Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
394/19.4T9OLH.E1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: EDUARDO LOUREIRO
Descritores: RECURSO PENAL
PENA ÚNICA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
LIBERDADE CONDICIONAL
REINCIDÊNCIA
Data do Acordão: 11/11/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - O recorrente vem condenado na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão, por via da prática em autoria material, em concurso real, de um total de treze crimes – concretamente, de furto (simples e qualificado), de dano, de apropriação ilícita de coisa achada, de burla informática, de coacção e de violação de domicílio – punidos com penas de prisão que, em soma material, atingiram os 21 anos e que oscilaram entre os 3 meses e os 4 anos e 3 meses.
II - A medida concreta da pena do concurso é determinada, tal como a das penas singulares, em função da culpa e da prevenção – arts. 40.º e 71.º, do CP –, mas levando em linha de conta o critério específico da «consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente» previsto no art. 77.º, n.º 1, segundo segmento, do CP.
III - In casu, tanto as exigências de prevenção, geral e especial, como a culpa são em grau elevado, a exigir, e a viabilizar, pena que reafirme solenemente a validade de vigência dos valores infringidos e constitua sério estímulo ao recorrente de reaproximação ao dever-ser jurídico-penal:
- A gravidade do ilícito global é muito acentuada;
- Os bens jurídicos ofendidos são múltiplos e diversificados: a propriedade –o património, a liberdade pessoal e a reserva da vida privada;
- Os ofendidos são no número, significativo, de treze;
- A prática dos crimes protraiu-se pelo período de tempo, já de significado, de cerca de seis meses;
- O grau de violação dos bens jurídicos não é minimamente desprezível em qualquer um dos casos, sendo que quatro dos crimes de furto, o de coacção e o de violação de domicílio, são agravados;
- A culpa do recorrente, lato sensu, é elevada, denotando a imagem global dos factos firme e prolongada intenção de delinquir. E sem esquecer que todos os crimes foram cometidos estando em liberdade condicional, após um longo período de reclusão por mais de 8 anos, e que, com referência a quatro crimes de furto qualificado, foi condenado como reincidente.
Na sua relação com a personalidade unitária do recorrente, o conjunto dos factos revela propensão criminosa para a prática crimes contra a propriedade. Na linha, aliás, do que vem sendo a sua atitude desde o já longínquo ano de 1991, em que cometeu o primeiro crime de que há registo – um crime de roubo – e a que se seguiram doze outras infracções, umas, por crimes da mesma natureza ou afim – furtos, simples e qualificados; roubos; extorsão –, outras, por ilícitos tão diversos como os de tráfico de estupefacientes, de condução sem habilitação legal e de ofensa à integridade física simples.
O que, tudo, revela uma personalidade profundamente refractária ao dever-ser jurídico penal, que das penas aplicadas até ao momento nenhuma – desde penas de multa a penas de substituição da prisão, passando por (longas) penas de prisão efectivamente cumpridas – foi capaz de fazer inflectir.
IV - O quadro que se desenha é, pois, de culpa acentuada – a suscitar forte censurabilidade da conduta –, de ilicitude significativa – a exigir decidida reafirmação por via das penas dos valores penais infringidos – e de resistência do Recorrente ao dever-ser jurídico-penal e de necessidade de contramotivação criminógena – a reclamar pena única que efectivamente o reaproxime do respeito daqueles valores.
V - O que, numa moldura abstracta de 4 anos e 3 meses de prisão a 21 anos, bem justifica a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão aplicada em 1.ª instância e que o tribunal da Relação confirmou.
Decisão Texto Integral:


Autos de Recurso Penal
Proc. n.º 394/19.4T9OLH.E1.S1
5ª Secção

acórdão
Acordam em conferência os juízes na 5ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:

I. relatório.
1. O Tribunal Colectivo do Juiz ... do Juízo Central Criminal de ... procedeu ao julgamento do arguido AA e outros, decidindo, a final, como segue [1]:
─ «a) Absolver os arguidos BB e CC da prática de um crime de dano, p. e p. pelo art.º 212.º, nº1 do Código Penal; de um crime de violação de domicílio, agravado, p. e p. pelo artº. 190.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal e de um crime de furto qualificado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 202.º, al. e), 203.º, n.º1, 204.º, n.º1, al. f) e n.º2, al. e) do Código Penal (situação XI – NUIPC 947/19....), dos quais vinham acusados;
b) Absolver o arguido AA da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, al. f) e n.º 2, do Código Penal, de que vinha acusado (situação II – NUIPC 346/19...);
c)  Absolver o arguido AA da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, al. f) e n.º 2, do Código Penal, de que vinha acusado (situação V – NUIPC 818/19....);
d)  Absolver o arguido AA da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, al. f) e n.º 2, do Código Penal, de que vinha acusado (situação VII – NUIPC 829/19...);
e) Absolver o arguido AA da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, al. f) e n.º 2, do Código Penal, de que vinha acusado (situação X – NUIPC 934/19....);
f) Absolver o arguido AA da prática oito crimes de falsidade informática, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 da Lei do Cibercrime (NUIPC 829/19... e NUIPC 874/10....);
g) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal, na pena oito meses de prisão (situação I – NUIPC 192/19....);
h)  Condenar o arguido AA pela prática de um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1 do Código Penal, na pena seis meses de prisão (situação I – NUIPC 192/19....);
i) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de apropriação ilegítima de coisa achada, p. e p. pelo artigo 209.º, ns.º 1 e 2 do Código Penal, na pena três meses de prisão (situação III – NUIPC 703/19....);
j) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, agravada a sua responsabilidade pela reincidência nos termos dos arts. 75.º e 76.º do Código Penal, na pena um ano e dois meses de prisão (situação IV – NUIPC394/19…….);
k) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal, agravada a sua responsabilidade pela reincidência nos termos dos arts. 75.º e 76.º do Código Penal, na pena de quatro anos e dois meses de prisão (situação VI – NUIPC 819/19.... )
l) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de coacção qualificado, p. e p. pelos artigos 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a) e b), do Código Penal, na pena de um ano e dois meses de prisão (situação VI - NUIPC 825/19...);
m) Absolver o arguido de três crimes de burla informática e por via da qualificação operada, condenar o arguido AA pela prática de um crime de burla informática, p. e p. pelo artigo 221.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de sete meses de prisão (situação VII - NUIPC 829/19...);
n) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal, agravada a sua responsabilidade pela reincidência nos termos dos arts. 75.º e 76.º do Código Penal, na pena de quatro anos e três meses de prisão (situação VIII – NUIPC 853/19....);
o)  Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal, agravada a sua responsabilidade pela reincidência nos termos dos arts. 75.º e 76.º do Código Penal, na pena de quatro anos e três meses de prisão (situação IX – NUIPC 874/19....);
p)  Absolver o arguido de três crimes de burla informática e por via da qualificação operada, condenar o arguido AA pela prática de um crime de burla informática, p. e p. pelo artigo 221.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de sete meses de prisão (situação IX – NUIPC 874/19....);
q)  Condenar o arguido AA pela prática de um crime de violação de domicílio agravado, p. e p. pelo artigo 190.º, ns.º 1 e 3 do Código Penal, na pena oito meses de prisão (situação XI – NUIPX 947/19...);
r) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1 do Código Penal, na pena seis meses de prisão (situação XI – NUIPX 947/19... – DD);
s)  Absolver o arguido da prática do crime de furto qualificado pelo que vinha acusado e condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2 al. e) e n.º 4 do Código Penal, na pena oito meses de prisão e de um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1 do Código Penal, cada na pena seis meses de prisão (situação XI – NUIPX 947/19... – EE);
t) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal, na pena dez meses de prisão (situação XII – NUIPC 1013/19.... );
u)  Procedendo ao cúmulo jurídico das aludidas penas condenar o arguido AA na pena conjunta de oito anos e seis meses de prisão;
v) Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante FF e, em consequência:
- condenar o arguido a pagar-lhe a quantia de seiscentos e cinco euros, no que tange aos danos patrimoniais acrescida de juros de mora desde a notificação do arguido para contestar o pedido cível até integral pagamento, à taxa de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor;
- condenar o arguido a pagar-lhe a quantia de setecentos e cinquenta euros, a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora vencidos desde a data da prolação desta decisão, à taxa legal e anual de 4% (ou outra que venha a estar em vigor), até efectivo e integral pagamento (cfr. artigos 559.º e artigo 1.º da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril).
- absolver o arguido do restante pedido.
w) n) Julgar totalmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pelo demandante GG e em consequência:
-  condenar o arguido a pagar-lhe a quantia de duzentos e cinquenta e cinco euros;
[…].
ee) Declarar que a medida de coacção imposta ao arguido AA -Termo de Identidade e Residência -  só se extingue com a extinção da pena;
ff)  Determinar que o arguido AA aguarde os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coacção de prisão preventiva;
gg) Determinar a recolha de amostras biológicas ao arguido AA, após trânsito em julgado da presente decisão, para inserção na base de perfis de ADN, salvo se a amostra já tiver sido recolhida à ordem de outro processo.
hh) Declarar perdido a favor do Estado o montante apreendido ao arguido AA.».
 
2. Discordante desse acórdão, impugnou-o, de facto e de direito, o arguido AA perante o Tribunal da Relação ... (TR...), suscitando a apreciação das seguintes questões:
─ Nulidade da falta de fundamentação e da omissão de pronúncia, nos termos do art.º 374º n.º 2 e 379 n.º 1 al.ª a) e c) do Código de Processo Penal (CPP);
─ Erros-vícios da decisão de facto da contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão – art.º 410º n.º 1 al.ª b) do CPP – e do erro notório na apreciação da prova – art.º 410º n.º  2 al.ª c) do CPP;
─ Erro de julgamento da matéria de facto, por violação dos princípios da presunção da inocência do arguido e do in dubio pro reo;
─ Erro de julgamento da matéria de direito, por violação das normas dos art.os 70º, 71º e 77º do Código Penal (CP), e, consequente, excesso da medida concreta das penas, parcelares e conjunta.

