Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04S1002
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MARIA LAURA LEONARDO
Descritores: PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RESCISÃO DE CONTRATO
INTERPRETAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO
ERRO
SIMULAÇÃO
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: SJ200410070010024
Data do Acordão: 10/07/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 1988/02
Data: 10/01/2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA.
Sumário : 1 - Tendo em vista o correcto enquadramento jurídico do pleito, o STJ goza, nos termos do artº 729º-3 do CPC, de poderes próprios para sindicar a coerência lógico-jurídica e a suficiência da decisão sobre matéria de facto em termos praticamente análogos aos que o nº 4 do artº 712º confere à Relação.
2 - Em sede de matéria de facto não se pode ler a expressão continuaram a trabalhar, com um sentido jurídico, se o tema a decidir é justamente a natureza jurídica das relações entre as autoras e a ré.
3 - Constitui questão de direito saber se a matéria de facto apurada pelas instâncias foi devidamente interpretada e conduziu à correcta qualificação do contrato.
4 - O que verdadeiramente caracteriza a prestação de trabalho e a prestação de serviço é o modo como se desenrola a actividade do devedor – em regime de submissão à autoridade e direcção do credor ou em regime de autonomia.
5 - Formalizar um negócio não é apenas aludir a um certo tipo de contrato mas descrever claramente por escrito o seu objecto e as sua condições.
6 - Se os termos do contrato (escrito) não espelham de forma inequívoca o pretendido pelas partes, impõe-se lançar mão de outros elementos (finalidade do negócio, interesses em jogo ...) e, sobretudo, atender à posição assumida por aquelas na respectiva execução.
7 - Se as autoras rescindiram os contratos, convictas de que os mesmos podiam ser livremente denunciados pela 1ª ré e que essa rescisão bem como a celebração de novos contratos com a 2ª ré constituíam a única via para manterem o emprego, isto significa que, tanto num caso (rescisão do contrato) como no outro (celebração de novo contrato com a 2ª ré ), actuaram em erro.
8 - Se foi o receio da verificação daquele mal (perda de emprego) que as determinou a emitirem tais declarações, existe coacção moral.
9 - Há dolo se o erro foi determinado por sugestão das declaratárias.
10. Para que haja simulação é necessário que haja divergência intencional entre a vontade e a declaração.
10. Embora a Relação não esteja impedida de extrair presunções judiciais a partir da matéria dada como provada, não o poderá fazer se o facto (desconhecido) inferido ou deduzido tiver sido levado à base instrutória e não tiver sido dado como provado pelo julgador.
11 - Se as rescisões contratuais foram induzidas pela 1ª ré com o fim de obter por via indirecta o fim do contrato de trabalho, é na vontade e iniciativa desta que radica, verdadeiramente, tal cessação.
12- Nesta medida, deve tal situação ser equiparada à de um despedimento ilícito, para efeitos de aplicação do citado artº 13º (quanto mais não seja, por interpretação extensiva do preceito).
13 - Estando as autoras desligadas de facto do seu emprego, embora juridicamente se mantenha o vínculo contratual, só a “reintegração” permitirá a reactivação efectiva desta relação.
14. Tratando-se duma obrigação de facere, que só pode ser cumprida pela própria ré (obrigação de prestação de facto infungível), justifica-se a aplicação da medida coercitiva prevista no nº 1 do artº 829º-A do CC.
15 –Sendo a ré uma grande empresa, bem implantada no mercado e com uma boa situação económica, e grande o interesse das autoras em ser reintegradas, mostra-se equitativamente fixado o montante diário de € 100, por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegração relativamente a cada uma das autoras.
16 - Litiga de má fé a ré que alega, mas não demonstra, uma versão que é contraditória da das autoras, provando-se, em contrapartida, esta que inclui factos que a ré, pessoalmente, conhecia.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1 - A e B, na acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, que instauraram contra "C - Central de Cervejas, S.A." e "D, Merchandising de Portugal, Lda.", pedem o seguinte:
a) Que os contratos que celebraram com a C sejam considerados como de trabalho subordinado e não de prestação de serviços;
b) Que esses contratos de trabalho sejam considerados sem termo, por não revestirem a forma nem a motivação dos contratos a termo;
c) Que sejam declaradas nulas as cláusulas desses contratos que permitem a sua rescisão sem prévio processo disciplinar nem justa causa, não só por contrariarem normas imperativas, mas também porque foram assinados pelas autoras por erro essencial quanto aos pressupostos legais e aos efeitos do contrato, erro esse induzido pela C quanto aos pressupostos legais e aos efeitos do contrato, mediante fraude e coacção;
d) Que seja considerada destituída de justa causa e ilícita a comunicação da C feita às autoras na reunião de 16.12.96, anunciando-lhes a intenção de pôr termo aos seus contratos com efeitos reportados a 31.12.96, com as legais consequências;
e) Subsidiariamente e caso se entenda que não houve despedimento por banda da C, mas antes rescisão dos contratos por banda das autoras, deve a declaração rescisória ser julgada nula e de nenhum efeito, pois também foi extorquida às autoras pela C mediante erro, fraude e coacção;
f) Consequentemente seja considerado que a relação laboral entre as autoras e a C prossegue para além de 31.12.96, tal como se as referidas declarações nunca tivessem sido assinadas;
g) Que a C seja condenada a restituir às autoras o seu posto de trabalho e local de trabalho, na efectividade e plenitude das funções correspondentes à sua categoria profissional, ou, em alternativa, a pagar-lhes a legal indemnização por antiguidade, correspondente a um mês de retribuição completa por cada ano ou fracção do tempo de serviço e que, à data da p.i., perfaz seis meses a cada autora, tomando por base a mais alta retribuição ilíquida que for;
h) Que os contratos entre as autoras e a D sejam anulados por simularem a interposição fictícia da 2ª ré – declarando o Tribunal que esta é uma mera "testa de ferro" da 1ª ré – pelo que a relação jurídica, a considerar-se que existe como "nova" a partir de 01.01.97, será sempre entre a C e as autoras;
i) Que a qualificação de tais contratos como de prestação de serviços seja alterada pelo tribunal, por representar um expediente ilícito e usurário destinado a tornear e defraudar a lei do contrato de trabalho e a permitir o despedimento das autoras sem justa causa nem indemnização e que, consequentemente, a relação subjacente a tais contratos seja também qualificada de trabalho subordinado e não de prestação de serviço;
j) Que seja declarado nulo o contrato celebrado entre a C e a D, quer por simular uma prestação de serviços inexistente, quer por ser uma peça na engrenagem fraudatória mais vasta arquitectada entre as duas rés para prejudicar as autoras e o Estado, quer por ilicitude do objecto, quer por usura;
l) Que, em qualquer caso, sejam considerados injustificados e usurários os honorários que a D auferiu da C a título da suposta "cedência" a esta das autoras e que, em consequência, seja a ré D condenada a entregar às autoras o montante líquido que esta ré recebeu da C na parte correspondente ao tempo de trabalho das autoras – a liquidar em execução de sentença; ou, subsidiariamente, o contrato entre a C e a D seja julgado ilícito por implicar a cedência temporária de pessoal em violação ou fraude à lei que disciplina tais cedências e que, neste caso, as autoras sejam autorizadas a optar pela C, opção que aquelas, desde já, declaram pretender;
m) Que, em qualquer caso, seja julgada ilícita a interrupção do pagamento das retribuições devidas às autoras, a partir de Junho relativamente à 1ª autora e a partir de Outubro em relação à 2ª autora;
n) Que seja igualmente julgada ilícita e culposa a interrupção das funções atribuídas às autoras, a partir das mesmas datas;
o) Que a ré que venha a ser considerada como a actual titular da relação laboral com as autoras seja condenada a reconduzi-las à efectividade e integralidade das suas funções, sem perda de quaisquer direitos ou regalias;
p) Que, em qualquer dos casos, as rés sejam condenadas a pagar às autoras todas as quantias em dívida, nomeadamente as dos intervalos para almoço, os subsídios de almoço e de transportes posteriores a 1996, o trabalho extraordinário, as folgas, o descanso compensatório, as férias anuais, a indemnização pelas férias não gozadas, os subsídios de férias e de Natal, as retribuições e as diferenças salariais vencidas, as prestações vincendas até à sentença final, acrescidas das que se vencerem posteriormente à sentença até efectiva reintegração e/ou pagamento, a liquidar em execução de sentença;
q) Que seja levado em conta, para cálculo e actualização das vincendas, as percentagens dos maiores aumentos salariais entretanto praticados com as suas promotoras repositoras, com todas as regalias incluídas;
r) Que as rés sejam condenadas, solidariamente, a indemnizar as autoras relativamente a todas as despesas com a lide, designadamente com técnicos, peritos, testemunhas, solicitadoria, mandatários judiciais e deslocações, a liquidar em execução de sentença;
s) E a pagar juros de mora, contados desde a data do vencimento das prestações até efectivo pagamento, tratando-se de prestações periódicas ou com vencimento certo, e desde a data da citação quanto às prestações que se liquidarem no decurso da acção;
t) Que tais juros sejam sujeitos a capitalização, decorrido que seja um ano sobre o seu vencimento (art° 560º-1 do C. Civil);
u) Que os pagamentos em que as rés forem condenadas sejam feitos por depósito bancário na conta à ordem das autoras e, quando parciais, sejam feitos sucessivamente por conta das despesas, das indemnizações, dos juros e só depois do capital, pela indicada ordem (art.º 785°-1-2 do C. Civil);
v) Que as rés sejam condenadas a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, caso não cumpram pontual e integralmente a sentença, uma quantia em dinheiro por cada dia de incumprimento, ou de cumprimento defeituoso ou incompleto, a fixar pelo tribunal, não inferior a 50.000$00 por dia e por cada autora (art° 820°-A do C. Civil);
x) Que o tribunal fixe um prazo máximo de 30 dias para as rés condenadas praticarem os actos materiais positivos e negativos, integradores do cumprimento, sendo os pagamentos efectuados segundo a ordem referida supra, e que tal prazo seja contado a partir da notificação da sentença, salvo se as rés vierem a recorrer dela com efeito suspensivo, caso em que o prazo se contará a partir do trânsito em julgado;
z) Que as rés sejam condenadas a inscrever as autoras na Segurança Social e a efectuar todos os descontos para esse efeito, quer os vencidos, quer os vincendos, bem como a pagar os impostos em falta e a reter os vincendos, suportando as rés os respectivos juros de mora e multas fiscais caso venham a ser exigidos por quem de direito;
aa) E também a indemnizar as autoras pelos subsídios de desemprego de que foram ilegalmente privadas pelo facto de as rés não as terem inscrito na Previdência e por aqueles subsídios de que as autoras venham a ser privadas no futuro, estes a liquidar em execução de sentença;
bb) E ainda a indemnizar as autoras pelas despesas de saúde que tenham suportado ou venham a suportar (nomeadamente com médicos, medicamentos ou meios auxiliares de diagnóstico), tanto na parte em que essas despesas seriam normalmente custeadas pela Previdência, quer na parte comparticipada pela(s) ré(s), tal como aconteceria se a(s) ré(s) tivesse(m) inscrito as autoras na Segurança Social, a liquidar em sede de execução de sentença.

As RR. contestaram, defendendo-se por excepção e por impugnação.
A ré C invocou a nulidade da citação, a excepção de incompetência material do tribunal e o facto de as AA terem continuado a auferir remunerações após as datas indicadas no nº 307 da petição inicial.
A ré D invocou a ineptidão da p.i. por ininteligibilidade dos pedidos e contradição entre pedidos e causa de pedir, a incompetência absoluta do tribunal, a ilegitimidade da coligação das rés e a sua própria ilegitimidade para a causa.
A final, ambas concluíram pela total improcedência da acção.
No despacho saneador as excepções suscitadas pelas partes foram conhecidas e declaradas improcedentes.
Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, absolveu a ré "D, Merchandising de Portugal, Ld.ª" de todos os pedidos contra si formulados.
Quanto à ré C, decidiu que entre esta e as AA. A e B foi celebrado, respectivamente, em 16 de Abril de 1993 e 29 de Junho de 1993, um contrato de trabalho sem termo e que a declaração emitida por estas, revogando esses contratos de trabalho, é anulável, por erro, mantendo-se os mesmos em vigor e produzindo todos os efeitos.
Consequentemente, condenou a ré C:
- na obrigação de dar trabalho às autoras, restituindo-lhe o seu posto e local de trabalho, na efectividade e plenitude das funções correspondentes à sua categoria profissional (promotoras);
- no pagamento de todas as prestações vencidas desde 01.01.97 até reintegração das autoras, em montante a apurar em sede de liquidação de sentença, correspondente aos valores que as mesmas aufeririam se estivessem ao serviço da ré C, incluindo subsídio de férias e de Natal, sendo estes também devidos desde o início dos contratos das autoras até 31.12.96, a que acrescem juros de mora legais desde a data do seu vencimento até efectivo pagamento;
- em caso de a ré C não proceder à reintegração das autoras, no pagamento de Esc. 50.000$00, por cada dia de atraso no cumprimento pontual dessa obrigação, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada autora;
- na obrigação de regularização da situação das autoras junto da Segurança Social, suportando todos os custos daí inerentes.

Inconformada, a ré C interpôs recurso de apelação da referida sentença.
As AA também não se conformaram com a sentença, na parte que lhes foi desfavorável, tendo igualmente interposto recurso de apelação.

A Relação de Lisboa julgou parcialmente procedentes ambas as apelações, decidindo:
1. Reconhecer que as autoras A e B estão vinculadas à ré C, respectivamente, desde 16 de Abril de 1993 e de 29 de Junho de 1993, por contratos individuais de trabalho, contratos esses que se mantêm em vigor;
2. Declarar nula a cláusula quarta dos contratos juntos a fls. 113 a 116 dos autos, celebrados pela 1ª autora e pela ré C, em 16.04.93, e pela 2ª autora e pela ré C, em 29.06.93, por contrariar normas legais imperativas;
3. Declarar nulo o contrato de prestação de serviços celebrado por ambas as RR. em 2.01.97, por simular uma prestação de serviços inexistente;
4. Anular a declaração emitida por cada uma das autoras a revogar o seu contrato de trabalho, com efeitos a partir de 31.12.96, por ter sido determinada por dolo e por coacção;
5. Condenar a ré C a pagar a cada uma das autoras as retribuições de férias a que têm direito, desde a data da sua admissão até à data da interrupção de funções, bem como o subsídio de transporte relativo ao período compreendido entre 1.01.97 e a data da interrupção de funções, relegando-se a liquidação de ambos os créditos para execução de sentença;
6. Condenar a ré C no pagamento de 100 euros por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação e por cada autora, a título de sanção pecuniária compulsória, sanção esta que começará a produzir efeitos a partir do trânsito em julgado da decisão que, em definitivo, fixe a referida obrigação;
7. Revogar a parte da sentença recorrida que condenou a 1ª ré no pagamento de juros de mora desde a data do vencimento de cada prestação remuneratória até efectivo pagamento e reportar os juros de mora à data do trânsito da decisão, que, em sede de execução de sentença, fixe os valores que são efectivamente devidos a cada uma das autoras;
8. Condenar a 1ª e 2ª rés, respectivamente, nas multas de 20 e 10 UC, por litigância de má fé;
9. Condenar solidariamente ambas as rés a indemnizar as autoras relativamente a todas as despesas da lide, designadamente com técnicos, peritos e mandatários judiciais, indemnização essa que, por não existirem no processo os elementos necessários para o efeito, deve, após o trânsito do acórdão, ser fixada pelo Mmo juiz a quo com observância e em conformidade com o disposto no artº 457°- 2 do CPC;
10. Absolver a ré C dos pedidos formulados (na p.i.) sob os n.°s 21 (actualização salarial), 24 e 25 (capitalização dos juros e ordem dos pagamentos);
11. Manter, em relação aos demais pontos, a sentença recorrida.

Ambas as RR interpuseram recurso deste acórdão. Porém, um deles – o interposto pela Ré "D-Merchandising Portugal Lda" – foi julgado deserto por falta de alegações.

