Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2303/08.7TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 1ª. SECÇÃO
Relator: HELDER ROQUE
Descritores: ACÓRDÃO RECORRIDO
VENCIMENTO
RECLAMAÇÃO
LEGITIMIDADE
CONTRATO-PROMESSA
CULPA IN CONTRAHENDO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
SINAL
LIMITE DA INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 06/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGÓCIO JURÍDICO / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS / CONTRATO-PROMESSA.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA ( EFEITOS DA SENTENÇA ) / RECURSOS / RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA.
Doutrina:
- Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil” Anotado, V, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, 141.
- Almeida Costa, Contrato-Promessa, Uma Síntese do Regime Vigente, 7.ª edição, revista e actualizada, 2001, 11 e 12; na RLJ, Ano 116.º, 148.
- Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 1970, Almedina, 211; Das Obrigações em Geral, I, 9.ª edição, revista e actualizada, 1998, Almedina, 381.
- Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 12.ª edição, revista e aumentada, 2007, Almedina, 27, 95 a 97, 266-267, 150-151.
- Galvão Telles, Direito das Obrigações, 7ª edição, revista e atulizada, 1997, Coimbra Editora, 102; Manual dos Contratos em Geral, 4.ª edição, 2002, Coimbra Editora, 207.
- Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1º volume, 1990, AAFDL, 481.
- Miguel Teixeira de Sousa, “Legitimidade e interesse no recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade”, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Armando M. Marques Guedes, FDUL, 2004, 948.
- Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição, por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, 2005, Coimbra Editora, 653.
- Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil” Anotado, I, 4ª edição, revista e actualizada, com a colaboração de Henrique Mesquita, Coimbra Editora, 1987, 418.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 227.º, N.º 1, 350.º, N.º 2, 410.º, 441.º, 442.º, N.ºS 2 E 4, 809.º, 830.º, N.º 2.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 620.º, N.º1, 636.º, N.º1, 652.º, N.ºS 3 E 4, 666.º, N.º 2, 679.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 12-1-1994, CJ (STJ), ANO II (1994), T1, 31.
-DE 28-5-1995, CJ (STJ), ANO III (1995), T1, 144.
-DE 06-05-2004, P.º N.º 03B4295,EM WWW.DGSI.PT .
-DE 09-09-2010, P.º N.º 1141/97, SUMÁRIOS DO STJ, SETEMBRO/2010; DE 10-10-2003, P.º N.º 03S744, WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I - Não tendo a ré interposto recurso do acórdão da Relação respeitante à taxa de juros da condenação mas, tão-só, a autora, e nem sequer, em sede de contra-alegações, requerido, subsidiariamente, a sua ampliação, não se considerando aquela vencida no acórdão recorrido, nesta matéria, não pode considerar-se prejudicada pela decisão singular do relator que julgou extinta a instância recursiva e não conheceu do objeto do recurso de revista interposto pela autora quanto à mesma matéria, sendo, consequentemente, inadmissível a reclamação formulada pela ré, ao abrigo do disposto no art. 652.º, n.º 3, do CPC.

II - Não é a respeito dos negócios preliminares, em que se inclui o contrato-promessa, e cuja violação gera a responsabilidade própria do incumprimento do contrato, que se coloca a questão da responsabilidade na formação dos contratos, mas antes a propósito dos ditos atos pré-negociais destituídos de qualquer garantia específica.

III - No âmbito do contrato-promessa, está-se fora da responsabilidade pré-contratual (culpa in contrahendo), pois o que se verifica, então, é a responsabilidade pelo incumprimento do contrato (culpa in contractu), uma vez que os atos preparatórios de um contrato definitivo de compra e venda de imóveis revestem natureza negocial, tendo-se autonomizado quando assumem a figura do contrato-promessa.

IV - O contrato-promessa, embora se distinga do contrato prometido, situando-se entre a fase pré-contratual e o contrato definitivo, traduz-se numa convenção completa, revestindo, em princípio, a natureza de um puro contrato obrigacional, ao qual são aplicáveis, em princípio, as disposições legais relativas ao contrato prometido.

V - As disposições legais relativas ao contrato prometido são as que contendem com a responsabilidade contratual e não com a responsabilidade pré-negocial.

VI - A presuntiva natureza confirmatória do sinal resulta, desde logo, do facto de as partes quando celebram um contrato se vinculam, em princípio, de modo irrevogável, e não se reservam na faculdade de retração ou de recesso do contrato, ou seja, na faculdade de arrependimento, reforçando-se, igualmente, face à anormalidade que o sinal penitencial apresenta num sistema jurídico que consagra a nulidade da cláusula de irrenunciabilidade prévia do credor ao direito de pedir o cumprimento.

VII - O sinal penitencial, apenas, deve ter lugar quando resulte da lei, ou de uma inequívoca vontade das partes, em que convencione, expressamente, a faculdade de arrependimento.

VIII - O sinal confirmatório apresenta uma dupla função, desde logo, a precípua finalidade do reforço dos vínculos nascentes do contrato e a coerção indireta do devedor ao seu cumprimento, mas, também, a fixação prévia e convencional do quantitativo da indemnização devida, em caso de não cumprimento imputável a uma das partes, independentemente do montante até da existência do dano efetivo.

IX - A fixação preventiva e convencional da indemnização devida pelo não cumprimento, é determinada, invariavelmente, pelo regime-regra da perda do sinal ou do pagamento em dobro do mesmo, ou, como limite mínimo de indemnização devida, se tiver sido estipulada convenção em contrário.

X - Tendo havido prestação de sinal, pelo promitente-comprador, sem tradição da coisa, deixando o promitente vendedor de celebrar o contrato definitivo, a indemnização pelos danos provenientes do não cumprimento corresponde ao dobro do sinal prestado, inexistindo, na ausência de estipulação em contrário, o direito de reclamar qualquer outra indemnização suplementar.

XI - Não sendo eficaz a existência do sinal como meio de coerção ao cumprimento do contrato, o mesmo funciona como veículo ressarcidor do dano, por não ser de aplicar o mecanismo do enriquecimento sem causa, dada a natureza subsidiária deste instituto.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]:

“AA – TRANSACÇÕES IMOBILIÁRIAS, LDA”, com a atual denominação de “BB – Investimentos Imobiliários, S.A.”, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “Rede Ferroviária Nacional Refer – EP”, pedindo que, na sua procedência, a ré seja condenada, em alternativa, a celebrar a escritura, sob a égide da execução específica [a] a devolver à autora o dobro do que esta prestou, mais os €250.000,00, mencionados, supra, em 202 e 203 (custos que a autora teve de suportar, ao nível dos projectos, das taxas municipais e de tudo o mais que despendeu na prossecução dos dois processos de licenciamento incidentes sobre o decorrente prédio urbano), tudo acrescido de juros de mora, à taxa máxima legal, agora e no futuro, desde a citação e até pleno cumprimento, alegando, para tanto, em síntese, que celebrou com a ré, no dia 2 de março de 1996, um contrato–promessa, no qual esta prometeu vender uma parcela de terreno, com a área de 8.119m2, que, apesar de só incluir bens imóveis não adstritos ao serviço público ferroviário, estava afeta ao domínio público, mas cuja desafetação e inscrição no registo predial a ré ficou incumbida de realizar, de acordo com o clausulado do mesmo contrato, e a autora prometeu comprar, pelo preço de 200.000.000$00.

Mais ficou a ré obrigada a promover a desocupação das casas de função na parcela de terreno, sendo que, decorrido um ano contado da data da assinatura do contrato sem que aquelas condições ocorressem, o contrato caducaria, automaticamente, com a obrigação de devolução, em singelo, da quantia entregue pela autora, salvo se esta manifestasse, de forma expressa, a sua vontade de manutenção do contrato, e, caso ainda assim, no prazo de um ano, após esta manifestação, não se verificassem as condições de eficácia, operar-se-ia a caducidade automática do contrato.

Tendo a ré logrado a desafetação do domínio publico e a inscrição no registo predial, não procedeu à desocupação das casas de função, antes de decorridos os aludidos prazos de caducidade, não obstante, mesmo assim, as partes terem decidido pela prossecução do contrato, sendo que as diversas reuniões e correspondência mantidas traduzem esta conduta das partes, tal como todas as diligências desenvolvidas, em ordem à desocupação das casas de função, que culminaram com a saída dos seus ocupantes, em finais de Maio, inícios de Junho de 2008.

No entanto, a ré, apesar de desonerada de promover a referida desocupação, acabou por responder à autora, declarando não aceitar que a desocupação fosse concedida, através da entrega de dinheiro pela autora aos funcionários da REFER, recusando-se a celebrar a escritura.

Na contestação, a ré invoca, em suma, a excepção de incompetência do tribunal, em razão da matéria, arguindo ainda a exceção de caducidade, por se mostrarem ultrapassados os prazos que o contrato-promessa previa, a menos que ocorresse manifestação de interesse, por parte da ré, na manutenção do contrato, antes do decurso do prazo de caducidade, o que não aconteceu.

Na réplica, a autora defende a improcedência das exceções de incompetência e de caducidade.

No despacho saneador, foi julgada improcedente a exceção de incompetência, em razão da matéria, e foi relegado para momento ulterior a apreciação e decisão da exceção de caducidade.

A sentença “decid(e-se)iu, na procedência da excepção peremptória de abuso de direito, na modalidade de «venire contra factum proprium» e parcial procedência desta acção, declarar resolvido o contrato-promessa celebrado entre a Autora BB – Investimentos Imobiliários, SA, ex AA – Transacções Imobiliárias, Lda. e a Ré Rede Ferroviária Nacional Refer – EP., e, consequentemente, condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de € 1.447.115,00, acrescida de juros à taxa legal”.