3. O recurso foi julgado totalmente improcedente em acórdão de 27.4.2021, que manteve, na íntegra, o acórdão do Tribunal Colectivo.

4. Ainda inconformado recorre o arguido AA – doravante Recorrente – de tal acórdão – doravante, Acórdão Recorrido – para este STJ.
Remata a motivação com as seguintes conclusões e pedido:
─ «I- Vem o presente recurso da douta decisão tirada nestes autos, que manteve o acórdão da 1ª Instância e que condenou a Recorrente em 8 anos e 6 meses de prisão.
II- A discordância do recorrente prende-se única e exclusivamente com a medida concreta da pena conjunta que entende ser demasiado gravosa.
III- Com efeito o Tribunal da Relação ...... ao aplicar aquela pena de prisão continuou (tal como já tinha feito o Tribunal de Comarca) a dar especial relevância aos factores agravativos (a reincidência e os antecedentes criminais) não considerando factores atenuantes de especial importância nomeadamente a confissão, o facto de serem crimes contra o património, as apropriações de reduzidos montantes, o facto de ser toxicodependente e estar em tratamento no E.P.
IV- A confissão do recorrente fundamentou parte do decidido: na Situação I - no 1º § de folhas 37 da decisão em que o próprio Tribunal “a quo” refere que “o decidido funda-se, nas declarações do arguido AA, que confessou os factos dados como provados, ”; na Situação III – 2º § de folhas 39 da decisão de 1ª instância “Relativamente ao conjunto de factos descritos sob a designação - situação III -, o decidido funda-se nas declarações prestadas pelo arguido, que confessa os factos, dados como provados”; e na Situação VII - 4º § de folhas 42 da decisão de 1ª instância: “Não existe prova da autoria do furto, não sendo bastante a posse e utilização do cartão, uma vez que esta acaba confirmada pelo arguido AA, alegando que lhe foi pedido, em troca de produto estupefaciente, para ele proceder às mencionadas operações, o que é possível, tendo em conta o percurso aditivo do arguido”.; Situação IX - 1º e 2º § de folhas 44 da decisão de 1ª instância: ”O decidido funda-se nas declarações do arguido AA, que confirmou ter estado no local, com outra pessoa” (…) “ O arguido também confirma o uso do cartão.”
V- O Tribunal da Relação ......, quanto ao facto invocado pelo recorrente de que a sua confissão pela prática de alguns dos crimes não tinha sido relevada pelo Tribunal de 1ª instância refere, ”Já no concernente à ausência de menção à confissão cumpre salientar não ter esta necessariamente de ser assinalada (as alíneas do n.º 2 como já referido são exemplificativas)” (…) “Por fim, a conduta posterior do arguido (confissão) não foi destinada a reparar as consequências do crime (cf. artigo 71.º, n.º 2, alínea e) parte final do CP).”; ora não pode o recorrente concordar com tal posição.
VI- Nomeadamente porque na esteira do que diz José António Rodrigues da Cunha “a colaboração com a justiça, enquanto comportamento pós-facto (positivo) do agente do crime, assume enorme relevo jurídico, quer se manifeste sob a forma de confissão, quer se manifeste sob a forma de arrependimento. A sua relevância resulta particularmente evidente no processo de escolha e individualização da sanção penal. Raras são as sentenças e os acórdãos que não o fazem, seja para as considerar e valorar, seja para as afastar, seja, simplesmente, para constatar a sua inexistência.”.
VII- Salvo do devido respeito não pode o recorrente concordar com a apreciação feita pelo acórdão recorrido quanto à fundamentação da pena conjunta, confirmando a parca e insuficiente fundamentação realizada pelo tribunal de 1ª Instância.
VIII- Na fixação da pena conjunta há que avaliar os factos no seu conjunto obtendo assim a medida da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, “como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado” tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele.
IX- Na motivação apresentada pelo Tribunal de 1ª Instância e que é confirmada pelo acórdão recorrido não é feita uma avaliação gravidade do ilícito global perpetrado nem são levados em conta factores que pesam a favor do arguido e que são importantes para a medida da pena conjunta. Realça sim a fundamentação unicamente – e parece ser este o fundamento principal para a determinação da pena conjunta – o facto de o recorrente ter antecedentes criminais e já ter sido condenado anteriormente.
X- Ora por tal facto o recorrente foi condenado nas penas parcelares dentro de um moldura penal de reincidência, já agravada, já aí se tomando em consideração o facto de o recorrente ter antecedentes criminais.
XI- Os crimes perpetrados pelo recorrente foram motivados unicamente pela sua toxicodependência; todos à excepção de um, crimes contra o património.
XII- Prevendo-se que terminando este percurso aditivo o percurso delitivo também termine pois tal não está directamente determinado pela personalidade do recorrente mas sim da sua adicção que, como se sabe, desvirtua a personalidade dos toxicodependentes.
XIII- Também o acórdão recorrido não tomou em consideração, na pena conjunta, o montante das quantias furtadas, tendo sido dado como provado que o arguido se apropriou: no crime de burla informática de €60,00 na compra de tabaco (Situação VII); de €56,10 também na compra de tabaco (Situação IX); de €39,00 no crime de furto (Situação I); de €190,00 no crime de apropriação ilegítima; na Situação XI o facto de os objectos furtados serem inferiores a €102,00; €375,00 na situação IV, Sendo o valor mais alto de que o recorrente se apropriou de €1500,00 (Situação XII).
XIV- Temos assim que pelo menos em 4 situações o valor de que se apropriou o recorrente foi diminuto sendo que em nenhum dos casos se apropriou de quantias de valor elevado.
XV- Nada no relatório social refere que o arguido tem limitada perspetiva de vida, tal é apenas uma “inferência alcançada pelo Tribunal a quo” tal como refere o acórdão recorrido.
XVI- Mas refere o relatório social que o recorrente se inseriu favoravelmente no mercado de trabalho aquando da liberdade condicional e num período em que não consumia estupefacientes e apenas foi despedido por, segundo ele (e não há motivo para não acreditar), foi despedido por ter omitido os antecedentes criminais.
XVII- Também se refere que beneficia do apoio da mãe.
XVIII- Que tem mantido no E.P. um comportamento adequado, encontrando-se em programa de substituição por metadona (o recorrente não voltou, após a detenção, a consumir drogas, tendo abandonado a sua dependência),
XIX- e reconhece que errou e aceita a necessidade de se manter abstinente.
XX- O acórdão recorrido não considerou suficientemente, para a medida da pena conjunta, o explanado no relatório social do recorrente, embora o tenha dado como provado.
XXI- Por outro lado as penas parcelares aplicadas, na análise efectuado pelo acórdão recorrido (a fls. 72 a 74) situam-se, a maioria, muito abaixo do limite médio, algumas próximas do mínimo, e apenas nas situações VI, VIII, IX (com moldura de reincidência) a pena se situa abaixo do limite médio, o que é revelador do baixo grau de dolo e ilicitude e das não acentuadas necessidades de prevenção geral e especial.
XXII- O recorrente confessou alguns dos crime cometidos tendo colaborado para a descoberta da verdade, o que revela um traço de personalidade não dissidente com o direito e que deve ser levado em conta na aferição da pena conjunta.
XXIII- O arguido à data dos factos tinha 44 anos de idade e neste momento tem 46 anos, idade em que a sensibilidade à pena mais se faz sentir e estando o mesmo em programa de substituição por metadona e tendo ainda em conta o efeito previsível da pena no comportamento futuro do arguido, face às exigências de socialização, e a baliza legal da pena aplicável, entende-se ser de diminuir a pena conjunta aplicada.
XXIV- A pena parcelar mais baixa aplicada é de 3 meses de prisão e a mais alta de 4 anos e 3 meses, fruto da moldura da reincidência, sendo este o limite mínimo da moldura de abstracta do concurso de crimes.
XXV- Deverá, por isso, ser ao arguido aplicado um aditamento da pena parcelar, por força do concurso de crimes, de pelo menos 1/3, pois estamos perante crimes de pequena e média gravidade, todos da mesma natureza, contra o património (excepto um), sendo que mais do que 1/3 só se aplicam em casos excepcionais, o que não é o caso, pois os crimes são do mesmo tipo e de pequena e sempre abaixo da média gravidade.
XXVI- Neste contexto, valorando o ilícito global perpetrado, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade do arguido/recorrente, e ainda tendo em conta o efeito previsível da pena no comportamento futuro do arguido, face às exigências de socialização, entende-se justa, adequada e proporcional, a pena de 5 anos e 7 meses de prisão.
XXVII- Afigura-se-nos que o Tribunal da Relação ...... ao condenar o Recorrente numa pena de 8 anos e 6 meses de prisão, violou o artigo o artigo 40º, 71º e 77º do Código Penal.

Termos em que deve o presente recurso merecer provimento, devendo o Acórdão da Relação de ... posto em crise, na parte da aplicação da medida da pena conjunta, ser substituído por outro, que tenha em consideração as circunstâncias supra referidas, aplicando ao recorrente uma pena de prisão nunca superior a 6 anos.».

5. O recurso foi admitido por douto despacho de 11.6.2021.

6. O Ministério Público, pela pena do Senhor Procurador-Geral Adjunto no Tribunal da Relação ......, respondeu doutamente ao recurso, admitindo a redução da pena única a 7 anos de prisão.
Extraiu da contramotivação as seguintes conclusões:
─ «1ª O Acórdão encontra-se bem fundamentado de facto e de direito.
2ª Não padece dos vícios que se lhe são apontados no recurso.
3ª No confronto entre os factores atenuantes e agravantes com reflexos na escolha e medida da pena, é fortemente penalizador o seu passado criminal e a reincidência em crimes na prática de crimes contra o património.
4ª Ainda assim, atendendo ao contributo que deu no esclarecimento de muitos dos factos, conferindo maior relevância à confissão e considerando a sua situação actual – em tratamento à toxicodependência – não nos repugnaria que a pena única se viesse a fixar nos 7 anos de prisão.».

