Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2367/12.9TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4º SECÇÃO
Relator: MELO LIMA
Descritores: REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
DEVER DE RESPEITO
DEVER DE URBANIDADE
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
Data do Acordão: 12/10/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / DEVERES DO TRABALHADOR / INCUMPRIMENTO DO CONTRATO / PROCEDIMENTO DISCIPLINAR / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR.
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - INSTRUÇÃO DO PROCESSO / PROVA POR CONFISSÃO E POR DECLARAÇÕES DAS PARTES - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / RECURSOS / ALTERAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO.
Doutrina:
- Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2.ª edição, 2014, pp. 235, 236, 255.
- Júlio Gomes, Direito do Trabalho, vol. I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, pp. 276, 531.
- Monteiro Fernandes, Manual do Direito do Trabalho, Almedina, 12.ª edição, pp. 557, 575.
- Pires De Lima e Antunes Varela “ Código Civil” Anotado, vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 1967, p. 228
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.º1, 349.º, 351.º, 396.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 452.º, 466.º, N.º 3, 607.º, N.ºS 4 E 5, 662.º, 663.º, N.º 2, 674.º, N.º3, 682.º, N.º 2.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGO 128º, N.º 1, AL. A), 328.º, N.º 1, AL. F), 329.º, 330.º, 332.º, 351.º, 352.º E SS..
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 37.º, 53.º.
Referências Internacionais:
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS HUMANOS (CEDH): - ARTIGO 10.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 22.02.2005, PROCESSO N.º 4594/04, DA 1.ª SECÇÃO, DE 7.04.2005, PROCESSO N.º 393/05, DA 7.ª SECÇÃO, DE 1.03.2007, PROCESSO N.º 4192/06, E DE 27.06.2007, PROCESSO N.º 1050/07, AMBOS DA 4.ª SECÇÃO.
-DE 14-07-2010, PROCESSO N.º 3256/05.9TTLSB.L1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 16.03.2011, PROCESSO N.º37/04.3TCGMR.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 27.03.2014, PROCESSO N.º 184/11.2.TTVLG.P1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT .
-DE 14.05.2014, PROCESSO N.º 260/07, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 15.04.2015, PROCESSO N.º 1716/11.1TTPNF.P1.S1
Sumário :
I - O princípio da livre apreciação da prova, plasmado no n.º 5 do art.º 607.º do CPC, vigora para a 1.ª instância e, de igual modo, para a Relação quando é chamada a reapreciar a matéria de facto.

II - Compete ao Tribunal da Relação reapreciar todos os elementos probatórios que tenham sido produzidos nos autos e, de acordo com a convicção própria que com base neles forme, consignar os factos materiais que julga provados, coincidam eles, ou não, com o juízo alcançado pela 1.ª instância pois só assim atuando está, efetivamente, a exercitar os poderes que nesse âmbito lhe são legalmente conferidos.
 
III - Ao nível da decisão da matéria de facto, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça é limitada à apreciação da observância das regras de direito probatório material (denominada prova vinculada), ficando fora do seu âmbito de competência a reapreciação da matéria de facto fixada pela Relação no domínio da faculdade prevista no art.º 662.º do CPC, suportada em prova de livre apreciação e posta em crise apenas no âmbito da perceção e formulação do respetivo juízo de facto.
 
IV - A justa causa de despedimento pressupõe a existência de uma determinada ação ou omissão imputável ao trabalhador, a título de culpa, violadora de deveres emergentes do vínculo contratual estabelecido entre si e o empregador, que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a manutenção desse vínculo.

V - Consubstancia grave incumprimento do dever de respeito e de urbanidade – de modo a pôr irremediavelmente em causa a confiança imprescindível à manutenção do vínculo laboral - a conduta do trabalhador que, numa reunião com outros trabalhadores e seus subordinados, referindo-se ao membro da administração da empregadora a quem hierarquicamente reporta, profere expressões objetivamente atentatórias da honra e imagem profissionais do mesmo.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça.

I. RELATÓRIO

1. AA intentou acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra BB – Companhia de Seguros, SA.

Juntou cópia da decisão do seu despedimento pela empregadora, alegando justa causa.

2. Realizada a audiência de partes e gorada a tentativa de conciliação das mesmas, a empregadora, notificada para o efeito, apresentou o articulado a motivar o despedimento, sustentando a sua licitude, bem como juntou o processo disciplinar. Para o caso do despedimento vir a ser declarado ilícito, pede a exclusão da reintegração, nos termos do art.º 392 do CT.

3. O trabalhador contestou, invocando a prescrição do procedimento disciplinar e a inexistência de justa causa para o despedimento, tendo deduzido reconvenção, na qual pede:

a) Que seja declarado ilícito o despedimento;

b) Que a Ré seja condenada a pagar-lhe:
1. A título de danos patrimoniais, as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento (30 de dezembro de 2011) até ao trânsito em julgado da sentença, liquidando as já vencidas em € 19.344,00 (dois meses de retribuição), acrescidas do valor de € 1470,00 (a título de viatura como complemento variável da retribuição);
2. Face ao facto da Ré ter requerido a exclusão da reintegração, a título de indemnização por ilicitude de despedimento, 60 dias de retribuição por cada ano completo de antiguidade ou fração, liquidando-a até à data da contestação em € 356.048,40;
3. As férias e os subsídios de férias e de Natal e demais retribuições que se vencerem até à data do trânsito em julgado da sentença;
4. A quantia mensal de € 735,00 mensais, como componente variável da retribuição, até à data do trânsito em julgado da sentença, a título de viatura de serviço atribuída para seu uso familiar, 365 dias por ano, da marca B… série ... D 5 portas, viatura esta que com o despedimento se viu obrigado a entregar à empresa;
5. A quantia de € 30.000,00, a título de danos não patrimoniais.

4. Houve resposta à contestação e reconvenção, na qual a Ré pugnou pela tempestividade do exercício da ação disciplinar e pela improcedência do pedido reconvencional, concluindo pela sua absolvição do pedido.

5. Foi proferido despacho saneador, no qual foi relegado para a decisão final o conhecimento da prescrição do procedimento disciplinar e dispensada a seleção da matéria de facto.

6. Procedeu-se a julgamento, com observância do legal formalismo, como se alcança das respectivas atas, e foi decidida a matéria de facto sem reclamações, sendo depois prolatada a sentença, com a seguinte decisão:

«Face ao exposto, julga-se parcialmente procedente a presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento intentada pelo Autor/Trabalhador AA contra a Ré/Empregadora BB, …, SA, e, consequentemente, mais se decide:
1) Declarar a ilicitude do despedimento do Autor/Trabalhador promovido pela Ré/Empregadora;
2) Condenar a Ré/Empregadora a pagar ao Autor/Trabalhador uma indemnização em substituição da reintegração, correspondente a 40 (quarenta) dias de retribuição de base e de diuturnidades, equivalente ao montante total de € 3.250,26 (três mil duzentos e cinquenta euros e vinte e seis cêntimos) por cada ano de antiguidade ou fracção, contada desde 02/12/1996 até à data do trânsito em julgado da presente sentença, ou do acórdão que eventualmente e em definitivo confirmar a ilicitude do despedimento, a qual na presente data (24/05/2013) atinge o valor global de € 55.294,42 (cinquenta e cinco mil duzentos e noventa e quatro euros e quarenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde a data da presente sentença até ao integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada;
3) Condenar a Ré/Empregadora a pagar ao Autor/Trabalhador as retribuições [incluindo os montantes do ordenado base (€ 2.279,70), do prémio de antiguidade (€ 158,00), do suplemento por isenção de horário de trabalho (€ 569,95), do complemento salarial (€ 2.592,35), do subsídio de refeição (valor diário de € 9,00), e da viatura que lhe estava atribuída (€ 735,00), e também os respectivos subsídios de férias e de natal] vencidas desde 25/05/2012 até à data do trânsito em julgado da presente sentença ou, sendo a mesma objecto de recurso, do acórdão que venha a confirmar a ilicitude do seu despedimento, deduzindo-se do valor global das mesmas todas as importâncias que o Autor aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o montante do subsídio de desemprego auferido pelo Autor desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, acrescidas dos juros de mora vencidos e vincendos desde a data do respectivo vencimento de cada uma delas até ao integral e efectivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada;
4) Condenar a Ré/Empregadora a pagar ao Autor/Trabalhador a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos desde a data da citação (14/06/2012) até ao integral e efetivo pagamento, calculados à taxa legal de 4% ou a outra que vier a ser legalmente fixada;
5) Absolver a Ré/Empregadora do demais contra si peticionado pelo Autor/Trabalhador.
Nos termos do art. 98º/P do C.P.Trabalho, fixa-se o valor da causa em € 406.862,20 (quatrocentos e seis mil oitocentos e sessenta e dois euros e vinte cêntimos).
Custas da acção pelo Autor/Trabalhador e pela Ré/Empregadora, na proporção de 4/5 e 1/5 respetivamente.»

7. Inconformados, interpuseram Autor e Ré recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, vindo este Tribunal, por Acórdão de 11 de fevereiro de 2015, a deliberar:

«a) Não tomar conhecimento do recurso do Autor;
b) Julgar procedente o recurso da Ré, pelo que se revoga a sentença recorrida, absolvendo-se a Ré do pedido.»

8. Irresignado, traz o Autor a este Supremo Tribunal de justiça o presente recurso de Revista rematando as alegações com as seguintes conclusões:

«1) Do testemunho de CC, DD, EE e testemunha FF, bem como da prova documental (registo de entradas) resulta que o aqui Recorrente não poderia estar com os quatro subordinados;

2) O douto Acórdão recorrido desvalorizou a matéria de facto assente na 1.ª instância e os fundamentos para a decisão de direito tomada, pelo que no presente caso estamos perante um erro de julgamento, incurso pela Veneranda Relação de Lisboa, com clara violação do Código do Trabalho e da nossa Lei Fundamental;

3) O tribunal da Relação na sua nobre tarefa, não se circunscreveu a apurar da razoabilidade da convicção probatória do tribunal da primeira instância face aos elementos que perante esta foram apresentados, subvertendo, assim, o princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 607 do CPC e 396 do CC.

4) A reapreciação da matéria de facto na Relação veio postergar o princípio fundamental da livre apreciação das provas por parte do tribunal da 1.ª instância, (cfr. art.sº 607.º do CPC e 396.º do CC) com especial enfoque quanto à prova testemunhal e, segundo o qual, a íntima convicção do juiz é gerada de acordo com as regras da experiência e conhecimento dos homens (veja-se a este respeito o Ac. RP de 19.09.2000, CJ 2000/IV/186, 189), violando, assim Lei substantiva.

5) Também neste aspeto, o acórdão do tribunal da Relação de Lisboa vem atentar contra o artigo 662º do CPC, porquanto vem alterar a matéria de facto sem que “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impusessem decisão diversa”, violando assim o disposto no artigo 662º do CC

6) No seu Acórdão, a Relação de Lisboa não tem sequer em conta o alegado pelo aqui recorrente em sede de contra-alegações apresentadas, pelo que a Relação na decisão relativa à impugnação do julgamento de facto operado pela 1.ª instância omitiu a análise crítica das provas.

7) A Relação limita-se a daguerreotipar o Recurso apresentado pela empresa BB, contudo não faz a análise crítica das provas, de ambas as partes e não apenas da empresa Ré, e não especifica sequer os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, conforme é exigido pelo disposto no n.º 4 do art. 607.º do CPC, aplicável por força do n.º 2 do art. 663.º do mesmo diploma.

8) A Relação não faz a análise concreta dos meios probatórios em causa documentais e testemunhais carreados e produzidos nos autos por ambas a partes e não apenas pela empresa BB;

9) Ao contrário do que o Acórdão da Relação afirma, os trabalhadores (GG- rotações 10:57:46 a 11:45,45,- HH - rotações 11-46-28 a 12-24-37, II- rotações 12-26-18 a 13-06-55) afirmaram que não ficaram minimamente preocupados com os palavrões mas sim com a reestruturação, conforme o tribunal da 1ª instância o comprova, existindo, assim, um erro manifesto na livre apreciação da prova por parte do Acórdão da Relação

10) Ora, o tribunal da 1ª instância, face a estes testemunhos, considerou como não provados os factos alegados “os trabalhadores presentes nessa reunião ficaram chocados e surpreendidos com o teor das expressões aludidas em d) e g)”.

11) O acórdão do tribunal da Relação de Lisboa vem, assim, também neste aspeto, atentar contra o artigo 662º do CPC, porquanto vem alterar a matéria de facto sem que “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impusessem decisão diversa, violando, assim, lei substantiva, fazendo, inclusivamente, uma errada interpretação do escopo probatório produzido e carreado para estes autos.

12)Também neste aspecto, o douto Acórdão recorrido desvalorizou a matéria de facto assente na l.ª instância e os fundamentos para a decisão de direito tomada, pelo que também aqui estamos perante um erro de julgamento, incurso pela Veneranda Relação de Lisboa, com clara violação do Código do Trabalho e da nossa Lei Fundamental.

13) Fica assim prejudicada o acórdão da relação porquanto não tem sustentação em prova produzida, havendo assim a necessidade de o Supremo Tribunal de Justiça verificar a conformidade da decisão de facto com o direito probatório material, por manifesta violação dos artigos 674 nº 1, aliena a) e 3 e 682 do CPC, verificando-se, assim, uma violação da lei substantiva

14) A relação não conseguiu assim produzir ou encontrar prova mais forte do que a que foi produzida pelo tribunal da 1ª Instância, não podendo assim mudar a matéria dada por assente e devidamente sustentada na sentença

15) O tribunal da Relação vem assim atentar contra o princípio da livre apreciação da prova previsto no art. 607 do CPC, segundo o qual ao proceder a julgamento o Tribunal aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, exceto quando a lei exija formalidades especiais para a prova dos factos controvertidos;

16) A Testemunha Administrador JJ, a rotações 09.15 e seguintes afirma que-  “ …o que deixou as pessoas preocupadas foi o facto de o AA dizer que apesar de eu ter recusado uma restruturação de direção …proposta por ele ..ele me iria ultrapassar e iria dialogar diretamente com os franceses….que iria fazer com que eu tivesse que aceitar essa reestruturação que era da vontade dele…”, assim como o afirmaram GG, HH e II;

17) Do testemunho do Depoimento de Parte do Administrador JJ, resulta inequivocamente que o aqui Recorrente tinha autorização para falar com os franceses (a rotações 36.00 do seu testemunho gravado a rotações 14:47:21 a 16:25:54, o Sr. Administrador JJ afirma: - “não… de facto não…….e alias como eu tinha dito ao AA …era bom termos aqui uma entidade externa para fazer isto..eu na altura não me lembrei do KK…e achava positivo termos uma visão externa...”)

18) Também neste aspeto o acórdão do tribunal da Relação de lisboa vem atentar contra o artigo 662º do CPC, porquanto, vem alterar a matéria de facto sem que “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impusessem decisão diversa”, violando assim o disposto no artigo 662º do CC.

19) Todas estas imputações que o aqui Recorrente nega ter proferido, e que levam a que o Acórdão da Relação se decida pela licitude do despedimento, estão mergulhadas no campo das deduções e nas subjetividades, o que não se coaduna com a objetividade que a lei faz recair sobre a sanção mais grave a aplicar aos trabalhadores: o despedimento, violando, assim o acórdão da relação a lei substantiva que se aplica ao caso concreto

20) O Autor, aqui Recorrente, não pode ser despedido com base em deduções.

21) Também neste aspeto, o douto Acórdão recorrido desvalorizou a matéria de facto assente na l.ª instância e os fundamentos para a decisão de direito tomada, pelo que no presente caso estamos perante um erro de julgamento, incurso pela Veneranda Relação de Lisboa, com clara violação do Código do Trabalho e da nossa Lei Fundamental;

22) A Testemunha GG, a instâncias do Ilustre Juiz do tribunal “ A QUO” ( a rotação 40:09 ) “…e como é que o Sr. JJ…que não tinha estado na reunião …soube disto?…” afirma que não sabe ( rotação 40:09 a 40:20, timidamente afirma : - “ …sim...isso aí…não sei…”.)

23) Ao contrário do que o Acórdão da Relação de Lisboa, GG, afirma que não sabe como é que o Administrador veio a saber de tais alegados impropérios que o aqui Recorrente afirma não ter proferido em tempo algum.

24) Também neste aspecto, o acórdão do tribunal da Relação de Lisboa vem atentar contra o artigo 662º do CPC, porquanto, vem alterar a matéria de facto sem que “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impusessem decisão diversa”, violando assim o disposto no artigo 662º do CC.

25) Contudo, para grande surpresa, o Tribunal da Relação de Lisboa vem dizer que o Administrador JJ, agora com as ideias devidamente amadurecidas, nas declarações que prestou no dia 8 de maio de 2014, vem dizer que teve conhecimento dos palavrões no dia 29-02-2012, através do GG, o que está em clara contradição com o que é afirmado pelo Sr. GG, valorando aquele depoimento de parte para sustentar a afirmação que faz.

26) O tribunal da Relação, ao assumir como prova, única, deste facto as declarações prestadas pelo Sr. Dr. JJ vem assim atentar, também neste aspeto, contra lei substantiva.

27) De facto, o Dr. JJ, administrador, foi ouvido a título de depoimento de parte. Por despacho datado 11-12-2012, com a referência … do Tribunal da 1ª Instância foram as partes notificadas de que:  ” … sendo o referido JJ o legal representante da Ré, ele poderá prestar depoimento de parte em nome da Ré e, por via disso, conclui-se  de forma tão inequívoca quanto necessária que o mesmo não pode depor neste processo na qualidade de  testemunha (está legalmente impedido de o fazer – cfr art. 671º do C.P. Civil).

