Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
454/09.0YFLSB
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: SERRA BAPTISTA
Descritores: CONTRATO INOMINADO
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
MORA
INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 10/29/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :

1. O acordo pelo qual a autora se obrigou a custear as obras num prédio à ré pertencente, por determinado montante, vinculando-se esta a vender tal imóvel, também avaliado por ambas em certo valor, por preço mínimo, igualmente entre as partes ajustado, repartindo-se, a final, entre elas e em partes iguais o lucro líquido com a transacção obtido, abatidos que fossem previamente o valor do custo das obras, a entregar à autora e o valor do prédio, a entregar à ré, configura um contrato atípico e inominado.

2. A ré não poderia ter resolvido o contrato, de forma unilateral, quando verificou que as obras decorriam fora do prazo ajustado com um terceiro e com defeitos, que provocaram o reparo dos vizinhos, pois, mesmo que a autora estivesse em mora, não se torna certo que a prestação já não fosse possível, não tendo a autora sido devidamente interpelada para, em prazo razoável, fazer terminar a obra acordada, sem vício.

3. Não há indemnização sem dano.

4. O facto de a autora “se sentir enganada” pela ré, de “imputar a esta uma depressão nervosa pela frustração do negócio”, que nem se conhece se viria a realizar-se com êxito, de “se sentir desorientada e frustrada”, de “sentir angústia e preocupação”, sem mais qualificativos, não é indemnizável, por não ser, só por si, merecedor da tutela do direito.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:




AA ,veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 27 651,25, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a citação até integral liquidação.

Alegando, para tanto, e em suma:
Sendo a ré dona e possuidora de uma fracção autónoma que melhor identifica nos autos, celebraram as partes um acordo escrito, no âmbito do qual, sendo atribuída à fracção o valor de € 84 795,64, a A. comprometia-se a efectuar obras também acordadas, no valor de € 12 469,95, procedendo-se, depois, à venda do imóvel pelo valor mínimo de € 114 723,52.
O produto líquido da venda, deduzidos os valores da fracção e das obras, nos acordados montantes, seria dividido por ambas as partes.
A Ré não cumpriu o acordado, tendo daí resultado danos para a A., de natureza patrimonial e não patrimonial, que melhor discrimina, no montante peticionado.

Citada a ré, veio a mesma contestar, alegando ter sido a A. quem incumpriu o contrato entre ambas celebrado, que é de empreitada.
Deduziu pedido reconvencional, alegando prejuízos sofridos e desgostos.
Nele pedindo o pagamento da quantia de € 15 000, acrescida de juros de mora, também contados desde a notificação da contestação até integral liquidação.

Replicou a A., defendendo, alem do mais, a improcedência do pedido reconvencional.
Mais pedindo a condenação da ré como litigante de má fé.

Respondeu a ré, peticionando, por seu turno, a condenação da autora como litigante de má fé.

Ao que a autora respondeu, concluindo como na p. i. e na réplica.

Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Em sede de julgamento foi requerida e admitida a ampliação do pedido reconvencional para o valor de € 20 471,75.

Realizado o julgamento, decidiu-se a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 540 a 544 consta.

Foi proferida a sentença que julgou improcedentes quer a acção, quer a reconvenção. Com a absolvição da autora e da ré dos respectivos pedidos formulados.

Inconformada, veio a autora interpor, sem êxito, recurso de apelação para o Tribunal da relação de Lisboa.

De novo irresignada, veio pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, no qual, por acórdão de fls 751 a 764, se decidiu conceder a revista, anulando-se o acórdão recorrido e determinando-se, no que concerne à caracterização do contrato firmado pelas partes, a baixa dos autos para que, em novo acórdão, seja apreciada a matéria objecto de impugnação da decisão de facto da 1ª instância.

Cumprido o ordenado, foi proferido novo acórdão – não pelos mesmos senhores Desembargadores, com a menção de tal não ser possível – que julgou a apelação improcedente.

