Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
152/21.6JDLSB.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ORLANDO GONÇALVES
Descritores: RECURSO PER SALTUM
ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
MEDIDA DA PENA
CULPA
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
Data do Acordão: 06/09/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Sumário :
I - O entendimento do recorrente de que na fixação da medida concreta da pena deve partir-se da média entre os limites mínimo e máximo da pena, embora tenha tido alguns seguidores no início da vigência do atual Código Penal, aprovado pelo DL n.º 400/82, de 23-09, encontra-se arredado da jurisprudência e da doutrina, desde há muito, por se não coadunar com os princípios atrás enunciados.
É hoje pacífico que a delicada operação de determinação da medida concreta da pena, é feita de acordo com os critérios definidos no art. 71.º do CP, ou seja, em função da culpa e das razões de prevenção, quer geral, quer especial ou de ressocialização.
II - Tendo em consideração as circunstâncias valoradas na determinação das penas, as finalidades por estas prosseguidas, os princípios que lhe presidem e as molduras penais correspondentes a cada um dos crimes de abuso sexual de criança praticados, mencionadas no acórdão recorrido, não se encontra fundamento para discordar das penas parcelares aplicadas ao arguido, por alegado excesso, quando elas se situam no mínimo ou pouco acima dos seus limites mínimos e bem longe dos seus limites máximos.
III - Doutrina e jurisprudência coincidem em especificar que no cúmulo jurídico, a pena conjunta é definida dentro de uma moldura cujo limite mínimo é a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e o limite máximo resulta da soma das penas efetivamente aplicadas, emergindo a medida concreta da pena da imagem global do facto imputado e da personalidade do agente.
IV - No que respeita à ilicitude global da conduta do arguido, entendida como juízo de desvalor da ordem jurídica sobre um comportamento, por este lesar e pôr em perigo bens jurídico-criminais, a mesma é elevada, tendo em conta as conexões entre todos os crimes de abuso sexual de criança, cometidos durante um período de tempo razoavelmente longo (do ano de 2017 a agosto de 2020), através de condutas de elevada gravidade, desde logo, pela pouca idade da vítima (nascida em 20-12-2006), em que demonstrou características de personalidade altamente censuráveis, reveladoras de particular necessidade de socialização, tanto mais que agiu com dolo direto e intenso e não beneficia de confissão aberta, arrependimento sincero e de reparação dos danos causados à menor, circunstâncias que permitiriam demonstrar que no futuro não irá praticar novos factos contra a liberdade e autodeterminação sexual de crianças.
V - Ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade do recorrente a que se fez referência, concluímos que a pena conjunta fixada em 10 anos de prisão pelo Tribunal a quo, numa moldura de punição entre 4 anos e 6 meses de prisão e os 25 anos de prisão, mostra-se justa, adequada às finalidades de prevenção, e proporcional à culpa e personalidade do arguido/ recorrente, pelo que mantemos a mesma.
Decisão Texto Integral:


Proc. n.º 152/21.6JDLSB.S1

Recurso Penal

Acordam, em Conferência, na 5.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça

I - Relatório

1. Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal coletivo n.º 152/21.6JDLSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Central Criminal de Sintra - Juiz 4, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, entre outros, o arguido AA , devidamente identificado, imputando-se-lhe a prática de factos pelos quais teria cometido, em autoria material, na forma consumada, e em concurso real e efetivo, cinco crimes de abuso sexual de crianças agravado, p. e p. nos termos do art. 171.º, n.º 1, conjugado com o art. 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal, e três crimes de abuso sexual de crianças agravado, p. e p. nos termos do art. 171.º, n.ºs 1 e 2, conjugado com o art. 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal.

2. Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Coletivo, por acórdão proferido a 1 de fevereiro de 2022, decidiu julgar a pronúncia parcialmente procedente, e, em consequência, condenar o arguido AA:

a) pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real e efetivo, de quatro crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos nos termos do art. 171.º, n.º 1, conjugado com o art. 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão por cada um deles; b) pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real e efetivo, de um crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido nos termos do art. 171.º, n.º 1, conjugado com o art. 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão; c) pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real e efetivo, de um crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido nos termos do art. 171.º, n.ºs 1 e 2, conjugado com o art. 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão; d) pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso real e efetivo, de dois crimes de abuso sexual de crianças agravado, previstos e punidos nos termos do art. 171.º, n.ºs 1 e 2, conjugado com o art. 177.º, n.º 1, al. b), ambos do Código Penal, na pena de 4  anos de prisão por cada um deles; e) operar o cúmulo jurídico das oito penas parcelares referidas de a) a d), e condenar o mesmo arguido AA na pena única de 10 anos de prisão.

3. Inconformado com o acórdão dele interpôs recurso, diretamente para o Supremo Tribunal de Justiça, o arguido AA, concluindo a sua motivação do modo seguinte (transcrição):

- O presente Recurso vem interposto do douto Acórdão que condenou o Arguido como autor na forma consumada, de cinco crimes de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelo Art. 171 nº 1 conjugado com o art. 177 nº 1 alínea b) do Código Penal e três crimes de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelo Art. 171 nº 1 e nº 2 conjugado com o art. 177 nº 1 b) e c) do Código Penal, que depois de operado o cúmulo jurídico condenado na pena única de dez anos de prisão;

- O recurso pretende somente o reexame da matéria de Direito designadamente das medidas das penas aplicadas entendendo o recorrente que houve errada aplicação dos princípios gerais de determinação da medida da pena

- O recorrente considera elevadas, injustas e desproporcionais as penas parcelares em que foi condenado.

- O recorrente considera que a pena a que foi condenado resultante do cúmulo jurídico operado de 10 anos, salvo o devido respeito mostra-se desproporcionado, injusta, severa e exagerada, face às circunstâncias, modalidade da ação desenvolvida atendendo uma vez mais ao comportamento colaborante, demonstrado pelo recorrente

Sendo certo que, as penas visam a reintegração do agente na sociedade e as penas não podem ultrapassar a medida da culpa.

A pena de prisão aplicada é excessiva atentos os fins que visam tais penas e as finalidades de prevenção

Atendendo à personalidade do Arguido, às suas condições de vida e à sua conduta na sociedade, as penas de prisão aplicadas mostram-se gravosas, e vão contra a equidade e o próprio fim das penas;

O douto Acórdão não atendeu ao sentido pedagógico e ressocializador da pena, na determinação da medida da pena, que se considera excessiva.

