Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3218/04.3TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO
NULIDADE DE ACÓRDÃO
CONDENAÇÃO EM OBJECTO DIVERSO DO PEDIDO
Data do Acordão: 05/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL -- PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA ( NULIDADES ).
Doutrina:
- Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, pág. 39.
- Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, Limitada, 298.
- Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 362.
- Paulo Cunha, Processo Comum de Declaração, tomo II, 2.ª edição, citado por Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 16/05/2012, PROCESSO N.º 1598/08.0TTLSB.L1.S1 - 4.ª SECÇÃO.
Sumário :
Tendo a Autora pedido a condenação da Ré a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, determinado período de tempo, e a pagar as respetivas diferenças salariais, a condenação da Ré a proceder à retificação de uma lista de antiguidade publicada pela empregadora, sem que tal tenha sido pedido, configura uma condenação em objeto diverso do pedido, que determina a nulidade dessa parte do acórdão.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                           I

  1. AA (A.) intentou a presente ação, sob a forma de processo comum, contra TAP Air Portugal, S.A., (R.) pedindo a condenação desta:
a)  A reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de
serviço, como assistente de bordo (A/B) que prestou na base de ..., entre 02 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975, e em consequência:

- A pagar as diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial nos tempos próprios, tudo a apurar em execução de sentença, acrescida dos juros de mora vencidos e a vencer até integral pagamento;
- A repô-la no escalão salarial correto: o de chefe de cabine (C/C II), com efeitos desde maio de 1997;
b)  A pagar-lhe indemnização por danos morais, em montante não inferior a €
10.000,00.

Para o efeito, alegou, em síntese:
-    É trabalhadora integrante do quadro de efetivos da R., tendo atualmente a categoria profissional de chefe de cabine;
-    Foi admitida pela R. em 2 de novembro de 1971, como Assistente de Bordo, tendo exercido essas funções na base de Lisboa até maio de 1974 e, depois desta data, na base de ..., em ..., até abril de 1975;
-    Atentas as conturbações políticas que, então, se faziam sentir naquele País, a Ré, em maio de 1975, encerrou a sua Base em ..., pelo que foi compelida a exercer funções em terra como assistente de terra e permanecendo em ... até maio de 1978, data em que regressou a Portugal e voltou aos voos e onde permanece até hoje;
-    A R. não tem vindo a considerar, para efeitos de contagem de antiguidade de função e de categoria, o período de tempo de trabalho em que exerceu a sua atividade como assistente de bordo entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975, sendo que, em consequência, tem sofrido os prejuízos patrimoniais consistentes em diferenças salariais, por não se ter verificado evolução salarial no que respeita à promoção e à progressão técnica nos momentos em que tal se imporia, cujo valor deverá ser apurado em execução de sentença mas que não se pode computar em quantia inferior a € 15.000,00, bem como prejuízos não patrimoniais consistentes numa contínua vexação à sua dignidade profissional por ver colegas de menor antiguidade ter ascendido à posição de chefia muito antes, vivendo momentos de grave ansiedade e padecendo de mágoa, abalo psíquico e emocional, danos morais que devem ser ressarcidos em valor não inferior a € 10.000,00.
Não tendo sido obtida a conciliação na audiência de partes, a R. foi notificada para contestar, tendo alegado, em resumo:
- A A. foi, por si, admitida em 02/11/1971, tendo iniciado curso de assistente de bordo e, após aprovação no mesmo, passou ao exercício de funções de assistente de bordo (A/B) em Lisboa, sendo que a seu pedido foi transferida para a base de ... em 06/06/1974, onde ficou após ter rejeitado a transferência para Lisboa após extinção daquela base, passando a exercer as funções de assistente de terra (A/T) até 1978, data em que, por conveniência pessoal, pretendeu voltar para Lisboa, interrompendo a sua relação de trabalho com o empregador;
- Em 24/05/1978, a A. celebrou com a ora R. um contrato-promessa de contrato de trabalho, nos termos do qual e sob condição suspensiva de obtenção de aproveitamento no respetivo curso e de verificação da aptidão médica, a A. seria novamente admitida para as funções de A/B, como veio a suceder, assim se iniciando nova relação de trabalho;
- O pedido que a A. lhe fez no sentido de que fosse contado o tempo em que exerceu funções de A/B inicialmente em Lisboa e depois em ..., envolve o reconhecimento de que tinha havido duas relações laborais distintas e um novo vínculo a partir de 1978 e que, não estando a isso obrigada e sem que a A. tivesse efetivamente tanto tempo de serviço anterior, a ora R. decidiu considerar para efeitos de antiguidade de serviço o tempo que a A. tinha exercido funções de A/B: 3 anos, 6 meses e 4 dias, tendo sido integrada como «A/B 4 anos» com efeitos reportados a 01/01/1979, tendo sido dadas instruções aos serviços financeiros da R. para se processar à A. no vencimento de 1984 quer a reintegração salarial, quer o pagamento das diferenças salariais, importâncias que recebeu, pelo que todo o tempo em que a A. prestou serviço como A/B, quer no primeiro contrato de 1971, quer no segundo vínculo a partir de 1978, foi considerado para efeitos de antiguidade de serviço;
- Tendo a Autora em função dessa antiguidade de serviço assim considerada progredido normalmente na carreira como se estivesse estado ininterruptamente ao serviço da R. desde a sua admissão em 2/11/71;
- E, por isso, a A. atingiu os níveis IV e V da evolução salarial da sua carreira (CAB IV e CAB V, última posição da evolução salarial da carreira de Comissário e Assistente de Bordo ou CAB) 3 anos antes das restantes suas colegas que, com ela, mediante novo contrato, ingressaram na carreira de A/B em 2/5/1978;
- Tendo, na altura própria, passado à categoria profissional seguinte: Chefe de Cabine, sendo que o acesso a esta categoria depende da existência de vagas;
-    A Autora, a seu pedido, viu-lhe ser reconstituída toda a sua carreira profissional como A/B, tendo sido recompensada com as diferenças salariais de acordo com a antiguidade que lhe foi considerada, tendo evoluído na carreira sem qualquer constrangimento e de acordo com a antiguidade que lhe foi reconhecida, tendo sido promovida a C/C na data que podia e devia ter sido, em igualdade de circunstâncias com os colegas, não tendo a autora sofrido quaisquer danos patrimoniais ou morais, apresentando-se a litigar com má-fé.
Concluiu pedindo que a ação seja julgada improcedente com a sua absolvição do pedido e condenada a A. como litigante de má-fé em multa e indemnização.
A A. apresentou articulado de resposta, alegando, em suma, que não nega ter recebido o valor de € 412.026$00, mas que não pode a R. afirmar que a A. sabia que tais dinheiros se reportavam aos créditos reclamados nesta ação, isto porque nem a R. consegue explicar a origem daquele montante; que nunca se verificou a extinção do vínculo laboral da A. porque esta trabalhou, ininterruptamente, para a R., sendo que a assinatura do contrato promessa invocado na contestação só aconteceu por lapso, uma vez que a A. integrou uma turma, no concurso, formada apenas por ex-assistentes de bordo readmitidas na empresa após interrupção do seu vínculo laboral, que não era o seu caso, tendo a R. reconhecido, inclusive, que a mesma não era um caso de readmissão mas de transferência temporária para terra, pelo que a atribuição dos 3 anos, 6 meses e 4 dias é um direito da A. e não uma mera liberalidade da R. e que tendo a R. admitido que a A. tinha antiguidade idêntica à dos quatro elementos que integraram o curso de 1996 e improcedendo a alegada virtualidade da sua antiguidade, então há expresso reconhecimento de que deveria a mesma ter integrado este curso e não o fazendo verificou-se preterição e, consequentemente, há diferenças salariais a apurar em sede de execução de sentença, diferenças salariais que sempre resultariam verificadas ainda que a ré tenha contado os 3 anos, 6 meses e 4 dias, pois isso determinaria que a antiguidade da autora se reportaria a 29 de outubro de 1974 e não 1975, como alega a ré.
Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença que decidiu julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência:
A) Condenar a R. a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como A/B, que a A. prestou na base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975;
B) Condenar a R. a pagar à A. as quantias correspondentes às diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial desde novembro de 1984, a liquidar em execução de sentença, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação até integral pagamento;
C) Absolver a R. do demais peticionado.

