Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
96/18.9T8PVZ.P1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: FERNANDO BAPTISTA
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
DANOS FUTUROS
DANOS PATRIMONIAIS
PERDA DA CAPACIDADE DE GANHO
Data do Acordão: 04/21/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I. O dano biológico vem sendo entendido como dano-evento, reportado a toda a violação da integridade físico-psíquica da pessoa, com tradução médico-legal, ou como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, independentemente de dele decorrer ou não perda ou diminuição de proventos laborais; é um prejuízo que se repercute nas potencialidades e qualidade de vida do lesado, susceptível de afectar o seu dia-a-dia nas vertentes laborais, sociais, sentimentais, sexuais, recreativas, determinando perda das faculdades físicas e/ou intelectuais em termos de futuro, perda essa eventualmente agravável em função da idade do lesado.

II. Tal dano tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como pode ser compensado a título de dano moral. Depende da situação concreta sob análise, a qual terá de ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originará, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida, e por si só, uma perda da capacidade de ganho ou se se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, sem prejuízo do natural agravamento inerente ao decorrer da idade.

III. Não sendo possível determinar o valor exacto deste dano, tal avaliação terá de ser efectuada recorrendo à equidade, nos termos do artigo 566 º n.º 3 do CC. Isto é, a equidade terá de ser sempre um elemento essencial no cálculo deste dano, independentemente de se considerar o dano biológico numa vertente meramente patrimonial, mais ou menos patrimonial ou até... como um tertium genus.

IV. Na determinação do seu quantum indemnizatório, deve ter-se em consideração os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, face ao que dispõe o art. 8°, n° 3, do CC, fazendo-se a comparação do caso concreto com situações análogas equacionadas noutras decisões judiciais, sem se perder de vista a sua evolução e adaptação às especificidades do caso concreto – não podendo, assim, o dano biológico ser indemnizado por obediência a tabelas rígidas, de forma que a uma mesma pontuação em pessoas de idade aproximada tenha de corresponder necessariamente a fixação do mesmo valor a ressarcir.

V. Particularmente relevante é a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, assim como de atividades profissionais ou económicas alternativas (tendo em conta as qualificações e competências do lesado).

VI. Como tal, desempenhando a Autora a actividade profissional de enfermeira instrumentista (e não se olvidando que cirurgias há que demoram muitas horas a finalizar e, como tal, a exigir destes profissionais (tal como dos médicos cirurgiões), não apenas grande resistência física e força anímica, como marcante rapidez, eficácia, agilidade e prontidão no auxílio ao cirurgião, sob pena de porem em causa o sucesso de uma intervenção cirúrgica e a saúde do paciente), o facto de ter ficado seriamente afectada com o acidente de viação de que foi vítima (e para o qual em nada concorreu), na medida em que perdeu agilidade e ficou com a sensação de desequilíbrio quando faz movimentos bruscos com a cabeça e pescoço, não pode deixar de pesar significativamente na determinação do quantum indemnizatório.

VII. Na quantificação dos danos não patrimoniais deve o julgador procurar encontrar o valor que repute justo no quadro da equidade e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, não deixando de trazer à colação e analisar decisões jurisprudenciais mais ou menos semelhantes, no fito de procurar que a indemnização atribuída esteja em sintonia com o cumprimento de um regime jurisprudencial de segurança e igualdade na realização da justiça equitativa.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível



I – RELATÓRIO


AA, solteira, maior, enfermeira, NIF ..., residente na Travessa ..., ..., ..., ..., ..., instaurou ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum, contra CRÉDITO AGRÍCOLA SEGUROS – COMPANHIA DE SEGUROS DE RAMOS REAIS, SA, alegando essencialmente que, em Fevereiro de 2015, ocorreu um acidente de viação que consistiu numa colisão entre o veículo ligeiro de passageiros de que a A. é proprietária, com a matrícula ..-..-MJ, e o veículo ligeiro de passageiros seguro na R., propriedade de BB, sua condutora e única culpada, como assumiu a própria R.

Do acidente resultaram vários danos patrimoniais e não patrimoniais, pessoais e materiais, para a A. que a R. deve reparar e que contabilizou assim:

- Perda do veículo e despesas com deslocações, exames médicos, medicamentos e consultas cujo valor a R. já pagou parcialmente, estando em falta € 889,14;

- Perdas salariais: € 14.765,60;

- Danos não patrimoniais, incluindo privação do uso do veículo: € 24.000,00;

- Danos patrimoniais, pelo défice funcional permanente de 2 pontos: € 40.000,00; e ainda,

- Indemnização de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que poderão ocorrer no futuro com o agravamento do seu estado físico e psíquico, que importem despesas no futuro com consultas, exames, medicamentos e tratamentos por causa das lesões sofridas e que continua ainda em tratamento, na sequência do acidente de que foi vítima, a liquidar em execução de sentença.

A estes valores fez acrescer o pagamento de juros de mora sobre cada um deles, a contar da citação.

Deduziu pedido condenatório em conformidade.


Citada, a R. reconheceu a culpa da sua segurada, mas impugnou parcialmente os factos relacionados com as consequências do acidente, considerando exagerados os valores das indemnizações peticionadas.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador a que se seguiram a identificação do objeto do litígio e os temas de prova.


Teve lugar a audiência final, após o que foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis:

«Em face do exposto, o Tribunal, julgando a ação parcialmente provada e procedente:

A) condena a Crédito Agrícola Seguros Companhia de Seguros, S. A. a pagar à Autora AA o seguinte:

a) a quantia de 32.173,55 a título de danos patrimoniais e dano biológico, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde 24 de Janeiro de 2018, até integral e efetivo cumprimento;

b) a quantia de 18.000, a título de compensação por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a presente data, até integral e efetivo cumprimento;

B) absolve a dos restantes pedidos formulados pela Autora.


Custas a cargo da Autora e da na proporção de 63/100 e 37/100, respetivamente.

(…)».


Inconformadas com a sentença, recorreu a A. e a R. de apelação.


Em acórdão, a Relação ... proferiu a seguinte decisão:

«Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação da A. e a apelação da R. parcialmente procedentes e, em consequência, altera-se a sentença recorrida, condenando-se a R. Crédito Agrícola Seguros – Companhia de Seguros, S. A. a pagar à A. AA:

a) A quantia total de € 20.173,55 a título de danos patrimoniais[1] e dano biológico, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde 24 de janeiro de 2018, até cumprimento integral e efetivo;

b) A quantia de € 15.000,00 a título de compensação por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a data da sentença, até cumprimento integral e efetivo;

c) As quantias relativas às consultas médicas e aos medicamentos que a A. suportar no futuro por causa de dores que venha a sofrer em consequência das lesões sofridas no acidente, a liquidar oportunamente.

No mais, absolve-se a R..».


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De novo inconformada, vem a Autora AA interpor recurso de Revista, apresentando alegações que remata com as seguintes


CONCLUSÕES:

1º Deve por Vª Exas, ser admitido o presente recurso de revista normal, ao abrigo do disposto nos artigos 629, nº 1 e 671º, nº1 do CPC., o que se requer a V.ª Ex.ªs., por estarem preenchidos os seus requisitos legais, a causa ter valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada ter sido desfavorável à aqui recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, conforme melhor fundamentado supra na nossa motivação.

2º O tribunal de primeira instância avaliou o dano biológico em € 28.000,00, a aqui recorrente recorreu para o tribunal da Relação pedindo que fosse fixado em 40.000,00, e o tribunal da relação na decisão de que ora se recorre, reduziu o valor atribuído na 1ª instância para €16.000,00, um decaimento muito significativo para a aqui recorrente de € 13.925,26 (inclui os juros legais referidos na sentença e que dela são parte integrante), de que frontalmente se discorda.

3º Com o devido respeito, o tribunal “a quo“ não valorizou convenientemente ou desvalorizou o trabalho que é realizado pelos enfermeiros e o seu grau elevado de exigência, que têm como missão principal salvar vidas, ajudar, cuidar dos pacientes, e que para isso têm de ser eficazes, rápidos e ágeis nas suas respostas que têm de dar no exercício da sua profissão.

4º Não se pode comparar a profissão da vítima, aqui recorrente, com outro tipo de profissão, pois cada uma tem as suas especificidades e exigências, mas quando a vida de uma pessoa depende de um profissional de saúde, seja ele médico ou enfermeiro, a responsabilidade e exigência torna-se evidentemente muito maior, é enorme, pois a vida é o bem mais valioso e precioso que temos.

5º A recorrente no exercício normal da sua profissão, não pode cumprir cabalmente, como o fazia até à data do acidente, as exigências que lhe são pedidas pela sua profissão, nomeadamente de rigor, rapidez e eficiência na assistência quer aos pacientes quer ao cirurgião no bloco operatório (como provado em 39.), dado que perdeu agilidade (ponto 66 da matéria provada) e não pode agora fazer determinados movimentos mais bruscos (entenda-se mais inesperados ou súbitos como lhe exige frequentemente o exercício da sua profissão, como, nomeadamente, entre outros, em trabalhos que exigem muita tensão e atenção no bloco operatório onde por regra mais está, passar ou facultar ao cirurgião os instrumentos ou material cirúrgico que este necessita e lhe pede quando está a operar, ou ainda a passagem de doentes das macas para as marquesas) para poder ser rápida e eficiente na assistência que tem de dar aos pacientes e ao cirurgião, pois, quando precisa de fazer esses movimentos mais súbitos e que têm de ser rápidos, fica com a sensação de desequilíbrio. É evidente que não pode. É evidente que estes danos lhe passaram a limitar, limitam e vai continuar a limitar, o normal exercício da sua profissão. E com o passar dos danos, cada vez vai ser pior.

6º A jurisprudência tende a ser mais atualista e evolutiva, e diferenciar a importância e exigência das profissões que usa na sua análise comparativa dos casos que indica, caminho este, com o devido respeito, que não foi o seguido pelo tribunal “a quo”.

7º Em consequência do acidente, para além do atrás dito, a recorrente ficou a padecer de uma incapacidade parcial permanente de 3 pontos, compatível com o exercício da sua atividade profissional habitual, mas com os esforços suplementares e necessidade de moderação de trabalhos (o que para esta profissão como supra já se deixou dito na motivação se torna muito difícil de nestas condições poder ser exercida)

8º Contrariamente ao referido no douto acórdão recorrido (que se limitou a dizer, que, “Dada a idade da lesada e a sua alargada ocupação, não se augura progressão significativa na carreira”), aquela incapacidade permanente geral que lhe foi reconhecida, afeta consideravelmente não só o dia a dia do exercido da sua profissão, mas a progressão na carreira da recorrente, que podia, não fosse o acidente, ser até significativa, dado que a aqui recorrente, ainda tinha e tem muitos anos pela frente, pois à data do acidente, tinha apenas 51 anos de idade.

9º Na valoração deste dano, o tribunal “a quo” deveria ter em conta os prejuízos que com grande probabilidade ocorrerão e que se prendem com as dificuldades, para além do exercício normal da profissão, na progressão da carreira, na execução de outros trabalhos em outras instituições de saúde e no exercício das atividades no âmbito do SIGIC ( Sistema Integrado de Gestão de inscritos para cirurgia).

10º Há cirurgias que demoram horas a finalizar, os enfermeiros instrumentistas têm de ser rápidas, eficazes e ágeis no auxilio que dão e devem dar com rapidez e prontidão ao cirurgião, sob pena de porem em causa o sucesso de uma intervenção cirúrgica e a saúde do paciente e a sua própria vida, além de terem de passar essas horas todas sempre em pé, e para isso, têm de ter saúde, o que a aqui recorrente, infelizmente, deixou a partir do acidente de poder contar ou ter, tal como a que tinha ou contava antes de ser vitima deste acidente.

11º A agilidade, destreza e equilíbrio corporal são de extrema importância para que a recorrente possa exercer convenientemente e normalmente os seus serviços.

12º O Tribunal “a quo“ não deu também aqui a devida importância a esta perda, que é muito significativa e relevante para uma enfermeira instrumentista, que executa também trabalhos a laser, que não pode de maneira alguma perder a agilidade e o equilíbrio, que são fatores ou qualidades de extrema importância, e a sua perda é de extrema gravidade e de graves consequências.

13º De acordo com todo o contexto factual, e da matéria dada como provada e demais prova documental, é de concluir que as limitações físicas da recorrente, que se objetivou numa incapacidade permanente de 3 pontos, afetam-na em muito na sua atividade profissional, pois trata-se de sofrimentos físicos, que lhe causam e irão futuramente causar ainda e diariamente o seu exercício normal da atividade e o grande risco de perder oportunidades de trabalho, que já está a acontecer, pois que, tendo ficado limitada como ficou, a sua vida profissional jamais irá ser a mesma e com o andar dos anos os danos que resultaram do acidente, nomeadamente os sofrimentos físicos com esforços suplementares que passou a ter de fazer após o acidente e terá de fazer sempre, irão agravar-lhe consideravelmente o seu estado de saúde e a sua capacidade de trabalho, com perdas patrimoniais que já estão a acontecer e que futuramente poderão vir a ser significativas.

14º A indemnização a arbitrar pelo dano biológico, consubstanciado numa limitação funcional ao nível dos movimentos (duma enfermeira instrumentista), deverá compensar a lesada, aqui recorrente, também, da inerente perda de capacidades mesmo que estas ainda não estejam imediata e totalmente refletidas no nível de rendimento auferido pela recorrente.