O douto acórdão não fez a devida valorização do fato do recorrente não ter antecedentes criminais para a determinação da medida da pena, não relevando essa situação como o deveria ter feito designadamente quando refere: “com um passado criminal isento (não lhe são conhecidas condenações anteriores), o que, porém, não releva sobremaneira

Considera-se que faltou ao douto acórdão o sentido pedagógico e ressocializador da pena aplicada, não valorizando convenientemente as condições pessoais do recorrente designadamente o estar inserido socialmente, ter família, filhos, emprego, e um percurso de vida sem condenações anteriores, Bem como,

O facto do arguido ter confessado parcialmente os fatos que vinha acusado e ter demonstrado o seu arrependimento, estar em prisão preventiva com a forte influência dissuasora de eventual conduta ilícita no futuro pelo tempo já passado na prisão. E ainda,

A duração da pena de prisão aplicada (10 anos) não teve em consideração a reinserção social do recorrente na sociedade que, ao invés, pela sua duração irá causar dificuldades acrescidas na reinserção social do recorrente.

Tendo em conta os parâmetros legais de determinação da medida concreta da pena e as molduras penais abstractamente aplicáveis e ainda todas as circunstâncias relevantes para a determinação da medida concreta daquela (artigos 40º-1 e 2 e 71º- 1 e 2, do C. Penal), as penas parcelares aplicadas e a pena aplicada em cúmulo, constantes da douta sentença recorrida afiguram-se excessivas, justificando-se a sua redução.

O douto acórdão violou o disposto nos artigos 40°, 50°, 70°, 71° e 72º do Código Penal;

O douto acórdão recorrido fez incorreta interpretação e errada aplicação dos princípios gerais de direito aplicáveis na determinação da medida da pena, devendo ser revogada, quanto ao quantum da pena de prisão aplicada, com as devidas consequências legais

Termos em que e nos mais de Direito, sempre com o douto suprimento de V.Exas, deve ser deferido o presente recurso e revogado o douto acórdão, com as devidas consequências legais, com o que se fará JUSTIÇA.

4. O Ministério Público no Juízo Central Criminal de Sintra respondeu ao recurso interposto pelo arguido, concluindo (transcrição):

1- No douto acórdão recorrido foi efetivamente tido em conta que o arguido não apresenta antecedentes criminais e a sua situação sócio-económica

2- Foi ainda tendo em conta aspetos da sua personalidade, nomeadamente défice ao nível das suas competências pessoais relacionadas com o raciocínio crítico e pensamento consequencial, bem como uma fraca capacidade de descentração, dificuldades de autocontrolo e de responsabilização.

3- No que concerne ao alegado comportamento colaborante com o Tribunal Coletivo, com todo o devido respeito esse comportamento não foi espontâneo, porque o arguido só foi deixando descair algumas respostas donde se depreendia que os factos ou parte dos factos correspondiam à verdade depois de ladeado de várias perguntas.

4- O Tribunal Coletivo teve em devida conta todos os aspetos pertinentes para efeitos da medida concreta da pena, nomeadamente a ausência de antecedentes criminais, a sua situação sócio-económica, défice ao nível da descentração, responsabilidade e juízo de auto crítica, às lesão irreparáveis para o desenvolvimento físico, psíquico e sexual da vítima e às elevadas necessidades de prevenção geral, considerando a elevada censura da Comunidade para como estas situações

5- As penas aplicadas ao recorrente se afiguram proporcionais, equilibradas de harmonia com o disposto nos artigos 40.º, 70.º e 71.º, todos do Código Penal.

Nestes termos, devem Vossas Excelências julgar improcedente o recurso e, em consequência, manter na íntegra, o douto acórdão recorrido, fazendo assim, como sempre, a costumada JUSTIÇA.

5. A Ex.ma Procuradora-geral Adjunta neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá improceder, mantendo-se o acórdão recorrido.

           

6. Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, não houve resposta.

7. Colhidos os vistos, foram os autos presentes à Conferência.

II Fundamentação

8. Com relevo para a decisão do recurso, consigna-se no acórdão recorrido (transcrição):

Factos provados

1. A vítima BB nasceu a .../.../2006.

2. A menor BB é filha da arguida CC e de DD.

3. O arguido AA e a arguida CC iniciaram uma relação amorosa, em data não concretamente apurada, mas anterior a 2010.

4. Desde essa data que a menor BB reside com a sua mãe e o seu padrasto, aqui arguido.

5. O arguido AA e a arguida CC têm dois filhos em comum, que residem com o casal: EE, nascida a .../.../2011, e FF, nascido a .../.../2012.

6. O arguido e a família residiram em ... entre 2010 e 2016.

7. Em 2016, o arguido e a sua família regressaram a Portugal e viveram um mês em Lisboa.

8. Depois, ainda em 2016 foram residir para ....

9. No verão de 2019, o arguido e a família estabeleceram residência na Estrada Nacional ..., nº..., ..., ..., em ....

10. A menor BB trata o arguido por “pai”.

11. Desde 2017, que, por várias vezes, em datas não concretamente apuradas, o arguido começou a olhar para as zonas íntimas da menor, o que lhe causava desconforto.

12. Desde 2017, por várias vezes, em datas não concretamente apuradas, o arguido começou a abraçar a menor BB e a roçar a sua zona genital no corpo da menor.

13. Em data não concretamente apurada, entre 2017 e 2019, ainda na casa de ..., por uma vez, o arguido colocou as suas mãos sobre os seios da menor, apalpando-os.

14. Em data não concretamente apurada, entre 2017 e 2018, na residência familiar, em ..., a menor BB foi, de manhã, para o quarto do arguido com os seus irmãos.

15. Depois, os seus irmãos e a sua mãe saíram do quarto e foram para a cozinha.

16. Nesse momento, o arguido agarrou-a e disse-lhe para ela ficar no quarto e para lhe dar um beijo, tendo a menor beijado o arguido na face.

17. O arguido disse-lhe que não era isso e disse-lhe para se pôr de joelhos e abrir a boca, o que ela fez.

18. Depois, o arguido, que estava de pé, despiu as calças do pijama, colocou o pénis de fora e introduziu o seu pénis na boca da BB e fez movimentos com o pénis para trás e para a frente no interior da boca da menor.

19. Em dia não concretamente apurado do mês de junho ou julho de 2017, na residência familiar, aproveitando o facto de CC estar em ... de visita a familiares, o arguido chamou a menor BB ao seu quarto, assim que ela chegou da escola.