28) Diga-se que, a este respeito, se tal fosse possível, teria também o Acórdão da Relação de Lisboa ter em conta o que afirma o aqui recorrente, a título de Depoimento de parte, tendo sempre de justificar sustentadamente, fundadamente, porque opta por um e não por outro depoimento.

29) Assim, a relação não poderia atender ao resultado desta prova constituenda traduzida nas declarações favoráveis ao depoente Administrador JJ.

30) Estamos, assim, perante um vicio do procedimento probatório, que torna o resultado nulo, pelo simples facto de o direito processual civil português não admitir a valoração do depoimento de parte senão para obter uma confissão (reduzida a escrito: artº 463.º, n.º 1, do CPC) ou para o valorar livremente se, não podendo valer como confissão, se respeitar a factos desfavoráveis ao depoente.

31) O tribunal da relação ao impor, sem qualquer sustentação probatória um ponto 45 na qual afirma ”O Dr. JJ veio a ter conhecimento, no dia 29 de fevereiro de 2012 de que na reunião do dia 25 de novembro de 2011, o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta”, o que nunca foi sequer afirmado pela empresa e ao sustentar essa sua afirmação unicamente com as declarações prestadas pelo Administrador JJ, valorando tais afirmações viola lei substantiva relativa à Prova por confissão de Partes, nomeadamente o artigo 452º e ss do CPC, atento a que tendo sido ouvido a titulo de depoimento de parte, tal depoimento/esclarecimento visava lograr uma confissão, sendo que nos termos do artigo 452º  e ss do CPC,  esta somente pode incidir sobre factos desfavoráveis ao depoente.

32) O tribunal da relação ao determinar a eliminação da expressão “educado” do ponto 23 da matéria de facto, extravasa os seus poderes, atento a que a Ré, empregadora não se dignou sequer a impugnar tal facto assente, dando-se, assim, por materialmente assumido, formando-se contra ele caso julgado material o que impede que se tomem em consideração esses factos para fundamentar o despedimento, não o tendo feito a relação fere e dá mau uso aos poderes conferidos pelo artigo 662 do CPC

33) Na linguagem do Sr. Administrador, concluímos que esta situação, sem motivo aparente para ter acontecido, a ter acontecido foi uma situação extrema (ficou "estarrecido" relativamente à linguagem empregue e que, embora considere que o Autor tem uma personalidade impulsiva e conflituosa, nunca pensou que ele chegasse a este extremo”.).

34) Em suma, esta situação, conforme o afirma o Administrador JJ a ter acontecido está no extremo (vide dicionário da língua portuguesa da texto editora), em suma:  “ o mais afastado”, o “ mais remoto” “ o ponto mais distante” daquilo que é a personalidade do arguido, atento toda a prova carreada para os autos e principalmente a documental que nem sequer foi impugnada.

35) Quer da prova testemunhal produzida nos autos, quer da prova documental carreada para os autos e não impugnada, concluímos que o aqui Recorrente era visto como um excelente trabalhador e reconhecido no seio da empresa como tal.

36) O passado profissional do Apelado, com méritos reconhecidos nacional e internacionalmente, conforme documentação junto aos autos e não impugnada, é meritório e digno de registo

37) Contudo, apesar de toda esta prova, o Tribunal da Relação entendeu retirar a expressão educado.

38) O acórdão do tribunal da Relação de lisboa vem, assim, atentar contra o artigo 662º do CPC, porquanto vem alterar a matéria de facto sem que: “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”,

39) O acórdão da relação atenta também contra o no n.º 2, prevê-se na alínea c), que impõe que a decisão da 1ª Instância só pode ser anulada quando não constando do processo todos os elementos, repute de deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto.

40) A Relação tem o poder de apreciar livremente a prova contudo não detém um poder arbitrário, que lhe permita julgar os factos sem provas ou contra as provas; antes “… pressupõe a observância das regras da experiência e dos critérios da lógica…” (Alberto dos Reis, Código do Processo Civil Anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 1981, pág);

41) A Relação, através do seu acórdão, ao reapreciar a matéria de facto veio assim declaradamente a postergar o princípio fundamental da livre apreciação das provas por parte do tribunal da 1.ª instância, (cfr. art.sº 607.º do CPC e 396.º do CC) com especial enfoque quanto à prova testemunhal e, segundo o qual, a íntima convicção do juiz é gerada de acordo com as regras da experiência e conhecimento dos homens;

42) Desde já se lamenta o facto de o acórdão da Relação não ter tido em conta sequer a Contra-‑alegação do trabalhador, não tecendo quaisquer comentários ao mesmo, não o analisando criteriosamente, não explicando sequer porque dá valor a uns depoimentos e não a outros.

43) O Tribunal de recurso só pode censurar a decisão recorrida, no que diz respeito à credibilidade de uma fonte de prova pelo julgador, assente na imediação e oralidade, quando ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum e do bom senso, o tribunal da relação, nada diz a este respeito, violando assim, mais uma vez, os art. 607º do CPC e 396º do CPC.

44) Por outro lado, nada vem apurado quanto a eventuais consequências do comportamento do trabalhador no seio da empresa, o que teria também, interesse, para avaliar a alegada justa causa de despedimento

45) O alegado comportamento que o aqui Recorrente reitera não ter praticado, a ter acontecido tem enquadramento na alínea i) do nº 2 do artigo 351º do CT: “ prática, no âmbito da empresa de violência físicas, injurias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhador da empresa, elementos dos corpos sociais ou empregador individual não pertencente a estes seus delegados os representantes”.

46) O termo prática significa: “ uso, maneira habitual de proceder, costume, rotina “ (vide Dicionário Universal da Língua Portuguesa da Texto Editora “

47) Provado resulta, quer pela 1ª instância quer pela Relação que: “ o Autor é um trabalhador que se obriga a profissionalismos, exigente consigo mesmo e com todos aqueles que com ele trabalha e é zeloso, diligente e cumpridor das suas tarefas”. ”O Autor sempre exerceu funções profissionais de destaque e desde sempre o trabalho desenvolvido pelo Autor foi alvo de manifestações de reconhecimento pelas pessoas com quem diretamente trabalhava e com os seus superiores hierárquicos”, com a seguinte fundamentação: do acordo das partes. (estes factos foram alegados pelo Autor em sede de Reconvenção e não foram impugnados pela Ré na resposta)”

48) A nossa jurisprudência tem entendido que não basta, que os comportamentos concretamente demonstrados se integrem nas hipóteses exemplificativas estabelecidas no referido n.º 2 do art. 351.º, sendo necessário que esses comportamentos sejam culposos, e que, pela sua gravidade e consequências, tornem imediata e praticamente impossível a relação de trabalho.

49) Não está provado nos autos que o aqui recorrente pretendia ofender a honra e idoneidade do Administrador JJ, nem nada é dito neste sentido.

50) Dos autos, nada nos é dito no que respeita a aferir se estes alegados impropérios imputados ao Recorrente, pela sua gravidade e consequência tornam imediata e praticamente impossível a relação de trabalho

51) Sabemos que o administrador do Pelouro da Informática, Sr. JJ, afirma ter ficado “estarrecido”, (o mesmo é dizer surpreendido) contudo, nada nos é dito se, de facto,  a empresa considera que tal comportamento, sendo primário o aqui Recorrente em tal conduta, que continua a negar, e diga-se bastante duvidoso quanto à prova produzida, atento os interesses em jogo dos subordinados directos do autor e o mau ambiente que estes afirmam existir por força do eventual papel que a esposa do aqui recorrente iria desempenhar na nova reestruturação, é suficientemente grave para a sanção mais grave.

52) O Conselho de Administração da empresa sendo, como é, um órgão colegial, nada nos diz nos autos quanto à verificação da impossibilidade prática da subsistência da relação laboral, nem sequer se estamos perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador.

53) É o tribunal da relação que o vem afirmar, sem qualquer suporte probatório

54) O aqui Recorrente, conforme ficou provado documentalmente, é um trabalhador com reconhecimento profissional a nível nacional e internacional, por todos os superiores hierárquicos.

55) A noção de impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho é um conceito normativo-‑objectivo, que não tem em conta a sensibilidade pessoal do empregador, mas o critério de uma empregadora razoável colocada naquela situação.

56) Atente-se que, todas as alegadas testemunhas, subordinados do Recorrente, vêm afirmar que nunca foi falado o nome do Administrador JJ, em suma que eles presumiram assim ou assim o quiseram entender.

57) Na linguagem do Sr. Administrador, concluímos que esta situação, sem motivo aparente para ter acontecido, a ter acontecido foi uma situação extrema (ficou "estarrecido" relativamente à linguagem empregue) e que, “embora considere que o Autor tem uma personalidade impulsiva e conflituosa, nunca pensou que ele chegasse a este extremo”.

58) Em suma, esta situação, conforme o afirma o Administrador JJ a ter acontecido está, palavras suas, no extremo, (vide dicionário da língua portuguesa da texto editora), em suma:  “ o mais afastado”, o “ mais remoto” “ o ponto mais distante” daquilo que é a personalidade do arguido, atento toda a prova carreada para os autos e principalmente a documental que nem sequer foi impugnada

59) O Recorrente tinha 16 anos de antiguidade sem qualquer registo disciplinar.

60) Não consta dos autos qualquer registo de sanção disciplinar ao aqui Recorrente.

61) Pelo contrário, consta dos autos, testemunhalmente e documentalmente, esta prova não impugnada, a idoneidade e profissionalismo do aqui Recorrente, o reconhecimento nacional e internacional do aqui recorrente por parte das suas chefias;

62) O Acórdão da Relação, vem assim, atento o princípio do Estado de direito democrático, conexionado com os direitos fundamentais, atentar contra o princípio da proibição do excesso ou princípio da proporcionalidade em sentido amplo no âmbito exercício do poder disciplinar atribuído à empresa pelo artº 98º CT.

63) Ora, o Acórdão da Relação viola os subprincípios da “necessidade”, da “adequação” e da “proporcionalidade”.

64) De facto, nada nos é dito em relação à empresa. Não sabemos se, de facto, a mesma não viabiliza outra sanção.

65) Ponderando os interesses em confronto e considerando o princípio da proporcionalidade e da adequação consagrados no art. 330º, n.º 1 do Código do Trabalho, afigura-se-nos que a factualidade sub judice não preenche o conceito de justa causa de despedimento, donde dever concluir-se pela ilicitude do despedimento (cfr. art. 381º b) do CT

66) Consabidamente, a proibição dos despedimentos sem justa causa recebeu expresso reconhecimento constitucional no artigo 53.º da Lei Fundamental, subordinado à epígrafe «Segurança no emprego» e inserido no capítulo III («Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores»), do Título II («Direitos, liberdades e garantias») da Parte I («Direitos e deveres fundamentais»).

67) No plano infra constitucional, o Código do Trabalho repetiu no artigo 338º, ipsis verbis, os termos daquela norma constitucional, pelo que o Acórdão da Relação viola também estes  preceitos

68) O ónus da prova dos factos integradores da justa causa cabe ao empregador (art. 342.º, n.º 1 do CC), pois trata-se de factos constitutivos do direito do empregador ao despedimento do trabalhador ou, na perspetiva processual da ação de impugnação, de factos impeditivos do direito à reintegração ou do direito indemnizatório que o trabalhador invoca com base na alegada ilicitude do despedimento;

69) Contudo, nada nos é dito por parte da empresa relativamente à sua posição em relação à verificação da impossibilidade de manutenção da relação laboral entre o trabalhador e o empregador (requisito objetivo);

70) De facto, apenas sabemos que aquele Administrador ficou estarrecido, entenda-se “ surpreendido”. A Empresa “BB-Companhia de Seguros SA”, nada nos diz em relação à manutenção do aqui recorrente na empresa.

71) Do Acórdão da Relação não conseguimos retirar onde houve errada decisão na 1.ª instância, qual a resposta dada em face dos depoimentos prestados é ilógica ou qual resposta dada é formal ou materialmente impossível, por não ter qualquer suporte para ela.

72) Concluímos assim que a Relação na decisão relativa à impugnação do julgamento de facto operado pela 1.ª instância desrespeitou o postulado no art. 607.º, n.º 4, do CPC, omitindo a análise crítica das provas

73) O Acórdão da Relação ao considerar licito o despedimento sem a prova legalmente exigida e ao afirmar que tais factos de que vem acusado o Recorrente foram dados como provados apesar da prova feita que legalmente impunha que fosse dado como não provados, desrespeita o artigo 674º, nº 2, violando o princípio da prova vinculada, vindo, assim, contra decisão expressa da lei, permitindo assim a esse Supremo Tribunal de Justiça analisar e modificar o Acórdão da Relação de Lisboa, por força do disposto no artigo 674º e 682º do CPC.

74) O Acórdão da Relação de Lisboa, vem, assim violar normas de direito probatório substantivo.

75) A Relação quanto à Justa Causa de Despedimento, limita-se a uma “fundamentação” conclusiva, que nada diz sobre a atividade de reponderação a que se terá procedido, nomeadamente que prejuízos para a empresa, se, de facto, uma outra sanção não seria suficiente para precaver futuros comportamentos, se, de facto, se verifica a impossibilidade prática da subsistência da relação laboral, se estamos perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do empregador a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta daquele.

76) Do acórdão da relação não resulta que a conduta do Recorrente possa ser encarada como representando um comportamento sistematicamente conflituoso, por forma a constituir justa causa de despedimento.

77) Os dados existentes nos autos são manifestamente insuficientes para caracterizar um perfil psicológico, que permita reputar o autor como elemento perturbador do regular funcionamento da empresa, a ponto de justificar o seu afastamento.

78) Resulta provado pela prova documental junta aos autos e não impugnada que o Recorrente é um profissional que ao longo de 16 anos de antiguidade nunca foi sancionado pelo que quer que seja e que tem sido reconhecido profissionalmente, nacional e internacionalmente como um excelente trabalhador tendo disso sido publicamente reconhecido.

79) Ao não ter em conta as contradições dos depoimentos prestados, ao valorar os testemunhos prestados pelos trabalhadores da Recorrida o Acórdão da Relação de Lisboa, ao vir declarar lícito o despedimento do aqui Recorrente, viola o princípio da proporcionalidade, mormente por não ter em consideração que o Recorrente é um trabalhador com 16 anos de antiguidade nesta empresa, sem notícia de qualquer deslize sancionado disciplinarmente, que não consta do processo do Recorrente qualquer sanção disciplinar, que é um trabalhador com crédito profissional reconhecido nacional e internacionalmente, que dos testemunhos prestados, todos afirmam que o Recorrente não proferiu em vez alguma o nome do Administrador JJ, que os trabalhadores interessados em imputar estes epítetos ao aqui recorrente foram promovidos (LL e HH) e que havia entre os trabalhadores em questão um desentendimento com o aqui Recorrente por força da eventual posição que a mulher deste iria assumir na nova reestruturação;

80) Com todo o respeito devido, e é muito, o douto Acórdão recorrido traduz uma apreciação incorreta do Direito e do regime jurídico aplicável ao Despedimento Sem Justa Causa, violando a nossa Lei fundamental;

81) Com efeito, o douto Acórdão proferido pelos Senhores Juízes desembargadores da Veneranda Relação de Lisboa violou o disposto no artigo 330.°, nº 1, do Código do Trabalho e o direito à segurança no emprego, consagrado no artigo 53.° da Constituição da República Portuguesa;

82) Os factos não permitem concluir estar verificada qualquer das situações descritas no art. 351º nº2 a) a m) do CT, pois não se provou que o A. tivesse desobedecido a quaisquer ordens, que demonstrasse um desinteresse repetido pelo cumprimento das suas obrigações, que tivesse lesado interesses patrimoniais sérios da Ré ou que levasse a efeito no âmbito da empresa a prática de violências físicas, injurias ou outras ofensas punidas por lei sobre trabalhador da empresa, elemento dos órgãos sociais ou empregador individual não pertencente a estes, seus delegados ou representantes;

83) O Acórdão da Relação faz errada interpretação e aplicação dos artigos 328.°, n.º 1, alínea f), e 351.° do Código do Trabalho, o que carece de reparação efetiva;

84) O douto Acórdão recorrido desvalorizou a matéria de facto assente na l.ª instância e os fundamentos para a decisão de direito tomada, pelo que, no presente caso, estamos perante um erro de julgamento, incurso pela Veneranda Relação de Lisboa, com clara violação do Código do Trabalho e da nossa Lei Fundamental;

85) O tribunal da relação apesar de estar inibido de proceder a qualquer alteração a um ponto de facto não impugnado pelo Recorrido, veio exceder os seus poderes o que conduz a ter-se por não escrita a sobredita alteração, ao impor, sem qualquer sustentação probatória um ponto 45 na qual afirma: ” O Dr. JJ veio a ter conhecimento, no dia 29 de Fevereiro de 2012 de que na reunião do dia 25 de Novembro de 2011, o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta” e um ponto 46 “ Estas afirmações ofenderam o administrador a quem se dirigiam, o Dr. JJ”;