15º Esta compensação do dano biológico deve ter por base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição ou limitação às possibilidades do exercício da sua profissão que se irá necessariamente agravar com o decurso do tempo, em vários locais e instituições, enquanto fonte atual de possíveis acréscimos patrimoniais, frustrada irremediavelmente pelo grau de incapacidade que a vai afetar para toda a vida, quer da acrescida penosidade e esforço no exercício da sua atividade diária, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequelas irreversíveis das lesões sofridas pela aqui recorrente.

16º Não foi levado ainda em conta pelo tribunal “quo “, para o cálculo da indemnização, para além do mais referido na nossa motivação, o aumento da inflação que estamos a vivenciar, o aumento acelerado dos preços, todos estes factos, porque estes mais atuais e recentes, devem ser considerados para chegarmos a uma justa e equitativa indemnização, que se quer atualista e progressista.

17º Não pode assim o tribunal “quo” socorrer-se dos acórdãos que cita relacionados com o presente caso, quando, para além do mais que os distingue e que desconhecemos, a conjuntura económica à data dos factos alegados nesses processos é totalmente diferente da atual, e o dinheiro nessas datas valia mais do que o que vale hoje, pelo que, os valores das indemnizações são por isso incomparáveis, sendo que a tendência deve ser e tem sido (nomeadamente na união europeia) de aumentos dos valores atribuídos às vitimas de acidentes de viação.

18º Atenta a idade da autora, o limite provável da sua vida ativa , a esperança média de vida que se situa nos 83 anos, o seu grau de incapacidade , o aumento do nível dos salários, os ganhos da produtividade, maior dificuldade na progressão da carreira seja significativa ou não ( a evolução profissional não tem limite de idade), as variantes das taxas de juros e da inflação e do aumento do nível dos preços que como é do conhecimento geral estão a aumentar, continuamos a entender, que deve ser arbitrada à aqui recorrente uma indemnização no valor de 40.000,00 ( valor que foi arbitrado no âmbito do referido acórdão do Supremo tribunal de Justiça – Proc 952/12.8TVPRT.P1. S1), por este dano biológico, por se apresentar mais conforme aos princípios da justiça, da equidade e da proporcionalidade, e mais progressista e atualista, nos termos do artigo 566º, nº 3 do CPC, e /ou pelo menos, caso assim não seja entendido, se mantenha o valor que foi arbitrado pela primeira instância de € 28.000,00, não se justificando a sua redução.

19. O Tribunal a quo também valorou de forma demasiado exígua e modesta os danos não patrimoniais.

20º Por todas as nossas razões expostas aqui na nossa motivação de recurso, e por outras que V.ªs Ex.ªs mui superiormente sempre podem suprir, somos de modesto entendimento, que ao caso, é perfeitamente justo e equitativo arbitrar à aqui recorrente, uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor peticionado pela recorrente de € 24.000,00, ou caso assim não seja entendido seja então mantido o valor de € 18.000,00 arbitrado pelo tribunal de 1º instância, o que se requer a V.ªs Ex.ªs., dado que se conteve dentro dos critérios jurisprudenciais que, numa perspetiva atualista, generalizadamente vêm sendo adotados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o principio da igualdade.

21º Pretende -se ainda, com o presente recurso, que o pedido da alínea e), da petição inicial, seja decidido de uma forma mais ampla do que aquela que foi proferida no tribunal da Relação, no sentido de este tribunal vir a condenar a ré a pagar também à autora os valores referentes a exames e tratamentos, que a recorrente venha de futuro a precisar de realizar em consequência das lesões sofridas no acidente, que se vierem a liquidar oportunamente em execução de sentença, o que se requer a V.ªs Ex.ªs.

22º Dado concluir-se, da matéria de facto provada e dos demais meios de prova, como a documental, veja-se, entre outros, o ponto. 31 “Em caso de agravamento (...), a Autora poderá ser submetida a cirurgia cervical C5-C6, C6-C7(...); art. 35. (...)a Autora fico a padecer a título definitivo,(...); 36. (...) défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (...), a exigir esforços suplementares e trabalhos moderados; 64. (...) a perspetiva de um agravamento do seu estado de saúde com o passar dos anos; 66. (...) perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça pois fica com a sensação de desequilíbrio; 39. A atividade da autora é exigente, requer esforço, dedicação, rigor, rapidez e eficácia na assistência quer aos pacientes, quer ao cirurgião no bloco operatório, implicando passar muito tempo de pé e em circulação. 66.A- Em algumas situações, designadamente de mudanças de tempo e de esforço excessivo, a A. continuará a sentir dor, (...) 70. A ortóse (...) causa desconforto, (...);

dos esclarecimentos prestados pelas Exmas Peritas do INML, a fls., dos quais se extrai que o desempenho da atividade profissional poderá levar a um agravamento e a uma revisão de tratamentos instituídos

23º O acórdão de que se recorre, ao assim não ter entendido, violou o disposto no nº 2 do art.º 564º do CC.

24º Face ao supra exposto na nossa motivação do presente recurso, tendo em linha de conta a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, e as diretivas comunitárias, que cada vez mais dão relevância à proteção das vitimas de acidente de viação, ao valor da dignidade da pessoa humana, e à esperança média de vida, que têm vindo a permitir o aumentar dos valores indemnizatórios devidos às vitimas, mais atualistas e mais progressistas e por isso mais justas, a decisão do tribunal “ a quo”, violou esses princípios universais e os valores mais humanistas e atuais, jurisprudência deste mais alto tribunal, e ainda, entre outros, referidos supra na nossa motivação de recurso e nossas conclusões, violou, nomeadamente, o disposto nos artigos 483º, nº 1, 494º, 496º, nºs 1e 4, 562º, 564º, nº 1 e 2, e 566º, nº 3 todos do Código Civil.

Nestes termos e nos melhores de direito que Vª Exas superiormente suprirão, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente,

Como ato de inteira e sã justiça.


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Contra-alegou a Ré CRÉDITO AGRÍCOLA SEGUROS - COMPANHIA DE SEGUROS DE RAMOS REAIS, S.A., pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.


Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.


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II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO


Nada obsta à apreciação do mérito da revista.

Com efeito, a situação tributária mostra-se regularizada, o requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC). Para além de que tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC).


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Considerando que o objecto do recurso (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), temos como questões a decidir:

1. Se devem alterar-se os valores indemnizatórios fixados no acórdão recorrido a título de dano biológico e danos não patrimoniais.

2. Se o pedido formulado pela Autora sob a al. e)[2], da petição inicial, deve ser “apreciado e decidido de uma forma mais ampla do que aquela que foi proferida no tribunal da Relação”, no sentido de este tribunal vir a condenar a ré a pagar também à autora os valores referentes aos tratamentos e exames, que a recorrente venha a precisar de realizar em consequência das lesões sofridas no acidente, que se vierem a apurar e liquidar oportunamente em execução de sentença.


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III – FUNDAMENTAÇÃO


III. 1. FACTOS PROVADOS


É a seguinte a matéria de facto provada (fixada na Relação após impugnação em recurso):

1. No dia 1 de Fevereiro de 2015 ocorreu um acidente de viação, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de marca ..., com a matrícula ...-...-MJ, propriedade da Autora e conduzido por esta, e o veículo de marca ..., com a matrícula ...-..-IP, propriedade de BB e por esta conduzido [ponto 1º dos factos assentes do despacho em referência].

2. Por contrato de seguro titulado pela apólice nº......63, a proprietária do “IP” transferiu a sua responsabilidade por danos causados a terceiros para a Companhia de Seguros Ré, tendo a mesma aceite a responsabilidade do veículo seu segurado na produção do acidente em causa nestes autos [ponto 2º dos factos assentes do despacho em referência].

3. Os valores pedidos pela Autora, referentes aos documentos 39 a 42 e 46 e 47 juntos com a p.i. foram já liquidados pela Ré [ponto 3º dos factos assentes do despacho em referência].

4. A Ré pagou à Autora a quantia de € 2.000 relativa à perda total do MJ e € 2.211,60 de despesas de deslocação, medicamentos, consultas e tratamentos de medicina física e reabilitação realizadas até 18 de Fevereiro de 2016 [resposta ao artigo 15º da petição inicial].

5. A Ré não disponibilizou à Autora um veículo de substituição tendo liquidado o valor da perda total, indicado em 4), a 3 de Junho de 2015 [resposta ao artigo 78º da petição inicial].

6. A Ré reembolsou o montante de € 265,05 que a Autora suportou a título de despesas de deslocação de táxi [resposta ao artigo 74º da petição inicial].

7. Na sequência do embate, a Autora sofreu síndrome de chicote no pescoço, perdeu os sentidos momentaneamente, entrando em pânico quando os recuperou, com medo de morrer e sofreu de amnésia transitória [resposta aos artigos 21º, 22º da petição inicial].

8. Por apresentar queixas no pescoço, zona cervical e lombar, tonturas e cefaleias, foi transportada pelos Bombeiros Voluntários ... para o Centro Hospital ..., para aí ser assistida [resposta ao artigo 24º da petição inicial].

9. Atentas as suas queixas, foi submetida a meios complementares de diagnóstico, nomeadamente, raio-X à bacia, ao crânio (duas incidências), à coluna cervical, lombar e dorsal (duas incidências) [resposta ao artigo 26º da petição inicial].

10. Obtidos os resultados dos exames, a Autora teve alta hospitalar pelas 22h46, com recomendação para fazer analgesia [resposta ao artigo 27º da petição inicial].

11. Devido às lesões, nos dias imediatamente seguintes, os sintomas agudizaram-se, sentindo fortes dores cervicais e lombares, dores de cabeça, tonturas, náuseas, perda de equilíbrio ao movimentar o pescoço e falta de força dos membros superiores e membro inferior direito, que não passavam com a medicação [resposta ao artigo 28º da petição inicial].

12. A Autora recorreu à consulta no Centro de Saúde ... no dia 4 de Fevereiro e, novamente, a 13 de Fevereiro seguinte, para emissão de certificados de incapacidade temporária para o trabalho por doença justificativos das faltas ao serviço até 13 de Março de 2015 [resposta ao artigo 29º da petição inicial].

13. No dia 9 de Fevereiro de 2015 teve uma consulta de especialidade de neurocirurgia com o Dr. CC, o qual diagnosticou os sintomas como traumatismo cervical [resposta ao artigo 30º da petição inicial].

14. Na referida consulta o médico prescreveu à Autora:

a) Paracetamol 1000 mg em SOS alternado com Ibuprofeno, Domperidona 10 mg em SOS 1 a 2 horas antes das e principais refeições e Trimetazidina 35 mg de 12 em 12 horas;

b) o uso de um colar cervical por 2 semanas;

c) a realização de TC cerebral e RMN cervical [resposta aos artigos 31º, 34º da petição inicial].

15. Na mesma ocasião o médico aconselhou a Autora a não conduzir [resposta ao artigo 31º da petição inicial].

16. Então, a Autora apresentava os seguintes sintomas:

- dores na transição crânio cervical com dores de predomínio lombar e região interescapular;

- episódios de tonturas e náuseas;

- cervicalgias que pioravam com o movimento cervical;

- parestesias e sensação de falta de força dos membros superiores e membro inferior direito, com dor da virilha para o joelho [resposta aos artigos 32º, 33º da petição inicial].

17. Os sintomas referidos em 16) causavam à Autora grande preocupação e ansiedade [resposta ao artigo 32º da petição inicial]

18. No âmbito do tratamento, durante o ano de 2015, a Autora submeteu-se a: a) em 18 de Fevereiro, RMN à coluna cervical e TAC cerebral;

b) em 11 de Março, RMN à coluna lombar;

c) em 23 de Fevereiro, consulta de neurocirurgia; d) em 23 de Março, consulta de neurocirurgia;

e) em 31 de Março consulta de fisiatria;

f) um total de 120 sessões de medicina física e reabilitação, efetuadas na clínica O... Unipessoal, Ld.ª, até ao início de Abril, consistindo em fisioterapia, ultrassons, massagem manual e calor húmido;

g) 195 sessões de medicina física e reabilitação realizadas no Instituto ...-..., entre 6 de Abril e 4 Junho de 2015, consistindo em ultrassons, estimulação elétrica dos pontos motores, calor húmido, massagem manual, cinesioterapia corretiva postural;

h) em 23 de Abril, consulta de neurocirurgia no Instituto ...-...; i) em 29 de Abril consulta de fisiatria;

j) em 2 de Junho consulta de fisiatria;

k) um total de 30 sessões de medicina física e reabilitação realizadas no Instituto ...-..., entre 5 e 26 de Junho de 2015, consistindo em ultrassons, estimulação elétrica dos pontos motores, calor húmido, massagem manual, cinesioterapia corretiva postural;

l) em 30 de Junho, consulta de neurocirurgia para reavaliação do seu estado de saúde;

m) em 7 de Julho, consulta de fisiatria para reavaliação do seu estado de saúde [resposta ao artigo 34º da petição inicial].

19. As lesões e os tratamentos impediram a Autora de trabalhar desde a data do acidente até 10 de Junho de 2015 [resposta ao artigo 45º da petição inicial].

20. A Autora reiniciou o trabalho em 11 de Junho de 2015 com a recomendação de fazer apenas trabalhos moderados [resposta ao artigo 46º da petição inicial].