7. Entendimento algo diferente sustentou a Senhora Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal no douto e aprofundado parecer que produziu no momento previsto no art.º 416º n.º 1 do CPP [2].
Pôs em destaque a ilicitude global das condutas do arguido, que considerou significativa, as exigências de prevenção geral, que teve por acentuadas, a tendência do arguido para a prática de crimes de furto qualificado e as, inerentes, exigências de prevenção especial, que ambas qualificou de fortes.
 E pronunciou-se, por tudo, pela total improcedência do recurso, mantendo-se, designadamente, a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão aplicada.  

8. Notificado do parecer nos termos e para o efeitos do art.º 417º n.º 2, o Recorrente nada disse.

9. Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. Fundamentação.

A. Âmbito-objecto do recurso.
10. O objecto e o âmbito dos recursos são os fixados pelas conclusões da respectiva motivação – art.º 412º n.º 1, in fine, do CPP –, sem prejuízo do conhecimento das questões oficiosas [3].
Tribunal de revista, de sua natureza, o Supremo Tribunal de Justiça conhece apenas da matéria de direito – art.º 434 º do CPP.
Não obstante, deparando-se com vícios da decisão de facto enquadráveis no art.º 410º n.º 2 do CPP ou com nulidade não sanada – n.º 3 da mesma norma – que inviabilizem a cabal e esgotante aplicação do direito, pode, por sua iniciativa, sindicá-los.

Revisto o Acórdão Recorrido nada se detecta que suscite intervenção oficiosa em sede de fixação dos factos ou de validade do procedimento.
A única questão a apreciar é assim a, suscitada pelo Recorrente, da medida concreta da pena única.

B. Apreciação.

a. O Acórdão Recorrido – matéria de facto.
11. No momento de coligir os factos, o Acórdão Recorrido, depois de ter afastado as acusações que o Recorrente lhes dirigira, acolheu o que vinham fixados da 1ª instância, dando como provados os seguintes:
─ «1. Factos provados
Discutida a causa resultam provados os seguintes factos:

Situação I – NUIPC 192/19.... – Apenso E
1. No dia 22 de Fevereiro de 2019, cerca das 06h00, o arguido AA aproximou-se do estabelecimento de restauração denominado “Café...”, sito na Avenida ..., n.º ... em..., explorado por HH, agarrou numa pedra e atirou a mesma contra o vidro inferior da porta do dito café, partindo-o.
2. Através da abertura por ele criada o arguido entrou no mencionado estabelecimento e do seu interior retirou duas garrafas de bebida “….”, cada uma no valor de € 12.00 e uma garrafa de Whisky da marca “…..”, no valor de €15,00.
3. Após, o arguido AA abandonou o local, levando e fazendo suas as ditas garrafas.
4. A reparação dos estragos provocados no vidro pelo arguido AA importa o valor de €81,75.
5. Ao actuar da forma supra descrita, o arguido AA agiu de modo livre, voluntário e com a consciência de estar a quebrar, como quebrou, o vidro da porta do estabelecimento explorado por HH, querendo provocar, como provocou, prejuízos patrimoniais a esta.
6. Agiu o arguido AA de modo livre, voluntário e consciente e com o propósito de fazer suas as ditas garrafas, fazendo-as coisa sua, bem sabendo que as mesmas não lhe pertenciam e que estava a agir contra a vontade do seu proprietário. 

Situação II – NUIPC 346/19... – Apenso J
7. No dia 25 de Julho de 2019, em momento não concretamente apurado, mas no período compreendido entre as 7 horas e 30 minutos e as 13 horas e 30 minutos do referido dia, pessoa, cuja identidade não se logrou apurar, aproximou-se da porta de entrada da cozinha da habitação sita na Rua ..., lote..., n.º..., ….., área deste município de ....., a qual era da propriedade de II.
8. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, utilizando objecto não concretamente apurado, a mencionada pessoa, logrou partir a fechadura da dita porta, tendo entrado, por aí, na dita residência.
9. Seguidamente,  a mencionada pessoa deambulou pelas várias divisões da residência e retirou e fez seus os seguintes objectos que se encontravam no interior da habitação II e de seu filho JJ: um relógio de marca ..., modelo..., de cor...cor..., no valor de aquisição de €329;  um relógio de marca..., de cor..., no valor de aquisição de €230; pelo menos €400 em notas de cinco euros do Banco Central Europeu que se encontravam dentro de um mealheiro, existente junto da lareira da habitação; um par de óculos de marca ..., modelo..., de lentes..., com o valor actual de pelo menos cinquenta euros.
10. Os relógios tinham sido adquiridos há um ano e tinham o valor global de pelo menos duzentos euros.
11. Em seguida, abandonou o local e levando consigo e fazendo seus os ditos objectos.

Situação III - NUIPC 703/19.... – Apenso C
12. No dia 9 de Agosto de 2019, cerca das 18 horas, GG deslocou-se à Pastelaria..., sita na Rua..., n.º...n.º..., em..., com o objectivo de adquirir tabaco da máquina aí existente.
13. Após adquirir o tabaco, GG deixou, por esquecimento, a sua carteira em cima da referida máquina dispensadora de tabaco e saiu do local.
14. A referida carteira continha um cartão do cidadão, uma carta de condução n.º ..., um cartão de sócio do ..., um cartão de crédito e cartão de débito do Banco BCP e a quantia de €190,00 em notas e moedas do Banco Central Europeu.
15. Mais tarde, por volta das 18 horas e 50 minutos, o arguido AA entrou no estabelecimento e apercebeu-se da existência da dita carteira, que se encontrava colocada em cima da máquina dispensadora de tabaco.
16. Acto contínuo, o arguido AA agarrou na dita carteira e abandonou o local, levando-a e fazendo-a sua e aos documentos e quantia monetária que se encontravam no seu interior.
17. Agiu o arguido AA da forma descrita, fazendo sua a dita carteira, bem como todo o seu conteúdo, que encontrara, bem sabendo que lhe não pertencia e que agia contra a vontade do seu proprietário.
18. O arguido AA não procurou saber quem era o proprietário da carteira, nem comunicou o sucedido ou entregou a carteira e o seu conteúdo a qualquer autoridade, tendo ficado indiferente ao facto de com tal conduta causar prejuízo patrimonial ao demandante GG.
19. O demandante GG teve de solicitar a emissão de novos cartão de cidadão, carta de condução e cartão bancário, no que despendeu, respectivamente, os montantes de € 15,00, de €30,00 e de €20,00.

Situação IV- NUIPC 394/19.4T9OLH – processo principal
20. No dia 17 de Agosto de 2019, cerca das 2 horas e 30 minutos, na Rua ..., em..., o arguido AA aproximou-se do veículo com a matrícula XX-XX-XX, da propriedade de FF e, fazendo uso de objecto não concretamente identificado, partiu o vidro lateral do lado do condutor do mencionado veículo.
21. Em seguida, o arguido AA logrou entrar no descrito veículo, tendo retirado do interior do mesmo, uma mala de marca ..., no valor de €50;  um casaco de criança de marca ..., no valor de €25; um par de óculos, no valor entre €100,00 a € 120,00; um par de óculos de sol marca ..., no valor de pelo menos €50,00 e um anel em prata comemorativo dos 40 anos, no valor de €150.
22. Em seguida, o arguido AA abandonou o local, levando consigo e fazendo seus os ditos objectos.
23. A reparação dos estragos causados pelo arguido no veículo (no vidro, na pintura e na consola central) importa o valor entre € 230 a 240,00.
24. O arguido AA actuou de forma livre, voluntária e consciente, com a intenção – concretizada- de fazer seus os ditos objectos, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que não tinha qualquer autorização do seu proprietário para adoptar as descritas condutas.
25. O arguido AA sabia que os objectos estavam guardados no interior do veículo citado, que se encontrava fechado e que não podia partir os vidros para aceder ao seu interior, 
26. O arguido AA agiu da forma supra descrita, bem sabendo que não tinha autorização da sua proprietária para agir de tal forma e para causar ao mesmo tal prejuízo.
27. A demandante FF ficou receosa, angustiada, revoltada e perturbada com os factos supra descritos em virtude da sua ocorrência e por ter sido em tempos defensora oficiosa nomeada ao arguido.

Situação V - NUIPC 818/19.... – Apenso I
28. No dia 10 de Setembro de 2019, a hora não concretamente apurada no período compreendido entre as 9 horas e as 21 horas e 50 minutos, pessoa cuja identidade não se logrou apurar aproximou-se da habitação da propriedade de KK, sita na Rua ..., n.º …, em..., e, através da utilização de objecto não concretamente identificado, estroncou e retirou o canhão da fechadura da porta de entrada da habitação, tendo logrado, dessa forma, aceder ao seu interior.
29. Seguidamente, a pessoa cuja identidade não se logrou apurar retirou da dita habitação uma caixa de comandos; uma hélice em aço inoxidável; manómetros do motor, um berbequim; duas chaves de fendas, uma de cabo azul e outra de estrelas com cabo vermelho, objectos pertença de KK e no valor global de € 3000,00; uma serra tico-tico, de cor..., da marca ... uma caixa de esquadria de marca ... de cor..., tudo no valor global de €200,00 e pertença de LL, que ali os tinha deixado, porquanto se encontrava a realizar trabalhos de colocação do chão flutuante na dita habitação.
30. Em seguida, a mencionada pessoa  abandonou o local, na posse dos ditos objectos, fazendo-os seus.