86) O tribunal da relação ao impor, sem qualquer sustentação probatória um ponto 45 na qual afirma ” O Dr. JJ veio a ter conhecimento, no dia 29 de Fevereiro de 2012 de que na reunião do dia 25 de Novembro de 2011, o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta”, o que nunca foi sequer afirmado pela empresa e ao sustentar essa sua afirmação unicamente com as declarações prestadas pelo Dr. JJ, valorando tais afirmações viola lei substantiva nomeadamente o artigo 452º e ss do CPC, atento a que tendo sido aquele administrador ouvido a titulo de depoimento de parte, tal depoimento/esclarecimento visava lograr uma confissão, sendo que nos termos do artigo 454º do CPC, esta somente pode incidir sobre factos desfavoráveis ao depoente, acrescendo que o tribunal da relação baseou-se exclusivamente nessas declarações para formar a sua convicção sobre os factos controvertidos que deu como provados e não provados pela 1ª instância;

87) O tribunal da relação ao determinar a eliminação da expressão “educado” do ponto 23 da matéria de facto, extravasa os seus poderes, atento a que a Ré, empregadora não se dignou sequer a impugnar tal facto assente, dando-se, assim, por materialmente assumido, formando-se contra ele caso julgado material o que impede que se tomem em consideração esses factos para fundamentar o despedimento, não o tendo feito a relação fere e dá mau uso aos poderes conferidos pelo artigo 662 do CPC. Tal facto está provado pelos documentos carreados para os autos e não impugnados pela Ré;

88) O tribunal da relação na sua nobre tarefa não se circunscreveu a apurar da razoabilidade da convicção probatória do tribunal da primeira instância face aos elementos que perante esta foram apresentados, subvertendo, assim, o princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 607 do CPC);

89) A reapreciação da matéria de facto na Relação veio postergar o princípio fundamental da livre apreciação das provas por parte do tribunal da 1.ª instância, (cfr. art.sº 607.º do CPC e 396.º do CC), com especial enfoque quanto à prova testemunhal, segundo o qual, a íntima convicção do juiz é gerada de acordo com as regras da experiência e conhecimento dos homens (veja-se a este respeito o Ac. RP de 19.09.2000, CJ 2000/IV/186, 189), violando, assim, também neste aspeto, Lei substantiva;

90) O tribunal da 1ª instância não julgou arbitrariamente, não alegou factos sem provas ou contra provas. O tribunal da 1ª instância julgou ilícito o despedimento observando criteriosamente a prova e fundamentando-a, dando cumprimento, ao contrário do acórdão da relação, ao disposto no artigo 607º do CPC, tendo em conta as provas e as contraprovas apresentadas;

91) O tribunal da 1º instância, formou a sua convicção não só com base nos elementos racionalmente demonstráveis (prova documental) mas também com base em fatores não materializados, como por exemplo, no que respeita aos depoimentos orais das testemunhas, atendendo a um complexo de situações e fatos, nos quais inseriu o porte, as reações imediatas, o sentido dado à palavra e à frase o contexto em que é prestado o depoimento, o ambiente gerado em torno da testemunha, o modo como é feito o interrogatório e surge a resposta;

92) O tribunal da relação não teve acesso a este imediatismo, diga-se inclusivamente que este é, manifestamente impossível de obter em sede de análise de matéria de facto pela relação, ficando impossibilitada de através das gravações, no que respeita à avaliação do depoimento em concreto, captar pormenores, reações, hesitações, expressões e gestos, impossíveis de transparecer pela simples audição das gravações dos depoimentos; não tendo sequer o douto Acórdão da Relação se pronunciado, nomeadamente, sobre eventuais deficiências, contradições ou obscuridades da decisão proferida sobre a base factual do litigio, definida na 1ª instância;

93) Pretende-se, assim, também, que esse Venerando Tribunal Superior verifique a conformidade da decisão de facto com o direito probatório material, nos estritos termos dos artigos 674.º, nº1  e 3 , e 682, por manifestamente , se  verificar uma violação da lei substantiva;

94) A revista tem por fundamento a violação de lei substantiva, também quer por erro de interpretação ou de aplicação quer por erro de determinação da norma aplicável, sendo, assim, também, intentada ao abrigo do disposto no artigo 674º do CPC;

95) O tribunal da Relação no seu acórdão ora em prejuízo ao considerar lícito o despedimento quando o mesmo tinha sido julgado ilícito pela 1ª instância, extravasou os poderes de substituição que lhe são conferidos pelo artigo 662º do CPC, mormente no que respeita à valoração que faz da matéria de facto bem como quanto ao uso processualmente ilegal que faz das presunções naturais, violando o artigo 674º do CPC

96) O acórdão do tribunal da Relação de Lisboa vem atentar contra o artigo 662º do CPC, porquanto; vem alterar a matéria de facto sem que “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impusessem decisão diversa”,

97) Pede-se, assim, a intervenção deste Supremo Tribunal de Justiça, pela necessidade de se verificar a conformidade da decisão de facto com o direito probatório material, nos estritos termos dos artigos 674.º, n.º 2 e 3, suscitando-se também este aspeto como fundamento do recurso de revista por se considerar igualmente verificada uma violação da lei substantiva;

98) O tribunal da Relação ao aditar um ponto 45 dar como provado, com base única e exclusivamente no testemunho prestado pelo Dr. JJ, tendo este sido ouvido a título de depoimento de parte, fere lei substantiva, impondo a esta prova a força probatória que de facto não tem;

99) Apesar de o Supremo Tribunal de Justiça estar impedido de controlar o juízo do tribunal da Relação sobre o depoimento de uma testemunha, tal não impede que não possa verificar se o facto dado como provado através desse meio de prova é compatível com outros igualmente julgados por provados. (682 do CPC);

100) A Relação ao alterar oficiosamente este quesito, fez mau uso dos poderes conferidos pelo artº 712º do CPC;

101) O Tribunal da Relação ateve-se única e simplesmente a não concordar com a decisão dada, pelo que não demonstrou a existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos.

102) Ora, no caso em apreço e com base nas excecionalidades previstas no art. 674º, n.º 3 do CPC, o objeto do recurso é também o erro de apreciação da prova por parte da Relação, com base na violação de normas de direito probatório, não só ao afirmar novas factualidades, nunca antes alegadas por ambas as partes e, por conseguinte, nunca antes sustentadas por qualquer prova em sede de audiência de discussão e julgamento, mas também por expressa violação de normas de direito probatório, de acordo com o disposto nos arts. 349º e 351º, ambos do CC e do disposto no art. 662º do CPC;

103) O Acórdão da Relação não é congruente com a matéria de facto fixada através da livre valoração da prova produzida, com imediação e oralidade, em audiência,

104) Pretende, também, o Recorrente que o Supremo Tribunal de Justiça afira se a Relação extravasou, porventura, os poderes de substituição ao tribunal recorrido na valoração da matéria de facto que resultam do preceituado no nº1 do art. 662º e, bem assim, se fez ou não um uso processualmente legítimo das presunções naturais,

105) No seu Acórdão, a Relação não se pronunciou, nomeadamente, sobre eventuais deficiências, contradições ou obscuridades da decisão proferida sobre a base factual do litígio, definida na 1ª instância

106) A Relação não fez uma análise crítica das provas e especificou os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, conforme é exigido pelo disposto no n.º 2 do art. 653.º do CPC, aplicável por força do n.º 2 do art. 713.º do mesmo diploma.

107) O Acórdão da Relação não nos diz quais as razões que determinaram a ter ou não por averiguado determinado facto, em revelar qual o seu raciocínio lógico que o conduziu à resposta, qual o processo racional que utilizou e acima de tudo porque não valoriza sequer os factos apresentados na respetiva contra-alegação de recurso;

108) O Acórdão da Relação não faz a análise a análise crítica sobre os pontos de facto e a prova invocados pelo Recorrente;

109) A Relação, no seu Acórdão não tem sequer em conta o princípio da proibição do excesso ou princípio da proporcionalidade em sentido amplo não aferindo se o poder disciplinar exercido está conforme aos subprincípios da “necessidade”, da “adequação”, da “proporcionalidade em sentido restrito”,

110) Toda a factualidade em causa, mesmo dando-se por provada, ponderando os interesses em confronto e considerando o princípio da proporcionalidade e da adequação consagrados no art. 330º, n.º 1 do Código do Trabalho, afigura-se-nos que não preenche o conceito de justa causa de despedimento, donde dever concluir-se pela ilicitude do despedimento (cfr. art. 381º b) do CT;

111) Os meios de prova existentes no processo, não impõem ou determinam a alteração da matéria de facto, do que se concluirá então que houve erro no respetivo julgamento, com a consequente alteração ou modificação dessa matéria

112) Com base num depoimento que não é decisivo, (depoimento de parte do Administrador JJ) pois dele não resulta a impetuosidade da alteração dos factos dados como provado pela 1ª instância, não poderia dar-se como provado esses factos – alterando a resposta dada na 1ª instância a esse respeito – sem que fosse colocado em causa o princípio da livre apreciação da prova previsto no art. 607º, do CPC, segundo o qual ao proceder a julgamento o Tribunal aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, exceto quando a lei exija formalidades especiais para a prova dos factos controvertidos.

113)A alteração que pode ser feita à matéria de facto julgada provada na 1ª instância nunca pode resultar de uma nova convicção que na 2ª instância possa ser formada acerca da produção da prova, mas apenas de os meios probatórios sobre que tenham assentado as respectivas respostas imporem diferente decisão da que ali foi tomada

114) Em suma, a convicção do julgador da matéria de facto na 1ª instância – gerada no desenrolar da respetiva sessão pelo conjunto de toda a prova produzida e influenciada por fatores culturais como sejam a sua experiência e cultura – é insuscetível de ser controlada na 2ª instância;

115) Os depoimentos prestados pelos trabalhadores subordinados do aqui Recorrente não impõem ou determinam que as respetivas respostas sejam alteradas, a menos que seja posto em causa esse princípio da livre apreciação da prova;

116) Do duplo grau de jurisdição como o próprio legislador refere, "nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a deteção e correção de pontuais, concretos e seguramente excecionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente. " - preâmbulo do ora mencionado diploma legal;

117) Na reapreciação da prova, a Relação, de acordo com o regime legal aqui em vigor, e sem, por isso, em si mesmo, se subverter o princípio da livre apreciação das provas estabelecido no art. 607° do CPC, nº 1, não  ponderou que, na formação da convicção do julgador de 1ª instância, entraram elementos que, em princípio, no sistema da gravação sonora dos meios probatórios oralmente prestados, não podem ser importados para a gravação, como sejam aqueles elementos intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo exterior do depoente que influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe, existindo, assim, actos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que não podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal, que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador;

118) No caso vertente, o Acórdão da Relação apenas valorizou os depoimentos da empresa Recorrida, nas passagens gravadas que a poderiam abonar, desvalorizando algum dos depoimentos prestados com base em razões atinentes a uma estrita imediação, não concluindo sequer pelas existência de erro grosseiro ou evidente na apreciação da prova pelo julgador de 1.ª instância, violando, assim o principio da imediação da prova.

119) Dos testemunhos prestados, em sede de audiência de discussão e julgamento, não se retira, desse cotejo global da prova analisada pelo tribunal da 1ª Instância, que estamos perante um “clamoroso e incontornável erro de julgamento a impor, clara e inequivocamente outra solução” pelo Tribunal da Relação;

120) Diz-nos também a sensatez que, se de facto o Autor, aqui Recorrente, tem, consentimento por parte do Administrador do Pelouro JJ, para tratar da reestruturação com os franceses, conforme este após apurado interrogatório de forma surpreendente veio a afirmar, o que documentalmente já estava provado por não impugnado, não teria, então, havido motivo algum aparente para o Autor aqui Recorrente, proferir tais para com o seu Administrador e , acima de tudo, muito menos perante uma equipa de subordinados que, conforme a Relação teve ensejo de apurar, lhe era hostil por força da presença da mulher do autor na respetiva equipa e no que respeita à respetiva reestruturação da DSI.

121)       Assim, tomando em consideração as razões expressas, deve ser considerado ilícito o despedimento alterando-se, em conformidade, a douta decisão do Tribunal da Relação de Lisboa.»

9. Pugnando no sentido de ver «o presente recurso de revista ser julgado improcedente» e «ser a Ré absolvida nos exactos termos constantes do acórdão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa», contra-alegou a Ré, concluindo do seguinte modo:

«A) Nos termos do artigo 676.º do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigos 1.º, n.º 2, alínea a) e 81.º n.º 5 do Código de Processo do Trabalho) é inadmissível a atribuição ao recurso de efeito suspensivo, com subida imediata e nos próprios autos como pretende o Recorrente.

B) Pelo que, deve ser indeferido o requerimento do Recorrente no sentido de atribuir efeito suspensivo ao presente recurso.

C) No caso em apreço e contrariamente ao que alega o Recorrente, o Tribunal da Relação não excedeu os seus poderes, conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, nem deixou de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, não padecendo o respectivo Acórdão de qualquer nulidade.

D) Mas, ainda que assim não se entenda, o que não se concede, por força do disposto no artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, a arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, pelo que, sendo esta norma também aplicável aos Acórdãos, a arguição de nulidades, que não se aceitam existir, cometidas num acórdão proferido pelo Tribunal da Relação teria, em caso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, de ser feita no requerimento de interposição desse recurso e não apenas nas respectivas alegações.

E) Pelo que, não tendo o Recorrente incluído no requerimento de interposição do recurso a decisiva e autónoma motivação da arguição de nulidades do Acórdão, considera-se extemporânea a arguição que seja feita somente nas alegações de recurso, não sendo de conhecer de tal questão sob pena de violação do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, o que se requer.

F) Não houve erro de julgamento do Tribunal da Relação na resposta que deu à matéria de facto e a invocação pelo Recorrente de que esse Tribunal teria cometido violações da lei processual e substantiva não passa de uma tentativa de levar o Supremo Tribunal de Justiça a reapreciar a matéria de facto, o que é manifestamente inadmissível.

G) O que o Recorrente pretende, de acordo com as suas alegações, é que o Supremo Tribunal de Justiça reaprecie a matéria de facto para verificar se, em face do que as testemunhas disseram, é razoável que o Tribunal da Relação tenha dado como provados os factos que aditou, o que se traduz num recurso sobre a matéria de facto que não é admissível em sede de revista e não pode, por isso, ser admitido.

H) A arguição do Recorrente de que a decisão do Tribunal da Relação violou o direito processual e o direito substantivo não é procedente e é uma mera tentativa de justificar o recurso de revista para tentar obter uma decisão em que o Supremo Tribunal de Justiça não considere a resposta que o Tribunal da Relação deu à matéria de facto.

I) Assim, não é admissível que, como pretende o Recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça verifique se há contradições entre os depoimentos das várias testemunhas ou se há outra prova nos autos para além da que foi mencionada na fundamentação do Acórdão, sob pena de violação dos artigos 672.º n.º 4 e 674.º n.º 3 do CPC.

J) Ao invés, a decisão sobre a matéria de facto constante dos autos é, neste momento, definitiva e ao Supremo Tribunal de Justiça não cabe aferir se, em face da prova produzida, essa decisão deveria ter sido outra, sob pena de violação do disposto nos artigos 674.º n.º 1 e 662 n.º 4 do CPC.

L) Na sua decisão, o Supremo Tribunal de Justiça só pode ter em consideração aqueles que foram os factos dados como provados na acção e fixados pelo Tribunal recorrido, que são suficientes para a decisão jurídica do pleito e deve ter em consideração esses factos.

M) Assim, não é admissível que o Supremo Tribunal de Justiça ignore os factos que o Tribunal da Relação julgou provados, aditados com os n.º 33 a 46, ou tenha em consideração afirmações sobre circunstâncias de facto que não constituem factos provados nos autos, tal como aquelas que o Recorrente vai proferindo ao longo das suas alegações sobre alegadas afirmações das testemunhas ou sobre inferências factuais suas, que não se aceitam como verdadeiras, sob pena de violação do disposto no n.º 1 a 3 do artigo 682.º do CPC.

N) Logo, em relação a tudo o que nas alegações do Recorrente respeita ao apuramento de matéria de facto para efeitos da decisão de direito a ser tomada na presente acção, o recurso deve ser liminarmente rejeitado sem mais apreciações, o que se requer.

O) Na fixação da resposta à matéria de facto, o Acórdão do Tribunal da Relação não violou qualquer disposição de direito processual ou substantivo e, designadamente, não violou nenhuma das normas que o Recorrente vai indicando ao longo das suas alegações sem sustentação.

P) Desde logo, é falso que o Tribunal da Relação tenha violado o princípio da livre apreciação das provas consagrado no n.º 5 do artigo 607.º do CPC.

Q) Com efeito, relativamente à matéria de facto, objecto de recurso, o Tribunal de 2.ª Instância não está obrigado a manter a mesma apreciação do Tribunal da 1.ª Instância e, se assim não fosse, ficaria esvaziado de conteúdo o recurso sobre a matéria de facto.

R) A intenção do legislador ao admitir o recurso sobre a matéria de facto para o Tribunal da Relação é, ao invés, a de criar um verdadeiro duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, o que só pode ser completamente conseguido se a Relação, perante o exame e análise crítica da prova produzida a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção (coincidente ou não com a formada pelo julgador da 1ª instância), no gozo pleno do princípio da livre apreciação da prova, sem estar, de modo algum, limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida.

S) Logo, relativamente aos concretos pontos da matéria de factos que foram objecto de recurso, o Tribunal da Relação não estava vinculado à decisão que foi tomada em 1.ª Instância, podendo alterar a decisão sobre a matéria de facto em conformidade com a prova produzida nos autos nos termos em que fez sem que tal constitua violação do princípio da livre apreciação das provas consagrado no n.º 5 do artigo 607.º do CPC.