Desta sentença, a ré interpôs recurso de apelação independente e a autora recurso de apelação subordinado, tendo o Tribunal da Relação decidido, “na procedência da excepção peremptória de abuso de direito, na modalidade de «venire contra factum proprium» e parcial procedência desta acção, [1.] declarar resolvido o contrato-promessa celebrado entre a Autora BB – Investimentos Imobiliários, SA, ex AA – Transacções Imobiliárias, Lda. e a Ré Rede Ferroviária Nacional Refer – EP., e, consequentemente, condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de €1.197.115,00, acrescida de juros de mora vencidos, à taxa legal sucessivamente vigente, nos termos previstos no art.º 559.º do CC, ex vi art.º 102.º § 2.º do Cód. Comercial, desde a citação da ré, em 02-09-2008, até efectivo e integral pagamento; e [2.] condenar a ré a pagar à autora a quantia que se vier a liquidar relativa a compensação dos valores despendidos pela Autora e constantes dos pontos 17, 31, 33 e 54, até ao limite de € 250.000,00”.

Deste acórdão da Relação de Lisboa, a ré interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, na parte em que condena a ré no pagamento de indemnização adicional à autora, a liquidar, com o limite de €250000,00, formulando as seguintes conclusões que, parcialmente, no segmento que ainda interessa considerar para o julgamento do objeto da revista, se transcrevem:

1ª – (18a) Relativamente ao recurso de apelação subordinado da A. e que o acórdão recorrido julgou procedente revogando-se a decisão de 1a instância, decidiu-se que, por existir abuso de direito por parte da R. recorrente, está a mesma obrigada ao pagamento dos investimentos realizados pela A. no pressuposto da celebração do contrato de venda, a liquidarem momento ulterior.

2ª – (19ª) Ora, desde logo, a matéria apurada é totalmente omissa a esse respeito, nada se tendo apurado ou provado a esse propósito, pelo que se trata aqui de uma condenação sem fundamento nos factos provados.

3ª – (20ª) Além disso as partes não estipularam qualquer indemnização em caso de incumprimento contratual, pelo que não poderia a A. receber mais do que o sinal em dobro, tendo, assim, a decisão recorrida violado o disposto no artigo 442 n° 4 do C. Civil.

4ª – (21ª) Além de, da matéria provada, não poderia a A. deixar de ter incerteza quanto à realização da escritura, pelo que a sentença recorrida ao determinar que a recorrente tem de indemnizar a A., além da devolução do sinal em dobro, violou os artigos 227, 334 e 442 n° 2 e 4 do C. Civil.

Nas suas contra-alegações, a autora defende que deve ser rejeitado o recurso ou, caso assim se não entenda e, em qualquer circunstância, deve ser negado provimento ao mesmo, mantendo-se o acórdão recorrido.

O Tribunal da Relação entendeu que se devem considerar demonstrados os seguintes factos, que este Supremo Tribunal de Justiça aceita, nos termos das disposições combinadas dos artigos 674º, nº 3 e 682º, nº 2, do Novo Código de Processo Civil (CPC), mas reproduz:

1. A autora dedica-se à compra, venda e construção de imóveis.

2. A ré tem por objeto a gestão da parte imobiliária da rede ferroviária portuguesa.

3. A CP-Caminhos de Ferro Portugueses, E.P. (“CP”) tinha, sob sua jurisdição, uma parcela de terreno, localizada em …, com a área total de 8.119 m2, que, apesar de só incluir bens imóveis não adstritos ao serviço ferroviário, estava afeta ao domínio público.

4. Para além da aludida afetação, a referida parcela estava livre de quaisquer ónus ou encargos.

5. A “CP”, através da INVESFER-Promoção e Comercialização de Terrenos e Edifícios, S.A. (“INVESFER”), apresentou à Câmara Municipal de … (“CM…”) um Pedido de Informação Prévia, nos termos do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro.

6. O qual foi aprovado por aquela Edilidade, através do ofício n.º …547, de 09/05/95.

7. “CP” e a autora., em 1996-03-02, outorgaram um contrato, por força do qual aquela prometeu vender a esta, que prometeu comprar, a referida parcela, pelo preço de 200.000.000$00, através da subscrição do documento junto, sob o nº 5, a fls. 64 e segs.

8. E sob as seguintes condições:

«a) A Promitente Vendedora vai solicitar a desafectação do domínio público da parcela de terreno identificada, através do Despacho Conjunto dos Ministros das Finanças e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações;

b) Obtido o despacho mencionado no número Um anterior e de acordo com a previsão do artigo 1.º do diploma citado, a Promitente Vendedora, ao abrigo do disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 269/92, promoverá a inscrição matricial e a descrição predial do imóvel que nele vier a ser identificado;

c) A CP promoverá a desocupação das casas na parcela de terreno identificada, para que a mesma possa ser transmitida livre de pessoas e bens».

9. E sujeito a prazos sucessivos de caducidade:

«d) A plena eficácia do presente Contrato-Promessa depende, cumulativamente, do acto de desafectação do domínio público ferroviário, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 269/92, de 28 de Novembro, e dos actos a que se referem os números Dois e Três da Cláusula Segunda;

e) A não verificação no prazo de 12 (doze) meses, contados da data da assinatura do presente Contrato-Promessa, da condição referida no número anterior, determina a caducidade automática deste instrumento, sem necessidade de qualquer declaração judicial, com a obrigação da devolução em singelo, pela Promitente Vendedora, da quantia recebida correspondente ao pagamento referido na Cláusula Quarta, salvo se a Promitente Compradora manifestar de forma expressa a sua vontade de manutenção do Contrato;

f) Não se verificando as condições de eficácia, e tendo decorrido doze meses sobre a manifestação de vontade a que se refere o número anterior, operar-se-á a caducidade automática do presente Contrato, nos mesmos termos nele previstos;».

10. Todas as condições estavam a cargo da “CP”.

11. Quanto às duas primeiras – alíneas a) e b) – a “CP”, depois de ter sido atendida a desafetação da referida parcela do domínio público, em 1997-04-11, através de despacho ministerial, promoveu as atinentes inscrição matricial e descrição predial.

12. Esta última aconteceu, em 1997-10-01.

13. Entretanto, só depois de excedido o primeiro prazo de caducidade [precisamente em 1997-03-02 (cfr. ponto Dois da Cláusula Sétima], é que a desafetação [cfr. 26., a)] e o registo [cfr. 26., b)] do decorrente prédio urbano ocorreram.

14. A primeira cerca de um mês e meio.

15.  O segundo sete meses, aproximadamente.

16. E excedido o segundo prazo de caducidade [precisamente em 1998-03-02 (cfr. ponto Três da Cláusula Sétima)] as desocupações [cfr. 26., c)] não foram consumadas.

17. A autora, por si ou através da sua mandatária, praticou os seguintes actos:

a) O pagamento dos reforços do sinal, estipulados nas alíneas b) e d) da Cláusula Quinta, em Fevereiro (não obstante o primeiro prazo de caducidade) e Dezembro de 1998 (apesar do segundo prazo de caducidade), respectivamente;

b) Comunicações telefónicas, postais e via fax, que dirigiu à “CP” (directamente ou através da “INVESFER”);

c) Reuniões com a “CP” (directamente ou através da “INVESFER”);

d) Apresentação de requerimentos e documentação na “CM…”, destinados aos dois processos de licenciamento encetados pela “CP” (ou através da “INVESFER”).

18. A “CP”, por si ou através da “INVESFER”, praticou os seguintes actos:

e) A quitação concedida aos reforços de sinal, estipulados nas alíneas b) e d) da Cláusula Quinta;

f) As comunicações telefónicas, postais e via fax, que dirigiu à A. (directamente ou através da mandatária);

g) As reuniões que teve com a A. (directamente ou através da mandatária);

h) O despoletar dos dois processos de licenciamento na “CM…”, bem como a apresentação de vários requerimentos e documentação nesta, destinados àqueles.

19. Em 2005-04-28, a mandatária da autora enviou carta à ”INVESFER” onde:

a)-lamentou a falta de resposta à carta mencionada supra em 53;

b)-deu conta da indisponibilidade da A. para continuar em impasse, depois de ter pago mais do que 500.000,00 €, e da pretensão da mesma de celebrar a escritura, com o pagamento do remanescente do preço em simultâneo;

c)-assegurou recurso à via judicial se não fosse correspondida no prazo de 15 dias.

20. Em 2006-06-06, a mandatária da autora enviou fax à R., onde aproveitou para salientar:

a)-Em reunião de Novembro de 2005 foi acordado com a Administração da INVESFER, S.A. fazer a escritura de compra e venda até ao mês de Janeiro do presente ano de 2006;

b)-para tal elaborámos minuta de escritura que, segundo temos sido informados pela assessora jurídica Dr.ª CC, está a ser apreciada pelos Serviços Jurídicos da REFER desde há cerca de 6 meses (Novembro a Maio);

c)-tal situação é manifestamente insustentável face ao normal funcionamento das instituições e às legítimas expectativas dos operadores económicos.

21. Bem como para solicitar informações sobre:

a)-a desocupação das casas existentes no decorrente prédio urbano;

b)-se a escritura poderia ser marcada para qualquer dia do mês de Junho subsequente;

c)-quem iria outorgar a escritura como entidade vendedora.