2. A A. e a R. interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa que decidiu:

- Julgar improcedente o recurso da Autora;

- Julgar parcialmente procedente o recurso da Ré e, em consequência, alterar a alínea A) do dispositivo da sentença no sentido de “ condenar a R. a retificar a lista de antiguidade/senioridades da tripulação por si emitida, com data de 24/05/2007, nela fazendo constar a real antiguidade da Autora”;

- Manter no mais a sentença recorrida.

3. Inconformada com o acórdão, a R. interpôs recurso de revista, tendo no requerimento de interposição de recurso, expressa e separadamente, arguido nulidade do acórdão, ao abrigo do disposto no artigo 615.°, n.º 1, alínea d), in fine, e e), do Código de Processo Civil, ou, subsidiariamente, da parte final da alínea b), por entender que se verifica pronúncia sobre questões de que o tribunal não podia tomar conhecimento, ou condenação em objeto diverso do pedido.

Quanto ao recurso de revista formulou as seguintes conclusões:

1) A decisão recorrida, na parte em que condena a ora Recorrente a retificar a lista de antiguidade/senioridades da tripulação por si emitida com data de 24/05/2007, nela fazendo constar a real antiguidade da Autora, aqui Recorrida, é nula.

2) A nulidade resulta de indevida pronúncia “Ex novo” acerca de questão de que o Tribunal da Relação de Lisboa não podia conhecer (por não ter sido submetida à apreciação do Tribunal do Trabalho de Lisboa nem ser de conhecimento oficioso) e condenação em objeto diverso do pedido na ação. Realmente,

3) O eventual erro constante da lista em causa não foi suscitado perante a 1.ª instância como questão a debater na ação, porquanto as questões que foram submetidas eram relativas à antiguidade de função e de categoria da Recorrida, e não à sua antiguidade de serviço, a que a lista respeitava.

4) A Recorrida também não pediu na ação que a Recorrente fosse condenada a retificar a lista em causa, e apenas a fez juntar aos autos com vista à prova de que a Recorrente não lhe contara para efeitos daquela antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como Assistente de Bordo que a Recorrida lhe prestara na Base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975, prova essa que a Recorrida não logrou fazer, antes se tendo provado o contrário.

5) Não se verificam os pressupostos da condenação extra vel ultra petitum, nem invocado o artigo 74.º do Código de Processo Civil, nem observado o contraditório que em tal eventualidade seria imposto nos termos do n.º 3 do artigo 3.º, do Código de Processo Civil.

6) Tão pouco se referem quaisquer preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho que pudessem invocar uma tal condenação além do pedido.

4. A A. não apresentou contra-alegações.

5. Em conferência, no Tribunal da Relação, foi decidido julgar improcedente a arguição das nulidades, mantendo-se na íntegra o Acórdão proferido, tendo o recurso de revista sido admitido.