T) É patente pelos termos do Douto Acórdão recorrido que o Tribunal a quo procedeu à modificação da decisão de facto em conformidade com o que, na sua perspectiva, resultou da apreciação da globalidade das provas disponíveis no processo.

U) Pelo que se conclui que o Tribunal da Relação julgou em plena liberdade e, por isso, respeitou o princípio da livre apreciação de provas, como determinam os artigos 607.º do CPC e 396.º do Código Civil, que, consequentemente, não foram incumpridos.

V) É completamente falso que o Tribunal “a quo” não tenha tido em consideração a prova produzida pelo Recorrente.

X) Com efeito, no Douto Acórdão proferido onde é expressamente referido que o Tribunal da Relação ouviu na sua integralidade toda a prova produzida - e, portanto, também toda a prova carreada pelo Recorrente - e é, além disso, explicitamente mencionado que, na formação da sua convicção, o Tribunal considerou a prova produzida pelo Recorrente, nomeadamente o teor do depoimento do próprio Autor, assim como o depoimento das testemunhas CC, DD, LL e MM, que foram as testemunhas do Recorrente que depuseram sobre a matéria correspondente aos factos aditados pelo Tribunal.

Z) E também é totalmente infundada a alegação do Recorrente de que o Tribunal não fez a análise crítica de toda a prova e não especificou os fundamentos da sua decisão.

AA) A obrigação que o n.º 4 do artigo 607.º do CPC impõe ao julgador de, na fundamentação da sentença, analisar criticamente as provas, apenas exige que este exponha aquela que foi a sua ponderação sobre a prova em termos que permitam às partes entender as razões da sua decisão relativamente a cada um dos factos que deu como provados e não lhe impõe que esgrima argumentos com as partes, diga tudo o que achou sobre cada uma das provas produzidas ou que refute os raciocínios que cada uma das partes tenha utilizado na análise que, nas respectivas alegações, fez da prova produzida nos autos.

AB) No Douto Acórdão recorrido, o Tribunal da Relação explicou as conclusões que retirou da prova em termos que nos permitem perceber as razões que o levaram a dar como provados os factos que aditou e, por conseguinte, analisou criticamente a prova produzida nos autos em relação aos concretos pontos de facto cujo aditamento foi requerido, cumprindo o disposto no n.º 4 do artigo 607.º do CPC.

AC) É também falso que a matéria a que se reportam os factos aditados com os n.º 45 e 46 não tenha sido alegada pela Empresa Recorrida, constando a mesma dos artigos 27.º e 28.º do articulado do empregador e tendo a mesma sido objecto do recurso sobre a matéria de facto interposto pela Recorrida, que requereu ao Tribunal da Relação que a desse como provada, como se pode comprovar pelas alegações do recurso sobre a matéria de facto que a Recorrido apresentou no dia 1 de Julho de 2013 e que aqui se deram por reproduzidas.

AD) É também falso o que o Recorrente afirma sobre essa matéria não ter sustentação probatória em face da prova produzida nos autos, como, de resto, também foi amplamente exposto nas alegações da Recorrida que sustentaram o recurso sobre a matéria de facto que interpôs em 1 de Julho de 2013, para as quais se remete.

AE) Mas, além disso, no Douto Acórdão recorrido é também expressamente indicada a prova que foi considerada relevante pelo julgador para a demonstração desses factos n.º 45 e 46 e que foram os depoimentos do Dr. JJ e de mais três testemunhas, NN, LL e GG.

AF) Assim, e contrariamente ao afirmado pelo Recorrente, o Tribunal da Relação não decidiu sem sustentação probatória, nem decidiu pela demonstração de factos que não tivessem sido alegados pela empresa Recorrida.

AG) O depoimento de parte, por força do disposto no artigo 352.º do CC, determina a confissão quando incida sobre factos que sejam desfavoráveis ao depoente e que este tenha capacidade e legitimidade para confessar, mas não está limitado a factos que sejam desfavoráveis ao depoente e que este tenha capacidade e legitimidade para confessar.

AH) Pelo contrário, nos termos do artigo 452.º do CPC, o depoimento de parte pode incidir sobre quaisquer factos que interessem à decisão da causa e os únicos limites estabelecidos para esse depoimento estão fixados no artigo 454.º do CPC, onde se estabelece que o depoimento de parte só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento.

AI) Também da circunstância de o n.º 3 do artigo 453.º do CPC estabelecer que cada uma das partes pode requerer não só o depoimento da parte contrária, mas também o dos seus compartes, torna evidente que a lei não pretende limitar a admissibilidade da prova por depoimento de parte apenas às posições judiciais em contraposição.

AJ) No sentido de o depoimento de parte não estar limitado à confissão, aponta, ainda, o n.º 1 do artigo 463.º do CPC, que estatui que o depoimento de parte é sempre reduzido a escrito na parte em que houver confissão do depoente. Logo, a lei admite que exista uma restante parte desse depoimento que não determina a confissão do depoente.

AL) Tal restante parte, por força do princípio da aquisição processual estabelecido no artigo 413.º do CPC, deve ser valorada pelo julgador e, nos termos do artigo 607.º do CPC, estará sujeita à livre apreciação do julgador.

AM) Em consequência, fez muito bem o Tribunal da Relação em valorar o depoimento do Dr. JJ para prova dos factos aditados com os n.º 45 e 46 e essa valoração não constitui violação dos artigos 452.º e 454.º do CPC.

AN) De qualquer modo, mesmo que a valoração do depoimento do Dr. JJ na formação da convicção sobre a veracidade desses factos fosse ilícita, o que não se aceita, tal seria irrelevante em termos de esses factos n.º 45 e 46 se deverem considerar como provados, uma vez que a sua prova assenta, ainda, no depoimento das testemunhas NN, LL e GG, o que para esse efeito é suficiente.

AO) Contrariamente ao que alega o Recorrente, o Tribunal da Relação não decidiu de forma arbitrária, sem provas ou contra provas, mas, antes, com base na prova produzida nos autos que impunha que os factos que aditou com os n.º 33 a 46 devessem ser dados como provados.

AP) Essa prova resulta do depoimento de cinco testemunhas presenciais (GG, HH, II, MM e LL), que assistiram aos factos e que declararam em Tribunal, de forma absolutamente clara e coincidente ter, efetivamente, acontecido aquilo que está descrito nos factos n.º 33 a 43 (Faixas 20121217105745_161457_ 64657;20121217114628 _161457 _64657; 20121217122617_161457_64657;20121217170001_161457_64657;20121217143356_161457_64657)

AQ) Como se pode confirmar pela audição dos respectivos depoimentos, essas cinco testemunhas foram insistentemente inquiridas quer pelo mandatário do Recorrente, quer pela mandatária da Recorrida, quer, ainda, pelo Meritíssimo Juiz “a quo” e a verdade é que não revelaram qualquer contradição entre eles, nem qualquer inconsistência ao longo dos respectivos depoimentos quanto à efectiva ocorrência dos factos imputados ao Recorrente e que conduziram ao seu despedimento.

AR) Do depoimento do Dr. JJ e do testemunho de mais três pessoas, NN, LL e GG resulta a prova de que o Dr. JJ veio a ter conhecimento, no dia 29 de Fevereiro de 2012, de que na reunião do dia 25 de Novembro de 2011, o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta” e de que essas afirmações o ofenderam faixa n.º 20130508155904_ 161457_64657; Faixa n.º 20121217155010_161457_64657; faixa n.º 20121217143356_161457_64657 e Faixa n.º 20121217105745_161457_64657)

AS) Dos depoimentos de GG, HH, II e LL resulta a evidência de que os funcionários da equipa de desenvolvimento da BB (DD, CC, LL, GG, II e HH) participaram na reunião, no dia 25 de Novembro de 2011, cerca das 11 horas, no 8.º piso da empresa, na qual o Recorrente praticou os actos que levaram ao seu despedimento, e que a mesma foi convocada pelo Recorrente.

AT) Mas, além dos participantes na reunião, também o funcionário MM confirmou ao Tribunal que, quando no dia 25 de Novembro de 2011, cerca das 11 horas, concluiu os testes que estava a fazer para a reunião seguinte do upgrade vida e regressou ao seu posto de trabalho, viu, pela porta que se encontrava aberta, que os restantes trabalhadores que compõem a Equipa de Desenvolvimento da BB (DD, CC, GG, II, HH e LL) se encontravam reunidos com o Recorrente no 8.º piso da empresa.

AU) A prova da convocatória e realização da dita reunião resulta ainda do registo de entradas e saídas, que foi junto ao processo disciplinar a fls. 88 e 89 e que é conforme ao depoimento das testemunhas.

AV) O funcionário II, um dos participantes na dita reunião, já se encontrava no hall dos elevadores, preparando-se para se dirigir ao 11.º piso (para a segunda reunião que havia de se realizar nesse dia), quando o Recorrente, abrindo a porta para esse hall, o chamou para se reunir no 8.º Piso. De seguida, o Recorrente regressou para dentro, acompanhado do referido II e esse movimento ficou registado no registo de entradas e saídas.

AX) Assim, a prova documental trazida ao processo confirma o que disseram as testemunhas que nela participaram, de que a reunião onde o Recorrente praticou os actos que conduziram ao seu despedimento foi convocada pelo Recorrente e aconteceu no 8.º piso da empresa no período situado entre as 10h41m (entrada no 8.º piso) e as 11h15m (entrada no 11.º piso) do dia 25 de Novembro de 2011.

AZ) No que respeita ao conteúdo da reunião, as testemunhas GG, HH, II, LL, que nela estiveram presentes, foram unânimes em confirmar de uma forma segura, que, no início dessa reunião, o Recorrente explicou que a mesma se destinava a dar conta do “estado das coisas” e de como o trabalho estava a correr e que, no decurso dessa reunião, aconteceram os factos mencionados nos n.ºs 35 a 43 doa factos provados.

BA) Contrariamente ao que afirma o Recorrente, não é verdade que do testemunho de CC, EE e FF resultasse que o recorrente não poderia estar com os quatro subordinados na dita reunião.

BB) O depoimento de EE e FF incidiu apenas sobre uma outra reunião, que se seguiu àquela que é referida nos factos aditados com os n.º 33 a 43 que se destinava a tratar do upgrading, sem nenhuma relevância para efeitos dos presentes autos.

BC) CC confessou ser amiga pessoal do Recorrente e da mulher deste, tendo sido, desde o início, perceptível que se encontrava visivelmente embaraçada pelo facto de ter de depor nos presentes autos e se, nalgumas matérias é muito assertiva, nomeadamente quanto a ter estado presente na dita reunião, de a mesma ter ocorrido antes das 14 horas do dia 25 de Novembro de 2011 e de não ter durado mais de 20 minutos a meia hora, sempre que foi inquirida sobre o conteúdo da reunião, CC hesitou e contradisse-se e, como já se referiu, usou profusa e sucessivamente expressões como “não me recordo” “não ouvi” e “não me lembro” e confirmou que o Dr. JJ tinha tido conhecimento dos palavrões numa ronda de reuniões individuais que fez no fim de Fevereiro de 2012.

BD) Pelo que, e como bem entendeu o Tribunal da Relação, o testemunho de CC não devia ser considerado suficiente para pôr em causa a credibilidade do depoimento das restantes cinco testemunhas presenciais que, inequivocamente, depuseram nos autos no sentido de, efectivamente, terem ocorrido os factos descritos dados como provados que o Tribunal aditou com os n.º 33 a 46.

BE) Assim, tem inteira razão o Tribunal da Relação quando considera que aquela que foi a convicção da 1.ª Instância não tem suporte razoável no conjunto da prova produzida sobre os mesmos e que devia alterar a decisão fáctica, dando como provados os factos n.º 33 a 46, não violando essa decisão o disposto no artigo 662.º do CPC mas, antes, dando cumprimento a essa disposição.

BF) De resto, as razões invocadas pelo Tribunal de 1.ª instância para não julgar esta matéria como provada eram incompreensíveis e improcedentes como bem considerou o Tribunal da Relação.

BG) E, perante essa prova massiva não fazia qualquer sentido e era, até, bastante surpreendente que o Tribunal de 1.ª Instância não tivesse dado essa matéria como provada, pelo que urgia corrigir esse erro, alterando a decisão em conformidade com a prova produzida nos autos.

BH) E, também procedeu correctamente o Tribunal da Relação quando entendeu que devia eliminar a expressão “educado” do ponto n.º 23 da matéria de facto, uma vez que a mesma estava em contradição com a prova produzida e com os novos factos que deu como provados.

BI) Com efeito, o que resultou da prova produzida nos autos é que, numa reunião de trabalho, o Recorrente, perante os seus subordinados e companheiros de trabalho, se reportou ao seu superior hierárquico e administrador da empresa em termos absolutamente indecorosos e utilizando expressões como, nomeadamente, “até a minha filha de seis anos sabe gerir melhor esta empresa” “cabrão” e “filho da puta”, que não são compatíveis com a conclusão de que o Recorrente é uma pessoa educada.

BJ) E, portanto, por força do disposto no artigo 662.º do CPC, o Tribunal da Relação devia, como fez, alterar a decisão sobre a matéria de facto porque a prova produzida nos autos impunha decisão diversa daquela que foi tomada pela 1.ª instância.

BL) Logo, também a eliminação dessa expressão “educado” do ponto 23 da matéria de facto, contrariamente ao que alega o Recorrente, não extravasa os poderes que o artigo 662.º do CPC confere ao Tribunal da Relação na modificação da decisão de facto.

BM) Assim, ao contrário do que afirma o Recorrente, o Tribunal da Relação não desrespeitou o disposto no artigo 662.º do CPC e, antes, fez bom uso dos poderes que essa norma lhe confere, cumprindo-a integralmente e alterando a decisão sobre a matéria de facto em conformidade com a prova produzida nos autos, que impunha decisão diversa daquela que tinha sido tomada em 1.ª Instância, tal como está devidamente fundamentado no Douto Acórdão recorrido.

BN) Nestes termos, há que se considerar que o Tribunal da Relação agiu em plena conformidade com a lei no que respeita à decisão sobre a matéria de facto, não sendo a mesma desconforme nem ao direito processual, nem ao direito substantivo, pelo que o acórdão recorrido não merece qualquer censura em tudo o que respeita à decisão sobre a matéria de facto.

BO) A decisão de direito que julgou o despedimento lícito e absolveu a Recorrida do pedido é, igualmente, correcta.

BP) Com efeito, e contrariamente ao que afirma, o Recorrente não foi despedido com base em deduções mas, antes, em factos concretos que praticou, que ficaram demonstrados nos autos e que consubstanciam uma violação grave dos deveres a que estava obrigado, constituindo justa causa de despedimento.

BQ) A licitude do despedimento resulta, desde logo, de ter ficado demonstrado que o mesmo foi precedido de processo disciplinar onde foram asseguradas todas as garantias de defesa do Recorrente e cumpridas as demais formalidades exigidas por lei (n.ºs 4 a 7 dos factos provados).

BR) Mas esse despedimento é, ainda, lícito porque, em face da matéria dada como provada pelo Tribunal - que conforme acima se demonstrou não é sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça – ter-se-‑á de concluir que existe justa causa de despedimento.

BS) Tal sucede porque as afirmações proferidas pelo trabalhador e, em especial, as correspondentes a “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa”, “cabrão” e “filho da puta” são, em termos objectivos, susceptíveis de lesar a honra e imagem profissional do Administrador Dr. JJ e ficou demonstrado que não se coadunam minimamente com os padrões de educação e urbanidade praticados na empresa Recorrida (n.º 20 e 22 dos factos provados).

BT) E constituem violação dos deveres de respeitar e tratar com urbanidade e probidade o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as demais pessoas que estejam ou entrem em relação com a empresa, a que o mesmo se encontrava adstrito nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho.

BU) No caso em apreço, os referidos factos são particularmente graves por estar em causa um Director-‑Coordenador da empresa, correspondente ao mais alto nível hierárquico da empresa, que reporta directamente à administração (n.º 21 dos factos provados).

BV) E, ainda, por esses factos terem sido praticados perante vários subordinados hierárquicos (n.º 11 e 14 dos factos provados).

BX) Na verdade, uma função como a de Director-Coordenador só pode ser exercida por quem trate com urbanidade e correcção todos os que com ele se relacionam e, principalmente, os membros dos órgãos sociais da empresa, pelo que a conduta do Recorrente é objectivamente apta a afectar a relação de confiança e respeito mútuos que devem existir entre todos os trabalhadores e o referido administrador.

BZ) Além disso, o Recorrente não podia deixar de saber que estava obrigado a tratar todas as pessoas que com ele trabalhavam, assim como os titulares dos órgãos sociais da empresa, com urbanidade e correcção e que o comportamento que adoptou seria considerado como violador desse dever. O Recorrente não podia, igualmente, deixar de saber que a circunstância de desempenhar funções de topo na empresa lhe conferia maior responsabilidade nas suas acções, pelo que as consequências das mesmas seriam acrescidas.

CA) A utilização de expressões como “cabrão” e “filho da puta”, “até a minha filha de seis anos sabe gerir melhor esta empresa”, bem como a acusação de “gestão danosa”, são objetivamente ofensivas e insultuosas e a sua mera prolação implica a existência de animus injuriandi.

CB) Acresce que, a utilização das referidas expressões por um director de topo perante subordinados hierárquicos e a propósito de um administrador, reveste um nível de agressividade muito elevado, consubstanciando uma injúria e ofensa à honra e dignidade desse administrador.

CC) E o que é mais grave é que, pelo contexto em que foi proferida, mais do que um funcionário perceberam que o Recorrente se estava a referir ao administrador JJ (n.º 17 dos factos provados).