São estas as conclusões da revista interposta pela ré C:
1ª) - Há contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do objecto da lide, nomeadamente entre: (a) o facto de 101 versus 181, 187, 189, 111, 122, 123 e 125; (b) o facto 186 v. 102, 103 e 104 a 110; c) o facto 111 v. 187 e 189; (d) 124, 187 e 209;
2ª) - Há também necessidade, para uma correcta e bem fundada decisão de direito, não só ampliar e completar a matéria constante dos pontos nºs 121 e 122 da base instrutória, que obtiveram, como resposta, os factos que se encontram, adiante, em III, sob os nºs 128 e 129, como dar também como assente a matéria factual correspondente aos nºs 27 e 31 da contestação da ora recorrente e apurar se as autoras foram despedidas, por quem e em que termos, ou se abandonaram o trabalho ou se rescindiram unilateralmente os respectivos contratos;
3ª) – O que tudo deverá ser feito nos termos e ao abrigo do disposto nos artºs 729º-3 e 730º do CPC, revogando-se, nessa parte, a decisão recorrida, que desatendeu as correspondentes pretensões da R., desaplicando, como devia, o artº 712º do mesmo Código;
4ª) - Deve ser revogado o acórdão recorrido e a acção julgada totalmente improcedente por não provada, uma vez que as autoras A e B estiveram vinculadas à recorrente, respectivamente, desde 16.04.93 e de 29.06.93, por um contrato de prestação de serviços, ao qual puseram termo, de forma eficaz, através das declarações emitidas por cada uma delas, com efeitos a partir de 31.12.96, já que os factos provados não permitem estabelecer, nem através do método do tipológico, nem do método indiciário interno e/ou externo, a titulação de um contrato de trabalho subordinado, cujo ónus da prova recaía sobre as autoras;
5ª) - As autoras não lograram demonstrar (artº 342º-1 do Cód. Civil) que a actividade por elas desenvolvida em benefício da ré, o era num quadro de subordinação jurídica, numa clara posição de domínio desta em relação a elas, antes tendo ficado demonstrado existir um relacionamento paritário entre ambas as contraentes, desacompanhado de tutela disciplinar, o que afasta irrefragavelmente a qualificação como trabalho subordinado (artºs 1152º do Cód. Civil e 1º da LCT);
6ª) - As autoras eram livres para aceitar, ou não, de acordo com os seus interesses e disponibilidades pessoais de momento, a realização de cada acção promocional concreta que lhes era proposta, com uma duração diária ou semanal que era ajustada caso a caso entre as partes, sem garantias de continuidade, de tal modo que terminada uma dada acção promocional as autoras desconheciam se, e quando, lhes era solicitada nova intervenção, que podiam sempre recusar, sem justificação nem sanção;
7ª) - O local onde se desenrolava e a respectiva duração, quer diária quer em número de dias, integravam o objecto essencial da própria prestação contratada - o serviço de promoção -, ou seja, a área meramente obrigacional do ajuste, gerador, como contrapartida, dos deveres de remunerar e de fornecer meios necessários ao desempenho da actividade contratada (als. a) e b) do artº 1167º do Cód. Civil) e do direito à obtenção de informações quanto aos resultados obtidos e de transmitir instruções relativas à prática dos correspondentes actos (als. a), b) e c) do artº 1161º do Cód. Civil);
8ª) - Tanto na fase preparatória do negócio jurídico celebrado, como na sua redução à forma escrita, o que as partes quiseram foi convencionar uma prestação de serviços e ao longo da sua execução mantiveram inalterado esse propósito e agiram em conformidade, vontade essa exteriorizada através dos regimes fiscal, de segurança social e seguro adoptados, sem que as autoras hajam requerido a respectiva declaração de nulidade e/ou de anulabilidade, com fundamento em vício específico, nem requerido a sua conversão e/ou aduzido factos capazes de atingir esse efeito, subsistindo, pois, o negócio, tal como foi querido, convencionado e executado pelas partes;
9ª) - As autoras não alegaram, nem os autos contêm, factos bastantes que permitam converter o negócio celebrado entre as partes num negócio distinto, nem o acórdão procedeu a essa conversão (artº 293º do Cód. Civil), antes se limitou a impor-lhes um tipo negocial que elas consciente e deliberadamente rejeitaram;
10ª) - Suposta a existência de um contrato de trabalho subordinado entre as autoras e a 1ª ré, aquelas puseram-lhe termo, unilateralmente, por escrito e com efeitos reportados a 31.12.96, por forma válida e eficaz, uma vez que não concorrem, in casu, os pressupostos dos quais os artºs. 253º-1, 255º e 256º do Cód. Civil fazem depender a verificação do dolo e/ou da coacção moral, preceitos esses que o acórdão recorrido violou ao decidir pela invalidade daquelas declarações rescisórias;
11ª) - A razão determinante que induziu as autoras a rescindirem o contrato com a ré foi, por um lado, o facto de terem sido informadas de que a 1ª ré, por opção de gestão não negociável, deixava de ter promotoras por ela contratadas e, por outro, que a 2ª. ré as contrataria, de imediato, para o exercício da mesma actividade, o que efectivamente aconteceu, tanto num como noutro aspecto;
12ª) - Mesmo a serem anuladas as declarações rescisórias emitidas pelas autoras, com a data de 31.12.96, então tudo se passava como se a ré, nesta data, as tivesse despedido ilicitamente, com as consequências fixadas no artº 13º da LDCT, o mesmo é dizer que a ilicitude daquele despedimento não contende com a validade e a eficácia do novo contrato celebrado pelas autoras com a 2ª ré, datado de 01.01.97, entidade jurídica esta totalmente distinta da ora recorrente;
13ª) - Não há qualquer divergência entre as declarações constantes do contrato de prestação de serviços celebrado entre ambas as rés, em 2.01.97, documentado de fls. 176 a 180, e a vontade das partes, cujo clausulado ambas, desde então até ao presente, têm cumprido e observado, em conformidade com as declarações dele constantes, e foi em ordem à execução desse contrato, que é um contrato real e sério - não simulado -, que a 2ª ré procedeu à contratação, por si e no seu interesse, das autoras, com efeitos a partir de 1.01.97, devendo, em decorrência, também nessa parte, ser revogado o acórdão recorrido;
14º) - A ter existido contrato de trabalho entre as autoras e a 1ª ré e a ter subsistido para além de 1.01.97, aquelas puseram-lhe termo, unilateralmente, na data em que ingressaram ao serviço de entidades terceiras, facto que ocorreu, pelo menos, em Maio de 1997, em relação à autora B, e em Novembro desse ano em relação à Autora. A, extinguindo-se, naquelas datas, os contratos com a 1ª ré ou, no mínimo, deve ser declarado o direito da ré a proceder às deduções fixadas no nº 2 do artº 13º da LCCT;
15ª) - Seja qual for o desfecho da lide e mesmo em caso de condenação na reintegração das autoras, não há lugar à condenação da ré em sanção pecuniária compulsória, ou, pelo menos, deve ser reduzida a € 100,00 (?);
16ª) - Deve, finalmente, o acórdão recorrido ser integralmente revogado na parte em que condenou a recorrente em multa e em indemnização a favor das autoras como litigante de má-fé, porquanto não agiu, ao longo de todo o processo, nem com negligência grave, nem de forma dolosa, mas na estrita defesa, leal e proba, do que entende ser o seu direito.

Não houve contra-alegações.
No seu parecer, o Exmº Magistrado do MP pronuncia-se no sentido de ser negada a revista.
Na resposta, a ré limita-se a reiterar in totum a argumentação expendida nas suas alegações.

II – Questões
Fundamentalmente importa resolver o seguinte:
A - Se o acórdão recorrido enferma de nulidade (invocada no requerimento de interposição de recurso);
B - Se procede a impugnação da matéria de facto (se a mesma padece de contradição e deve ser ampliada);
C – Se os contratos celebrados entre as autoras e a ré estão incorrectamente qualificados;
D - Se são válidas as declarações rescisórias das autoras e os contratos, posteriormente, celebrados com a 2ª ré;
E – Em caso negativo, se há lugar às deduções previstas no nº 2 do artº 13º da LCCT;
F - Se inexiste fundamento para aplicação da sanção pecuniária compulsória;
G – Se se verificam, ou não, os pressupostos da litigância de má fé.