 

6. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, tendo concluído: “…deflui da facticidade assente que a ré, por comunicação de serviço de 20/08/1984, decidiu considerar para efeitos de antiguidade de serviço, o tempo em que a autora tinha exercido funções de assistente de bordo e, em consequência, foi determinado por aquela o processamento do pagamento das diferenças salariais reportadas a 01/01/1979, conforme mostra o documento de folhas 72.

A quantia referente àquele pagamento foi processada no vencimento da autora de Outubro de 1984. Contudo, na lista de antiguidade/senioridades da tripulação emitida pela ré com data de 24/05/2007, a autora continua a ter o tempo de serviço referido 02/05/1978, pese embora aquela haja reconhecido a antiguidade de função e de categoria da autora, nos termos acabados de expor.

Conforme refere o acórdão, não foram alegados nem se provaram quaisquer factos que justifiquem a inclusão da autora na referida lista com o tempo de serviço reportado a 2/5/1978 quando, a ré já havia reconhecido à Autora a antiguidade que esta reclamava.

Por outra banda, a recorrente não invocou sequer que a lista mencionada enfermasse de qualquer erro.

Tendo a própria ré reconhecido pois a real antiguidade de função e de categoria da autora e não tendo alegado qualquer erro na referida lista, impunha-se que esta fosse devidamente corrigida afigurando-se tal correção como uma necessidade inerente à reposição do real trajeto profissional da recorrida e do seu posicionamento na estrutura da sua entidade patronal, pelo que não se nos afigurando verificada a invocada nulidade, se emite parecer no sentido de ser negada revista, antes devendo ser confirmado o Acórdão sub judice”.

 

7. A recorrente respondeu ao parecer salientando que o mesmo não apresenta nenhum fundamento que seja apto a refutar a linha argumentativa apresentada pela recorrente nas suas alegações de revista.

8. Nas conclusões das alegações do seu recurso de revista a recorrente suscita as seguintes questões:

a) A nulidade do acórdão recorrido com fundamento no disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea d), parte final, e alínea e), do Código de Processo Civil;

b) Se carece de suporte fático e de fundamento legal a condenação proferida pelo Tribunal da Relação.

Cumpre apreciar o objeto do recurso interposto.

                                                           II


1. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

1) A A. é trabalhadora integrante do quadro de efetivos da R., tendo à data da instauração da ação a categoria profissional de chefe de cabine e auferindo mensalmente um vencimento base de € 1.986,00;

2) A A. foi admitida na empresa em 02 de novembro de 1971, como assistente de bordo, tendo exercido as inerentes funções, na Base de Lisboa, até maio de 1974 e, depois desta data, na base de ..., em ..., até abril de 1975;

3) Atentas as conturbações políticas que então se faziam sentir naquele País, a R. veio a encerrar, em maio de 1975, a sua base em ...;

4) A A., após o encerramento referido em 3), passou a exercer funções como assistente de terra, permanecendo em ... até maio de 1978, data em que regressou a Portugal onde, na sede da R., regressou ao voo;

5) Em maio de 1997 a A. ascendeu à categoria de chefe de cabine;

6) A A. é associada no SNPVAC - Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil;

7) Com data de 07/10/2002 a A. remeteu à R., na pessoa do então diretor de recursos humanos, um escrito, comunicando-lhe, além do mais, o seguinte:

“(...) Fui admitida na TAP em 2/11/71, como A/B funções que exerci até abril/75.

Entre maio deste ano, após o fecho da base de ... e maio de 78, exerci funções em terra.

Depois, regressei ao voo.

Ora, como tenho vindo a reclamar insistentemente, aquele período de 71 a 75 deve ser contabilizado também para efeitos de antiguidade de função e de categoria.

Como V. Exas. bem compreenderão, têm sido múltiplos os prejuízos patrimoniais (evolução salarial, promoção e progressão técnica) e também morais, por sentir que a recusa da TAP em repor uma situação justa, moral e legal afeta a minha dignidade profissional.

Doutro passo, essa conduta constitui manifesta violação ao disposto na al) n), do art.º 3, do AE/PNC em vigor, uma vez que o desenvolvimento da minha carreira tem vindo a ser gravemente afetado.

Com efeito, para aferir da antiguidade, há que contar com o tempo efetivo de desempenho de funções, quer seja sucessivo, quer interpolado - é, assim, o entendimento prevalente na jurisprudência.

Pelas razões expostas, venho solicitar a V. Exa. uma reavaliação do meu processo e a urgente reposição da antiguidade, com todas as consequências inerentes. (...)” - cfr. doc. junto a fls. 20-21 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

8) Por carta datada de 23/01/2003, comunicou a A. à R., na pessoa do então diretor de recursos humanos, o seguinte:

“ (...) Venho, por este meio, reiterar a minha carta de 02.10.07 que anexo, solicitando uma resposta de V. Exa. no mais curto espaço de tempo, se possível. (...)” - cfr. doc. junto a fls. 23 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

9) A A. iniciou no dia 02/11/1971 o curso de assistente de bordo, tendo iniciado, após aprovação nesse curso, as funções próprias dessa categoria em 01/03/1972;

10) Em 06/05/1975, em razão da extinção da base de ..., a A., rejeitando ser transferida para Lisboa juntamente com os restantes tripulantes por motivos pessoais do seu exclusivo interesse, passou a exercer funções de Assistente de Terra;

11) A A. subscreveu um documento, dirigido ao Diretor de Operações de Voo, nos seguintes termos:

“ (...) tendo tomado conhecimento da próxima existência de pessoal de cabine, baseado em ..., vem por este meio pedir a V. Exa. se digne transferi-la como A/B para ... como empregada local (LAD), por motivos de ordem familiar.