CD) O Recorrente não podia deixar de ter consciência da gravidade da sua actuação sobretudo quando, como ficou demonstrado, na empresa é exigido respeito e correcção entre todos os trabalhadores.

CE) Estando em causa um trabalhador que, à data, exercia o cargo de Director-Coordenador, que constitui o mais alto grau da hierarquia laboral da empresa, essa actuação não pode deixar de ser qualificada como culposa e muito grave.

CF) Além disso, ficaram demonstrados outros factos nos autos que atribuem uma gravidade acrescida à utilização dessa expressão “até a minha filha sabe gerir melhor esta empresa” e que correspondem à utilização pelo Recorrente, a propósito do mesmo administrador, de outras expressões que são, em si mesmas, objectivamente injuriosas, como acusá-lo de fazer “gestão danosa” (n.º 14 dos Factos Provados).

CG) A utilização desta última expressão “gestão danosa”, ainda que não possa, por si só, fundamentar um despedimento lícito (por ter ficado demonstrado que a mesma chegou ao conhecimento do dito administrador no período anterior aos 60 dias que antecederam a instauração do processo disciplinar), pode e deve ser tida em conta na avaliação da gravidade da actuação do Recorrente quando profere também a expressão “até a minha filha sabe gerir melhor esta empresa”, constituindo uma agravante dessa actuação.

CH) A utilização dessa expressão a propósito de um administrador perante subordinados hierárquicos é, em si mesma, muito grave porque mina a confiança que os trabalhadores devem ter na capacidade do seu administrador para gerir a empresa e, ainda mais quando associada ao facto de não ser a primeira vez que o Recorrente utiliza expressões atentatórias da honra e dignidade desse administrador.

CI) Neste caso, é indesmentível que a relação profissional entre o trabalhador e o administrador a quem ele reportava directamente, Dr. JJ, ficou irremediavelmente afectada e insusceptível de ser recuperada.

CJ) E tal como o Tribunal da Relação bem refere “a sanção expulsória mostra-se assim proporcional à gravidade da conduta ilícita do trabalhador, sendo que a aplicação de medidas conservatórias do vínculo representariam uma insuportável imposição à empresa, sendo compreensível, à luz de critérios de razoabilidade, que a mesma tenha perdido a confiança no cumprimento pelo Autor do seu dever de respeito no âmbito da relação laboral”.

CL) E, contrariamente ao que o Recorrente afirma, não há, por conseguinte, qualquer violação da regra da proporcionalidade consagrada no artigo 330.º do Código do Trabalho.

CM) Sendo completamente absurda a afirmação que o Recorrente faz sobre nada nos ser dito sobre se a empresa viabilizaria outra sanção, quando a empresa já aplicou a sanção do despedimento.

CN) Acresce que, como também reconhece o Tribunal da Relação “se a entidade patronal assim não actuasse, estaria aberta uma via para que a indisciplina e o mau ambiente de trabalho se instalassem entre os trabalhadores com as mais graves consequências para uma empresa com a dimensão e os padrões de exigência da Ré.”

CO) Pelo que, é evidente que existe justa causa de despedimento em conformidade com o disposto quer no n.º 1, quer na alínea i) do n.º 2 do artigo 351.º do Código do Trabalho.

CP) Em consequência, também a decisão sobre a matéria de direito deve ser mantida, confirmando-se que o despedimento do Recorrente é lícito e absolvendo-se a Recorrida de todos os pedidos formulados pelo Recorrente.

CQ) Resta, por último, referir que, em qualquer caso, mesmo que se venha a entender que o despedimento do Recorrente foi ilícito, o que não se aceita, perante os factos que ficaram demonstrados, a fixação de uma indemnização em substituição da reintegração nunca deve ser fixada em valor superior ao mínimo.

CR) Pois estando inequivocamente demonstrado que ocorreu uma violação por parte do Recorrente dos deveres de respeito, urbanidade e probidade que lhe são impostos pelos artigos 128.º n.º 1, alínea a) e 351.º n.º 2, alínea i) do Código do Trabalho 2009, conferir uma indemnização superior a esse limite mínimo constituiria a atribuição de um prémio ao trabalhador quando, perante os factos que ficaram demonstrados nos presentes autos, não se pode deixar de entender que a sua actuação é muito censurável, o que seria inaceitável.

CS) Nestes termos, mesmo que se venha a entender que o despedimento é ilícito, o que não se aceita, o valor da indemnização atribuída em substituição da reintegração não deve ser fixado em valor superior a 30 dias de retribuição de base e de diuturnidades conforme permite o n.º 3 do artigo 392.º do Código do Trabalho de 2009.»

10. Admitido o recurso, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer, onde concluiu no sentido de ser de manter o acórdão recorrido, Parecer que, notificado às Partes, não mereceu reação.

11. Delimitação objetiva do recurso

A presente ação foi instaurada em 06 de abril de 2012 e o acórdão sob recurso foi proferido em 11 de fevereiro de 2015.

Nesta conformidade, são aplicáveis, in casu, em termos substantivos, o Código do Trabalho (CT) aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro, e em termos adjetivos, o Código de Processo do Trabalho (CPT) aprovado pelo DL. n.º 480/99 de 9 de novembro, com as alterações introduzidas pelo DL. nº 323/2001, de 17 de dezembro, DL. nº 38/2003, de 8 de março e 295/2009, de 13 de outubro, que o republicou, em vigor desde 1 de janeiro de 2000, e, subsidiariamente, o Código de Processo Civil (NCPC), aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de junho (artigo 5º deste mesmo diploma legal).

Sabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do NCPC, estão em causa na presente revista:

i. A reapreciação da prova;

ii. A (i)licitude do despedimento.

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

 

 É a seguinte a factualidade tida por provada no acórdão sob recurso:

1. No dia 2 de dezembro de 1996, o Autor/Trabalhador AA, foi contratado pela Ré/Empregadora Companhia de Seguros OO, SA, para exercer as funções correspondentes à categoria profissional de Diretor de Serviços,

2. Nos termos que constam do escrito particular de fls. 1 a 5 dos autos que constituem o apenso A, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

3. Em 28/06/2006, a Ré passou a ser designada PP, Companhia de Seguros, SA.

4. Na data de 05 de março de 2012, a Ré decidiu instaurar um processo disciplinar com vista ao despedimento com justa causa do Autor, o que comunicou a este na data de 06 de março de 2012.

5. Na data de 29 de março de 2012, a Ré elaborou a Nota de Culpa cuja cópia consta de fls. 25 a 27 dos autos que constituem o Apenso A e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, da qual deu conhecimento ao Autor através de carta registada com aviso de receção.

6. Em 21 de maio de 2012, a Ré emitiu a Decisão cuja cópia consta de fls. 101 e 102 dos autos que constituem o Apenso A e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, aplicando ao Autor a sanção de despedimento com justa causa,

7. A qual comunicou ao Autor, conjuntamente com o Relatório Final cuja cópia consta de fls. 104 e 110 dos autos que constituem o Apenso A e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, através de carta registada com aviso de receção, que foi recebida por este na data de 25 de maio de 2012.

8. Nessa data de 25 de maio de 2012, o Autor exercia as funções de Diretor-Coordenador da Direção de Sistemas de Informação.

9. Auferia mensalmente, pelo menos, € 2.279,70 de ordenado base, € 158,00 de prémio de antiguidade, € 569,95 de suplemento por isenção de horário de trabalho, e € 2.592,35 de complemento salarial.

10. O Autor é sócio do STAS - Sindicato dos Trabalhadores da Atividade Seguradora, e a Ré é associada da APS – Associação Portuguesa de Seguradores.

11. Em novembro de 2011, GG, II, HH, CC, DD e LL, eram trabalhadores da Ré e subordinados hierárquicos do Autor, que era o chefe dos mesmos.

12. E o Dr. JJ era o Administrador da Ré encarregue do pelouro da Direção de Sistemas de Informação (DSI).

13. Onde se encontravam integrados todos os trabalhadores referidos em 11).

14. O Autor proferiu as expressões “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa” e “gestão danosa” perante, pelo menos, os trabalhadores referidos em 11).

15. O Autor proferiu também a expressão “vou tratar diretamente da reestruturação diretamente com os franceses” perante, pelo menos, os trabalhadores referidos em 11).

16. Ao proferir as expressões referidas em 14) e 15), o Autor não referiu o nome do Administrador JJ.

17. Os trabalhadores GG, II, HH, e LL, entenderam que ao proferir as expressões referidas em 14) e 15), o Autor se estava a referir ao Administrador JJ.

18. Em 28/11/2011, o Administrador JJ tomou conhecimento das referidas expressões “gestão danosa” e “vou tratar diretamente da reestruturação diretamente com os franceses”,

19. E não se sentiu ofendido pelas mesmas.

20. Na empresa Ré é exigido respeito e correção entre todos os trabalhadores.

21. O cargo de Diretor-Coordenador constitui o mais alto grau da hierarquia laboral da empresa e reporta diretamente ao Administrador responsável pelo pelouro,

22. Tratando-se de uma função só pode ser exercida por quem trate com urbanidade e correção todos os que com ele se relacionam, principalmente, os membros dos órgãos sociais da empresa.

23. O Autor é um trabalhador que se obriga a profissionalismo, exigente consigo mesmo e com todos aqueles que com ele trabalha(m), e é zeloso, diligente, cumpridor das suas tarefas. [Facto alterado pelo Tribunal da Relação]

24. Para além do referido em 9), o Autor auferia ainda um subsídio de refeição no valor diário de € 9,00.

25. Em todos os meses do ano de 2011 e no mês de fevereiro de 2012, para além dos valores relativos a ordenado base, prémio de antiguidade, suplemento por isenção de horário de trabalho, complemento salarial, e subsídio de refeição, a Ré pagou ao Autor o valor mensal de € 1.214,50 a título de “CAP. FLEX. EMP. ABON”.

26. No ano de 2011, para além do referido em 25), a Ré pagou ainda ao Autor a quantia de € 41.867,61 a título de distribuição de lucros.

27. O Autor tinha atribuída uma viatura de serviço, para seu uso familiar, 365 dias por ano, de marca … série ... D 5 portas, cujo valor mensal orça em € 735,00.

28. O Autor tem 53 anos de idade.

29. O Autor sempre exerceu funções profissionais de destaque e desde sempre o trabalho desenvolvido pelo Autor foi alvo de manifestações de reconhecimento pelas pessoas com quem diretamente trabalhava e com os seus superiores hierárquicos.

30. O processo disciplinar, e a subsequente decisão de despedimento, provocaram ao Autor tristeza, angústia e desespero, insegurança, isolamento e necessidade de recorrer a ajuda psiquiátrica.

31. As distribuições de lucros são sempre decididas, anualmente, pela Administração da Ré, deliberando esta quer a sua atribuição, quer o respetivo montante.

32. O “CAP. FLEX. EMP. ABON” referido em 25) corresponde a um produto de capitalização concedido a alguns trabalhadores, decidido anualmente pela Administração da Ré.

33. No dia 25 de novembro de 2011, por volta das 11 horas, o Autor convocou uma reunião com a equipa de desenvolvimento do BB, a realizar de imediato. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

34. Nessa reunião estiveram presentes, para além do Autor, GG, II, HH, CC DD e LL. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

35. No início da reunião, o Autor explicou que a mesma se destinava a dar conta do “estado das coisas” e de como o trabalho estava a correr. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

36. De seguida, o trabalhador declarou que andava a tentar puxar pela DSI (Direção de Sistemas de Informação), mas que as coisas estavam difíceis para esta Direção porque “aquele filho da puta lá de cima não nos quer dar nada”. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

37. O trabalhador referia-se ao Dr. JJ, Administrador do BB, que tem o pelouro da DSI. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

38. Tal facto foi percebido pelos presentes de forma inequívoca. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

39. O trabalhador acrescentou “Nós não somos do grupo de amigos dele, dizendo que as subidas de níveis que tinha havido recentemente noutras direções se deviam a amizades e não ao trabalho feito”. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

40. E ainda “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa”. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

41. O Autor referiu ainda ter apresentado à Administração um plano de reestruturação para o seu departamento, mas que o Administrador, Dr. JJ, não estava interessado. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

42. E, a propósito desta questão, acrescentou “não quero saber mais desse cabrão” - querendo referir-se novamente ao Dr. JJ – “e vou tratar da reestruturação diretamente com os franceses”. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

43. O Autor, ainda nessa reunião, afirmou que o que o Administrador estava a fazer na empresa era “gestão danosa”. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

44. Pelo menos os trabalhadores HH, GG e II ficaram chocados e surpreendidos com o teor das afirmações do Autor proferidas na reunião referida em 33. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

45. O Dr. JJ veio a ter conhecimento, no dia 29 de fevereiro de 2012, de que na reunião do dia 25 de Novembro de 2011, o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta”. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

46. Estas afirmações ofenderam o administrador a quem se dirigiam, Dr. JJ. [Facto acrescentado pelo Tribunal da Relação]

III. CONHECENDO.

1. A reapreciação da prova.

1.1 Lidas as 121 conclusões da revista, resulta ex abundanti que é pretensão do Recorrente que este Supremo Tribunal de Justiça reaprecie quer a prova produzida, na 1ª instância, em audiência de julgamento, quer as alterações produzidas pelo Tribunal da Relação e correlata fundamentação aí prestada, com vista à verificação do erro de julgamento em que incorreu o mesmo tribunal de recurso.

São pontos tocantes daquele acervo conclusivo: (i) a subversão do princípio da livre apreciação da prova [Ex.g.: Cls. 3, 4, 15, 41, 84, 88, 89, 90, 91, 92, 103, 114, 115, 116, 117]; (ii) a omissão da análise crítica das provas [Ex.g: Cls. 6, 7, 8, 42, 71, 72, 105, 106, 107, 108]; (iii) o erro manifesto na apreciação da prova [Ex.g.: Cls. 1, 9, 14, 16, 17, 21, 22, 23, 24, 25, 101, 102, 103, 111, 112, 118, 119, 120 ]; (iv) o uso processualmente ilegítimo das presunções naturais [Ex.g.: Cls. 19, 95, 104; (v) valoração ilícita de prova e/ou «vício do procedimento probatório» e/ou violação do princípio da prova vinculada [Ex.g.: Cls. 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 73, 74, 85, 86, 87, 98].

Todas estas questões prendem-se com a apreciação das provas e com a fixação dos factos materiais.

1.2 Decorre do disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, que a Relação pode alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto fixada pela 1.ª instância, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Nos termos previstos no n.º 2, do mencionado preceito, a Relação poderá também, ex officio: «a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;

b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;

c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;

d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados

Nos termos do citado preceito legal, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação, facultando-se a esta proceder não só à reponderação da decisão recorrida, como também ao reexame da causa, determinando a renovação dos meios de prova produzidos pela 1.ª instância ou até a produção de novos meios de prova, nas circunstâncias ali previstas.

A determinação dos factos pela Relação, após a reapreciação da prova, deve decorrer da análise crítica dos elementos probatórios para o efeito apreciados, de acordo com a própria convicção que a Relação sobre eles forma, sem quaisquer limitações, a não ser as impostas pelas regras de direito probatório material, ou seja, pelas regras que atribuem força probatória plena a determinados meios de prova e/ou pelas que impõem que a prova de determinado facto se faça por certo meio probatório.

Ou seja, o princípio da livre apreciação da prova, plasmado no n.º 5 do art.º 607.º do CPC, vigora para a 1.ª instância e, de igual modo, para a Relação quando é chamada a reapreciar a matéria de facto.

Compete, assim, ao Tribunal da Relação reapreciar todos os elementos probatórios que tenham sido produzidos nos autos e, de acordo com a convicção própria que com base neles forme, consignar os factos materiais que julga provados, coincidam eles, ou não, com o juízo alcançado pela 1.ª instância pois só assim atuando está, efetivamente, a exercitar os poderes que nesse âmbito lhe são legalmente conferidos. 

Como explica Abrantes Geraldes ([1]), «(…) sendo a decisão do tribunal a quo o resultado da valoração de meios de prova sujeitos à livre apreciação (…) a Relação, assumindo-se como verdadeiro tribunal de instância, está em posição de proceder à sua reavaliação, expressando, a partir deles, a sua convicção com total autonomia. Afinal nestes casos, as circunstâncias em que se inscreve a sua atuação são praticamente idênticas às que existiam quando o tribunal de 1ª instância proferiu a decisão impugnada, apenas cedendo nos fatores da imediação e oralidade.

Fazendo incidir sobre tais meios probatórios os deveres e os poderes legalmente consagrados e que designadamente emanam dos princípios da livre apreciação (art. 607.º, n.º 5) ou da aquisição processual (art.º 413.º) deve reponderar a questão de facto em discussão e expressar de modo autónomo o seu resultado: conformar a decisão, decidir em sentido oposto ou, num plano intermédio, alterar a decisão no sentido restritivo ou explicativo.»

Estes amplos poderes de reapreciação da matéria de facto conferidos à Relação não são, no entanto, extensíveis ao Supremo Tribunal de Justiça, o que, como refere Abrantes Geraldes ([2]) «(…) se compreende num contexto em que é atribuída a este último tribunal competência privilegiada para apreciar questões de direito, deixando para as instâncias a circunscrição dos factos».

Efetivamente, em sede de revista, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do apuramento da matéria de facto relevante é residual e destina-se exclusivamente a apreciar a observância das regras de direito material probatório, nos termos conjugados dos arts. 674.º, n.º 3 e 682.º, n.º 2, do NCPC, ou a mandar ampliar a decisão sobre a matéria de facto, nos termos do n.º 3 deste último preceito legal.