Outra vez irresignada, veio a apelante pedir revista para este Tribunal, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões, que se transcrevem tal como foram elaboradas:

1ª - Não assiste razão ao Tribunal recorrido, porquanto, o mesmo violou de forma manifesta e grave a lei substantiva.
2ª- Dá-se por reproduzida, por uma questão de economia processual, toda a matéria de facto dada por assente pelo Tribunal da Relação de Lisboa, reproduzindo e mantendo aquela que foi fixada na 1ª Instância.
3ª - 0 acordo escrito celebrado entre a A. e a R, bem como a planta anexa ao mesmo, onde se encontram desenhadas e descritas as obras a realizar na fracção autónoma de que é proprietária a R, constituem os factos assentes nas alíneas B), C), D), E), G) e H) do douto acórdão. Tal documento particular tem força probatória plena, nos termos do disposto no arte 376º, nº 1 do CC.
4ª -Na verdade, as obras que se encontram descritas na planta anexa ao contrato celebrado entre a A. e a R, consistiam, nomeadamente, em proceder ao isolamento do telhado, levantar o telhado, colocação de um armário na entrada do WC, isolamento do terraço, instalação de nova canalização de água e electricidade e afagamento do chão e envernizamento do mesmo – Al. D) dos factos assentes.
5ª - 0 facto constante da al. Aj), de que a R. se apercebeu de que os barrotes do telhado haviam sido serrados, fragilizando toda a estrutura do prédio, foi uma obra prevista pela própria R. na planta anexa ao acordo, porquanto o levantamento do telhado implicava esses trabalhos.
6ª - Ficou provado que a Ré pretendia colocar a cozinha onde antes era a casa de banho e assim aconteceu durante a obra realizada pelo Sr. CC– al. Ax dos factos assentes.
7ª - Está provado que o esgoto da fracção ficou ligado aos escoamentos das águas pluviais - aI. AI) dos factos assentes - tal foi previsto pela R naquela pretensão de colocar a cozinha onde era a casa de banho.
8ª - 0 facto de ter havido infiltrações de águas pluviais provenientes da má execução dos trabalhos ou da sua falta de conclusão, e que originaram queixas dos vizinhos – cfr. al. Ae) dos factos assentes – ora tal situação constituiu e constitui um risco inerente à realização de obras num telhado, e do próprio negócio celebrado, sendo uma situação previsível, havendo chuvas.
9ª - Além do mais, foi a R quem impediu a conclusão das obras - aI. Af) e Ba) da matéria assente.
10ª- Da matéria de facto dada por assente resulta que a R efectuou diversas deslocações ao imóvel e que seguiu de perto as obras levadas a efeito pelo Sr. CC, atendendo às als. Aj) e Az), prevalecendo a vontade da R na execução das mesmas, sendo certo que, foi dado por provado que a A. não acompanhou a obra até ao momento em que o Sr. DD deixou de estar na obra, altura em que a A. começou a procurar a R - aI. M) da matéria assente.
11ª- Não resulta dos factos provados que haja modificação ou resolução do contrato por alteração das circunstâncias, pois, para tanto, impõe-se que as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tenham sofrido uma alteração anormal. Para além disso, impõe-se que, as exigências da obrigação assumida pela parte lesada afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do negócio, tornando excessivamente oneroso e difícil para uma delas o cumprimento daquilo a que se encontrava obrigada. (Neste sentido Ac. STJ de 20/04/82, BMJ 316-255 e Código Civil Anotado de Pires de Lima e Antunes Varela, 4ª ed., págs. 412 e seguintes). Pelo que o Tribunal recorrido violado a lei substantiva, nomeadamente o disposto nos arts. 437°, 433º e 434° do CC.
