Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2815/20.4T8FAR.E1.S2
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: JÚLIO GOMES
Descritores: REVISTA EXCECIONAL
Data do Acordão: 07/14/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA EXCECIONAL
Decisão: ADMITIDA A REVISTA EXCECIONAL
Sumário :
Afirmando o Acórdão recorrido que as deduções a que se refere a cláusula 136.º do ACT aplicável apenas têm como único critério o tempo de descontos para a Segurança Social, ao passo que o Acórdão fundamento atende expressamente tanto ao tempo, como ao valor das retribuições, existe oposição de respostas quanto à mesma questão de direito, admitindo-se a revista excecional.
Decisão Texto Integral:


Processo n.º 2815/20.4T8FAR.E1.S1

Acordam na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3 do CPC junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,

AA intentou a presente ação comum contra Banco Santander Totta, S.A., pedindo a condenação do Réu:

“a. a reconhecer ao A. o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 33,33 %, correspondente a 9 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;

b. a pagar ao A. o valor de quantia de € 30.476,41 Euros, acrescido de juros de mora no montante de € 1.456,41 Euros, num valor total global de €31.933,34 Euros, correspondente ao valor excessiva e ilegalmente descontado, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescida dos juros vencidos até integral pagamento do valor em divida.

c. a aplicar uma regra pro rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo A. para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;

d. a pagar ao A. todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença”.

O Réu contestou.

Foi realizada audiência final.

Em 22.09.2021, foi proferida sentença, na qual se decidiu o seguinte:

“Em face do exposto, julgo a ação procedente e, consequentemente, condeno o R., Banco Santander Totta, SA:

a) A reconhecer ao A., AA, o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 33,33 %;

b) A pagar ao A., AA, a quantia de € 30 476,41 (trinta mil, quatrocentos e setenta e seis euros e quarenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora no montante de € 1 456,41 (mil quatrocentos e cinquenta e seis euros e quarenta e um cêntimos) e dos juros vincendos, à taxa legal, desde a entrada da ação até integral pagamento do valor em divida.

c) A aplicar uma regra de três simples no apuramento da parte da pensão do Centro Nacional de Pensões a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo A. AA para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, a liquidar em execução de sentença;

d) A pagar ao A. AA as quantias que, sem aplicação da regra referida em c), reteve desde a propositura da ação ou venha a reter até ao trânsito em julgado da ação, acrescidas de juros de mora, entretanto, vencidos e dos vincendos, à taxa legal, a liquidar em incidente de liquidação de sentença.”.

O Réu interpôs recurso de apelação.

Por Acórdão de 24.02.2022, o Tribunal da Relação de Évora confirmou a decisão recorrida.

Ainda inconformado, o Réu interpôs recurso de revista excecional, tendo invocado para o efeito a alínea c) do n.º 1 do artigo 674.º do CPC e apresentado como fundamento o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 10/10/2016, proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1 já transitado em julgado, conforme certidão junta.

O Autor contra-alegou.

A respeito da contradição invocada disse o Recorrente:

“I. Trata-se da mesma questão de direito com os mesmos pressupostos de facto, porquanto ambos os arestos decidiram sobre como apurar o benefício pago pelo regime geral de segurança social para o efeito da aplicação do disposto na cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011 - Data de Distribuição: 24/01/2011) – atualmente cláusula 94ª do ACT do Setor Bancário - quando, além da carreira contributiva ao serviço do Banco, o pensionista tem carreira contributiva fora do setor bancário;

II. Trata-se de decisões expressas e opostas, pois o Acórdão recorrido decidiu, confirmando a sentença proferida pelo Tribunal da Primeira Instância, reconhecer ao Autor o direito a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor a liquidar a calcular por aplicação de uma “regra de três simples pura”, enquanto no Acórdão proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, já transitado em julgado, se decidiu, confirmando igualmente a sentença proferida pelo Tribunal da Primeira Instância, julgar totalmente improcedente a ação e absolver a Ré do pedido, o qual correspondia, designadamente, a reconhecer ao Autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor correspondente à percentagem de 13%, correspondente aos 2 anos e 7 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário, numa “regra de três simples pura”;

III. A oposição dos julgados concretiza-se, manifestamente, no sentido da decisão tomada em cada um deles, pois no Acórdão recorrido seguiu-se no sentido da aplicação da “regra de três simples pura”, condenando-se o Réu nesses termos e no Acórdão fundamento proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, já transitado em julgado, decidiu-se exatamente o contrário, ou seja, absolver o Réu do pedido de condenação a aplicar uma “regra de três simples pura”.

Ora, a contradição efetivamente existe.
Os dois Acórdãos incidem sobre a mesma questão de Direito, a saber, a forma de cálculo de parte da pensão atribuída ao Autor pelo CNP, que o Réu tem direito a deduzir, em face do prescrito na cláusula 136.º do Acordo Coletivo de Trabalho do sector bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011) cláusula que veio a ser substituída, com idêntica redação, pela cláusula 94.º do ACT para o Sector Bancário, publicado no BTE n.º 29, 1ª série, de 08/08/2016.
E dão-lhe respostas claramente distintas:
Para o Acórdão recorrido, “para o cálculo da pensão a abater atende-se ao tempo e não às remunerações que geraram as contribuições”, enquanto o Acórdão fundamento, proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, atende expressamente tanto ao fator tempo, como ao valor das retribuições.
Pese embora o Acórdão recorrido corresponda à jurisprudência pacífica e reiterada desta Secção Social, que, aliás, invoca expressamente, não existe jurisprudência uniformizada, pelo que a presente revista excecional é admitida.

Decisão: Admite-se a presente revista excecional.
Lisboa, 14 de julho de 2022

Júlio Gomes (Relator)

Ramalho Pinto

Mário Belo Morgado