Na verdade, dispõe o n.º 3 do referido art.º 674.º que «[o] erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova».

Por seu lado, dispõe o n.º 2 do citado art.º 682.º que «[a] decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excecional previsto no n.º 3 do artigo 674.º».

Como se consignou no acórdão desta Secção, de 27.03.2014, proferido no Proc. 184/11.2.TTVLG.P1.S1 ([3]), «[c]om a ressalva do condicionalismo excetivo decorrente da ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, não pode alterar a matéria de facto fixada nas instâncias recorridas».

Ou, como se reafirmou no sumário do aresto desta Secção, de 14.05.2014, proferido no âmbito da Revista n.º 260/07 ([4]), «I - Na questão de facto, o duplo grau de jurisdição pressupõe que o Tribunal da Relação, instruído no princípio da livre apreciação da prova, crie e faça refletir na sua decisão a sua própria convicção. II - Em sede de revista, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça é residual e destina-se exclusivamente a apreciar a observância das regras de direito material probatório ou a mandar ampliar a decisão sobre a matéria de facto. III – Sempre que um ponto da matéria de facto (quesito) integre uma afirmação ou uma valoração de facto que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objeto da ação, comportando uma resposta ou componente de resposta àquelas questões, deve o mesmo ser eliminado».

Desta forma, no tocante à modificabilidade da decisão de facto, a intervenção do Supremo reconduz-se à verificação da conformidade da decisão de facto com o direito probatório material, nos estritos termos dos normativos citados.

Isto é, ao nível da decisão da matéria de facto, a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça é limitada à apreciação da observância das regras de direito probatório material (denominada prova vinculada), ficando fora do seu âmbito de competência a reapreciação da matéria de facto fixada pela Relação no domínio da faculdade prevista no art.º 662.º do CPC, suportada em prova de livre apreciação e posta em crise apenas no âmbito da perceção e formulação do respetivo juízo de facto.

Assim, o Supremo Tribunal de Justiça, só pode alterar a decisão proferida pelo tribunal recorrido no respeitante à matéria de facto quando, nessa fixação, tenha havido ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova, ou seja, quando tiver sido dado como provado determinado facto sem que tenha sido produzido o meio de prova de que determinada disposição legal faz depender a sua existência, quando determinado facto tenha sido dado como provado por ter sido atribuído a determinado meio de prova uma força probatória que a lei não lhe reconhece ou quando um facto tenha sido dado como não provado por não ter sido atribuído a determinado meio de prova a força probatória que a lei lhe confere.

1.3 No caso em apreço, o recorrente insurge-se com o facto de o Tribunal da Relação ter determinado o aditamento dos factos elencados sob os pontos 33 a 46 e, ainda, de ter alterado a redação do facto provado n.º 23, eliminando a expressão “educado”.

Tendo sido chamado a reapreciar a matéria de facto, no acórdão recorrido exarou-se o seguinte a esse propósito:

«A – Do recurso da Ré

1. impugnação da matéria de facto

Importa sublinhar que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre (art.º655 do CPC), segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, nem preocupação quanto à natureza de qualquer delas, e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido. No tocante ao julgamento da matéria de facto refere o Tribunal. Constitucional, de 3.10.2001, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 51°., págs. 206 e ss. – “ A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas, e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova" e factores que não são "racionalmente demonstráveis, de tal modo que a função do Tribunal de 2ª instância deverá circunscrever‑se a apurar da razoabilidade da convicção probatória do 1º grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos”.

Posto isto analisemos a impugnação apresentada pela Apelante.

Vem esta impugnar a matéria de facto, sustentando que a decisão que sobre ela recaiu peca por deficiência, por não se ter dado por integralmente provados os factos alegados nos arts. 12 a 28 do articulado do empregador e que constam igualmente da nota culpa e da decisão disciplinar.

Entende assim que devem ainda considerar-se provados os seguintes factos:

(i) No dia 25 de Novembro de 2011, pelas 11 horas, o trabalhador convocou uma reunião com a equipa de desenvolvimento da BB, a realizar de imediato (artigo 12.º do AE).

(ii) Nessa reunião estiveram presentes, para além do trabalhador, os senhores GG, II, HH, CC, DD e LL (artigo 13.º do AE).

(iii) Todos os referidos trabalhadores, convocados e presentes nessa reunião, eram, à data, subordinados hierárquicos do trabalhador, Sr. AA (artigo 14.º do AE).

(iv) No início da reunião, o trabalhador explicou que a mesma se destinava a dar conta do “estado das coisas” e de como o trabalho estava a correr (artigo 15.º do AE).

(v) De seguida, o trabalhador declarou que andava a tentar puxar pela DSI (Direcção de Sistemas de Informação) mas que as coisas estavam difíceis para esta Direcção porque “aquele filho da puta lá de cima não nos quer dar nada” (artigo 16.º do AE).

(vi) O trabalhador referia-se ao Dr. JJ, Administrador da BB que tem o pelouro da DSI (artigo 17.º do AE).

(vi) Tal facto foi percebido pelos presentes de forma inequívoca (artigo 18.º do AE).

(vii) O trabalhador acrescentou “nós não somos do grupo de amigos dele, como a DT e a DMC” – referindo-se às Direcções Técnica e de Marketing, respectivamente – dizendo que as subidas de níveis que tinha havido recentemente noutras Direcções se deviam a amizades e não ao trabalho feito (artigo 19.º do AE).

(ix) Seguidamente, referiu que “se calhar devíamos fazer o mesmo, deixar de trabalhar a ver se somos promovidos” (artigo 20.º do AE).

(x) Em resposta a esta declaração, o Sr. II, presente na reunião, disse que devia seguir-se o plano de acção e trabalhar, mas o trabalhador retorquiu, dizendo que não havia plano de acção e que, com a gestão que estava a ser feita, nem sabia se ia haver (artigo 21.º do AE).

(xi) O trabalhador acrescentou “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa” (artigo 22.º do AE).

(xii) De seguida, o trabalhador queixou-se aos presentes de ter apresentado à Administração um plano de reestruturação para o seu departamento, mas que o Administrador, Dr. JJ, não estava interessado (artigo 23.º do AE).

(xiii) E, a propósito dessa questão, acrescentou “não quero saber mais desse cabrão” – referindo-se novamente ao Dr. JJ – “e vou tratar da reestruturação directamente com os franceses” (artigo 24.º do AE).

(xix) O trabalhador concluiu a reunião dizendo que o Administrador, Dr. JJ, estava a fazer na empresa era “gestão danosa” (artigo 25.º do AE).

(xx) Os trabalhadores que estavam presentes na reunião acima descrita e que ouviram as referidas afirmações ficaram chocados e surpreendidos com o teor das mesmas (artigo 26.º do Articulado do Empregador)

(xxi) O Dr. JJ veio a ter conhecimento, no início de Março de 2012, de que, na reunião acima descrita, o trabalhador tinha dito “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa” e que se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta” (artigo 27.º do Articulado do Empregador).

(xxii) As afirmações proferidas pelo trabalhador ofenderam o administrador a quem se dirigiam Dr. JJ (artigo 28.º do Articulado do Empregador).

Ouvida, na sua integralidade, a prova produzida em julgamento, entendemos que, em traços gerais, assiste razão à Apelante, já que a mesma fez prova abundante e convincente da aludida factualidade, sendo que a convicção firmada pela 1ª instância, ao dar como não provada essa factualidade, não tem razoável suporte nos elementos de prova carreados para os autos, pelo que não pode manter-se.

Sobre a matéria dos arts. 12 a 25 do articulado do empregador depuseram as testemunhas GG, HH, II e LL que afirmaram que foram convocados pelo Autor, no dia 25.11.11, um pouco antes das 11 horas, para uma reunião, que teve lugar de imediato.

Nessa reunião, na qual estiveram presentes, e que se destinava a dar conta “do estado das coisas” e pô-los a par dos assuntos da “reestruturação” que estava a ser discutida na empresa, aquelas quatro testemunhas declararam de forma precisa e coincidente entre si, que o Autor proferiu as declarações contidas nos arts. 15, 16, 19, 20, 22, 23, 24 e 25 do articulado do empregador.

Mais esclareceram que, nessa reunião, o Autor nunca mencionou o nome do administrador JJ, mas atento o contexto em que foram proferidas as declarações e porque era este o Administrador do pelouro da informática em que estava inserido o Autor e os trabalhadores presentes na reunião, cabendo-lhe tomar as decisões nessa área, não tiveram quaisquer dúvidas que aquelas a ele se reportavam.

Precisaram ainda que a reunião se iniciou por volta das 11 horas e que terá durado cerca de 15, 20 minutos.

A testemunha LL afirmou ainda que saiu da reunião com o Autor e foram juntos para a outra (do upgrade), que começou às 11h20.

Por seu turno, o registo de entradas e saídas do Autor nos diversos pisos das instalações da Ré, que consta de fls. 88 e 89 do processo disciplinar, ocorridas no dia 25.11.11, é condicente com a aludida factualidade e relatada pelos depoimentos destas testemunhas.

A mesma testemunha adiantou ainda que o uso daquelas expressões pelo Autor, referindo-se ao Administrador JJ, na reunião em causa, não foi caso único. Anteriormente já havia referido esses nomes, reportando-se a este Administrador, ao depoente, em conversas particulares, embora nunca o tivesse feito em reuniões de trabalho.

E também “não cola” a tese de um complot contra o Autor que se fez passar nos articulados, no sentido de que este trabalhador teria em vista apossar-se do lugar do Autor, já que resulta da prova produzida que não foi o trabalhador LL quem denunciou ao Administrador as declarações mais gravosas por aquele proferidas, mormente os impropérios, (tendo-os mesmo omitido num encontro que teve com aquele administrador, em novembro de 2011 e em que foi abordada a reunião em causa), mas antes GG quem acabou por fazê-lo, já em março do ano seguinte.

Aliás, o próprio Autor, ouvido em declarações na audiência de julgamento, admitiu que possa ter referido que “ia falar com os franceses”, referindo-se ao processo de reestruturação e ainda que proferiu a expressão “gestão danosa” e “a minha filha de seis anos sabia melhor gerir”, embora usadas em contexto diferente do que lhe é imputado no processo disciplinar.

Também a testemunha MM, analista programador, igualmente inserido na direcção de informática, referiu que não esteve presente na reunião em causa porque estava a fazer testes para a reunião que teve lugar a seguir, no 11º andar, tendo afirmado, peremptoriamente, que essa reunião teve lugar na “sala estrela” (sala de reuniões da DSI), tendo visto as pessoas que nela participaram dentro da sala, nomeadamente as trabalhadoras CC e DD.

À hora do almoço, os colegas II, HH e GG contaram-lhe o que se passou na reunião, tendo-lhe sido referidas as expressões “filho da puta” e “cabrão” como tendo sido proferidas pelo Autor, dirigidas ao Administrador JJ.

Todas estas testemunhas foram insistentemente inquiridas pelos mandatários das partes e ainda pelo Sr. Juiz a quo e não revelaram contradição entre os vários depoimentos.

Os dois depoimentos dissonantes a esta matéria foram prestados pelas testemunhas DD e CC.

A 1ª é mulher do Autor e também trabalhadora da Ré, que referiu que não assistiu a nenhuma reunião onde aquele tenha proferido aquelas expressões ou os palavrões e que o mesmo tem uma “linguagem cuidada”, principalmente se havia mulheres presentes.

A 2ª pensa que a reunião foi com toda a equipa de desenvolvimento, não se recordando da data, mas afirmando que a reunião ocorreu e que esteve presente.

Admite que o Autor tenha proferido as expressões “gestão danosa” e a “minha filha de 6 anos sabia gerir melhor”. No entanto, referiu que a expressão “gestão danosa” foi usada quando o Autor se referiu ao prejuízo de €90.000,00 sofrido pelo BB, por exposição à dívida grega e porque não se havia actuado em tempo útil para evitar esse prejuízo.

No entanto, a testemunha confirmou que é amiga do Autor e da mulher deste, DD, mantendo com eles uma relação bastante próxima.

Essa proximidade foi depois evidenciada pelo Administrador, JJ, que referiu que a trabalhadora CC entrou na empresa por conhecimento do Autor, adiantando ainda que, após a saída do Autor, esta recebeu um telefonema da mulher deste, pedindo-lhe para destruir um conjunto de programas informáticos, com o intuito de provocar danos na empresa.

Desta forma, entendemos que não podemos dar credibilidade ao depoimento destas duas testemunhas em que o Sr. Juiz se apoiou para pôr em causa o depoimento dos restantes trabalhadores ouvidos aos arts. 12 a 25 do articulado do empregador.

O facto das testemunhas terem presenciado que o Autor se apresentava “normal” e “calmo” na aludida reunião não põe em causa a credibilidade do seu depoimento, até porque não é indispensável estar-se alterado ou nervoso para que se possa falar nos termos em que aquele o fez.

Por outro lado, também não colhe a objecção feita pelo Tribunal a quo, das testemunhas não saberem justificar a actuação do Autor, nem o terem questionado sobre a mesma. Há que ter presente que essas testemunhas eram, todas elas, subordinados hierárquicos do Autor e que então estava instalada uma certa tensão entre este e o Administrador JJ, por haver posições divergentes quanto à reestruturação, o que era do conhecimento daquelas testemunhas, tornando desnecessária a aludida indagação.

Assim, quanto à matéria alegada nos arts. 12 a 25 do articulado do empregador, porque aquela que foi a convicção da1ª instância não tem suporte razoável no conjunto da prova produzida sobre os mesmos, entendemos dever alterar a decisão fáctica, devendo dar-se como provados os seguintes factos, cujo aditamento se determina:

33. No dia 25 de Novembro de 2011, por volta das 11 horas, o Autor convocou uma reunião com a equipa de desenvolvimento do BB, a realizar de imediato.

34. Nessa reunião estiveram presentes, para além do Autor, GG, II, HH, CC DD e LL.

35. No início da reunião, o Autor explicou que a mesma se destinava a dar conta do “estado das coisas” e de como o trabalho estava a correr.

36. De seguida, o trabalhador declarou que andava a tentar puxar pela DSI (Direcção de Sistemas de Informação), mas que as coisas estavam difíceis para esta Direcção porque “aquele filho da puta lá de cima não nos quer dar nada”.

37. O trabalhador referia-se ao Dr. JJ, Administrador do BB, que tem o pelouro da DSI.

38. Tal facto foi percebido pelos presentes de forma inequívoca.

39. O trabalhador acrescentou “Nós não somos do grupo de amigos dele, dizendo que as subidas de níveis que tinha havido recentemente noutras direcções se deviam a amizades e não ao trabalho feito”.

40. E ainda “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa”.

41. O Autor referiu ainda ter apresentado à Administração um plano de reestruturação para o seu departamento, mas que o Administrador, Dr. JJ, não estava interessado.

42. E, a propósito desta questão, acrescentou “não quero saber mais desse cabrão” - querendo referir-se novamente ao Dr. JJ – “e vou tratar da reestruturação directamente com os franceses”.

43. O Autor, ainda nessa reunião, afirmou que o que o Administrador estava a fazer na empresa era “gestão danosa”.

A matéria do art. 26 do articulado da empregadora resulta do depoimento das testemunhas HH e MM.

A primeira referiu que, após a reunião, “ficaram em choque e preocupados com o que foi dito”.

Também a testemunha MM referiu que foi almoçar, no dia da reunião, com o II, HH e GG e que estes “estavam escandalizados pelos termos que foram usados”.

Por seu turno, estas três testemunhas referiram que o que foi dito pelo Autor na reunião os deixou muito preocupados, sobretudo com a afirmação feita pelo Autor de contactar directamente com os franceses, ultrapassando o Administrador, de tal maneira que pediram ao LL, seu chefe directo, para os receber, o que teve lugar no dia seguinte, sábado, em casa deste.

Assim determina-se o aditamento do seguinte ponto:

44. Pelo menos os trabalhadores HH, GG e II ficaram chocados e surpreendidos com o teor das afirmações do Autor proferidas na reunião referida em 33.

Relativamente à matéria dos arts. 27 e 28 do articulado da empregadora a testemunha LL referiu que apenas no início de Março de 2012 o Administrador JJ teve conhecimento que o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta” (a testemunha omitiu-lhe estas expressões quando lhe reportou a ocorrência da reunião, em Novembro de 2011, na sequência da preocupação expressa por outro três colaboradores), porque foi então chamado por este e confrontado com aquelas afirmações.

Esta versão foi também corroborada pelas testemunhas HH e II.

A testemunha LL referiu ainda que o Dr. JJ estava muito perturbado e que lhe disse que nunca esperava que isso viesse a acontecer.

Também a testemunha NN, Director de Recursos Humanos, a quem aquele Administrador se dirigiu no sentido de ser instaurado o processo disciplinar ao Autor pôde constatar que o mesmo estava muito ofendido.

Por sua vez, nas declarações que prestou, o Dr. JJ, referiu que tomou conhecimento dos palavrões no dia 29.2.2012, através do GG, e que ficou “estarrecido” relativamente à linguagem empregue e que, embora considere que o Autor tem uma personalidade impulsiva e conflituosa, nunca pensou que ele chegasse a este extremo.

Assim determina-se o aditamento de dois novos pontos, com o seguinte teor:

45. O Dr. JJ veio a ter conhecimento, no dia 29 de Fevereiro de 2012, de que na reunião do dia 25 de Novembro de 2011, o Autor se referiu a ele como “cabrão” e “filho da puta”.