Situação VI - NUIPC 819/19.... – Apenso B e NUIPC 825/19... – Apenso H
31. No período compreendido entre as 20h00 e as 23h00 do dia 10 de Setembro de 2019, o arguido AA formulou o propósito de entrar na residência sita na Rua ..., n.º..., em..., da propriedade de MM e de NN e daí retirar bens que existissem no seu interior.
32. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido AA, aproximou-se da porta da dita habitação e, com a utilização de um objecto não concretamente identificado, logrou partir e extrair o canhão da fechadura da referida porta.
33. Em seguida, o arguido AA entrou na habitação e retirou da mesma os seguintes objectos: - uma coluna ..., Bluetooth speaker...; uma máquina... digital camera + 35mm lens; uma lente...;  uma lente...; uma televisão...televisão..., no valor de €200; um jarro eléctrico...; duas chaves de fendas; um Saco térmico; uma aparafusadora eléctrica; uma garrafa de vodka; um estojo de parafusos; uma garrafa de gin; uma garrafa de Whisky; uma garrafa de cerveja; um pacote de batatas fritas; quatro embalagens de aperitivos; dois queijos; seis gelados; dois chinelos; um comando de TV; um saco para câmara...;  uma coberta de cama; um trolley – ... e Um chapéu de Baseball.... 
34. Após, o arguido AA saiu da habitação na posse dos ditos objectos, que sabia que tinham um valor superior a €200.
35. Alguns minutos depois, numa rua não concretamente apurada, mas junto à loja dos CTT, em..., o arguido avistou OO, nascido a 30 de Março de 2004 e disse-lhe para transportar a televisão... supra descrita e que o esfaqueava caso o mesmo se recusasse a agir de tal forma e fazer tal transporte.
36. Com receio das palavras do arguido e de que este atentasse contra a sua vida e integridade física, OO agarrou no televisor e transportou o mesmo.
37. Quando se encontrava na Rua..., em..., surgiram no local os agentes da Policia de Segurança Pública, PP, QQ e RR.
38. Ao se aperceber da presença dos agentes da P.S.P., o arguido AA colocou-se em fuga, tendo sido encontrado, escondido de baixo de um veículo, alguns metros à frente.
39. Ao actuar da forma supra descrita, o arguido AA agiu de modo livre, voluntário e com a consciência de estar a quebrar, como quebrou, a fechadura da porta de entrada da residência de MM, querendo provocar, como provocou, prejuízos patrimoniais a esta e para, dessa forma, lograr entrar na habitação, com o propósito concretizado de fazer seus os supra descritos objectos, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que estava a agir contra a vontade do seu proprietário.
40. Ao proferir as palavras descritas dirigidas a OO, o arguido AA actuou com o propósito de, através da expressão acima referida, forçar OO, a ajudá-lo a transportar o dito televisor, bem sabendo que as palavras que lhe dirigiu eram susceptíveis de causar um sentimento de insegurança e de intranquilidade no visado, fazendo-o recear pela sua saúde, integridade física e vida.
41. O arguido actuou ainda ciente que a expressão dirigida ao OO era apta a que o mesmo assumisse a conduta por si pretendida, o que veio a suceder, tendo aquele, com receio pela sua vida e integridade física, transportado o dito televisor por várias ruas desta cidade de ......
42. O arguido sabia que OO era menor de idade, tendo apenas 15 anos.

Situação VII - NUIPC 829/19... – Apenso G
43. No dia 13 de Setembro de 2019, por volta das 03h00, o pessoa cuja identidade não se logrou apurar na residência sita na Rua ..., n.º..., em..., da propriedade de SS e daí retirar objectos e/ou quantias monetárias que aí estivessem.
44. Na concretização desse propósito, a mencionada pessoa aproximou-se da janela da cozinha da residência e trepou para o parapeito desta, tendo, em seguida, logrado entrar na dita habitação através de tal janela, que se encontrava sem estar fechada no trinco.
45. Seguidamente, essa pessoa retirou e fez seus os seguintes objectos: uma mala de cor vermelha, de marca ..., no valor de €80, contendo os seguintes bens: 4 cartões bancários; o cartão de contribuinte e o cartão de cidadão; €200 em notas do Banco Central Europeu; um relógio de marca ..., no valor de €250; uns óculos, no valor de €180; um anel em ouro com um pequeno diamante, no valor de €850; um porta moedas de marca ..., no valor de €230; um porta cartões de marca ..., no valor de €160; um bilhete de metro de ..., no valor de €31; uma caderneta de bilhetes de barco da Ilha da ..., no valor de €37 e selos no valor de €11.
46. Depois, a mencionada pessoa, suja identidade não se logrou apurar, saiu da residência, na posse dos ditos bens, levando-os consigo, fazendo-os seus.
47. Por forma não concretamente apurada o arguido AA veio a ficar na posse de um cartão de débito de SS.
48. O arguido AA ao aperceber-se que o cartão permitia a utilização através do método denominado “Contactless”, ou seja, bastando a passagem do cartão perto do terminal de pagamento automático para que os dados do cartão sejam enviados e se processe a compra, com a consequente transferência da quantia monetária em causa decidiu proceder à sua utilização.
49. Sabia o arguido AA que tal método permitia a compra de bens em valores inferiores a €20, sem que fosse necessário colocar um código “PIN” no dito terminal de pagamento.
50. Assim, o arguido AA deslocou-se ao Posto de abastecimento de combustível da BP, sito na Avenida ..., em..., tendo efectuado, no dia 13-09-2019, pelas 05h35, a compra de quatro maços de tabaco ..., no valor total de €19,20.
51. Posteriormente, o arguido AA deslocou-se ao posto de abastecimento de combustível CEPSA, sito na Zona Industrial de..., Lote..., área deste município de ..... e efectuou as seguintes compras, efectuando os respectivos pagamentos com recurso ao cartão de débito do Banco... retirado da residência sita na Rua ..., n.º..., em..., propriedade de SS, através do método “contactless”:
52. No dia 13-09-2019, pelas 06h50 – três maços de tabaco ..., no valor total de €15,30;
53. No dia 13-09-2019, pelas 06h52 – dois maços de tabaco de ..., no valor total de €10,20;
54. No dia 13-09-2019, pelas 06h57 – três maços de tabaco ..., no valor total de €15,30.
55. Ao actuar da forma descrita  supra o arguido AA agiu sempre de modo livre, voluntário e com o propósito de proceder às mencionadas compra, através da utilização do cartão de débito bancário que não lhe pertencia, fazendo uso do meio “contactless”, actuava sem a autorização da respectiva proprietária e contra a sua vontade e em prejuízo desta.
56. O arguido bem sabia que ao utilizar o dito cartão através do método “contactless” que estava a utilizar dados bancários atribuídos exclusivamente à ofendida SS, acedendo à conta bancária desta e fazendo uso das quantias nela existente, mesmo sabendo que esta não lhe tinha dado qualquer autorização para tais utilizações.
57. Ao agir do modo descrito, em cada um dos momentos supra descritos, o arguido fez crer no sistema bancário que a conta bancária supra descrita estava a ser acedida e movimentada pelo seu titular, que autorizou as operações.

Situação VIII - NUIPC 853/19.... – Apenso A
58. No dia 22 de Setembro de 2019, cerca das 22 horas, o arguido AA aproximou-se da habitação de TT, sita na Urbanização... formulando o propósito de entrar na mesma com o objectivo de fazer seus bens e quantias monetárias que estivessem no seu interior.
59. Na concretização de tal propósito, nas circunstâncias de tempo e locar acima descritas, o arguido AA trepou pelas grades de acesso à varanda do dito apartamento e, em seguida, entrou pela porta de acesso à habitação, tendo logrado entrar no seu interior.
60. Em seguida, o arguido AA deambulou pela habitação de TT e retirou três relógios de marca ..., cada um no valor de, pelo menos, € 180,00 e dois relógios de marca ..., cada um no valor de, pelo menos, € 180,00.
61. Depois, o arguido AA abandonou a residência, na posse dos ditos bens, levandoos consigo, fazendo-os seus.
62. Ao actuar da forma supra descrita, o arguido AA agiu de modo livre, voluntário e com a consciência de estar a entrar na dita habitação pela dita varanda - após trepar por esta - e porta com o propósito de fazer seus os supra descritos objectos, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que estava a agir contra a vontade do seu proprietário.

Situação IX – NUIPC 874/19.... – Apenso M
63. No dia 1 de Outubro de 2019, em momento não concretamente apurado do período compreendido entre depois da 00 horas e as 02h30, o arguido AA formulou o propósito de entrar na residência sita na Rua do ..., n.º..., em..., da propriedade de UU e daí retirar objectos e/ou quantias monetárias que aí estivessem.
64. Na concretização desse propósito, o arguido AA aproximou-se da janela basculante que dá acesso à cozinha da residência e retirou a mesma das calhas, tendo em seguida trepado para o parapeito desta, logrando, dessa forma, entrar na dita habitação através de tal janela.
65. Seguidamente, o arguido AA retirou e fez seus os seguintes objectos quatro bolsas contendo a quantia monetária de €1300 em notas do Banco Central Europeu,  um  passaporte n.º ..., em nome de VV, um passaporte com o n.º... em nome de UU, um cartão de débito com o n.º ..., da titularidade de UU, um passaporte em nome de YY e um cartão bancária de débito com o n.º ..., da titularidade de UU.
66. Depois, o arguido AA abandonou a residência, na posse dos ditos bens, levando-os consigo, fazendo-os seus.
67. Ao actuar da forma supra descrita, o arguido AA agiu de modo livre, voluntário e com a consciência de estar a entrar na dita habitação pela dita janela com o propósito concretizado de fazer seus os supra descritos objectos, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que estava a agir contra a vontade do seu proprietário.
68. O arguido AA verificou que o cartão de débito que retirou da habitação (cartão com o n.º ..., da titularidade de UU) permitia a utilização através do método denominado “Contactless”, bastando a passagem do cartão perto do terminal de pagamento automático para que os dados do cartão sejam enviados e se processe a compra, com a consequente transferência da quantia monetária em causa.
69. Mais sabia o arguido que tal método permitia a compra de bens em valores inferiores a €20, sem que fosse necessário colocar um código “PIN” no dito terminal de pagamento.
70. Assim, depois de ter abandonado a dita residência, utilizando o dito cartão de débito que havia retirado e através do método “contactless” acima descrito, o arguido AA deslocou-se ao Posto de abastecimento de combustível da BP, sito na Avenida ..., em..., tendo utilizado o dito cartão de débito por quatro vezes e adquirido bens nesse estabelecimento. 
71. Pelas 03h46m57ss, adquiriu 3 maços de tabaco ..., no valor total de €15,30;
72. Pelas 03h47m42ss, adquiriu três maços de tabaco ..., no valor total de €15,30;
73. Pelas 03h48m06ss, adquiriu dois maços de tabaco ..., no valor total de €10,20;
74. Pelas 03h48m34ss, adquiriu três maços de tabaco ..., no valor total de €15,30.
75. Ao actuar da forma supra descrita, o arguido AA agiu sempre de modo livre, voluntário e com o propósito de obter para si benefício, como obteve, bem sabendo que, ao utilizar, em cada uma das situações, o dito cartão de débito bancário que não lhe pertencia, fazendo uso do meio “contactless”, actuava sem a autorização da respectiva proprietária e contra a sua vontade e em prejuízo desta.
76. Em cada uma das quatro vezes acima explanadas, o arguido bem sabia que ao utilizar o dito cartão através do método “contactless” que estava a utilizar dados bancários atribuídos exclusivamente à ofendida UU, acedendo à conta bancária desta e fazendo uso das quantias nela existente, mesmo sabendo que esta não lhe tinha dado qualquer autorização para tais utilizações.
77. Ao agir do modo descrito, o arguido fez crer no sistema bancário que, por quatro vezes, a conta bancária supra descrita estava a ser acedida e movimentada pelo seu titular, o que determinou a entidade bancária a validação das operações bancárias em causa.