20. No quarto, o arguido disse-lhe para ela despir a roupa da cintura para baixo, o que ela fez, e virou-a de costas para ele.

21. Depois, o arguido, que tinha apenas um robe vestido, colocou o pénis para fora da roupa, agarrou a menor e encostou o seu pénis na vagina da menor e fez movimentos para trás e para a frente, tendo introduzido a ponta do seu pénis na vagina da menor e friccionado.

22. Depois, o arguido perguntou-lhe se ela estava a gostar e ela nem lhe respondeu.

23. No dia seguinte ao referido em 19, o arguido entrou na casa-de-banho, enquanto a menor estava a tomar banho, entrou na banheira e encostou o seu corpo ao dela, tocando com o seu pénis ereto nas nádegas da menor.

24. Entre março e julho de 2020, em dia não concretamente apurado, na residência familiar, na ..., o arguido estava num armazém existente nas traseiras da residência e chamou a BB, que estava a brincar no jardim da habitação.

25. A BB foi ter com o arguido ao armazém e o arguido pediu-lhe um abraço.

26. Em ato contínuo, o arguido abraçou-a de frente e depois abraçou-a pelas costas e enquanto a abraçava roçou a sua zona genital na menor.

27. O arguido tinha o pénis ereto enquanto se roçava na menor.

28. Depois o arguido disse à BB para se ir embora e para ir brincar, pois ele não se estava a controlar e isso era errado.

29. Dias depois, entre março e julho de 2020, em dia não concretamente apurado, aproveitando-se do facto de a CC não estar em casa e dos outros filhos estarem a dormir, o arguido foi ao quarto da BB, que estava a dormir.

30. O arguido dirigiu-se ao quarto todo nu só com um robe azul vestido.

31. Já no quarto, o arguido acordou a BB e despiu-lhe as calças do pijama e as cuecas.

32. Em seguida, o arguido lambeu e chupou a vagina da menor.

33. Depois, o arguido introduziu o seu dedo no interior da vagina da menor, retirava um pouco e voltava a introduzir, o que fez várias vezes.

34. O arguido, entretanto, parou com este comportamento porque o seu telemóvel tocou e o arguido saiu do quarto para atender a chamada.

35. Em agosto de 2020, em dia não concretamente apurado, na residência familiar, na ..., o arguido, aproveitando o facto de a CC estar a tomar banho, foi ter com a menor BB, que estava na cozinha.

36. De imediato, o arguido agarrou a BB pelas costas e roçou a sua zona genital nas nádegas da menor.

37. Em ato contínuo, o arguido colocou as suas mãos sobre as mamas da menor, por cima da roupa, e apalpou-as.

38. O arguido, entretanto, parou com este comportamento porque a mãe da menor acabou o seu banho.

39. Em todas as situações descritas, o arguido nunca ejaculou na presença da menor BB.

40. No dia 15 de março de 2021, o arguido enviou à BB a seguinte mensagem, via ..., “BB, você não sabe o que está fazendo, sei que errei com você, sei que sente muitas raiva de mim, e estou muito arrependido, peço em nome de JESUS que você venha a desfazer esta história, você sabe que não fizemos sexo, BB fiz tudo errado, mas Amo minha família, Amo muito minha esposa, não sei mais o que dizer peço que tenha misericórdia da minha vida, esta é a vida que tenho, não quero ser mau, pelo contrário te quero bem você é a única vítima, Me perdoe por favor”

41. O arguido sabia qual a idade de BB.

42. A partir de data não concretamente apurada, mas por altura de fevereiro de 2021 a arguida CC tomou conhecimento dos factos supra descritos.

43. O arguido agiu com o propósito concretizado de satisfazer os seus instintos e intentos libidinosos, o que representou, quis e conseguiu, sabendo que atentava contra o desenvolvimento da menor, ofendendo o seu sentimento de pudor e vergonha.

44. Mais sabia arguido que a sujeição da menor a contactos dessa natureza era suscetível de interferir com o seu desenvolvimento e autodeterminação sexual, o que não o coibiu de levar avante a satisfação dos seus desejos.

45. O arguido sabia que a BB era sua enteada, e residia consigo, e que por esse motivo tinha o dever de cuidar, respeitar e acarinhar a menor, ainda assim decidiu atuar da forma descrita, aproveitando-se da relação familiar que mantinha com a menor e do facto de residirem juntos.

46. O arguido agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal como crime e tinha capacidade para se determinar de acordo com esse conhecimento.

Mais se provou:

47. O arguido AA prestou declarações em julgamento e em primeiro interrogatório judicial de arguido detido.

48. Em primeiro interrogatório judicial, o arguido AA confessou parcialmente a prática dos factos.

49. Em julgamento, o arguido AA negou a prática dos factos.

50. A arguida CC prestou declarações em julgamento e negou que tivesse tomado conhecimento dos factos supra descritos.

      Condições Pessoais:

51. AA é de nacionalidade ..., sendo oriundo de uma família com alguns recursos económicos, cujo processo de desenvolvimento e socialização, decorreu no agregado familiar dos progenitores, num enquadramento familiar descrito como afetivamente satisfatório.

52. O arguido iniciou a escolaridade na idade prevista, tendo concluído o 12º ano. Era um aluno mediano e não mostrou dificuldades na aprendizagem.

53. Depois de terminados os estudos, iniciou atividade laboral numa transportadora de carnes.

54. É um indivíduo saudável e não tem hábitos de consumo.

55. AA veio para Portugal ter com uma irmã com quem viveu até ao seu casamento com uma portuguesa. Do agregado familiar fazia parte o próprio, a mulher e uma filha desta de uma anterior relação, vítima neste processo e que se encontra atualmente a viver com o pai biológico.

56. Posteriormente o casal teve uma filha, agora com 10 anos e um rapaz com 9 anos e que vivem com a respetiva progenitora.

57. O arguido e a família residiram em ... entre 2010 e 2016, onde aquele trabalhava na ...

58. Em 2016, o arguido e a sua família regressaram a Portugal, uma vez que o arguido se encontrava com os documentos caducados. Viveram um mês em Lisboa.

Depois, ainda em 2016 foram residir para .... No verão de 2019, o arguido e a família estabeleceram residência na Estrada Nacional ..., nº..., ..., ..., em ....

