais via internet, fazendo com que o público consumidor de tais produtos seja levado a adquirir as novas versões dos jogos, motivo pelo qual o dano sofrido pelo Autor é renovado a cada ano, paralelamente ao facto de que a Ré, com as novas versões, aufere rendimentos, com um consequente crescimento da sua faturação (art. 23.º)

Ora, no caso dos autos, a Ré está a utilizar indevidamente a imagem e o nome do Autor, pelo menos, desde Setembro 2007 (data de lançamento do jogo de vídeo FIFA 2008) (art. 25.º)

E, tais jogos, mesmo de anos anteriores, continuam a ser difundidos e vendidos, em Portugal e em todo o mundo, sendo que as versões mais antigas dos jogos FIFA e FIFA MANAGER continuavam a ser vendidas em 2019, por exemplo, (…) e, portanto, continuam no mercado (art. 26.º)

(…) a Ré procede ao relançamento de versões mais antigas dos jogos, (art. 28.º)

(…) Aliás, mais se diga que a própria Ré organiza e patrocina um desses torneios internacionais, designado por “FIFA Global Series”, onde participam aficionados de jogos online, provenientes de todo o mundo, (art. 32.º).

(…) A Ré, com nítido intento comercial, divulgou a imagem e o nome do Autor, sem autorização e auferiu e continua a auferir avultados rendimentos com isso (art. 107.º).

É possível comprar, diretamente do website da Ré (…) os jogos para PC, modalidade que dispensa a compra do CD, suporte físico (…) (art. 159.º)

(…) sentiu-se, naturalmente, perturbado, desgostoso, triste e revoltado, ao ver a sua imagem e nome utilizados de forma abusiva e ilícita pela Ré (art. 191.º).

2. Resulta do factualismo enunciado e constante da petição inicial, com a articulação que o A. faz do direito que considera aplicável, que o mesmo pretende efetivar a responsabilidade da R. por facto ilícito, por violação dos direitos à sua imagem e nome, resultante da utilização da imagem e do nome do A, enquanto jogador, a nível nacional e mundial, através de jogos de vídeo propriedade da Ré, produzindo-os e desenvolvendo-os, sendo os mesmos vendidos em Portugal e em todo o mundo, e cujos conteúdos serão utilizados em plataformas informáticas, quer por via de atualizações, quer por organização e patrocínio de torneios de jogos onde participam aficionados dos jogos online provenientes de todo o mundo.

Configurada assim a relação jurídica controvertida, para além do que possa vir a ser apurado, e decorrentemente enquadrada em termos jurídicos, estamos perante uma causa de pedir complexa, que servindo de suporte ao pedido formulado, é integrada por todos os factos que de cuja verificação depende o reconhecimento da pretensão do A., não confundível com a valoração jurídica que o mesmo deles possa fazer.

Nesta ótica, na indicação de todos os factos possivelmente geradores da obrigação de indemnizar os danos invocados, mostra-se realizada uma imputação à R., em termos de produção e divulgação dos jogos, bem como conteúdos em suporte informático, passando também pela comercialização, pelo menos ab initio, traduzidos no uso da imagem e nome do A. não autorizado por este, não só em Portugal mas em todo o mundo.

Em conformidade, ainda que se considerasse que o processo causal foi iniciado nos Estados Unidos, como possível sede da R., tal processo teve uma evolução apontada, não sendo a atuação da R, invocada pelo A. reduzida apenas a uma primeira fase de produção, antes e na versão por este último trazida aos autos, se difundindo em termos globais, e de que resultaram os danos que o A. alega ter sofrido.

Tais danos, decorrentes da apontada violação de direitos de personalidade, não se confundem com as condutas lesivas, correspondendo sim ao aproveitamento económico da personalidade do Autor e assim a lesão verifica-se no local onde o bem da personalidade é explorado economicamente33, na vertente patrimonial, relativamente aos quais o Autor não só apontou a plurilocalização, referindo Portugal e o resto do Mundo, como indicou critérios de cálculo, enquanto também descreveu os danos não patrimoniais que o terão afetado, face à utilização não autorizada da sua imagem e nome.