Situação X– NUIPC 934/19.... – apenso L
78. Em momento não concretamente apurado, no período compreendido entre as 18h00 do dia 10 de Outubro de 2019 e as 12h00 do dia 12 de Outubro de 2019, pessoa cuja identidade não se logrou apurar formulou o propósito de entrar na residência sita na Rua ..., n.º.., em..., da propriedade de XX e daí retirar objectos e/ou quantias monetárias que aí estivessem.
79. Na concretização desse propósito, a mencionada pessoa subiu para o telhado da dita habitação, tendo saltado para o interior do quintal e, em seguida, abriu a porta da cozinha que não se encontrava fechada com o trinco, tendo entrado na dita habitação.
80. Após, retirou do interior da habitação um televisor de marca ..., modelo ..., no valor de €149,99; um grelhador eléctrico de marca ..., modelo ..., no valor de €29,99; um lençol... e um frasco com café, de cor..., de marca ....
81. Depois, a mencionada pessoa cuja identidade não se logrou apurar abandonou a residência, na posse dos ditos bens, levando-os consigo, fazendo-os seus.

82. Situação XI - NUIPC 947/19.... – Apenso F
83. Em data e hora não concretamente apuradas mas antes das 13 horas e 40 minutos do dia 15 de Outubro de 2019, o arguido AA introduziu-se nas residências do prédio com o n.º..., sito na Rua ..., em....
84. Já no interior do prédio, o arguido AA dirigiu-se à residência DD, sita no 1.º andar e, de forma não concretamente apurada, partiu a dita porta de madeira e a fechadura desta, que logrou abrir, introduzindo-se assim no interior da habitação.
85. O arguido esteve no interior da residência, mas não retirou bens por inexistirem dinheiro ou bens de valor que fossem do seu interesse. 
86. A reparação dos estragos provocados pelos arguidos na porta e na fechadura da mesma terão um custo de pelo menos € 20.
87. Após, o arguido AA abandonou aquela residência e subiu ao 2.º andar, dirigindo-se à residência de EE e, de forma não concretamente apurada, partiu a porta de madeira, tendo entrado na dita habitação.
88. Do interior da habitação de EE, o arguido retirou uma pulseira em imitação de ouro amarelo, com a forma de um golfinho, de valor não concretamente apurado; relógio em forma de golfinho, de valor não concretamente apurado e um fio em prata com uma medalha, de valor não concretamente apurado; um telemóvel que não funcionava, um carregador de valor não apurado; um televisor LCD, sem valor; uma balança digital no valor de €20 e uma caixa de farinha da marca ....
89. O valor global dos mencionados objectos era inferior a cento e dois euros.
90. Após, o arguido AA saiu da habitação na posse dos ditos objectos, que fez seus.
91. Ao actuar da forma descrita, o arguido AA agiu de modo livre, voluntário e com a consciência de estar a quebrar a porta de entrada da residência de DD, querendo provocar, como provocou, prejuízos patrimoniais a esta e para, dessa forma, lograr entrar na habitação, com o propósito não concretizado de fazer seus bens ou dinheiro que ali encontrassem, bem sabendo que estavam a agir contra a vontade do seu proprietário.
92. O arguido AA sabia que não podia entrar e permanecer no interior daquela residência sem prévia autorização de quem a habitasse ou dela dispusesse, sabendo ainda que o seu interior não era de livre acesso à generalidade das pessoas.
93. Ao actuar da forma descrita, o arguido AA agiu de modo livre, voluntário e com a consciência de estar a quebrar a porta de entrada da residência de EE, querendo provocar prejuízos patrimoniais a esta e para, dessa forma, lograr entrar na habitação, com o propósito concretizado de fazer seus os objectos supra descritos e que estavam a agir contra a vontade da sua proprietária.

Situação XII -  NUIPC 1013/19.... – Apenso K
94. No dia 31 de Outubro de 2019, no período compreendido entre as 22h30 e as 23h30, o arguido AA entrou no estabelecimento comercial denominado “...”, sito na Avenida ..., n.º..., em... da propriedade de WW.
95. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido AA debruçou-se sobre o balcão de atendimento ao público e retirou do interior do mesmo uma carteira que continha a quantia de €1500 em notas do Banco Central Europeu, um cartão de cidadão e uma carta de condução, que pertenciam a WW.
96. Agiu o arguido AA de modo livre, voluntário e consciente e com o propósito de fazer sua a dita carteira com a dita quantia monetária, fazendo-as coisa sua, bem sabendo que as mesmas não lhe pertenciam e que estava a agir contra a vontade do seu proprietário.
97. Em todas as situações supra descritas, o arguido AA agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Das condições pessoais do arguido e suas condenações penai
98. O arguido beneficiou ao longo da sua vida de suporte e enquadramento familiar.
99. Concluiu o 9.º ano aos 17 anos de idade, vindo, na sequência de uma crescente atitude de desmotivação, a abandonar os estudos. Passou a integrar o mercado de trabalho como indiferenciado nas áreas da …. e ….., mantendo em moldes irregulares períodos de actividade de curta duração.
100. Frequentou com sucesso, através do centro de emprego, alguns cursos de formação profissional.
101. A toxicodependência tem-se constituído como principal causa de desajuste comportamental e criminal, tendo sido submetido a vários processos terapêuticos.
102. No âmbito da liberdade condicional, na fase inicial, compareceu às entrevistas agendadas, beneficiando do apoio da mãe e inserindo-se no mercado de trabalho, exercendo a actividade de ….., em unidade hoteleira em... até Maio de 2019. Após ter sido despedido retomou o consumo de heroína e abandonou o acompanhamento à sua problemática aditiva.
103. No estabelecimento prisional tem mantido comportamento adequado.
104. Encontra-se integrado em programa de substituição por metadona.