Grata pela atenção que V. Exa. possa dispensar a este meu pedido (...) ” - cfr. doc. junto a fls. 63 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

12) Em resposta, por escrito datado de 30/04/1974, foi comunicado à Autora:

“ (...) Com referência ao seu pedido de integração no quadro local de LAD como assistente de bordo, informamos que a mesma está dependente do apuramento dos cursos locais e caso venha a verificar-se a sua ida será levada a efeito nas condições constantes da CS. n.º 9/74 da Divisão de Administração do PNC.

As férias e respetivo subsídio serão atribuídos nas mesmas condições do PNC de Lisboa, se outros de maior montante lhes não vierem a ser atribuídos.

Quanto ao mais serão aplicáveis as disposições de lei geral do Estado de ..., bem como as disposições em vigor para os empregados de idêntica categoria ali admitidos. (...)” -cfr. doc. junto a fls. 64 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

13) Pelo chefe do pessoal navegante comercial da R. foi subscrito o ofício junto a fls. 65 dos autos, dirigido ao diretor de operações de voo, onde o mesmo lhe comunica, além domais:

“ (...) Como é do conhecimento de V. Exa. dos 23 elementos de que se compunha o núcleo, 19 manifestaram o seu desejo de serem transferidos, foram-no já, estando portanto 4 neste momento, ainda baseados em ..., onde a função para a qual o referido núcleo foi criado, desapareceu já neste momento, ou está em vias de desaparecer a curto prazo pelas rotações de tripulações de que temos conhecimento.

Se assim se entender conveniente, propomos a V. Exa que seja rescindido o contrato efetuado com estes elementos segundo os termos definidos no ACT em vigor. (…)” - cfr. doc. junto a fls. 65 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

14) Pelo diretor de operações de voo, com data de 16/01/1975 foi subscrito ofício, onde, além do mais, fez constar o seguinte:

“ (...) Dos 23 elementos que compunham aquele quadro do PNC LAD, 21 já manifestaram o desejo de transferir-se para Lisboa, o que sucedeu com 20, faltando neste momento apenas a chegada da última.

Restam pois 2 elementos daquele quadro de que a TAP não carece e que são N° ... AA (...)

A primeira destas A/B foi recrutada em Lisboa e transferida para Lisboa a seu pedido.

Nesta conformidade julgamos conveniente rescindir os respetivos contratos de trabalho. (...)”

15) Mais tarde, em 1978, a A., novamente por conveniência pessoal, pretendeu voltar para Lisboa.

16) Com data de 24 de Maio de 1978, a A. subscreveu, como 2.ª contraente, constando como 1.ª outorgante a R., o documento denominado «CONTRATO PROMESSA DE CONTRATO DE TRABALHO A PRAZO», subordinado às cláusulas que dele constam, designadamente, às seguintes:

Cláusula 1.ª

A 2.ª contraente, se o não foi ainda, deverá ser considerada apta no exame médico e, ou, psicotécnico.

Clausula 2.ª

Terminado que seja o aproveitamento o curso teórico de A/B que o 2.º contraente se encontra a frequentar, deverá esta passar, também com aproveitamento, o exame que lhe será feito em voo.

Clausula 3.ª

Satisfeitas que sejam as exigências mencionadas nas cláusulas precedentes, considera-se a 2.ª contratante ao serviço da 1ª contratante a partir do dia seguinte ao exame em voo e até ao dia 30 de novembro do ano corrente

Cláusula 4.ª

O contrato de Trabalho que ora se promete, observados que sejam os condicionalismos anteriores, obriga a 2.ª contratante a exercer as atividades e funções próprias da categoria profissional de Assistente de Bordo, vinculando-se a 1ª contratante a pagar à 2.ª contratante as remunerações que durante o decurso do Contrato de Trabalho estiver a pagar ao escalão inicial da tabela de salários aplicável à referida categoria profissional do seu quadro permanente. (...)» - cfr. doc. junto a fls. 67-68 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

17) Por ofício datado de 20/08/1984 pelo diretor das relações de trabalho da R. foi comunicado, além do mais:

“ (...) informa-se que também relativamente às BB devem ser feitas as respetivas integrações salariais com os correspondentes aumentos e alteração das diuturnidades a que houver lugar. (...)” - cfr. doc. junto a fls. 69 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

18) A R., por comunicação de serviço de 20/08/1984, decidiu considerar para efeitos de antiguidade de serviço, o tempo em que a A. tinha exercido funções de A/B (assistente de bordo), que correspondia nessa data a 3 (três) anos, 6 (seis) meses e 4 (quatro) dias;

19) A A. foi integrada como A/B 4 anos com efeitos reportados a 01/01/1979;

20) Na sequência do referido em 18), a R. determinou o processamento da quantia de 362.782$00 no salário do mês de outubro de 1984 à A. a título de reintegração salarial e de pagamento das diferenças salariais reportadas a 01/01/1979 - cfr. doc. junto a fls. 72 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

21) A quantia referida em 20) foi processada no vencimento da A. de outubro de 1984, auferindo nesse mês a quantia de Escudos: 412.026$00, que lhe foram processados a título de «Abonos Retroativos e Eventuais».

