Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
835/21.0T8VFR.P1-A.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: CATARINA SERRA
Descritores: ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE REVISTA
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
REQUISITOS
REJEIÇÃO DE RECURSO
DESPACHO SOBRE A ADMISSÃO DE RECURSO
RECLAMAÇÃO
EXTEMPORANEIDADE
ALEGAÇÕES DE RECURSO
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
IGUALDADE DAS PARTES
Data do Acordão: 05/11/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO - ARTº 643 CPC
Decisão: RECLAMAÇÃO INDEFERIDA
Sumário :
I. Não pode considerar-se que o recurso foi interposto ao abrigo do fundamento específico da contradição de julgados quando o recorrente se limita a referir jurisprudência em que, alegadamente, se adoptou posição distinta da do Acórdão recorrido.

II. O momento em que o recorrente define os termos da interposição do recurso é o momento das alegações de recurso, não valendo para esse efeito nem as correcções nem os acrescentos posteriores, designadamente na reclamação da decisão de inadmissibilidade do recurso.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA



I. RELATÓRIO


1. AA, BB, CC e DD intentaram a presente acção especial de acompanhamento, com pedido de suprimento do consentimento, a favor de EE.

2. O Tribunal de 1.ª instância julgou a acção procedente e nomeou como acompanhante o irmão do beneficiário FF.

3. EE interpôs recurso de apelação, impugnando a nomeação como acompanhante do irmão do beneficiário.

4. Em 21.10.2022, o Exmo. Senhor Juiz Desembargador Relator proferiu decisão singular, em que não admitiu o recurso de apelação.

5. Inconformado, EE reclamou para a conferência.

6. Em 14.12.2022, o Tribunal da Relação do Porto proferiu Acórdão, em que confirmou a decisão do Relator de não admitir o recurso de apelação.

7. Inconformado, EE veio, “nos termos do artigo 652 nº 5 do Código do Processo Civil (…) apresentar reclamação, com efeito suspensivo, para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça” do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação.

Porque relevante para a presente decisão, reproduzem-se as conclusões aí enunciadas:

I - O Tribunal da Relação decidiu. em decisão singular. e posteriormente em conferencia . não conhecer o presente recurso, alento este normativo, entendendo assim que apenas e passível de recurso as decisões sobre as medidas decretadas . separando o que chamou segmento decisório que decretou a medida, do segmento decisório que designa o acompanhante ao maior, concluindo que o legislador quis expressamente restringir o âmbito de recurso.

II - Ora. o recurso versa sobre uma serie de questões e não se reduz à escolha do acompanhante.

III - Mais entende o recorrente que a escolha do acompanhante, deverá ser conhecida pelo Tribunal e ser objecto de sindicância superior, sob pena de manifesta negação da justiça e ofensiva dos princípios constitucionais consagrados na Constituição da República Portuguesa.

IV - O regime do acompanhante ao maior assenta em vários primados. Além da (i) primado pela autonomia do beneficiário, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até aos limites do possível, são vectores essenciais do regime do maior acompanhado (ii) a subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à capacidade do visado pela medida de protecção, só admissíveis quando o problema não possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de protecção e de acompanhamento comuns, próprios de qualquer situação familiar, designadamente através dos deveres de cooperação e assistência que impendem sobre o cônjuge: (iii) flexibilização da medida de acompanhamento, dentro da ideia de que cada caso é um caso; (iv) a manutenção de um controlo jurisdicional eficaz sobre qualquer constrangimento imposto ao visado: (v) e o primado dos interesses pessoais e patrimoniais do beneficiário.

V - Existem questões de especial relevância suscitadas no recurso que. ao não serem conhecidas, comprometem de, forma grave, os interesses do recorrente. nomeadamente. a verificação de um conflito de interesses que determina, necessariamente, a escolha de outro acompanhante e ainda a violação flagrante da lei civil, nomeadamente, do disposto nos números 1 e 2 do artigo 143.° do Código Civil, da vontade do acompanhado.

VI - A interpretação das normas legais c das tarefas que mais questões suscita e é nesse sentido que consideramos necessário convocar os elementos de interpretação da lei: in casu não pode deixar de se considerar, para além do elemento literal, os elementos histórico e lógico, isto é. a razão de ser do regime; aquilo que levou à mudança do paradigma e qual a finalidade e razão de ser do Maior Acompanhado.

VII - Assim, partindo do elemento literal, entendemos que a medida de acompanhamento e a escolha do acompanhante não são dissociáveis, aliás, não pode. De maneira nenhuma, deixar de se considerar que a decisão da escolha do acompanhante é. em si mesma, uma decisão relativa ã medida do acompanhamento, porque ê dela parte integrante.

VII - A escolha do acompanhante é tão importante como as concretas medidas de acompanhamento, uma vez que. para serem eficazes- terão de ser executadas pela pessoa mais capaz â luz de todas as circunstâncias do caso concreto e respeitando-se a escolha do acompanhado-

IX - O acompanhante não poderá encontrar-se numa situação de conflito de interesses com o acompanhado, sob pena de não ser tutelado o seu interesse, mas sim o interesse daquele; É precisamente o que acontece no caso concreto, em que o acompanhante tem interesses contrários aos do acompanhado, já que se arroga seu credor.

X - Não se vislumbra qualquer razão para uma interpretação restritiva do artigo 901.° do Código de Processo Civil que. leni de ser interpretado no sentido de abranger qualquer segmento da decisão, pois na verdade não existem um sem o outro.

XI - Se o que se visa acautelar é a pessoa do acompanhado, nomeadamente, os seus interesses, seria, no mínimo, irónico optar por uma via interpretativa que colocasse em causa esses mesmos interesses.

XII - O artigo deve ser interpretado no sentido de que sobre as medidas de acompanhamento, apenas aqueles pessoas tem legitimidade . Não pode ser vista no sentido de excluir o recurso sobre as demais questões que se possam colocar num processo de acompanhamento de maior.

XIII - Consta de um acórdão do STJ que "- A 1.ª instância fundamentou a decisão de admissão da recurso de apelação no facio de o processo especial de acompanhamento de maiores não prever regras especiais para recorrer, salvo - como se viu supra a regra prevista no art 901. ° do CPC a respeito do recurso da decisão relativa ã medida de acompanhamento. Considerando que tal não significa une as demais proferidas nestes processos sejam irrecorríveis, mas antes que às mesmas é aplicável o regime previsto nos arts. 627.°esegs. do CPC, ex vi art. 549. °, n. ° 1, nomeadamente, o disposto no n." 2 do art. 631. ° do CPC: "As pessoas diretamente prejudicadas pela decisão podem recorrer dela. ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias ".

XIV - O direito fundamental a um processo justo e equitativo não seria acautelado se não fosse admissível recorrer da decisão que designa o acompanhado, deixando o acompanhante a mercê de uma decisão imponderada do Tribunal da 1.ª instância, que não poderia ser controlada por uma instância superior.