46. Estas afirmações ofenderam o administrador a quem se dirigiam, Dr. JJ.

Por estar em contradição com a prova produzida e com os factos ora aditados, determina-se ainda a eliminação da expressão “educado” do ponto 23 da matéria de facto.

Procede, pois, parcialmente a impugnação da matéria de facto nos termos supra referidos.»

Da leitura do acórdão recorrido, em particular do excerto citado, resulta evidente que o Tribunal da Relação reapreciou a globalidade das provas produzidas no processo, procedeu ao confronto entre elas, explicou as conclusões da prova que reavaliou e, a final, procedeu à modificação da decisão de facto de acordo com a convicção que formou acerca dos factos em discussão.

Ou seja, depois de reapreciar os meios de prova produzidos junto da 1.ª instância, o Tribunal da Relação explicitou as razões que o levaram a dar como provados os factos aditados e especificou os fundamentos decisivos para a sua convicção, dando dessa forma cabal cumprimento ao disposto no art.º 607.º, n.º 4, do CPC.

Com efeito, o Tribunal da Relação analisou e confrontou entre si as declarações ouvidas em julgamento pelo Autor e pelo legal representante da Ré, JJ, assim como os depoimentos prestados por LL, MM, DD, CC, HH, II, GG - os quais depuseram na qualidade de testemunhas sobre os factos aditados - tendo igualmente ponderado a respetiva razão de ciência e a credibilidade que cada uma lhe mereceu, em função das relações pessoais e profissionais que mantinham/mantêm com as partes.

Em concreto, o Tribunal recorrido fundamentou o aditamento aos factos provados da matéria constante dos arts. 12.º a 25.º do articulado da Ré/empregadora (pontos 33 a 43) nos depoimentos conjugados das testemunhas GG, HH, II e LL, que conjugou também com o registo de entradas e saídas junto a fls. 88-89 do processo disciplinar ocorridas no dia 25.11.2011, com o depoimento de MM e, ainda, com as declarações prestadas em audiência pelo próprio Autor, tendo considerado que aquela que foi a convicção da 1.ª instância não tem suporte razoável no conjunto da prova produzida sobre os mesmos.

A propósito destes factos, o Tribunal da Relação esclareceu também o motivo pelo qual entendeu não atribuir credibilidade aos depoimentos das testemunhas DD e CC, ao contrário da 1.ª instância que se havia apoiado nos depoimentos destas para pôr em causa o depoimento das testemunhas acima mencionadas.

Já a matéria do artigo 26.º do articulado da empregadora (ponto 44), foi aditada com base nos depoimentos das testemunhas HH e MM, devidamente conjugados com os depoimentos prestados pelas testemunhas II e GG.

Relativamente à matéria dos artigos 27.º e 28.º do articulado da empregadora, aditada aos factos provados sob os pontos 45 e 46, o Tribunal da Relação fundou a sua convicção nos depoimentos conjugados das testemunhas LL, HH, II e NN, tendo a este propósito sido também consideradas as declarações prestadas em sede de julgamento por JJ, legal representante da Ré.

É certo que ao aditar novos factos, o Tribunal da Relação fez uma valoração da prova diversa da seguida pela 1.ª instância.

Tal circunstância, no entanto, não atenta contra o princípio da livre apreciação da prova, princípio este que, conforme referimos supra, tanto vigora para a 1.ª instância como para a Relação quando é chamada a reapreciar a matéria de facto.

Destarte, o Tribunal da Relação, exercitando poderes que nesse âmbito lhe são legalmente conferidos, reapreciou e reponderou todos os elementos probatórios produzidos nos autos, expressou, a partir deles, a sua convicção com total autonomia e, de acordo com a convicção própria que com base neles formou, exprimiu o seu resultado, aditando os factos materiais que julgou igualmente provados.

É, assim, totalmente infundada a alegação do Recorrente de que o Tribunal da Relação violou o princípio da livre apreciação da prova e não procedeu à análise crítica da prova e à especificação dos fundamentos da sua convicção.

1.4 Improcedente é também a alegação do Recorrente segundo a qual o acórdão recorrido violou o disposto no art.º 662.º, do CPC, mormente no que respeita à valoração que fez da matéria de facto, incorrendo em erro na apreciação da prova e fazendo uso processualmente ilegal das presunções naturais.

Conforme já se referiu, decorre da leitura do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação, reapreciando a prova testemunhal produzida e conjugando-a com os esclarecimentos prestados pelas partes determinados por despacho judicial de fls. 482, decidiu alterar a decisão da matéria de facto proferida pela 1.ª instância, aditando novos factos.

Dentro do já referido alargado âmbito de atuação no que à reapreciação da matéria de facto lhe é legalmente concedido, colocada na mesma posição do julgador da 1ª Instância, nada impedia a Relação, também como tribunal de instância, de proceder às modificações que levou a efeito, porque se tratam, exclusivamente, de meios de prova submetidos ao princípio da livre apreciação da prova e, portanto, à livre convicção do julgador (artigos 396.º do Código Civil e 466.º, n.º 3 do NCPC), não cabendo, por isso, nos poderes cognitivos deste Supremo Tribunal pronunciar-se sobre o invocado erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa (artigos 662.º, n.º 4, 674.º, n.º 3, e 682.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), no que concerne à determinação, pelo acórdão recorrido, de considerar provada a matéria constante dos factos n.ºs 23.º a 28.º do articulado da empregadora, que vieram a constar sob os n.ºs 33 a 46 dos factos provados, e de alterar a redação do ponto 23.

Na verdade, essa reapreciação estava contida nos poderes que competem ao Tribunal da Relação, o qual estava, no caso, na posse dos mesmos elementos probatórios de que dispunha a 1ª instância para se poder substituir a esta e proceder à reapreciação completa da decisão da matéria de facto impugnada, sem quaisquer limitações, a não ser as impostas pelas regras de direito probatório material.

É que, conforme vem referido no acórdão deste Supremo Tribunal de 15.04.2015, proferido no processo, 1716/11.1TTPNF.P1.S1 «[d]a leitura do art. 662º/1 do NCPC, ressuma o propósito do legislador em dar sentido prático ao princípio do duplo grau de jurisdição imputando ao Tribunal da Relação o dever de, na reapreciação da matéria de facto, formar autonomamente a sua convicção, seja ex officio, seja a solicitação do recorrente e/ou do recorrido com referência aos meios de prova correspetivamente indicados

No caso concreto, não se vislumbra que o acórdão recorrido tenha infringido o disposto no art.º 662.º, do NCPC, sendo certo que, no que diz respeito à prova testemunhal e às declarações/esclarecimentos prestados pelas partes, sendo as mesmas suscetíveis de ser apreciadas pelo Tribunal da Relação, de acordo com o princípio da livre apreciação, estão as mesmas fora da sindicância deste Supremo Tribunal, o qual funcionando estruturalmente como um tribunal de revista, aprecia, em princípio, matéria de direito, cabendo-lhe aplicar definitivamente à factualidade fixada pelas instâncias o regime jurídico que entenda adequado.

Relativamente ao alegado “uso processualmente ilegal das presunções naturais”, importa referir que de entre os poderes que podem ser exercitados pela Relação não se exclui o uso de presunções sendo estas, segundo o artigo 349.º do Código Civil, «(…) ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido», sendo que, nos termos do artigo 351.º do Código Civil, «[a]s presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal».

No dizer de Pires De Lima e Antunes Varela ([5]), as presunções judiciais «inspiram-se nas máximas da experiência, nos juízos correntes de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana.»

Traduzindo-se as presunções judiciais em juízos de valor formulados perante os factos provados, as mesmas referem-se ao julgamento da matéria de facto.

Ora, é pacífico o entendimento de que a Relação, conhecendo de facto, pode extrair dos factos materiais provados as ilações que deles sejam decorrência lógica, bem como sindicar as presunções judiciais tiradas pela 1.ª instância. Pode também extrair dos factos apurados presunções legais impostas pelas regras de experiência, nos termos do art.º 607.º, n.º 4, ex vi art.º 663.º, n.º 2, do CPC, ainda que nestes casos a Relação não possa contrariar outros factos que, tendo sido considerados provados pela 1.ª instância não foram objeto de impugnação. ([6])

Essa atividade, em regra, também não é sindicável por este Supremo Tribunal.

O Supremo Tribunal de Justiça só pode ajuizar, por se tratar de uma questão de direito, se as presunções extraídas pelas instâncias violam o disposto nos artigos 349.º e 351.º citados, isto é, se foram tiradas de factos desconhecidos (não provados) ou irrelevantes para firmar factos desconhecidos ou se exigem um grau superior de segurança na prova, ou, ainda, se conflituam com a factualidade material provada ou contrariam um facto que tenha sido submetido a concreta discussão probatória e que o tribunal considerou não provado (cf. Acórdãos deste Supremo Tribunal, de 22 de Fevereiro de 2005, Revista n.º 4594/04, da 1.ª Secção, de 7 de Abril de 2005, Revista n.º 393/05, da 7.ª Secção, de 1 de Março de 2007, Revista n.º 4192/06, e de 27 de Junho de 2007, Revista n.º 1050/07, ambos da 4.ª Secção).

No caso concreto, não resulta do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação, na reapreciação que fez da matéria de facto, tivesse extraído presunções em violação do disposto nos artigos 349.º e 351.º do Código Civil, pelo que improcede também a alegação do Recorrente imputando ao tribunal recorrido o “uso processualmente ilegal das presunções naturais”.

1.5 Sustenta, ainda, o recorrente que o Tribunal da Relação procedeu a uma valoração ilícita de prova e incorreu em «vício do procedimento probatório» e/ou violação do princípio da prova vinculada.

A este propósito invoca, por um lado, que ao aditar sob o n.º 45 um facto com base única e exclusivamente nas afirmações de JJ, legal representante da Ré, o acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 452.º e seguintes do CPC, na medida em que o depoimento de parte visa a confissão e, como tal, apenas pode incidir sobre factos desfavoráveis ao depoente, tendo o Tribunal da Relação se baseado «… exclusivamente nessas declarações para formar a sua convicção sobre os factos controvertidos que deu como provados e não provados pela 1.ª instância» (conclusão n.º 86).

Por outro lado, alega que o Tribunal da Relação extravasou os seus poderes ao determinar a eliminação da expressão “educado” do ponto 23, dado que a Ré não impugnou esse facto que se mostra também corroborado pelos documentos carreados para os autos e não impugnados (conclusão n.º 87).

Uma vez mais não assiste razão ao recorrente.         

Desde logo porque, ao contrário do que o mesmo alega, o Tribunal da Relação não atendeu, em exclusivo, às afirmações de JJ, legal representante da Ré, para dar como provado o facto aditado sob o n.º 45.

Com efeito, uma leitura atenta do acórdão recorrido, em particular do excerto acima transcrito, demonstra claramente que relativamente à matéria dos artigos 27.º e 28.º do articulado da empregadora, aditada aos factos provados sob os pontos 45 e 46, o Tribunal da Relação fundou a sua convicção nos depoimentos das testemunhas LL, HH, II e NN, que conjugou com as declarações prestadas por JJ, legal representante da Ré.

Outrossim, ao contrário do que também sustenta o recorrente, o legal representante da Ré, JJ, não foi ouvido ao abrigo do disposto no art.º 452.º, do CPC, preceito legal que dispõe acerca do depoimento de parte.

Na verdade, compulsados os autos, verifica-se que foi ao abrigo do disposto nos artigos 265.º, n.º 3, 266.º, n.º 2, 519.º, 653.º, n.º 1, do CPC, na versão anterior à conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, que o Mm.º Juiz da 1.ª instância ordenou, por despacho de 22.04.2013 (fls. 482), a comparência das partes com vista a prestarem esclarecimentos acerca dos factos em discussão, o que as mesmas fizeram conforme resulta da ata de fls. 487-488.

Ora, tais esclarecimentos, não podendo naturalmente valer como confissão, estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova.

No caso concreto, o Tribunal da Relação não tratou os esclarecimentos prestados pelo legal representante da Ré como se de uma confissão se tratasse, pelo que nada impedia a sua valoração ao abrigo do mencionado princípio da livre apreciação da prova, não ocorrendo, por isso, a violação de qualquer norma (substantiva) de direito material probatório.

Sem prejuízo, sempre se dirá que se mostra ultrapassada a conceção restrita de depoimento pessoal vocacionado exclusivamente à obtenção da confissão, pois, conforme se apreciou no acórdão deste Supremo Tribunal de 16.03.2011, proferido no processo 237/04.3TCGMR.S1 ([7]) «(…) o depoimento tem um alcance muito mais vasto, podendo o tribunal ouvir qualquer uma das partes quando tal se revele necessário ao esclarecimento da verdade material. E se é certo que “a confissão” só pode versar sobre factos desfavoráveis à parte, não é menos verdade que o Juiz no depoimento em termos gerais não está espartilhado pela confissão, podendo colher elementos para a boa decisão da causa de acordo com o princípio da “livre apreciação da prova”. Aliás este entendimento deverá ter-se por reforçado atenta a possibilidade que hoje existe de reapreciação da prova pelo Tribunal da Relação e assim de controlar eventuais excessos de valoração, pelo que nada justifica que o depoimento de parte se restrinja a simples meio de viabilizar uma confissão, o que aliás está de acordo com as normas aplicáveis a esta matéria».

Tanto assim é que a atual versão do Código de Processo Civil prevê expressamente no respetivo art.º 466.º, a prova por declarações de parte sobre factos em que as partes tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto, declarações que o tribunal aprecia livremente, salvo se constituírem confissão.

Não estava, pois, o Tribunal da Relação impedido de valorar, como valorou, os esclarecimentos prestados pelo legal representante da Ré em sede de reapreciação da matéria de facto de acordo com a sua íntima convicção, já não cabendo, no entanto, a este Supremo Tribunal aquilatar do seu alcance do caso concreto, por força do disposto no art.º 674.º, n.º 3, do CPC.

Tão pouco tem o recorrente razão quando alega que a Relação extravasou os seus poderes ao determinar a eliminação da expressão “educado” do ponto 23.

Em primeiro lugar, ao invés do que o mesmo sustenta, esse “facto” não foi aceite por acordo das partes e também não se mostra corroborado por qualquer documento, nem mesmo pelos de fls. 262-270 indicados pela 1.ª instância na fundamentação da decisão de facto a respeito do facto n.º 23. Mal se compreenderia, aliás, que se pudesse dar como provado o facto de uma pessoa ser educada por documento.

Outrossim, decorre do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação determinou a eliminação da expressão “educado” do ponto 23 da matéria de facto por estar em contradição com a prova produzida e com os factos aditados.

De entre os factos aditados consta que numa reunião de trabalho o Autor, perante os seus companheiros de trabalho, se reportou ao seu superior hierárquico e administrador da empresa usando expressões como “aquele filho da puta lá de cima não nos quer dar nada”, “até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa” e “não quero saber mais desse cabrão”.

Posto isto, não estava o Tribunal da Relação impedido de alterar, como alterou, a redação do ponto 23, ao abrigo do disposto n.º 1, do art.º 662.º, do CPC, por considerar aquelas expressões incompatíveis com a conclusão de que o Autor é uma pessoa educada, estando este Supremo Tribunal impedido de exercer censura sobre o uso desse poder de alteração da decisão de facto, na medida em que tal implicaria uma pronúncia sobre a matéria de facto, faculdade que a lei não consente.

Em suma, não se alcança que, no caso concreto, tenha havido ofensa de quaisquer regras do direito material probatório, nos termos conjugados dos arts. 674.º, n.º 3 e 682.º, n.º 2, do NCPC, pelo que improcedem todas as conclusões do recorrente a propósito da reapreciação da prova e da matéria de facto levada a cabo pelo Tribunal da Relação.

2. A (i)licitude do despedimento.

2.1 Sob as conclusões n.ºs 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53,54, 55, 56,57, 58, 59, 60, 61, 62, 63,64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 75, 76, 77, 78,79, 80,81, 82,109, 110, da sua alegação de recurso vem o Recorrente sustentar, em síntese, que os factos provados não preenchem o conceito de justa causa de despedimento, pelo que o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 330.º, n.º 1, do Código do Trabalho e o direito à segurança no emprego, consagrado no artigo 53.° da Constituição da República Portuguesa, e fez uma errada interpretação e aplicação dos artigos 328.º, n.º 1, al. f) e 351.º, do Código do Trabalho.

Considerando que apenas os factos que a administração da Ré teve conhecimento em 29.02.2012 poderiam constituir fundamento para a apreciação da justa causa, o Tribunal da Relação considerou lícito o despedimento do Autor fundamentando a sua decisão do seguinte modo:

«Assim, apenas aqueles de que a Administração teve conhecimento em 29.2.2012 constituirão fundamento da apreciação da justa causa.

Nos termos do nº1, a) do art. 128 do CT recai sobre o trabalhador o dever de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as pessoas que se relacionam com a empresa, com urbanidade e probidade.

Este é um dever acessório, cuja intensidade é função das circunstâncias em que ocorre o seu cumprimento, constituindo uma decorrência do princípio de mútua colaboração, consagrado no art. 126, nº2 do CT. É um dever da maior importância, na medida em que a empresa exige uma conjugação comunitária de actividades entre a entidade patronal e os trabalhadores e entre eles, que estabelecem relações pessoais que se têm de processar num clima de mútuo respeito e de confiança para que a empresa possa atingir os seus objectivos de “maior produtividade, bem como na promoção humana, profissional e social do trabalhador” e de que fala o preceito.