59. Aquando da sua detenção à ordem dos presentes autos, o arguido encontrava-se a viver com a mulher, os filhos e a enteada, na morada “supra” referida. Mantinha atividade laboral ….

60. Em relação à sua ligação conjugal, e apesar de referir que ama muito a mulher, o arguido acredita que a mesma está terminada devido ao seu comportamento criminal.

61. Quando se encontrar em meio livre, o arguido pretende solicitar apoio à irmã, pessoa com quem ainda não falou desde que se encontra recluído. Não tem como perspetivas regressar ao ..., onde vive a progenitora, pelo menos por agora, para poder acompanhar o crescimento dos filhos e poder ajudar a mulher e os filhos a nível económico.

62. Em termos pessoais, o arguido denota défices ao nível das competências pessoais relacionadas com o raciocínio crítico e pensamento consequencial, bem como uma fraca capacidade de descentração, dificuldades de autocontrolo e de responsabilização.

63. Apresenta ausência de consciência crítica relativamente aos factos em julgamento, não reconhecendo os danos causados à vítima.

64. Relativamente ao impacto do atual processo, centra-o na esfera pessoal, referindo que está a perder o crescimento dos filhos e que estes necessitam da sua presença, tanto a nível afetivo como económico, não fazendo referência à vítima.

65. AA em meio contentor tem apresentado uma postura consonante com as regras e normas institucionais, e tendo em conta que se encontra preventivo, não foi integrado a nível laboral.

Antecedentes Criminais

66. Do certificado de registo criminal do arguido AA não constam quaisquer condenações anteriores.

Factos não provados

a. Sem prejuízo da matéria assente, em 6, que tanto tivesse ocorrido até 2017.

b. Sem prejuízo da matéria assente em 7, que tanto tivesse ocorrido em 2017 e durante uns meses.

c. Sem prejuízo da matéria assente em 8, que tanto tivesse ocorrido em 2017.

Convicção do Tribunal

No que respeita à matéria de facto dada como provada e não provada formou o Tribunal a sua convicção na análise crítica e conjugada de toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como em toda prova documental constante dos autos e considerada igualmente analisada naquela sede.

Teve ainda em conta este Tribunal as regras da vida e da experiência comum, em obediência ao princípio da livre apreciação da prova ínsito no art.127.º do Código de Processo Penal.

1 - O presente julgamento respeita à prática de crime de abuso sexual de crianças, cuja prova é reconhecidamente difícil, desde logo atenta a própria vergonha das vítimas que impede muitas vezes a denúncia dos factos em tempo útil, permitindo, como se afigura ter sido o caso dos autos, um “arrastar da situação”, dentro do próprio núcleo familiar.

2 - Não obstante, certo é que a vítima dos presentes autos deu sinais de que estava a ser vítima.

Tanto resultou dos depoimentos prestados em julgamento pelas testemunhas GG e HH, frequentadoras, tal como a família da ofendida, da ..., e com quem a menor procurou desabafar, tudo traduzindo sofrimento, numa manifestação clara de que a própria não estava a saber lidar com a situação e que por isso procurou ajuda fora do agregado familiar.

Foram, porém, evidentes as dificuldades de comunicação, na medida em que os seus apelos não foram atempadamente interpretados, sendo claro que logo em janeiro de 2020 a menor BB enviou uma mensagem de voz ao pai (a testemunha DD, a quem se mostra atualmente entregue), dizendo-lhe que tinha acontecido algo de muito grave na família da mãe, acabando por não conseguir desenvolver o assunto, pese embora o pai o tenha procurado desbravar.

3 - Sem prejuízo, a investigação acabou por levar à prisão preventiva do arguido AA, no passado dia 13 de maio de 2021, após interrogatório judicial, onde então o arguido confessou parcialmente a prática dos factos, com total ausência de censura ética pelo seu comportamento, pois que a versão que procurou transmitir foi no sentido de que os factos ocorridos apenas tiveram lugar porque teria sido seduzido pela menor (“Ela me correspondia com aquilo. Ela dava olhares. Sorrisos. Barrava em mim”), assumindo para com ela comportamentos libidinosos (“Só carícias. Eu só tentei beijar. Só toquei com as mãos no rabo dela”), mas procurando negar, sem consistência, aqueles factos que se lhe afiguravam mais hediondos (tal como realçado no despacho de pronúncia proferido nos presentes autos).

4 - Contudo, em julgamento, ao prestar declarações, o arguido negou em absoluto a prática dos factos, imputando a responsabilidade de todas as afirmações trazidas a julgamento, que apelidou de falsas, à própria menor, a quem inclusive “acusou” de estar como que possuída por um espírito maligno, procurando transmitir da mesma uma imagem provocadora ou mesmo diabólica.

Em tudo foi acompanhado pela mãe da menor, a arguida CC, que deixou claro não acreditar na filha, mas sim no marido. Pese embora, foi notória a consternação da arguida, ao serem reproduzidas em julgamento as declarações prestadas pelo marido em primeiro interrogatório judicial, onde então, e para além do mais, afirmou ter confessado à mulher, que o perdoou.

Acresce que, quando por nós confrontado o arguido com a mensagem que no dia 15 de março de 2021 enviou à menor (cf. auto de análise preliminar de telemóvel, fls. 35), por si só suficientemente elucidativa (cf. matéria assente em 40), procurou aquele retirar-lhe qualquer valor, inserindo-a noutro contexto que não o discutido nos presentes autos, mas antes, segundo ele, relacionado com uma sua tentativa de corrigir o comportamento da menor enquanto adolescente e algum excesso associado, que terá motivado a revolta da menor.

5 - Desta feita, e perante a negação dos factos pelo arguido, que tudo atribuiu, como “supra” se referiu, a uma força maligna, foram determinantes na formação da convicção do Tribunal, as declarações para memória futura prestadas, em sede inquérito, pela menor, e que em nosso entender mereceram total credibilidade, conforme infra melhor se explanará.

6 - Assim, foram reproduzidas em audiência de julgamento as declarações para memória futura prestadas pela menor BB no passado dia 13 de maio de 2021 (então ainda com 14 anos, porquanto nasceu a .../.../2006), declarações essas que se mostram registadas sob a forma de som e de imagem, contribuindo assim para uma maior e melhor imediação.