XV - A decisão do juiz singular ora colocada cm crise, refere-se aos critérios legais de escolha, pertença do acompanhado c só na falia de escolha c que se designa outra, pessoa nos termos do artigo 143.° CG Ora in caso o acompanhante escolheu uma pessoa, o tribunal não seguiu esta escolha e entende o tribunal superior que esta decisão não poderá ser objecto de recurso c reapreciação.

XVI - Mais. a interpretação da norma no sentido da separação dos segmentos decisórios e da não admissibilidade do recurso não é compatível com as garantias constitucionais plasmadas no artigo 20.° da Constituição da República Portuguesa.

XVH - O direito fundamental a um processo justo e equitativo não seria acautelado se não fosse admissível recorrer uma decisão que designa o acompanhado, deixando o acompanhante à mercê de uma decisão imponderada do Tribunal da l.a instancia, que não poderia ser controlada por uma instância superior.

XVIII - Não pode, ainda, a escassez de meios disponíveis para administrar a justiça ser utilizada como válvula de escape do sistema para justificar uma interpretação que vai contra toda a essência e razão de ser do regime do Maior Acompanhado”.


8. Em 18.01.2023, o Exmo. Senhor Desembargador Relator proferiu despacho com o seguinte teor:

EE, notificado que foi do acórdão prolatado em conferência que confirmou a decisão singular do Relator que não admitiu o recurso por si interposto da sentença proferida pela primeira instância, veio apresentar reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do preceituado no artigo 652.º, nº 5 al. a) do CPCivil.

Mas, salvo o devido respeito, do acórdão proferido em conferência pelo Tribunal da Relação que confirma a decisão de não admissão ou rejeição do recurso de apelação não cabe, em regra, quer reclamação quer mesmo recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

Analisando.

Preceitua o artigo 652.º, nº 5 al. a) do CPCivil que do acórdão da conferência pode a parte que se considere prejudicada:

a) - Reclamar, com efeito suspensivo, da decisão proferida sobre a competência relativa da Relação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o qual decide definitivamente a questão.

Como é de meridiana clareza, o inciso citado contempla os casos em que o tribunal da Relação se julga incompetente para conhecer do recurso, por tal conhecimento pertencer a outra Relação.

Trata-se, portanto, da situação equivalente à que vem prevista no artigo 105.º, nº 4 do CPCivil, relativamente à competência relativa suscitada em primeira instância.

Ora, como se torna evidente, no caso concreto não estamos perante a situação que preencha a facti species da citada al. a) do nº 5 do artigo 652.º, ou seja, perante decisão cujo objecto incida sobre a [in] competência relativa desta Relação para conhecer do recurso.

Da mesma forma que a situação sub Júdice, ainda que fosse de aplicar o artigo 193.º, nº 3 do CPCivil e, portanto, se operasse a convolação para os termos processuais adequados (por haver erro na forma de processo) se não enquadra na factie species da al. b) do nº 1 do mesmo normativo.

Dispões esta alínea que do acórdão da conferência pode a parte que se considere prejudicada “recorrer nos termos gerais.”

Na verdade, daqui se extrai em conjugação com os demais princípios e regras gerais que regulam/ disciplinam a matéria-que do acórdão proferido, em conferência, pela Relação só poderá ser interposto recurso de revista (neste caso normal) nas situações previstas no nº. 1 do artigo 671.º do CPCivil, ou naquelas outras em que o recurso é sempre admissível [casos das als. a), b), c) e d) do nº. 2 artigo 629.º ex vi artigo 671.º, nº. 2 al. a), e ainda da al. b) deste último normativo legal].

Efectivamente, tal como refere enta Abrantes Geraldes1 da leitura do citado artigo 671.º, nº. 1, “resulta agora inequívoco que o ponto de referência para a admissibilidade do recurso da revista é o teor do acórdão da Relação e não o que tenha sido decidido pela 1ª. instância.”2

Em consonância, e em primeira linha, ressalta ainda da leitura do nº. 1 do aludido preceito legal que só admitirão recurso de revista os acórdãos da Relação que, incidindo sobre as decisões da 1ª. instância, conheçam (no todo ou em parte) do mérito da causa e bem como ainda aqueles que ponham termo ao processo, mediante a absolvição da instância do réu ou algum dos réus quanto ao pedido ou à reconvenção deduzidos.

Tendo presente o que se acabou de deixar exposto, é patente que a situação não se enquadra na previsão do citado nº. 1 do artigo 671.º, pois que o que o acórdão da Relação de que se pretende recorrer de revista, não conheceu do mérito da causa e nem pôs termo ao processo, pelo que à sua luz não é admissível recurso de revista.

De igual modo, por aquilo o que se deixou exarado, é igualmente patente que no caso em apreço não estamos perante nenhum das situações previstas do 629.º, nº. 2, ou mesmo do nº 2 do artigo 671.º.

Diga-se, aliás, que vem constituindo entendimento consolidado neste Supremo Tribunal de que, em regra, do acórdão da Relação que confirme a decisão de não admissão de recurso de apelação não cabe recurso de revista para o STJ.

Na doutrina, vide ainda, entre outos, Abrantes Geraldes quando, invocando ainda (a par ainda dos argumentos de natureza formal) elementos de natureza histórica e racional, afirma “do acórdão da Relação proferido em conferência que confirme o despacho de não admissão do recurso de apelação não admite, em regra, recurso de revista, a não ser nos casos previstos nos arts. 629.° n.° 2, e 671.° n.° 2.”.

Diante do exposto indefere-se a reclamação apresentada.

Custas pelo Reclamante (artigo 527.º, nº 1 do CPCivil)”.


9. EE vem agora deduzir reclamação, ao abrigo do artigo 643.º do CPC.

Finaliza a sua reclamação com as seguintes conclusões:

I - O Tribunal da Relação decidiu , em decisão singular , e posteriormente em conferencia, não conhecer o presente recurso, atento o artigo 901 do CPC , entendendo assim que apenas c passível de recurso as decisões sobre as medidas decretadas, separando o que chamou segmento decisório que decretou a medida, do segmento decisório que designa o acompanhante ao maior, concluindo que o legislador quis expressamente restringir o âmbito de recurso.

II - Por decisão de 14/12/2022 o Tribunal da Relação entendeu que o recurso apresentado pelo acompanhado/ recorrente não pode ser conhecido. Aqui chegados, nos termos do Artigo 652 n°5 do CPC , o recorrente se sentisse inconformado , que é manifestamente o caso , poderia apresentar em 10 dias reclamação para o Presidente do STJ ou cm 30 dias recurso para o STJ , nos termos gerais. No dia 23/12/2022 , o recorrente apresentou reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do artigo 652 n°5 do CPC . O Tribunal da Relação em 18/01/2023 veio a não admitir a reclamação e a não admitir a convolação da reclamação em recurso .

III - A reclamação apresentada, foi dentro do prazo de 10 dias , o que permite a convolação cm recurso . se assim se entender.

IV. - O Tribunal da Relação do Porto começa por entender que a reclamação prevista no n°5 do 652 do CPC" apenas se aplica a casos de incompetência relativa. Portanto julgou-se incompetente para conhecer esta matéria, que é uma tratada como uma incompetência absoluta , nos termos do Artigo 96 do CPC .