III - Factos
1. A "C" opera no ramo de bebidas, tendo por objecto, nomeadamente, a produção e comercialização de malte, cerveja, refrigerantes e águas (FA).
2. Nos contratos celebrados com as autoras estas eram consideradas como prestadoras de serviços de promoção e vendas, junto de clientes da empresa (FA).
3. As autoras usavam fardas que eram custeadas e fornecidas pela 1ª ré (FA).
4. Era a C que pagava a limpeza a seco das fardas, contra factura ou recibo (FA).
5. A ré fazia entregar às autoras os cartões e os crachats de identificação; as credenciais, as fardas, os bordados publicitários a aplicar pelas AA., as camisolas com as 16 marcas estampadas, os materiais de trabalho (nomeadamente, um pano, um x-acto, um tubo de cola), os impressos para os relatórios e para a folha de ponto, as brochuras explicativas dos produtos (FA).
6. A autora A passou à C diversos recibos em papel timbrado, como empresária em nome individual ... (FA)
7. ... o mesmo fez a B (FA).
8. A 1ª ré nunca efectuou nem reteve descontos para a Segurança Social (FA).
9. Em Dezembro de 1996, a C convocou todas as promotoras da área da grande Lisboa, para uma reunião nas suas instalações, a qual se realizou em 16.12.96; nessa reunião estiveram presentes as Chefes de Equipa, nomeadamente as Srªs E, F e G e, ainda, H e o Director da C, Eng.° I e ainda as autoras (FA).
10. A IGT entendia que as situações dos repositores ditos a "recibo verde" que escondessem uma subordinação jurídico-laboral deviam ser regularizadas (FA).
11. O pagamento dos serviços prestados pelas autoras à 2ª ré tinha lugar mediante a contra-entrega de recibos por elas apresentadas (FA).
12. A 1ª ré foi constituída sob a forma de sociedade anónima, em Junho de 1934; foi nacionalizada pelo DL nº 474/75, de 30/8; foi transformada em empresa pública pelo DL nº 531/77, de 30/12 (ratificado, com emendas pela Lei 6/78, de 22/2); passou a sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, através do DL nº 300/90, e foi objecto de privatização no último trimestre de 1990, ao abrigo da Resolução do Conselho de Ministros nº 39/90, de 28/9... (FA)
13. No conjunto das empresas cervejeiras existentes no território nacional do Continente em 1974 - Sociedade Central de Cervejas, SARL; CUFP - Companhia União Fabril Portuense, SARL; Cergal - Cervejas de Portugal, SARL; COPEJA - Companhia Portuguesa de Cervejas, SARL; Imperial - União Cervejeira de Portugal, SARL -, a ré detinha directamente uma quota de mercado ligeiramente superior a 80% (FA).
14. Com a reorganização do mencionado sector industrial, todo ele nacionalizado pelo DL nº 474/75, o mercado nacional, após o início de vigência do DL nº 531/77, ficou repartido entre duas empresas, a saber: a ora ré, que integrou a antiga Sociedade Central de Cervejas e a Cergal, e, por outro, a Unicer, que integrou as anteriores CUFP, COPEJA e IMPERIAL (FA).
15. A 1ª ré admite que, com data de Abril de 1993, a 1ª autora subscreveu o acordo denominado “contrato de prestação de serviços"... (FA)
16. ...E que, com data de 29 de Junho de 1993, a 2ª autora subscreveu um acordo denominado “contrato de prestação de serviço"... (FA)
17. ... E que os referidos serviços deviam ser prestados pelas autoras como promotoras de vendas, “em estabelecimentos comerciais de venda ao público de produtos da empresa” ré, mediante o pagamento de "uma importância diária no valor de 4.000$00, correspondente a um mínimo de 9 horas/dia”, a qual liquidaria, em termos de retribuição, o valor dos serviços prestados ... (FA)
18. ... E que os contratos em apreço foram estabelecidos por prazo indeterminado, com início de vigência em data certa, coincidente com a da sua redução a escrito, e deles ficou a constar que podiam "ser livremente denunciados por qualquer das partes mediante a comunicação por escrito à contraparte, com a antecedência mínima de 30 dias, sobre a data pretendida para a sua cessação"... (FA)
19. ... E que ficou estipulado que "o cumprimento das obrigações respeitantes ao regime da Segurança Social que decorram da actividade de prestação de serviços a que se refere o presente contrato, é da exclusiva responsabilidade do segundo outorgante", as ora autoras ... (FA)
20. ... E que, em 1993, tanto a 1ª autora como a 2ª autora preencheram um formulário, então em uso na ré, identificado como "Pedido de Admissão", no qual não mencionaram quais as funções que pretendiam desempenhar no âmbito da organização empresarial da ré (FA).
21. ... E que em, respectivamente, 6 de Abril de 1993 e 22 de Junho desse mesmo ano, as autoras A e B foram entrevistadas pelos serviços da ré em ordem a avaliar se reuniam, ou não, os requisitos indispensáveis à prestação do serviço de promoção de vendas dos produtos fabricados ou comercializados pela ré junto das "Grandes Superfícies" (FA).
22. A 1ª ré proporcionou às autoras, formação adequada ao desempenho profissional da "promoção de vendas" - que elas terminaram com aproveitamento - e suportou os inerentes custos (FA).
23. A ré não se alheava dos resultados produzidos por qualquer acção de promoção e fazia o correspondente acompanhamento através do seu serviço de promoções, quer para prestar colaboração às promotoras, se necessária e lhe fosse solicitada, quer para suprir eventuais deficiências ou melhorar, os resultados da acção" (FA).
24. A 1ª ré entregou a cada uma das autoras um documento, intitulado "Normas Trabalho Ponto de Venda" (FA).
25. Em 27.04.1993, a autora A subscreveu e apresentou na Repartição de Finanças da área da sua residência uma "Declaração de Inscrição no Registo/Início de Actividade", como trabalhador independente, quer para efeitos de IRS, quer de IVA, na qual indicou como actividade principal a correspondente a "promotora de vendas" (FA):
26. A autora B, em 25.06.1993, subscreveu e apresentou na Repartição de Finanças de Moscavide, declaração idêntica à referida no artigo anterior, na qual indicou como actividade principal a de "prestação de serviços", também como trabalhador independente, com início de actividade em 29.06.1993 (FA).
27. Não obstante os factos referidos nos dois números anteriores, as autoras mantiveram a actividade de promotoras (FA).
28. As autoras, desde o início da vigência do acordo celebrado com a ré, sempre observaram o sistema fiscal e de segurança social próprios do trabalho independente (FA).
29. Os serviços foram pagos contra recibos do Modelo 6, previstos no art° 107° do Código do IRS, e, mais tarde, contra recibos em papel timbrado das autoras (FA).
30. As autoras, passados vários dias sobre a reunião a que alude o n.º 10, subscreveram os documentos de fls. 190 e 191 - desp. de fls. 788 (FA).
31. A 1ª ré, quer antes, quer depois de 31.12.1996, acompanhou sempre as promoções que fez dos seus próprios produtos, através de visitas às lojas onde elas decorreram, seja do Director do "Canal Clientes Chave", seja dos diversos trabalhadores que integram o quadro respectivo “Serviços de Promoções” integrado naquela Direcção (DCCC) – (FA).
32. A 1ª ré emitiu e entregou às autoras credenciais do tipo das que constam dos documentos de fls. 192-195 (FA).
33. As autoras nunca participaram nos órgãos de intervenção na empresa ré, nem directamente, integrando a comissão de trabalhadores ou como delegadas sindicais, nem indirectamente, através da participação nas respectivas eleições (FA).
34. A 1ª ré nunca reconheceu às autoras, nem lhes atribuiu nenhum dos direitos e regalias auferidos por todos os que com ela mantêm uma relação de trabalho subordinado, designadamente, a prática de um sistema de férias pagas, a atribuição do subsídio de Natal, o acesso aos serviços médicos da empresa, consumo gratuito dos produtos por ela fabricados, comparticipação em despesas de saúde e outras similares (FA).
35. As autoras não estão, nem nunca estiveram, inscritas em nenhum dos Sindicatos outorgantes dos instrumentos de regulamentação colectiva aplicáveis à 1ª ré (FA).
36. As autoras, a partir de Março de 1994, encontravam-se inscritas como empresárias em nome individual (FA).
37. A partir de Junho de 1994, colectaram-se como empresárias em nome individual (FA).
38. Em 1995, a comercialização dos produtos da C era assegurada em todo o território nacional por mais de 120 agentes, que tinham a seu cargo a venda e distribuição de todos os produtos da empresa, cobrindo os cerca de 90.000 postos de venda que integravam este mercado (resposta ao ponto nº 1 da BI).
39. A 2ª ré tem por objecto a prestação de serviços de publicidade e promoção de produtos, bem como a comercialização de produtos para fins publicitários, actividades e merchandising (resposta ao ponto nº 2 da BI).
40. A "A" e a "C" assinaram, em 16.04.1993, um contrato escrito para vigorar desde aquela data (resposta ao nº 3 da BI).
41. A "B" e a "C" assinaram, em 29.06.1993, um contrato escrito, para vigorar desde a mencionada data (resposta ao ponto nº 4 da BI).
42. Todos estes contratos foram dactilografados pelos serviços da C, de acordo com minutas pré-existentes na empresa... (resposta ao ponto nº 5 da BI).
43.... Minutas estas semelhantes entre si... (resposta ao ponto nº 6 da BI)
44.... E semelhantes às minutas utilizadas com outras promotoras (resposta ao ponto nº 7 da BI).
45. Os contratos foram dados às autoras já prontos a assinar... (resposta ao ponto nº 8 da BI).
46. ... As autoras limitaram-se a aderir (resposta ao ponto nº 9 da BI).
47. Destes contratos não foi dada qualquer cópia às autoras, ficando a C com o único exemplar disponível (resposta ao ponto nº 12 da BI).
48. As autoras actuavam directamente junto dos potenciais clientes e/ou dos consumidores finais, esclarecendo-os quanto aos preços e realçando as características dos produtos, tendo em vista convencê-los a incrementar as compras ... (resposta ao ponto nº 14 da BI).
49. ... Também colocavam bebidas nas prateleiras e nos locais de venda; procediam à contagem e ao controlo dos stocks; em caso de falta, procediam à sua reposição nas prateleiras (resposta ao ponto nº 15 da BI).
.50. ... Controlavam os preços dos produtos da concorrência (resposta ao ponto nº 16 da BI).
51. O desempenho das autoras era levado a cabo fundamentalmente nos estabelecimentos a que a C fornecia bebidas (resposta ao ponto nº 17 da BI).
52. A autora B actuou nomeadamente nos seguintes estabelecimentos: Jumbo (Alfragide, Alverca, Setúbal, Cascais, Castelo-Branco), Pão de Açúcar (Amoreiras, Almada), Continente (Amadora e Cascais), Modelo (Montijo, Torres Novas, Caldas da Rainha), Macro (Alfragide), Grula (Lumiar, Santarém, Nazaré), Recheio (Torres Vedras, Abóboda), Coopertorres (Torres Vedras, Samora Correia), Pingo Doce (Graça, Olivais, Palmeiras, Póvoa de Santo Adrião, Loures, Odivelas, Alverca, Bobadela, Paivas, Santarém), Intermarché (Tomar, Almeirim), Ibérico (Lumiar), Feira Nova (Lumiar, Barreiro, Santarém), AC Santos (Odivelas, Sacavém, Cartaxo), Manuel Nunes (Cacém), Armazéns da Matinha (Cabo Ruivo) , Simões e Sousa (Sacavém e Vila Franca de Xira), Torrental (Torres Novas) - (resposta ao ponto nº 18 da BI).
53. A autora B nos seguintes estabelecimentos, Jumbo (Alfragide, Alverca, Setúbal, Cascais e Castelo Branco), Pão de Açúcar (Amoreiras, Almada), Continente (Amadora, Cascais, Colombo), Modelo (Caldas da Rainha, Tapada das Mercês), Macro (Alfragide), Grula (Lumiar, Santarém, Nazaré, Coruche), Coopertorres (Torres Vedras, Samora Correia, Coopercadas), Recheio (Abóboda), Intermarché (Cacém), Pingo Doce (Graça, Olivais, Palmeiras, Póvoa de Santo Adrião, Loures, Alverca, Sassoeiros, Rebelva, Algés, Alcântara, Santarém, Caldas da Rainha), Ibérico (Lumiar), Feira Nova (Lumiar, Barreiro), AC Santos (Odivelas, Paço de Arcos), Manuel Nunes (Cacém), Armazéns da Matinha (Massamá, Cabo Ruivo), Torrental (Torres Novas) - (resposta ao ponto nº 19 da BI).
54. Sempre que determinado pela C, as autoras deslocavam-se também às instalações da 1ª ré sitas no Prior Velho e em Belas, Vialonga e Lisboa, ou a outros locais onde a ré considerasse a sua colaboração necessária ... (resposta ao ponto nº 20 da BI).
55. ... Distribuíam bebidas em locais públicos, tal como numa festa equestre em Benavente (11-06-95), na Doca de Belém e no Estádio José Alvalade (durante o jogo de futebol em 1995) - (resposta ao ponto nº 21 da BI).
56. ... E faziam distribuição de folhetos publicitários da Central de Cervejas nas caixas do correio ... (resposta ao ponto nº 22 da BI).
57.... E por vezes também durante jogos de futebol (na data de 23.03.94, em Coimbra, e, em 29.03.94, no Estádio da Luz, em Lisboa) ... (resposta ao ponto nº 23 da BI).
58. ... Chegando mesmo a deslocarem-se ao Algarve, nomeadamente para relançamento da cerveja Cergal (de 12 a 15 de Abril de 1994) - (resposta ao ponto nº 24 da BI).
59. As autoras não têm cópia dos contratos semelhantes feitos com as suas colegas promotoras (resposta ao ponto nº 27 da BI).
60. As autoras estavam obrigadas a cumprir as chamadas "Normas" procedimentais, determinadas pela C "para as promotoras" comunicadas mediante circular escrita distribuída a todas, a saber:
a) As AA. eram contactadas pelas "Chefes de Equipa" entre a terça e a quarta­feira de cada semana para distribuição de trabalho;
b) No final de cada dia de trabalho, as autoras tinham de preencher o "relatório de vendas" e a folha de ponto;
c) E tinham de proceder "à análise dos pontos negativos e positivos da acção" desenvolvida nesse dia;
d) No dia seguinte as autoras tinham que discutir esses "pontos negativos e positivos" com as chefes de equipa;
e) Todas as segundas feiras as autoras tinham que telefonar ou enviar mensagem para os bips das chefes de equipa comunicando-lhes as vendas da semana anterior;
f) As autoras estavam obrigadas a usar fardas;
g) As fardas eram segundo modelo estabelecido pela C;
h) As autoras tinham que velar pela sua apresentação e limpeza pessoal (cabelo, unhas, dentes, etc), bem assim pela limpeza do vestuário;
i) Tinham que cuidar da apresentação do material de trabalho, no que se refere a limpeza do balcão, a limpeza e reposição do topo/linear e da apresentação dos brindes;
j) Tinham que transportar consigo "1 pano, 1 x-acto e 1 tubo de cola" fornecidos pela C para usarem sempre que necessário;
l) Antes do início de cada acção promocional, tinham que efectuar a sua apresentação ao responsável da loja ou ao chefe do sector de bebidas;
m) Tinham que proceder à verificação de todos os produtos Central de Cervejas no linear, limpeza e reposição do mesmo, quer a loja tivesse repositor, quer não;
n) Tinham de efectuar a exposição do local de acção, guardando no final o material usado na promoção;
o) Tinham que efectuar o shopping, ou seja, percorrer as prateleiras contendo produtos da concorrência - como se andassem às compras - para efeitos de verificação dos preços;
p) E se encontrassem preços de concorrência abaixo dos produtos em promoção deveriam informar de imediato as chefes de equipa (resposta ao ponto nº 31 da BI).
61. Quando a C adoptou em Julho de 1994 um novo logotipo e símbolo, as autoras e as restantes promotoras receberam ordens para distribuir uma brochura denominada “Novo Rumo” e um porta-chaves individualmente a cada trabalhador da C (resposta ao ponto nº 32 da BI).
62. E também nos estabelecimentos onde os produtos da ré eram comercializados (resposta ao ponto nº 33 da BI).
63. Eram chefes de equipa da ré que entregavam às autoras todos os elementos necessários ao seu trabalho nomeadamente:
a) Os cartões e os "crachats" de identificação;
b) As credenciais de promotora;
c) As fardas;
d) Os bordados publicitários a aplicar nas fardas;
e) As camisolas com as marcas estampadas;
f) Os materiais de trabalho (nomeadamente, um pano, um x-acto, um tubo de cola);
g) Os impressos para os relatórios e para a folha de ponto;
h) As brochuras explicativas dos produtos (resposta ao ponto nº 35 da BI).
64. O serviço de promoção estava sujeito a um horário previamente estabelecido pela C e acordado entre esta e os pontos de venda (resposta ao ponto nº 36 da BI).
65. O horário em que as autoras realizavam as promoções, normalmente era das 09H00 às 19H00, nos chamados "Cash and Carry", e das 10 horas às 20 horas, no Pingo Doce e nos restantes super e hipermercados (resposta ao ponto nº 37 da BI).
66. Horário esse que era composto de 8 horas de trabalho efectivo e de uma hora de intervalo para almoço (normalmente entre as 13 horas e as 14 horas) - (resposta ao ponto nº 38 da BI).
67. Concluído o tempo gasto no almoço, não era pago pela C como tempo de trabalho (até 31.12.96 foi pago apenas um subsídio de refeição) - (resposta ao ponto nº 39 da BI).
68. Caso as autoras trabalhassem mais horas do que as 8 efectivas, as horas a mais seriam pagas mediante o preço/hora previamente estabelecido pela C (resposta ao ponto nº 40 da BI).
69. Conforme determinação da C em conformidade com o que esta acordava com o ponto de venda, as referidas 8 horas de trabalho efectivo podiam ser repartidas entre 2 ou mais turnos (resposta ao ponto nº 41 da BI).
70. A distribuição dessas horas era definida pelas chefes de equipa, feita mediante a acção e o acordado com o cliente em causa (resposta ao ponto nº 42 da BI).
71. As autoras não trabalhavam normalmente 2 dias/semana (resposta ao ponto nº 43 da BI).
72. As autoras não trabalhavam aos Sábados e Domingos, quando faziam promoção no Cash and Carry, e às 2ªs e 3ªs feiras, quando faziam promoção nas grandes superfícies (resposta aos pontos nºs 44 e 45 da BI).
73. Os dias em que as autoras não trabalhavam nunca foram pagos pelas RR (resposta ao ponto nº 46 da BI).
74. Era a C que estipulava às autoras as tarefas a realizar em cada serviço de promoção, os estabelecimentos a visitar e os dias em que não realizavam promoção, estes, em conformidade com o que consta das respostas aos quesitos nºs 44 e 45, correspondiam àquilo que aquelas entidades acordavam com a ré C em termos de promoções (resposta ao ponto nº 47 da BI).
75. Por ordem da C, as autoras frequentavam cursos de formação custeados pela C ... (resposta ao ponto nº 48 da BI).
76. ... Nomeadamente um curso de promoção de vendas ministrado por "..........., Lda" (resposta ao ponto nº 49 da BI).
77. Por determinação expressa da C, as remunerações das autoras deviam ser processadas mensalmente (resposta ao ponto nº 50 da BI).
78. Com periodicidade idêntica à das restantes promotoras da Zona Sul (resposta ao ponto nº 51 da BI).
79. A "C" nem sempre pagava em dia certo de cada mês, havendo atrasos nos pagamentos (resposta ao ponto nº 52 da BI).
80. Desde que foram admitidas ao serviço da C, as autoras sempre desempenharam a sua actividade todos os meses (resposta ao ponto nº 53 da BI).
81. As remunerações mensais que as rés pagaram às autoras constituíram a totalidade dos rendimentos auferidos pelas autoras nesses meses (resposta ao ponto nº 54 da BI).
82. As autoras nunca cumularam a sua actividade ao serviço da C com outras actividades remuneradas para terceiros (resposta ao ponto nº 55 da BI).
83. As autoras celebraram contratos individuais de Acidente de Trabalho (resposta ao ponto nº 57 da BI).
84. A autora A transferiu para a Companhia de Seguros Império os riscos emergentes de acidentes de trabalho ao serviço da empresa (resposta ao ponto nº 58 da BI).
85. ... E a autora B para a Companhia de Seguros Império ... (resposta ao ponto nº 59 da BI).
86. As autoras desde a sua admissão passaram recibos verdes de todas as quantias recebidas e pagas pela C (excepto do almoço e dos transportes, que eram pagos contra factura) - (resposta ao ponto nº 60 da BI).
87. Em 24.02.94, a autora B inscreveu-se nas Finanças como empresária em nome individual (resposta ao ponto nº 61 da BI).
88. A autora A também se inscreveu como empresária em nome individual, em data não apurada, mas em Março de 1994 já se encontrava inscrita nessa qualidade (resposta ao ponto nº 62 da BI).
89. Parte dos pagamentos da C respeitavam a despesas das autoras com o passe social, transportes, restaurante, alojamento, etc., algumas das quais a C pagava contra a entrega pelas autoras do respectivo comprovativo (resposta ao ponto nº 63 da BI).
90. Diversos promotores e repositores laboravam ao abrigo de contratos ditos de prestação de serviços e eram pagos a recibo verde (resposta ao ponto nº 65 da BI).
91. Na reunião referida no n° 10 dos factos assentes (supra nº 9) estiveram presentes praticamente todas as promotoras da C (resposta ao ponto nº 70 da BI).
92. Nessa reunião, o Director da C, Sr. I, informou as autoras e suas colegas presentes que, a partir de 31.12.96, a C deixava de ter promotoras por ela contratadas, passando a contratação das mesmas e o respectivo pagamento a estar a cargo duma agência de merchandising chamada D (resposta ao ponto nº 71 da BI).
93. A agência estaria na disposição de as contratar de imediato dado a experiência que tinham nos produtos comercializados pela C (resposta ao ponto nº 73 da BI).
94. Informou as promotoras que a decisão da C referida no quesito nº 71 era uma opção de gestão, não negociável, tendo sido preparado um documento com vista à rescisão dos contratos celebrados entre as promotoras e a C (resposta ao ponto nº 74 da BI).
95. Os responsáveis da C distribuíram a cada promotora uma folha de papel dactilografada que já traziam consigo para o efeito, declarando findo o contrato de prestação de serviços entre as promotoras e a C (resposta ao ponto nº 75 da BI).
96. As folhas eram todas iguais entre si, só faltando preencher os locais destinados à data e à assinatura (resposta ao ponto nº 76 da BI).
97. As autoras e as suas colegas assinaram a declaração referida na resposta ao quesito nº 75 (resposta ao ponto nº 78 da BI).
98. As autoras dataram as declarações de 31.12.96, conforme exigido pela C (resposta ao ponto nº 79 da BI).
99. Acreditaram que se não assinassem não mais trabalhariam para a C (resposta ao ponto nº 80 da BI).
100. Destas declarações não foi dada qualquer cópia às autoras, ficando a C com o único original (resposta ao ponto nº 81 da BI).
101. Durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 1997, as promotoras continuaram a trabalhar para a C como até então (resposta ao ponto nº 83 da BI).
102. Em Março de 1997, a C informou as autoras que podiam dirigir-se aos escritórios da D para assinarem os novos contratos (resposta ao ponto nº 84 da BI).
103. Aí chegadas as autoras identificaram-se e disseram que vinham assinar os contratos como promotoras (resposta ao ponto nº 85 da BI).
104. As autoras verificaram que os seus nomes já constavam de uma lista em poder da D (resposta ao ponto nº 86 da BI).
105. Ambas receberam para assinar contratos idênticos e já previamente dactilografados (resposta ao ponto nº 87 da BI).
106. As autoras limitaram-se a preencher a sua identificação e assinar, após o que devolveram os originais, ficando com uma cópia (resposta ao ponto nº 88 da BI).
107. Nunca antes as autoras, ou as suas colegas se haviam matriculado ou candidatado para trabalhar por conta da D (resposta ao ponto nº 89 da BI).
108. Nunca antes a D havia anunciado que pretendia recrutar as autoras como promotoras (resposta ao ponto nº 90 da BI).
109. Jamais as autoras haviam tido contactos profissionais de qualquer tipo com esta ré (resposta ao ponto nº 91 da BI).
110. Depois da C lhes ter referido o nome da D, nunca as autoras ou as suas colegas foram submetidas a quaisquer provas de selecções pela 2ª ré (resposta ao ponto nº 92 da BI).
111. Após 01.01.97, o dia a dia das autoras no tocante ao tipo de trabalho realizado continuou a ser o mesmo, com excepção de também aparecerem no posto de venda supervisores da D, de as promotoras terem também de comunicar à D o número de vendas realizadas e serem pagas pela mesma; após Março de 1997, a D também passou a contactar as promotoras que iriam fazer cada um dos serviços de promoção (resposta ao ponto nº 93 da BI).
112. Os locais onde as autoras exerciam a sua actividade continuaram a ser os mesmos (resposta ao ponto nº 94 da BI).
113. As chefes de equipa que distribuíram e controlavam o trabalho das autoras e a que a estas se reportavam diariamente continuaram a ser as mesmas, sem prejuízo do que consta na resposta ao quesito nº 93 (resposta ao ponto nº 95 da BI).
114. Provado que em Junho de 1997 a chefe de equipa J entregou à autora A um cartão de parabéns pelo seu casamento (resposta ao ponto nº 96 da BI).
115. As autoras também continuaram a reportar à H, responsável da C pelas chefes de equipa (resposta ao ponto nº 98 da BI).
116. As fardas usadas pelas autoras continuaram a ser as mesmas que anteriormente (resposta ao ponto nº 99 da BI).
117. Continuaram a ser fornecidas e custeadas pela C... (resposta ao ponto nº 100 da BI).
118. ...Que continuou a pagar a respectiva limpeza a seco (resposta ao ponto nº 101 da BI).
119. Os emblemas das marcas e os crachás afixados nas fardas também permaneceram (resposta ao ponto nº 102 da BI).
120. Os catálogos explicativos também (resposta ao ponto nº 103 da BI).
121. E também os balcões e os expositores (resposta ao ponto nº 104 da BI).
122. Provado apenas que os recibos das autoras foram passados, desde Janeiro 1997, em nome da 2ª ré (resposta ao ponto nº 107 da BI).
123. Foi sempre a C, quer antes, quer depois de 1 de Janeiro de 1997, quem fixou unilateralmente as promoções a realizar. O valor da remuneração/hora paga às promotoras, a partir de 01.01.97, foi decisão da ré D (resposta ao ponto nº 109 da BI).
124. Por volta de Maio de 1997, as condições em que as promotoras realizavam as promoções e os valores pagos, passaram a figurar num impresso denominado "Termo de Ajustamento e Contratação" (resposta ao nº 110 da BI).
125. A ré C até 31/12/96 e a ré D, após 1.01.97, passavam credenciais destinadas a identificar as promotoras face às empresas onde elas iam desenvolver tarefas de promoção (resposta ao ponto nº 117 da BI).
126. Nas suas credenciais a C referia-se a cada uma das autoras, usando as seguintes expressões "...que a trabalhadora em epígrafe (estava) "abrangida pelo seguro de acidentes de trabalho" (resposta ao ponto nº 118 da BI).
127. Nas suas credenciais a D referia-se a cada uma das AA. usando as seguintes expressões "... que se encontra contratada e ao serviço" ... "no local de trabalho" e "dentro do horário de trabalho definido"; que estava ..."sob as ordens, fiscalização e orientação"; e obrigada a acatar "as directivas e normas internas em vigor na vossa empresa", estava segura "contra acidentes de trabalho..." (resposta ao ponto nº 119 da BI).
128. A partir do final de Julho de 1997, a autora B deixou de fazer qualquer trabalho de promoção dos produtos da C (resposta ao ponto nº 121 da BI).
129. A autora A, a partir de Novembro de 1997, deixou de fazer qualquer trabalho de promoção dos produtos da C (resposta ao nº 122 da BI).
130. A "D" tem recrutado, admitido e dado trabalho a outras promotoras novas (resposta ao ponto nº 124 da BI),
131. Que passaram a fazer o mesmo trabalho das autoras (resposta ao ponto nº 125 da BI).
132. O critério da remuneração aplicado às autoras e às restantes promotoras pela C era à hora (resposta ao ponto nº 129 da BI).
133. Até ao final de 1995, a C calculou a retribuição diária das autoras à razão de 500$00/hora (resposta ao ponto nº 130 da BI).
134. A remuneração/hora base era de 500$00 x 8 horas por dia, não sendo a hora de intervalo para o almoço paga (resposta ao ponto nº 131 da BI).
135. A partir da 9ª hora efectivamente trabalhada era pago o valor de 500$00/hora (resposta ao ponto nº 132 da BI).
136. Era pago 1.100$00 líquidos de subsídio de almoço sempre que a prestação efectiva ultrapassava a hora prevista para o almoço (resposta ao ponto nº 133 da BI).
137. Era pago 1.100$00 líquidos de subsídio de jantar, sempre que a prestação efectiva ultrapassava as 20H00, contra a apresentação de factura (resposta ao ponto nº 134 da BI).
138. ... Até Dezembro de 1995, a ré também pagou às autoras o custo de um passe na Rodoviária, tipo L 123, para as suas deslocações dentro do perímetro abrangido pelo passe (resposta ao ponto nº 135 da BI).
139. ... As restantes deslocações das autoras em serviço, fora do âmbito do passe, eram reembolsadas pela ré, mediante a apresentação dos comprovativos da despesa efectuada (resposta ao ponto nº 136 da BI).
140. ... As despesas de alojamento tinham como limite 3.900$00 por dormida (resposta ao ponto nº 137 da BI).
141. Durante o ano de 1996, a C passou a pagar 4.500$00 líquidos por cada período de 8 horas diárias de trabalho efectivo (resposta ao ponto nº 138 da BI).
142. ... Mas continuou sem pagar o intervalo para o almoço ... (resposta ao ponto nº 139 da BI).
143. ...Acresciam 1.300$00 líquidos, a título de subsídio de almoço e 500$00 fixos para transportes (resposta ao ponto nº 140 da BI).
144. A partir de 1997, passaram a receber 6.300$00 líquidos por cada 8 horas de trabalho efectivo, incluindo nesse valor o pagamento do subsídio de almoço (resposta ao ponto nº 141 da BI).
145. As rés celebraram, em 1.01.97, entre si, um contrato denominado de "prestação de serviços", com o teor constante de fls. 176 a 180 (resposta ao ponto nº 146 da BI).
146. Ao abrigo desse contrato a D forneceria à C os serviços constantes da memória descritiva anexa ao mesmo contrato, pagos pela C de acordo com os preços constantes no ponto nº 4 da mesma memória descritiva (resposta ao ponto nº 147 da BI).
147. O montante pago pela C à D quanto ao serviço de promoção era de 900$00/hora (resposta ao ponto nº 148 da BI).
148. É com base no contrato referido na resposta ao quesito nº 146 e requisições semanais que a C faz à D que esta emite facturas com o total das horas contempladas nessas requisições (resposta ao ponto nº 149 da BI).
149. As campanhas promocionais em que as autoras intervieram no âmbito do acordo celebrado com a 2ª ré, correspondem a acções de promoção que normalmente se estendem por períodos que vão de 2 dias a 5 dias (resposta ao ponto nº 152 da BI).
150. Estes contratos celebrados entre a 2ª ré e cada uma das autoras têm em vista o cumprimento de serviços e campanhas promocionais que lhe são encomendadas por clientes seus (resposta ao ponto nº 153 da BI).
151. A ré C tem tido oscilações quanto à quota de mercado que detém, verificando-se uma recuperação a partir de 1995 (resposta ao ponto nº 154 da BI)
152. Ao longo da sua existência a C tem sido objecto de diversas opções de gestão, nomeadamente decorrentes da privatização do seu capital social no final de 1990, quer das alterações das condições de mercado e venda dos seus produtos decorrentes da implantação das grandes superfícies (resposta ao ponto nº 155 da BI).
153. A "C" tem lançado grandes campanhas publicitárias, seleccionado promoções dos seus diversos produtos nos pontos de venda que congregam maior número de potenciais consumidores e em eventos sociais propiciadores de conduzir ao consumo daqueles mesmos produtos (resposta ao ponto nº 156 da BI).
154. As acções promocionais que a 1ª ré leva a efeito, têm duração limitada no tempo, variando os locais (resposta ao ponto nº 157 da BI).
155. A sua efectivação, sobretudo nas grandes superfícies comerciais, é objecto de negociação anual, concretizada depois em planos mensais quanto aos produtos e com implementação a uma a duas semanas da realização do evento (resposta ao ponto nº 158 da BI).
156. Seja qual for a técnica utilizada - v.g., ofertas de preço (reduções, cupões, bónus de redução, preços trancados, conteúdos suplementares para o mesmo preço, venda por lotes, ofertas especiais e similares), ofertas por natureza (brindes, amostras, etc.) ou ofertas activas (concursos, jogos, lotarias, etc.) - as promoções têm sempre como finalidade a referida na resposta ao quesito nº 161 (resposta ao ponto nº 159 da BI).
157. Associado à promoção há, em regra, uma vantagem patrimonial passageira ou pontual atribuída ao consumidor (resposta ao ponto nº 160 da BI).
158. As acções promocionais são baseadas em extensos estudos de mercado e desenvolvem-se programadamente a partir dum Plano de Marketing, o qual visa prioritariamente o conhecimento e a utilização dos produtos pelo público consumidor. As acções promocionais estão, em regra, relacionadas com certos eventos, mas basicamente obedecem a técnicas de comunicação com objectivos específicos: marcar posição no mercado, chegar mais depressa ao consumidor e acima de tudo fidelizá-lo, incrementando as vendas (resposta ao ponto nº 161 da BI).
159. Para que a acção de promoção atinja os seus objectivos é necessário interessar o consumidor no produto, sendo a publicidade, a promoção e a animação as ferramentas utilizadas para esse fim (resposta ao ponto nº 162 da BI).
160. As autoras foram submetidas a uma entrevista onde lhes foi explicado o tipo de trabalho a realizar e que o mesmo não era contínuo (resposta ao ponto nº 163 da BI).
161. Após a entrevista e as explicações dadas e mencionadas no quesito 163°, as autoras aceitaram celebrar com a C os contratos mencionados nos pontos nºs 16 e 17 dos factos assentes (resposta ao ponto nº 164 da BI).
162. O planeamento final das acções promocionais a desenvolver junto das "Grandes Superfícies Comerciais" existentes no território nacional do Continente é feito pela 1ª ré pela actualmente denominada, "Direcção Canal Clientes-Chave - DCCC" (antes, "Direcção de Vendas das Grandes Superfícies - DVGS") - (resposta ao ponto nº 165 da BI).
163. A "C" está em condições de saber quais os meios humanos de que carece para o serviço de promoção quando está definido o ponto de venda, a duração da promoção e os produtos a promover (resposta ao ponto nº 167 da BI).
164. Por factores imprevisíveis e externos à C pode ocorrer a necessidade de alterações de última hora (resposta ao ponto nº 168 da BI).
165. As autoras sempre foram contactadas para cada acção promocional concreta, num determinado local e com a duração referida nas respostas aos quesitos nºs 37, 44 e 45 (resposta ao ponto nº 169 da BI).
166. Após terem terminado uma acção promocional concreta, as autoras não tinham qualquer garantia de serem seleccionadas para uma promoção seguinte, tivesse ela uma duração inferior, igual ou superior à antecedente, tudo dependendo das necessidades momentâneas da 1ª ré (resposta ao ponto nº 170 da BI).
167. Perante cada contacto da 1ª ré, as autoras aceitavam ou não realizar a promoção de harmonia com os seus interesses e disponibilidades pessoais de momento (resposta ao ponto nº 171 da BI).
168. Quando as autoras participavam numa campanha promocional, o briefing (instruções específicas quanto ao modo como deviam agir no desempenho daquela promoção) era ministrado pelo serviço de promoção da C (resposta ao ponto nº 173 da BI).
169. No início de cada acção de promoção, as autoras recebiam da 1ª ré os impressos dos modelos juntos a fls. 165 a 167, nos quais elas registavam e documentavam a duração efectiva da promoção, o produto promovido, os resultados alcançados e emitiam um juízo de valor sobre o próprio produto com base nas reacções recolhidas junto dos consumidores (resposta ao ponto nº 174 da BI).
170. O preenchimento e entrega desses documentos à C servia para a mesma medir a eficácia das vendas (o de fls. 165), analisar a concorrência (o de fls. 166) e controlar as entradas e saídas das promotoras e horas a pagar (o de fls. 167) - (resposta ao ponto nº 175 da BI).
171. Cada acção promocional tinha uma duração pré-determinada, que umas vezes coincidia com a totalidade do período de abertura ao público da loja onde decorria, estendendo-se por um ou mais dias, outras vezes era inferior àquele período, consoante o planeamento da acção (resposta ao ponto nº 177 da BI).
172. A duração diária de permanência das autoras na loja onde decorria a acção de promoção, incluindo a fixação do seu início e termo, e o intervalo para a tomada de refeições, eram as estabelecidas pelo responsável da loja, de acordo com o horário de funcionamento desta e o acordado com a ré C (resposta ao ponto nº 178 da BI).
173. As entradas das promotoras nas grandes superfícies tinha de ser solicitada com uma antecedência de 48 horas, que é feita através da "entrada de serviço", contra a apresentação de uma credencial emanada do produtor, cujo conteúdo foi variando ao longo dos anos, mas que visava basicamente permitir identificar o promotor, o período em que ia decorrer a promoção e o horário de permanência na loja, horário de entrada e saída, e declarava que a promotora estava abrangida por seguro de acidente de trabalho (resposta ao ponto nº 180 da BI).
174. Os dados constantes do impresso correspondente ao de fls. 167 eram confirmados pelo gerente da loja ou estabelecimento, que o assinava nessa qualidade, e era esse mesmo documento que servia de suporte ao pagamento do preço do número de horas prestadas pelas promotoras à 1ª ré, e que serve, simultaneamente, para apuramento dos débitos e créditos entre esta e o ponto de venda, decorrentes da promoção (resposta ao ponto nº 181 da BI).
175. As acções promocionais levadas a efeito pela 1ª ré divergem quantitativamente de ano para ano (resposta ao ponto nº 182 da BI).
176. As autoras não estavam vinculadas à C através de cláusula de exclusividade, nem a mesma ré lhes garantia continuidade do serviço (resposta ao ponto nº 184 da BI).
177. Variando o número de horas conforme os serviços de promoção realizados (vd. também resposta ao quesito 53°) - (resposta ao ponto nº 185 da BI).
178. O valor da remuneração anual a segurar foi de 600.000$00 (vd. também resposta ao quesito nº 58) - (resposta ao ponto nº 187 da BI).
179. A 1ª ré celebrou com a Ré D, um contrato formalizado por escrito em 2.01.1997 (resposta ao ponto nº 191 da BI).
180. A 2ª ré é uma empresa que opera no mercado como prestadora de serviços de merchandising, ou seja, no domínio da técnica de rentabilização dos produtos e locais de venda (resposta ao ponto nº 192 da BI).
181. Após 31 de Dezembro de 1996, a 1ª ré nunca passou a favor das autoras qualquer credencial, e, antes daquela data, as credenciais com que a ré habilitava as autoras para estas poderem ter acesso às lojas onde decorria qualquer promoção tinham o conteúdo mencionado na resposta ao quesito nº 180 (resposta ao ponto nº 194 da BI).
182. A autora B, até 05.97, efectuou descontos para a Segurança Social como trabalhadora independente e, após 05.97 e, pelo menos, até 01.99, como trabalhadora por conta de outrem. A autora A efectuou descontos para a Segurança Social desde 12.97 (resposta ao ponto nº 199 da BI).
183. O fornecimento dos meios referidos no n° 5 dos factos assentes era indissociável e necessário à promoção da imagem e dos produtos fabricados pela ré (resposta ao ponto nº 200 da BI).
184. As acções promocionais desenvolvem-se de acordo com o acordado entre o produtor do produto a promover e o responsável pelo ponto de venda onde a promoção ocorre (resposta ao ponto nº 204 da BI).
185. Só a partir de 1997, a 2ª ré estabeleceu contactos com as autoras, as quais não conhecia até essa altura e com quem, até então, não estabelecera qualquer contrato (resposta ao ponto nº 205 da BI).
186. Em 1.01.97, a 2ª ré celebrou com cada uma das autoras os contratos denominados de prestação de serviços com o conteúdo de fls. 69 a 74 (resposta ao ponto nº 206 da BI).
187. Também a partir do início do ano de 1997, é a 1ª ré que elabora toda a programação mensal das acções promocionais, com a identificação das lojas onde deviam ocorrer, o dia, ou os dias, em que se desenvolviam e o número de horas englobadas, planeamento esse que entregava à 2ª ré, para que esta seleccionasse e contactasse as promotoras que iriam realizar a promoção, nos termos e condições constantes dos contratos de prestação de serviços celebrados e Termos de Ajustamento e Contratação (resposta ao ponto nº 209 da BI).
188. No final de cada mês, a 2ª ré facturava à 1ª ré os serviços de promoção que lhe tinha prestado no decurso deste mês, mediante a aplicação da tabela de preços fixada no contrato junto a folhas 176 e seguintes, que a 1ª ré ulteriormente liquidava (resposta ao ponto nº 210 da BI).
189. A partir de 1 de Janeiro de 1997, foi a 2ª ré quem pagou às autoras a sua intervenção em acções promocionais dos produtos da 1ª ré e com elas contactou e contratou para realizarem as promoções (resposta ao ponto nº 211 da BI).