22) Não obstante o referido em 18) e 19), na lista de antiguidade/senioridades da tripulação emitida pela R. com data de 24/05/2007, a A. continua a ter o tempo de serviço reportado a «02/05/1978»;

23) A A. atingiu os níveis IV e V da evolução salarial da sua carreira (CAB IV e CAB V, última posição da evolução salarial da carreira de comissário e assistente de bordo ou CAB) 3 (três) anos antes das restantes suas colegas que com ela, mediante contrato, ingressaram na carreira de A/B em 02/05/1978, a A. chegou a CAB V em 1/06/1990 e as restantes colegas em 01/06/1993; (versão já retificada)

24) A A. integrou a categoria de chefe de cabine em 1997, depois de permanecer na posição de CAB5 desde Junho de 1990;

25) Os comissários e assistentes de bordo no curso de 1995 tinham como antiguidade de serviços os anos de 1971, 1972, 1973 e 1974;

26) No curso de 1996 dos 38 tripulantes promovidos a C/C, 34 (trinta e quatro) tinham antiguidade reportada a 1974 e 4 (quatro) a 1975;

27) A A. foi promovida a C/C ao mesmo tempo que os colegas que com ela frequentaram o curso de A/B em Maio de 1978;

28) A R. remeteu um escrito ao Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil, comunicando-lhe o seguinte:

“(...) constata-se que, posteriormente à Circular C4/70/80 - aliás também referida por esse Sindicato - não se considerou, para efeitos de evolução salarial, o tempo de serviço anterior em caso de readmissões, conforme orientação dessa Circular.

Atendendo porém a que a A/B CC não constitui um caso de readmissão e que outros casos idênticos anteriores - transferência temporária para terra - foram resolvidos no sentido pela mesma pretendido, vão ser dadas instruções aos Serviços para que seja considerado o exercício de funções anterior como A/B no seu posicionamento na tabela salarial/PNC.

O mesmo tratamento será dado às BB, cujas situações são semelhantes às da A/B CC (...)”- cfr. doc. junto a fls. 93 dos autos e cujo teor se considera aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

29) Em virtude do referido em 22), a A. sente-se magoada, vexada na sua dignidade profissional e ansiosa.

A sentença considerou não provados os seguintes factos:

a) A A. foi compelida a exercer funções em terra como assistente de terra (A/T);

b) O referido em 7) ocasionou a que a A. não auferisse a quantia de € 15.000,00 a título de diferenças salariais;

c) A A. viu colegas de menor antiguidade ascender à posição de chefia muito antes;

d) A conduta da R. ocasionou à A. uma baixa médica compulsiva de há 18 meses desde a data da instauração da ação.

2. Os presentes autos respeitam a ação de processo comum instaurada em 30 de julho de 2004, tendo o acórdão recorrido sido proferido em 14 de setembro de 2016.

Assim sendo, o regime processual aplicável é o seguinte:

- O Código de Processo Civil, na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, com exceção do regime da dupla conforme, atento o disposto no art.º 7.º, n.º º1 da referida lei;

- O Código de Processo do Trabalho, na versão da dada pelo Decreto-lei n.º 38/2003, de 08/03.

3. Como já se referiu, a recorrente, no requerimento de interposição de recurso de revista, expressa e separadamente, arguiu a nulidade do acórdão, ao abrigo do disposto no artigo 615.°, n.º 1, alínea d), in fine, e e), do Código de Processo Civil, ou, subsidiariamente, da parte final da alínea b), por entender que se verifica pronúncia sobre questões de que o tribunal não podia tomar conhecimento, ou condenação em objeto diverso do pedido.

Por seu turno, nas conclusões da alegação do recurso de revista que interpôs, suscitou duas questões:

 - A nulidade do acórdão recorrido com fundamento no disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea d), parte final, e alínea e), do Código de Processo Civil;

- A falta de suporte fático e de fundamento legal para a condenação proferida pelo tribunal da relação.

Iremos começar, pela alegada nulidade do acórdão, pois caso a mesma seja procedente ficarão prejudicadas as outras questões.

O art.º 615.º, do Código de Processo Civil, com o título “ Causas de nulidade da sentença”, na parte invocada pelo recorrente, refere o seguinte:

1 - É nula a sentença quando:

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

No caso concreto dos autos, a A. intentou a presente ação, sob a forma de processo comum, contra a R. pedindo a condenação desta:
a)  A reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de
serviço, como assistente de bordo (A/B) que prestou na base de ..., entre 02 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975, e em consequência:

- A pagar as diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial nos tempos próprios - tudo, a apurar em execução de sentença - acrescida dos juros de mora vencidos e a vencer até integral pagamento;
- A repô-la no escalão salarial correto: o de chefe de cabine (C/C II), com efeitos desde maio de 1997;

b) A pagar-lhe indemnização por danos morais, em montante não inferior a €
10.000,00.