V - O Artigo 68 do CPC prescreve que as Relações conhecem dos recursos e das causas que por lei sejam da sua competência.

VI. - Nesta circunstância afígura-se que a interpretação que se deve dar á norma prevista no 652 n° 5 do CPC quando se refere a incompetência relativa, deverá incluir as situações de incompetência absoluta. Apoia-se cm tal interpretação no primado de a Lei que permite o menos. permite o mai . Sc o Legislador previu a reclamação para a violação das regras de competência menos gravosas , há-de querer que as mais gravosas sejam , por maioria de razão possíveis de reclamação .

VII- Assim deva a reclamação apresentada no âmbito do artigo 652 n°5 do CPC ser admitida.

VIII - O Tribunal da Relação veio decidir igualmente que não poderia ocorrer convolação nos termos do artigo 193 do CPC, porque a decisão que proferiu não admite recurso ordinário nos termos do artigo 671 n° 1 do CPC . Ora não se concorda com este entendimento por varias razões .

IX - Desde logo é sempre admissível recurso com fundamento na violação das regras da competência em razão da matéria, conforme prescreve o artigo 629 n° 2 alínea a do CPC . A presente acção é relativa ao estado das pessoas .

X - A recusa da reclamação apresentada para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça tem por base as regras da competência cm razão da matéria, pelo que tal norma se aplica. Assim esta norma permite o recurso nos termos gerais para o STJ.

XI - Continua o artigo 629 n°2 alínea d do CPC , que c sempre admissível recurso do acórdão da relação que esteja em contradição com outro dessa Relação no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito .

XII - Ora conforme já consta da reclamação apresentada nos termos do art 652 n°5 do CPC para o Presidente do STJ , o acórdão proferido que julgou não ser de conhecer o recurso , com o fundamento de que a norma do 901 do CPC não admite recurso, nem para a Relação está em manifesta contradição com um acórdão do STJ , que prescreve exactamente o contrario.

XIII - Se a Lei permite um recurso se a decisão estiver em contradição com um acórdão da Relação por maioria de Razão permite se estiver cm contradição com um acórdão do STJ.

XIV . Veja-se o Acórdão do STJ de 14/01/2021,

I. — Na interpretação do art. 901. ° do CPC deve atender-se a que, estando em causa, nas acções de acompanhamento de maiores, o direito à capacidade civil consagrado nos n.os 1 e 4 do art. 26."da CRP. se justifica plenamente a possibilidade de o STJ sindicar as decisões da Relação quanto às quais não se verifica dupla conforme, tal como sucede, em geral, nos demais processos especiais.

II. — Assim, e uma vez que a letra do art. 901. ° do CPC não o exclui, entende-se que não vigora neste tipo de processos um princípio de irrecorribitidade para o STJ, sendo de concluir que o sentido útil da norma legal será o de regular especificamente a legitimidade para recorrer de decisão relativa a medida de acompanhamento de maior.

XV - Assim nos termos do Artigo 629 do CPC , a reclamação pode ser convolada em recurso para o STJ , nos termos do artigo 629 n° 2 alíneas a e d do CPC . Pelo que deverá sempre a reclamação ser convolada em recurso .se se entender que a reclamação não é admissível, nos termos do Artigo 193 do CPC.

XVI — As sentença proferidas no âmbito de processos de acompanhamento de maiore . por se tratarem de acções relativas ao estado das pessoas, tem o valor de alçado do STJ, para permitir recurso para o STJ . O despacho em causa proferido pelo Tribunal da Relação defende que uma vez que não ocorreu decisão de mérito nem a sua decisão pôs termo ao processo não é admissível o recurso de revista, nos termos do artigo 671nº 1 do CPC .

XVII - Ora cm primeiro lugar. tal prescrição não se pode aplicar a processos , que pela sua natureza, não terão fim , não se extinguem . Na verdade os processos de acompanhamento são processo de natureza de jurisdição voluntária c consequentemente são processos que estão sempre abertos. para poderem ser alterados em função das alterações das circunstancias.

XVII - Assim esta norma tem de ser adaptada á especificidade dos processos de acompanhamento de maior. Tanto assim é que o STJ tem-se pronunciado sobre questões de acompanhamento de maior. o que significa que esta limitação não se impõe as processos de acompanhamento de maior .

XIX - Mas se se levar á letra o entendimento do artigo 671 n° I do CPC , defendido pelo Tribunal da Relação , significa que a decisão da Relação do Porto que não conheceu de mérito nem pôs termo ao processo « só poderá ser entendida como uma decisão interlocutória. que nos leva para o n°2 do Artigo 671 do CPC .

XX - Ora o artigo 671 n° 2 do CPC permite recurso para o STJ sobre os despachos interlocutórios, nos casos em que o recurso é sempre admissível, que vimos ser o caso nos termos do artigo 629 n°2 alíneas a e d . do CPC ;

XXI - E também permite recurso de revista quando esteja tal despacho esteja em contradição com outro acórdão proferido pelo STJ no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, acórdão atrás referido .

XXII - A previsão do n°3 do 671 igualmente não se verifica porquanto o Tribunal da Relação não confirmou de mérito a sentença de primeira instância. Pelo que nada obsta a que se proceda á convolação da reclamação em recurso se entender que a reclamação não é admissível, nos termos do Artigo 193 do CPC

Reiteram-se e reproduzem-se as conclusões quanto ao mérito da questão, já constantes na reclamação apresentada para o senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça

II - Ora. o recurso versa sobre uma serie de questões e não se reduz à escolha do acompanhante.

III- Mais entende o recorrente que a escolha do acompanhante, deverá ser conhecida pelo Tribunal e ser objecto de sindicância superior, sob pena de manifesta negação da justiça e ofensiva dos princípios constitucionais consagrados na Constituição da República Portuguesa.

IV - O regime do acompanhante ao maior assenta em vários primados.Além da (i) primado pela autonomia do beneficiário, cuja vontade deve ser respeitada c aproveitada até aos limites do possível, são vectores essenciais do regime do maior acompanhado (ii) a subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à capacidade do visado pela medida de protecção, só admissíveis quando o problema não possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de protecção e de acompanhamento comuns, próprios de qualquer situação familiar, designadamente através dos deveres de cooperação e assistência que impendem sobre o cônjuge; (iii) a flexibilização da medida de acompanhamento, dentro da ideia de que cada caso é um caso; (iv) a manutenção de um controlo jurisdicional eficaz sobre qualquer constrangimento imposio ao visado; (v) e o primado dos interesses pessoais e patrimoniais do beneficiário.

V - Existem questões de especial relevância suscitadas no recurso que. ao não serem conhecidas, comprometem de, forma grave, os interesses do recorrente, nomeadamente, a verificação de um conflito de interesses que determina, necessariamente, a escolha de outro acompanhante e ainda a violação flagrante da lei civil, nomeadamente, do disposto nos números 1 e 2 do artigo 143.° do Código Civil, da vontade do acompanhado.