22. Em 2006-09-28, a mandatária da autora enviou fax à ré, onde disse:

a)-Temos em mão um contrato promessa que tem todas as condições para que seja feita a escritura pública de compra e venda;

b)-O projecto camarário de obras está aprovado e foram apresentadas as telas finais dos projectos de especialidade;

c)-Com a INVESFER (Eng. DD) foi elaborada uma minuta de escritura que vos foi enviada em Novembro de 2005 para apreciação;

d)-A escritura já esteve marcada por duas vezes em Cartório Notarial de … conforme referi ao Colega e, por falta de análise da minuta pela REFER, não foi ainda possível a sua outorga;

e)-Estamos na disposição de alterar essa minuta, caso assim o entendam;

f)-Porém, torna-se insustentável continuar a telefonar para o V/gabinete, que após as nossas duas conversas de Junho, Julho, não tem capacidade para nos devolver as chamadas (já fizemos mais de 20 telefonemas nestes três meses) e, como não estou habituada a que os Colegas não respondam ... permitam-me que estranhe este comportamento;

g)-Os nossos clientes têm todo o interesse em ver concluído este negócio e pagar a parte restante do imóvel;

h)-Por isso sugiro que marquemos uma reunião, pessoalmente, nas vossas instalações, a fim de se ultimar algum pormenor e podermos outorgar a escritura durante o mês de Outubro, para o que solicito urgência.

23. Em 2006-10-10, a mandatária da autora enviou fax à ré, onde solicitou resposta ao fax mencionado supra, que anexou.

24. Em 2006-12-04, a mandatária da autora enviou fax à ré, com conhecimento à ”INVESFER”, onde, como ponto da situação:

a)-deu conta do contrato e anexou uma cópia do mesmo;

b)-salientou o desenvolvimento do projecto de construção para o decorrente prédio urbano, que tinha dado entrada na “CM…”, aproximadamente há mais de onze anos;

c)-chamou à colação o facto de tal projecto, depois de várias e sucessivas modificações, estar licenciado e com os projectos de especialidade concluídos;

d)-advertiu que na reunião efectivada entre si e a ”INVESFER”, em 2005-11-21, foi feita a minuta da escritura com as indicações da administração desta, a qual seguiu para a R., em ordem a ser analisada;

e)-lamentou não ter tido qualquer resposta a propósito;

f)-juntou faxes supra mencionados.

25. Em 2007-06-21, a ”INVESFER” enviou fax ao mandatário da autora, onde disse que todos os assuntos relacionados com o referido Contrato devem ser tratados directamente com a REFER.

26. Em 2007-07-02 o mandatário da autora reencaminhou o fax mencionado supra para a ré.

27. As partes reuniram-se, em 2007-07-18.

28. Na reunião de 18/07/2007, chegou-se à conclusão de que, em relação aos meios alternativos de desocupação das casas existentes no decorrente prédio urbano, o único viável era o da saída dos ocupantes daquelas tout court.

29. O mandatário da autora ficou incumbido de formalizar proposta nesse sentido e recebeu luz verde da ré, com vista a contatar os ocupantes das casas existentes no decorrente prédio urbano, em ordem a negociar a concretização daquela.

30. O Inspector da ré da zona de … mediou a marcação de encontros e viabilizou os números de telefone.

31. Houve encontros, reuniões no Gabinete do Chefe da Estação e no escritório do mandatário da autora, e contactos telefónicos.

32. Subsequentemente, o mandatário da autora, no âmbito de contacto telefónico entre si e o mesmo director da ré, apresentou a proposta.

33. A autora decidiu subrogar-se à ré no pagamento das compensações estipuladas na proposta, de forma àquela segunda não ter o menor argumento contra a celebração da escritura, e, como tal, o mandatário da autora, em 2008-01-08, enviou fax à mesma, onde disse:

«a)-Na sequência do nosso fax de 2007-12-05 vimos por este meio informar os passos que a nossa cliente foi tomando e reformular a nossa proposta em função dos mesmos.

I. Além dos ocupantes das casas no terreno objecto do contrato sob epígrafe terem-se comprometido a desocupá-las, em definitivo, livre de pessoas e bens, a nossa cliente conseguiu que cada um assinasse um documento ...

“Confirmação/Declaração/Compromisso”, em cujo teor consta ... : ...por ocupar o Edifício da CP ... em …, a título precário, confirma ter deixado de subsistir todas as razões sociais que levaram a Companhia ... a autorizar tal situação de facto, razão pela qual se compromete a restituir na íntegra e em definitivo, livre de quaisquer pessoas e bens, o supra referido imóvel, dentro do prazo de seis meses, a contar da data da assinatura da presente, contra o recebimento de 6.000,00 € ..., por conta do custo das obras de conservação que teve de levar a cabo nos cerca de 22 anos de ocupação;

II. Ou seja, a desocupação definitiva, livre de pessoas e bens, das casas no terreno objecto do contrato sob epígrafe já é um facto;

III. Neste contexto, a minha cliente, porque, ainda por cima, conseguiu uma redução muitíssimo significativa da contrapartida de cada uma das desocupações [14.000,00 € (42.000,00 € no global)], decidiu reformular a sua proposta nos termos seguintes:

-A AA assume o pagamento das três contrapartidas no valor global de 18.000,00 €, apesar da desocupação definitiva, livre de pessoas e bens, das casas no terreno objecto do contrato sob epígrafe estar a cargo da CP;

-A CP designará o Cartório Notarial e a data da outorga da escritura pública do contrato sob epígrafe, a qual, pela AA, poderá ser em 2008-02-28 ...;

-A AA pagará o remanescente do preço aquando da outorga indicada no ponto anterior.

IV. Esta reformulação constitui o último esforço da minha cliente no sentido da concretização do contrato sob epígrafe, já com cerca de 12 anos de vida, corolário, aliás, de muitos outros que foi levando a cabo ao longo de tamanha imensidão temporal;

V. Nada mais barra, pois, o caminho até à outorga da escritura pública do contrato sob epígrafe e com a ocorrência desta os legítimos interesses de ambas as partes serão finalmente acautelados.

VI. É, assim, com um sentimento de “dever cumprido” que a minha cliente fica a aguardar prezadas notícias.»

34. A ré enviou carta à autora, em 2008-01-11, dizendo:

...conforme já havia esta Empresa realçado, nas reuniões que efectuou com os representantes da AA, em 18 de Julho e 12 de Setembro do corrente ano, a desocupação das casas de função em causa só poderá efectuar-se por via da transferência dos trabalhadores no activo para outras casas, igualmente de função sem o direito a qualquer contrapartida.

35. Para, seguidamente, asseverar que:

a)-o mecanismo proposto para a desocupação não pode ser aceite pela REFER, por manifesta divergência do estipulado na promessa de compra e venda no que concerne com a desadequação do negócio ao que havia sido estabelecido e ainda por razões de natureza jurídica da REFER, enquanto Entidade Pública Empresarial;

b)-Em face da reconhecida impossibilidade de celebração do contrato definitivo, o que já ocorre há mais de dez anos, não nos resta outra alternativa que não seja a suscitação da caducidade do contrato-promessa de compra e venda sob condição celebrado no dia 2 de Março de 1996;

c)-Esta caducidade contratual opera por não se verificarem as condições de eficácia do contrato promessa em causa, obrigando-se a REFER à devolução do sinal prestado pela AA em singelo;

d)-Nesta conformidade, deverão V. Ex.ªs nos trinta dias seguintes à recepção da presente missiva, levantar o cheque no montante de quinhentos e noventa e oito mil quinhentos e cinquenta e sete euros e quarenta e cinco cêntimos, no valor global do sinal e reforços de sinal efectuados pela AA, na Direcção do Património Imobiliário da REFER, sita na Estação de …, procedendo-se, no momento do levantamento do cheque à assinatura de um acordo de revogação do contrato-promessa em questão, para os devidos efeitos da contabilização, nas duas empresas das transferências de valores.

36. A Cláusula Sétima do contrato previa prazos sucessivos de caducidade [cfr., 27., d) a e)], dependentes da efetivação de algumas condições [cfr. 26, a) a c)], de funcionamento automático, caso estas não se verificassem.

37. Já depois dos prazos de caducidade, a mandatária da autora elaborou uma minuta, com sucessivas indicações da “INVESFER” (Eng. DD)], que continha algumas cláusulas em manifesta divergência com as do contrato, na medida em que as mesmas previam:

a)-a celebração da escritura com as casas existentes no decorrente prédio urbano ocupadas;

b)-a dilação do pagamento do remanescente do preço até à desocupação plena dessas casas, nunca por mais de 180 dias;

c)-a caução desse pagamento por garantia bancária;

d)-a compensação da indemnização que a R viesse a ter de pagar à A. por causa dessas casas, no valor máximo de 500.000,00 euros, com esse pagamento.

38. A “INVESFER” submeteu a minuta à apreciação da ré, desde 2005-12-05, pelo menos.

39. Em 18 de Julho de 2007, teve lugar reunião entre o mandatário da autora e a ré, no seio da qual foi discutida a questão atinente à desocupação das casas de função (5., 6., 21., 22. e 26. da Base Instrutória).

40. Em 2005-01-14, sucedeu reunião no seio da qual:

a)-foi reiterado o interesse de A. e R. na manutenção do contrato;

b)-A mandatária da A. pediu à ”INVESFER” notícias sobre a data de desocupação das casas existentes no decorrente prédio urbano;

c)-A mandatária da A. pediu os documentos necessários para a escritura e a marcação desta, o mais depressa possível, em ordem ao cumprimento do contrato;

d)-A mandatária da A. disponibilizou-se para negociar uma promessa de compra e venda com a ”INVESFER”, relativamente a uma das fracções a construir no decorrente prédio urbano, depois da outorga da escritura (7.).

41. Em 2005-08-02, a mandatária da autora enviou carta à ”INVESFER”, onde chamou à atenção desta sobre essas questões [cfr. 52., a) a d)] e insistiu no cumprimento em relação às que a mesma se havia comprometido (8.).

42. Em 10.10.2005, a autora foi informada que a ré havia assumido a posição da ‘’CP’’ no contrato, por força da transmissão mencionada (9.).

43. Em 2005-10-10, a ”INVESFER” enviou fax à mandatária da autora, onde pediu reunião, em ordem a ser encontrada a solução para a concretização do contrato (10).