12ª- O contrato dos autos é um contrato atípico ou inominado, para o qual não existe disciplina legal específica, concluído ao abrigo do princípio da liberdade contratual consagrado no art. 405º n° 1 do CC, o qual deve respeitar os deveres de protecção, informação e lealdade nos termos do arte 227º, nº 1 do CC. É neste sentido que o Tribunal recorrido deveria ter interpretado e aplicado a lei substantiva ao caso em análise.
13ª- Todo o circunstancialismo fáctico dado como provado é revelador de um modo de agir, por parte da R recorrida, eivado de má fé, tendo violado os deveres de informação, lealdade e protecção que devem pautar as relações contratuais, omitindo factos e tomando atitudes causadoras de danos à A. recorrente.
14ª- Ficou provado que a A. não acompanhou a obra até ao momento em que o Sr. DD deixou de estar na obra, altura em que a A. começou a procurar a Ré - aI. M) da matéria assente; Depois, quando a A. verificou que as obras no imóvel não estavam concluídas (Cfr. Al. O) da matéria assente), contactou a R. facto este tido por assente na alínea Q) "A R contactada pela A, disse-lhe que não podiam continuar com as obras acordadas porque a Câmara não permitia sem autorização (resposta quesitos 10º, 11º e 12º") o que demonstra que foi a A. quem diligenciou pelo contacto com a R para obter informações. (O negrito é nosso); Posto isto, a A. "... solicitou à R que lhe facultasse a decisão de embargo das obras, que esta lhe referiu ter sido proferido pela Câmara Municipal de Lisboa ", facto tido por assente na aI. S); Sucede que, conforme consta da al. T) da matéria de facto assente, "Nunca a R facultou qualquer documento ou comunicação da Câmara Municipal de Lisboa referente às obras, ou qualquer decisão de embargo das mesmas, que comprovasse o que aquela alegava", ocultando, assim. informação essencial à A; ficou provado na aI. U) da matéria de facto assente que, "Em princípios do mês de Outubro do ano 2002, a A. dirigiu-se à fracção autónoma em causa, e verificou que na mesma se encontravam trabalhadores da construção civil a efectuar obras no imóvel" da R e a mando desta (Cfr. Al. V) da matéria assente), não tendo dado qualquer satisfação à A; Acresce que, tendo o Sr. DD sido escolhido por acordo de ambas, a A. e a R para gerir a execução da obra no imóvel desta (Cfr. al. E) dos factos assentes), e dado que a R acompanhava os trabalhos e propunha alterações que vieram a ser acatadas, o que é revelado pelos factos assentes das aIs. Aj) e Az) da matéria assente, a R recorrida tinha o dever contratual de informar a A. sobre as suas "desconfianças" (Cfr. aI. Am) matéria assente) em relação ao dito DD, a fim de, em conjunto arranjarem uma solução para o assunto.
15ª- A atitude de impedir a continuação da obra (al. Ba dos factos assentes), de mudar a fechadura da porta (aI. Al) dos factos tidos por assentes), de negar à A informações e apresentar documentos comprovativos do alegado embargo (Al. T da matéria assente), tanto mais que foram solicitados pela A, demonstra a violação grave dos deveres a que a R estava adstrita resultantes da relação contratual, levando à frustração das legítimas expectativas da A, causando-lhe prejuízos patrimoniais e não patrimoniais, que têm de ser ressarcidos, nos termos do disposto no arte 227º, nº 1 do CC (Vide Prof. Vaz Serra in Boletim nº 68, pág. 122 e Prof. Mota Pinto, Teoria Geral, 3ª ed., 443).
16ª- A R não teve um comportamento consciencioso e honesto, como seria de esperar de uma pessoa séria e leal. Além do mais, presume-se a culpa da R (Cfr. art. 799º do CC). Neste sentido acórdãos do STJ, nomeadamente de 04/05/2006, de 21/12/2005, de 18/11/2004, de 28/02/2002.
17ª- Assim, salvo o devido respeito, o Tribunal recorrido violou, também, o disposto no art. 227º e 405º n° 1 do CC, não tendo feito a mais correcta interpretação e aplicação do direito.