VI - A interpretação das normas legais c das tarefas que mais questões suscita e é nesse sentido que consideramos necessário convocar os elementos de interpretação da lei: in casu não pode deixar de se considerar, para alem do elemento literal, os elementos histórico e lógico, isto é. a razão de ser do regime; aquilo que levou à mudança do paradigma e qual a finalidade e razão de ser do Maior Acompanhado.

VII - Assim, partindo do elemento literal, entendemos que a medida de acompanhamento e a escolha do acompanhante não são dissociáveis, aliás, não pode, de maneira nenhuma, deixar de se considerar que a decisão da escolha do acompanhante é. em si mesma, uma decisão relativa à medida do acompanhamento, porque é dela parte integrante.

VII - A escolha do acompanhante é tão importante como as concretas medidas de acompanhamento, tuna vez que. para serem eficazes, terão de ser executadas pela pessoa mais capaz à luz de todas as circunstâncias do caso concreto c respeitando-se a escolha do acompanhado.

IX - O acompanhante não poderá encontrar-se numa situação de conflito de interesses com o acompanhado, sob pena de não ser tutelado o seu interesse, mas sim o interesse daquele; íí precisamente o que acontece no caso concreto, em que o acompanhante tem interesses contrários aos do acompanhado, já que se arroga seu credor.

X - Não se vislumbra qualquer razão para uma interpretação restritiva do artigo 901.° do Código de Processo Civil que. tem de ser interpretado no sentido de abranger qualquer segmento da decisão, pois na verdade não existem um sem o outro.

XI - Se o que se visa acautelar c a pessoa do acompanhado, nomeadamente, os seus interesses, seria, no mínimo, irónico optar por uma via interpretativa que colocasse em causa esses mesmos interesses.

XII. - O artigo deve ser interpretado no sentido de que sobre as medidas de acompanhamento, apenas aqueles pessoas têm legitimidade. Não pode ser vista no sentido de excluir o recurso sobre as demais questões que se possam colocar num processo de acompanhamento de maior.

XIII - Consta de um acórdão do STJ que " A 1a instância fundamentou a decisão de admissão do recurso de apelação no facto de o processo especial de acompanhamento de maiores não prever regras especiais para recorrer, salvo como se viu supra - a regra prevista no art. 901 ° do CPC a respeito do recurso da decisão relativa ã medida de acompanhamento. Considerando que tal não significa que as demais decisões proferidas nestes processos sejam irrecorríveis, mas antes que às mesmas é aplicável o regime geral previsto nos arts. 627." e sesss. do CPC, ex vi art. 549. °, n. ° /, nomeadamente, o disposto no n." 2 do art. 63J.°do CPC: “As pessoas direta e e/etivamente prejudicadas pela decisão podem recorrer dela, ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias “.

XIV - O direito fundamental a um processo justo e equitativo não seria acautelado se não fosse admissível recorrer da decisão que designa o acompanhado, deixando o acompanhante à mercê de uma decisão imponderada do Tribunal da 1.ª instância, que não poderia ser controlada por uma instância superior.

XV - A decisão do juiz singular ora colocada em crise, refere-se aos critérios legais de escolha, pertença do acompanhado e só na falia de escolha é que se designa outra, pessoa nos termos do artigo 143.° CC. Ora in caso o acompanhante escolheu uma pessoa, o tribunal não seguiu esta escolha e entende o tribunal superior que esta decisão não poderá ser objecto de recurso c reapreciação.

XVI - Mais, a interpretação da norma no sentido da separação dos segmentos decisórios e da não admissibilidade do recurso nào compatível com as garantias constitucionais plasmadas no artigo 20.° da Constituição da República Portuguesa.

XVII - O direito fundamental a um processo justo c equitativo nào seria acautelado se não fosse admissível recorrer da decisão que designa o acompanhado, deixando o acompanhante à mercê de uma decisão imponderada do Tribunal da l.ª instância, que não poderia ser controlada por uma instância superior.

XVIII - Não pode. ainda, a escassez de meios disponíveis para administrar a justiça ser utilizada como válvula de escape do sistema para justificar uma interpretação que vai contra toda a essência c razão de ser do regime do Maior Acompanhado.

Pelas razões enunciadas, requer-se a V.Exas que seja proferida decisão que revogue a decisão do Tribunal da Relação e substitua por outra que admita a subida da reclamação apresentada para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça ou convolando a reclamação em recurso admita a subida para o STJ c afinal seja o Tribunal da Relação do Porto notificado para conhecer e se pronunciar sobre a totalidade o recurso . para se pronunciar sobre todas as questões suscitadas, com especial enfoque na problemática da inconstitucionalidade e que admita e conheça todo o objecto do recurso apresentado. pois só dessa forma se fará justiça”.


10. Em 6.03.2023 foi proferida, neste Supremo Tribunal de Justiça, decisão singular, indeferindo a presente reclamação e mantendo o despacho reclamado.

11. Não se conformando, vem EE reclamar para a conferência.

Conclui a sua reclamação assim:

I – O Tribunal da Relação decidiu , em decisão singular . e posteriormente em conferencia . não conhecer o presente recurso, atento o artigo 901 do CPC , entendendo assim que apenas é passível do recurso as decisões sobre as medidas decretadas , separando o que chamou segmento decisório que decretou a medida, do segmento decisório que designa o acompanhante ao maior, concluindo que o legislador quis expressamente restringir o âmbito de recurso.

II - Por decisão de 14/12/2022 o Tribunal da Relação entendeu que o recurso apresentado pelo acompanhado/ recorrente não pode ser conhecido . Aqui chegados . nos termos do Artigo 652 nº5 do CPC . o recorrente se sentisse inconformado , que é manifestamente o caso , poderia apresentar cm 10 dias reclamação para o Presidente do STJ ou em 30 dias recurso para o STJ , nos termos gerais , No dia 23/12/2022 , o recorrente apresentou reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do artigo 652 nº5 do CPC . O Tribunal da Relação em 18/01/2023 veio a não admitir a reclamação e a não admitir a convolação da reclamação em recurso .

III - A reclamação apresentada. foi dentro do prazo de 10 dias, o que permite a convolação em recurso , se assim se entender .

IV - O Tribunal da Relação do Porto começa por entender que a reclamação prevista no ri^ do 652 do CPC apenas se aplica a casos de incompetência relativa. Portanto julgou-se incompetente para conhecer esta matéria , que é tratada como uma incompetência absoluta . nos termos do Artigo 96 do CPC .

V - Entende o recorrente que o Artigo 68 do CPC prescreve que as Relações conhecem dos recursos e das causas que por lei sejam da sua competência.

VI - Nesta circunstancia afigura-se que a interpretação que se deve dar á norma prevista no 652 n° 5 do CPC quando se refere a incompetência relativa , deverá incluir as situações de incompetência absoluta . Apoia-se em tal interpretação no primado de a Lei que permite o menos , permite o mais . Se o Legislador previu a reclamação para a violação das regras de competência menos gravosas , há-de querer que as mais gravosas sejam . por maioria de razão possíveis de reclamação .

VII - Assim deva a reclamação apresentada no âmbito do artigo 652 n°5 do CPC ser admitida .