Dos antecedentes criminais do arguido AA
105. Por sentença de 22 de Março de 1994, transitada em julgado em 22 de Setembro de 1995, no âmbito do processo comum singular n.º 2673/93.... do ... Juízo Criminal do Tribunal do ….., o arguido foi condenado na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, pela prática em 19 de Novembro de 1991 de um crime de roubo, punido pelo art.º 306.º n.º1 do Código Penal/82, suspensão esta posteriormente revogada - a pena de prisão foi declarada extinta pelo cumprimento.
106. Por decisão de 14 de Abril de 1994, no âmbito do processo n.º 402/93.... do ... Juízo do Tribunal de ….., o arguido foi condenado na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, e 15 dias de multa, pela prática em 22 de Maio de 1993, de um crime de furto qualificado e um crime de furto de uso, punidos pelos art.ºs 296.º e 297.º n.º1 al. a) e n.º2 al. e), d) e h), e art. 304.º n.º1 do Código Penal /82, tendo a suspensão sido posteriormente revogada e cumpridas as penas de prisão, principal e subsidiária.
107. Por decisão de 21 de Março de 1995, proferida no âmbito do processo n.º 955/94.... do ... Juízo Criminal do Tribunal do ……., o arguido foi condenado na pena conjunta de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática em 5 de Outubro de 1994, de um crime de roubo e um crime de extorsão na forma tentada, punidos pelos art.ºs  306.º n.º1, n.º 3 al. b) e n.º 5 e 297.º n.º1 al. g) e n.º2 al. e), d) e h), e art.º 317.º n.º1 al. e) e 22º e 23º do Código Penal /82, pena esta extinta pelo cumprimento.
108. Por decisão de 11 de Julho de 1996, proferida no âmbito do processo n.º 256/95 do Tribunal de ..., foi condenado na pena conjunta de 2 anos de prisão, pela prática em 19 de Maio de 1993 de um crime de roubo e um crime de furto qualificado, punidos pelos art.ºs  210.º n.º1 do Código Penal  e 296.º e 297.º n.º 1 al. a) e n.º2 al. e), d) e h) e 298.º n.º1 do Código Penal /82, pena esta extinta pelo cumprimento.
109. Por decisão de 16 de Outubro de 1998, proferida no âmbito do processo n.º 213/97.... do ... Juízo do Tribunal de ….., foi condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, pela prática em 24 de Junho de 1996, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, punido pelos art.ºs 21.º e 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, pena esta extinta pelo cumprimento.
110. Por decisão de 31 de Maio de 2005, proferida no âmbito do processo n.º 1490/01.... do ... Juízo Criminal do Tribunal de ……, foi condenado na pena de 150 dias de multa à taxa diária de 5 euros, pela prática em 8 de Julho de 2001, de um crime de ofensa integridade física, punido pelo art.º 143.º do Código Penal, pena esta extinta pelo pagamento.
111. Por decisão de 25 de Setembro de 2006, no âmbito do processo n.º 929/05.... do ... Juízo do Tribunal de ……, foi condenado na pena de 55 dias de multa à taxa diária de 5 euros, pela prática em 23 de Outubro de 2005,  de um crime de ofensa integridade física, punido pelo art.º 143º do Código Penal, pena esta extinta pelo pagamento.
112. Por decisão de 4 de Janeiro de 2007, no âmbito do processo n.º 117/06.... do ... Juízo Criminal do Tribunal de ….., foi condenado na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa por igual período, pela prática em 22 de Janeiro de 2006, de um crime de roubo, punido pelo art.º 210.º n.º1 do Código Penal, pena esta extinta nos termos do artigo 57.º, n.º 1 do Código Penal.
113. Por decisão de 12 de Fevereiro de 2009, no âmbito do processo n.º 170/09.... do ... Juízo do Tribunal de ….., foi condenado na pena de 4 meses de prisão, substituída por 120 dias de multa à taxa diária de 6 euros, pela prática em 9 de Fevereiro de 2009 de um crime de condução sem habilitação legal, punido pelo art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3/01, pena esta extinta pelo cumprimento.
114. Por decisão de 8 de Abril de 2011, transitada em julgado em 8 de Agosto de 2011. no âmbito do processo n.º...857/10.... do ... Juízo do Tribunal de ….., foi condenado na pena de 2 anos e 9 meses de prisão, suspensa pelo mesmo período, com regime de prova e obrigações, pela prática em 9 de Fevereiro de 2010 de um crime de furto qualificado, punido pelos art.ºs 203.° n.º1 e 204.º n.º2 al. e) do Código Penal. A suspensão foi revogada.
115. Por acórdão de 15 de Julho de 2 016, transitado em julgado no dia 30 de Setembro de 2 016 , proferido nos autos de processo comum coletivo 51/10...., foi o arguido AA condenado pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punível pelo artigo 204º, n.º 2, alínea e) do Código Penal na pena de 2 anos e 11 meses de prisão, por ter praticado os seguintes factos:- No dia 8 ou 9 de fevereiro de 2 010 o arguido partiu o vidro da porta da junta de freguesia da ... e, através da abertura assim criada, abriu a fechadura da porta e introduziu-se no interior do edifício de onde retirou e fez seus € 200,00 e duas chaves de veículos automóveis;
116. - Por acórdão de 27 de Março de 2012, parcialmente alterado pelo acórdão do Tribunal da Relação ...... de 19 de Fevereiro de 2013, transitado em julgado no dia 18 de Março de 2013 proferido no processo 194/10...., foi o arguido condenado pela prática de um crime de roubo (previsto e punível pelo artigo 210º, n.º 1 do Código Penal) na pena de 3 anos e 6 meses de prisão; de um crime de roubo tentado (previsto e punível pelo 210, n.º 1, 22º e 23º do Código Penal) na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; de um crime de furto qualificado (previsto e punível pelo artigo 204º, n.º 2, alínea e) do Código Penal) na pena de 2 anos e 6 meses de prisão; de um crime de furto qualificado (previsto e punível pelo artigo 204º, n.º 2, alínea e) do Código Penal) na pena de 3 anos de prisão e de crime de furto qualificado (previsto e punível pelo artigo 204º, n.º 2, alínea e) do Código Penal) na pena de 3 anos de prisão, por ter cometido os seguintes factos: No dia 28 de Dezembro de 2009, o arguido, em conjugação de esforços e de forma concertada com outro indivíduo, acedeu ao interior das instalações do Tribunal Judicial de..., depois e ter fraturado a fechadura da porta da entrada e, uma vez no interior do, várias divisões do Tribunal, manuseando secretárias, donde retiraram as quantias de € 350,00, após o que se retiraram das instalações do tribunal fazendo suas a referida quantia em dinheiro;
- A hora não apurada, durante a noite do dia 10 de Janeiro de 2010 ou madrugada do dia seguinte (antes da 1:53 horas), o arguido, em conjugação de esforços com outro indivíduo e de forma concertada, acedeu ao interior de um estabelecimento comercial localizado em ..., através do estroncamento da janela lateral do mencionado estabelecimento e, uma vez no interior, o arguido e seu acompanhante retiraram dois telemóveis, um cheque e dinheiro no valor global de € 191,33 (os telemóveis foram recuperados devido à atuação da polícia);
- No dia 16 de Janeiro de 2010, cerca das 3:20 horas, o arguido, em conjugação de esforços e de forma concertada com outros dois indivíduos, acederam ao interior das instalações de um lar situado em... após terem fraturado a porta de entrada, que estava fechada apenas pelo trinco, quando foram surpreendidos por uma senhora. O arguido ficou à porta a vigiar, um dos outros agarrou a referida senhora, apertou-lhe o pescoço, tapou-lhe a boca e disse "isto é um assalto!”. Ato contínuo a senhora conseguiu libertar-se e o arguido e os seus companheiros colocaram-se cm fuga;
- No dia 12 de Fevereiro de 2010, entre as 18:00 e as 22:57 horas, o arguido, em conjugação de esforços e de forma concertada com outro indivíduo, acederam ao interior de um estabelecimento comercial sito em..., após ferem fraturado uma janela, com a utilização de uma chave de fendas. No interior do estabelecimento retiraram coisas e dinheiro no valor global de € 1310,00 (sendo que uma das coisas – arma de alarme - foi recuperada por ação da polícia);
- No dia 13 de Fevereiro de 2010, cerca das 20:15 horas, o arguido, em conjugação de esforços e de forma concertada com outro indivíduo solicitaram a uma senhora que saísse do escritório da estação de serviço localizada em.... Julgando a senhora que aqueles pretendiam proceder ao abastecimento de gasolina ela decidiu sair do escritório. Acto contínuo, no momento em que a referida senhora abria a porta do escritório, o arguido desferiu-lhe um soco na face e agarrou-a pelo pescoço, encostando-a a uma parede e, nessa sequência, o outro indivíduo desferiu vários socos no corpo da senhora na medida em que esta, com nervosismo estava com dificuldades em abrir a sua mala. Enquanto o arguido segurava a vítima pelo pescoço, o outro indivíduo, na posse de um objeto escuro e com a configuração de uma arma de fogo, com a qual ameaçava a vítima, arrancou da cintura desta uma mala azul, mediante um forte puxão e a seguir entregou-a ao arguido, tendo ambos se colocado em fuga de seguida; a mala continha no seu interior a quantia de € 120,00 e alguns talões de pagamento de multibanco.
117. - Por acórdão de 20 de Fevereiro de 2014, transitado em julgado no dia 24 de Março de 2014, proferido no âmbito do processo 618/12...., foi o arguido condenado pela prática de um crime de furto qualificado (previsto e punível pelo artigo 204º, n.º 1, alínea f) do Código Penal) na pena de 2 anos e 3 meses de prisão, por ter praticado os seguintes factos:
- No dia 14 de Agosto de 2 012 o arguido, que residia no 1.º andar de um prédio onde cumpria a medida de coação de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, invocou, junto da competente equipa de vigilância, uma urgência médica e ausentou-se da residência. Durante a sua ausência, o arguido introduziu-se (de modo não apurado) num apartamento sito no segundo andar do mesmo bloco onde o arguido cumpria a aludida medida de coação e do seu interior retirou e fez seus e um computador, a respetiva mala, 4 pen drive, duas consolas de jogos, um telemóvel e um relógio.
118. - O arguido esteve em cumprimento sucessivo de penas (processos 194/10.... e 857/10....), sendo que desde o dia 15 de Fevereiro de 2010, à ordem do processo 194/10.... e foi libertado no dia 5 de Abril de 2018, no âmbito de decisão proferida pelo Tribunal da Relação ......, que concedeu a liberdade condicional pelo tempo que faltava cumprir até ao dia 15 de Outubro de 2021.
1. No âmbito do processo n.º 51/10.... do Juízo Criminal de... – Juiz ..., por acórdão de 28 de Abril de 2017 e transitado em julgado no dia 29 de Maio de 2017, ao cúmulo jurídico com as penas aplicadas no âmbito do processo n.º 194/10.... e processo n.º...618/12.... , tendo o arguido sido condenado na pena conjunta de 8 anos e 11 meses de prisão.».