21. Devido ao traumatismo cervical, a partir de 11 de Fevereiro de 2016, a Autora passou a ser assistida no Hospital ... na consulta externa de medicina física e reabilitação, realizando entre 22 de Março e 12 de Maio de 2016, um tratamento que consistiu em cinesioterapia corretiva postural, calor húmido, massagem transcutânea e massagem manual, num total de 60 sessões [resposta ao artigo 36º da petição inicial].

22. A Autora despendeu € 94,25 nas consultas de medicina física e reabilitação de 11 de Fevereiro e 12 de Maio de 2016 e no tratamento referido em 21) [resposta ao artigo 38º da petição inicial].

23. Na consulta de 11 de Fevereiro de 2016 a Autora apresentava cervicobraquialgia esquerda, mobilidade cervical limitada por dor na rotação e inclinação para a esquerda, dor à palpação da porção superior do trapézio esquerdo e contratura para vertebral cervical esquerda [resposta ao artigo 37º da petição inicial].

24. A Autora continuou a ser assistida pelo Dr. CC até Dezembro de 2017[resposta ao artigo 42º da petição inicial].

25. Por indicação desse médico, em 18 de Fevereiro de 2016, realizou ressonância magnética à coluna vertebral seguida de consulta [resposta ao artigo 43º da petição inicial].

26. Na consulta de 12 de Maio de 2016, referida em 22), a Autora apresentava cervicalgia esporádica, parestesias, contratura paravertebral cervical e amplitude cervical limitada nos últimos graus por dor, tendo sido encaminhada para a consulta da cor crónica [resposta ao 37º da petição inicial].

27. Após as sessões de medicina física e reabilitação referidas em 21), a Autora foi orientada para acupunctura pelo médico neurocirurgião [resposta ao artigo 49º da petição inicial].

28. Em Agosto de 2017, a Autora era acompanhada na consulta da dor do Hospital ... apresentando queixas de cervicalgia esquerda, com braquialgia esporádica e parestesias desde a axila até aos 3º a 5º dedos mais à esquerda, mas também à direita [resposta ao artigo 40º da petição inicial].

29. Estava medicada com Flexiban por não tolerar a outra medicação e a realizar tratamento de acupunctura [resposta ao artigo 41º da petição inicial].

30. Devido às dores que sentia, em Fevereiro de 2015 e Março de 2016, a Autora também esteve medicada com Vallium para relaxamento muscular [resposta ao artigo 83º da petição inicial].

31. Em caso de agravamento das parestesias ou dores, a Autora poderá ser submetida a cirurgia cervical C5-C6, C6-C7, situação que não se justificava a 9 de Agosto de 2017 [reposta ao artigo 50º da petição inicial].

32. Em 19 de Outubro e 5 de Dezembro de 2017 a Autora teve duas consultas de neurocirurgia e em 6 de Novembro do mesmo ano realizou ressonância magnética cervical, suportando o montante de € 200 [resposta ao artigo 44º da petição inicial].

33. A Autora manteve tratamento ambulatório, designadamente, de acupunctura, até 1 de Maio de 2018 [resposta ao artigo 47º da petição inicial]

34. A Autora já padecia de hérnias em C5-C6, C6-C7, L4-L5 e L5-S1, as quais, até à data do acidente, não haviam sido diagnosticadas, eram assintomáticas e não causavam limitações [resposta ao artigo 69º da petição inicial].

35. Devido ao traumatismo cervical decorrente do acidente, apesar dos tratamentos a que se submeteu, a Autora ficou a padecer, a título definitivo, de dor à palpação difusa e inespecífica da região da nuca, sem contratura dos músculos da região cervical, com força muscular cervical conservada, mantendo força muscular dos membros superiores mantida e simétrica [resposta aos artigos 48º, 59º, 125º da petição inicial].

36. A queixa álgica identificada em 35) corresponde a défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 3 pontos, compatível com o exercício da atividade profissional habitual, mas a exigir esforços suplementares e trabalhos moderados [resposta aos artigos 51º, 63º da petição inicial].

37. A sequela referida em 35) faz a Autora sentir-se menos eficiente no seu trabalho e na vida pessoal, o que a deixa insegura, triste e angustiada [resposta aos artigos 95º, 96º, 97º da petição inicial].

38. A Autora é enfermeira instrumentista exercendo a sua atividade profissional no Hospital ... em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado [resposta ao artigo 62º da petição inicial].

39. A atividade profissional referida em 37) é exigente, requer esforço, dedicação, rigor, rapidez e eficácia na assistência quer aos pacientes, quer ao cirurgião no bloco operatório, implicando passar muito tempo de pé e em circulação [resposta ao artigo 64º da petição inicial].

40. À data do acidente a Autora auferia, a título de remuneração base, em 14 prestações mensais o valor de € 1.476,40 [resposta ao artigo 101º da petição inicial].

41. Também exercia a atividade referida em 38) no âmbito do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), relativamente a cirurgias efetuadas fora do horário normal de trabalho, auferindo montante variável em função do tipo de cirurgia e respetiva duração, pago, em média, quatro meses depois da sua prestação [resposta aos artigos 102º, 103º, 104º da petição inicial].

42. Prestava, igualmente, serviços de enfermagem esporádicos na ... em horário e com retribuição variável [resposta ao artigo 106º da petição inicial].

43. Os serviços referidos em 42) ascenderam, em 2014, ao valor ilíquido de € 1.502,15 e, em 2015, a € 53,70 com retenção de 25% a título de IRS [resposta aos artigos 107º, 115º da petição inicial].

44. As atividades referidas em 38), 41) e 42) proporcionaram à Autora, no ano de 2014, rendimentos ilíquidos no montante de € 32.453,46, ao qual foi deduzido o valor global de € 13.053,96 relativo a imposto, contribuições para a CGA e ADSE e sobretaxa [resposta aos artigos 102º, 103º, 104º da petição inicial].

45. Em 2015 a Autora auferiu rendimentos ilíquidos no montante de € 22.311,10, ao qual foi deduzido o valor global de € 8.017,31 relativo a imposto, contribuições e sobretaxa [resposta ao artigo 114º da petição inicial].

46. Do rendimento referido em 45), o montante de € 3.124,41 diz respeito à atividade referida em 41), exercida durante os meses Setembro, Outubro e Novembro de 2014 [resposta ao artigo 113º da petição inicial]

47. Desde Fevereiro de 2015 a Autora não auferiu qualquer montante no âmbito das atividades referidas em 41) e 42), respetivamente, até Dezembro e Novembro do mesmo ano [resposta aos artigos 105º, 106º, 113º da petição inicial].

48. No período decorrido entre a data do acidente e 11 de Junho de 2015, a Autora deixou de auferir subsídio de alimentação no montante de € 384,30 [resposta ao artigo 112º da petição inicial].

49. A Autora nasceu a .../.../1963 [resposta aos artigos 66º, 99º da petição inicial].

50. Antes do acidente a Autora era muito independente, social e profissional ativa, sem sintomas álgicos, excepto os relacionados com cefaleias [resposta ao artigo 68º da petição inicial].

51. Trabalhava, conduzia e fazia as tarefas domésticas com normalidade [resposta ao artigo 94º da petição inicial].

52. Á data do acidente, a Autora morava na cidade ... [resposta ao artigo 71º da petição inicial].

53. Devido às lesões, a Autora teve de se mudar para casa da Mãe na ..., que teve de a auxiliar, apesar de ser pessoa idosa e já cuidar de uma filha com deficiência [resposta ao artigo 71º da petição inicial].

54. Até à data do acidente, era a Autora quem prestava apoio à Mãe e à irmã [resposta ao artigo 72º da petição inicial].

55. A situação referida em 53) causou à Autora preocupação e revolta, fazendo-a sentir-se impotente, triste e irritada por sobrecarregar a Mãe [resposta aos artigos 72º, 73º da petição inicial].

56. Como não podia conduzir, nem tinha viatura para se deslocar às consultas, a Autora teve de se deslocar de táxi até ao final de Fevereiro de 2015 [resposta ao artigo 74º da petição inicial].

57. A partir do início de Março de 2015, por não gostar de andar de táxi, uma prima da Autora passou a levá-la no seu carro a consultas e tratamentos [resposta ao artigo 76º da petição inicial].

58. As situações referidas em 56) e 57) deixavam a Autora desconfortável e irritada por depender de terceiros [resposta aos artigos 75º, 76º da petição inicial].

59. Entre 8 e 10 de Abril de 2015 a Autora alugou uma viatura durante três dias para poder deslocar-se, despendendo o valor de € 245 [resposta ao artigo 77º da petição inicial].

60. A partir de Abril de 2015, com os tratamentos a efetuar-se no Instituto ...-..., a Autora regressou à sua residência na ... [resposta ao artigo 84º da petição inicial].

61. No período referido em 18) g), a demandante percorria 24 km todos os dias úteis nas deslocações para os tratamentos [resposta ao artigo 88º da petição inicial].

62. No período compreendido entre a data do acidente e o momento referido em 20) a Autora sofreu por estar sem trabalhar e não ter as suas rotinas, ficando deprimida [resposta aos artigos 80º, 81º, 82º, 90º da petição inicial].

63. O tempo despendido nas deslocações, consultas e nos tratamentos causava transtorno e incómodo à Autora [resposta ao artigo 90º da petição inicial].

64. A Autora sente ansiedade e receio com a perspetiva de um agravamento do seu estado de saúde com o passar dos anos [resposta aos artigos 84º, 96º da petição inicial].

65. A Autora sofreu dores de grau 2 numa escala de 1 a 7 devido às lesões e tratamentos [resposta aos artigos 85º, 90º da petição inicial].

66. A Autora perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça pois fica com sensação de desequilíbrio [resposta aos artigos 60º, 61º da petição inicial].

66.A- Em algumas situações, designadamente de mudanças de tempo e de esforço excessivo, a A. continuará a sentir dor, necessitando, ocasionalmente, de medicação para aliviar os respetivos sintomas, a prescrever em consulta do seu médico assistente (facto aditado pela Relação).

67. Nos primeiros meses após o acidente a Autora não conseguia dormir o suficiente por causa das dores e não encontrar posição [resposta ao artigo 55º da petição inicial].

68. Usou colar cervical durante duas semanas [resposta ao artigo 56º da petição inicial].

69. Também passou a usar colar cervical viaja para ... em visita à Mãe e à irmã que ali passaram a residir [resposta ao artigo 56º da petição inicial].

70. A ortótose referida em 69) causou e causa desconforto, tendo impacto estético [resposta ao artigo 56º da petição inicial].

71. No período decorrido desde o acidente até Abril de 2015, a Autora necessitou do auxílio de familiares para efetuar atividades domésticas e deslocações [resposta ao artigo 57º da petição inicial].


***


Factualidade dada como não provada (na sentença e confirmada pela Relação):

a) o Dr. CC prescreveu ... à Autora;

b) a Autora passou a ser seguida na consulta externa de medicina física e reabilitação do Hospital ... a partir de Outubro de 2015;

c) efetuou um programa de reabilitação desde 13 de Outubro de 2015 até à data referida no ponto 21) da fundamentação de facto despendendo o total de € 174,95;

d) em 22 de Fevereiro e 1 de Outubro de 2017 a Autora teve de recorrer às urgências por causa das dores que sentia;

e) devido ao acidente a Autora:

i) ficou a padecer de discopatia em L4-L5 com hérnias de Schmorl na transição lombar e hemangiomas de L1 e L2;

ii) mantém cefaleias e por vezes acorda com as mesmas; iii) dores no trapézio esquerdo, com dores à palpação; iv) parestesias no membro superior esquerdo;

v) sensação de falta de força nos membros superiores;

vi) mal estar craniano com sensação de pressão (sensação de ter um capacete);

vii) ocasionais parestesias nos membros superiores e sensação de falta de força e sensação de peso, deixando cair objetos com facilidade;

viii) tricipital diminuído;

f) o medicamento identificado em 30) fosse destinado a combater a depressão; g) a Autora necessita de manter terapêutica com acupunctura e pilates;

h) no conjunto a Autora teve perdas no valor de € 14.263,15.


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III. 2. DO MÉRITO DO RECURSO


1. DA INDEMNIZAÇÃO PELO DANO BIOLÓGICO


A Autora pediu fosse indemnizado o dano biológico em 40.000,00; na sentença avaliou-se esse dano em € 28.000,00; a Relação reduziu o valor atribuído na 1ª instância para €16.000,00 (inclui os juros legais referidos na sentença e que dela são parte integrante).

Desta redução operada pela Relação vem a Autora/Recorrente manifestar discordância, peticionando seja a indemnização por esse dano fixada no valor peticionado na inicial, ou pelo menos no montante arbitrado na sentença.


Quid juris?


v Do montante da indemnização arbitrada pelo défice funcional permanente da integridade físico-psíquica da Autora/Recorrente – o designado dano biológico (dano patrimonial, não patrimonial ou um tertium genus?).


Em causa, portanto, aferir do quantum indemnizatório que se ajusta a tal défice permanente, que foi fixado em 3 pontos (dano que não impede a Autora de exercer a sua actividade profissional habitual, é certo, mas que exige esforços suplementares e trabalhos moderados no seu desempenho.


Diverge a jurisprudência quanto à classificação, ou melhor, à natureza do chamado dano biológico (o decorrente da incapacidade permanente sem reflexo profissional): se um dano meramente patrimonial, se um dano moral, se um tertium genus. E procuram os vários arestos, cada um à sua maneira, justificar o quantum indemnizatório arbitrado para estes danos geradores de incapacidade permanente que se não repercutam directamente na capacidade de ganho do lesado (na medida em que não implicam uma diminuição da retribuição, embora implicando esforços acrescidos, ou, então, porque o lesado está fora do mercado de trabalho, como ocorre com desempregados, crianças, reformados).