Não houve contra-alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.
Vem dado como PROVADO:

A) - A R. é dona e legítima possuidora da fracção autónoma designada pela letra "T", correspondente ao 4º andar esquerdo do prédio urbano, sito na Travessa ........,...., em Lisboa, como se alcança da certidão do teor da descrição e de todas as inscrições em vigor, emitida pela 8ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa.

B) - Por acordo escrito, datado de 20.11.2001, celebrado entre a R. e a A., ao referido imóvel foi atribuído o valor actual de Esc. 17.000.000$00, ou seja, € 84.795,64.

C) - Nesse acordo ficou estipulado que a A. se comprometia a efectuar as obras acordadas por ambas, na mencionada fracção, no valor de Esc. 2.500.000$00, ou seja, € 12.469,95.

D) - Obras que se encontram descritas na planta anexa ao mencionado acordo e que consistiam em proceder ao isolamento do telhado, levantar o telhado, colocação de um armário na entrada do WC, isolamento do terraço, instalação nova de canalização de água e electricidade e afagamento do chão e envernizamento do mesmo.

E) - Mais acordaram A. e R. que a gestão e a responsabilidade das obras ficariam a cargo do Sr. DD, cujo prazo de execução seria de 5 semanas, a contar da data do acordo.

F) - O DD recebeu o valor total da obra, por parte da A.

G) - Ficou acordado que, concluídas as obras, a A. e a R. procederiam à venda da referida fracção, fixando desde logo o valor da venda em pelo menos Esc. 23.000. 000$00, ou seja, € 114.723,52, sujeito a rectificação (resposta ao quesito 1°).

H) - A A. e a R. acordaram que o produto líquido da venda, deduzidos o valor do imóvel, no montante de Esc. 17.000.000$00, a entregar à R., e o valor das obras, no montante de Esc. 2.500.000$00, a entregar à A., seria dividido por ambas em partes iguais (resposta ao quesito 2°).

I) - A A. entregou a DD todo o valor de Esc. 2.500.000$00 (resposta ao quesito 3°).
CC para executar as mencionadas obras (resposta ao quesito 4°).

L) - Este iniciou as obras e na execução das mesmas cumpriu todas as ordens que lhe foram dadas por DD (resposta ao quesito 5°).

M) - A A. não acompanhou a obra até ao momento em que o Sr. DD deixou de estar na obra, altura em que a A. começou a procurar a R. (resposta ao quesito 6°).

N) - No dia 02.04.2002, a A. insistiu junto do CC para ir ver as obras, como, efectivamente, sucedeu (resposta ao quesito 7°).

O) - A A. verificou que as obras não se encontravam concluídas (resposta ao quesito 8°).

P) - Tendo-lhe sido comunicado pelo CC que havia sido impedido pela R. de continuar lá a trabalhar, tendo-lhe a mesma dito que a obra tinha sido embargada (resposta ao quesito 9°).

Q) - A R., contactada pela A., disse-lhe que não podiam continuar com as obras acordadas porque a Câmara não permitia sem autorização (resposta aos quesitos 10°, 11 ° e 12°).

S) (1) - A A. solicitou à R. que lhe facultasse a decisão de embargo das obras, que esta lhe referiu ter sido proferida pela Câmara Municipal de Lisboa (resposta ao quesito 13°).

T) - Nunca a R. facultou qualquer documento ou comunicação da Câmara Municipal de Lisboa referente às obras, ou qualquer decisão de embargo das mesmas, que comprovasse o que aquela alegava (resposta ao quesito 14°).

U) - Em princípios do mês de Outubro do ano 2002, a A. dirigiu-se à fracção autónoma em causa, e verificou que na mesma se encontravam trabalhadores da construção civil a efectuar obras no imóvel (resposta ao quesito 15°).

V) - Tendo a A. contactado com o encarregado da obra, este informou a A. que trabalhava a mando da R. (resposta ao quesito 16°).

X) - A A. tentou ultrapassar a situação, visando reaver o dinheiro entregue a DD (resposta ao quesito 17°).

Z) - A R. recusou entregar qualquer quantia e admitir a intervenção da A. na obra (resposta ao quesito 18°).

Aa) - No registo predial da decisão de arresto do imóvel identificado em A), a A. despendeu a quantia de € 125,00 (resposta ao quesito 19°).

Ab) - A A. despendeu ainda € 28,25 na certidão do teor da descrição e de todas as inscrições em vigor do imóvel identificado em A) (resposta ao quesito 20°).

Ac) - Esta factualidade enervou a A., sentindo-se a mesma desorientada, enganada e frustrada nas expectativas do negócio (resposta ao quesito 21°).

Ad) - A A. sente-se enganada pela R. e imputa-lhe a causa de uma depressão nervosa, causada pela frustração do negócio (resposta ao quesito 22°).