12. Nos momentos de fundamentar a convicção probatória, consignou, entre o mais, o Acórdão Recorrido o seguinte:
─ «A convicção do tribunal formou-se com base na apreciação crítica de toda a prova produzida em audiência de julgamento, analisada de acordo as regras normais e lógicas da experiência comum relacionadas com o tipo de factos em causa nos autos, consideradas estas no âmbito do princípio da livre apreciação da prova estabelecido no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Assim:
Relativamente ao conjunto de factos identificados sob a designação situação I o decidido funda-se, nas declarações do arguido AA, que confessou os factos dados como provados, com excepção da qualidade e valor das mencionadas garrafas (o que é compreensível), bem como no depoimento, objectivo e circunstanciado da testemunha HH, que explora o estabelecimento mencionado em 1.
[…].
Relativamente ao conjunto de factos descritos sob a designação - situação III -, o decidido funda-se nas declarações prestadas pelo arguido, que confessa os factos, dados como provados quanto ao que se passou no interior do estabelecimento, obejctos e montante apropriado, em consonância, de resto, com o se extrai da reportagem fotográfica de fls. 18 a 19 (auto de visionamento das imagens de videovigilância do interior do estabelecimento ..., de fls. 14) e auto de denúncia de fls. 3 a 4, do qual resulta a data e hora de prática dos factos.
[…].
Relativamente ao conjunto de factos identificados sob a designação situação VII.
No que tange aos factos objectivos considerou-se o depoimento preciso e rigoroso da testemunha SS, proprietária da residência, em articulação com o auto de notícia de fls. 9, rol de objectos a fls. 10 e 11, documentos bancários de fls. 14 a 17 e 29 a 31, reportagem fotográfica de fls. 22 a 26 e copias das facturas de 44 a 46.
Não existe prova da autoria do furto, não sendo bastante a posse e utilização do cartão, uma vez que esta acaba confirmada pelo arguido AA, alegando que lhe foi pedido, em troca de produto estupefaciente, para ele proceder às mencionadas operações, o que é possível, tendo em conta o percurso aditivo do arguido.
[…].
Situação IX
O decidido funda-se nas declarações do arguido AA, que confirmou ter estado no local, com outra pessoa (sobre essa pessoa não há qualquer prova, sendo de todo o modo irrelevante saber se o arguido entrou ou não no interior da residência, quando o mesmo admite o desiderato da deslocação, retirada da janela e divisão da quantia apreendida). 
O arguido também confirma o uso do cartão, o que de resto resulta da visualização das imagens.
[…].
Situação XII
Considerou-se o depoimento preciso da testemunha WW, em articulação com o auto de notícia e auto de visionamento das imagens.
A versão do arguido afirmando ter apenas subtraído um telemóvel, do qual nem o queixoso fala, não merece qualquer credibilidade, face ao depoimento da testemunha.
[…]».

b. A questão sob recurso: a medida concreta da pena única de prisão.
13. Sustenta, então, o Recorrente que a medida da pena única de 8 anos e 6 meses de prisão é excessiva.
Alega, em suma, que o Tribunal não avaliou devidamente a gravidade global do ilícito, sobrevalorizando a circunstância de já ter antecedentes criminais. E, de outro lado, subvalorizou factores tão importantes como os de a grande maioria dos ilícitos ser dos contra o património; de a sua prática ter sido determinada pela toxicodependência de que padecia; de a generalidade dos bens subtraídos ser de baixo valor; de ter confessado, com utilidade, os factos de quatro dos episódios; de ter 46 anos de idade; de vir mantendo bom comportamento prisional; de frequentar programa de substituição por metadona; de, em meio prisional, se manter abstinente de drogas ilícitas; e de todas as penas parcelares serem de baixa dimensão.
Por tudo o que entende que a pena única justa, adequada e proporcional será a de 5 anos e 7 meses de prisão, pedindo, em qualquer caso, aplicação de pena nunca superior a 6 anos [4].

Veja-se.

14. Nos momentos em que tratou do concurso de crimes e da pena única, o Acórdão Recorrido discreteou como segue:
─ «F. Da pena Conjunta.
Invoca, ainda, o arguido a nulidade da decisão por se encontrar erradamente fundamentada a determinação da pena de concurso de crimes (artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alíneas a) e c) do CPP).
Argumenta o arguido que o Tribunal recorrido ao dizer ter atendido aos factos e às circunstâncias já anteriormente referidos no seu conjunto e à personalidade do arguido, à condição pessoal, à dilação temporal e aos antecedentes criminais estaria novamente a valorar os parâmetros já utilizados aquando se referiu à culpa e à prevenção (artigo 71.º do CP).
Na perspetiva do arguido os factos anteriores constituem pressupostos formais de aplicação da moldura penal agravada (reincidência) não podendo ser de novo valorados em sede de medida da pena da reincidência.
Ao valorar novamente os fatores do artigo 71.º do CP, por remissão direta para o dito a propósito da determinação da pena concreta de cada um dos crimes, e da pena de reincidência, a decisão recorrida teria violado os princípios da proibição da dupla valoração e ne bis in idem.
A propósito da fundamentação da pena conjunta na decisão recorrida é assinalado que:
"Assim, considerando os factos e circunstancias já referidos no seu conjunto e a personalidade do arguido e respetiva condição pessoal, bem como o contexto em que os factos ocorreram, nomeadamente tendo em conta que se trata de factos praticados com dilação temporal, nos termos já explanados, os antecedentes criminais do mesmo, por crimes da mesma e de diferente natureza, e sido condenado anteriormente em penas de prisão cuja execução foi suspensa, tendo praticado os factos no período da liberdade condicional, sem que tenha logrado inverter o referido percurso delituoso, e os bens jurídicos em causa, afigura-se adequado condenar o arguido na pena conjunta de oito anos e seis meses de prisão.. "


Quando no segmento apontado o acórdão indica os factos e circunstâncias já referidos no seu conjunto, não está a fazer uma nova valoração, mas antes, a enunciar os mesmos, de acordo com os n.ºs 1 e 2 do artigo 71.º do CP.
Conforme uma interpretação do artigo 77.º, n.º 1 do CP na fixação da pena única das penas correspondentes aos crimes concorrentes, o tribunal procede a uma reavaliação dos factos em conjunto com a personalidade do arguido, em função das exigências gerais de culpa e de prevenção.
Não ocorreu por isso a violação de qualquer preceito legal nem nenhuma nulidade foi cometida.


3.2.3. Erro de julgamento quanto ao direito aplicável por errada dosimetria das penas parcelares e única aplicadas
Por fim o arguido refere serem as penas parcelares aplicadas e a pena conjunta de 8 anos e 6 meses de prisão demasiado gravosas.
Tendo em consideração o referido na decisão recorrida e ao atrás mencionado por esta Relação, designadamente quanto:
- Ao dolo direto (elevado em todos os crimes);
- À ilicitude cujo grau variou - consoante o crime cometido - de diminuto, ao médio e ao elevado;
- À dilação temporal entre as situações (fevereiro de 2019; 9 e 17 de agosto, 10 e 22 de setembro e 1, 15 e 31 de outubro);
- Aos sentimentos manifestados no cometimento dos crimes (indiferença dos bens alheios visando a obtenção de vantagens patrimoniais para aquisição de produto estupefaciente), tendo ainda em consideração que os dois crimes de dano, os dois de burla informática e o de violação de domicílio se encontram todos conexionados com a prática de delitos contra o património;
- Aos antecedentes criminais do arguido (num total de 13 condenações, pela prática de vinte crimes, cometidos nos anos de 1991, 1993, 1994, 1996, 2001, 2005, 2006, 2009, 2010, 2012, 2014, dos quais pelo menos dois com pena de multa, quatro com pena de prisão suspensa na execução (três deles revogada a suspensão), um com pena de prisão substituída por multa e seis com pena de prisão efetiva);
- As condições pessoais do arguido: 9.º ano de escolaridade (completado com 17 anos de idade atenta a crescente atitude de desmotivação com abandono dos estudos), o desempenho irregular de atividades de curta duração na construção civil e restauração, a frequência com sucesso de alguns cursos de formação profissional, a toxicodependência com submissão a vários processos terapêuticos (o último dos quais frequentado durante a liberdade condicional tendo após despedimento retomado o consumo de heroína), encontrar-se em estabelecimento prisional onde manteve comportamento adequado e integrado em programa de substituição por metadona;
- Às exigências muito fortes em relação às necessidades de prevenção geral e especial;
- À escassa relevância das confissões realizadas no âmbito de apenas três dos crimes cometidos (numa delas parcial) num conjunto de treze;
- Ter cometido todos os treze crimes no período de liberdade condicional
- O diminuto valor de alguns dos bens furtados (ou danos provocados) ou obtidos através de burla através da utilização de cartão bancário pertencente a terceiro, etc;

Apreciemos, então, cada uma das penas parcelares e a pena conjunta aplicadas.
Na situação I. o arguido foi condenado em prisão por 8 meses pelo crime de furto simples e em 6 meses pelo de dano. A pena abstrata para estes crimes é de 1 mês a 3 anos de prisão. Tendo por isso as penas parcelares sido fixadas substancialmente abaixo do limite médio (18 meses e 15 dias).
Na situação III. o arguido foi condenado em prisão por 3 meses pelo crime de apropriação ilegítima de coisa achada. A pena abstrata para este crime é de 1 mês a 1 ano de prisão. A pena parcelar foi fixada abaixo do limite médio (6 meses e 15 dias).
Na situação IV. o arguido foi condenado em prisão por 1 ano e 2 meses pelo crime de furto qualificado agravado pela reincidência dentro de uma pena abstrata de prisão de 3 meses a 5 anos, abaixo do limite médio (2 anos 7 meses e 15 dias).
Na situação VI o arguido foi condenado em prisão por 4 anos a 2 meses pelo crime de furto qualificado agravado pela reincidência, quando a pena abstrata era de 2 anos e 8 meses a 8 anos, por isso abaixo do limite médio (5 anos e 3 meses e 28 dias).
Foi o recorrente também condenado em 1 ano e 2 meses pelo crime de coação qualificada dentro de uma moldura penal abstrata de 1 a 5 anos de prisão no segundo, ou seja, muito abaixo do limite médio (3 anos) e muito próximo do limite mínimo.
Na situação VII o arguido foi condenado em 7 meses pelo crime de burla informática, quando a moldura penal abstrata era de 1 mês a 3 anos, por isso também muito abaixo do limite médio (18 meses e 15 dias).
Na Situação VIII o arguido foi condenado em prisão por 4 anos a 3 meses pelo crime de furto qualificado agravado pela reincidência dentro de uma pena abstrata de prisão de 2 anos e 8 meses a 8 anos, por isso abaixo do limite médio (5 anos e 3 meses e 28 dias de prisão).
Situação IX o arguido foi condenado em prisão por 4 anos a 3 meses pelo crime de furto qualificado agravado pela reincidência dentro de uma pena abstrata de prisão de 2 anos e 8 meses a 8 anos, abaixo do limite médio (5 anos e 3 meses e 28 dias).
Foi também o recorrente condenado em 7 meses pelo crime de burla informática numa moldura abstrata de 1 mês a 3 anos, muito abaixo do limite médio (18 meses e 15 dias).
Na Situação XI o arguido foi condenado em prisão por 8 meses pelo crime de violação de domicílio agravado e em 6 meses pelo crime de dano dentro de uma moldura abstrata de 1 mês a 3 anos de prisão. Em ambos os casos muito abaixo do limite médio (18 meses e 15 dias).
O arguido foi, ainda, condenado em prisão por 8 meses pelo crime de furto e por 6 meses pelo crime de dano, dentro de uma moldura abstrata de 1 mês a 3 anos de prisão. Em ambos os casos abaixo do limite médio (18 meses e 15 dias).
Na situação XII O arguido foi, ainda, condenado em prisão por 10 meses pelo crime de furto dentro de uma moldura abstrata de 1 mês a 3 anos de prisão. Também abaixo do limite médio (18 meses e 15 dias).
Verifica-se, assim, que as penas parcelares foram todas fixadas abaixo do limite médio, muitas no ponto intermédio entre o limite mínimo e o médio e algumas mesmo perto do limite mínimo.
Por fim, dentro da moldura abstrata encontrada para o cúmulo (4 anos e 3 meses a 21 anos de prisão) o Tribunal fixou, pelo cometimento dos 13 crimes, no âmbito do caso em apreciação, uma pena única de 8 anos e 6 meses, fixada assim no ponto intermédio entre o limite mínimo e o médio (12 anos e 7 meses e 15 dias)
 Não merece, assim, qualquer censura a pena única encontrada tendo até em consideração que o limite máximo se situava nos 21 anos.
[…]».