VIII - O Tribunal da Relação veio decidir igualmente que não poderia ocorrer convolação nos termos do artigo 193 do CPC . porque a decisão que proferiu não admite recurso ordinário nos termos do artigo 671 n°1 do CPC . Ora não se concorda com este entendimento por varias rabões .

IX - Desde logo é sempre admissível recurso com fundamento na violação das regras da competência em razão da matéria . conforme prescreve o artigo 629 nº 2 alínea a do CPC . A presente acção é relativa ao estado das pessoas .

X - A recusa da reclamação apresentada para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça tem por base (as regras da competência em razão da matéria . pelo que tal norma se aplica . A Relação do porto apoiando-se na interpretação do Art 901 do CPC entende que determinadas matérias apenas . que não a nomeação do acompanhante poderão ser objecto de recurso . Assim esta norma permite o recurso nos termos gerais para o STJ

XI - Continua o artigo 629 n°2 alínea d do CPC , que ê sempre admissível recurso do acórdão da relação que esteja em contradição com outro dessa Relação no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito .

XII - Ora conforme já consta da reclamação apresentada nos termos do art 652 n°5 do CPC para o Presidente do STJ , o acórdão proferido que julgou não ser de conhecer o recurso , com o fundamento de que a norma do 901 do CPC não admite recurso , nem para a Relação está em manifesta contradição com um acórdão do STJ , que prescreve exactamente o contrario

XIII - Se a Lei permite um recurso se a decisão estiver em contradição com um acórdão da Relação por maioria de Razão permite se estiver cm contradição com um acórdão do STJ.

XIV - Veja-se o Acórdão do STJ de 14/01/2021.

Na interpretação do art. 901. "do CPC deve atender-se a que, estando em causa, nas acções de acompanhamento de maiores, o direito à capacidade civil, consagrado nos M.w1 e 4 do art. 26. "da CRP, se justifica plenamente a possibilidade de o STJ sindicar as decisões da Relação quanto às quais não se verifica dupla conforme, tal como sucede, em geral, nos demais processos especiais.

11. Assim, e uma vez que a letra do art. 901°do CPC não o exclui, entende-se que não vigora neste tipo de processos um principia de ir recorribilidade para o STJ, sendo de concluir que o sentido útil da norma legal será o de regular especificamente a legitimidade para recorrer de decisão relativa a medida de acompanhamento de maior.

XV - Assim nos termos do Artigo 629 do CPC. a reclamação pode ser convolada em recurso para o STJ , nos termos do artigo 629 n° 2 alíneas a e d do CPC . Pelo que deverá sempre a reclamação ser convolada em recurso .se se entender que a reclamação não c admissível, nos termos do Artigo 193 do CPC

XVI - As sentença proferidas no âmbito de processos de acompanhamento de maiores. por se trata liem de acções relativas ao estado das pessoas, tem o valor de alçado do STJ , para permitir recurso para o STJ . O despacho em causa proferido pelo Tribunal da Relação defende que uma vez que não ocorreu decisão de mérito nem a sua decisão pôs termo ao processo não é admissível o recurso de revista , nos termos do artigo 671n°l do CPC .

XVII - Ora em primeiro lugar, tal prescrição não se pode aplicar a processos, que pela sua natureza . não terão fim , não se extinguem. Na verdade os processos de acompanhamento são processo de natureza de jurisdição voluntária e consequentemente São processos que estão sempre abertos, para poderem ser alterados em função das alterações das circunstancias.

XVIII - Assim esta norma tem de ser adaptada á especificidade dos processos de acompanhamento de maior. Tanto assim é que o STJ tem-se pronunciado sobre questões de acompanhamento de maior, o que significa que esta limitação não se impõe as processos de acompanhamento de maior.

XIX - Mas se se levar á letra o entendimento do artigo 671 n° 1 do CPC . defendido pelo Tribunal da Relação. significa que a decisão da Relação do Porto que não conheceu de mérito nem pôs termo ao processo, só poderá ser entendida como uma decisão interlocutória, que nos leva para o n°2 do Artigo 671 do CPC .

XX - Ora o artigo 671 n° 2 do CPC permite recurso para o STJ sobre os despachos interlocutórios, nos casos em que o recurso é sempre admissível, que vimos ser o caso nos termos do artigo 629 n°2 alíneas a e d . do CPC ;

XXI - E também permite recurso de revista quando esteja tal despacho esteja cm contradição com outro acórdão proferido pelo STJ no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito. acórdão atrás referido.

XXII - E a previsão do n°3 do 671 igualmente não se verifica porquanto o Tribunal da Relação não confirmou de mérito a sentença de primeira instancia. Pelo que nada obsta a que se proceda à convolação da reclamação em recurso se entender que a reclamação não é admissível. nos termos do Artigo 193 do CPC

XXIII - A decisão singular da Veneranda Conselheira do STJ , que pelo presente se impugna manteve o entendimento do Tribunal da Relação do Porto , que a decisão não é susceptível nem de reclamação nem de convolação em recurso ,

XXIV - Laconicamente e não se pronunciando sobre a interpretação que se pretendeu dar á norma 652 n° 5 rejeitou a aplicabilidade desta norma rejeitando a possibilidade de reclamação. Insiste o recorrente:

Nesta circunstancia afigura-se que a interpretação que se deve dar á norma prevista no 652 n" 5 do CPC quando se refere a incompetência relativa, deverá incluir as situações cie incompetência absoluta.

Apoia-se em tal interpretação no primado de a Lei que permite o menos, permite o mais. Se o legislador previu a reclamação para a violação das regras de competência menos gravosas, há-de querer que as mais gravosas sejam, por maioria de razão. possíveis de reclamação».

Doutra forma estaremos presentes na situação caricata, a dos autos, em que, uma sentença de primeira instancia. se a Tribunal do Relação se recusar a conhecer, por entender não ter competência em razão da matéria, tal decisão jamais poderia ser objecto de sindicância e o recurso jamais conhecido .

XXV - Em relação á possibilidade de consolação da reclamação em recurso, igualmente decidiu no sentido não ser admissível.

XXVI - A decisão que ora se impugna decidiu que o artigo 671 do CPC não tem aplicação in casu .O recorrente defende que tal norma não se pode aplicar a processos que pela sua natureza , não têm termo , aos processos sobre a sua natureza podem ser alterados a todo o tempo , como c o caso dos processos de acompanhamento de maior , Sobre tal entendimento a decisão não se pronuncia . Ocorre omissão de pronuncia que expressamente se arguiu.

XXVII - O recorrente defendeu ainda que se a decisão do Tribunal da Relação não* decidiu de mento porque não conheceu o recurso, o que leva á não aplicação do artigo 671 nl ,implicando o recurso ao seu n^ 2 ; norma esta . que permite sempre o recurso, quando em causa estejam questões relativas á competência em razão da matéria e contradição com outros acórdãos. Aqui limitou-se a decisão em causa a referir que o recurso não pode proceder porque nada tem a haver com as competência absoluta ou relativa.

XXVIII - Ora insiste o recorrente que se a Relação do Porto entendeu que estas matérias estariam fora do âmbito da possibilidade de recurso, pela interpretação que faz do artigo 901 do CPC, esta é uma questão de competência em razão da matéria.