Ae) - Devido às obras que estavam a ser realizadas na fracção da R., começaram a surgir queixas frequentes dos vizinhos devido a infiltrações de águas pluviais provenientes da má execução dos trabalhos realizados ou da sua falta de conclusão (resposta ao quesito 23°).

Af) - A A. não concluiu as obras no telhado nem colocou o respectivo isolamento (resposta ao quesito 24°).

Ag) - Houve uma queixa por causa das infiltrações na casa da vizinha e a R. foi alertada que não poderia prosseguir as obras e tinha que reparar o que se encontrava feito (resposta ao quesito 25°).

Ah) - Após o conhecimento da queixa, a R. tentou indagar junto do Sr. DD que procurou e não encontrou (resposta ao quesito 27°).

Ai) - A R. não conseguiu encontrar nem contactar DD (resposta aos quesitos 28° e 29°).

Aj) - Numa dessas deslocações, a R. apercebeu-se de que os barrotes do telhado haviam sido serrados, fragilizando, assim, toda estrutura superior do prédio (resposta ao quesito 30°).

AI) - Provado que o esgoto da fracção ficou ligado ao escoamento das águas pluviais (resposta ao quesito 31°).

Am) - A R., em virtude de ter perdido confiança no DD, mudou a fechadura da porta (resposta ao quesito 33°).

An) - A A. era casada com DD (resposta ao quesito 34°).

Ap) (2). - A Ré teve de despender € 6.000,00 (seis mil euros) a desfazer e a refazer o que a A. fez (resposta ao quesito 35°).

Ao) - A saber: corrigir a canalização e o esgoto, repor as paredes interiores, desfazer e voltar a construir o telhado (resposta ao quesito 36°).

Ap) - Estas obras levaram a que a R. tenha levado mais de seis meses a alcançar a conclusão da obra (resposta ao quesito 37°).

Aq) - A R. sofreu angústia com toda a situação (resposta ao quesito 38°).

Ar) - O arresto do seu único bem, impede a R. de o transaccionar, afastando a hipótese de nos anos mais próximos recuperar o valor investido ou realizar qualquer mais valia (resposta ao quesito 39°).

As) - Confrontada com o facto de estar impedida de dispor do seu bem, seja para recuperar o investimento, seja para realizar alguma mais valia e sendo essa a finalidade para qual comprou o imóvel em 25 de Junho de 2001 (resposta ao quesito 40°).

At) - A A. tem sentido angústia e preocupação (resposta ao quesito 41°).

Au) - A R. sente-se angustiada e preocupada com a impossibilidade de rentabilizar o imóvel (resposta ao quesito 44°).

Av) - Provado que recebia as ordens que lhe foram dadas pelo Sr. DD (resposta ao quesito 45°) (3).

Ax) - Provado que a R. pretendia colocar a cozinha onde antes era a casa de banho e assim aconteceu durante a obra realizada pelo Sr. CC (resposta ao quesito 46°).

Az) - Provado que inicialmente houve contradição, mas depois a vontade da R. prevaleceu com a anuência do Sr. DD (resposta ao quesito 47°).

Ba) - A dada altura, que se situa no mês de Fevereiro de 2002, a R. impediu o Sr. CC, pessoa incumbida de realizar as obras, de continuar a respectiva execução da
obra, dizendo-lhe que a mesma havia sido embargada pela Câmara Municipal de Lisboa (resposta ao quesito 48º).

Bb) DD recebeu o valor da obra, por parte da A. (resposta ao quesito 52º).

Bc) A A. e DD indicaram à ré, como morada de ambos, a Rua ...........a nº .... em Lisboa (resposta ao quesito nº 53).


As conclusões da alegação dos recorrentes, como é bem sabido, delimitam o objecto do recurso – arts 684º, nº 3 e 690º, nº 1 e 4 do CPC, bem como jurisprudência firme deste Supremo Tribunal.

Sendo, pois, as questões atrás enunciadas e que pela recorrente nos são colocadas que cumpre apreciar e decidir.

As quais, e se bem entendemos as complexas conclusões da recorrente, assim se podem resumir:
1ª - a da violação do contrato atípico ou inominado por banda da ré, com os consequentes prejuízos causados à A.;
2ª – a da não alteração anormal das circunstâncias que legitimem a resolução do contrato por banda da ré.