Tais declarações, prestadas cerca de nove meses após os últimos factos sofridos pela vítima, nos termos considerados assentes, são relativas a uma menor necessariamente constrangida com a situação de que foi alvo, mas que descreveu com o necessário pormenor e no essencial a factualidade considerada provada, resultando dessa sua descrição um claro aproveitamento pelo arguido de todo um circunstancialismo que lhe foi favorável, e que lhe permitiu renovar e concretizar os seus intentos por mais do que uma vez.

Na análise do depoimento da menor esteve este tribunal especialmente atento à coerência do relato e respetiva componente afetiva, desde logo atentas as relações em destaque, deixando a menor transparecer no seu discurso a certeza de que os factos se passaram nos termos dados como assentes, sem lugar a dúvidas da nossa parte,

Tornou-se evidente que o arguido mente, demonstrando à evidência não ter interiorizado o desvalor da sua conduta, mas antes procurando branqueá-la na alegação desconcertante de que afinal foi ele o seduzido pelo comportamento da enteada.

A menor tem consciência de que foi vítima dos desejos sexuais do padrasto e tanto provoca-lhe vergonha e uma confusão de sentimentos, o que é percetível ao longo das suas declarações, ao traduzir e expressar a sua inibição quanto ao respetivo relato, marcado por pausas, por vezes longas, e lágrimas, tudo coincidente com o discurso deste tipo de vítimas quando conscientes do “anormal” do por si vivenciado.

As declarações prestadas pela menor são coerentes e objetivas, ao contrário da posição assumida pelo arguido, centrado na sua própria defesa e sem exibir qualquer empatia para com a vítima, ficando nós, aliás, sem compreender o sentido das alegações da respetiva defesa ao realçar a virgindade da menor ou ausência dela, quando a julgamento não foi trazido um único episódio de cópula completa, a justificar a realização de qualquer perícia de natureza sexual (ao mesmo tempo que também não compreendemos o sentido da junção aos autos, pela defesa do arguido, de três imagens do instagram da menor próprias da vivência de uma adolescente).

7 - Tudo visto, resulta com clareza que a menor esteve como que entregue à sua sorte e a mãe particularmente desatenta, o que a tornou na vítima perfeita.

Pese embora, não se compreende o sentido da imputação pretendida pelo Ministério Público quanto à mãe da menor, a saber, quanto à arguida CC.

Com efeito, passando esta a tomar conhecimento dos factos considerados assentes a partir de data não concretamente apurada, mas por altura de fevereiro de 2021, conforme alegado pelo Ministério Público em sede de acusação pública, tanto significa que tal conhecimento sobreveio à respetiva consumação, nada já havendo, por isso, a obstar a uma prática já consumada, mesmo enquanto mãe.

8 - Sem prejuízo, toda a prova foi entrecruzada e valorada no seu conjunto, não impressionando a negação dos factos pelo arguido, porquanto não olvidamos que frequentemente estes sujeitos, enquanto agressores sexuais de crianças, carecem de sentimentos de culpa, desde logo face a um mecanismo de distorção cognitiva tendente a neutralizar qualquer interiorização do desvalor da sua conduta.

Desta feita, e considerando afastada qualquer hipótese de “malignidade”, nos termos pretendidos pelo arguido, que justifique uma falsa denúncia intencional de abuso sexual, julgamos que a verdade está do lado da menor BB, sendo essa sua versão a enquadrar juridicamente em conformidade.

9 - A propósito das condições pessoais do arguido AA, quanto ao qual cumpre retirar as devidas consequências (em face daquilo que se concluirá quanto à absolvição arguida CC, mostra-se despicienda qualquer enunciação relativa às suas condições pessoais), foi considerado o relatório social para julgamento produzido pela DGRSP, onde se abordam as respetivas condições sociais e pessoais, sendo ainda em conjugação com as suas próprias declarações, com as declarações da coarguida sua mulher e ainda com as declarações da própria ofendida, que permitiram enquadrar em termos temporais e geográficos os períodos em ..., ..., ... e finalmente em ..., correspondentes à vivência familiar.

10 - Por último, relevou ainda este Tribunal o certificado de registo criminal do arguido, do qual não constam quaisquer condenações anteriores.

9. Âmbito do recurso

O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação (art. 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal). São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.[1]

Face às conclusões da motivação do recorrente AA a questão a decidir consiste em determinar se as penas parcelares e a pena única fixadas, são excessivas.

10. Apreciando.

10.1. Da dosimetria das penas

O arguido AA sustenta que o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos

40.º, 50.º, 70.º, 71.º e 72.º do Código Penal, por incorreta interpretação e aplicação dos princípios gerais de direito na determinação da medida das penas parcelares e única, pelo que deve o acórdão recorrido ser revogado relativamente ao quantum das penas de prisão aplicadas, as quais sendo excessivas, devem ser reduzidas.

Argumenta para o efeito, no essencial: (i) na fixação da medida concreta da pena deve partir-se da média entre os limites mínimo e máximo da pena, residindo as finalidades da pena primordialmente na tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na sociedade; (ii) o acórdão recorrido não atendeu ao sentido pedagógico e ressocializador da pena, ao não valorizar, convenientemente, a ausência de antecedentes criminais, as condições pessoais do recorrente, designadamente, o estar inserido socialmente, ter família, filhos, emprego e um percurso de vida sem condenações anteriores e, ainda, o ter confessado parcialmente os factos de que vinha acusado, demonstrando arrependimento; (iii) o facto de estar em prisão preventiva tem forte influência dissuasora de eventual conduta ilícita no futuro pelo tempo já passado na prisão. 

10.2. Vejamos, em primeiro lugar, o regime legal que o recorrente entende ter sido violado na decisão recorrida.

O art. 71.º, n.º 1 do Código Penal dispõe, quanto ao critério geral da determinação da medida concreta da pena, que esta é feita, dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.

A culpa do agente consiste no juízo de censura dirigido ao agente pelo facto deste ter atuado em desconformidade com a ordem jurídica quando podia, e devia, ter atuado em conformidade com esta, sendo uma desaprovação sobre a conduta do agente.

Como bem refere Figueiredo Dias, o facto punível não se esgota com a ação ilícita-típica, necessário se tornando sempre que a conduta seja culposa, “isto é, que o facto possa ser pessoalmente censurado ao agente, por aquele se revelar expressão de uma atitude interna pessoal juridicamente desaprovada e pela qual ele tem por isso de responder perante as exigências do dever-ser sociocomunitário.”[2]

A culpa, enquanto juízo de censura ou desaprovação, é suscetível de se revelar maior ou menor sendo, por natureza, graduável e dependendo sempre das circunstâncias concretas em que o agente desenvolveu a sua conduta, traduzindo igualmente um juízo de exigibilidade determinado pela vinculação de cada um a conformar-se pela atuação de acordo com as regras estipuladas pela ordem jurídica superando as proibições impostas.