XXIX - O recorrente defendeu ainda que o recurso deveria ser admitido porque está em contradição com um acórdão do STJ de 14/01/2021. Defendeu a Veneranda Relatora que só na presente reclamação é que faz referencia ao referido acórdão e porque não juntou copia do acórdão em conflito nos termos do Artigo 637 n°2 do CPC, tal já não é admissível poder-se conhecer o recurso.

XXX - Aqui verifica-se que a Veneranda Conselheira Relatora admite a possibilidade do recurso como admissível, mas porque no seu entender ocorreu esta falha, dir-se-ia técnica de não juntar o acórdão do STJ , formalmente já não é possível admitir .

XXXI - Ora desde logo importa esclarecer que não é verdade que só no recurso/ reclamação para o STJ o recorrente tenha referido este acórdão em manifesto conflito com a decisão do Tribunal da Relação do Porto.

XXXII - Por outro lado a figura-se que o procedimento do STJ neste tipo de ocorrências tem tido uma visão diferente, perdoe-se, menos formalista e mais preocupado com a justiça material e decidiu noutras ocasiões de forma diferente. notificando o recorrente para juntar o acórdão que refere, ultrapassando a questão formal.

XXXIII - Do acórdão do STJ de 22/04/2021 que se junta, verifica-se esse procedimento: II- os recursos em que se invoca conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, o recorrente tem o ónus de juntar com o requerimento de interposição do recurso, cópia do acórdão fundamento, sob pena de rejeição (art. 637" n°2 do CPC);

III   Se não cumpriu esse Ónus e é notificado para o fazer, o prazo para juntar o acórdão não se encontra abrangida pela regra da suspensão de prazos fixada no n" I do art. 6"da lei n" 4-B/202I, devendo antes aplicar-se o regime previsto non°5 alínea d), para a interposição dos recursos.

XXXIV - Ou ainda o Ac STJ de 07/06/2022: /- Invocando-se. como fundamento de recorribilidade, o "conflito jurisprudencial", tem o recorrente que juntar copiado acórdão fundamento (cfr art. 637. °r n. ° 2, do CPC).

II - Não o fazendo, o recurso será rejeitado, porém, apenas após o recorrente ser convidado a aperfeiçoar a sua alegação recursiva (ou seja, apôs ser convidado a suprir a omissão de tal junção),

XXXV - Pelo presente entende o recorrente que deveria ser notificado para suprir essa falha.

Reiteram-se e reproduzem-se as conclusões quanto ao mérito da questão, já constantes na reclamação apresentada para o senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça

II - Ora. o recurso versa sobre uma série de questões e não se reduz a escolha do acompanhante.

III- Mais entende o recorrente que a escolha do acompanhante, deverá ser conhecida pelo tribunal e ser objecto ele sindicância superior, sob pena de manifesta negação da justiça e ofensiva dos princípios constitucionais consagrados na Constituição da República Portuguesa.

[V - O regime do acompanhante ao maior assenta em vários primados, Além da (i) primado peia autonomia do beneficiário, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até aos limites do possível, são vectores essenciais do regime do maior acompanhado (ii) a subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à capacidade do visado pela medida de protecção, sô admissíveis quando o problema só possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de protecção e de acompanhamento comuns, próprios de qualquer situação familiar, designadamente através dos deveres de cooperação e assistência que  impendem sobre o cônjuge: (iii) a flexibitizaçâo da medida de acompanhamento, dentro da ideia de.que cada caso é uni caso; (iv) a manutenção de um controlo jurisdicional eficaz sobre qualquer constrangimento imposto ao visado: (vj e o primado dos interesses pessoais e patrimoniais cio beneficiário.

V - Existem questões de especial relevância suscitadas no recurso que, ao não serem conhecidas, comprometem de, forma grave- os interesses do recorrente, nomeada utente, a verificação de um conflito de interesses que determina, necessariamente, a escolha de outro acompanhante e ainda a violação flagrante da lei civil, nomeadamente, do disposto nos números I e 2 do artigo 143." do Código Civil, da vontade do acompanhado.

VI - A interpretação das normas temais é das tarefas que mais questões suscita e é nesse sentido que consideramos necessário convocar os elementos de interpretação da lei: in casu não pode deixar de se considerar, para além do elemento literal, os elementos histórico e lógico, isto é. a razão de ser do regime; aquilo que levou á mudança do paradigma e qual a finalidade e razão de ser do Maior Acompanhado.

VII - Assim, partindo do elemento literal, entendemos que a medida de acompanhamento e a escolha do acompanhante não são dissociáveis, aliás, não pode, de maneira nenhuma, deixar de se considerar que a decisão da escolha do acompanhante é. em si mesma, uma decisão relativa ã medida do acompanhamento, porque é dela parte integrante.

VII - A escolha do acompanhante é tão importante como as concretas medidas de acompanhamento, uma vez que. para serem eficazes, terão de ser executadas peia pessoa mais capaz à luz de todas as circunstâncias do caso concreto e respeitando-se a escolha do acompanhado.

IX - O acompanhante não poderá encontrar-se numa situação de conflito de interesses com o acompanhado, sob pena de não ser tutelado o seu interesse, mas sim o interesse daquele: E precisamente o que acontece no caso concreto, em que o acompanhante tem interesses contrários aos do acompanhado, já que se arroga seu credor.

X - Não se vislumbra qualquer razão para uma interpretação restritiva do artigo 901.° do Código de Processo Civil que. tem de ser interpretado no sentido de abranger qualquer segmento da decisão, pois na verdade não existem um sem o outro.

XI- Se o que se visa acautelar ê a pessoa do acompanhado, nomeadamente, os seus interesses, seria, no mínimo. irónico optar por uma via interpretativa que colocasse em causa esses mesmos interesses.

XIJ - O artigo deve ser interpretado no sentido de que sobre as medidas de acompanhamento, apenas aqueles pessoas tem legitimidade. Não pode ser vista no sentido de excluir o recurso sobre as demais questões que se possam colocar num processo de acompanhamento de maior.

XIII - Consta de um acórdão do STJ que '* A 1'." instância fundamentou a decisão de admissão do recurso de apelação no facto de o processo especial de acompanhamento de maiores não prever regras especiais para recorrer, salvo - como se viu supra - ti regra prevista no art. 901 ° ao CPC a respeito do recurso da decisão relativa à medida de acompanhamento. Considerando que tal não significa que as demais decisões proferidas nestes processos sejam irrecorríveis, mas antes que às mesmas é aplicável o regime geral prevista nos arts. 627." e segs. do CPC. ex vi art, J-Í9." n." /, nomeadamente, o disposto no n°2 do art. 63!."do CPC: "As pessoas direta e efetivamente prejudicadas pela decisão podem recorrer dela, ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias".

XIV - O direito fundamental a um processo justo e equitativo não seria acautelado se não fosse admissível recorrer da decisão que designa o acompanhado, deixando o acompanhante a mercê cie uma decisão imponderada do Tribunal da 1.a instância, que não poderia ser controlada por unia instância superior.