Vejamos:

Aceitando-se a bondade do decidido no anterior acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça (4), podemos dar como assente, sob o prisma da qualificação do contrato gizado entre as partes, estarmos perante um contrato inominado e atípico em que ambas se obrigaram, a A. a efectuar as obras, pelas contraentes acordadas, na fracção predial da Ré, no valor actual de € 12 469,95, que custearia, e a Ré a vender a mesma fracção, sua propriedade, depois de remodelada, avaliada, também por acordo, antes das obras, no valor de € 84 795,64. O lucro líquido obtido com a dita venda, a efectuar, pelo menos, por € 114 723,52 – restituídos que fossem os € 12 469,95 à Ré e os € 84 795,64 à A. – seria dividido entre ambas.
As obras, também segundo o acordado, ficariam a cargo de DD, então casado com a A., que faria a sua respectiva gestão e que por elas se responsabilizaria.

Dizendo-se, depois, no mesmo aresto:
“Tanto quanto se pode entender da leitura da petição, a A., com a presente acção pretendia ver-se ressarcida dos prejuízos sofridos com o impedimento que imputou â Ré de prosseguirem as obras empreitadas e de unilateralmente as recomeçar com pessoal diferente do contratado para o efeito pelo terceiro que tinham incumbido de as levar a cabo.
E segundo diz a autora, essa atitude da ré levou-a a pedir a devolução do montante entregue, o que esta recusou, declarando resolvido o contrato.
Grande parte desta factualidade foi considerada provada. Contudo, mediante a prova dos factos aduzidos pela Ré e justificativos da sua recusa em aceder às pretensões da A. por via da execução deficiente das obras que não lhe trouxeram benefício, nem incrementaram o valor da fracção, a acção veio a ser julgada improcedente, tendo justamente a autora impugnado as respostas dadas à base instrutória em ordem a poder inverter o sentido da decisão.
Deste modo cabia ao Tribunal da Relação conhecer de tal impugnação da matéria de facto, (…) e, em resultado dela, apreciar da justeza da solução de direito na parte em que negou procedência ao pedido formulado pela autora ora recorrente.”

E, por isso, anulou (5) o acórdão recorrido, determinando “em conformidade com o exposto no que concerne à caracterização do contrato firmado pelas partes,” a baixa dos autos para, se possível com os mesmos Juízes Desembargadores, ser apreciada a matéria objecto de impugnação da decisão de facto da 1ª instância.

Conhecendo, assim, das insuficiências da decisão proferida acerca da matéria de facto e enquanto tais factos são susceptíveis de afectarem ou impossibilitarem a correcta decisão jurídica do pleito (6) .

Embora este STJ não o tenha dito de forma expressa, crê-se que o dito acórdão terá julgado, no fundo, que a decisão de facto deveria ser ampliada, pelo que, tendo definido o direito aplicável, quanto à caracterização do contrato, mandou julgar novamente a causa – art. 729.º, nº 3 e 730.º, nº 1 do CPC.

Concluindo-se aqui que, na falta de indicação de qualquer preceito legal que nos possa melhor elucidar, o Supremo não terá fixado com precisão o regime jurídico a aplicar (art. 730.º, nº 2 do mesmo diploma legal).

Ora, reapreciando a matéria de facto pela autora impugnada, a Relação manteve o a propósito decidido na 1ª instância.

Tanta bastaria, ao que supomos, na lógica do discurso do anterior aresto deste mesmo Tribunal para a acção improceder.

Já que provados definitivamente terão ficado os factos que poderão levar a concluir que a Ré justificou a sua recusa em aceder às pretensões da autora, já que a deficiente execução das obras não lhe trouxe qualquer proveito

Mas, vejamos um pouco mais circunstanciadamente:

É sabido que os contrato devem ser, por força do disposto no art. 406.º, nº 1 do CC (7), pontualmente cumpridos, coincidindo este advérbio com o seu sentido amplo, ou seja, o cumprimento deve coincidir ponto por ponto, em toda a linha com a prestação a que o devedor se encontra adstrito. (8)

Só podendo extinguir-se, ainda por via do mesmo preceito legal, por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.