Na primeira instância, foi proferida sentença que decidiu julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência:
A) Condenou a R. a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como A/B, que a A. prestou na base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975;
B) Condenou a R. a pagar à A. as quantias correspondentes às diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial desde novembro de 1984, a liquidar em execução de sentença, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação até integral pagamento;
C) Absolveu a R. do demais peticionado.
Inconformados com a decisão da 1.ª instância A. e R. interpuseram, respetivamente, recursos de apelação, nos quais foram suscitadas as seguintes questões:
-Recurso da Autora:
- Se a Ré deveria ter sido condenada a pagar à Autora a peticionada indemnização por danos não patrimoniais.
Recurso da Ré:
1-  Se a sentença enferma da invocada nulidade.
2-  Se deve ser alterada a decisão que recaiu sobre a matéria de facto
3-  Se o tribunal a quo errou o julgamento ao condenar a Ré a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como A/B, que a autora prestou na base de ..., entre 2 de Novembro de 1971 e 30 de Abril de 1975 e ao condenar a ré a pagar à autora as quantias correspondentes às diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial desde Novembro de 1984, a liquidar em execução de sentença.
O acórdão do Tribunal da Relação apreciou todas as questões suscitadas nos recursos, começando, por uma razão de precedência lógico-jurídica, pela alegada nulidade da sentença, invocada no recurso interposto pela R., tendo concluído pela improcedência da nulidade.
De seguida, reapreciou a decisão proferida sobre a matéria de facto, uma vez que a mesma tinha sido impugnada pela R., tendo, também, julgado a mesma improcedente.
Fixada a matéria de facto, o Tribunal da Relação entrou na análise da questão de fundo suscitada pela R., que se prendia com o reconhecimento do tempo de serviço que a A. prestou como assistente de bordo na base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975, e as respetivas consequências a nível das correspondentes diferenças salariais.

Quanto a esta questão na decisão recorrida consignou-se o seguinte, que se transcreve:

Analisemos, por fim, se o tribunal a quo errou o julgamento ao condenar a Ré a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como A/B, que a autora prestou na base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975 e ao condenar a Ré a pagar à Autora as quantias correspondentes às diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial desde novembro de 1984, a liquidar em execução de sentença.

Nesta sede, argumentou a recorrente nos mesmos termos em que o fez quanto à alegada nulidade da sentença e que acima já referimos.

Vejamos:

Na presente ação a Autora pediu, além do mais, a condenação da Ré a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como A/B que a Autora prestou na base de ..., entre 02 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975 e, como consequência, a pagar as diferenças salariais verificadas por não ter procedido à evolução do escalão salarial nos tempos próprios - tudo, a apurar em execução de sentença -acrescida dos juros de mora vencidos e a vencer até integral pagamento e a repor a autora no escalão salarial correto: o de C/C II, com efeitos desde maio de 1997.

Da factualidade provada decorre que a Ré, por comunicação de serviço de 20/08/1984, decidiu considerar para efeitos de antiguidade de serviço, o tempo em que a Autora tinha exercido funções de A/B (assistente de bordo), que correspondia nessa data a 3 (três) anos, 6 (seis) meses e 4 (quatro) dias, que a Autora foi integrada como A/B 4 anos com efeitos reportados a 01/01/1979, que na sequência desse reconhecimento a Ré determinou o processamento da quantia de 362.782$00 no salário do mês de outubro de 1984 à Autora a título de reintegração salarial e de pagamento das diferenças salariais reportadas a 01/01/1979 e que a quantia em causa foi processada no vencimento da Autora de outubro de 1984, auferindo nesse mês a quantia de Escudos: 412.026$00, que lhe foram processados a título de «Abonos Retroativos e Eventuais».

Contudo, apesar de a Ré ter procedido ao reconhecimento da antiguidade da Autora, a verdade é que também se provou que na lista de antiguidade/senioridades da tripulação emitida pela Ré com data de 24/05/2007, a Autora continua a ter o tempo de serviço reportado a «02/05/1978».

Ora, a Ré não alegou nem se provaram quaisquer factos que justifiquem a inclusão da Autora na referida lista com o tempo de serviço reportado a 2.5.1978, quando, afinal, a própria, em 1984, já havia reconhecido à Autora a antiguidade que esta reclamava, posicionando-a como Assistente de Bordo de quatro anos (A/B 4 anos), com efeitos reportados a 01/01/1979 e pagando-lhe, então, as diferenças salariais respetivas.

Também é certo que a Ré não invocou a existência de qualquer erro na referida lista vindo agora alegar que "o reclamado reconhecimento de tempo de serviço prestado pela Apelada como assistente de bordo já havia sido comprovadamente efetuado pela Apelante em 1984 para efeitos de antiguidade de função e de categoria, efeitos esses que eram os únicos que estavam em jogo como resulta do pedido formulado pela autora na petição inicial, então um documento relativo à antiguidade de serviço (conceito normativamente distinto, como resulta da regulamentação coletiva do trabalho aplicável...), em nada interfere com aquele prévio reconhecimento, nem o anula, nem torna justificada a condenação em novo reconhecimento".

Ou seja, a Ré admite que a circunstância de a antiguidade da Autora não se mostrar correta na lista que emitiu em 2007 não tem efeitos sobre o reconhecimento da antiguidade que teve lugar em 1984.

Por outro lado, não se extrai da factualidade provada que a circunstância da Autora constar da referida lista com uma antiguidade que não corresponde à sua a tenha, de algum modo, prejudicado.

Aliás, a Autora não põe em causa o segmento da sentença no qual se conclui que a Ré, em outubro de 1984, lhe reconheceu a antiguidade de 3 anos, 6 meses e 4 dias e que lhe foram pagas as respetivas diferenças salariais.

Contudo, tendo a Ré reconhecido a antiguidade reclamada pela Autora, obviamente que a antiguidade que consta da mencionada lista não corresponde à realidade, pelo que entendemos que deve ser retificada no sentido de nela figurar a real antiguidade da Autora.

E nesta parte não acompanhamos a sentença recorrida quando condena a Ré a reconhecer, para efeitos de antiguidade de função e de categoria, o tempo de serviço, como A/B, que a Autora prestou na base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975, na medida em que tal reconhecimento já foi feito em 1984.

Sucede, porém, que não obstante o reconhecimento da antiguidade da Autora, feito pela Ré, entendemos que, face à factualidade provada, após outubro de 1984, não podemos concluir, como pretende a recorrente, que a evolução no escalão salarial da categoria de Assistente de Bordo se fez nos momentos próprios.