O dano biológico tem suscitado especiais perplexidades na relação com a dicotomia tradicional da avaliação de danos patrimoniais versus danos não patrimoniais, por poder incidir numa, noutra ou em ambas as vertentes.

Este dano vem sendo entendido como dano-evento, reportado a toda a violação da integridade físico-psíquica da pessoa, com tradução médico-legal, ou como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, independentemente de dele decorrer ou não perda ou diminuição de proventos laborais[3]. É um prejuízo que se repercute nas potencialidades e qualidade de vida do lesado, susceptível de afectar o seu dia-a-dia nas vertentes laborais, sociais, sentimentais, sexuais, recreativas. Determina perda das faculdades físicas e/ou intelectuais em termos de futuro, perda essa eventualmente agravável em função da idade do lesado. Poderá exigir do lesado, esforços acrescidos, conduzindo-o a uma posição de inferioridade no mercado de trabalho[4]. Ou, por outras palavras, é um dano que se traduz na diminuição somático-psíquica do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre.


Ora, o dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como pode ser compensado a título de dano moral; tanto pode ter consequências patrimoniais como não patrimoniais. Ou seja, depende da situação concreta sob análise, a qual terá de ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originará, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida, e por si só, uma perda da capacidade de ganho ou se se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, sem prejuízo do natural agravamento inerente ao decorrer da idade. Tem a natureza de perda ‘in natura’ que o lesado sofreu em consequência de certo facto nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar[5].


Como quer que seja visto ou classificado este dano, o certo é que o mesmo é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial. É indemnizável em si mesmo, independentemente de se verificarem consequências para o lesado em termos de diminuição de proventos.

Também ARMANDO BRAGA[6] observa que “A jurisprudência (que cita em notas de rodapé e a págs. 133 e 134) tem considerado que a incapacidade permanente parcial para o trabalho constitui em si mesma um dano patrimonial, mesmo nos casos em que a vítima prossiga a sua actividade profissional habitual e sem que se verifique diminuição da retribuição.”.

Assim, é entendimento pacífico que mesmo as pequenas incapacidades ainda quando não impliquem directamente uma redução da capacidade de ganho, constituem sempre um dano patrimonial indemnizável (seja de natureza patrimonial, seja como dano não patrimonial – ou, se quisermos, classificado naquele tertium genus), dada a inferioridade em que o lesado se encontra na sua condição física, quanto à resistência e capacidade de esforço.    

Com efeito, uma incapacidade permanente parcial não se esgota na incapacidade para o trabalho, constituindo em princípio um dano funcional, mas sempre, pelo menos, um dano em si mesmo que perturba a vida da relação e o bem-estar do lesado ao longo da vida. Pelo que é de considerar autonomamente esse dano, distinto do referido dano patrimonial, não se diluindo no dano não patrimonial, na vertente do tradicional pretium doloris ou do dano estético.


O lesado não pode ser objecto de uma visão redutora e economicista do homo faber[7]. A incapacidade permanente (geral) de que está afectada a vítima constitui, nesta perspectiva, um dano em si mesmo, cingindo-se à sua dimensão anátomo-funcional. 

A incapacidade permanente geral (IPG) corresponde a um estado deficitário de natureza anatómica-funcional ou psicosensorial, com carácter definitivo e com impacto nos gestos e movimentos próprios da vida corrente comuns a todas as pessoas. Pode ser valorada em diversos graus de percentagem, tendo como padrão máximo o índice 100. Esse défice funcional pode ter ou não reflexo directo na capacidade profissional originando uma concreta perda de capacidade de ganho.


**


Na situação presente, a Autora ficou, por causa do acidente dos autos, com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 3 pontos, compatível com o exercício da atividade profissional habitual, mas a exigir esforços suplementares e trabalhos moderados [facto provado nº 36 - resposta aos artigos 51º, 63º da petição inicial].

É um dano merecedor, obviamente, de ser ressarcido.


Na determinação do seu quantum indemnizatório, ter-se-ão «em consideração os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, face ao que dispõe o art. 8°, n° 3, do CC, fazendo-se a comparação do caso concreto com situações análogas equacionadas noutras decisões judiciais, não se perdendo de vista a sua evolução e adaptação às especificidades do caso concreto».[8].

A jurisprudência autonomizou, antes da Portaria n.º 377/2008, de 26/05, o dano biológico e maioritariamente qualificou-o como de cariz patrimonial[9]. Esta Portaria adoptou, como salienta o seu preambulo, o “princípio de que só há lugar à indemnização por dano patrimonial futuro quando a situação incapacitante do lesado o impede de prosseguir a sua actividade profissional habitual ou qualquer outra.”.

Porém, por outro lado, refere-se na Portaria que “ainda que não tenha direito à indemnização por dano patrimonial futuro, em situação de incapacidade permanente parcial o lesado terá direito à indemnização pelo seu dano biológico, entendido este como ofensa à integridade física e psíquica.”.   

Nessa orientação, o artigo 4º da referida Portaria integra entre os denominados danos morais complementares o dano biológico.

No entanto, é entendimento pacífico que as normas da referida Portaria n.º 377/2008, de 26/05, alterada pela Portaria n.º 679/2009, de 25 de Junho, não são vinculativas para a fixação, pelos Tribunais, de indemnizações por danos decorrentes de responsabilidade civil em acidentes de viação, devendo «os valores propostos ( ... ) ser entendidos como o são os resultantes das tabelas financeiras disponíveis para a quantificação da indemnização por danos futuros, ou seja, como meios auxiliares de determinação do valor mais adequado, como padrões, referências, factores pré-ordenados, fórmulas em forma abstracta e mecânica, meros instrumentos de trabalho, critérios de orientação, mas não decisivos, supondo sempre o confronto com as circunstâncias do caso concreto e, tal como acontece com qualquer outro método que seja a expressão de um critério abstracto, supondo igualmente a intervenção temperadora da equidade, conducente à razoabilidade já não da proposta, mas da solução, como forma de superar a relatividade dos demais critérios. Os valores indicados, sendo necessariamente objecto de discussão acerca da sua razoabilidade entre o lesado e a entidade que deverá pagar, servirão apenas como uma referência, um valor tendencial a ter em conta, mas não decisivo», assumindo um carácter instrumental[10].


Portanto, na determinação dos montantes indemnizatórios aos lesados em acidentes de viação – como ocorre no presente caso –, os tribunais não estão obrigados a aplicar as tabelas contidas na citada Portaria, antes ali se estabelecem padrões mínimos, a cumprir pelas seguradoras, na apresentação aos lesados de propostas sérias e razoáveis de regularização dos sinistros, indemnizando o dano corporal[11].


No presente caso, até podíamos simplificar e, simplesmente, incluir o dano aqui em apreciação na indemnização que, a seguir, se vai fixar por danos morais.

Contudo, seguindo a posição maioritária da jurisprudência e por uma questão de rigor, dado que o dano biológico é distinto do dano não patrimonial (artigo 496.º do Código Civil) que se reconduz à dor, ao desgosto, ao sofrimento de uma pessoa que se sente diminuída fisicamente para toda a vida, entendemos (tal como se fez na decisão recorrida) ser de autonomizar, como dano patrimonial futuro esse maior esforço que a Autora terá de efectuar ao longo da sua vida activa. 


Ora, não sendo possível determinar o valor exacto do dano ora em causa, tal avaliação terá de ser efectuada recorrendo à equidade, nos termos do artigo 566 º n.º 3 do CC.

Isto é, a equidade terá de ser sempre um elemento essencial no cálculo do dano aqui sob apreciação, independentemente de se considerar o dano biológico numa vertente meramente patrimonial, mais ou menos patrimonial ou... como um tertium genus.


É certo que o nosso legislador não definiu o conceito de equidade, deixando a sua densificação para os aplicadores do Direito.

Nas palavras sábias de Pires de Lima e Antunes Varela[12], a equidade é a justiça do caso concreto. Julgar pela equidade é procurar a justiça do caso concreto "limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal"[13]. Ou, como diz ANA PRATA[14], "julgar segundo a equidade significa dar a um conflito a solução que parece mais justa, atendendo apenas às características da situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável. A equidade tem, consequentemente, conteúdo indeterminado, variável de acordo com as concepções da justiça dominantes em cada sociedade e em cada momento histórico".

Do que se trata, portanto, é de encontrar a solução mais equilibrada no contexto da prova disponível.

E porque não estamos perante uma imediata redução da capacidade de ganho, como já observámos, não se justifica o recurso às tabelas financeiras para se encontrar um capital que se extinga no fim da vida activa e seja susceptível de garantir, durante esta, as prestações periódicas correspondentes à sua perda de ganho.

Sendo um dano biológico sem reflexo na capacidade de ganho, apenas impondo um maior esforço, a acarretar um dano funcional que perturba a vida de relação e bem-estar da Autora, para o cálculo da respectiva indemnização, há, portanto, que fazer apelo aos supra aludidos juízos de equidade, tendo em consideração, designadamente, a esperança de vida da Autora, o grau de incapacidade permanente de que ficou a padecer e a sua actividade profissional.


*


Para a determinação da indemnização pelo dano biológico, o acórdão recorrido cita vários arestos dos tribunais superiores.

Como é sabido, o controlo da fixação equitativa da indemnização é admitido, no recurso de revista, por este Supremo Tribunal de Justiça, cabendo-lhe averiguar “se estavam preenchidos os pressupostos normativos do recurso à equidade; se foram considerados as categorias ou os tipos de danos cuja relevância é admitida e reconhecida; se, na avaliação dos danos correspondentes a cada categoria ou a cada tipo, foram considerados os critérios que, de acordo com a legislação e a jurisprudência, deveriam ser considerados; e se, na avaliação dos danos correspondentes a cada categoria ou a cada tipo, foram respeitados os limites que, de acordo com a legislação e com a jurisprudência, deveriam ser respeitados”[15].


Ora, o ac. recorrido arbitrou o montante indemnizatório pelo défice funcional permanente da Autora com recurso à equidade, como é aconselhado pela jurisprudência dominante neste Supremo, vária dela que, com dito, cita.

Por outro lado, procurou seguir os padrões indemnizatórios seguidos por essa jurisprudência, segundo um critério atualístico e evolutivo, de modo a não abalar critérios minimamente uniformes e, em última análise, o princípio da igualdade na aplicação do Direito[16]. E diz ter tido em consideração as particularidades e especificidades do caso concreto que, a seu ver, eram particularmente relevantes na determinação da indemnização sob apreciação.

Compreende-se perfeitamente a necessidade de haver uma possível uniformização de critérios valorativos neste domínio, imperativo, aliás, de cariz constitucional.

Como “vem sendo reiteradamente sublinhado pelo STJ, o juízo de equidade de que se socorrem as instâncias na fixação de indemnização, alicerçado, não na aplicação de um estrito critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em rigor, a resolução de uma questão de direito, pelo que tal juízo prudencial e casuístico deverá, em princípio, ser mantido, salvo se o critério adoptado se afastar, de modo substancial e injustificado, dos padrões que, generalizadamente, se entende deverem ser adoptados numa jurisprudência evolutiva e actualística, abalando a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade (arts. 566.º, n.º 3, do CC, e 674.º, e 682.º, do CPC)”[17].

Assim também, “Quando o cálculo da indemnização haja assentado decisivamente em juízos de equidade, ao Supremo não compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar, já que a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto sub juditio[18].


Ou seja, a determinação de indemnizações por dano biológico, na sua vertente patrimonial, e particularmente por danos não patrimoniais, obedece a juízos de equidade assentes numa ponderação casuística, à luz das regras da experiência comum, que não se reconduzem, rigorosamente, a questões de direito ou à aplicação de critérios normativos estritos para que está vocacionado o tribunal de revista[19]

C:\Users\daniela.c.matos_st\AppData\Local\Microsoft\Windows\Temporary Internet Files\Content.Outlook\OSTLKX6F\Revista 3987 10 acidente de viação I.doc - _ftn8.

Apesar disso e como bem se observa no Ac. deste Tribunal de 2/6/2016, na revista nº  3987/10.1TBVFR.P1.S1, relatado por Tomé Gomes, «caberá a este tribunal sindicar os limites de discricionariedade das instâncias, no recurso à equidade, mormente na busca de uniformização dos critérios jurisprudenciais, de modo a garantir o respeito pelo princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei, nos termos proclamados no n.º 1 do artigo 13.º da Constituição e conforme o disposto no n.º 3 do artigo 8.º do CC».


Como é sabido, todos os danos que causalmente forem imputados à conduta do condutor do veículo seguro na Ré devem por esta ser ressarcidos (arts. 562º a 564º do CC), sendo que em matéria que lida com lesões de ordem física que se projetam no futuro se mostra necessário, como dito, o recurso à equidade (art. 566º, nº 3, do CC), instrumento que permite encontrar o valor da compensação que seja concretamente ajustado à situação.


Ora, como se demonstra no acórdão recorrido, o montante que foi fixado a título de dano biológico, não se afasta dos valores médios que este STJ vem atribuindo em casos de igual ou aproximada pontuação de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica[20].