As exigências de prevenção remetem-nos para o objetivo último das penas, que é a proteção, o mais eficaz possível, dos bens jurídicos fundamentais (art.40.º do Código Penal).

Esta proteção implica a utilização da pena como instrumento de prevenção geral, servindo primordialmente para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal (prevenção geral positiva ou de integração).

A prevenção geral radica no significado que a “gravidade do facto” assume perante a comunidade, isto é, no significado que a violação de determinados bens jurídico penais tem para a comunidade e visa satisfazer as exigências de proteção desses bens na medida do necessário para assegurar a estabilização das expectativas na validade do direito.

A reintegração do agente na sociedade está ligada à prevenção especial ou individual, isto é, à ideia de que a pena é um instrumento de atuação preventiva sobre a pessoa do agente, com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida.

É a prevenção geral positiva que fornece uma moldura de prevenção geral positiva dentro de cujos limites podem e devem atuar considerações de prevenção especial.

Entre o ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida de tutela dos bens jurídicos, podem e devem atuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo estes que vão determinar, em último termo a medida da pena.

Nesta tarefa, importa atender aos fatores de medida da pena, que na linguagem do art. 71.º, n.º 2 do Código Penal «…depuserem a favor do agente ou contra ele», considerando, designadamente, as suas várias alíneas.

As circunstâncias gerais enunciadas exemplificativamente neste n.º 2 do art. 71.º do Código Penal, são, no ensinamento de Figueiredo Dias, elementos relevantes para a culpa e para a prevenção e, “por isso, devem ser consideradas uno actu para efeitos do art. 72.º-1; são numa palavra, fatores relevantes para a medida da pena por força do critério geral aplicável.”.

Para o mesmo autor, esses fatores podem dividir-se em “Fatores relativos à execução do facto”, “Fatores relativos à personalidade do agente” e “Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto”.[3] 

Podemos agrupar, nas alíneas a), b), c) e e), parte final, do n.º 2 do art.71.º, do Código Penal, os fatores supramencionados relativos à execução do facto; nas alíneas d) e f), os fatores relativos à personalidade do agente; e na alínea e), os fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto.

Por respeito à eminente dignidade da pessoa a medida da pena não pode ultrapassar a medida da culpa (art. 40.º, n.º 2 do C.P.), designadamente por razões de prevenção.

A culpa tem aqui uma função limitadora do intervencionismo estatal.

Para além de outros casos, expressamente previstos na lei, de atenuação especial da pena, o legislador, consagrou, na parte geral do Código Penal, uma cláusula geral de atenuação especial da pena, no seu art. 72.º:

«1. O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

O seu n.º 2, acrescenta que, «Para o efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes: a) Ter o agente atuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência; b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida; c) Ter havido atos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados; d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.

A jurisprudência tem sido exigente na aplicação desta norma, limitando a atenuação especial da pena a casos extraordinários ou excecionais de acentuada diminuição da ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

A acentuada diminuição significa que a imagem global do facto se apresenta com uma gravidade tão específica ou diminuída em relação aos casos para os quais está prevista a fórmula de punição, que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em tais hipóteses quando estatuiu os limites normais da moldura do tipo respetivo.

Só pode ser decretada (mas se puder deve sê-lo) quando a imagem global do facto revele que a dimensão da moldura da pena prevista para o tipo de crime não poderá realizar adequadamente a justiça do caso concreto, quer pela menor dimensão e expressão da ilicitude ou pela diminuição da culpa, com a consequente atenuação da necessidade da pena, vista a necessidade no contexto e na realização dos fins das penas.[4]

A este propósito escreve Figueiredo Dias, que “a diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto, resultante da(s) circunstância(s) atenuante(s), se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respetivo.

Por isso, tem plena razão a nossa jurisprudência – e a doutrina que a segue – quando insiste em que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar: para a generalidade dos casos, para os «casos normais», lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios.”.[5]

Subscrevemos integralmente este entendimento jurisprudencial e doutrinal.

Retomando o caso concreto.

10.3 Quanto à medida concreta das penas parcelares.

O arguido AA não questiona que com as suas condutas descritas na factualidade dada como provada praticou, em autoria material e em concurso real, oito crimes de abuso sexual de crianças agravado.

Cinco desses crimes, são previstos e punidos nos artigos 171.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, com uma pena, cada um deles, de 1 ano e 4 meses de prisão a 10 anos e 8 meses de prisão; os outros três crimes, são previstos e punidos nos artigos 171.º, n.º 1 e 2 e 177.º, n.º 1, alíneas b) e c), do Código Penal, com uma pena, cada um deles, de 4 anos de prisão a 13 anos e 4 meses de prisão.

É dentro destes limites da moldura penal que importa verificar, em primeiro lugar, se o Tribunal a quo na determinação das penas parcelares, violou, por excessivas, o disposto no art.71.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal.

Na determinação concreta das penas parcelares, consignou o acórdão recorrido, no essencial, o seguinte:

“… há que atender à elevada gravidade do ilícito global, com claro aproveitamento pelo agente de todo um circunstancialismo que lhe foi favorável, naturalmente em detrimento da própria vítima.

Na mesma linha, e naquilo que respeita à violação do bem jurídico protegido pela norma e consequências daí resultantes, as mesmas são importantes, atentas as consequências da conduta do arguido na ofendida, devido às lesões muitas vezes irreparáveis produzidas no desenvolvimento da personalidade das crianças abusadas, desde logo ao nível da sua própria sexualidade e relacionamentos sexuais futuros.

O dolo do arguido foi direto e intenso.

Quanto às suas condições pessoais, resulta ser o arguido um cidadão de nacionalidade ..., aparentemente inserido em Portugal, atualmente com 48 anos, com um passado criminal isento (não lhe são conhecidas condenações anteriores), o que, porém, não releva sobremaneira, na medida em que a violência sexual pode ocorrer em todos os estratos sociais, muitas vezes se bastando e refugiando no silêncio das vítimas.