XV - A decisão do juiz singular ora colocada em crise, refere-se aos critérios legais de escolha, pertença do acompanhado e só na falta de escolha e que se designa outra, pessoa nos termos do artigo ]43.°CC. Ora ir caso o acompanhante escolheu uma pessoa, o tribunal não seguiu esta escolha e entende o tribunal superior que esta decisão não poderá ser objecto de recurso e reapreciação,

XVI - Mais, a interpretação da norma no sentido da separação dos segmentos decisórios e da não admissibilidade do recurso não é compatível com as garantias constitucionais plasmadas no artigo 20° da Constituição da República Portuguesa.

XVII - O direito fundamental a um processo justo e equitativo não seria acautelado se não fosse admissível recorrer da decisão que designa o acompanhado, deixando o acompanhante á mercê de uma decisão imponderada do Tribunal da l.a instância, que não poderia ser escrutinada por uma instância superior,

XVIII - Não pode. ainda, a escassez de meios disponíveis para administrar a justiça ser utilizada como válvula de escape do sistema para justificar uma Interpretação que vai contra toda a essência e razão de ser do regime do Maior Acompanhado”.


*

II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

Os factos relevantes para a presente decisão são os apresentados no Relatório que antecede e que se dão aqui por reproduzidos.


O DIREITO

A questão a decidir pelos Juízes nesta Conferência é, em síntese, a de saber se deve ou manter-se a decisão de indeferimento da reclamação.

Na decisão impugnada afirmou-se o seguinte:

Em primeiro lugar, o reclamante impugna o despacho de 18.01.2023, na parte em que não admitiu a reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 652.º, n.º 5, do CPC.

Diz-se nesta norma, sobre as funções do relator:

“1 - O juiz a quem o processo for distribuído fica a ser o relator, incumbindo-lhe deferir todos os termos do recurso até final, designadamente:

a) Corrigir o efeito atribuído ao recurso e o respetivo modo de subida, ou convidar as partes a aperfeiçoar as conclusões das respetivas alegações, nos termos do n.o 3 do artigo 639.o;

b) Verificar se alguma circunstância obsta ao conhecimento do recurso;

c) Julgar sumariamente o objeto do recurso, nos termos previstos no artigo 656.o;

d) Ordenar as diligências que considere necessárias;

e) Autorizar ou recusar a junção de documentos e pareceres;

f) Julgar os incidentes suscitados;

g) Declarar a suspensão da instância;

h) Julgar extinta a instância por causa diversa do julgamento ou julgar findo o recurso, por não haver que conhecer do seu objeto.

2 - Na decisão do objeto do recurso e das questões a apreciar em conferência intervêm, pela ordem de antiguidade no tribunal, os juízes seguintes ao relator.

3 - Salvo o disposto no n.o 6 do artigo 641.o, quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária.

4 - A reclamação deduzida é decidida no acórdão que julga o recurso, salvo quando a natureza das questões suscitadas impuser decisão imediata, sendo, neste caso, aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os 2 a 4 do artigo 657.o.

5 - Do acórdão da conferência pode a parte que se considere prejudicada:

a) Reclamar, com efeito suspensivo, da decisão proferida sobre a competência relativa da Relação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o qual decide definitivamente a questão;

b) Recorrer nos termos gerais”.

Os casos de incompetência relativa estão previstos no artigo 102.º do CPC, norma que tem o seguinte teor:

“A infração das regras de competência fundadas no valor da causa, na divisão judicial do território ou decorrentes do estipulado na convenção prevista no artigo 95.º determina a incompetência relativa do tribunal”.

O presente recurso nada tem a ver com os casos de incompetência relativa previstos no artigo 102.º do CPC, logo, o artigo 652.º, n.º 5, do CPC não poderá aplicar-se-lhe.

O reclamante alega que o regime do artigo 652.º, n.º 5, do CPC deveria aplicar-se, a fortiori, aos casos de incompetência absoluta.

Os casos de incompetência absoluta estão previstos no artigo 96.º do CPC, onde pode ler-se:

“Determinam a incompetência absoluta do tribunal:

a) A infração das regras de competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras de competência internacional;

b) A preterição de tribunal arbitral”

O presente recurso nada tem nada a ver com os casos de incompetência absoluta previstos no artigo 96.º do CPC, logo, ainda que a procedência do argumento a fortiori pudesse ser apreciada, nunca o regime do artigo 652.º, n.º 5, do CPC poderia aplicar-se-lhe.

Em segundo lugar, o reclamante impugna o despacho 18.01.2023, na parte em que não admitiu a convolação da reclamação em recurso ou, admitindo a convolação, não admitiu o recurso de revista.

O artigo 671.º, n.º 1, do CPC de 2013 é do seguinte teor:

“Cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”.

A regra do artigo 671.º, n.º 1, do CPC tem como corolário a regra de que não é admissível recurso de revista de acórdão da Relação que não admita o recurso de apelação[1].

O caso típico é o do recurso de revista contra um acórdão da Relação que confirme o despacho proferido pelo Relator de não admissão do recurso de apelação: em primeiro lugar, o acórdão da Relação que indefere uma reclamação contra um despacho do relator que não admite o recurso de apelação não é um acórdão que conheça do mérito da causa e, em segundo lugar, não é um acórdão que ponha termo ao processo, “absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”[2] [3].

Salvaguarda-se tão-só os casos em que esteja preenchida “alguma das previsões excepcionais do art. 629.º, n.º 2, e 671.º, n.º 2”[4].

Como se diz, por exemplo, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.02.2019 (Proc. 27417/16.6T8LSB-A.L1.S2), “caso se verifique alguma das previsões excepcionais do art. 629.º, n.º 2, do Código de Processo Civil — nomeadamente a da sua alínea d) —, o recurso de revista é admissível”.

O reclamante vem alegar, na presente reclamação, que o recurso é admissível ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, al. a), do CPC por haver violação das regras de competência em razão da matéria (cfr. conclusões IX e X).

Vem ainda alegar, na presente reclamação, que o recurso é admissível ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, al. a), e do artigo 671.º, n.º 2, al. b), do CPC por haver contradição entre o acórdão recorrido e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.01.2021, invocado na reclamação (cfr. conclusões XI, XII, XIII, XIV, XV, XIX, XX e XXI).

A alegação, na presente reclamação, de que o recurso é admissível ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, al. a), do CPC nunca procederia, entre outras razões, porque, como se disse atrás, o presente recurso nada tem a ver com a competência, absoluta ou relativa, do tribunal.

A alegação, na presente reclamação, de que o recurso é admissível ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, al. a), e do artigo 671.º, n.º 2, al. b), do CPC por haver contradição entre o acórdão recorrido e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.01.2021 tão-pouco pode proceder.

O artigo 637.º, n.º 2, do CPC é do seguinte teor:

“O requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; quando este se traduza na invocação de um conflito jurisprudencial que se pretende ver resolvido, o recorrente junta obrigatoriamente, sob pena de imediata rejeição, cópia, ainda que não certificada, do acórdão fundamento”.