Porém, como já acima ficou dito, o dano biológico não pode ser indemnizado por obediência a tabelas rígidas, de forma que a uma mesma pontuação em pessoas de idade aproximada tenha de corresponder necessariamente a fixação do mesmo valor ressarcitório. É que, se assim fosse, então, em vez de se dar abrigo ao princípio constitucional da igualdade que a adopção dos referidos critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados consubstancia, estaríamos precisamente a violar esse mesmo princípio, dado que o mesmo impõe que a situações desiguais se dê tratamento desigual.


Ou seja, tudo depende da situação concreta sob análise, a qual terá de ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originará, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida, e por si só, uma perda da capacidade de ganho ou se se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, sem prejuízo do natural agravamento inerente ao decorrer da idade.

Assim, seguindo um critério de equidade e de ponderação das regras de experiência, devem ser ponderadas, globalmente, mas de forma casuística, todas as circunstâncias envolventes, designadamente as atividades exercidas pelo lesado, os rendimentos patrimoniais que lhe proporcionam, assim como a idade e tempo de vida activa.


Como se decidido no Ac. do STJ, de 6-12-17[21], “o dano biológico abrange um espetro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, incluindo a frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer atividades ou tarefas de cariz económico, mesmo fora da atividade profissional habitual, bem como os custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expetáveis”.

Escreveu-se na motivação deste aresto, designadamente, que “a jurisprudência, com particular destaque para a do STJ, tem vindo a reconhecer o chamado dano biológico como dano patrimonial, na vertente de lucros cessantes, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos, sendo que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente auferido. E que, em sede de rendimentos frustrados, a indemnização deverá ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir, que se extinga no fim da sua vida provável e que é suscetível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado”.

Esta orientação colhe-se, designadamente, do Ac. deste STJ, de 29-10-20, 111/17, relatado pela Cons. Maria da Graça Trigo, em cujo sumário se refere, nomeadamente, que “de acordo com a jurisprudência do STJ, a atribuição de indemnização por perda de capacidade geral de ganho, segundo um juízo equitativo, tem variado, essencialmente, em função dos seguintes fatores: a idade do lesado; o seu grau de incapacidade geral permanente; as suas potencialidades de aumento de ganho - antes da lesão -, tanto na profissão habitual, como em profissão ou atividade económica alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações e competências. A que acresce um outro fator: a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da atividade profissional habitual do lesado, assim como de atividades profissionais ou económicas alternativas (tendo em conta as qualificações e competências do lesado)” (destaque nosso).

Para além disso, neste e noutros casos, como é jurisprudencialmente pacífico, não poderão deixar de ser considerados as sequelas das lesões sofridas na realização de todas as tarefas, pois também aí se revela uma maior dificuldade na sua execução que encontra a sua causa principal no acidente de viação.

Assim vem sendo considerado em numerosos arestos deste Supremo Tribunal de Justiça, sendo exemplos os Acs. de 3-11-16, 1971/12, 16-12-20, 6295/16 ou de 25-2-21, 3014/14[22].


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Ora, com o devido respeito pelo bem elaborado acórdão recorrido, não cremos que tenha sido esta a “tese” ali assumida que, ao invés, parece ter considerado que a quantificação da indemnização pelo dano biológico deve tratar de forma indiferenciada todas as pessoas, independentemente dos rendimentos proporcionados pela atividade profissional. Ou seja, socorrendo-se de muitos acórdãos do STJ (que cita), levou em conta, essencialmente, a pontuação havida em tais casos pelo défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, a idade dos respectivos lesados e as indemnizações neles fixadas para daí extrair um valor médio indemnizatório.

Não nos parece ser esse o melhor critério - este que, in casu, serviu para sustentar uma forte redução do valor que a 1ª instância tinha fixado na sentença (de €28.000,00 para €16.000,00).

Em casos como este, a resolução do diferendo não dispensa a análise de todos os elementos objetivos proporcionados pela matéria de facto apurada, apreciados sob o prisma da equidade e à luz das regras da experiência e tendo em consideração os valores que vêm sendo atribuídos em casos semelhantes por este Supremo Tribunal de Justiça[23]. Mas sempre (mesmo sempre) tendo em conta as especificidades do caso concreto, em especial (como dito) a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado.


A que (impõem-se referi-lo) acresce um outro factor, igualmente a ponderar, como se observa no Ac. do STJ de 11-11-21 (Abrantes Geraldes) - e que as instâncias parecem ter desvalorizado: o grau de culpa do condutor do veículo a que as normas que regulam a responsabilidade civil e a fixação de indemnizações atribuem relevo, sendo que no caso o acidente ocorreu devido a uma grave e exclusiva negligência da condutora do veículo segurado.


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A recorrente defende que a indemnização correcta para o dano biológico deve corresponder à peticionada na acção (€40.000,00), ou pelo menos deve ser mantida a indemnização arbitrada na sentença (€28.000,00); já a Relação entendeu fixá-la em montante substancialmente inferior (€16.000,00).


Como factualidade relevante para a determinação do quantum indemnizatório sob apreciação, temos, em particular, a seguinte:  

31. Em caso de agravamento das parestesias ou dores, a Autora poderá ser submetida a cirurgia cervical C5-C6, C6-C7, situação que não se justificava a 9 de Agosto de 2017 [res-posta ao artigo 50º da petição inicial].

35. Devido ao traumatismo cervical decorrente do acidente, apesar dos tratamentos a que se submeteu, a Autora ficou a padecer, a título definitivo, de dor à palpação difusa e ines-pecífica da região da nuca, sem contratura dos músculos da região cervical, com força muscular cervical conservada, mantendo força muscular dos membros superiores mantida e simétrica [resposta aos artigos 48º, 59º, 125º da petição inicial].

36. A queixa álgica identificada em 35) corresponde a défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 3 pontos, compatível com o exercício da atividade profissional habitual, mas a exigir esforços suplementares e trabalhos moderados [resposta aos artigos 51º, 63º da petição inicial].

37. A sequela referida em 35) faz a Autora sentir-se menos eficiente no seu trabalho e na vida pessoal, o que a deixa insegura, triste e angustiada [resposta aos artigos 95º, 96º, 97º da petição inicial].

38. A Autora é enfermeira instrumentista exercendo a sua atividade profissional no Hospital ... em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado [resposta ao artigo 62º da petição inicial].

39. A atividade profissional referida em 38) é exigente, requer esforço, dedicação, rigor, rapidez e eficácia na assistência quer aos pacientes, quer ao cirurgião no bloco operatório, implicando passar muito tempo de pé e em circulação [resposta ao artigo 64º da petição inicial].

41. Também exercia a atividade referida em 38) no âmbito do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), relativamente a cirurgias efetuadas fora do horário normal de trabalho, auferindo montante variável em função do tipo de cirurgia e respetiva duração, pago, em média, quatro meses depois da sua prestação [resposta aos artigos 102º, 103º, 104º da petição inicial].

42. Prestava, igualmente, serviços de enfermagem esporádicos na ... em horário e com retribuição variável [resposta ao artigo 106º da petição inicial].

49. A Autora nasceu a .../.../1963 [resposta aos artigos 66º, 99º da petição inicial].

50. Antes do acidente a Autora era muito independente, social e profissional ativa, sem sintomas álgicos, exceto os relacionados com cefaleias [resposta ao artigo 68º da petição inicial].

66. A Autora perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça pois fica com sensação de desequilíbrio [resposta aos artigos 60º, 61º da petição inicial].


Em sintonia com o referido supra, escreveu-se no Ac. do STJ de 12.01.2022[24]: «Na linha do tratamento da questão da indemnização por perda de capacidade geral de trabalho realizado pelos acórdãos deste Supremo Tribunal de 20/10/2011 (proc. n.º 428/07.5TBFAF.G1.S1), de 10/10/2012 (proc. n.º 632/2001.G1.S1), de 07/05/2014 (proc. n.º 436/11.1TBRGR.L1.S1), de 19/02/2015 (proc. n.º 99/12.7TCGMR.G1.S1), de 04/06/2015 (proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1), de 07/04/2016 (proc. n.º 237/13.2TCGMR.G1.S1), de 14/12/2016 (proc. n.º 37/13.0TBMTR.G1.S1), de 16/03/2017 (proc. n.º 294/07.0TBPCV.C1.S1), 25/05/2017 (proc. n.º 2028/12.9TBVCT.G1.S1), de 09/11/2017 (proc. n.º 2035/11.9TJVNF.G1.S1), de 01/03/2018 (proc. n.º 773/07.0TBALR.E1.S1) e de 29/10.2020 (proc. n.º 111/17.3T8MAC.G1.S1), todos consultáveis em www.dgsi.pt, entende-se que:

- De acordo com o regime do n.º 3 do art. 566.º do Código Civil, não podendo ser averiguado o valor exacto dos danos, a indemnização deve ser fixada equitativamente dentro dos limites que o tribunal tiver como provados (art. 566.º, n.º 3, do Código Civil);

- Não existindo, como sucede no caso dos autos, limites de danos que o tribunal tenha dado como provados, a equidade constitui o único critério legalmente previsto para a fixação da indemnização devida;

- A atribuição de indemnização por perda de capacidade geral de trabalho, segundo um juízo equitativo, tem variado, essencialmente, em função dos seguintes factores:

(i) A idade do lesado (a partir da qual se pode determinar a respectiva esperança média de vida à data do acidente);

(ii) O seu grau de incapacidade geral permanente;

(iii) As suas potencialidades de aumento de ganho, antes da lesão, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividades económicas alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações e competências;

(iv) A conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, assim como de actividades profissionais ou económicas alternativas (também aqui tendo em conta as suas qualificações e competências).

- Esclarece-se que se deve atender à esperança média de vida do lesado (à data do acidente) e não à sua previsível idade de reforma, na medida em que a afectação da capacidade geral tem repercussões negativas ao longo de toda a vida do lesado, tanto directas como indirectas (…)».


E, como também já acima se observou, se é certo que a sindicância do juízo equitativo não afasta a necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade (ut art. 13º da Constituição e art. 8º, nº 3, do Código Civil), é claro que um juízo comparativo incidente sobre montantes indemnizatório apenas poderá ser realizado em relação a decisões não apenas temporalmente próximas, mas também em que estejam em causa situações fácticas essencialmente similares.

Como tal, «Pretender indemnizar a perda da capacidade geral mediante recurso a comparações com outros casos decididos pelos tribunais, tendo designadamente em conta a idade do lesado à data do sinistro, o índice de incapacidade funcional e o valor indemnizatório fixado, mas esquecendo a referida exigência de ponderação das potencialidades de ganho e de aumento de ganho do lesado, anteriores à lesão, tanto na profissão habitual, como em profissão ou actividades económicas alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações e competências, assim como de avaliação da conexão entre as lesões psicofísicas sofridas e as exigências próprias de actividades profissionais ou económicas do lesado, compatíveis com as suas habilitações ou preparação técnica, constitui, a nosso ver, uma grave falha nos pressupostos do juízo equitativo porque leva a comparar entre si situações factuais não comparáveis..». [negritos nossos][25].


No (ainda mais recente) Ac. do STJ de 24.02.2022[26], escreveu-se:

«…. Da apreciação feita pelo tribunal a quo, e para além da dificuldade técnica de estabelecer a correspondência exacta entre índice de défice funcional e percentagem de incapacidade geral, aquilo que se destaca é a circunstância não se ter tido em conta o critério que enunciamos como a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado.

Isto é, não se atendeu, de forma específica, à factualidade dada como provada nos autos da qual resulta que, com elevada probabilidade, as lesões sofridas pelo A. terão repercussão (negativa) sobre o desempenho da profissão de serralheiro cujo exercício exige um elevado nível de força e de destreza físicas ao nível dos membros superiores. Na verdade, tendo tais lesões atingido (…), as consequências das ditas lesões na capacidade de ganho do lesado serão, com elevada probabilidade, muito significativas. Tanto basta para se concluir ser mais justo e adequado o quantum indemnizatório de € 50.000,00 atribuído pela 1.ª instância do que o valor de € 30.000,00 atribuído pelo acórdão recorrido.».


Ora bem, é precisamente essa ponderação das “exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado” (não estamos, é certo, a falar dum “serralheiro”. Mas estamos perante uma “enfermeira-instrumentista”, cuja actividade profissional “é exigente, requer esforço, dedicação, rigor, rapidez e eficácia na assistência quer aos pacientes, quer ao cirurgião no bloco operatório, implicando passar muito tempo de pé e em circulação” (facto 39), e que por causa dum acidente de viação, para que nada concorreu, “perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça, pois fica com sensação de desequilíbrio” (facto 66) - com as muito graves consequências acima explanadas, as quais, para além do mais, se reflectirão muito significativamente na sua capacidade de ganho) que nos parece não ter sido devidamente atendida no acórdão recorrido - e que consubstancia o essencial da alegação da Recorrente para sustentar a pretensão de alteração do valor arbitrado a título de dano biológico.

Efectivamente, é imperioso não olvidar que a Autora/lesada exerce a actividade de “enfermeira instrumentista”. O mesmo é dizer que estamos perante uma profissional com elevadíssima responsabilidade, exigindo, em todos os momentos do seu exercício, uma boa condição física e psíquica. Basta atentar no facto de ser quase impensável, por exemplo, deixar a meio uma cirurgia e/ou um tratamento com a desculpa de estar cansada e/ou com sintomas álgicos - com sensação de desequilíbrio”, devido a qualquer “movimento brusco com a cabeça” (facto provado 66)!