O arguido denota défices ao nível das competências pessoais relacionadas com o raciocínio crítico e pensamento consequencial, bem como uma fraca capacidade de descentração, dificuldades de autocontrolo e de responsabilização. Apresenta ausência de consciência crítica relativamente aos factos em julgamento, não reconhecendo os danos causados à vítima. Relativamente ao impacto do atual processo, centra-o na esfera pessoal, referindo que está a perder o crescimento dos filhos e que estes necessitam da sua presença, tanto a nível afetivo como económico, não fazendo referência à vítima, sendo certo que tendo prestado declarações em julgamento negou a prática dos factos, imputando a responsabilidade dos factos a esta última, a quem acusou de “sedutora”.

As necessidades de prevenção geral positiva são elevadas no que toca ao tipo de crimes em questão, pois estes são ilícitos que tem vindo a ter uma crescente e maior visibilidade e censura social, que reclama dos tribunais resposta adequada a colmatar o alarme social associado e confiança do cidadão na reposição da eficácia da norma violada.

As necessidades de prevenção especial são relevantes, porquanto não se identifica no arguido qualquer capacidade de autocensura ou sequer de empatia com a vítima, mas antes tudo centrando na sua esfera pessoal.”

Antes do mais, importa clarificar que o entendimento do recorrente de que na fixação da medida concreta da pena deve partir-se da média entre os limites mínimo e máximo da pena, embora tenha tido alguns seguidores no início da vigência do atual Código Penal, aprovado pelo DL n.º 400/82, de 23 de setembro, encontra-se arredado da jurisprudência e da doutrina, desde há muito, por se não coadunar com os princípios atrás enunciados.

É hoje pacífico que a delicada operação de determinação da medida concreta da pena, é feita de acordo com os critérios definidos no art. 71.º do Código Penal, ou seja, em função da culpa e das razões de prevenção, quer geral, quer especial ou de ressocialização. 

O recorrente começa por centrar a impugnação da determinação da medida da pena nos “Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto», ao chamar à colação a não valorização convenientemente da ausência de antecedentes criminais, mas a valoração feita no acórdão recorrido relativamente a esta circunstância que depõe a favor do arguido, não merece censura. A ausência de antecedentes criminais é a situação comum à generalidade das pessoas e, como bem anota o acórdão recorrido, nos crimes de natureza sexual muitas vezes resulta do silêncio das vítimas.  

No que respeita à confissão parcial dos factos, a mesma é de escasso de relevo, na medida em que essa confissão ocorreu apenas em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido, pois em audiência de julgamento negou a sua prática, nos termos que constam dos pontos n.ºs 47 a 50 da factualidade dada como provada.

O Tribunal a quo não deu como provado o arrependimento, nem como tal tem de ser entendida a mensagem referida no ponto n.º 40 dos factos dados como provados, numa altura em que já a mãe da menor BB tinha tomado conhecimento dos factos em causa e, por outro lado, provou-se a ausência crítica por parte do arguido dos factos em causa, não reconhecendo os danos causados à vítima. 

A terminar, no respeitante à conduta posterior aos factos, anotamos que o arguido não procedeu ou envidou esforços no sentido de reparar as consequências dos crimes de que foi vítima a sua enteada.

Nos “Fatores relativos à personalidade do agente”, que integram a alínea e), n.º 2 do art.71.º do Código Penal, assume preponderância a não interiorização satisfatória da gravidade da conduta por parte do arguido, bem realçada pelo Tribunal a quo, minimizando a sua responsabilidade, através da sua atribuição à vítima, que sabe ser menor de idade e tinha a particular obrigação de a proteger como enteada com quem vivia sobre o mesmo teto.  

O facto do ora recorrente se encontrar em prisão preventiva não pode ser valorado, nestas circunstâncias, como pretende o recorrente, como uma atenuante que exerce forte influência dissuasora da prática de futuros crimes. 

Também não nos merece reparo o acórdão recorrido no respeitante às considerações tecidas sobre as condições pessoais do arguido AA, que resultam da factualidade dada como provada, pois teve em consideração a sua aparente inserção social, integrado em meio familiar e laboral, tendo como habilitações académicas o 12.º ano.

Bem andou ainda o Tribunal a quo, no que respeita aos “Fatores relativos à execução do facto”, ao graduar a ilicitude dos factos como elevada, por a idade da vítima, dos 8 crimes de abuso sexual praticados pelo arguido, num razoavelmente largo período de tempo, assim o impor.

No modo de execução dos vários crimes de abuso sexual de criança, encontramos os mais variados atos de abuso sexual, merecendo alguns deles distinção em função do seu maior desvalor e que, tal como o acórdão recorrido realça, deve ser refletido na pena concreta.

A motivação que levou o arguido a causar, repetidamente atos sexuais de relevo sobre a criança, foi, evidentemente, a satisfação dos seus instintos libidinosos.

O grau de violação dos deveres impostos ao arguido, é intenso, tendo em conta que os factos foram cometidos praticamente todos na residência familiar, aproveitando um local onde a vítima se deveria sentir protegida, para mais impunemente ir dando satisfação aos seus atos ilícito-típicos.

As consequências destas condutas para a BB são as inerentes às crianças abusadas sexualmente, ou seja, graves danos no desenvolvimento da personalidade da criança, desde logo ao nível da sua própria sexualidade e relacionamentos sexuais futuros, como realça o acórdão recorrido. 

Por fim, agiu com dolo direto e intenso na pluralidade de atos praticados contra a criança.

Considerando o grau de perigosidade do arguido que resulta da globalidade dos factos provados, entendemos que as razões de prevenção especial são elevadas.

As razões de prevenção geral são muito elevadas nos crimes contra a liberdade sexual de crianças, pela forte censura e repugnância que este tipo de crimes causa na sociedade, pelo que importa reforçar a ideia da validade dos bens jurídicos inerentes às normas violadas.

Perante estes elementos objetivos relevantes para a culpa e para a prevenção, entendemos que é também elevada a culpa do arguido.

Afastada se mostra, assim, liminarmente, atenuação especial da pena ao abrigo do art.72.º do Código Penal.

Tendo em consideração as circunstâncias valoradas na determinação das penas, as finalidades por estas prosseguidas, os princípios que lhe presidem e as molduras penais correspondentes a cada um dos crimes praticados, mencionadas no acórdão recorrido, não se encontra fundamento para discordar das penas parcelares aplicadas ao arguido, por alegado excesso, quando elas se situam no mínimo ou pouco acima dos seus limites mínimos e bem longe dos seus limites máximos.