44. Em 2005-10-17, teve lugar uma reunião no seio da qual:

a)-a ”INVESFER” comprometeu-se a entregar à mandatária da A. a identificação do decorrente prédio urbano, em termos fiscais e registais;

b)-ficou marcada nova reunião para ultimar os elementos da escritura;

c)-a mandatária da A. pediu à ”INVESFER” informação acerca da desocupação das casas existentes no decorrente prédio urbano (11.).

45. Em 2005-11-07, a mandatária da autora enviou fax à ”INVESFER”, onde chamou à atenção desta sobre essas questões [cfr. 56., a) a c)] e insistiu no cumprimento em relação às que a mesma se havia comprometido (12.).

46. Em 2005-11-08, a ”INVESFER” enviou fax à mandatária da autora, onde:

a)-informou que já tinha requisitado a certidão do registo predial e a caderneta do decorrente prédio urbano;

b)-transmitiu, preliminarmente, as informações constantes nos documentos mencionados na alínea anterior, de modo a permitir a preparação da próxima reunião de dia 14 de Novembro bem como da própria escritura a celebrar em breve;

c)-Informou acerca do ponto da situação relativo às casas existentes no decorrente prédio urbano relativamente às casas cinco estavam ocupadas, duas das quais já não estavam ao serviço nem da CP nem da REFER (13.).

47. A mandatária da autora enviou fax à INVESFER, sugerindo o adiamento da reunião de 14.11.2005 para 21.11.2005, invocando como fundamento a falta de envio pela ré dos elementos documentais necessários para a elaboração da minuta da escritura (14.).

48. Em 2005-12-05, a mandatária da autora enviou fax à ”INVESFER”, onde seguiu em anexo a planta da zona do decorrente prédio urbano, a pedido daquela segunda (15.).

49. Em 2005-12-20, a mandatária da autora enviou fax à ”INVESFER”, onde pediu informação sobre os aspectos pendentes com vista à realização da escritura (16.).

50. Em 2005-12-23, a ”INVESFER” enviou fax à autora onde informou, no tocante ao ponto de situação relativamente à preparação da escritura, que:

a)-a minuta foi enviada para a REFER para aprovação pelo Conselho de Administração, que aguardamos;

b)-quanto às questões da actualização das confrontações e da isenção de licença de utilização, aguardamos neste momento resposta por parte da Câmara Municipal de … aos requerimentos enviados com vista a solucionar os dois problemas (17.).

51. Em 2006-02-21, a mandatária da autora enviou fax à ”INVESFER”, onde remeteu em anexo um requerimento para solicitar a prorrogação do prazo no processo de loteamento, com vista a ser recolhida a assinatura daquela, para, de seguida, fazer a apresentação do mesmo na “CM…” (18.).

52. Em 2006-02-23, a ”INVESFER” enviou carta à mandatária da autora, para devolver o requerimento mencionado, devidamente assinado (19.).

53. Em 14.06.2007, o mandatário da autora enviou fax à INVESFER a sugerir a realização de uma reunião entre os advogados dos contraentes com o objetivo de discutir alguns acertos tendentes à celebração da escritura pública (20.).

54. Na sequência da reunião mencionada em AL)., um dos directores da ré que esteve presente na mesma, acertou com o mandatário da autora uma deslocação conjunta às casas daquela, localizadas nas estações de Dois Portos, … e …, em ordem a verificarem se algumas delas estavam em condições de acolher os ocupantes das casas existentes no decorrente prédio urbano (23).

55. Os funcionários da CP e da REFER acederam em sair das casas de função, após, cada um, ter recebido da autora a quantia de €6.000,00, tendo-as, efectivamente, devolvido à ré (28., 33., 35., 36. e 38.).

56. O mandatário da autora converteu a proposta em documento escrito que, em 2007-12-05, foi enviado para a R., por fax:

a)-Estabelecer acordo de desocupação definitiva, livre de pessoas e bens, das casas ocupadas por funcionários da CP, com cada um destes, contra o pagamento de 20.000,00 € (vinte mil euros), para cada um, a título de obras de conservação;

b)-Esses pagamentos, no valor de 60.000,00 € (sessenta mil euros), deverão ser levados a cabo por V. Ex.ªs ou então por nós desde que imputado no valor que vamos ter de pagar aquando da outorga do contrato definitivo;

c)-Celebração do contrato definitivo a partir da desocupação plena referida no ponto 1 (29.).

57. Tendo a autora proposto, em 5/12/07, o pagamento de €20.000,00 (vinte mil euros), a cada funcionário, pela desocupação das casas de função da ré, na totalidade €60.000,00 (sessenta mil euros) a cargo da ré ou imputado no valor que faltava pagar (com referência ao contrato-promessa) e, formalização da transmissão da propriedade do imóvel para a autora, após a desocupação da totalidade dos imóveis (41.).

58. Em 2008-01-22, a autora enviou à ré, pelo seu mandatário, carta com o seguinte teor:

«I-Enquadramento da questão do ponto de vista contratual...

1-Em 1996-03-02, a n/cliente, AA, Lda., prometeu comprar à CP – Caminhos-de-ferro Portugueses, E.P., que prometeu vender, o prédio misto composto de casa em alvenaria com dois pavimentos para habitação; torre em alvenaria com dois pavimentos para habitação, barracão em alvenaria com um pavimento amplo para cocheira de carruagens e logradouro, com a área coberta de 1.246,38 m2 e a área descoberta de 6.872,62 m2, a confrontar Norte e Nascente com Caminho-de-ferro (Linha do Oeste): Sul e Poente com Caminho de Ferro (Linha do Oeste) e Rua …, descrita na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º …579, da freguesia de …, concelho de …, e inscrito na matriz respectiva, sob o artigo …04.º, da dita freguesia de ….

2-No n.º Dois da cláusula segunda do contrato indicado supra em 1., a “CP” declarou que a mencionada parcela de terreno inclui bens imóveis que não se encontram adstritos ao serviço público ferroviário e, como tal, de acordo com a previsão do art. 9.º do Decreto-Lei n.º 269/92, de 28 de Dezembro, e nos termos ai previstos podem ser desafectados do domínio público ferroviário e, posteriormente, alienados.

3-Do n.º Três da mesma cláusula do contrato indicado supra em 1., resulta, no tocante à mencionada parcela de terreno, que a “CP”, através da Invesfer - Promoção e Comercialização de Terrenos e Edifícios, S.A., apresentou à Câmara Municipal de … pedido de informação prévia nos termos do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, o qual foi aprovado por aquela entidade.

4-No n.º Quatro da mesma cláusula do contrato indicado supra em 1., a “CP” declarou sobre a mencionada parcela de terreno que não impende, além da afectação indicada no n.º 2, qualquer ónus ou encargo, bem como não existe, em relação à mesma obrigação, condição ou compromisso ou qualquer direito de terceiros, nomeadamente qualquer direito de preferência susceptível de prejudicar, limitar ou condicionar a plenitude da respectiva disponibilidade para os fins do presente Contrato-Promessa ou que, de qualquer modo, possa afectar a plena evolução do mesmo.

5-O n.º Um da cláusula sétima do contrato indicado supra em 1., consagrou a estatuição de que as referidas desafectação e desocupação eram cumulativamente condição de plena eficácia daquele.

6-Pelos n.ºs Dois e Três da mesma cláusula do contrato indicado supra em 1., foram previstos dois prazos de verificação da aludida condição: doze meses desde a outorga mais doze meses se a n/cliente manifestasse de forma expressa a sua vontade no sentido da manutenção, sendo certo que a não concretização, tanto no primeiro, como no segundo destes termos, determinaria a caducidade automática.

II-Neste Conspecto...

1-Sob a égide dos expostos ditames contratuais, V. Ex.ªs diligenciaram, com absoluto sucesso, a referida desafectação, bem como a inscrição matricial e a descrição predial do imóvel que foi identificado no despacho ministerial atinente.

2-Ademais, V. Ex.ªs encetaram o processo de desocupação dos imóveis na mencionada parcela de terreno, para que a mesma pudesse ser transmitida livre de pessoas e bens.

III-Vicissitudes...

1-Todavia, decorridos os dois prazos sucessivos indicados supra em 6., a referida desocupação ainda não tinha acontecido.

2-Mesmo assim, V. Ex.ªs e a n/cliente insistiram na manutenção do contrato indicado supra em 1., pois ambas estavam convictas de que a referida desocupação iria ocorrer mais cedo ou mais tarde.

3-Assim, a cláusula sétima do contrato indicado supra em 1., foi dada sem efeito ou invalidada por acordo entre V. Ex.ªs e a n/cliente.

4-A este respeito, não podem restar quaisquer dúvidas porque, a título de exemplo:

a)-V. Ex.ªs intervieram de forma directa no tratamento administrativo do projecto de construção que a n/cliente pretende desenvolver na mencionada parcela de terreno, em momentos claramente subsequentes à aludida ultrapassagem temporal a dois tempos, v.g. actuando como requerente no processo instaurado na Câmara Municipal de …;

b)-V. Ex.ªs continuaram a tomar medidas em prol da referida desocupação.

5-Contudo, o tempo foi passando e não havia maneira de V. Ex.ªs darem por concluída a referida desocupação.

6-A certa altura, percorridos que estavam cerca de oito anos da vida do contrato indicado supra em 1., a n/cliente, como forma de ultrapassar a situação, propôs a celebração do contrato definitivo, desde que a V. Ex.ªs contratassem garantia bancária a favor daquela, caso tivesse de ser a mesma a solucionar a referida desocupação.

7-V. Ex.ªs até aceitaram a proposta, ainda que com algumas nuances indicadas pelos Administradores da Invesfer, E.P. (Eng.º DD e Dr. EE).