IV – Apreciando
Elencadas (em II.) as questões, cujo conhecimento é objecto do presente recurso, passemos à sua apreciação.
A - A ré C, notificada do acórdão da Relação (a fls 1263 e sgs) veio arguir a nulidade do mesmo por omissão de pronúncia.
Fê-lo no requerimento de interposição de recurso, nos termos do artº 77º-1 do CPT.
Conclui que o vício de que o mesmo padece resulta do facto de não se ter pronunciado sobre a nulidade que a recorrente assacara à sentença da 1ª instância, devendo a referida omissão ser suprida pelo Tribunal a quo, ou, se este o não fizer, pelo Tribunal ad quem.
Tal nulidade reconduzir-se-ia ao facto de o Tribunal, classificando de laboral a relação existente entre as autoras e a ré/recorrente, o que implicava a existência dum despedimento ilícito, não ter determinado a dedução dos valores previstos no artº 13º-2 do DL nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
A Relação não se pronunciou sobre a arguição, por certo no pressuposto de que, havendo recurso, era ao Tribunal Superior que caberia o seu conhecimento – nº 3 do citado artº 77º.
Uma vez, porém, que o Tribunal a quo podia suprir a nulidade da sentença, ao abrigo do disposto no artº 668º-4 do CPC, o seu silêncio também poderá significar o entendimento de não haver nada a suprir.
Vejamos, então, se houve ou não omissão de pronúncia.
Preceitua o artº 668º-1-d) do CPC que a sentença é nula quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (....).
Diz a recorrente que suscitou a invocada questão no nº 146 da contestação e que sobre ela não se pronunciaram os Tribunais recorridos (nem a 1ª instância, nem a Relação, tendo a recorrente arguido a respectiva nulidade na apelação que interpôs).
É fora de dúvida que a ré/recorrente, no nº 146 da sua contestação, alegou que as autoras continuaram a auferir remunerações de trabalho após Julho e Outubro de 1997, respectivamente, e após 1.01.97. Também é certo que essa matéria foi incluída na base instrutória sob o nº 199, tendo resultado provado que “a autora B, até 05.97, efectuou descontos para a segurança como trabalhadora independente e, após 05.97 e até, pelo menos, 1.01.99, como trabalhadora por conta de outrem; e que a autora A efectuou descontos para a segurança social desde 12.97.”
Mas se é certo que nem a 1ª, nem a 2ª instância se pronunciaram sobre a (eventual) aplicação do disposto no nº 2 do artº 13º do DL nº 64-A/89, de 27.02, também é verdade que não se disse no acórdão recorrido (a única decisão que, neste momento, está em causa) que a situação dos autos era equiparável a um despedimento ilícito.
Neste contexto, o silêncio da Relação não pode ser configurado como omissão de pronúncia, devendo, antes e se for caso disso, reconduzir-se a um erro de julgamento.
Logo, improcede a arguida nulidade.
Porém, uma vez que a recorrente impugnou, em recurso, a qualificação do contrato celebrado entre as AA e a ré, o que pode conduzir à sua absolvição, justifica-se que a questão de fundo levantada pela recorrente – aplicação ou não do nº 2 do citado artº 13º - seja apreciada em momento posterior.