Os danos invocados, e que se terão prolongado no tempo, localizar-se-ão em diferentes Estados, mas também em Portugal, onde o A. exerce a sua profissão de jogador, com a qual segundo alega se sustenta a si e à sua família, e durante as últimas cinco temporadas.

Perante este quadro, reportando aos fatores legais atributivos de competência internacional dos tribunais portugueses, surgem-nos de difícil aplicação o relativo à alínea a) do art. 62.º, enquanto ao critério previsto na alínea c), não se configura que tenha sido invocado factualismo que o possa preencher.

Já quanto ao critério da causalidade, alínea b), configura-se face ao delineado que existem elos suficientemente fortes entre os factos da causa e os tribunais portugueses, tendo em conta a alegada concretização da violação do direito ao nome e imagem do A. em Portugal, assim como a verificação, pelo menos em parte, dos danos patrimoniais e não patrimoniais, no desenvolvimento da sua atividade, não só maioritariamente, mas também, nos últimos anos, o que não se mostra muito arredado do seu centro de interesses, mas ao qual não é, em tais termos, atribuída relevância determinante.

Deste modo, não se descortinam razões para não tomar em consideração o disposto da alínea b) do art.º 62, e tendo em conta o critério da causalidade, não considerar os tribunais portugueses internacionalmente para conhecer da causa.

Refira-se, em nota, que a conclusão a que se chegou não se afigura como o reconhecimento de uma competência exorbitante, face à conexão suficientemente forte encontrada, sem recurso, sublinha-se, a quaisquer presunções, mas tão só ao concretamente vertido nos autos, não se divisando, acrescente-se, que seja de alguma forma impossibilitada a defesa pela R., dos seus legítimos interesses.

5. A R. suscitou o conhecimento expresso deste Tribunal da questão relativa à inconstitucionalidade da aplicação dos artigos 351.º, do CC, art.º 5.º, n.º 1, 608.º, n.º 2 do CPC, 674.º, n.º 1 e 3 do CPC e 38.º, n.º 1 da LOSJ, nos termos e para os efeitos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), 72.º, n.º 2 e 75.º-A, n.º 2, todos da Lei n.º 28/82.

Considera a Requerente que a interpretação e aplicação operada pelo STJ quanto aos artigos 62.º do CPC, 9.º e 351.º do CC e 38.º, n.º 1 da LOSJ padece de inconstitucionalidade, no sentido de ser possível trazer ao processo, em última instância, factos presumidos, não alegados na petição inicial e fora da causa de pedir, bem como a adoção de um “critério normativo de centro de interesses” para decidir sobre a matéria de competência internacional, por contrário ao princípio do estado de direito democrático, o princípio do processo equitativo, o princípio da separação de poderes e o princípio do dever de obediência à lei.

Ora assentando o decidido no vertido na petição inicial, sem recurso a quaisquer presunções, por um lado, e tendo-se concluído pela existência de um elo de conexão suficientemente forte entre o objeto da causa e a ordem jurídica portuguesa que justifica a atribuição de competência em razão da nacionalidade aos tribunais nacionais para conhecer do presente litígio nos termos da alínea b) do artigo 62.°, numa ação de responsabilidade civil extracontratual de violação de direitos de personalidade apontada como verificada em Portugal, mas também com dimensão mundial, por outro, sem que haja recurso a critérios que não os legais, conforme se apontou em sede própria, não se vislumbra que se configure o indicado vício de interpretação em sentido desconforme com a Constituição, nem quaisquer outras interpretações inconstitucionais que importe conhecer.

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III – DECISÃO

Nestes termos, decide-se conceder a revista, revogando o acórdão recorrido, julgando improcedente a exceção da incompetência internacional do Juízo Central Cível de Setúbal, e determinando o prosseguimento dos autos.

Custas dos recursos de apelação e revista pela Ré.

Lisboa, 15 de fevereiro de 2023

Ana Resende (Relatora)

Maria José Mouro

Graça Amaral

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Sumário, art.º 663, n.º 7, do CPC.