8-Foi então que a n/cliente elaborou a minuta do contrato definitivo, com base no aduzido no ponto antecedente, e enviou-a para V. Ex.ªs, em final de 2005, para análise.

9-Malogradamente, desde essa ocasião e pelos menos até à actualidade, a n/cliente não recebeu, a propósito, qualquer notícia, apesar de múltiplas insistências nesse sentido, outrossim não correspondidas.

10-Perante tal silêncio, a n/cliente solicitou, entretanto, uma reunião com V. Ex.ªs, em ordem a ser acertada nova estratégia conjunta rumo à celebração incondicional do contrato definitivo.

11-Em vez de uma reunião tiveram lugar duas e o corolário das mesmas foi a irrefutável conclusão de que a referida desocupação só poderia suceder de duas maneiras alternativas:

a)-Transferir os ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno para outras habitações de V. Ex.ªs.;

b)-Remover os ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno.

12-Concomitantemente, na dita reunião acordou-se que um dos Directores de V. Ex.ªs e o signatário visitassem os imóveis na mencionada parcela de terreno e algumas das habitações da V. Ex.ªs noutros locais (Dois Portos; … e …).

13-Essa visita conjunta aconteceu e serviu para ser alcançada a certeza de que a alternativa exposta supra em 11, alínea b) seria a mais aconselhável, pois as habitações disponíveis estavam muito degradadas e os custos das suas reparações, mediante cálculo por baixo, seriam excessivos.

14-Deste modo, o signatário, com a anuência e toda a colaboração do Director de V. Ex.ªs, que, através do Inspector FF, viabilizou a ponte com os ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno, encetou negociações com estes para conseguir a referida desocupação.

15-E o certo é que o signatário conseguiu, na medida em que os ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno assumiram o compromisso com o seguinte teor: por ocupar o Edifício da CP ..., em …, a título precário, confirma ter deixado de subsistir todas as razões sociais que levaram a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses a autorizar tal situação de facto, razão pela qual se compromete a restituir na íntegra e em definitivo, livre de quaisquer pessoas e bens, o supra referido imóvel, dentro do prazo de seis meses, a contar da data da assinatura da presente, contra o recebimento de 6.000,00 euros (seis mil euros), por conta do custo das obras de conservação que teve de levar a cabo nos cerca de 22 anos de ocupação.

16-Paralelamente, o signatário, durante as negociações com os ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno, apresentou, em 2005-12-05, uma proposta da n/cliente a V. Ex.ªs com os seguintes termos:

a)-V. Ex.ªs obteriam a referida desocupação, pagando a quantia de 20,000,00 euros a cada um dos ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno, directamente ou pela n/cliente desde que tal valor fosse deduzido no valor a pagar por esta como remanescente do preço:

b)-O contrato definitivo seria celebrado logo após a referida desocupação.

17-De novo, V. Ex.ªs não se dignaram a responder com a celeridade que se impunha.

18-Até que o signatário, em 2008-01-08, aproveitando as boas notícias que eram os compromissos definitivos dos ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno, apresentou a derradeira proposta da n/cliente a V. Ex.ªs com os seguintes termos:

a)-A AA assume o pagamento das três contrapartidas no valor global de 18.000,00 euros, apesar da desocupação definitiva, livre de pessoas e bens, das casas no terreno objecto do contrato sob epígrafe estar a cargo da CP.

b)-A CP designará o Cartório Notarial e a data da outorga da escritura pública do contrato sob epígrafe, a qual, pela AA, poderá ser em 2008-02-28 e não antes somente por causa da obrigação de comunicar previamente estatuída no n.º 3 da cláusula sexta daquele.

c)-A AA pagará o remanescente do preço aquando da outorga indicada no ponto anterior.

IV-Constatação...

Com tal reformulação deixou de haver qualquer impedimento objectivo para a celebração do contrato definitivo, ao fim duns penosos 12 anos do contrato indicado supra em 1., e só com a produção daquela é que os legítimos interesses de ambas as partes serão finalmente acautelados.

V-Tomada de posição...

1-Por tudo o que acabou de ser expresso, a n/cliente não compreende e não aceita a decisão que V. Exªs informaram através da carta sob resposta.

2-Não compreende porque:

a)-tinha apostado com V. Ex.ªs numa nova estratégia conjunta e esta excedeu as melhores expectativas;

b)-Apesar da referida desocupação ser uma obrigação contratual, a cargo de V. Ex.ªs, viabilizou-a e disponibilizou-se para custeá-la.

3-Não aceita porque:

a)-Estão reunidas todas as condições objectivas para a celebração do contrato definitivo;

b)-A devolução do sinal em singelo representa um enorme prejuízo, tendo em conta os valores imensos pagos no processo do projecto de construção, a valorização da mencionada parcela de terreno e a depreciação monetária.

4-Como tal, a n/cliente não prescinde da celebração do contrato definitivo, pelo que fica a aguardar a disponibilidade de V. Ex.ªs para tanto, no prazo de 15 dias a contar da assinatura do aviso de recepção desta missiva, designando o Cartório Notarial e a data da outorga, mas respeitando os prazos definidos no n.º Três da cláusula sexta do contrato indicado supra em 1.

5-Ao invés, estarão em jogo inequívocos incumprimento e má fé contratuais, pelo que exigiremos, na via judicial, a execução específica do contrato definitivo ou uma indemnização por todos os prejuízos que a não celebração deste acarretará, ao mesmo tempo que iremos comunicar à hierarquia e ao ministro a lamentável actuação nesse caso protagonizada por V. Ex.ªs.

VI-Precipuamente…

1-Como já ficou dito supra o mecanismo proposto pela n/cliente, com vista à referida desocupação, foi uma das alternativas aceite por todos os intervenientes na segunda das sobreditas reuniões.

2-Mecanismo esse que não encontra oposição alguma em qualquer das cláusulas do contrato indicado supra em 1. [as únicas que tratam da referida desadequação são: a segunda (que no seu n.º Três apenas diz: A CP promoverá a desocupação das casas da parcela de terreno identificada, de forma a que a mesma possa ser transmitida livre de pessoas e bens) e a sétima (que no seu n.º Um apenas diz: A plena eficácia do presente Contrato-Promessa depende, cumulativamente, do acto de desafectação do domínio público ferroviário, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 269/92, de 20 de Novembro, e dos actos a que se referem os números Dois e Três da Cláusula Segunda)], e muito menos põe em causa a natureza jurídica de V. Ex.ªs, enquanto Entidade Pública Empresarial.

3-Aliás, sobre à natureza jurídica de V. Ex.ªs, enquanto Entidade Pública Empresarial, a mesma fica posta em causa se a referida desocupação não acontecer porque, se estão em jogo ocupações a título precário, por razões sociais, e os ocupantes assumiram que estas deixaram de subsistir, em definitivo, como legitimar a continuidade sem que a mesma passe a ser considerada situação de favor, em detrimento doutros funcionários em particular (alguns deles se calhar bem mais necessitados) e do erário público em geral.

4-E como se tanto não bastasse, os ocupantes dos imóveis na mencionada parcela de terreno não param de “bater à porta” do signatário em ordem a receberem as compensações pelas obras que efectuaram naqueles e a desocuparem nessa altura os mesmos, até porque já acertaram financiamentos bancários por forma adquirirem habitações com condições bem mais dignas» (30.).

59. A ré retorquiu, através do envio, em 2008-02-18, de carta onde:

a) fez menção ao contrato e a cessão da posição contratual ocorrida no mesmo a seu favor;

b) Invocou as condições [cfr., 26., a) a c)] e disse que, por uma delas não se ter verificado, a plena eficácia do contrato não tinha sucedido;

c) confessou desenvolvimento de esforços, por si e pela A., desde a outorga do contrato, no sentido de ser removido o impedimento que constituía essa não verificação, em prol da celebração da escritura;

d) alegou que, na presença duma proposta de reformulação do negócio, feita pela A., após um interregno de mais de nove anos, não a aceitou porque os termos da mesma divergiam do estipulado no contrato e estavam desadequados à sua natureza, enquanto Entidade Pública Empresarial;

e) tornou a subverter os trabalhos e as conclusões das reuniões mencionadas supra arguindo que no âmbito destas tinha sido realçado que a desocupação das casas existentes no decorrente prédio urbano só poderia efectuar-se por via da transferência dos ocupantes para outras casas de função a ela pertencentes e que, caso assim não acontecesse, mais não restaria a si e à A. do que se socorrerem do mecanismo da caducidade estatuído na cláusula sétima do contrato;

f) salientou o facto de ter enviado a carta mencionada supra, para entender de seguida que a A. não podia dar essa cláusula sem efeito ou invalidada, sob a justificação de não ter havido acordo nesse sentido;

g) teve o desplante -salvo o devido respeito de verbalizar, acerca da asserção feita pela A.: tendo em linha de conta os valores imensos pagos no processo do projecto de construção, que em lado nenhum do contrato promessa a AA é mandatada para o efeito, podendo ter nos mesmo incorrido por sua conta e risco;

h) terminou proferindo o seguinte: é nesta conformidade que a REFER plenamente reitera o teor da sua carta de 11 de Janeiro do corrente ano, não podendo aceitar que exista o direito a qualquer contrapartida aos ocupantes das casa de função em causa, estando porém disposta a discutir a questão da depreciação monetária pelo capital investido a título de sinal e reforço do mesmo (31.).

60. A ré comunicou à autora não ser possível celebrar o contrato prometido (39.).

61. Não obstante esse facto, a ré concedeu à autora um prazo de 60 dias para apresentar uma proposta de resolução do assunto (40.).

62. O imóvel prometido vender encontra-se registado, em nome da ré, na Conservatória do Registo Predial de …, como prédio urbano, com a área total de 8119 m2, sob o nº…79/…001, mostrando-se inscrito na matriz predial respectiva, sob o art.º …604.