B - Impugnação da matéria de facto
Sustenta a recorrente C que a matéria de facto peca por contradição e por defeito.
É sabido que só muito limitadamente é consentido ao Supremo Tribunal de Justiça interferir para alterar ou ampliar a matéria de facto fixada nas instâncias.
Estes limites estão traçados nos artºs 722º-2 e 729º-2-3 do CPC.
Segundo o nº 2 destes preceitos, o STJ só pode conhecer do erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais, se houver ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou fixe a força de determinado meio de prova. Em bom rigor, não estamos perante desvios à regra geral que veda ao STJ o conhecimento da matéria de facto, pois tais hipóteses reconduzem-se a erros de direito.
Situação diferente é a prevista no nº 3 do artº 729º do CPC que permite ao Supremo conhecer da decisão de facto, se entender que esta decisão “pode e deve ser ampliada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito” ou que encerra contradições “que inviabilizam a decisão jurídica do pleito”. Neste âmbito, o STJ passa a “gozar de poderes próprios para sindicar a coerência lógico-jurídica e a suficiência da decisão sobre matéria de facto em termos praticamente análogos aos que o nº 4 do artº 712º confere à Relação”. (1)
A impugnação da recorrente insere-se na previsão do citado artº 729º-3 – contradições na decisão sobre a matéria de facto e necessidade de ampliação desta decisão.
Sobre elas já se pronunciou a Relação, uma vez que foram também suscitadas na apelação.
Começando pelas contradições.
Uma residiria no seguinte:
A resposta ao ponto nº 83 da BI (do seguinte teor: “durante os meses de Janeiro e Fevereiro – de 1997 – as promotoras continuaram a trabalhar para a C como até então”) estaria em oposição frontal às respostas aos pontos nºs 194, 209, 211, 93, 107, 109 e 117 da mesma BI (respectivamente, do seguinte teor: “após 31 de Dezembro de 1996, a 1ª ré nunca passou a favor das AA qualquer credencial”; “a partir do início do ano de 1997, é a 1ª ré que elabora toda a programação mensal das acções promocionais, com a identificação das lojas onde deviam ocorrer, o – ou os – dias em que se desenvolviam e o número de horas englobadas, planeamento esse que entregava à 2ª ré, para que esta seleccionasse e contactasse as promotoras que iriam realizar a promoção nos termos e condições constantes dos contratos de prestação de serviços celebrados e Termos e Ajustamentos e Contratação”; “a partir de 1 de Janeiro de 1997, foi a 2ª ré quem pagou às AA a sua intervenção em acções promocionais dos produtos da 1ª ré e com elas contactou e contratou para realizarem as promoções”; “as AA tinham de comunicar à 2ª ré o número de vendas realizadas e eram pagas por esta”; “os recibos das AA foram passados desde Janeiro de 1997 em nome da 2ª ré”; “o valor da remuneração/hora paga às promotoras, a partir de 01.01.97, foi decisão da ré D”; “a ré C até 31.12.96 e a ré D após 01.01.97 passavam credenciais destinadas a identificar as promotoras face às empresas onde elas iam desenvolver tarefas de promoção”).
Não é este o entendimento do acórdão recorrido.
Explica:
Ao afirmar-se que “durante os meses de Janeiro e Fevereiro (de 1997) as promotoras continuaram a trabalhar para a C como até então" quis dizer-se que as AA. continuaram a desempenhar as funções, nos mesmos termos e condições, isto é, sem se ter verificado, em termos substanciais, qualquer alteração na sua relação com a ré C, sendo esta matéria perfeitamente compatível com a que consta nas resposta dadas aos quesitos 209°, 211°, 93°, 107°, 109° e 117°. Na verdade, numa relação contratual desta natureza, o que releva fundamentalmente é a existência de subordinação jurídica do trabalhador em relação ao dador de trabalho, podendo perfeitamente o pagamento da retribuição, assim como a realização de outras diligências (como os contactos a que se refere a resposta dada ao quesito 209° e a passagem das credenciais a que se reporta a resposta dada ao quesito 109°) serem efectuados por outra entidade, sem pôr em causa a natureza dessa relação.

Concorda-se que não há contradição entre as citadas respostas susceptível de afectar ou impossibilitar a correcta decisão jurídica do pleito. Não se poderá, porém, em sede de matéria de facto, ler a expressão continuaram a trabalhar contida na resposta ao ponto nº 83 da BI com um sentido jurídico: de que durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 1997 se mantiveram as “relações de natureza laboral que vigoravam entre as AA e C”. É que o tema a decidir é justamente a natureza jurídica destas relações, pelo que não poderá ficar decidido nessa resposta.

Outra contradição invocada pela recorrente residiria no seguinte:
A resposta ao ponto nº 206 da BI (do seguinte teor: “Em 1.01.97, a 2ª ré celebrou com cada uma das AA os contratos denominados de prestação de serviços com o conteúdo de fls 69 a 74”, documentos datados de 1.01.97) estaria em oposição directa e frontal com as respostas aos pontos nºs 84, 85, 86 a 92 da BI (respectivamente do seguinte teor: “em Março de 1997 a C informou as AA que podiam dirigir-se aos escritórios da D para assinarem os novos contratos”; “aí chegadas as autoras identificaram-se e disseram que vinham assinar os contratos como promotoras”; “as autoras verificaram que os seus nomes já constavam de uma lista em poder da D”; “ambas receberam para assinar contratos idênticos e já previamente dactilografados”; “as autoras limitaram-se a preencher a sua identificação e assinar, após o que devolveram os originais, ficando com uma cópia”; “nunca antes as autoras, ou as suas colegas se haviam matriculado ou candidatado para trabalhar por conta da D; “nunca antes a D havia anunciado que pretendia recrutar as autoras como promotoras”; “jamais as autoras haviam tido contactos profissionais de qualquer tipo com esta ré”; “depois da C lhes ter referido o nome da D, nunca as autoras ou as suas colegas foram submetidas a quaisquer provas de selecção pela 2ª ré”).
Segundo o acórdão recorrido não existe contradição.
Diz:
Enquanto a data de "Março de 1997" representa o momento em que as autoras se dirigiram, efectivamente, aos escritórios da 2ª ré para assinarem os contratos, por indicação da ré C, a de "1.01.97" corresponde simplesmente à que foi aposta nesses contratos como sendo a da sua "celebração".

Confrontando as ditas respostas, afigura-se manifesto não haver contradição entre elas, susceptível de afectar ou impossibilitar a correcta decisão jurídica do pleito.

Outra contradição invocada pela recorrente residiria no seguinte:
A resposta ao ponto nº 93, parte final, da base instrutória (cujo teor é o seguinte: “Após 01.01.97, o dia a dia das autoras no tocante ao tipo de trabalho realizado continuou a ser o mesmo, com excepção de também aparecerem no posto de vendas supervisores da D, de as promotoras terem também de comunicar à D o número de vendas realizadas e serem pagas pela mesma; após Março de 1997, a D também passou a contactar promotoras que iriam fazer cada um dos serviços de promoção) estaria em oposição com as respostas aos pontos nºs 209 e 211 da BI (respectivamente, do seguinte teor: “Também a partir do início do ano de 1997, é a 1ª ré que elabora toda a programação mensal das acções promocionais, com a identificação das lojas onde deviam ocorrer, o/ou os dias em que se desenvolviam e o número de horas englobadas, planeamento esse que entregava à 2ª ré, para que esta seleccionasse e contactasse as promotoras que iriam realizar a promoção, nos termos e condições constantes dos contratos de prestação de serviços celebrados e Termos de Ajustamento e Contratação”; “a partir de 1 de Janeiro de 1997, foi a 2ª ré quem pagou às autoras a sua intervenção em acções promocionais dos produtos da 1ª ré e com elas contactou e contratou para realizarem as promoções).
Diz que não o acórdão recorrido.
Segundo este, a invocada contradição entre a resposta ao quesito 93º e as respostas aos quesitos 211° e 209° é mais aparente que real. Como os contratos só foram outorgados e assinados em Março (antes dessa data as AA. não tinham contactado nem conheciam a ré D), é natural que só a partir desse momento as autoras tenham passado a ser contactadas pela 2ª ré. Que, contrariamente ao que alega a ré recorrente, o que resulta da resposta ao quesito 211º é (apenas) que "a partir de 1 de Janeiro de 1997, foi a 2ª ré quem pagou às AA. a sua intervenção em acções promocionais dos produtos da 1ª ré ..."; a última parte da resposta onde se refere "e com elas contratou para realizarem as promoções" só pode reportar-se, como resulta da conjugação com a demais matéria de facto provada, aos contratos outorgados e assinados em Março, com data de 1.01.97.

Continuamos a não dar razão à recorrente.
Mesmo que seja excessiva a afirmação da Relação, posta entre parênteses, de que “antes dessa data (da assinatura dos contratos em Março de 1997) as AA. não tinham contactado nem conheciam a 2ª ré”, considera-se, tal como o Tribunal recorrido, que a invocada contradição é mais aparente que real e que se supera articulando as ditas respostas. Evidentemente, pelas razões já apontadas, não poderá o termo “contratou” em sede de matéria de facto ser entendido como um conceito normativo.
Assim, a resposta ao ponto nº 211 da BI não briga, antes pode ser articulada, com o facto de os “contratos com a 2ª ré” só terem sido assinados pelas autoras em Março de 1997.
De qualquer forma, a invocada discrepância não teria relevância suficiente para inviabilizar a decisão jurídica do pleito.

Como última contradição, a recorrente aponta a seguinte:
A resposta dada ao ponto nº 110 da BI (do seguinte teor: “por volta de Maio de 1997, as condições em que as promotoras realizavam as promoções e os valores pagos, passaram a figurar num impresso denominado “Termo de Ajustamento e Contratação”) está em oposição à resposta ao ponto nº 209 da BI (do seguinte teor: “Também a partir do início do ano de 1997, é a 1ª ré que elabora toda a programação mensal das acções promocionais, com a identificação das lojas onde deviam ocorrer, o/ou os dias em que se desenvolviam e o número de horas englobadas, planeamento esse que entregava à 2ª ré, para que esta seleccionasse e contactasse as promotoras que iriam realizar a promoção, nos termos e condições constantes dos contratos de prestação de serviços celebrados e Termos de Ajustamento e Contratação”).

O acórdão recorrido diz que não há contradição entre as respostas, verificando-se apenas pouca precisão na redacção da expressão "... do início do ano de 1997".

Continuamos a não dar razão à recorrente.
Na verdade, inexiste contradição porque aquelas respostas contemplam situações diferentes: a resposta ao nº 110 da BI diz respeito à forma (impresso) que passou a revestir a apresentação das condições em que as promotoras realizavam as promoções e os valores pagos, o que terá acontecido por volta de Maio de 1997, enquanto a resposta ao ponto nº 209 da BI retrata certos comportamentos da 1ª ré, no âmbito duma relação estabelecida com a 2ª ré: elaboração de programações mensais (de promoções).... a partir do início do ano de 1997, sua entrega à 2ª ré, para que esta seleccionasse e contactasse as promotoras que iriam realizar as promoções, nos termos e condições constantes dos contratos de prestação de serviços celebrados e Termos de Ajustamento e Contratação.

Sustenta ainda a ré/recorrente que há factos essenciais para a boa decisão da causa que não foram apurados. Diz que, perguntando-se nos quesitos n.°s 121 e 122 se "a partir do final de Julho de 1997, as RR (sic) deixaram de encarregar a A. B de qualquer trabalho” e "a Autora A a partir de Novembro de 1997", é bom de ver que a resposta dada a estes dois quesitos ("provado que a partir do final de Julho de 1997, a Autora B deixou de fazer qualquer trabalho de promoção dos produtos da C" e "provado que a Autora A, a partir de Novembro de 1997, deixou de fazer qualquer trabalho de promoção dos produtos da C") não responde ao que se perguntava (se as RR. assumiram um comportamento omissivo), mas sim a uma coisa diversa que não era perguntada (imputação do comportamento omissivo às Autoras, mas circunscrito à "promoção dos produtos da C").
Acrescenta ainda que importa esclarecer qual ou quais as razões que motivaram tais comportamentos omissivos, se foram as AA. que se desinteressaram, ou se foram as RR. que, apesar do interesse manifestado pelas AA. na realização de "qualquer trabalho" de promoção, ou, especificamente de "promoção dos produtos da C", lhes negaram essa possibilidade.
De acordo com a 2ª conclusão do recurso, é indispensável não só ampliar a matéria das respostas dadas aos quesitos nºs 121 e 122, como, além disso, dar como assentes os factos constantes dos nºs 27 e 31 da contestação da 1ª ré.
A Relação entende que a recorrente não tem razão. Que a resposta dada aos quesitos nºs 121 e 122, não sendo uma resposta exactamente coincidente com a pergunta, ainda assim traduz aquilo que o tribunal conseguiu apurar. É uma resposta restritiva, cujo conteúdo tem a ver com a matéria dos quesitos, não se situando, de modo algum, fora do seu âmbito.
O "apuramento" que a recorrente pretende que se faça ou seja, saber se foram as AA. que se desinteressaram, ou se, pelo contrário, foram as RR. que, apesar do interesse manifestado pelas AA. na realização de "qualquer trabalho de promoção", lhes negaram essa possibilidade - já foi feito na audiência de discussão e julgamento e conduziu às ditas respostas.
Quanto à matéria constante dos nºs 27 e 31 da sua contestação, diz a Relação que, a serem admitidas as fórmulas aí usadas, isso implicaria a antecipação da resposta de direito.

Vejamos, então.
Os factos levados aos nºs 121 e 122 da BI correspondem aos alegados pelas AA nos nºs 210 e 211 da sua p.i.
Alegando tais factos, estas pretendiam significar que uma, a partir de fins de Julho de 1997, outra, a partir de Novembro de 1997, deixaram de trabalhar para as rés, em virtude de estas terem deixado de as encarregar de qualquer trabalho.
E tratando-se de factos constitutivos do direito das autoras, a estas cabia a sua alegação e prova. Acresce que a ré/apelante apenas se limitou a impugnar tais factos, nos termos que constam do nº 114 da respectiva contestação.
Neste contexto, não se compreende a sua posição quando defende que deve ser ampliada a matéria das respostas dadas aos quesitos nºs 121 e 122, sabido que, em princípio, o juiz “só pode servir-se dos factos articulados pelas partes” (artº 664º do CPC).
Na verdade, e como já se referiu, o teor destes quesitos reproduz a matéria alegada pelas autoras. Por seu turno, as respostas, sendo restritivas, traduzem o convencimento do julgador, face à prova produzida (que se restringiu a isto: provado, apenas, que as autoras, a partir das datas indicadas, deixaram de fazer qualquer trabalho de promoção dos produtos da C).
Pretende ainda a ré/recorrente que seja dada como provada a matéria constante dos nºs 27 e 31 da contestação.
Acontece que o que se alega em tais números corresponde ao alegado nos números 24 e 25 do mesmo articulado – em suma, que as AA subscreveram, respectivamente, os documentos, cujas fotocópias se encontram a fls 113/114 e 115/116 - e tal matéria foi dada como assente (ver nºs 16 e sgs dos FA).
Aliás, da parte decisória do acórdão, resulta expressamente que as autoras e a ré C celebraram “os contratos juntos a fls 113 a 116”.
Assim sendo, não se vê necessidade de ampliar a matéria de facto pois a mesma constitui base suficiente para a decisão de direito.