Na verdade, tendo a sentença recorrida concluído que não houve qualquer interrupção da relação laboral existente entre Autora e Ré, o que não foi posto em causa pela recorrente e tendo ficado provado que a Autora atingiu os níveis IV e V da evolução salarial da sua carreira (CAB IV e CAB V, última posição da evolução salarial da carreira de comissário e assistente de bordo ou CAB) 3 (três) anos antes das restantes suas colegas que com ela, mediante contrato, ingressaram na carreira de A/B em 02/05/1978, a autora chegou a CAB V em 1/06/1990 e as restantes colegas em 01/06/1993 e sendo certo que, nos termos da Cláusula 4.ª do Regulamento de Carreira Profissional do PNC a evolução salarial depende do tempo de permanência, então, a Autora, não poderia ter chegado a CAB IV e V apenas três anos antes das colegas que ingressaram (ex novo) na carreira de A/B em 2.05.1978, o que não era o caso da Autora, mas deveria ter atingido essas posições três anos, seis meses e 4 dias antes daquelas.

E nessa medida, a partir de novembro de 1984 são devidas à Autora diferenças salariais decorrentes da evolução salarial da categoria de Assistente de Bordo cujo montante deverá ser apurado em execução de sentença, conforme decidido pela sentença recorrida, embora com fundamentos diversos.

Em consequência, apenas parcialmente procede o recurso da Ré.

Nesta sequência, e após ter sido apreciado o recurso da Autora, referente aos peticionados danos não patrimoniais, que foi julgado improcedente, o Tribunal da Relação decidiu:

- Julgar improcedente o recurso da Autora;

- Julgar parcialmente procedente o recurso da Ré e, em consequência:

- Alterar a alínea A) do dispositivo da sentença nos seguintes termos:

A) Condenar a Ré TAP Air Portugal a retificar a lista de antiguidade/senioridades da tripulação por si emitida, com data de 24/05/2007, nela fazendo constar a real antiguidade da Autora.

- Manter a sentença recorrida, no mais.

Ora, é, precisamente, contra esta alteração do dispositivo da sentença, efetuada pelo Tribunal da Relação, que a R. se insurge, arguindo a nulidade do acórdão.

Sustenta a sua posição na seguinte argumentação, que se sintetiza:

- A questão da eventual existência de erro na lista de antiguidades/senioridades a que se refere o segmento da condenação não foi submetida a juízo por qualquer das partes;

- A retificação da mencionada lista de antiguidades/senioridades não foi pedida na ação nem é de conhecimento oficioso;

- O pedido e a causa de pedir na formulação da A. - não lhe ter sido contado para efeitos de antiguidade de função e de categoria o tempo de serviço, como Assistente de Bordo que prestou na Base de ..., entre 2 de novembro de 1971 e 30 de abril de 1975 - balizam o poder jurisdicional.

- Acrescenta que, em 27/03/2008 a A. veio juntar aos autos diversos documentos, invocando no ponto III desse requerimento, "ex novo", que a R. não contou para efeitos de antiguidade de serviço o tempo que desempenhou funções como Assistente de Bordo antes de ter passado para Assistente de Terra, tendo para o efeito procedido à junção de uma lista de antiguidades/senioridades da tripulação.

- Sucede que, na petição inicial, a A. apenas pediu o reconhecimento da antiguidade de função e de categoria, nunca tendo pedido o reconhecimento da antiguidade de serviço, nem fundamentou a sua pretensão nos autos na contagem da antiguidade de serviço;

- Face a este requerimento da A. a R. pronunciou-se invocando a sua intempestividade, pois o que se discute na ação é a contagem de tempo para efeitos de antiguidade de função e de categoria.

-Por despacho do Juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, que transitou em julgado, foi decidido indeferir a junção aos autos daqueles documentos, uma vez que “a causa de pedir da A. encontra-se balizada em tal articulado, não tendo havido lugar à cumulação sucessiva de pedidos ou causa de pedir (art.º 28.°, do Código de Processo do Trabalho).

- Quanto a este tema, apenas foi dado por provado, no ponto 22, que “Não obstante o referido em 18) e 19), na lista de antiguidade/senioridades da tripulação emitidas pela Ré com data de 24/05/2007, a autora continua a ter o tempo de serviço reportado a 02/05/1978", assim não foi nem podia ser retirada pelo tribunal de 1.ª instância qualquer consequência deste facto assente.

- A A. também não peticionou, mesmo quando juntou aos autos a fls.172 o documento que representa a lista de antiguidades/senioridades da tripulação, a retificação da antiguidade que dela constava.

- Assim, quando o Acórdão se pronuncia sobre a antiguidade de serviço mencionada na lista de antiguidade/senioridades da tripulação e conclui pela condenação da R. na retificação da antiguidade de serviço da A. constante daquela lista, ultrapassa o âmbito da causa de pedir na ação, conhecendo de questão de que não podia tomar conhecimento e condena em objeto diverso do pedido.

O Tribunal da Relação, em conferência, pronunciou-se sobre a aludida nulidade, tendo julgado a arguição improcedente, argumentando que a retificação determinada é uma decorrência do reconhecimento da antiguidade de serviço efetuada pela própria R., conforme decorre do ponto 18) dos factos provados sem que, contudo, tivesse procedido a tal retificação na lista de antiguidades e senioridades em questão e está intimamente ligada com o pedido formulado na alínea a) do pedido.