O Supremo Tribunal de Justiça entende que a fixação de penas inferiores às penas parcelares aplicadas ao ora recorrente não respeitariam o disposto nos artigos 18.º, n.º 2 da CRP e 40.º e 71.º do Código Penal.

10.4. Vejamos, agora, se a pena conjunta de 10 anos de prisão aplicada ao recorrente, é excessiva, pelo que deve ser reduzida.

Nos termos do art.77.º Código Penal, «1. Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. 2. A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.».

Doutrina e jurisprudência coincidem em especificar que no cúmulo jurídico, a pena conjunta é definida dentro de uma moldura cujo limite mínimo é a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e o limite máximo resulta da soma das penas efetivamente aplicadas, emergindo a medida concreta da pena da imagem global do facto imputado e da personalidade do agente.

O agente é sancionado, não apenas pelos factos individualmente considerados, numa visão atomística, mas especialmente pelo conjunto dos factos, enquanto reveladores da gravidade da ilicitude global da conduta do agente e da sua personalidade.

A pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art.71º.º, n.º 1, um critério especial estabelecido no art.77.º, nº 1, 2ª parte, ambos do Código Penal.[6]

Os parâmetros indicados no art.71.º do Código Penal, servem apenas, porém, de guia para a operação de fixação da pena conjunta, não podendo ser valorados novamente, sob pena de se infringir o princípio da proibição da dupla valoração, a menos que tais fatores tenham um alcance diferente enquanto referidos à totalidade de crimes.[7]

Na busca da pena do concurso, explicita Figueiredo Dias, na obra que vimos citando, que “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”. E acrescenta que “de grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).”

Como refere ainda, na doutrina, Cristina Líbano Monteiro, com o sistema da pena conjunta, perfilhado neste preceito penal, deve olhar-se para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente.[8]

As conexões ou ligações fundamentais na avaliação da gravidade da ilicitude global, são as que emergem do tipo e número de crimes, dos bens jurídicos individualmente afetados, da motivação, do modo de execução, das suas consequências e da distância temporal entre os factos.

É evidente que condutas muito gravosas para a comunidade, como as integradas no terrorismo, criminalidade violenta, criminalidade especialmente violenta ou criminalidade altamente organizada, [definidas no art.1.º, alíneas f) a m)] exigem, por respeito do princípio da proporcionalidade e exigências de prevenção, uma menor compressão das penas parcelares, na formação da pena única, do que condutas de agentes inseridas na chamada média ou pequena criminalidade. 

No caso, as condutas do arguido integram a criminalidade violenta (art. 1.º, alínea j), do C.P.P.).

Ínsita nos factos ilícitos unificados no âmbito da pena de concurso, a personalidade do agente, é um fator essencial à formação da pena única. A revelação da personalidade global do agente, o seu modo de ser e atuar em sociedade, emerge essencialmente dos factos ilícitos praticados, mas também das suas condições pessoais e económicas e da sensibilidade à pena e suscetibilidade de ser por ela influenciado.

Sendo as necessidades de prevenção mais exigentes quando o ilícito global é produto de tendência criminosa do agente, do que quando esse ilícito se reconduz a uma situação de pluriocasionalidade, a pena conjunta deverá refletir esta singularidade da personalidade do agente.

Presentes os critérios e finalidades que se acabam de expor, anotamos, antes do mais que o recorrente não especifica argumentos visando a redução da pena única em que foi condenado em cúmulo jurídico.

No caso concreto, a moldura de punição situa-se entre 4 anos e 6 meses de prisão (mínimo legal) e os 25 anos de prisão (máximo legal).

No que respeita à ilicitude global da conduta do arguido, entendida como juízo de desvalor da ordem jurídica sobre um comportamento, por este lesar e pôr em perigo bens jurídico-criminais, a mesma é elevada, tendo em conta as conexões entre todos os crimes de abuso sexual de criança, cometidos durante um período de tempo razoavelmente longo (do ano de 2017 a agosto de 2020), através de condutas de elevada gravidade, desde logo, pela pouca idade da vítima (nascida em .../.../2006), em que demonstrou características de personalidade altamente censuráveis, reveladoras de particular necessidade de socialização, tanto mais que agiu com dolo direto e intenso e não beneficia de confissão aberta, arrependimento sincero e de reparação dos danos causados à menor, circunstâncias que permitiriam demonstrar que no futuro não irá praticar novos factos contra a liberdade e autodeterminação sexual de crianças. 

Ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade do recorrente a que se fez referência, concluímos que a pena conjunta fixada em 10 anos de prisão pelo Tribunal a quo, numa moldura de punição entre 4 anos e 6 meses de prisão e os 25 anos de prisão, mostra-se justa, adequada às finalidades de prevenção, e proporcional à culpa e personalidade do arguido/ recorrente, pelo que mantemos a mesma.

Deste modo, improcede esta questão e, consequentemente, o recurso.

III - Decisão

Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e manter o douto acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente, fixando em 6 Ucs a taxa de justiça (art. 513º, nºs 1 e 3, do C. P.P. e art.8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa)

*

(Certifica-se que o acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos seus signatários, nos termos do art. 94.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.P.). 

                                                                                             

*

                                                                               

Lisboa, 9 de junho de 2022

Orlando Gonçalves (Relator)

Adelaide Sequeira (Adjunta)

Eduardo Loureiro (Presidente da Secção)

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[1] Cf. entre outros, os acórdãos do STJ de 19-6-96 (BMJ n.º 458º, pág. 98) e de 24-3-1999 (CJ, ASTJ, ano VII, tomo I, pág. 247.)

[2] Cf. “Temas básicos da doutrina penal”, Coimbra Ed., pág. 230.
[3] Cf. “Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime”, Aequitas - Editorial Notícias, págs. 210 e 245 e seguintes.  
[4] Cf. entre outros, os acórdãos do STJ de 25 de maio de 2005 (proc. n.º 05P1566), de 12 de Julho de 2006 (proc. n.º 06P796) e de 25 de Outubro de 2006 ( proc. n.º 06P1286), in www.dgsi.pt/jstj.
[5]  Cf. “Direito Penal Português, as consequências jurídicas do crime”, noticias editorial, páginas 306 e 307.  

[6]  Cf. “Direito Penal Português, “As Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, 1993, pág.290/2. 

[7] Cf. Figueiredo Dias, obra cit., pág. 292.

[8]  Cf. “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 16, n.º 1, pág. 155 a 166 e acórdão do STJ, de 09-01-2008, CJSTJ 2008, tomo 1.