                                               *

Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.

As questões a decidir, na presente revista, em função das quais se fixa o objeto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nºs 4 e 5, 639º e 679º, todos do CPC, são as seguintes:

I – A questão da viabilidade da reclamação para a conferência do despacho do relator sobre o não conhecimento do objeto do recurso interposto pela parte contrária.

II – Se, no âmbito do contrato-promessa celebrado, mas não seguido da realização do contrato definitivo, pode verificar-se uma situação enquadrável na responsabilidade pré-negocial.

III – Consequentemente, se há lugar a cumulação do pagamento do sinal em dobro e do pagamento de indemnização pelos prejuízos sofridos pelo promitente-comprador, correspondentes aos investimentos que o mesmo realizou, no pressuposto da celebração do contrato definitivo.

I. DA RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA DO DESPACHO DO RELATOR QUE NÃO CONHECE DO OBJETO DO RECURSO INTERPOSTO PELA PARTE CONTRÁRIA

Na sequência da decisão singular do relator que entendeu não poder conhecer-se do objeto do recurso de revista interposto pela autora “AA – TRANSACÇÕES IMOBILIÁRIAS, LDA”, com a atual denominação de “BB – Investimentos Imobiliários, S.A.”, com a qual esta se conformou, a ré “Rede Ferroviária Nacional Refer – EP”, em oposição com a mesma, veio requerer, em reclamação deduzida, ao abrigo do disposto pelos artigos 652º, nº 3 e 679º, do CPC, que seja “tirado douto acórdão por este Tribunal que revogue o despacho reclamado, na parte em que decide aplicável à taxa de juros a sentença de 1ª instância”.

A autora, na sua resposta, entende que deve ser julgada inadmissível a reclamação apresentada, mantendo-se o decidido pelo despacho do relator, porquanto a ré não requereu a retificação do decisório pelo acórdão da Relação recorrido, com base no preceituado pelo artigo 614º, nº 2, do CPC.

Estipula o artigo 652º, nº 3, aplicável ao recurso de revista, por força do disposto pelos artigos 666º, nº 2 e 679º, todos do CPC, que “…, quando a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária”, prosseguindo o respetivo nº 4, ao estatuir que “a reclamação deduzida é decidida no acórdão que julga o recurso, salvo quando a natureza das questões suscitadas impuser decisão imediata, sendo, neste caso, aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.ºs 2 a 4 do artigo 657.º”.

No despacho singular do relator diz-se, a propósito desta questão, que:

" [II]

7. Impõe-se, igualmente, analisar a admissibilidade da revista-regra interposta pela autora “BB – Investimentos Imobiliários, SA”, no segmento decisório que contende com os juros peticionados, à taxa legal.

8. Efetivamente, como já se disse, neste particular, a sentença decidiu “condenar a Ré Rede Ferroviária Nacional Refer – EP., a pagar à Autora a quantia de € 1.197.115,00, acrescida de juros à taxa legal.”, enquanto que o acórdão da Relação decidiu “condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de €1.197.115,00, acrescida de juros de mora vencidos, à taxa legal sucessivamente vigente, nos termos previstos no art.º 559.º do CC, ex vi art.º 102.º § 2.º do Cód. Comercial, desde a citação da ré, em 02-09-2008, até efectivo e integral pagamento;…”.

9. Tendo a autora “BB – Investimentos Imobiliários, SA”, no articulado inicial, peticionado a condenação da ré “Rede Ferroviária Nacional Refer – EP“, “em juros de mora, à taxa máxima legal, agora e no futuro, desde a citação e até pleno cumprimento”, a sentença condenou esta última a pagar à autora a quantia de €1.197.115,00, “acrescida de juros à taxa legal”.

10. O acórdão recorrido, considerando que “não tendo a autora no caso dos autos formulado pedido de juros ao abrigo do disposto no § 3º do art.º 102º do Código Comercial, o pedido deve ser interpretado no sentido de a taxa de juros ser a prevista no art.º 559º do Código Civil, e a sentença deveria ter condenado no pagamento de juros à taxa deste preceito, pelo que ocorre nulidade da sentença ao abrigo do disposto no art.º 668º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil, por ter condenado para além do pedido”.

11. Quer isto dizer que o acórdão recorrido, entendendo que a sentença condenou além do pedido, determinou que a taxa de juros deveria ser a prevista, no Código Civil, para os «juros civis», e não, no Código Comercial, para os «juros comerciais», não obstante, em sede de dispositivo, ter “condena(r)do a Ré a pagar à Autora a quantia de €1.197.115,00, acrescida de juros de mora vencidos, à taxa legal sucessivamente vigente, nos termos previstos no art.º 559.º do CC, ex vi art.º 102.º § 2.º do Cód. Comercial, desde a citação da ré, em 02-09-2008, até efectivo e integral pagamento;…”, isto é, nos termos em que o fez a sentença de 1ª instância.

12. A situação fáctico-jurídica considerada poderá, idealmente, convocar os vícios do erro de julgamento, do erro material e da nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão do julgado.

12. Não se está perante um erro de julgamento, de um erro de interpretação dos factos ou do Direito ou da aplicação deste, em que o juiz disse o que queria dizer, mas decidiu contra lei expressa ou contra os factos apurados, uma vez que o acórdão decidiu em conformidade com os factos e o Direito aplicável.

13. Não se está, igualmente, em face da nulidade resultante da contradição entre os fundamentos e a decisão, em que a oposição não é apenas aparente, mas real, pois que o juiz escreveu o que queria escrever, o que sucede é que a construção é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam, logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto[2].

14. Trata-se, finalmente, de um erro material, ou melhor, de uma contradição entre os fundamentos e a decisão, que resulta de um erro material, mas onde não existe um vício lógico na construção da mesma, e a contradição é, meramente, aparente[3], pois que se escreveu, manifestamente, coisa diferente da que se queria escrever, o que consubstancia um erro material, a que alude o artigo 614º, nº 1, do CPC, que nada tem a ver com os erros ou inexactidões que se verifiquem no processo interno de formação do juízo expresso na decisão, a que se alude em 13.

15. Este erro material, identificado em 14., é passível de retificação, através do mecanismo contemplado pelo artigo 614º, nº 2, do CPC, de modo a que a vontade real prevaleça sobre a vontade declarada.

16. Requerendo a autora a retificação do acórdão recorrido, por ter incorrido em lapso manifesto, no que que respeita à aplicação do artigo 102º, do Código Comercial, de modo a ser confirmada, nesta parte, a decisão do tribunal de 1ª instância, com a oposição da ré, que sustentou o seu indeferimento, por entender tratar-se de um erro de julgamento insuprível, a conferência decidiu que “os fundamentos da reclamante não demonstram a existência de qualquer lapso, mas tão só demonstram a existência de divergência em relação ao entendimento perfilhado no acórdão e que não servem de fundamento à rectificação mas, eventualmente, poderão servir de fundamento de recurso”, rejeitando, consequentemente, a pretensão da autora.

17. Com efeito, se é certo que o segundo acórdão da conferência não podia corrigir o erro de julgamento, como bem decidiu, de facto, inexistente, já o poderia ter feito, em relação ao erro material, ainda que nenhuma das partes o tenha solicitado, explicitamente, por sua própria iniciativa, nos termos do disposto pelo artigo 614º, nº 1, do CPC.

18. Por outro lado, os poderes de correção consagrados pelo artigo 614º, nº 1, do CPC, competem ao tribunal que proferiu a decisão, sendo certo que, em caso de recurso, o tribunal «ad quem», apenas, pode proceder à retificação dos erros materiais que só perante si hajam sido levantados, ficando impedido da sua apreciação não, anteriormente, suscitada[4].

19. Assim sendo, por não ter sido, tempestivamente, requerida a rectificação do erro material ocorrido, ou procedido, oficiosamente, à sua correção, e por não poder agora, face ao circunstancionalismo fáctico-jurídico considerado, efetuar-se essa correção material, o segmento do acórdão recorrido, que “conden(ar)ou a Ré a pagar à Autora a quantia de €1.197.115,00, acrescida de juros de mora vencidos, à taxa legal sucessivamente vigente, nos termos previstos no art.º 559.º do CC, ex vi art.º 102.º § 2.º do Cód. Comercial, desde a citação da ré, em 02-09-2008, até efectivo e integral pagamento;…”, coincide, semanticamente, com o correspondente segmento da sentença de 1ª instância, segundo o qual se “conden(a)ou a Ré Rede Ferroviária Nacional Refer – EP., a pagar à Autora a quantia de € 1.197.115,00, acrescida de juros à taxa legal.”, consoante resulta, também, da interpretação conjugada que dos respetivos termos foi efetuada pela Relação e pelas próprias partes.

20. Preceitua o artigo 631º, nº 1, do CPC, que “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os recursos só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido”.

E a parte principal diz-se vencida quando for prejudicada pela decisão, porquanto se esta lhe não é desfavorável, não pode recorrer da mesma, ainda que a decisão se tenha baseado em razões jurídicas diferentes das alegadas pela parte respetiva, e mesmo que tenha recusado, expressamente, a procedência de fundamentos por aquela invocados.

A legitimidade para recorrer não assenta numa relação da parte com o objeto da causa, como acontece com a legitimidade processual, mas antes nas consequências que uma decisão pode produzir na esfera jurídica de um sujeito, que, se lhe for prejudicial, pode pretender afastar, através da sua revogação pelo tribunal de recurso[5].

21. Assim sendo, fica desprovido de sentido lógico e sustentáculo jurídico o pedido da autora, formulado na presente revista, no sentido da revogação do acórdão do Tribunal da Relação, “na parte referente aos juros peticionados à taxa legal”, mantendo-se assim a decisão proferida, neste segmento, pelo Tribunal da 1ª Instância.