Portanto, é mais que evidente que a Autora, para poder estar à altura das responsabilidades inerentes à sua profissão, tem necessariamente de estar em muito boas condições físicas e mentais, donde o mínimo dano que tenha a esse nível, físico ou mental, poder, por si só, fazer toda a diferença, impedindo-a de dar satisfação às exigências da profissão, de cuidar de pacientes, de doentes, afinal…de salvar vidas humanas.

Como tal, não pode, sem mais - no presente, para efeitos da fixação da indemnização pelo dano biológico -, equiparar-se a profissão da Autora a qualquer outro tipo de profissão. Cada profissão tem as suas especificidades e exigências, mas quando a vida de uma pessoa depende de um profissional de saúde, seja ele médico ou enfermeiro, a responsabilidade e exigência torna-se bem maior.


Ora, como ficou provado, se é certo que o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de que a Autora ficou a padecer, é compatível com o exercício da actividade profissional habitual, é, porém, de molde a exigir esforços suplementares e trabalhos moderados (facto provado 36 - resposta aos arts. 51º e 63º da pi).

Donde a pergunta: como pode a Autora continuar a exercer cabalmente e com o mesmo desempenho a sua profissão de enfermeira instrumentista (no bloco operatório), se agora se lhe exige que leve a cabo trabalhos moderados? Sendo sabido que estes nem sempre (antes pelo contrário…) são compatíveis com aquela profissão, dado que, por exemplo, movimentar pacientes no bloco operatório (do banco cirúrgico para a cama articulada e vice-versa) a mais das vezes exige, para além de agilidade, uma muito boa condição física.

Isso mesmo ressalta com toda a nudez, v.g., do facto provado sob o nº 39ª: A atividade profissional referida em 37) é exigente, requer esforço, dedicação, rigor, rapidez e eficácia na assistência quer aos pacientes, quer ao cirurgião no bloco operatório, implicando passar muito tempo de pé e em circulação [resposta ao artigo 64º da petição inicial].”.

E provado ficou, ainda, que a Autora perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça, pois fica com sensação de desequilíbrio.” (ponto 66 dos factos provados).

Cremos que este último facto referido, por si só, é bem revelador da particular especificidade e relevância do dano sofrido pela Autora com repercussão na indemnização pelo dano biológico.


Assim sendo, não podemos deixar de dar razão à Recorrente quando “desabafa”: “Como pode a recorrente no exercício da sua profissão, cumprir cabalmente, como o fazia até à data do acidente, as exigências que lhe são pedidas pela sua profissão, nomeadamente de rigor, rapidez e eficiência na assistência quer aos pacientes quer ao cirurgião no bloco operatório, se perdeu agilidade ou se não pode agora fazer determinados movimentos mais bruscos (entenda-se mais inesperados ou súbitos como lhe exige frequentemente o exercício da sua profissão, como, nomeadamente, entre outros, em trabalhos que exigem muita tensão e atenção no bloco operatório onde por regra está, como passar ou facultar ao cirurgião os instrumentos ou material cirúrgico que este necessita e lhe pede quando está a operar, ou ainda a passagem de doentes das macas para as marquesas) para poder ser rápida e eficiente na assistência que tem de dar aos pacientes e ao cirurgião, se, quando precisa de fazer esses movimentos mais súbitos e que têm de ser rápidos, fica com a sensação de desequilíbrio? É evidente que não pode. É evidente que estes danos lhe passaram a limitar, limitam e vão continuar a limitar, o normal exercício da sua profissão. E com o passar dos danos, cada vez vai ser pior.”.


Provado ficou, ainda, que para além de exercer a actividade de enfermeira instrumentista no Hospital ..., no ... (facto 38) “em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado”, também exercia essa mesma atividade “no âmbito do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), relativamente a cirurgias efetuadas fora do horário normal de trabalho…” (facto 41). Para além de que “Prestava, igualmente, serviços de enfermagem esporádicos na ... em horário e com retribuição variável” (facto 42).

Como provado ficou, também, que a Autora, vítima de um acidente de viação para o qual em nada contribui,antes dele era uma pessoa muito independente, social e profissionalmente ativa, sem sintomas álgicos” (Ponto 50 dos factos provados).


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Considerando o exposto, não nos parece, portanto, que o douto Acórdão recorrido, ao citar inúmeros acórdãos para, com base neles, fixar a indemnização pelo dano biológico no valor que arbitrou - à excepção do também citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/01/2021 (Proc. 2787/15.7T8BRG.G1.SI), que atribuiu uma indemnização a este título no valor de € 40.000,00 - , tenha levado na devida conta a particular especificidade factual do caso que ora nos ocupa, pois que se trata de situação algo distinta das demais ínsitas nos arestos ali citados.


A jurisprudência tende a ser mais actualista e evolutiva, procurando diferenciar a importância e exigência das profissões que usa na sua análise comparativa dos casos que indica. Tendência esta que, percute-se, não parece ter sido a seguida no acórdão recorrido, pois que o tribunal “quo“ fez o aludido tipo de comparações indicando acórdãos (no geral prolatados há muitos anos) com factos diferentes, utilizando-os como exemplos padrão, achando-os similares com o presente caso, quando não o são, parecendo-nos que deveria, assim, ter sido um pouco mais actualista e evolutivo (à excepção, como dito, do citado acórdão de 12/01/2021).


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Refere, ainda, o acórdão recorrido que “Dada a idade da lesada e a sua alargada ocupação, não se augura progressão significativa na carreira”.

Não nos parece que assim deva ser entendido. É que a incapacidade permanente geral que foi atribuída à Autora, não apenas afecta (e de forma significativa, como se disse) o dia a dia do exercido da sua profissão, mas também a sua progressão na carreira.

Efectivamente, tendo a Recorrente, à data do acidente, apenas 51 anos de idade, não fosse o acidente e seguramente que podia sempre progredir até final do seu ainda longo período de vida activa, fazendo formação, tirando especialidades em várias áreas actualmente reconhecidas pela ordem dos Enfermeiros (v.g., Enfermagem Médico-Cirurgia, Enfermagem de reabilitação, Enfermagem de saúde Infantil e Pediátrica, Enfermagem de saúde Materna e obstétricia, Enfermagem de Saúde mental e Psiquiátrica, todas autorizadas e reguladas pelas respectivas portarias, publicadas no DR).

É, de facto, perfeitamente legítimo que a Autora - que, antes do acidente, era muito independente, social e profissionalmente activa” (facto 50) - pretendesse fazer qualquer adicional formação, o que, naturalmente, se repercutiria nos seus réditos mensais.


Veja-se que “a sequela referida em 35)” - ou seja, que “Devido ao traumatismo cervical decorrente do acidente, apesar dos tratamentos a que se submeteu, a Autora ficou a padecer, a título definitivo, de dor à palpação difusa e inespecífica da região da nuca, sem contratura dos músculos da região cervical” - “faz a Autora sentir-se menos eficiente no seu trabalho e na vida pessoal, o que a deixa insegura..”.


Assim, portanto, se vê que a Autora, que bem podia ainda progredir significativamente na carreira, ficou impedida de o fazer, dada a debilidade física e psíquica com que se viu confrontada após o acidente e decorrência deste, debilidade esta que é muito pouco compatível com a muito exigente profissão que exerce, a impor frescura e resistência física e mental.


Acresce que a necessidade de moderação de trabalhos por banda da Autora, naturalmente a levará a recusar (ter de recusar) prestar serviços em outras unidades de saúde. Para além de muito provavelmente ter de deixar ou diminuir as actividades que exercia no âmbito do sistema integrado de Gestão de inscritos para cirurgia (SIGICS), relativamente a cirurgias efetuadas fora do horário normal de trabalho, com a consequente repercussão negativa nos seus rendimentos (Cfr. pontos 41º e 42º dos factos provados).


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Pelo exposto se vê que a incapacidade permanente de 3 pontos, atenta a importância da actividade da recorrente e a particular exigência da profissão em causa, nos sobreditos termos, pode bem ser muito mais incapacitante do que noutras situações em que tenha sido atribuída uma incapacidade com mais pontos.

Cada caso é um caso e as próprias exigências do princípio constitucional da igualdade impõem se atenda à especificidade de cada caso, tratando de forma desigual o que é factualmente desigual.

Pelo que a comparação feita no acórdão recorrido não nos parece a melhor, até porque grande parte dos arestos citados são já muito antigos (1995, 1999, 2004, 2005, 2009, 2010, 2012, 2015, 2016, 2017), para além de que, quer estes, quer os demais têm subjacente factualidade específica que bem se distingue da que aqui e agora apreciamos.

Sendo vários dos acórdãos citados, proferidos há mais de dez anos, não são, como tal, de trazer à colação para efeitos ponderação do respeito pelo princípio da igualdade. E quanto aos demais arestos indicados, compulsada a respectiva fundamentação, verifica-se serem de tal forma diversas tanto as lesões concretamente sofridas por cada um dos lesados como as exigências das profissões e actividades de natureza económica para as quais cada um deles se encontra habilitado ou tecnicamente preparado, que se torna particamente inviável proceder a juízos comparativos.

Note-se, ainda, que a jurisprudência actual é unânime em considerar, para ponto de partida do quantum indemnizatório a título de dano biológico, não a vida activa, mas a esperança média de vida, sendo que esta se cifra, no caso das mulheres já bem acima dos 80 anos de idade[27].


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Tudo ponderado (com especial enfoque para a especificidade factual do caso concreto), entende-se ajustado fixar o valor da indemnização pelo denominado “dano biológico” em €22.000,00 (vinte e dois mil euros).

Assim, quanto ao dano patrimonial e dano biológico, fixa-se a quantia total de €26.173,55 (sendo €22.000,00 pelo dano biológico, €3.250,00 a título de perdas salariais e €923,55 referente a despesas), acrescida de juros à taxa legal de 4% desde 24 de Janeiro de 2018, até efectivo pagamento.


2. DA INDEMNIZAÇÃO PELOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS 


A Autora peticionou na acção, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 24.000,00, o Tribunal de primeira instância atribuiu a esse título o montante indemnizatório de € 18.000,00 e a Relação reduziu para € 15.000,00 esse valor indemnizatório.


Quid juris?

Em causa estão, agora, prejuízos que não atingem em si o património, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo.  Ofendem bens de carácter imaterial, desprovidos de conteúdo económico, insusceptíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro.  A ofensa objectiva desses bens tem em regra um reflexo subjectivo na vítima, traduzido na dor ou sofrimento, de natureza física ou de natureza moral.

Os danos não patrimoniais podem consistir em sofrimento ou dor, física ou moral, provocados por ofensas à integridade física ou moral duma pessoa, podendo concretizar-se, por exemplo, em dores físicas, desgostos por perda de capacidades físicas ou intelectuais, vexames, sentimentos de vergonha ou desgosto decorrentes de má imagem perante outrem, estados de angústia, etc., reflectindo, mais ou menos, melhor ou pior, manifestações de perturbações emocionais.

Nesta categoria de danos se compreendem todos aqueles que afectam a personalidade moral, nos seus valores específicos[28] tais como "as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização" [29].

Como é consabido, apenas devem ser atendidos os danos não patrimo­niais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil).

Dano grave não terá que ser considerado apenas aquele que é “exorbitante ou excepcional”, mas também aquele que “sai da mediania, que ultrapassa as fronteiras da banalidade.  Um dano considerável que, no seu mínimo espelha a intensidade duma dor, duma angústia, dum desgosto, dum sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se torna inexigível em termos de resignação” [30].

Para a dor moral ou psíquica é impossível estabelecer escalas peremptórias: dentro do critério da gravidade, seguir-se-ão os ensinamentos da experiência humana em termos de afectividade e sentimento, segundo um prudente arbítrio de indemnização.  Nestes danos interfere em especial a natureza e intensidade do sofrimento causado e a sensibilidade do lesado e duração da dor.

A avaliação da sua gravidade tem de aferir-se segundo um padrão objectivo, e não à luz de factores subjectivos[31], sendo, nessa linha, orientação consolidada na jurisprudência, “com algum apoio na lei”, que as simples contrariedades ou incómodos apresentam “um nível de gravidade objectiva insuficiente para os efeitos do n.º 1 do art. 496.º” [32].

A este propósito, Antunes Varela [33] desenvolve algumas úteis reflexões: “o montante da indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.  É este, como já foi observado por alguns autores, um dos domínios onde mais necessários se tornam o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir.”

Para Dario Martins de Almeida (ob e loc. cits), “quando se faz apelo a critérios de equidade, pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa; a equidade está, assim, limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias) em oposição à justiça meramente formal.  Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça.  A equidade é a resposta àquelas perguntas em que está em causa o que é justo ou o que é mais justo”.

Os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis: não podem ser reintegrados mesmo por equivalente.  Mas é possível, em certa medida, contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas da utilização.  Não se trata, portanto (como já ensinava o saudoso professor Mota Pinto), de atribuir ao lesado um “preço de dor” ou um “preço de sangue”, mas de lhe proporcionar uma satisfação em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo interesses de ordem refinadamente ideal.

Resulta do exposto que o juiz, para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento da prescrição legal que o manda julgar de harmonia com a equidade, deverá atender aos factores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada.  Tudo com o objectivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofreu.

Assim se compreende que a actividade do juiz no domínio do julgamento à luz da equidade[34], não obstante se veja enformada por uma importante componente subjectiva, não se reconduza ao puro arbítrio. Sendo que para o cálculo do respectivo montante, ponderará, entre outros factores, o grau de culpa do autor da lesão, as condições económicas deste e do lesado, as flutuações da moeda[35]-[36].