Acrescentou que a inexatidão constante da lista de antiguidades/senioridades consubstanciada no facto da Autora continuar a ter o tempo de serviço reportado a 2/5/1978 é contraditória com o reconhecimento que a Ré acabou por fazer da antiguidade de serviço da Autora, pelo que deixaria de fazer sentido considerar-se, como se considerou, que a R. reconheceu a antiguidade de serviço da Autora e não determinar a sua retificação, tanto mais, que a matéria do ponto 22 dos factos provados não foi impugnada.

Vejamos se o acórdão recorrido, ao proceder à referida alteração da sentença da 1.ª instância, incorreu em alguma das nulidades alegadas.

As nulidades de sentença, como refere o Juiz Conselheiro Fernando Amâncio Ferreira[1], citando o Professor Paulo Cunha[2], resultam da violação da lei processual por parte do juiz ao proferir alguma decisão, situando-se assim no âmbito restrito da elaboração de decisões judiciais, desde que essa violação preencha um dos casos contemplados no n.º 1, do art.º 668.º, do Código de Processo Civil (atual n.º 1, do art.º 615.º).

  O n.º 1, do art.º 609.º, do Código de Processo Civil, com a epígrafe “ Limites da condenação” impõe que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.

Estes limites da condenação ou limites da sentença assentam no princípio do dispositivo, segundo o qual cabe às partes através do pedido e da defesa circunscrever os temas a decidir.

O princípio do dispositivo, ao longo dos tempos, tem sofrido restrições moldadas por preocupações atinentes à justa composição do litígio e à busca da verdade material, ganhando terreno o princípio contraposto, denominado do inquisitório ou da oficialidade.

De qualquer forma, o legislador tem sido cauteloso ao configurar esses desvios, reservando-os a matérias relacionadas com direitos indisponíveis.

Temos assim que, em regra, a sentença deve manter-se no âmbito do pedido, como consequência da disponibilidade das partes sobre o objeto do litígio.

Como bem observa o Professor Manuel de Andrade[3] “ à não coincidência entre a sentença e os pedidos das partes pode chamar-se extrapetição; se a diferença não é de qualidade mas só de quantidade pode falar-se ainda de ultrapetição ou de infrapetição.

O vício da extrapetição produz a nulidade da sentença: art.º 668.º, n.º 1, alíneas d) e e)”.

Também o Professor Miguel Teixeira de Sousa[4] ao debruçar-se sobre o âmbito do julgamento frisa que “Um limite máximo                                           ao conhecimento do tribunal é estabelecido pela proibição de apreciação de questões que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se forem de conhecimento oficioso (art.º 660.º, n.º 2, 2.ª parte), e pela impossibilidade de condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido (art.º 661.º, n.º 1). A violação deste limite determina a nulidade da sentença por excesso de pronúncia (art.º 668.º, n.º 1, alínea e).”

No caso concreto dos autos, a alteração efetuada pelo tribunal da relação à alínea a) do dispositivo da sentença da primeira instância, no sentido de condenar a R. a retificar a lista de antiguidade/senioridades da tripulação por si emitida, com data de 24/05/2007, nela fazendo constar a real antiguidade da Autora, não se enquadra no âmbito do pedido formulado, pois a A. não formulou qualquer pedido de retificação da referida lista de antiguidade.

Não tendo sido formulado tal pedido de retificação da aludida lista de antiguidade o Tribunal da Relação não tinha de condenar a R. em tal pedido, mesmo que considerasse que essa retificação fosse uma decorrência natural do reconhecimento da antiguidade de serviço efetuada pela própria Ré.

O Supremo Tribunal de Justiça no acórdão de 16/05/2012, proferido no processo n.º 1598/08.0TTLSB.L1.S1 - 4.ª secção, relatado pelo Juiz Conselheiro Sampaio Gomes, pronunciou-se no sentido de que a condenação em objeto diverso do pedido é geradora de nulidade porque soluciona causa diversa da proposta através do pedido, havendo julgamento fora do pedido tanto quando o juiz defere uma prestação diferente da que lhe foi postulada, como quando defere a prestação devida mas com base em fundamento não invocado como causa do pedido na propositura da ação.

A alteração efetuada pelo Tribunal da Relação à alínea a) do dispositivo da sentença da primeira instância, no sentido de condenar a R. a retificar a lista de antiguidade/senioridades da tripulação por si emitida, com data de 24/05/2007, nela fazendo constar a real antiguidade da A., configura um vício de extrapetição, que determina a nulidade da sentença por condenação em objeto diverso do pedido, nos termos da segunda parte da alínea e), do n.º 1, do art.º 615.º, do Código de Processo Civil.

Assim, julga-se procedente a nulidade de acórdão arguida pela R., reformando-se o acórdão do Tribunal da Relação na parte referida, devendo manter-se o dispositivo constante da alínea a) da sentença recorrida.

Face à solução dada a esta questão ficam prejudicadas as questões suscitadas no recurso interposto pela Ré, mantendo-se no restante o decidido no acórdão recorrido.

                                                           III

Pelos fundamentos expostos, concede-se a revista, julgando-se procedente a nulidade do acórdão arguida pela Ré, decidindo-se reformar o acórdão do Tribunal da Relação na parte referida, devendo manter-se o dispositivo constante da alínea a) da sentença recorrida.

Sem custas.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 11 de maio de 2017.

Chambel Mourisco (Relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha

___________________
[1] Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, pág. 39.
[2] Processo Comum de Declaração, tomo II, 2.ª edição.
[3] Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, Limitada, pág. 298.
[4][4] Estudos sobre o novo processo civil, Lex, pág. 362.