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1. Diploma a que se fará referência se nada mais for dito.

2. Assim como por último um indicado “parecer” que se encontra nos autos.

3. Caso dos Acórdãos do STJ de 24.05.2022, Proc. n.º 3853/20, de 07.06.2022, Proc. n.º 24974/19, de 07.06.2022, Proc. n.º 4157/20, de 23.06.2020, Proc. n.º 3239/20, de 27.09.2020, Proc. n.º 637/20, de 29.09.2022, Proc. 2160/20, de 13/10/2022, Proc. n.º 1014/20, de 10.11.2022, Proc. n.º 1579/20 e Proc. n.º 17046/20, de 15.12.2022, Proc. n.º 3731/21, e de 10.01.2023, Proc. n.º 996/21, maioritariamente acessíveis in www.dgsi.pt.

4. Sendo efetuada referência a jurisprudência desenvolvida pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em matéria de competência internacional relativa à responsabilidade civil extracontratual por violação dos direitos de personalidade, como os direitos ao nome, à imagem e à honra, através de meios de exposição globais, no âmbito das normas comunitárias.

5. Cf. Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, vol I, fls. 57, mencionando que a doutrina do n.º 3, completando o dever de obediência à lei, é contra a equidade, enquanto justiça do caso concreto em desacordo com a justiça do princípio geral, a que o legislador reage, procurando evitar desacordos na aplicação da lei.

6. Cf. Acórdão do STJ de 12.06.2016, processo n.º 982/10.4TBPTL.G1-A.S1, in www.dgsi.pt.

7. Cf. Miguel Teixeira de Sousa, in A Competência Declarativa dos Tribunais Comuns, Lisboa, 1994, fls. 30, referindo que o tribunal será o competente para o julgamento de certa causa quando os critérios determinativos da competência lhe atribuem a medida de jurisdição que seja suficiente e adequada para essa apreciação.

8. Cf. Miguel Teixeira de Sousa, (MTS) Código de Processo Civil, online, (CPC online) versão de 2022.12, Introdução Geral, §4, 20, p5.

9. Em contraposição com a competência internacional indireta, reconhecida a outro Estado, relevante em termos de revisão de sentença estrangeira, Miguel Teixeira de Sousa, CPC online referenciado, art. 1.º a 129.º, NP art. 59.º, 1 (a), p. 68.

10. Fomentando “o chamado fórum shopping, porque o autor pode escolher, de entre os vários possíveis, o foro que lhe for mais conveniente (até pela ótica da lei aplicável)”, MTS, CPC online, citado, NP art. 59.º, 1 (b), p. 68.

11. Cf. Acórdão do STJ, 07.06.2022, processo n.º 4157/20.6T8STB.E1.S1 (já referenciado), in www.dgsi.pt.

12. Revogando o Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 22.12.2000, relativo à competência judiciária, reconhecimento e execução de decisões em matéria civil e comercial., aplicável desde o dia 1 de Março de 2002, que substituiu para os Estados que integravam a União Europeia, a Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 Relativa à Competência Judiciária e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial, sendo aprovada em Portugal, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 34/91, de 30 de Outubro, entrando em vigor no nosso país em 1.7.1992, bem como a Convenção de Lugano, esta in DR. 1ª - Série A, Suplemento de 30.10.1991, que praticamente a reproduz alargando-a aos Estados que integravam a EFTA.

13. Cf. Acórdão do STJ, de 07.06.2022, processo n.º 24974/19.9T8LSB.L1.S1 (já referenciado), in www.dgsi.pt.

14. Cf. Acórdão do STJ de 29.09.2022, processo n.º 2160/20.5T8PNF.P1.S1, já referenciado nos autos.

15. In Acórdão do STJ de 24.06.2022, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1, já referenciado nos autos, in www.dgsi.pt.