C – Qualificação dos contratos celebrados entre as autoras e a ré C.
Tanto a 1ª instância como a Relação qualificaram os contratos celebrados entre a C e as autoras como de trabalho subordinado (contratos de trabalho, sem termo).
Eis, no essencial, a fundamentação do acórdão recorrido:
- para que se possa falar de contrato de trabalho, necessário se torna que se verifiquem cumulativamente dois tipos de subordinação do trabalhador ao dador de trabalho: subordinação económica e subordinação jurídica, embora, para a doutrina e jurisprudência dominantes, só esta última constitua elemento essencial do contrato;
- quando a existência deste elemento não resulte clara, torna-se necessário averiguar se ela decorre de factos concretos indiciadores dessa subordinação;
- na situação em apreço, ficou sobejamente demonstrado que as AA. estavam economicamente dependentes da ré C, pois desde que foram admitidas ao serviço, trabalharam ininterrupta e exclusivamente para esta, mediante o pagamento de determinada retribuição, que constituía a totalidade dos rendimentos por elas auferidos, nunca tendo cumulado essa sua actividade com outras actividades remuneradas para terceiros; além disso, a remuneração foi sempre estipulada em função de determinada unidade de tempo (à hora) e nunca em função do resultado do serviço por elas prestado; acresce que era uma remuneração certa, regular e periódica (mensal), auferindo as AA também um subsídio de refeição (que nos últimos meses da relação contratual foi integrado na própria retribuição), tudo indícios típicos de uma relação de trabalho subordinado e não de uma relação de trabalho autónomo;
- dos factos provados resulta também que as autoras se encontravam juridicamente subordinadas à 1ª ré e, como indícios dessa subordinação, temos: era a ré que definia o local de trabalho (para realização das promoções) e o horário de trabalho (8 horas diárias de trabalho efectivo, repartidas ou não por 2 ou mais turnos em conformidade com o acordado com os postos de venda, havendo uma hora de intervalo para o almoço, sendo de sublinhar que, se as autoras trabalhassem para além dessas 8 horas diárias, as horas prestadas fora do horário normal, eram pagas à razão dum valor/ hora previamente estabelecido pela própria ré); a permanência das autoras nos postos de venda obedecia a um planeamento previamente definido pela ré, em termos de estratégia comercial e segundo um plano de marketing (ainda que com menor ou maior possibilidade de alteração pontual); as autoras cumpriam as "normas procedimentais" estabelecidas por esta, cuja execução era controlada pelas suas chefes de equipa, com poderes para definir tarefas, para lhes dar instruções antes de cada promoção (nos chamados briefings); às autoras era imposto o uso de fardas, bordados publicitários, crachats, fornecidos pela ré, exigindo-lhes uma apresentação cuidada em termos pessoais e em termos do material usado, etc; as autoras eram incumbidas da realização de outras tarefas à margem dos actos de promoção propriamente ditos (v.g. colocar bebidas nas prateleiras e nos locais de venda, proceder a sua reposição, efectuar a contagem e o controlo dos stocks; controlar os preços dos produtos da concorrência, nos postos de venda onde ocorria o acto promocional; distribuir bebidas em locais públicos, tal como sucedeu numa festa equestre em Benavente, em 11.06.95, na Doca de Belém e no Estádio José Alvalade, durante um jogo de futebol em 1995; distribuir folhetos publicitários da Central de Cervejas nas caixas do correio e por vezes também durante jogos de futebol); às autoras era exigido o preenchimento de relatórios de vendas e de folhas de ponto, que visavam o controle do tempo de trabalho e da produtividade de cada promotora, incumbindo-lhes prestar contas às chefes de equipa com quem tinham de discutir os pontos positivos e negativos da promoção;
- em contrapartida, os elementos indiciadores da existência de uma relação de trabalho autónomo - pagamento das retribuições mediante os chamados "recibos verdes" e, mais tarde, mediante factura, a não dedução de encargos para a Segurança Social por parte da ré, a existência de contratos de seguros de acidente de trabalho a cargo das autoras, o facto de estas se encontrarem inscritas como "trabalhadoras independentes" e, mais tarde, como "empresárias em nome individual - são escassos, pouco seguros e mostram-se bastante fragilizados;
- um contrato deve ser qualificado juridicamente em função da relação que realmente existiu entre as partes e não em função da sua denominação, do modelo ou da cor do recibo, ou do facto de o trabalhador estar colectado como "trabalhador independente" ou como "empresário em nome individual”;
- estes elementos, no caso em apreço, colidem totalmente com os inúmeros elementos de natureza substancial que foram apurados e permitem concluir que as autoras estavam juridicamente subordinadas à ré;
- aliás, nos anos de 1995, 1996 e 1997, inúmeras situações de "promotores" e de "repositores", idênticas às vividas pelas autoras, foram detectadas e consideradas irregulares pela IOT e submetidas à apreciação dos tribunais do trabalho e também, nessa altura, estes concluíram, na grande maioria dos casos, que essas situações configuravam verdadeiras relações de trabalho subordinado.

A recorrente discorda deste entendimento sustentando que os contratos em causa devem ser qualificados como contratos de prestação de serviço.
Temos, pois e fundamentalmente, um problema de qualificação contratual, sendo certo que, qualificados os contratos celebrados entre a ré e as autoras, ficarão resolvidas, por si, ou prejudicadas (artº 660º-2 do CPC) as questões suscitadas nas conclusões 4ª, 5ª, 6ª, 7ª, 8ª e 9ª da alegação da recorrente.
Com efeito, se, face aos factos provados, este Tribunal vier a qualificar os contratos como de trabalho, tal como o fizeram as instâncias, será porque entende que as autoras demostraram os factos constitutivos do seu direito, cumprindo o ónus da prova que sobre si impendia (artº 342º-1 do CC), e porque conclui que foram esses os contratos celebrados, não colhendo as considerações tecidas sobre uma eventual “nulidade” do negócio que devesse ser declarada, nem sobre a “necessidade” da sua conversão.
E será também porque faz uma diferente leitura dos factos de que a recorrente extrai a conclusão 7ª, os quais, segundo esta, constituiriam o conteúdo de deveres que a lei faz recair sobre o prestador de serviço e o beneficiário da prestação, consagrados, respectivamente, nas alíneas a), b) e c) do artº 1161º e alíneas a) e b) do artº 1167º, ambos do CC.
Se, pelo contrário, a qualificação dos contratos for no sentido preconizado pela recorrente – contratos de prestação de serviço - também tais questões, se bem que perspectivadas de outro ângulo, ficarão resolvidas ou prejudicadas.

Vejamos então.
Como resulta do acórdão recorrido as autoras e a 1ª ré subscreveram os contratos juntos a fls 113 e 116.
Está efectivamente provado que:
- a A e a C assinaram, em 16.04.1993, um contrato escrito para vigorar desde aquela data (documento a fls 113 e resposta ao nº 3 da BI);
- a B e a C assinaram, em 29.06.1993, um contrato escrito, para vigorar desde a mencionada data (documento a fls 116 e resposta ao ponto nº 4 da BI);
- ambos os contratos foram dactilografados pelos serviços da C, de acordo com minutas pré-existentes na empresa, semelhantes entre si e às minutas utilizadas com outras promotoras (resposta aos pontos nºs 5, 6 e 7 da BI);
- os contratos foram dados às autoras já prontos a assinar, limitando-se estas a aderir (resposta aos pontos nºs 8 e 9 da BI);
- destes contratos não foi dada qualquer cópia às autoras, ficando a C com o único exemplar disponível (resposta ao ponto nº 12 da BI).
A Relação declarou nula a cláusula 4ª desses contratos, por contrariar normas legais imperativas.

Para qualificar um contrato (questão de direito), importa primeiro interpretá-lo, o que envolve uma questão de facto (o apuramento da vontade das partes) e uma questão de direito (selecção, interpretação e aplicação de normas sobre a interpretação), podendo nesta parte este Supremo Tribunal exercer censura sobre a actividade exegética da Relação.

Interpretar um contrato é, pois, conhecer o sentido das declarações que o formam.
O artº 236º-1 do CC consagra a “teoria da impressão do declaratário” (a declaração vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, .....).
Prevalece, porém, o sentido correspondente à vontade real do declarante, se o destinatário da declaração conhecer esta vontade (nº 2 do mesmo preceito).
Nos negócios onerosos, em caso de dúvida, prevalece o sentido que conduzir ao maior equilíbrio das prestações – artº 237º do CC.
Nos formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento ainda que imperfeitamente expresso, a não ser que corresponda à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio não se opuserem a essa validade – artº 238º do CC.

O que está em causa é saber se a matéria de facto apurada pelas instâncias foi devidamente interpretada e conduziu à correcta qualificação dos contratos. Por outras palavras, se as autoras e a ré C celebraram contratos individuais de trabalho ou contratos de prestação de serviço.
Distinguem-se as duas figuras pondo o acento no objecto da prestação: o próprio trabalho (enquanto actividade intelectual ou manual – artº 1º do CIT e artº 1152º do CC; ou o resultado do trabalho - artº 1154º do CC.
Como, porém, todo o trabalho conduz a um resultado e este não existe sem aquele, o que verdadeiramente caracteriza uma e outra prestação é o modo como se desenrola a actividade do devedor – em regime de submissão à autoridade e direcção do credor (prestação de trabalho) ou em regime de autonomia (prestação dum resultado).
No caso dos autos, as autoras declararam assumir a obrigação de prestar à C serviços de promoção de venda junto dos clientes da ré, mediante retribuição.
Tal actividade – promoção de venda - tanto pode ser realizada independentemente, sendo o devedor livre de escolher os meios de exercício da sua actividade com vista a alcançar o resultado que se obrigou a prestar, como subordinadamente, obrigando-se o devedor a desenvolver a sua actividade nos termos que forem determinados pelo credor com vista àquele fim (promoção de venda).
Ora, olhando aos termos dos contratos escritos, fica patente que as partes não exteriorizaram o seu pensamento de forma límpida e inequívoca.
Quanto aos termos da prestação da actividade das autoras apenas ficou clausulado que esta teria lugar em estabelecimentos de venda ao público de produtos da ré, mediante uma certa retribuição diária no valor de 4.000$00, correspondente a um mínimo de 9 horas/dia ...
O nome do contrato e a remissão para as normas que o regulam, o facto de se referir que o serviço era prestado sob a responsabilidade das autoras, sendo também da sua responsabilidade o cumprimento das obrigações fiscais, bem como das obrigações respeitantes ao regime da Segurança Social, decorrentes da actividade de prestação de serviços, não são, só por si, elementos literais determinantes no sentido da existência ou não do vínculo de subordinação jurídica na realização do serviço de promoção.
Estabelecendo o paralelo com o regime vinculístico do arrendamento e imaginando que uma pessoa cedia a outra o uso temporário dum imóvel para habitação, mediante uma certa retribuição mensal, mas clausulando que não se tratava de arrendamento e que as regras aplicáveis eram as do comodato, ninguém defenderia, neste contexto, que o sentido da declaração afastava a qualificação do contrato como arrendamento.
No caso dos autos, houve a preocupação de reduzir o contrato a escrito. Ora, formalizar um negócio não é apenas aludir a um certo tipo de contrato, mas descrever claramente por escrito o seu objecto e as suas condições.
Isto para dizer que o facto de as autoras terem subscrito os contratos em causa não impedia, antes impunha, que as instâncias averiguassem o sentido das declarações negociais, tanto mais que as circunstâncias em que as autoras assinaram os contratos apontam para que o fizeram na posição de parte mais fraca (necessidade de arranjar emprego, correspondendo os contratos a minutas pré-existentes na empresa, os quais foram dados às autoras já prontos a assinar, limitando-se estas a aderir ...). E, quando a linguagem utilizada pelos pactuantes é imperfeita, tornando obscuro o sentido do acordo, há que lançar mão de outros elementos, como “a finalidade prosseguida pelo declarante”, “os interesses em jogo” (2), as circunstâncias em que o negócio foi concluído e, sobretudo, a posição assumida pelas partes na execução do contrato. Neste âmbito, importará atender àqueles indícios de facto que exteriorizam a subordinação jurídica, assumindo particular relevo os seguintes: vinculação a horário de trabalho, execução da prestação em local definido pelo empregador, existência de controlo externo do modo de prestação, obediência a ordens, sujeição à disciplina da empresa, modalidade da retribuição (em função do tempo, em regra), propriedade dos instrumentos de trabalho e os próprios regimes fiscal e de segurança social. Como o valor de cada um destes indícios pode variar de caso para caso, a situação deve ser apreciada na sua globalidade.

Ora, foi isto que a Relação fez. Face aos factos provados, entendeu que os mesmos eram demonstrativos de que a actividade de promoção de venda levada a cabo por cada uma das autoras no âmbito dos contratos celebrados não era exercida autonomamente, mas sob a autoridade e direcção da ré C.
Nesta interpretação, ponderou a posição relativa da ré e das autoras e o seu diferente peso na contratação, quer antes, quer no momento da assinatura dos contratos, afastando a tese defendida pela recorrente de que as contraentes estariam numa posição paritária.
Na verdade, como bem se salienta na acórdão recorrido, “embora um contrato pressuponha a existência de um acordo livremente aceite e esse acordo pressuponha uma prévia discussão das suas cláusulas, decorre da experiência do quotidiano que, para uma grande parte das pessoas, arranjar e manter um posto de trabalho para garantir a sua subsistência implica a não dedução de qualquer oposição à denominação do contrato e às condições propostas pelo dador de trabalho”, designadamente, "aceitar" inscrever-se e colectar-se como "trabalhador independente" ou como "empresário em nome individual", isto para "libertar" o empregador de despesas com seguros de acidentes de trabalho, do pagamento de contribuições à segurança social e do cumprimento das normas que regulam o contrato de trabalho.
Na verdade, nas circunstâncias em que as partes contrataram, o poder negocial das AA era praticamente inexistente, sendo, por isso, desajustada da realidade, a afirmação de que a protecção das partes se bastava com a simples recusa da contratação.
O Tribunal recorrido ponderou, ainda, os interesses em jogo – estabilidade e segurança no emprego -, não oferecendo dúvidas que a interpretação da declaração negocial no sentido da existência da subordinação jurídica é a que conduz ao maior equilíbrio das prestações e a que se mostra conforme à vontade das partes exteriorizada através dos indícios postos em destaque no acórdão recorrido.
Por outro lado, sendo este o elemento essencialmente caracterizador da relação de trabalho, manifestamente que perdem relevo outros aspectos focados na argumentação da recorrente.
Impõe-se, pois, concluir que a actividade exegética da Relação não merece censura e que os contratos celebrados entre as autoras e a ré C são contratos individuais de trabalho, dado que, através deles, as autoras assumiram a obrigação de, mediante retribuição, prestarem à ré C a actividade de promoção de venda, sob a autoridade e direcção desta.
Assim sendo, improcedem (ou ficam prejudicadas) as conclusões 4ª) a 9ª) da revista.

D - Vejamos, agora, se são válidas tanto as declarações rescisórias emitidas pelas autoras como os contratos celebrados entre as autoras e a 2ª ré e o celebrado entre as duas rés.
Faz-se esta apreciação conjunta, porque o acórdão recorrido entendeu que se estava perante uma actuação em cadeia, viciada por dolo, coacção, simulação e fraude à lei (artºs 240º-1-2, 253°-1, 255°-1, 256° e 281° do CC), actuação que se prolongou no tempo e que se desdobrou em vários actos devidamente concertados e articulados entre si e que tinham como objectivo: por um lado, contornar as normas imperativas aplicáveis às relações de trabalho subordinado e normas de interesse e ordem pública que obrigam as entidades patronais a pagar contribuições à Segurança Social por cada trabalhador ao seu serviço e a transferir para seguradoras a sua responsabilidade por acidentes de trabalho; por outro, fazer crer às autoridades competentes e às autoras que estas sempre estiveram vinculadas por contrato de prestação de serviço, primeiro à ré C até 31/12/96, depois à 2ª ré, a partir dessa data.
Em suma, que as declarações rescisórias dos contratos celebrados com a 1ª ré, a celebração de novos contratos com a 2ª ré e o próprio contrato celebrado entre as duas rés foram uma montagem, um artifício de que estas se serviram para enganar as autoras e o próprio Estado, o que fizeram aproveitando-se da “dependência, do receio e da necessidade das autoras em manter o seu trabalho como base da sua subsistência”.
O que está em causa é, pois, saber se as declarações rescisórias emitidas pelas autoras e os contratos celebrados entre as próprias rés (em 2.01.97) e entre as autoras e a 2ª ré (em Março de 1997, mas com a data de 1.01.97) são ou não válidos.
Tratando-se de declarações negociais, tem aqui aplicação a disciplina comum do Código Civil, relativa à falta e vícios da vontade.
Como é sabido a declaração de vontade (negocial) é constituída por dois elementos – declaração propriamente dita e vontade real – entre os quais pode existir divergência, por falta ou desvio de algum dos sub-elementos em que se desdobra o elemento interno (vontade de acção, vontade de acção como declaração e vontade de declaração negocial), divergência que pode ser intencional (o declarante tem consciência dela, mas emite livremente a declaração) e não intencional (o declarante não tem consciência da divergência ou, tendo-a, é forçado a emitir a declaração).
Pode haver ainda perturbações no processo formativo da vontade, de tal sorte que, embora não haja divergência entre a vontade real (elemento interno) e a declaração propriamente dita (comportamento que exterioriza aquela vontade), aquela se mostra “viciada”.