Embora o art. 351, nº2 não refira expressamente o incumprimento desse dever como uma das causas justificativas do despedimento pela entidade patronal, não pode deixar de se atribuir essa força rescisória do contrato de trabalho a esse incumprimento desde que, de harmonia com o nº1 do mesmo artigo, possa assacar-se a culpa do trabalhador se, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a manutenção da relação de trabalho.

Há ainda que atentar que a um trabalhador que exerce um elevado cargo, é exigível um mais exigente dever de respeito, lealdade e colaboração com a entidade patronal, decorrentes da sua qualificação, atribuições e responsabilidade (vd. Ac. do STJ de 24.6.98: AD 445-112).

Revertendo ao caso concreto e para apreciação da justa causa apenas se podem tomar em conta os seguintes factos:

33. No dia 25 de Novembro de 2011, por volta das 11 horas, o Autor convocou uma reunião com a equipa de desenvolvimento do BB, a realizar de imediato.

34. Nessa reunião estiveram presentes, para além do Autor, GG, II, HH, CC DD e LL.

35. No início da reunião, o Autor explicou que a mesma se destinava a dar conta do “estado das coisas” e de como o trabalho estava a correr.

36. De seguida, o trabalhador declarou que andava a tentar puxar pela DSI (Direcção de Sistemas de Informação), mas que as coisas estavam difíceis para esta Direcção porque “aquele filho da puta lá de cima não nos quer dar nada”.

37. O trabalhador referia-se ao Dr. JJ, Administrador do BB, que tem o pelouro da DSI.

38. Tal facto foi percebido pelos presentes de forma inequívoca.

42. E, (…), acrescentou “não quero saber mais desse cabrão” - querendo referir-se novamente ao Dr. JJ.

44. Pelo menos os trabalhadores HH, GG e II ficaram chocados e surpreendidos com o teor das afirmações do Autor proferidas na reunião referida em 33.

46. Estas afirmações proferidas pelo trabalhador ofenderam o administrador a quem se dirigiam, Dr. JJ.

Deve ainda ter-se em consideração que:

20) Na empresa Ré é exigido respeito e correção entre todos os trabalhadores.

21) O cargo de Diretor-Coordenador constitui o mais alto grau da hierarquia laboral da empresa e reporta directamente ao Administrador responsável pelo pelouro,

22) Tratando-se de uma função só pode ser exercida por quem trate com urbanidade e correcção todos os que com ele se relacionam, principalmente, os membros dos órgãos sociais da empresa.

23) O Autor é um trabalhador que se obriga a profissionalismo, exigente consigo mesmo e com todos aqueles que com ele trabalha, e é zeloso, diligente e cumpridor das suas tarefas.

Deles decorre que as expressões “filho da puta” e “cabrão”, visando o Administrador do pelouro, Dr. JJ, utilizadas pelo Autor numa reunião de trabalho, perante diversos trabalhadores, seus subordinados, são, em termos objectivos, susceptíveis de lesar a honra e imagem profissionais daquele membro da administração, tendo ficado demonstrado que não se coaduna com os padrões de educação e urbanidade praticados na Ré.

Essa conduta reveste uma acentuada gravidade, particularmente por estar em causa um Director – Coordenador da empresa, correspondente ao mais elevado nível hierárquico da empresa, que reporta diretamente à Administração e por esse comportamento ter sido assumido perante vários subordinados, sendo apto a descredibilizar esse administrador perante os trabalhadores que assistiram à reunião.

Imputações deste jaez relativamente a um dos administradores da Ré, além de representarem a ofensa dos deveres de respeito e urbanidade, podem ainda até de um ponto de vista jurídico-criminal constituir um ilícito, pelo que o comportamento do trabalhador que assim procede conduz à formulação de um juízo objetivo de acentuada gravidade que leva àqueloutro de acentuada diminuição da fidúcia que o empregador deve manter relativamente aos seus trabalhadores.

A sanção expulsória mostra-se assim proporcional à gravidade da conduta ilícita do trabalhador, sendo que a aplicação de medidas conservatórias do vínculo representariam uma insuportável imposição à empresa, sendo compreensível, à luz de critérios de razoabilidade, que a mesma tenha perdido a confiança no cumprimento pelo Autor do seu dever de respeito no âmbito da relação laboral.

Acresce que, se a entidade patronal assim não atuasse, estaria aberta uma via para que a indisciplina e o mau ambiente de trabalho se instalassem entre os trabalhadores, com as mais graves consequências para uma empresa com a dimensão e os padrões de exigência da Ré.

Em consequência, considera-se o despedimento do Autor lícito, pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida, com a consequente absolvição da Ré do pedido.»

Entendemos que o acórdão recorrido decidiu com acerto.

2.2 O despedimento com justa causa é uma modalidade de cessação do contrato por iniciativa da entidade empregadora estando, contudo, vinculada no seu exercício uma vez que o empregador só pode resolver o contrato dessa forma fundamentando a sua decisão num motivo que a justifique, ou seja, baseando-se num comportamento culposo por parte do trabalhador (justa causa subjetiva).

No âmbito da relação laboral, um dos poderes conferidos à entidade empregadora é o disciplinar sobre todos os trabalhadores que se encontrem ao seu serviço (art.º 328º do Código do Trabalho), o qual tem de ser exercido mediante processo próprio adequado (arts. 329º e 332º e 352º e seg. Código do Trabalho).

O poder disciplinar conferido à entidade empregadora destina-se a fazer face a situações suscetíveis de gerar responsabilidade disciplinar, consubstanciadas em ações (ou omissões) do trabalhador violadoras da relação laboral, traduzindo-se assim na faculdade do empregador aplicar, internamente, sanções aos trabalhadores cuja conduta conflitue com os padrões de comportamento da empresa ou se mostre inadequada à correta efetivação do contrato.

As sanções disciplinares suscetíveis de aplicação pelo empregador estão estabelecidas no art.º 328º do Código do Trabalho, devendo o empregador aplicar sempre aquela que se mostre adequada e proporcional à gravidade da infração e à culpa do trabalhador (art.º 330º do Código do Trabalho) e sendo a de despedimento a mais gravosa, uma vez que determina a extinção do contrato de trabalho sem qualquer indemnização ou compensação ao trabalhador. Nos termos do disposto no art.º 351º do Código do Trabalho, existe justa causa de despedimento quando se verifique um comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

São assim requisitos de justa causa de despedimento:

- um comportamento culposo e ilícito do trabalhador (ativo ou passivo), necessariamente consubstanciador de violação grave dos seus deveres profissionais;

- a imediata impossibilidade prática da subsistência do vínculo laboral com a entidade empregadora; e

- o nexo causal entre aquele comportamento e esta impossibilidade de manutenção do contrato.

O comportamento do trabalhador tem de integrar a previsão disciplinar, podendo consistir tanto na violação de deveres tipificados na lei, como na inobservância de deveres genéricos que se imponham no âmbito da relação laboral. Ou seja, o comportamento culposo do trabalhador tem de ser afirmado pela violação, por parte deste, dos seus deveres laborais principais e acessórios, e, de entre estes, os integrantes ou autónomos da prestação principal.

A culpa é apreciada, em cada caso, por um critério objetivo, segundo a diligência média exigível a um trabalhador daquele tipo, nos termos em que se desenvolve a relação laboral e atendendo às circunstâncias do caso.

É ainda necessário que o comportamento culposo e ilícito do trabalhador revele a insubsistência da relação de trabalho. Dizer, é necessário que, objetivamente, não seja razoável exigir do empregador a continuação da relação contratual, dada a quebra da relação de confiança justificada pelo comportamento do trabalhador.

Para legitimar um despedimento, não basta, pois, a perda de confiança da entidade patronal no trabalhador, sendo necessário, da parte deste, que a violação dos deveres laborais seja objetiva e subjetivamente grave, no domínio da ilicitude e da culpa, como é próprio do direito sancionatório.

A justa causa de despedimento pressupõe, portanto, a existência de uma determinada ação ou omissão imputável ao trabalhador, a título de culpa, violadora de deveres emergentes do vínculo contratual estabelecido entre si e o empregador, que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a manutenção desse vínculo.

Nas palavras de Monteiro Fernandes ([8]), “não se trata, evidentemente, de uma impossibilidade material, mas de uma inexigibilidade, determinada mediante um balanço in concreto dos interesses em presença - fundamentalmente o da urgência da desvinculação e o da conservação do vínculo (...). Basicamente, preenche-se a justa causa com situações que, em concreto (isto é, perante realidade das relações de trabalho em que incidam e as circunstâncias específicas que rodeiem tais situações), tornem inexigível ao contraente interessado na desvinculação o respeito pelas garantias de estabilidade do vínculo”.

Ou, como refere noutro passo, “a cessação do contrato, imputada a falta disciplinar, só é legítima quando tal falta gere uma situação de impossibilidade de subsistência da relação laboral, ou seja, quando a crise disciplinar determine uma crise contratual irremediável, não havendo espaço para o uso de providência de índole conservatória”. ([9])

Na apreciação da gravidade da culpa e das suas consequências, deve recorrer-se ao entendimento de uma “empregadora razoável”, segundo critérios objetivos e razoáveis, em face do circunstancialismo concreto, devendo atender-se, “no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes”, como estabelece o n.º 3 do art.º 351º.

O ónus da prova dos factos integradores da justa causa cabe ao empregador (art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil), pois trata-se de factos constitutivos do direito do empregador ao despedimento do trabalhador ou, na perspetiva processual da ação de impugnação, de factos impeditivos do direito à reintegração ou do direito indemnizatório que o trabalhador invoca com base na alegada ilicitude do despedimento.

No caso concreto, ponderando a factualidade demonstrada, é manifesto que o Autor, com o seu comportamento, violou o dever de respeito e urbanidade para com o seu superior hierárquico previsto no art.º 128º, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho).

Com efeito, as expressões proferidas pelo Autor numa reunião de trabalho, perante diversos trabalhadores, seus subordinados, visando um dos administradores da Ré e que estão documentadas nos pontos 36 (“aquele filho da puta lá de cima não nos quer dar nada”), 39 (“Nós não somos do grupo de amigos dele, dizendo que as subidas de níveis que tinha havido recentemente noutras direções se deviam a amizades e não ao trabalho feito”), 40 (“até a minha filha de 6 anos sabe gerir melhor esta empresa”), 42 (“não quero saber mais desse cabrão”) e 43 (afirmando que aquele administrador estava a fazer na empresa uma “gestão danosa”), são objetivamente ofensivas do respeito que é devido a um superior hierárquico que simultaneamente é membro da administração da sua entidade patronal, e carregam um concreto e específico sentido injurioso dirigido à pessoa e ao carácter do destinatário.
Acresce que se tratou de uma conduta despropositada e sem causa aparente, já que nenhum motivo válido se apurou que de alguma forma a pudesse justificar.
O apurado comportamento do Autor foi, pois, culposo e ilícito, uma vez que ele devia, porque podia, ter atuado em conformidade com os deveres a que, enquanto trabalhador, se encontrava vinculado, e só não o fez por sua própria vontade e de modo consciente.
Verificada a existência de um comportamento ilícito e culposo por parte do trabalhador, terá de se ponderar se o respetivo despedimento, sanção máxima disciplinar, é proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator.

A gravidade do comportamento do trabalhador e a inexigibilidade da subsistência do vínculo devem ser apreciados, como já referimos supra, na perspetiva de um “bom pai de família”, isto é, de um empregador normal, norteado por critérios de objetividade e razoabilidade, devendo o tribunal atender, ainda, atento o disposto no art.º 351º, nº 3 do Código do Trabalho, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre os trabalhadores e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.

Ponderando os factos apurados, é nosso entendimento que o comportamento do Autor, sendo culposo e grave põe em causa, de forma irremediável, a relação laboral.

É certo que a liberdade de expressão é um direito fundamental protegido pela Constituição da República Portuguesa (art.º 37.º da CRP) e pela Convenção Europeia dos Direitos Humanos (art. 10.º CEDH) e constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das condições primordiais do seu progresso e do desenvolvimento de cada pessoa.

No entanto, tal como afirma Júlio Gomes ([10]), «encontrando a liberdade de expressão o seu primeiro limite na necessidade de conciliação com outros direitos fundamentais e na procura de um ponto de equilíbrio, tal liberdade não pode servir de pretexto para a violação dos direitos de personalidade alheios», por isso, «o trabalhador terá, no exercício da sua liberdade de expressão de respeitar as obrigações de urbanidade e de probidade».
Noutro ponto, o mesmo autor ([11]) refere que «O dever de urbanidade não é, como vimos, incompatível com um direito à crítica por parte do trabalhador, desde que essa crítica seja feita, ela própria em termos corteses e educados e não viole um dever de sigilo, nem prejudique a imagem da empresa. A crítica, mormente a interna, que obedeça a estes requisitos poderá ser considerada um facto normal e saudável na vida de uma empresa.»
Assim, conforme se entendeu no acórdão deste Supremo Tribunal, de 14-07-2010, proferido no processo n.º 3256/05.9TTLSB.L1.S1 ([12]): «(…) nenhum direito pode ser entendido com um alcance absoluto. Sempre que um direito conflitue com outro direito ou bens constitucionalmente protegidos, esse conflito deve ser resolvido através da recíproca e proporcional limitação de ambos, em ordem a optimizar a solução (princípio da concordância prática) de modo a garantir uma relação de convivência equilibrada e harmónica em toda a medida possível.»
No caso concreto, as expressões que o Autor proferiu numa reunião de trabalho, perante diversos trabalhadores, seus subordinados, visando JJ, administrador da Ré encarregue do pelouro da Direção de Sistemas de Informação, são objetivamente atentatórias da honra e imagem profissionais daquele membro da administração, tendo ficado demonstrado que não se coaduna com os padrões de educação e urbanidade praticados na Ré, empresa onde é exigido respeito e correção entre todos os trabalhadores (facto n.º 20).

Esta conduta reveste-se de uma acentuada gravidade, particularmente porque o Autor exercia o cargo de Diretor – Coordenador da Direção de Sistemas de Informação (facto n.º 8), correspondente ao mais elevado nível hierárquico da empresa, reportava diretamente ao referido JJ que era o administrador responsável pelo pelouro (factos n.ºs 12 e 21), e porque o seu apurado comportamento foi assumido perante vários subordinados, sendo apto a descredibilizar aquele administrador da Ré perante os trabalhadores que assistiram à reunião.

Sendo muito grave, o comportamento assumido pelo Autor é suscetível de abalar seriamente a confiança que a Ré nele podia deter, sendo absolutamente compreensível, à luz de critérios de razoabilidade, que a mesma tenha perdido a confiança no cumprimento pelo Autor do seu dever de respeito no âmbito da relação laboral.

Tolerar esse tipo comportamento por parte de um dos seus mais altos responsáveis, equivaleria a transmitir aos restantes trabalhadores que a empresa era permissiva e não exigia respeito, disciplina e cordialidade no cumprimento dos seus deveres laborais, para além para além de permitir a instalação do caos entre o relacionamento humano cerne de todas as relações, em especial, da laboral, sendo certo que é imprescindível a existência de um ambiente pacifico, respeitador e salutar para a estrutura organizacional da empresa e, evidentemente, para o bem-estar e produtividade de todos.

Acresce que em momento algum o Autor demonstrou arrependimento pela sua conduta, não tendo sequer procurado reverter ou atenuar, na medida do possível, o sucedido.

Tudo para concluir que o Autor, com o seu comportamento grave e culposo, pôs em crise a permanência da confiança em que se alicerçava a relação de trabalho, não sendo exigível à empresa Ré que o mantivesse ao seu serviço, em virtude de dúvidas sérias e legítimas quanto à conformidade do comportamento do trabalhador no futuro, tornando-se prática e imediatamente impossível a manutenção da relação laboral, pelo que se preenche a justa causa de despedimento.

A sanção aplicada não violou, assim, o princípio da proporcionalidade consagrado no art.º 330.º, do Código do Trabalho.

Por último, refira-se que o despedimento do Autor não violou o seu direito à segurança no emprego previsto no art.º 53.º da Constituição da República Portuguesa, norma que estabelece que «[é] garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos».

No caso, assume pertinência a invocação da proibição dos despedimentos sem justa causa. Porém, o exercício do poder disciplinar está previsto no âmbito das relações laborais e condicionado à verificação das circunstâncias concretas que a lei ordinária define, e que foram respeitadas. Por outro lado, tendo sido decidido que os factos pelos quais o Autor foi despedido integram o conceito de justa causa de despedimento, não se vislumbra que tal dimensão normativa possa configurar a violação daquela norma constitucional.

Em consequência, considera-se o despedimento do Autor lícito e confirma-se o acórdão recorrido.


IV

Termos em que se acorda em negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.
As custas da Revista ficam a cargo do recorrente – art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Anexa-se sumário do presente Acórdão.


Lisboa, 10 de dezembro de 2015

Melo Lima (Relator)

Mário Belo Morgado

Ana Luisa Geraldes

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[1] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2.ª edição, 2014, p. 235
[2] Ob. Citada, p. 255
[3] Disponível em www.dgsi.pt
[4] Disponível em www.dgsi.pt
[5] Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 1967, p. 228
[6] Neste sentido, Abrantes Geraldes, ob. citada, p. 236
[7] Disponível em www.dgsi.pt
[8] Manual do Direito do Trabalho, Almedina, 12.ª edição, p. 557.
[9] Obra citada, p. 575.
[10] Direito do Trabalho, vol. I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, p. 276
[11] Ob. Citada, p. 531
[12] Disponível em www.dgsi.pt