Não deve ser descurada a Doutrina e a Jurisprudência que vêm soprando sempre novos ventos de justiça sobre este campo indemnizatório, nomeadamente, o anunciado sentimento de que “a indemnização ou compensação deverá constituir um lenitivo para os danos suportados, não devendo, portanto, ser miserabilista”[37].


Neste particular, tem sido salientado que o dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo:

(i) o chamado quantum (pretium) doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária, com tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamentos, a analisar através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico;

(ii) o “dano estético” (pretium pulchritudinis), que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima;

(iii) o “prejuízo de distracção ou passatempo”, caracterizado pela privação das satisfações e prazeres da vida, vg., com renúncia a actividades extra-profissionais, desportivas ou artísticas;

(iv) o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), integrando este prejuízo a quebra na “alegria de viver”;

(v) o prejuízo da “saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem estar, e que valoriza as lesões muito graves, com funestas incidências na duração normal da vida;

(vi) os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida;

(vii) o prejuízo juvenil “pretium juventutis”, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida, privando a criança das alegrias próprias da sua idade;

(viii) o “prejuízo sexual”, consistente nas mutilações, impotência, resultantes de traumatismo nos órgãos sexuais;

(ix) o “prejuízo da auto-suficiência”, caracterizado pela necessidade de assistência duma terceira pessoa para os actos correntes da vida diária, decorrente da impossibilidade, de se vestir, de se alimentar[38].


Presente neste domínio deverá estar a consideração do melindre que a “quantificação”/valoração de tais danos sempre acarreta, procurando traduzir-se em quantia certa de coisa fungível (a mais fungível das coisas), o que por natureza é insusceptível de mensuração e de redução a uma expressão numérica, não tendo cabimento uma reparação por equivalente, encerrando óbvias dificuldades a tradução em números do que por definição não tem tradução matemática, procurando ter-se em conta todo o cortejo de dores e sofrimentos padecidos, por vezes, o corte abrupto dos sonhos e das ambições, dos projectos de vida, bem como o reflexo, o rebate da perda de autonomia de vida em diversos aspectos, com todas as consequentes limitações, sob múltiplas formas, da vivência do demandante e os efeitos imediatos e mediatos de todas as sequelas das lesões sofridas.

Neste campo, em que não entram considerações do “ter” ou “possuir”, “perder”, ou “ganhar”, mas do “ser”, “sentir”, ou “sonhar”, não rege a teoria da diferença, nem faz sentido o apelo ao conceito de dano de cálculo, pois que a indemnização/compensação do dano não patrimonial não se propõe remover o dano real, nem há lugar a reposição por equivalente.


Efectivamente, em bom rigor, a única condição de compensabilidade dos danos não patrimoniais é a sua gravidade, o que lhes confere um carácter algo indeterminado e de difícil quantificação. Seria, por isso, em vão que se tentaria apurar o respectivo quantum compensatório com base em factores aparentemente objectivos, devendo reconhecer-se ao julgador margem para valorar segundo critérios subjectivos (na perspectiva do lesado), isto é, “à luz de factores atinentes à especial sensibilidade do lesado [como] [a] doença, a idade, a maior vulnerabilidade ou fragilidade emocionais[39]. A equidade é aqui, em rigor, o único recurso do julgador[40], ainda que não descurando as circunstâncias que a lei manda considerar (cfr. artigo 496.º, n.º 4, do CC).


Dito isto e voltando ao caso concreto sub judice, vemos que o acórdão recorrido procurou encontrar o valor que reputou justo, no quadro da equidade e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, não deixando de trazer à colação e analisar várias decisões, mais ou menos semelhantes, quer das Relações, quer deste STJ, no fito de procurar que a indemnização atribuída estivesse em sintonia com o cumprimento de um regime jurisprudencial de segurança e igualdade na realização da justiça equitativa (artº 496º, nºs 1 e 4 do CC).


*


Atente-se nos factos provados relevantes neste domínio:

- Na sequência do embate, a A. sofreu síndrome de chicote no pescoço, perdeu os sentidos momentaneamente, entrando em pânico quando os recuperou, com medo de morrer, e sofreu de amnésia transitória;

- A A. apresentou queixas no pescoço, zona cervical e lombar, tonturas e cefaleias, pelo teve que ter assistência hospitalar;

- Foi submetida a vários exames de diagnóstico, nomeadamente raio-X, a várias partes do corpo, designadamente à cabeça;

- As referidas dores agudizaram-se e teve tonturas, náuseas, perda de equilíbrio ao movimentar o pescoço e falta de força dos membros superiores e membro inferior direito, que não passavam com a medicação, nos dias seguintes à alta hospitalar que teve no próprio dia do acidente, dores essas que foram classificadas em grau 2 numa escala de 1 a 7;

- A A. submeteu-se a várias consultas médicas, nomeadamente de neurocirurgia e tomou medicação para correção daqueles sintomas que lhe causavam grande preocupação e ansiedade;

- Fez novos exames de diagnóstico entre fevereiro e março de 2015, 120 sessões de medicina física e reabilitação até abril de 2015 e 195 sessões de medicina física e reabilitação entre 6 de abril e 4 de junho do mesmo ano, com várias consultas de fisiatria;

- Realizou 30 sessões de medicina física e reabilitação entre 5 e 26 de junho de 2015, consistindo em ultrassons, estimulação elétrica dos pontos motores, calor húmido, massagem manual, cinesioterapia corretiva postural;

- Esteve impedida de trabalhar entre a data do acidente e o dia 10 de junho de 2015;

- Fez cinesioterapia corretiva postural, calor húmido, massagem transcutânea e massagem manual, num total de 60 sessões entre 22 de março e 12 de maio;

- Continuou a ser medicamente assistida até dezembro de 2017, em consulta de neurocirurgia;

- Fez uma ressonância magnética à coluna vertebral;

- Em agosto de 2017, a A. era acompanhada na consulta da dor no Hospital ..., apresentando queixas de cervicalgia esquerda, com braquialgia esporádica e parestesias desde a axila até aos 3° a 5° dedos mais à esquerda, mas também à direita;

- Manteve tratamento ambulatório de acupuntura até 1 de maio de 2018;

- Ficou a padecer, a título definitivo, de dor à palpação difusa e inespecífíca da região da nuca, mas sem contratura dos músculos da região cervical, com força muscular cervical conservada, e com força muscular dos membros superiores mantida e simétrica. Aquela dor determinou um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 3 pontos, compatível com o exercício da atividade profissional habitual, mas a exigir esforços suplementares e trabalhos moderados.

- A A., enfermeira, sente-se, por isso, menos eficiente no seu trabalho e na vida pessoal, o que a deixa insegura, triste e angustiada;

- Após o acidente teve de se mudar para casa da mãe, na ..., necessitada do seu auxílio, o que lhe causou preocupação e revolta, sentindo-se impotente, triste e irritada por sobrecarregar a progenitora;

- Dependeu de terceiros familiares até abril para as atividades domésticas e para se deslocar às consultas e tratamentos;

- Sente ansiedade e receio com a perspetiva de um agravamento do seu estado de saúde com o passar dos anos;

- A A. perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça, ficando com sensação de desequilíbrio;

- Nos primeiros meses após o acidente a A. não conseguia dormir o suficiente por causa das dores e não encontrar posição;

- Usou colar cervical durante duas semanas, o que lhe causou desconforto e impacto estético;

- Em algumas situações, designadamente de mudanças de tempo/temperatura e de esforço excessivo, a A. continuará a sentir dor, necessitando, ocasionalmente, de medicação para aliviar os respetivos sintomas, a prescrever em consulta do seu médico assistente;

- Em caso de agravamento das parestesias ou dores, a A. poderá ainda ter de se sujeitar a cirurgia cervical C5-C6, C6-C7.


*


Justificou assim o ac. recorrido (“atendendo às particularidades do caso … mas atendendo à dinâmica dos valores que têm sido usados pela jurisprudência em situações análogas de dano não patrimonial”) a atribuição da indemnização de €15.000,00 por este tipo de danos sofridos pela Autora:

“…não sendo muito significativos os danos físicos permanentes, tendo a A. ficado, por dor, com um défice funcional de apenas 3 pontos, que afetará até ao fim da sua vida, previsivelmente, por mais de 30 anos, teve, no entanto, sofrimento expressivo e prolongado ao longo de cerca de meio ano, com a realização de difíceis e prolongados tratamentos, com vários transtornos psicológicos e sociais de ordem profissional e familiar. Sofreu dores mis fortes durante vários meses, teve perturbação do sono, e ainda sofre de dores de esforço e de dor à palpação difusa e inespecífica da região da nuca, perdeu alguma agilidade e fica com a sensação de desequilíbrio se fizer movimentos bruscos com a cabeça.”.


Constata-se que o acórdão recorrido apresenta um extenso bosquejo jurisprudencial sobre esta temática dos danos não patrimoniais, de forma alguma se podendo dizer que tenha agido de forma discricionária ou acriteriosa. Pelo contrário, cremos que neste segmento ponderou cuidadosamente a factualidade provada, observou as regras de Direito aplicáveis e alicerçou a sua decisão em critérios razoáveis, recorrendo (como deve ser) à equidade e ponderando os valores que têm sido atribuídos pela jurisprudência - desta forma manifestando a preocupação que deve ser partilhada pelos tribunais, por forma a servir o propósito ínsito no artigo 8.º, n.º 3, do CC, da uniformidade na interpretação e na aplicação do Direito.

Como tal, tendo em conta a ponderação feita pelo acórdão recorrido - dos factos provados, da jurisprudência e critérios legais – não vemos necessidade de maiores considerações para aqui se justificar a aceitação do montante ali arbitrado a título de danos não patrimoniais, o qual, como tal, se mantém[41].


3. DO PEDIDO DEDUZIDO SOB A AL. E)


Este pedido foi assim formulado pela Autora:

e) Ser a condenada a responsabilizar-se por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que poderão ocorrer no futuro com o agravamento do estado físico e psíquico da autora, que importem despesas no futuro com consultas, exames, medicamentos e tratamentos por causa das lesões sofridas e que continua ainda em tratamento, na sequência do acidente de que foi vítima, a liquidar em execução de sentença”.


A sentença absolveu, deste pedido, a Ré.

A Relação, porém, condenou a Ré a pagar à Autora “as quantias relativas às consultas médicas e aos medicamentos que a A. suportar no futuro por causa de dores que venha a sofrer em consequência das lesões sofridas no acidente, a liquidar oportunamente.”.


*


A questão ora suscitada consiste em saber se, no que tange àquele pedido da Autora/Recorrente, formulado sob a al. e), deve a ré (diferentemente do decidido no acórdão recorrido) ser condenada a pagar à Recorrente, para além das aludidas “quantias relativas às consultas médicas e aos medicamentos”, também os valores referentes aos exames e tratamentos que venha a precisar de realizar em consequência das lesões sofridas no acidente, que se vierem a apurar e liquidar oportunamente em execução de sentença.


Parece-nos evidente que sim.

Se se reconhece à Recorrente/Autora o direito ao ressarcimento das “quantias relativas às consultas médicas e aos medicamentos que … venha a suportar no futuro por causa de dores que venha a sofrer em consequência das lesões sofridas no acidente”, é claro que não pode deixar de também se lhe reconhecer o mesmo direito ao ressarcimento dos exames e tratamentos que igualmente venha a precisar de realizar em consequência das mesmas lesões.

De facto, não se compreenderia que lhe fossem ressarcidas as despesas em consultas médicas e medicamentos eventualmente necessários in futurum, decorrentes do acidente dos autos, e já lhe não assistisse o mesmo direito ao ressarcimento de exames e tratamentos de que igualmente viesse a necessitar, desde que medicamente justificados e prescritos por clínicos e fossem também consequência do mesmo acidente.


Efectivamente, provado está que a Autora, designadamente:

· Ficou a padecer, a título definitivo, de dor à palpação difusa e inespecífíca da região da nuca, fazendo a Autora sentir-se menos eficiente no seu trabalho e na vida pessoal, o que a deixa insegura, triste e angustiada.

· Sente ansiedade e receio com a perspetiva de um agravamento do seu estado de saúde com o passar dos anos;

· Ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 3 pontos, compatível com o exercício da atividade profissional habitual, mas a exigir esforços suplementares.

· Sendo que a sua actividade profissional é exigente, requer esforço, dedicação, rigor, rapidez e eficácia na assistência quer aos pacientes, quer ao cirurgião no bloco operatório, implicando passar muito tempo de pé e em circulação.

· Perdeu agilidade e não pode fazer movimentos bruscos com a cabeça, ficando com sensação de desequilíbrio;

· Passou a usar colar cervical, quando viaja para ... em visita à Mãe e à irmã que ali passaram a residir, sendo que essa ortótose lhe causou e causa desconforto.

· Em algumas situações, designadamente de mudanças de tempo/temperatura e de esforço excessivo, a A. continuará a sentir dor, necessitando, ocasionalmente, de medicação para aliviar os respetivos sintomas, a prescrever em consulta do seu médico assistente;

· Em caso de agravamento das parestesias ou dores, a A. poderá ainda ter de se sujeitar a cirurgia cervical C5-C6, C6-C7.