O nosso direito dá relevância autónoma a vários vícios da vontade. Interessa-nos os seguintes: erro-vício, dolo e coacção moral.
erro-vício quando a vontade é determinada por ignorância ou por uma ideia falsa. A lei prevê o erro sobre a pessoa do declaratário, sobre o objecto do negócio e sobre os motivos (artº 251º e 252º do CC).
O erro sobre os motivos é uma figura residual. Contempla o erro acerca da causa do negócio (de direito e de facto) e sobre a pessoa de terceiro.
O erro sobre o objecto do negócio pode incidir sobre o objecto imediato (sobre a sua identidade ou sobre a suas qualidades: julga-se que a coisa comprada é de ouro e afinal é de latão) ou sobre o objecto mediato (erro sobre a natureza do negócio: julga-se que é um arrendamento e, afinal, é um negócio de constituição de um usufruto).
dolo, quando o erro do declarante é determinado por um certo comportamento do declaratário (ou de terceiro) – quer por sugestão ou artifício, quer por dissimulação (do erro) – artº 253º do CC.
Diz-se feita por coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração, ameaça que tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro (artº 205º-1-2 do CC).
Olhando à matéria de facto, dela resulta que as autoras em 1993 celebraram com a ré C contratos através dos quais estas se obrigaram mediante retribuição a prestar para a ré a actividade de promoção de vendas, sob a autoridade e direcção desta, mas cujos termos, minutados pela ré, indevidamente estipulavam que o cumprimento das obrigações fiscais, bem como os encargos com a segurança social impendiam sobre as autoras e que os contratos, impropriamente designados por contratos de prestação de serviço, podiam ser denunciados livremente por qualquer das partes.
Face aos factos provados, temos também por seguro que as autoras, ao rescindirem os contratos de trabalho celebrados com a 1ª ré e seguidamente ao celebrarem novos contratos, em termos semelhantes, com a 2ª ré, o fizeram motivadas por erro. Ou seja, que os contratos celebrados em 1993 podiam ser livremente denunciados pela C e que esta, ao “sugerir” a cada uma a rescisão unilateral do respectivo contrato e ao “garantir-lhes” a celebração de contratos semelhantes com a 2ª ré, lhes estava, afinal, a dar a única possibilidade de manterem os seus “empregos.” Trata-se, pois, de erro, essencial, próprio e desculpável, sobre a causa dos negócios.
Resulta, ainda, da matéria provada que tal erro foi determinado por “sugestões e artifícios” da 1ª ré, uma grande empresa coadjuvada por bons advogados e que, por isso, não podia ignorar que um contrato que obrigava as autoras a prestarem a sua actividade de promoção de vendas sob a autoridade e direcção dos serviços da ré era um contrato de trabalho e, sendo-o, não podia conter cláusulas daquele tipo (ver clªs 4ª e 5ª dos citados contratos). A sugestão e o artifício consistiram justamente em fazer crer às autoras, socorrendo-se da designação e dos termos dos contratos celebrados em 1993 (ou, pelo menos, dissimulando o seu erro), que a ré podia denunciar livremente o contrato e que a rescisão e celebração de novo contrato com a 2ª ré constituíam a única via para manterem o emprego, nos moldes que tinham.
Impõe-se, pois, concluir que se verificam os requisitos do dolo: as autoras emitiram as declarações negociais, em erro; tal erro foi causado (ou dissimulado), conscientemente, pela ré; com artifício (artº 253º do CC).
Acresce que, mostrando-se provado que as autoras só assinaram as declarações de rescisão dos contratos celebrados em 1993, porque se convenceram de que, se não assinassem tais documentos, deixariam de trabalhar para a C, isto também aponta para a existência de coacção moral (artº 255º e 256º do CC).
Com efeito, deixar de trabalhar para a C, significava perder o “modo de vida” que tinham – por outras palavras, perder o “emprego”. Ora, se a ré, que, como já se referiu, tinha conhecimento da real situação jurídica das autoras, adoptou um comportamento que as convenceu de que a não assinatura das declarações rescisórias teria como consequência a perda de emprego e se foi o receio da verificação deste mal que determinou as autoras a emitirem tais declarações, impõe-se concluir que, ao rescindirem os contratos, a vontade das autoras se mostrava viciada (por coacção moral), concorrendo, no caso, os requisitos geradores da invalidade do negócio (essencialidade, intenção, gravidade do mal e ilicitude da ameaça - artºs 255º e 256º do CC).
Isto significa que a resposta restritiva ao ponto nº 80 da BI não tem o relevo que a recorrente lhe atribui.
Também não vale a sua argumentação, quando se posiciona como titular dum contrato de prestação de serviço que podia ser livremente denunciado por qualquer das partes. O posicionamento deve ser outro – como titular dum contrato de trabalho, impropriamente designado de contrato de prestação de serviço.
Nesta perspectiva, faz todo o sentido que a 1ª ré se quisesse acautelar, “coagindo” as autoras a porem, unilateralmente, fim aos contratos celebrados.
Aliás, não deixa de ser sintomático o facto de a 1ª ré não ter optado por denunciar os contratos. Se, na verdade, estava tão segura de poder enveredar livremente por esta via, não se compreende por que não quis, ela própria, pôr termo às relações contratuais existentes, sendo certo que tal denúncia não constituiria obstáculo a que a ré D pudesse contratar de imediato as autoras. Na verdade, se esta, por causa do contrato que celebrou com a C, “tinha inevitavelmente de aumentar de forma significativa o número de promotoras, sob pena de incumprir o contrato”, como defende a recorrente, e se a opção mais segura, económica e imediata era contratar “quem, estando disponível, já tinha experiência na promoção de tais produtos” – o caso das autoras – então, menos se compreende a “pressão” da ré no sentido da rescisão do contrato por parte das autoras (ver respostas aos pontos nºs 74, 75 e 76 da BI).
Não releva, pois, a argumentação da recorrente.
Resta ver qual o papel desempenhado pela D Portugal neste processo, o que coloca a seguinte questão: a de saber se esta colaborou no engano das autoras, através duma posição concertada com a 1ª ré, levando-as, também com a sua atitude, a rescindirem os contratos existentes e a formalizarem novos contratos, em termos idênticos aos anteriores, mas agora tendo como contraparte a 2ª ré. Por outras palavras, se o erro das autoras também foi determinado por dolo da 2ª ré (por um certo comportamento dos seus representantes ou agentes).
O acórdão recorrido diz que sim, extraindo ilações dos factos provados, num contexto que não merece censura.
Partindo do pressuposto – correcto – que a posição assumida pela C na reunião de 16.12.96 visava colocar as AA entre a “espada e a parede” e obrigá-las a rescindir os contratos celebrados com ela, em 1993, e a celebrar novos, datados de 1997, tendo como contraparte a 2ª ré, o Tribunal recorrido considerou que este plano implicava, pelo menos, um acordo entre as duas rés, já que a ré D Portugal se dispunha a viabilizar aquele, apesar de conhecer o modo como as AA faziam o trabalho de promoção para a 1ª ré e, portanto, a relação contratual existente entre aquelas e esta.
Inferiu aquele acerto prévio e este conhecimento:
- do teor da comunicação feita pela ré às autoras naquela reunião (que de futuro a contratação das promoções para a C seria feita através da 2ª ré, estando esta disposta a contratar de imediato as autoras, caso rescindissem unilateralmente os contratos existentes);
- da forma como as AA foram contratadas pela 2ª ré (sem que aquelas se tivessem inscrito ou candidatado para tal ou se tivessem sujeitado a quaisquer provas de selecção; sem que a D, por si, tivesse anunciado que as queria contratar ou mesmo estabelecido contactos para esse fim, sendo inclusive a 1ª ré que, em Março de 1997, informou as autoras que podiam dirigir-se aos escritórios da D para assinarem os novos contratos);
- dos termos dos novos contratos (semelhantes aos celebrados com a 1ª ré);
- da situação que resultou das novas contratações (as autoras e as outras promotoras continuaram a fazer as promoções da 1ª ré como até ali; embora fossem contactadas e pagas pela 2ª ré, a verdade é que era a 1ª ré quem fixava unilateralmente as promoções a realizar, quem elaborava a programação mensal das acções promocionais, com identificação das lojas onde deviam ocorrer e os dias em que tinham lugar, quem fiscalizava a actividade das promotoras e quem fornecia o equipamento e os adereços necessários às acções promocionais, sendo ainda certo que o preço/hora pago às AA – 787$50 - não sofreu alteração, mas o preço/hora – 900$00 - que a 1ª ré se obrigou a pagar à 2ª ré era superior);
- do facto de haver uma razão para a atitude concertada das rés (ser importante e vantajoso para a 1ª ré desvincular-se duma relação que já durava desde 1993 e não era conforme à lei, face à posição que a IDICT, na altura, estava adoptando em relação aos “promotores” e “repositores” que trabalhavam nas grandes superfícies comerciais e à jurisprudência que se estava firmando sobre situações idênticas às das autoras, pois desse modo evitava o risco de ser autuada por aquela entidade e condenada pelos tribunais em multas, custas e indemnizações; ser também vantajoso para a 2ª ré na medida em que ficando numa posição mais confortável (não só pela data da contratação, mas pelo modo menos claro como surgia a subordinação jurídica à 2ª ré), concretizava uma forma de receber proventos;
- e dos termos do contrato celebrado entre as rés em 2.01.97.
Ora, estando concretizada uma actuação da 2ª ré que se enquadra na figura do dolo, prevista no artº 253º do CC, na medida em que, pactuando com a 1ª ré nos termos referidos, também concorreu para causar (ou dissimular), conscientemente, o erro das AA, nada obstará a que se conclua pela invalidade das declarações negociais das autoras nos “contratos de prestação de serviço” celebrados com a 2ª ré (documentos a fls 69 e sgs), invalidade, cuja declaração foi pedida pelas autoras (nº 9 do pedido), sem esquecer que o julgador não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artº 664º do CPC) (3).
E isto, independentemente de ser ou não válido o contrato celebrado entre as duas rés em 2.01.97, que é a questão que passamos a apreciar.
O acórdão recorrido diz que é nulo, apelando para a figura da simulação.
Como é sabido para que se possa falar de simulação é preciso que se verifiquem três elementos: intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração (a divergência tem que ser livre e propositada); acordo entre o declarante e o declaratário (acordo simulatório); intuito de enganar terceiros.
A simulação pode ser absoluta (as partes fingem realizar um negócio que efectivamente não pretendem realizar – por exemplo, a chamada “venda fantástica”) ou relativa (as partes fingem realizar um negócio diverso daquele que pretendem concluir; ou seja, há um negócio simulado e outro dissimulado – por ex. uma venda disfarçada de doação).
A simulação relativa pode revestir as seguintes modalidades: simulação de sujeitos e simulação sobre o conteúdo do negócio, podendo esta incidir sobre a natureza deste (doação em vez de venda .....) ou sobre o valor da prestação (simulação do preço ....).
O acórdão recorrido entendeu que no caso dos autos se mostrava configurada uma simulação relativa (de sujeitos).
Nesta modalidade, verifica-se uma interposição fictícia de pessoas, decorrendo dum conluio entre os sujeitos reais e o interposto.
Segundo o acórdão recorrido o interposto seria a ré D os sujeitos reais a 1ª ré e as autoras.
Esta modalidade pressupõe a realização de dois negócios, segundo este esquema: um dos sujeitos reais celebra um negócio com o interposto, que, por sua vez, celebra outro negócio com o outro sujeito real.
Neste contexto, nem o interposto quer realmente vincular-se aos sujeitos reais, nem estes ao interposto, que funciona como testa de ferro, homem de palha (4).
No caso dos autos, temos um “contrato de prestação de serviço” celebrado entre a as duas rés em 2.01.97, através do qual a D se obrigou a prestar à C, remuneradamente, os serviços de Merchandising constantes da memória descritiva, anexa ao contrato, conforme documento junto a fls 176 e segs e, ainda, dois contratos de prestação de serviço, celebrados pela 2ª ré, um deles com a autora A e o outro com a autora B, através dos quais estas se obrigaram a prestar àquela os serviços que esta lhe viesse a solicitar no âmbito do lançamento de campanhas de promoção de vendas de produtos diversos em espaços comerciais adequados ...... (docs a fls 69 e sgs).
Segundo o acórdão recorrido, estaríamos perante uma simulação fictícia de pessoas.
Como já se referiu, para que se possa falar de simulação é necessário antes de mais que haja divergência intencional entre a vontade e a declaração. Reportando-nos ao caso dos autos: seria necessário que as declarações que as rés e as autoras emitiram, aquando da celebração dos referidos contratos, não correspondessem à sua vontade real, sendo essa divergência intencional.
Como já deixámos expresso, nem foi alegado, nem sustentado por qualquer das instâncias que tenha havido uma divergência intencional entre a vontade real das autoras e as declarações que emitiram, nos contratos realizados com a 2ª ré, mas, antes, que estas contrataram em erro, por terem sido enganadas pelas rés (ver nota nº 3).
Resta saber se se verificam os pressupostos da simulação relativamente ao contrato celebrado entre as duas rés.
Para demonstrar a existência desta divergência (e a sua razão de ser) foi levada à base instrutória a seguinte matéria, sob os nºs 146,150 e 151:
(146) – Para justificarem o facto das promotoras terem continuado, mesmo depois de Janeiro de 1997, a trabalhar com os produtos da C e continuado sujeitas, como até então, às ordens e directrizes da C, as RR celebraram entre si um contrato denominado de prestação de serviço?
(150) – As duas RR bem sabiam que tal contrato não passava duma “capa” para a C poder continuar a usar as mesmas promotoras sem correr o risco de ser sancionada pela IGT e sem ter que suportar as remunerações, as indemnizações e os descontos próprios do trabalho subordinado?
(151) – Simultaneamente servia de “capa” para a D poder tornear apertados requisitos legais que disciplinam a “cedência temporária” de pessoal, requisitos que a D não possui?
Acontece que o primeiro quesito mereceu resposta restritiva (provado apenas que as RR celebraram, em 01.01.97, entre si, um contrato denominado de prestação de serviço, com o teor constante de fls 176 a 180) e os outros dois, resposta negativa.
Ora, se é verdade que a Relação não está impedida de extrair presunções judiciais a partir da matéria dada como provada, não o poderá fazer se o facto (desconhecido) inferido ou deduzido tiver sido levado à base instrutória e não tiver sido dado como provado pelo julgador.
Acresce que se é seguro resultar da matéria de facto a existência da figura do dolo (artº 253º do CC), determinante da invalidade das declarações rescisórias das AA e dos contratos que estas celebraram com a 2ª ré, o mesmo não acontece quanto à verificação dos requisitos da simulação.
Tem interesse sublinhar que a invalidade (5) dos contratos celebrados com as autoras não foi impugnada em recurso pela ré contratante (a ré D).
Assim, improcedem as conclusões nºs 10, 11, 12 e 14 das conclusões e procede, em parte, a conclusão nº 13.

E - Aqui chegados, é altura de decidir se tem aqui aplicação o disposto no artº 13º-2 da LCCT.
Relembremos que, na 1ª instância, a ré C foi condenada a pagar às autoras todas as prestações vencidas desde 1.01.97 até à integração das autoras, em montante a apurar em sede de liquidação de sentença, correspondentes aos valores que as mesmas aufeririam se estivessem ao serviço da ré C, incluindo subsídio de férias e de Natal, sendo estes também devidos desde o início dos contratos das autoras até 31.12.96, a que acrescem juros de mora legais desde a data do seu vencimento até efectivo pagamento.
Sustentando que a condenação ficou aquém do pedido, as autoras, na apelação que interpuseram, concluíram no sentido de a condenação ser ampliada de forma a abranger o pagamento de outras prestações.
Dando em parte razão às autoras, a Relação condenou a ré C a pagar a cada uma das autoras as retribuições de férias a que tinham direito, desde a data da sua admissão até à data da interrupção de funções, bem como o subsídio de transporte relativo ao período compreendido entre 1.01.97 e a data da interrupção de funções, relegando-se a liquidação de ambos os créditos para a execução de sentença.
Sustenta a recorrente, no presente recurso, que, decidindo-se como se decidiu, então, a situação deve ser equiparada à de um despedimento ilícito, sendo-lhe aplicável o disposto no artº 13º-2 do LCCT.
Entendemos que tem razão.
Na verdade, qualificando como contratos de trabalho sem termo os contratos celebrados, em 1993, entre as AA e a ré C, temos que tirar daí todas as consequências.
Ao comunicar às autoras, na reunião de 16.12.96, que deixava de ter promotoras por ela contratadas ... e que esta opção de gestão era inegociável, tendo preparado um documento com vista à rescisão dos respectivos contratos, a ré mais não fez do que anunciar às autoras o termo daqueles. E porque as rescisões contratuais nas circunstâncias descritas foram induzidas pela 1ª ré com o fim de obter por via indirecta aquele objectivo, é na vontade e iniciativa desta que radica, verdadeiramente, a cessação dos contratos de trabalho celebrados com as autoras. Nesta medida, deve tal situação ser equiparada à de um despedimento ilícito (sem justa causa), para efeitos de aplicação do citado artº 13º (quanto mais não seja, por interpretação extensiva do preceito).
No âmbito do despedimento ilícito, entende-se que “o direito do trabalhador a auferir as retribuições vencidas entre a data do despedimento e a data da sentença – vulgarmente designadas como «salários intercalares» - explica-se pela conjugação do regime geral da invalidade com as regras sobre o cumprimento e incumprimento das obrigações”.
Assim, “declarada a invalidade, e uma vez que essa declaração tem eficácia retroactiva, tudo se passa como se o vínculo existente entre as partes sempre tivesse produzido os seus efeitos, maxime a constituição do empregador no dever de pagar a remuneração e do trabalhador na obrigação de prestar a actividade prometida”.
Uma vez, porém, que a execução da prestação laboral foi impossibilitada pelo empregador, justifica-se que o trabalhador não perca o direito à respectiva contraprestação, apesar de ficar exonerado da sua prestação.
Tal direito “mais não é do que a consequência normal ou natural do funcionamento do conjunto das regras próprias da invalidade dos actos jurídicos e das normas sobre a impossibilidade” da prestação.
O regime consagrado no citado artº 13º-1-a) está em consonância com tais regras, representando as deduções previstas no nº 2-b) do mesmo artigo uma aplicação especial do regime geral consagrado no artº 795º-2 do CC (alcançando o devedor algum benefício com a exoneração, deverá o valor do benefício ser descontado na contraprestação). (6)
Dado que, no caso presente, se está perante situações de invalidade negocial, com eficácia retroactiva, tendo na sua base uma situação equiparável à dum despedimento sem justa causa, por parte da ré C, justifica-se que, sendo esta condenada a pagar às autoras importâncias correspondentes ao valor das retribuições vencidas desde 1.01.97 até à respectiva reintegração, em montante a apurar em sede de liquidação de sentença, retribuições correspondentes aos valores que as mesmas aufeririam se estivessem ao serviço da ré C (...), justifica-se – repetimos – que esta beneficie das deduções previstas no citado artº 13º-2 (7), a liquidar em execução de sentença.
Neste contexto, procede a conclusão 14ª, na sua parte final (8).