Na verdade, o objeto do recurso de revista da autora já se mostra, plenamente, atingido, resultante da ausência de oportuna correção do erro material verificado, pelo que aquela não ficou vencida e, consequentemente, não tem legitimidade para recorrer de revista da sobredita decisão.

22. Por todo o exposto, por não poder conhecer-se do objeto do recurso de revista interposta pela autora, julgo extinta a instância recursiva, neste particular, com base nas disposições conjugadas dos artigos 631º, nº 1, 652º, nº 1, b) e h) e 679º, todos do CPC”.

Efetivamente, a ré, quanto a este segmento do acórdão da Relação respeitante à taxa de juros, não interpôs recurso de revista, mas, tão-só, como já se referiu, a autora, nem sequer, em sede de contra-alegações, requereu, subsidiariamente, a sua ampliação, nos termos do disposto pelo artigo 636º, nº 1, do CPC.

E, não se considerando a ré vencida pelo acórdão recorrido, não pode reclamar-se prejudicada pela decisão singular do relator que julgou extinta a instância recursiva e não conheceu do objeto do recurso de revista interposta pela autora, pelo que, consequentemente, manteve-se inalterado o acórdão do Tribunal da Relação, com o qual a ré, oportunamente, se conformou.

Deste modo, é inadmissível a reclamação formulada pela ré, por não poder considerar-se prejudicada com a sobredita decisão singular do relator, atento o disposto pelo artigo 652º, nº 3, do CPC.

II. DA APLICAÇÃO DO REGIME DA RESPONSABILIDADE PRÉ-NEGOCIAL AO CONTRATO-PROMESSA

I. 1. O acórdão recorrido entendeu, neste particular, que se está “perante uma verdadeira situação enquadrável no âmbito da responsabilidade pré-contratual”, porquanto “a ré comportou-se de modo a criar na autora a convicção de que o contrato-promessa seria efectivamente cumprido, levando a autora a desenvolver, paralelamente ao contrato-promessa, toda uma séria de actividades com vista à celebração do contrato definitivo” e que “a relação de confiança que a ré estabeleceu com a autora não é consumida pelo contrato-promessa, tendo a recusa de celebração do contrato definitivo se enquadrado numa manifesta violação do princípio da boa fé e se enquadrado também na figura do abuso de direito do art.º 334º do Código Civil”.

Dispõe o artigo 227º, n.º 1, do Código Civil (CC), que “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.

As negociações são a actividade instrumental da conclusão de um qualquer contrato e, também, obviamente de um contrato-promessa, constituindo a sua fase pré-contratual, durante a qual as partes devem proceder segundo as regras da boa-fé.

Consagra o normativo legal, acabado de descrever, a denominada responsabilidade pré-contratual que, tanto vale, no caso de rutura de negociações, como no caso de o contrato se concluir e vier a ser nulo ou ineficaz, ou, ainda, se, por causa da violação dos ditames da boa-fé, por uma parte, vier a ser concluído com um conteúdo diferente[6].

Por outro lado, o negócio jurídico celebrado pelas partes, consensualizado por estas e, assim, qualificado pelas instâncias, consiste num contrato- promessa de compra e venda de um imóvel, contemplado pelo artigo 410º, do CC, que o define como a “convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato”, e de que resulta, como prestação devida, a emissão de uma declaração negocial destinada a celebrar o contrato prometido[7].

I. 2. Acontece, com grande frequência, que a celebração dos contratos é uma realidade antecedida de um processo genético que se inicia com os primeiros contactos das partes com o objetivo da realização de um negócio e se prolonga até ao momento da sua efetiva conclusão.

Porém, existem atos preparatórios do itinerário dirigido à constituição de um negócio jurídico que já revestem, em si mesmos, natureza negocial, como acontece com o contrato-promessa, do qual resulta uma vinculação mais forte, porquanto envolve, em relação a um ou a todos os intervenientes, a obrigação de concluir determinado contrato, nos termos estabelecidos.

Deste modo, não é a respeito destes negócios preliminares, em que se inclui o contrato-promessa, que se coloca a questão da responsabilidade na formação dos contratos, cuja violação gera a responsabilidade própria do incumprimento de um contrato, mas antes a respeito dos atos pré-negociais destituídos de qualquer garantia específica[8].

Assim sendo, no âmbito do contrato-promessa, está-se fora da responsabilidade pré-contratual [culpa in contrahendo], pois o que se verifica, então, é a responsabilidade pelo incumprimento do contrato [culpa in contractu[9]], uma vez que os actos preparatórios de um contrato definitivo de compra e venda de imóveis revestem natureza negocial, tendo-se autonomizado quando assumem a figura do contrato-promessa[10].

É que o contrato-promessa, embora se distinga do contrato prometido, situando-se entre a fase pré-contratual e o contrato definitivo[11], já se traduz numa convenção completa, revestindo, em princípio, a natureza de um puro contrato obrigacional[12].

A isto acresce que a natureza contratual do contrato-promessa resulta, igualmente, do próprio texto do artigo 410º, nº 1, do CC, que determina que lhe sejam “aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido, excetuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa”.

Ora, as disposições legais relativas ao contrato prometido são as que contendem com a responsabilidade contratual e não com a responsabilidade pré-negocial, aqui inaplicável.

III. DA CUMULAÇÃO DO PAGAMENTO DO SINAL EM DOBRO COM A INDEMNIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS SOFRIDOS PELO PROMITENTE-COMPRADOR

III. 1. No articulado inicial, a autora pede que a ré seja “condenada, em alternativa, a celebrar a escritura, sob a égide da execução específica [a] a devolver à A. o dobro do que esta prestou, e, se proceder esta alternativa, a pagar a quantia que, por ora, se fixa em €250.000,00, por conta dos custos que teve de suportar, ao nível dos projetos, das taxas municipais e de tudo o mais que despendeu na prossecução dos dois processos de licenciamento incidentes sobre o decorrente prédio urbano”.

O acórdão recorrido, como já se disse, condenou a ré “a pagar à Autora a quantia de €1.197.115,00,…e a quantia que se vier a liquidar relativa a compensação dos valores despendidos pela Autora e constantes dos pontos 17, 31, 33 e 54, até ao limite de € 250.000,00”.

Diz o acórdão impugnado, a este propósito, que “não pode deixar de haver cumulação no presente caso do pagamento do sinal em dobro nos termos do art.º 442º do Código Civil e do pagamento de indemnização dos prejuízos sofridos pela autora e correspondentes aos investimentos por esta feitos já no pressuposto da efectivação da celebração do contrato de compra e venda.

A não cumulação levaria à verificação de uma situação de enriquecimento da ré sem qualquer causa, nos termos do art.º 473º do Código Civil”.

III. 2. O sinal é, normalmente, uma quantia pecuniária que um dos contraentes entrega ao outro, no momento da celebração do contrato ou, em momento posterior, sendo que, no contrato-promessa de compra e venda, que aqui interessa considerar, “presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda qua a título de antecipação ou princípio de pagamento”, nos termos do disposto pelo artigo 441º, podendo essa presunção ser ilidida, em conformidade com o estatuído pelo artigo 350º, nº 2, ambos do CC, o que não aconteceu.

Quando a intenção dos contraentes é a de confirmar o contrato, demonstrando a sua celebração e existência, garantindo e reforçando o vínculo estabelecido e o cumprimento das obrigações assumidas, o sinal tem natureza confirmatória, o que, aliás, se presume, atendendo à regra geral de que as partes quando celebram um contrato se vinculam, em princípio, de modo irrevogável, e não se reservam na faculdade de retração ou de recesso do contrato, hipótese em que existiria o sinal penitencial, reforçando-se, igualmente, o seu caráter confirmatório, face à anormalidade que o sinal penitencial representa num sistema jurídico que consagra a nulidade da cláusula de irrenunciabilidade prévia do credor ao direito de pedir o cumprimento, atento o estipulado pelo artigo 809º, do CC, pelo que o sinal penitencial, apenas, deve ter lugar quando resulte da lei, de acordo com o prescrito pelo artigo 830º, nº 2, também, do CC, ou de uma inequívoca vontade das partes, situações estas que, de igual modo, se não verificaram[13].

Assim sendo, onde inexista convenção expressa da faculdade de arrependimento, o sinal será confirmatório, e só quando for convencionada, expressamente, essa faculdade e existir sinal, este tem carácter penitenciário[14].

Tratando-se, assim, de um sinal confirmatório aquele que foi prestado pela autora, o mesmo tem uma dupla função, desde logo, o reforço dos vínculos nascentes do contrato e a coerção indireta do devedor ao seu cumprimento, como já se acentuou, mas, também, a fixação prévia e convencional da indemnização devida, em caso de não cumprimento imputável a uma das partes, razão pela qual se aquela precípua finalidade coercitiva do sinal não for alcançada, este determina, antecipadamente, o «quantum respondeatur» resultante do incumprimento, independentemente do montante e até da existência do dano efetivo.

III. 3. Dispõe o artigo 442º, nº 4, do CC, que “na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento”.

Na redacção originária do, então, nº 3, correspondente ao atual nº 4, do artigo 442º, do CC[15], os efeitos do não cumprimento imputável a qualquer dos contraentes, quanto ao sinal, eram os tradicionais no ordenamento jurídico nacional, isto é, imperativamente, a perda do sinal ou a sua restituição em dobro, como fixação da respetiva indemnização pelos danos, salvo circunstâncias excepcionais, em que, v. g., o promitente-comprador goza do direito de indemnização, em termos gerais, pelas  benfeitorias realizadas no bem em cuja posse tenha entrado[16].