16. Processo C-68/93, EU:C:1995:61.

17. Processos apensos C-509/09 e C161/10, EU:C:2011:685

18. Processo C-194/16, EU:C:2017:766.

19. Processo C-251/2020, EU:C:2021:1036

20. Cf. Acórdão do STJ de 29.09.2022, processo n.º 2160/20.5T8PNF.P1.S1, já referenciado nos autos

21. Cf. Acórdão do STJ de 29.09.2022, processo n.º 2160/20.5T8PNF.P1.S1, referido na nota supra, mencionando, ser tal opção “ (…) a que se afigura mais consentânea com a viabilidade prática desse dano, por parte do lesado, posto que é aí que este, em regra, disporá dos meios de prova tendentes a demonstrar os efeitos danosos na sua personalidade e para a sua condição de vida”.

22. Cf. Acórdão do STJ de 24.05.22, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1, já referenciado.

23. Cf. MTS, CPC online, citado, art. 62, 1 (b), 6, pág. 71/72.

24. Cf. Acórdão do STJ de 24.05.22, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1, já referenciado.

25. Cf. Acórdão do STJ de 24.05.2022, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1. (já referenciado), mencionando Dário Moura Vicente, A Competência Internacional no Código de Processo Civil Revisto, em “Aspetos do Novo Código de Processo Civil”, LEX, 1997, pág. 84, e Luís Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, vol. III, tomo 1, 3.ª ed., 2019, Almedina, pág. 337, nota 1334, e sustentando a inutilidade deste critério, face à dupla funcionalidade das normas de competência territorial, num alinhamento com o sistema alemão, Miguel Teixeira de Sousa, A Competência e a Incompetência nos Tribunais Comuns, 3.ª ed., AAFDL, 1990, pág. 54, Apreciação de Alguns Aspetos da Revisão do Processo Civil – Projeto, na Revista da Ordem dos Advogados 55 (1995), pág. 367 e seg., e em Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2.ª ed., LEX, 1997, pág. 99-100.

26. Cf. Acórdão STJ de 24.05.2022, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1, acima aludido, apontando para Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 1º, 2.ª ed., Coimbra Editora, 1960, pág. 195, relativamente ao Código de Processo Civil de 1939.

27. Cf. Remédio Marques, A Ação Declarativa à Luz do Código Revisto, 3.ª ed., Coimbra Editora, 2011, pág. 336 e Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Almedina, 2018, vol. I, pág. 102, apud Acórdão STJ de 24.05.2022, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1.

28. “ Se o réu tiver domicílio e a residência em pais estrangeiro, é demandado no tribunal em que se encontrar; não se encontrando em território português, é demandado no do domicílio do autor, e quando, este domicílio for em país estrangeiro, é competente para a causa o tribunal de Lisboa.”

29. Cf Cf. MTS, CPC online, citado, art. 62, 2 (c), pág. 72.

30. Cf, Acórdão STJ de 24.05.2022, processo n.º 3853/20.2T8BRG.G1.S1, mencionado.

31. Cf. Acórdão do STJ de 27.09.2022, processo n.º 637/20.1T8PRT.P1.S1, na menção “ da “comunitarização” do Direito Internacional Privado e “a jurisprudência da União viria a condicionar a aplicação das regras de direito internacional privado dos Estados Membros em domínios não abrangidos pela competência da União e, portanto, limitar também por essa forma, a aplicação dos sistemas de direito internacional privado da natureza estadual que haviam sido criados por aqueles “ referindo Moura Ramos, Estudos Direito Internacional Privado da União Europeia, pág. 66 e 67..

32. Cf. Ac. do STJ de 07-06-2022, processo n.º 24974/19.9T8LSB.L1.S1, já referenciado.

33. Elsa Oliveira, Da Responsabilidade Civil Extracontratual Por violação dos Direitos de Personalidade em Direito Internacional Privado, 2011, pág. 408, apud Ac. do STJ de 27-09-2022, processo n.º 637/20.1T8PRT.P1.S1, referindo que “A lesão do bem de personalidade, na sua vertente patrimonial, ocorre no lugar onde se sofre a agressão, onde o bem é utilizado sem autorização, e o dano verifica-se no lugar onde o titular do direito que tem por objeto o bem em causa, devido a essa atuação, sofre uma perda ou uma desvantagem”.