E – Sanção pecuniária compulsória
O tribunal da 1ª instância decidiu condenar a ré C no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de 50.000$00 (249,40 euros) por cada autora e por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação.
A Relação manteve a condenação, considerando que se estava perante uma prestação de facto infungível positivo. Alterou, porém, o quantitativo da sanção, reduzindo-o para 100 euros.
A recorrente sustenta que a sanção prevista no artº 829º-A do CC não tem aqui aplicação. Argumenta, citando Pedro Furtado Martins (in “Despedimento Ilícito ... pp. 167 e ss), que “falar em cumprimento ou incumprimento da reintegração não tem verdadeiro sentido”, pois em “termos jurídicos a questão não é a de saber se o empregador cumpre ou não a condenação na reintegração, e sim averiguar se ele satisfaz ou não as obrigações que do vínculo jurídico resultam para si”, com especial destaque para o dever de retribuição.

Acrescenta que, no plano substancial, a reintegração não tem valor autónomo, não sendo, só por si, susceptível de execução e que outros meios de defesa contra o incumprimento do empregador – não pagamento da retribuição – resolvem-se através duma acção executiva.
Quanto ao montante fixado (€ 100/dia), considera-o excessivo, argumentando que é superior ao triplo da (última) remuneração diária de cada uma das autoras, sendo certo que o pagamento da sanção abrange todos os dias – úteis e não úteis. Para o caso de ser mantida a aplicação da sanção pecuniária, pretende que o respectivo valor seja reduzido a € 25 diários (como consta do corpo das alegações e não € 100, como, por lapso, se refere nas conclusões).

Todos sabemos que a razão de ser da sanção pecuniária compulsória se alicerça na insuficiência e incapacidade da execução específica para, em certos casos, assegurar o cumprimento das sentenças de condenação.
E também não oferece dúvidas que são insusceptíveis de execução específica as obrigações de prestação de facto infungível - aquelas cujo cumprimento só pode ser feito pelo devedor, por só este satisfazer o interesse do credor. Neste caso, o credor pode pedir e obter judicialmente a condenação do devedor no cumprimento da prestação. Porém, se ele não cumprir, o processo de execução não prevê nenhuma forma de obter o resultado prático do cumprimento.
A sanção pecuniária compulsória está prevista no artº 829º-A do CC. Como a sua própria designação indica é uma medida coercitiva, de natureza pecuniária, traduzindo-se numa condenação acessória da condenação principal. Visa compelir o devedor a cumprir, sob a ameaça do pagamento duma determinada quantia por cada período de atraso no cumprimento da prestação ou por cada infracção. É uma medida marcadamente preventiva. A ameaça só se converte em “sanção”, se o devedor resolver não cumprir, suportando a desvantagem monetária daí decorrente, desvantagem, todavia, que não o liberta da obrigação principal.
Do nº 1 do citado artº 829º-A resulta clara a natureza subsidiária da medida adoptada. O legislador não consagrou a sanção pecuniária compulsória como mecanismo coercitivo de aplicação geral, reservando a sua aplicação para os casos em que a execução específica não tem lugar (prestações de facere e de non facere), (9) em virtude do cumprimento exigir a intervenção insubstituível do devedor.
Diz a recorrente, com a argumentação a que já se fez referência, que a situação em apreço não cabe na previsão do artº 829º-A, nº 1.
Sem razão, porém.
É certo que a condenação da ré a reintegrar as autoras, mais não é do que a condenação daquela a cumprir os contratos celebrados com as autoras, os quais, dada a eficácia retroactiva da invalidade dos actos posteriores, continuam validamente a vinculá-la.
Simplesmente reintegrar não se esgota nem se satisfaz com a “garantia” do pagamento da retribuição salarial por parte do empregador. Implica também a realização da prestação laboral, “como meio de desenvolvimento da personalidade e da dignidade do próprio trabalhador”.
Como já se referiu, a situação presente é equivalente à de um despedimento ilícito. Estando as autoras desligadas de facto do seu emprego, embora juridicamente se mantenha o vínculo contratual, só a “reintegração” permitirá a reactivação efectiva desta relação. Reactivação que passa por a ré abrir as portas da empresa “e, antes ainda de cumprir a obrigação de prestar a retribuição”, fazer tudo o que se mostre necessário para que as autoras possam cumprir as suas obrigações. A “reentrada” do trabalhador constitui, assim, uma condição “preliminar ou instrumental à realização efectiva da prestação laboral”. Por isso, se fala num direito (dos trabalhadores) à reintegração e num dever (do empregador) à reinserção do trabalhador no local de trabalho. Tratando-se duma obrigação de facere, que só pode ser cumprida pela própria ré (obrigação de prestação de facto infungível), justifica-se a aplicação da medida coercitiva prevista no nº 1 do citado artº 829º-A.
A ré também discorda do montante fixado. Diz que o valor da sanção deve ser reduzido a € 25 diários.
A sua argumentação não convence.
Como refere João Calvão da Silva (in Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, pg 418), autor que temos vindo a seguir, destinando-se esta medida a provocar o cumprimento e a obediência à sentença de condenação, o juiz deve fixar um montante que se mostre capaz de pressionar e intimidar o obrigado, vencendo a resistência da sua oposição, indiferença ou falta de diligência. A lei não estabelece qualquer critério, nem fixa os parâmetros em que o juiz se deva mover. A este caberá determinar, perante as circunstâncias do caso concreto, o montante que considera mais eficaz, dentro dum critério de razoabilidade (equidade). Uma das circunstâncias a ter em conta são as possibilidades económicas do devedor, sem perder de vista, por uma questão de equilíbrio, o valor do interesse do credor na prestação em dívida (10).
Ora, tendo presente que a ré é uma grande empresa, bem implantada no mercado, com uma boa situação económica, e que o interesse das autoras em ser reintegradas não pode deixar de ser grande, considera-se equitativamente fixado o montante diário de € 100, a título de sanção pecuniária compulsória, a pagar pela ré, por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de integração relativamente a cada uma das autoras, não se afigurando que um quantitativo inferior fosse ameaça bastante para forçar a resistência da ré a cumprir o decidido pelo tribunal.
Improcede, pois, a conclusão 15ª da revista.

F – Litigância de má fé.
Em recurso, apenas está em causa a condenação da 1ª ré.
A Relação considerou que esta tinha litigado de má fé em virtude de ter deduzido oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, ter alterado a verdade dos factos e negado outros, de natureza pessoal, que eram relevantes para a decisão.
Para chegar a este entendimento o Tribunal fez um confronto rigoroso entre a matéria alegada pela ré e os factos que resultaram provados.
Apurou o seguinte:
a) Foi alegado pela ré na contestação (nº 50) que as AA. desempenharam sempre e apenas a actividade de promotoras e nunca tiveram a seu cargo funções de reposição; contudo o que se provou foi o que consta da resposta aos pontos nºs 15, 16, 20, 21, 22, 23 e 32, m) da base instrutória (que, além, da função de promotoras, as AA. tinham que proceder à verificação de todos os produtos da Central de Cervejas no linear e à limpeza e reposição do mesmo; tinham que colocar bebidas nas prateleiras e nos locais de venda, proceder à contagem e ao controlo dos stocks e, em caso de falta, à sua reposição nas prateleiras; tinham também que controlar os preços dos produtos da concorrência e, sempre que lhes era determinado pela C, deslocavam-se às instalações desta ... ou a outros locais onde a ré considerasse a sua colaboração necessária, tendo chegado a distribuir bebidas em locais públicos, tal como sucedeu numa festa equestre em Benavente, em 11.06.95 (......), folhetos publicitários da Central de Cervejas nas caixas do correio e, por vezes, também durante jogos de futebol.
b) Foi também alegado pela ré no mesmo articulado que as AA. foram contratadas para cada acção promocional concreta, num determinado local e com uma duração pré-fixa, a qual por regra se desenvolvia entre as 4ªs feiras e o domingo imediato (nº 46); que as AA. nunca lhe prestaram uma colaboração permanente e duradoura (nº 124); que os serviços prestados pelas AA. sempre assumiram a característica da descontinuidade, em virtude de corresponderem a necessidades extraordinárias e ocasionais (nº 130) e que as AA. sempre puderam exercer livremente a sua actividade a favor de outros produtores (art. 75); contudo o que ficou provado é o que consta da resposta aos pontos nºs 43, 44, 45, 50, 53,54 e 55 da BI (que as AA., desde que foram admitidas ao serviço da ré C, trabalharam sempre ininterrupta e exclusivamente para esta, mediante o pagamento de determinada retribuição, que constituía a totalidade dos rendimentos por elas auferidos, nunca tendo cumulado essa sua actividade com outras actividades remuneradas para terceiros; que descansavam aos Sábados e Domingos, quando faziam promoção no Cash and Carry, e às 2" e 3°s feiras, quando faziam promoção nas grandes superfícies).
c) Alegou, ainda, a ré C, no mesmo articulado, que as AA. sempre exerceram a sua actividade com inteira independência em relação à empresa e em relação aos trabalhadores que estavam ao serviço desta (nº 51); que as autoras não estavam sujeitas a ordens e orientações ditadas pela ré (nº 58), nem a qualquer horário de trabalho (nº 60); que a ré nunca exerceu qualquer forma de controlo da presença das AA. nos locais onde decorriam as promoções que lhes cabia executar (nº 65) e que, a partir de 1.01.97, as AA. não intervieram em qualquer acção promocional por indicação da 1ª ré (nº 106); todavia o que ficou provado foi o que consta das respostas aos pontos n°s 35, 36, 37, 47, 48, 93, 94, 95, 98, 173, 174 e 175 da BI (que era a C quem estipulava às AA. as tarefas a realizar em cada serviço de promoção, os estabelecimentos a visitar e os dias em que não realizavam promoção; que o serviço de promoção estava sujeito a um horário previamente estabelecido pela C e acordado entre esta e os pontos de venda; que o horário das autoras era, normalmente, das 0900 às 19H00, nos chamados "Cash and Carry ", e das 10 horas às 20 horas, no Pingo Doce e nos restantes super e hipermercados, horário esse que era composto de 8 horas de trabalho efectivo e de uma hora de intervalo para almoço - geralmente entre as 13 horas e as 14 horas -, sendo as entradas e saídas das AA. controladas pela Ré C; que, em 1997, as AA. continuaram a trabalhar para a C, tal como até então, não se alterando o seu dia a dia, no tocante ao tipo de trabalho realizado, já que os locais onde exerciam a sua actividade continuaram a ser os mesmos, sendo os chefes de equipa da C que lhes davam instruções e lhes distribuíam e controlavam o trabalho e a que reportavam diariamente ...).
Diz a recorrente que se limitou a agir ao longo do processo, na defesa daquilo que sempre considerou ser o seu direito e que a sua conduta processual não pode ser taxada, nem de dolosa, nem de gravemente negligente só porque sucumbiu na prova de alguns factos não essenciais para a decisão da causa, sendo certo que o tribunal silenciou (nºs 165 a 167 e 176, supra em III) e hipervalorizou outros.
Como é sabido, a acção é um instrumento posto à disposição dos interessados para fazerem valer em juízo as suas pretensões.
No artº 266º-A do CPC consagra-se um dever geral de probidade. “As partes devem agir de boa fé e observar os deveres de cooperação resultantes do preceituado no artigo anterior.”
É a violação deste dever (conduta ilícita), de forma dolosa (lide dolosa) ou gravemente negligente (lide temerária), que configura a litigância de má fé.
O artº 456º-2 do CPC tipifica essas violações.
É litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção de justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
(....)
Ora, do confronto da matéria alegada e provada verifica-se e conclui-se que a ré alterou conscientemente a verdade dos factos para obter este resultado: que a relação existente entre ela e as AA desde 1993 não fosse qualificada de “laboral”, mas sim de prestação de serviço, sendo certo que esta qualificação condicionava o sucesso da acção.
Não estamos, pois, perante uma defesa meramente infundada, por incorrecta interpretação ou aplicação da lei, nem perante uma situação de sucumbência na prova. Do que se trata é que a ré alegou uma versão (contraditória da das autoras) que não se provou, provando-se, em contrapartida, a outra versão, que incluía factos que a ré, pessoalmente, conhecia.
Esta situação vale, por si, não sendo afectada pela prova dos factos que a recorrente diz terem sido silenciados pelo tribunal. Sempre se dirá, porém, que esses factos têm mais a ver com a convicção e os receios das autoras - receios que se compreendem, face à denominação dada pela ré aos contratos e às cláusulas que, neles, inseriu - do que com a realidade.
Assim sendo, não merece censura, nesta parte, o acórdão recorrido (conclusão nº 16 da revista).

V – Decidindo
Nestes termos, concedendo parcial revista, acordam em revogar o acórdão recorrido na parte em que declarou nulo o contrato celebrado entre as RR "C-Central de Cervejas, S.A." e "D-Merchandising de Portugal, Lda." e em reconhecer à recorrente o direito às deduções previstas no nº 2 do artº 13º do DL nº 64-A/89, de 27-02, a liquidar em execução de sentença.
No mais, mantém-se o decidido.
Custas por recorrente e recorridas, na proporção respectiva de 9/10 e 1/10.

Lisboa, 7 de Outubro de 2004
Maria Laura Leornardo
Vítor Mesquita
Fernandes Cadilha
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(1) Lopes do Rego, in “Comentários ao Código Processo Civil”, I, pg 622.
(2) Manuel Andrade, in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, II, Coimbra, 1960, pg 313, nota 1.
(3) Sublinha-se que relativamente ao contrato celebrado entre as autoras e a 2ª ré não foi alegado, nem sustentado por qualquer das instâncias, que tenha havido uma divergência intencional entre a vontade real das autoras e as declarações que emitiram, ou seja, que elas tenham agido simuladamente, mas, antes, que contrataram em erro, por terem sido enganadas pelas rés.
(4) Manuel de Andrade, in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, II, pg 187; veja-se também, Luís A. Carvalho Fernandes, in “Teoria Geral do Direito Civil”, II, 262.
(5) Embora a Relação não tenha declarado expressamente a invalidade dos contratos celebrados entre as autoras e a 2ª ré, a verdade é que esse efeito decorre da declaração de nulidade constante no nº 3 da parte decisória do acórdão recorrido e está expressamente referida na sua fundamentação quando afirma que houve uma actuação das RR em cadeia, viciada por dolo, coacção, simulação e fraude à lei (artºs 240º-1-2, 253º-1, 255º-1, 256º e 281º do CC), actuação que se prolongou no tempo e que deve considerar-se nula e de nenhum efeito, mantendo-se as relações contratuais decorrentes dos contratos celebrados em 1993 entre as autoras e a 1ª ré (o menos está contido no mais).
(6) Pedro Furtado Martins, in “Cessação do Contrato de Trabalho”, pgs 148 – 150 e “Despedimento Ilícito, Reintegração na Empresa e Dever de Ocupação Efectiva”, 1992, pgs 124 e sgs.
(7) Lembremos que as autoras, a B até fins de Julho de 1997 e a A até Novembro do mesmo ano (ver respostas aos nºs 121 e 122 da BI) continuaram a fazer promoções para a C, que esta pagava (indirectamente).
(8) No pressuposto de que quem pretende o mais (absolvição no pedido), também quer o menos.
(9) A lógica do carácter subsidiário da sanção pecuniária compulsória é quebrada no nº 4 do citado preceito.
(10) Pires de Lima e Antunes Varela, in CCA, II, anot. nº 5 ao artº 829º-A do CC.