Por isso, o pagamento da soma resultante do regime do sinal fazia presumir a existência de um sinal penitencial, em que as partes se reservavam no direito de repensar e de se arrepender, pagando como sanção a soma resultante do regime do sinal, tratando-se de uma obrigação de faculdade alternativa, em que o devedor se encontrava vinculado a emitir a declaração de vontade correspondente ao contrato prometido, mas com a faculdade de se desonerar, mediante o pagamento do montante resultante do regime do sinal.

Na atual redação do nº 4, do artigo 442º, do CC, mesmo que haja sinal, presume-se que as partes quiseram reservar a possibilidade da execução específica, com a consequente presunção de exclusão do sinal penitenciário, por se verificar antes uma presunção de existência de sinal confirmatório da conclusão do contrato.

Sendo uma das finalidades do sinal confirmatório a fixação preventiva e convencional da indemnização devida pelo não cumprimento, como já se disse, a mesma é determinada, invariavelmente, pelo regime-regra da perda do sinal ou do pagamento em dobro deste, ou, como limite mínimo de indemnização devida, se tiver sido estipulada convenção em contrário, nos termos do disposto pelo artigo 442º, nº 4, do CC.

Encontrando-se decidido, com trânsito em jugado formal, nos termos do preceituado pelo artigo 620º, nº 1, do CPC, decorrente do segmento do acórdão que não foi objeto de impugnação, “condenar a ré a pagar à autora a quantia de €1.197.115,00, correspondente ao dobro do sinal passado”, sustenta ainda a autora que lhe deveria ter sido reconhecido o direito de obter, em sede de indemnização, o valor equivalente aos custos que suportou com a realização de despesas que pressupunham a conclusão do contrato definitivo.

Tendo havido prestação de sinal, pelo promitente-comprador, e inexistindo a tradição da coisa ("traditio"), resta-lhe socorrer-se da indemnização facultada pelo artigo 442°, nºs 2 e 4, correspondente, precisamente, ao dobro do sinal, pelo que "se o promitente vendedor violar definitivamente a promessa, impossibilitando o seu cumprimento, a contraparte apenas poderá exigir indemnização pelos danos provenientes do não cumprimento que, em caso de sinal passado, é o que resulta da substância do valor do sinal"[17], inexistindo, na ausência de estipulação em contrário, o direito de reclamar qualquer outra indemnização[18].

Como assim, quando não for eficaz como meio de coerção ao cumprimento do contrato, o sinal funciona como veículo ressarcidor do dano, não se podendo aplicar o enriquecimento sem causa, dada a subsidiariedade deste instituto[19].

Ora, não se tendo demonstrado a existência de estipulação que contemple uma indemnização suplementar pelo incumprimento do contrato, independentemente do mecanismo do sinal, não tem fundamento substancial esta pretensão formulada pela autora, pelo que se revoga, consequentemente, o acórdão recorrido, neste particular da condenação em liquidação.

CONCLUSÕES:

I – Não tendo a ré interposto recurso do acórdão da Relação respeitante à taxa de juros da condenação, mas, tão-só, a autora, nem sequer, em sede de contra-alegações, requereu, subsidiariamente, a sua ampliação, não se considerando aquela vencida no acórdão recorrido, nesta matéria, não pode considerar-se prejudicada pela decisão singular do relator que julgou extinta a instância recursiva e não conheceu do objeto do recurso de revista interposto pela autora, quanto à mesma matéria, sendo, consequentemente, inadmissível a reclamação formulada pela ré, ao abrigo do disposto pelo artigo 652º, nº 3, do CPC.

II - Não é a respeito dos negócios preliminares, em que se inclui o contrato-promessa, e cuja violação gera a responsabilidade própria do incumprimento do contrato, que se coloca a questão da responsabilidade na formação dos contratos, mas antes a propósito dos atos pré-negociais destituídos de qualquer garantia específica.

III - No âmbito do contrato-promessa, está-se fora da responsabilidade pré-contratual [culpa in contrahendo], pois o que se verifica, então, é a responsabilidade pelo incumprimento do contrato [culpa in contractu], uma vez que os atos preparatórios de um contrato definitivo de compra e venda de imóveis revestem natureza negocial, tendo-se autonomizado quando assumem a figura do contrato-promessa.

IV - O contrato-promessa, embora se distinga do contrato prometido, situando-se entre a fase pré-contratual e o contrato definitivo, traduz-se numa convenção completa, revestindo, em princípio, a natureza de um puro contrato obrigacional, ao qual são aplicáveis, em princípio, as disposições legais relativas ao contrato prometido.

V - As disposições legais relativas ao contrato prometido são as que contendem com a responsabilidade contratual e não com a responsabilidade pré-negocial.

VI - A presuntiva natureza confirmatória do sinal resulta, desde logo, do facto de as partes quando celebram um contrato se vinculam, em princípio, de modo irrevogável, e não se reservam na faculdade de retração ou de recesso do contrato, ou seja, na faculdade de arrependimento, reforçando-se, igualmente, face à anormalidade que o sinal penitencial apresenta num sistema jurídico que consagra a nulidade da cláusula de irrenunciabilidade prévia do credor ao direito de pedir o cumprimento.

VII – O sinal penitencial, apenas, deve ter lugar quando resulte da lei, ou de uma inequívoca vontade das partes, em que se convencione, expressamente, a faculdade de arrependimento.

VIII - O sinal confirmatório apresenta uma dupla função, desde logo, a precípua finalidade do reforço dos vínculos nascentes do contrato e a coerção indireta do devedor ao seu cumprimento, mas, também, a fixação prévia e convencional do quantitativo da indemnização devida, em caso de não cumprimento imputável a uma das partes, independentemente do montante e até da existência do dano efetivo.

IX - A fixação preventiva e convencional da indemnização devida pelo não cumprimento, é determinada, invariavelmente, pelo regime-regra da perda do sinal ou do pagamento em dobro do mesmo, ou, como limite mínimo de indemnização devida, se tiver sido estipulada convenção em contrário.

X - Tendo havido prestação de sinal, pelo promitente-comprador, sem tradição da coisa, deixando o promitente vendedor de celebrar o contrato definitivo, a indemnização pelos danos provenientes do não cumprimento corresponde ao dobro do sinal prestado, inexistindo, na ausência de estipulação em contrário, o direito de reclamar qualquer outra indemnização suplementar.

XI – Não sendo eficaz a existência do sinal como meio de coerção ao cumprimento do contrato, o mesmo funciona como veículo ressarcido do dano, por não ser de aplicar o mecanismo do enriquecimento sem causa, dada a natureza subsidiária deste instituto.

DECISÃO[20]:

Por tudo quanto exposto ficou, acordam os Juízes que constituem a 1ª secção cível do Supremo Tribunal de Justiça, em julgar inadmissível a reclamação formulada pela ré “Rede Ferroviária Nacional Refer – EP.”, por não poder considerar-se prejudicada com a decisão singular do relator que declarou extinta a instância recursiva e não conheceu do objeto do recurso de revista interposta pela autora, mas conceder a revista da mesma ré e, em consequência, revogam o acórdão recorrido, na parte em que “condena a ré a pagar à autora a quantia que se vier a liquidar relativa a compensação dos valores despendidos pela Autora e constantes dos pontos 17, 31, 33 e 54, até ao limite de € 250.000,00”, que confirmam, em tudo o mais.

                                                                    *

Custas da revista, a cargo da autora e da ré, na proporção de 3/4 e de ¼, respetivamente.

                                                          *

Notifique.

Lisboa, 07 de junho de 2016

Helder Roque (Relator)

Martins de Sousa

Gabriel Catarino

_______________________________________________________
[1] Relator: Helder Roque; 1º Adjunto: Conselheiro Martins de Sousa; 2º Adjunto: Conselheiro Gabriel Catarino.
[2] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, V, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, 141.
[3] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, V, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, 141, citado.
[4] STJ, de 09-09-2010, Pº nº 1141/97, Sumários do STJ, Setembro/2010; STJ, de 10-10-2003, Pº nº 03S744, www.dgsi.pt
[5] Miguel Teixeira de Sousa, Legitimidade e interesse no recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade, in Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Armando M. Marques Guedes, FDUL, 2004, 948.
[6] Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, 2005, Coimbra Editora, 653.
[7] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 1970, Almedina, 211; Almeida Costa, Contrato-Promessa, Uma Síntese do Regime Vigente, 7ª edição, revista e actualizada, 2001, 11 e 12.
[8] Almeida Costa, RLJ, Ano 116º, 148.
[9] Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, 4ª edição, 2002, Coimbra Editora, 207.
[10] STJ, de 28-5-1995, CJ (STJ), Ano III (1995), T1, 144.
[11] Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 12ª edição, revista e aumentada, 2007, Almedina, 27.
[12] Galvão Telles, Direito das Obrigações, 7ª edição, revista e atulizada, 1997, Coimbra Editora, 102; Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1º volume, 1990, AAFDL, 481.
[13] Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 12ª edição, revista e aumentada, 2007, Almedina, 95 a 97.
[14] Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 12ª edição, revista e aumentada, 2007, Almedina, 266 e 267.
[15] Salvo estipulação em contrário, a existência de sinal impede os contraentes de exigirem qualquer outra indemnização pelo não cumprimento do contrato, além da fixada no número anterior”, ou seja, a perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
[16] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I, 4ª edição, revista e actualizada, com a colaboração de Henrique Mesquita, Coimbra Editora, 1987, 418.
[17] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 9ª edição, revista e actualizada, 1998, Almedina, 381; STJ, de 06-05-2004, Pº nº 03B4295, www.dgsi.pt
[18] STJ, de 12-1-1994, CJ (STJ), Ano II (1994), T1, 31.
[19] Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 12ª edição, revista e aumentada, 2007, Almedina, 150 e 151.
[20] Relator: Helder Roque; 1º Adjunto: Conselheiro Martins de Sousa; 2º Adjunto: Conselheiro Gabriel Catarino.