A verdade é que em nenhum momento das alegações ou das conclusões do requerimento apresentado como reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (que é, recorde-se, o requerimento que o reclamante pretendia / pretende que fosse / seja convolado e admitido como recurso de revista), se faz qualquer referência ao artigo 629.º, n.º 2, al. d), ou ao artigo 671.º, n.º 2, als. a) ou b), do CPC.

O facto de a ré, agora recorrente, fazer referência, na presente reclamação, ao acórdão do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.01.2021, não é suficiente para fazer valer a sua pretensão.

Como se diz, por exemplo, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.09.2017 (Proc. 1029/12.1TVLSB-A.L1.S1)[5] ,

“VI. — A mera citação e referência a jurisprudência variada nas alegações de revista, no sentido e em apoio da solução que a recorrente defende e pretende ver reconhecida pelo tribunal, não se confunde com a invocação do fundamento específico da revista respeitante a conflito jurisprudencial evidenciado pela contradição ou oposição entre o acórdão recorrido e outro acórdão (da Relação ou do STJ).

VII. — Não é por se citarem vários acórdãos, sufragando a mesma solução de determinada questão de direito que, só por si, se invoca a contradição de julgados”.

As alegações correspondentes às conclusões XI, XII, XIII, XIV, XV, XIX, XX e XXI podem ser interpretadas como uma tentativa da ré, agora recorrente, para corrigir o seu requerimento, as suas conclusões enunciadas no requerimento apresentado como reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, deduzindo, como fundamento subsidiário de recorribilidade, a contradição jurisprudencial prevista no artigo 629.º, n.º 2, al. d), ou no artigo 671.º, n.º 2, al. b), do CPC.

O problema é que já não é possível considerar esta tentativa oportuna.

Em termos em tudo idênticos aos do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.02.2021 (Proc. 1148/13.7TJVNF-C.G1.S1), dir-se-ia que as alegações feitas “[são], obviamente, insuscetíve[is] de modificar os termos da interposição de recurso, o[s] qua[is], em momento oportuno, fo[ram] definido[s] pelos recorrentes nas respectivas alegações”.

Face ao exposto, indefere-se a presente reclamação e mantém-se o despacho reclamado.

Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 1 UC”.

Tudo visto, não pode deixar de se secundar à decisão impugnada.

Quanto às razões que justificam o indeferimento da presente reclamação, elas foram claramente explicitadas naquela decisão, devendo considerar-se reproduzidas aqui para efeito de fundamentação.

E a verdade é que o recorrente / reclamante não aduz qualquer argumento novo capaz de abalar a decisão de indeferimento, pelo que pouco há, em rigor, a acrescentar.

Se alguma coisa, talvez seja conveniente insistir numa clarificação, relacionada com o fundamento subsidiário de recorribilidade (só) agora deduzido – a contradição jurisprudencial prevista no artigo 629.º, n.º 2, al. d), ou no artigo 671.º, n.º 2, al. b), do CPC.

 Ao contrário do que o reclamante alega, em especial, nas conclusões XXIX a XXXV, aquilo que aqui está em causa não é – nunca foi – uma falha susceptível de suprimento por mero convite à junção de acórdão.

Por isso, não vale concitar, contra a presente decisão, certos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, em que, como logo se compreende a partir dos respectivos sumários (transcritos pelo reclamante nas conclusões XXXIII e XXXIV), estão em causa recursos interpostos, expressis verbis, com fundamento específico em determinada contradição de julgados, faltando apenas a junção da cópia do Acórdão fundamento.  Nesses casos – mas só nesses casos – justifica-se o convite ao suprimento da omissão, dado que se trata somente de “ilustrar” ou de “apoiar” uma contradição que já foi expressamente invocada e explicitada nas alegações de recurso.

Ora, o que acontece no presente caso é completamente distinto. Como se disse na decisão singular, em nenhum momento das alegações ou das conclusões do requerimento apresentado como reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (que é o requerimento que o reclamante pretende que seja convolado e admitido como recurso de revista), se faz qualquer referência ao artigo 629.º, n.º 2, al. d), ou ao artigo 671.º, n.º 2, als. a) ou b), do CPC.

Em face disto, não vale o reclamante contrapor que devia ser adoptada aqui uma “visão diferente (…) menos formalista e mais preocupado com a justiça material” (cfr., em especial, conclusão XXXIII).

O “argumento da justiça material” ou argumentos do tipo podem, com certeza, justificar que o tribunal interprete e “adapte” as alegações de recurso à luz ou em conformidade com uma vontade implícita ou subjacente do recorrente. Trata-se, normalmente, de casos em que esta vontade não foi perfeitamente expressa ou não foi acompanhada de alguma formalidade que, sendo embora legalmente exigível, tem um valor acessório ou instrumental em relação ao que se alegou.

Nenhum argumento daquele tipo poderá, contudo, justificar que o tribunal tenha o poder de definir, ele próprio, as alegações de recurso, modificando-as à medida dos interesses do recorrente. Isso seria uma ingerência inadmissível, porquanto implicaria, desde logo, uma clara violação do princípio da igualdade das partes e do princípio da igualdade em geral.


*


III. DECISÃO

Pelo exposto, confirma-se o despacho reclamado e mantém-se a decisão de inadmissibilidade da revista.


*


Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

*


Lisboa, 11 de Maio de 2023


Catarina Serra (Relatora)

Cura Mariano

Fernando Baptista

_____

[1] Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2020 (6.ª edição), pp. 224-232 (esp., p. 229).

[2] Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19.02.2015 (Proc. 3175/07.4TBVCT-B.G1-A.S1), de 21.02.2019 (Proc. 27417/16.6T8LSB-A.L1.S2), de 10.12.2019 (Proc. 4154/15.3T8LSB-C.L1.S2), de 25.02.2021 (Proc. 12884/19.4T8PRT-B.P1-A.S1), de 28.10.2021 (Proc. 2743/17.0T8GMR-D.G1.S1), de 9.12.2021 (Proc. 2290/09.4TJPRT-B.P1.S1), de 5.05.2022 (Proc. 932/17.7T8LSB.L1.S1), de 11.05.2022 (Proc. 400/11.0TBCVL-I.C1.S1), de 7.06.2022 (Proc. 400/11.0TBCVL-J.C1.S1) e de 14.07.2022 (Proc. 575/05.8TBCSC-W.L1-A.S1).

[3] Em termos semelhantes, cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3.11.2020 (Proc.  1560/13.1TBVRL-N.G1.S1): “Não admite recurso de revista o acórdão da Relação que confirme o despacho do relator que rejeite o recurso de apelação, por ilegitimidade do apelante, terceiro num procedimento cautelar”.

[4] Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no novo Código de Processo Civil, cit., p. 229.

[5] Citado, por exemplo, nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 6.06.2019 (Proc. 143/11.5TBCBT.G1.S2), de 18.02.2021 (Proc. 1148/13.7TJVNF-C.G1.S1), de 18.022021 (Proc. 17/18.9YLPRT-A.P1.S1-A) e de 18.03.2021 (Proc. 2111/12.0TVLSB.L1-A.S1).