15. Ora, olhando para a fundamentação do Acórdão Recorrido que se acaba de transcrever,  diz-se já que, na sua generalidade, responde por antecipação às acusações que o Recorrente lhe dirige, evidenciando que, em contrário do que quer fazer crer, foram tidos em devida conta os factos que do ponto de vista da ilicitude, da culpa, da prevenção e da atinência do conjunto dos factos à sua personalidade justificavam, e reclamavam, nos termos dos art.os 40º, 70º, 71º e 77º do CP, o decretamento de pena única de prisão e na medida dos 8 anos e 6 meses da que vem imposta.
Com efeito, e pouco mais do que repetindo as doutas considerações dos Senhores Desembargadores:

16. Nos termos do art.º 77º n.º 1 do CP, «[q]uando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».
Já o n.º 2 do preceito dispõe que «a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes».
E o n.º 3 estipula que «[s]e as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores».

A medida concreta da pena do concurso é determinada, tal como a das penas singulares, em função da culpa e da prevenção – art.os 40º e 71º do CP –, mas levando em linha de conta um critério específico: a consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente (art.º 77.º, n.º 1, segundo segmento, do CP).
O que significa que à visão atomística inerente à determinação das penas singulares, sucede, nesta, uma visão de conjunto em que se consideram os factos na sua totalidade, como se de um facto global se tratasse, de modo a sopesar a gravidade desse ilícito global enquanto enquadrada na personalidade unitária do agente, «tudo deve[ndo] passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique» [5].
E sendo que nessa «avaliação da personalidade – unitária – do agente» releva «sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma "carreira") criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade», que só primeira, que não a segunda, tem «um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta» [6].
E nela assumindo especial importância «a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)» [7], em que são de considerar «múltiplos factores entre os quais: a amplitude temporal da atividade criminosa; a diversidade dos tipos legais praticados; a gravidade dos ilícitos cometidos; a intensidade da atuação criminosa; o número de vítimas; o grau de adesão ao crime como modo de vida; as motivações do agente; as expetativas quanto ao futuro comportamento do mesmo» [8].

Servindo, como já dito, as finalidades exclusivamente preventivas da protecção de bens jurídicos – prevenção geral positiva ou de integração – e da reintegração do agente na sociedade – prevenção especial positiva ou de socialização –, devem elas «coexistir e combinar-se da melhor forma e até ao limite possível» na pena única, «porque umas e outras se encontram no propósito comum de prevenir a prática de crimes futuros» [9].
Finalidades – e também culpa – que, tendo intervindo, já, na determinação da medida das penas parcelares, operam aqui por referência ao «conjunto dos factos e à apreciação geral da personalidade», o que «não se confunde com a ponderação das circunstâncias efetuada relativamente a cada crime, que é necessariamente parcelar» e não envolve, por isso, violação do princípio da dupla valoração [10].

E pena única que, também ela, deve respeitar os princípios da proporcionalidade, necessidade, adequação e proibição de excesso decorrentes do art.º 18º da CRP.
 
17. Presentes os critérios e finalidades que se acabam de recordar e conferindo, então, a necessidade, adequação e proporcionalidade da pena única de 8 anos e 6 meses de prisão, tem-se, em primeiro lugar, que, intermediando, como afirmado, entre os crimes por que o Recorrente foi parcelarmente condenado a relação de concurso prevista no art.º 77º n.º 1 do CP se justifica, de facto, a cumulação jurídica das correspondentes penas e havendo a pena única de ser de prisão, por serem dessa natureza todas as penas em presença – art.os 77º n.º 3, a contrario sensu, do CP –, e encontrada – art.º 77º n.º 2 do CP – no intervalo de 4 anos e 3 meses – a mais elevada das parcelares – a 21 anos – a soma material de todas as pena em presença.

Depois, e olhando para a gravidade do ilícito global, não se pode deixar de concluir ser bem relevante:
─ Os crimes, em número de treze, são, na sua grande maioria contra a propriedade – furtos, simples e qualificado; danos; apropriação ilícita de coisa achada –, mas a que se juntam crimes contra o património – burla informática –, contra a liberdade pessoal – coacção – e contra a reserva da vida privada – violação de domicílio –, com ofensa, assim, de múltiplos, e diversificados bens jurídicos.
─ Os ofendidos são no número, significativo, de treze.
─ A prática dos crimes protraiu-se pelo período de tempo, já de significado, de cerca de seis meses.
─ O grau de violação dos bens jurídicos não é minimamente desprezível em qualquer um dos casos, sendo que quatro dos crimes de furto, o de coacção e o de violação de domicílio, são agravados.

Depois, ainda, a culpa do Recorrente, lato sensu, é elevada, denotando a imagem global dos factos firme e prolongada intenção de delinquir.
E sem esquecer que todos os crimes foram cometidos estando o Recorrente em liberdade condicional, após um longo período de reclusão ente 15.2.2010 e 5.4.2018, e que, com referência aos quatro crimes de furto qualificado, foi condenado como reincidente.

Na sua relação com a personalidade unitária do Recorrente, o conjunto dos factos revela propensão criminosa para a prática crimes contra a propriedade.
Na linha, aliás, do que vem sendo a sua atitude desde o já longínquo ano de 1991, em que cometeu o primeiro crime de que há registo – um crime de roubo – e a que se seguiram doze outras infracções, umas, por crimes da mesma natureza ou afim – furtos, simples e qualificados; roubos; extorsão –, outras, por ilícitos tão diversos como os de tráfico de estupefacientes, de condução sem habilitação legal e de ofensa à integridade física simples.
O que, tudo, revela uma personalidade profundamente refractária ao dever-ser jurídico penal, que das penas aplicadas até ao momento nenhuma – desde penas de multa a penas de substituição da prisão, passando por (longas) penas de prisão efectivamente cumpridas – foi capaz de fazer inflectir.

18. O quadro que se desenha é, pois, de culpa acentuada – a suscitar forte censurabilidade da conduta –, de ilicitude significativa – a exigir decidida reafirmação por via das penas dos valores penais infringidos – e de resistência do Recorrente ao dever-ser jurídico-penal e de necessidade de contramotivação criminógena – a reclamar pena única que efectivamente o reaproxime do respeito daqueles valores.
O que, numa moldura abstracta de 4 anos e 2 meses de prisão a 21 anos, bem justifica a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão que o Acórdão Recorrido confirmou.
E pena esta que – diga-se – já tem na devida a atenção os ténues e, por ora, incertos, sinais de que o Requerente terá já iniciado algum do caminho de reconformação da sua personalidade e conduta aos valores do direito que o seu bom comportamento em meio prisional, a frequência de programa terapêutico da problemática aditiva e a confissão – ainda assim, muito limitada – pode indiciar que, de outro modo, bem seria de esperar sanção (bem) mais gravosa que os 8 anos e 6 meses não se aproximam,  sequer, dos 12 anos e 7 meses do ponto médio da moldura abstracta.

19. Pena aquela que, assim e sem necessidade de mais alargadas considerações aqui se mantém, em tudo improcedendo o recurso.

III. Decisão.
20. Termos em que, decidindo, acordam os juízes desta 5ª Secção em:
─  Julgar improcedente o recurso, mantendo o Acórdão Recorrido na íntegra e, designadamente, a condenação do Recorrente na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.
─ Condenar o Recorrente em taxa de justiça, que se fixa em 6 UC's.

*

Digitado e revisto pelo relator (art.º 94º n.º 2 do CPP).

 *

Supremo Tribunal de Justiça, em 11.11.2021.


Eduardo Almeida Loureiro (Relator)

António Gama


____________________________________________________


[1] Transcrição parcial do dispositivo.
[2] Diploma a que pertencerão os preceitos que se vierem a citar sem menção de origem.
[3] Cfr. Ac. do Plenário das Secções do STJ, de 19.10.1995, in D.R. I-A , de 28.12.1995.
[4] Sublinhado acrescentado.
[5] Figueiredo Dias, "Consequências Jurídicas do Crime", 1993, p. 291 e 292.
[6] Idem, ibidem, nota anterior.
[7] Idem, ibidem, notas anteriores.
[8] AcSTJ de 9.10.2019 - Proc. n.º 600/18.2JAPRT.P1.S1, in SASTJ.
[9] Figueiredo Dias, "Temas Básicos de Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 105 e ss.
[10] AcSTJ de 16.5.2019 - Proc. n.º 790/10.2JAPRT.S1, in www.dgsi.pt.