Bastará atentar nesta factualidade para se concluir que é bem provável que a Autora possa vir a necessitar, não apenas de consultas médicas e medicamentos, mas também de exames e tratamentos, em caso de agravamento do seu futuro estado de saúde que sejam consequência do acidente, nomeadamente por causa das dores ou seu agravamento que venha a sofrer em consequência das lesões sofridas.

É certo que resulta do relatório do INML que a A. vai necessitar de ajudas medicamentosas para alívio das dores relacionadas com as lesões sofridas, segundo prescrição médica; mas não é menos verdade, segundo os esclarecimentos prestados pelas Peritas do mesmo INML sobre o relatório pericial elaborado e junto aos autos, que a Autora, em caso de ocorrer um agravamento dos sintomas, igualmente irá precisar de uma revisão de tratamentos instituídos.

Tudo interligado e consequência do acidente dos autos (e, percute-se, para o qual em nada contribuiu a Autora/Recorrente).


Assim se dá razão à Recorrente ao alegar que se conclui do Relatório do INML, com os esclarecimentos prestados pelas Srª Peritas, “bem como da matéria de facto provada e dos demais meios de prova que a recorrente além de necessitar de ajudas medicamentosas vai também necessitar de exames e tratamentos caso haja um agravamento dos sintomas para a atenuação dos seus problemas de saúde provocados pelo acidente, que passam pelo recurso a profissionais de saúde, como médicos, a toma de medicação e tratamentos para relaxamento muscular”, bem assim que “existe ainda a possibilidade de ter que efetuar uma cirurgia, conforme resulta do relatório pericial, dos esclarecimentos prestados pelas Exmas Peritas ao relatório pericial (dos quais se extrai que “o desempenho da atividade profissional poderá levar a um agravamento e a uma revisão de tratamentos instituídos”) e dos factos dados como provados” (com especial enfoque para os ínsitos nos já referidos arts. 31, 35, 36, 64, 66, 39, 66, 69 e 70).  


Perante a matéria factual provada, parece, portanto, que dúvidas não haverá de que é perfeitamente espectável que a autora venha a ver de futuro agravada a sua situação de saúde em consequência do acidente de que foi vítima. E se, nessa situação, vier a carecer, não apenas de consultas médicas e medicamentos, mas também de exames e tratamentos, obviamente que deles deverá beneficiar, a suportar pela Ré seguradora. Obviamente apenas desde que a necessidade desses exames e tratamentos seja provada (pela Autora) no respectivo incidente de liquidação e outrossim que os mesmos são sequelas do acidente que sofreu.


Assim procede esta questão.


***



IV. DECISÃO

 

Face ao exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso e, consequentemente, conceder parcialmente a revista, em função o que se altera o decidido sob as alíneas a) e c) do acórdão recorrido nos seguintes termos (condenando-se a R. Crédito Agrícola Seguros – Companhia de Seguros, S. A. a pagar tais quantias à A. AA):

a) A quantia total de €26.173,55 (vinte e seis mil cento e setenta e três euros e cinquenta e cinco cêntimos) a título de danos patrimoniais e dano biológico (sendo €22.000,00 pelo dano biológico, €3.250,00 a título de perdas salariais e €923,55 referente a despesas), acrescida de juros à taxa legal de 4% desde 24 de Janeiro de 2018, até efectivo pagamento.

c)  As quantias relativas às consultas médicas, medicamentos, exames e tratamentos que a A. vier a necessitar no futuro em consequência das lesões sofridas no acidente, a liquidar oportunamente.


No mais, mantém-se o decidido no acórdão recorrido.

Custas na proporção do decaimento.


Lisboa, 21-04-2022


Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator)

Vieira e Cunha (Juiz Conselheiro - 1º adjunto)

Ana Paula Lobo (Juíza Conselheira - 2º Adjunto)

________

[1] Inclui aquantia de €3.250,00 relativa a perdas salariais e outros valores patrimoniais atendidos na sentença e fora do objecto do recurso.
[2] Que seja:

e) Ser a condenada a responsabilizar-se por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que poderão ocorrer no futuro com o agravamento do estado físico e psíquico da autora, que importem despesas no futuro com consultas, exames, medicamentos e tratamentos por causa das lesões sofridas e que continua ainda em tratamento, na sequência do acidente de que foi vitima, a liquidar em execução de sentença”.
[3] Ver, v.g., Ac. do STJ, de 20.05.2010, Processo n° 103/2002.L1.S1; e Ac. do STJ, de 26.01.2012, Processo n° 220/2001-7.S1, onde se faz uma resenha histórica do surgimento do conceito dano biológico e da sua construção, ambos in www.dgsi.pt.
[4] Cfr. ac. do S.T.J., de 2-12-2013, in http://www.dgsi.pt.
[5] Ver Ac. do STJ de 27/10/2009, in http://www.dgsi.pt.
[6]A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual”, pág. 132.
[7] O homem artífice.
[8] Ac. do STJ, de 15.04.2009, Raul Borges, Processo n° 08P3704, in www.dgsi.pt.
[9] Cfr. Acs. R.P de 04.03.08, proc. 0724890 e de 04.04.06, proc.062059 e os acórdãos do STJ, neste citados, designadamente, de 27.04.2004, no proc. 04A1182 e de 06.07 2004, no proc. n.º 04B2084.

[10] Ac. do STJ, de 25.02.2009, Raul Borges, Processo na 3459/08, in www.dgsi.pt. No mesmo sentido, pode ver-se, entre outros: Ac. do STJ. De 07.07.2009. Processo nº 205/07.3GTLRA.Cl; Ac. do STJ, de 18.03.2010, Santos Carvalho, Processo n° 1786/02.3SILSB.L1.S1; Ac. do STJ, de 14.09.2010, Ferreira de Almeida, Processo n° 797/05.ITBSTS.PI; Ac. do STJ, de 17.05.2012, Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, Processo n° 48/2002.I.2.S2; Ac. do STJ, de 07.02.2013, Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, Processo n° 3557/07.ITVLSB.L1.S1; Ac. da RP, de 20.03.2012, Manuel Pinto dos Santos, Processo n° 571/l0.3TBLSD.Pl; Ac. da RP, de 15.01.2013, Vieira e Cunha, Processo n° 1949/06.2TVPRT.Pl; e Ac. da RG, de 12.01.2012, Manuel Bargado, Processo n° 282/09.2TCGMR-A.Gl, todos disponíveis in www.dgsi.pt.

[11] Veja-se o Ac. do STJ de 16.01.2014, proc. 1269/06.2TBBCL.G1.SI.
[12]Pires de Lima e Antunes Varela, Noc.  Fundamentais Dir. Civil, 6.ª ed., 104, nota 2.
[13] Cfr. DARIO MARTINS DE ALMEIDA, Manual de Ac. De Viação, 1980, pp ­103/104.
[14] Dicionário Jurídico – 4ª ed.- 2005-499.
[15] Ac.S.T.J. 14/1/2021, pº 644/12.8TBCTX.L1.S1 – NUNO PINTO OLIVEIRA.
[16] A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem defendido que o recurso à equidade “não afasta a necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso. O não afastamento, pela sindicância do juízo equitativo, da necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade, ilustra a tendencial uniformização de critérios na fixação judicial dos montantes indemnizatórios, sem prejuízo da consideração das circunstâncias do caso concreto – Cf. Cf. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de maio de 2019 (Maria dos Prazeres Beleza), proc. n.º 2476/16.5T8BRG.G1.S2; de 8 de junho de 2017 (Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), Proc. n.º 2104/05.4TBPVZ.P1.S2 e ainda acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de dezembro de 2017 proc. n.º 559/10.4TBVCT.G1.S1; de 28 de janeiro de 2016, proc. n º 7793/09.8T2SNT.L1.S1; de 6 de abril de 2015, proc. n.º 1166/10.7TBVCD.P1.S1, com remissão para os acórdãos de 28 de outubro de 2010, proc. n.º 272/06.7TBMTR.P1.S1, e de 5 de novembro de 2009, proc. n.º 381-2002.S1m estes in www.dgsi.pt.
[17] Cfr. Ac. S.T.J. 17/5/2018, pº 952/12.8TVPRT.P1.S1 – Távora Victor.
[18] Ac.S.T.J. 28/10/2010, pº 272/06.7TBMTR.P1.S1 – Lopes do Rego.
[19] Veja-se, a este propósito, a título exemplificativo, o acórdão do STJ, de 04/06/2015, relatado por Maria dos Prazeres Beleza, no processo n.º 1166/10.7TBVCD.P1.S1, em que se referem outros acórdãos anteriores do mesmo Tribunal e disponível in http://www.dgsi.pt/jstj .
[20] Cfr., entre outros, os seguintes acórdãos do STJ: de 7.6.18, revista 418/13, Relatora Rosa Tching; de 12.11.2020, revista 4212/18, relator, Pinto de Oliveira; de 16.6.2016, revista 1364/06, relator Tomé Gomes; de  5.3.2015,  revista 46/09, relator Pires da Rosa.
[21]Proc. 1509/13, em www.dgsi.pt (Tomé Gomes).
[22] Consultáveis in www.dgsi.pt.

[23] V.g. Acs. do STJ, de 29-10-20, 13585/19, de 26-1-17, 1862/13 e de 10-1-17, 536/16, em www.dgsi.pt.

[24] Processo n.º 6158/18.5T8SNT.L1.S1 (Graça Trigo).

[25] Consª MARIA DA GRAÇA TRIGO, in «O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – Breve contributo», Revista Julgar, n.º 46, em curso de publicação, pág. 268.

[26] Proc. 1082/19.7T8SNT.L1.S1 (Graça Trigo).
[27] Exemplificativamente, veja-se Ac. STJ de 05.05.2020, Procº 30/11.7TBSTR.E1.S1; STJ de 12.07.2018, Procº 1842/15.8T8STR.E1.S1; Ac. da RG de 30.05.2019, Procº 1760/16.2T8VCT.G1; da RC de 22.01.2019, Procº 342/17.6T8CBRC1, todos em www.dgsi.pt.
[28] Dario Martins de Almeida, in Manual de Acidentes de Viação, Livraria Almedina, 3.ª ed., p. 271.
[29] Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, volume I, Livraria Almedina, 7.ª ed., p. 595.
[30] Cfr. o Ac. do STJ de 4.3.2008, Proc. 08A164, in www.dgsi.pt.
[31] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 9.ª ed., p. 628.
[32] Cfr. Ac. do STJ de 12.10.1973, BMJ, 230.º, p. 107.
[33] Ob. e loc. cits.
[34] Para a pergunta sobre em que consiste a equidadenão há resposta fácil nem unívoca”, mas parece possível dizer que a decisão segundo a equidade (…) pode conferir peso a quaisquer argumentos sem se preocupar com a sua autoridade e relevância face às aludidas fontes (do sistema). É campo ilimitado do 'material', do 'razoável', do 'justo', do 'natural'”. Cfr. Manuel A. Carneiro da Frada, “A equidade ou a 'justiça com coração' – A propósito da decisão arbitral segundo a equidade”, in: Forjar o Direito, Coimbra, Almedina, 2015, p. 656 e pp. 675-676 (interpolação nossa).
[35] Cfr. artigo 494.º.
[36] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed., 1987, p. 501.
[37] Ac. STJ de 25‑7‑2002, in CJ cit., p. 134.
[38] Assim, o Ac. do STJ de 25.11.2009, proc. 397/03.0GEBNV.S1, www.dgsi.pt.
[39] Cfr. Maria Manuel Veloso, “Danos não patrimoniais”, in: Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da reforma de 1977, volume III – Direito das Obrigações, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 506.
[40] Para a pergunta sobre em que consiste a equidade “não há resposta fácil nem unívoca”, mas parece possível dizer que a decisão segundo a equidade (…) pode conferir peso a quaisquer argumentos sem se preocupar com a sua autoridade e relevância face às aludidas fontes (do sistema). É campo ilimitado do 'material', do 'razoável', do 'justo', do 'natural'”. Cfr. Manuel A. Carneiro da Frada, “A equidade ou a 'justiça com coração' – A propósito da decisão arbitral segundo a equidade”, in: Forjar o Direito, Coimbra, Almedina, 2015, p. 656 e pp. 675-676 (interpolação nossa).
[41] Ainda em apoio aproximativo do montante da indemnização em causa - considerando as circunstâncias mais relevantes dos casos, incapacidades, danos estéticos e quanto doloris, que não absolutas particularidades, não repetíveis nos casos concretos -, pode ver-se os Acs. S.T.J. 25/5/2017, pº 868/10.2TBALR.E1.S1 – Lopes do Rego, S.T.J. 21/1/2016, pº 1021/11.3TBABT.E1.S1 – Lopes do Rego, S.T.J. 28/1/2016, pº 7793/09.8T2SNT.L1.S1 – Maria da Graça Trigo, S.T.J. 7/4/2016, pº 237/13.2TCGMR.G1.S1 – Maria da Graça Trigo, S.T.J. 12/7/2018 Col.II/183 – Maria Rosa Oliveira Tching, S.T.J. 10/12/2019, pº 32714.1TBMTR.G1.S1 - Maria do Rosário Morgado, S.T.J. 5/2/2020, pº 10529/17 (ECLI) – Oliveira Abreu, S.T.J. 29/10/2020, pº 2631/17.0T8LRA.C1.S1 – Nuno Oliveira, S.T.J. 14/1/2021, pº 644/12.8TBCTX.L1.S1 – Nuno Oliveira, e S.T.J. 12/1/2021, pº 1307/14.5T8PDL.L1.S1 - Maria João Vaz Tomé.