Só produzindo efeitos em relação a terceiros nos casos e termos especialmente previstos na lei – art. 406.º, nº 2.

Trata-se, sem dúvida, de um contrato bilateral, formado pelo acordo de duas partes, a ora autora e ré.

Tendo ficado, por via de tal contrato sinalagmático, as partes com obrigações recíprocas, isto é, com obrigações, que sendo principais e caracterizadoras do contrato, impendem sobre ambas as partes, encontrando-se ligadas por um nexo de correspectividade, o sinalagma (9).

Mas, antes de prosseguirmos, atentemos melhor no conteúdo (10) do contrato em apreço, com natural relevo jurídico, já que temos por verdadeiro a validade do mesmo.

Reproduzindo aqui as suas cláusulas, assim explicitando melhor o texto do escrito aludido em B) e C):

“Entre:
1. AA, com sede na Rua da ..........., ... , em Lisboa, dona e legítima possuidora do quarto andar esquerdo do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa d......,.., em Lisboa.
e
2. AA, com sede na Rua ............., ... em Lisboa, é estabelecido o seguinte acordo com base nas seguintes cláusulas:

1) À propriedade da "1ª" é atribuído o valor actual de Esc: 17 000 000$00 (Dezassete milhões de escudos);
2) A "2ª”- compromete-se a efectuar as obras acordadas por ambas no valor global de Esc: 2 500 000$00 (Dois milhões e quinhentos mil escudos).
3) Concluídas as obras dever-se-á proceder à venda da referida fracção, fixando-se neste momento o valor de venda em Esc: 23 000 000$00 (Vinte e três milhões de escudos), sujeito a rectificação, se tal for necessário.
4) O produto líquido da venda, deduzidos os Esc: 17 000 000$00 (Dezassete milhões de escudos) a entregar à "1ª" e os Esc: 2 500 000$00 (Dois milhões e quinhentos mil escudos) a entregar à "2ª" serão divididos por ambas em partes iguais.
5) A gestão e a responsabilidade da obra ficam a cargo de DD, com escritório na Rua .............., em Lisboa.
6) O prazo de execução das referidas obras é de 5 semanas, a contar da presente data.

A ora autora comprometeu-se, pois, de acordo com o clausulado, a efectuar as obras entre ambas acordadas, encarregando-se da respectiva realização, também por acordo de ambas, que o STJ, no seu anterior aresto, entendeu por contrato de empreitada, DD, que se apurou ser marido da mesma autora e então com ela convivente.

E a ré a vender a sua fracção, beneficiada com as ditas obras, a fim de o lucro – a diferença entre o valor estipulada para o prédio antes das obras e o custo acordado destas – ser repartido por ambas as partes.

Mas a ré não vendeu a casa – pelo menos no âmbito deste contrato.

Sendo certo que, em 2/4/2002 as obras ainda se não encontravam concluídas, tendo a A., que até então não havia acompanhado as mesmas, sido informada por CC, a quem o DD havia incumbido de as executar, que a Ré o havia impedido de lá continuar a trabalhar, dizendo-lhe que a obra havia sido embargada - als J) a Q).

Em Outubro de 2002, e sem que a Ré tivesse comprovado à A. o alegado embargo da obra, foi esta informada que as obras prosseguiam mas a mando daquela, que se recusou a admitir a sua intervenção na obra - als U) a Z).

Aquando da realização das obras – e tem que se admitir que tal sucedeu na altura do DD – houve queixas frequentes dos vizinhos devido a infiltrações de águas pluviais provenientes da má execução dos trabalhos ou da sua falta de conclusão, sendo certo que também provado ficou que a A. não concluiu as obras no telhado nem colocou o respectivo isolamento – als Ae) a Ag).

A Ré, tendo sido alertada – crê-se que pela vizinha – de que não poderia prosseguir as obras e que tinha que reparar o que havia sido feito devido a infiltrações na casa da vizinha, procurou, sem êxito, contactar com o DD, tendo-se apercebido que a estrutura do telhado estava fragilizada – als . Ah) a Aj).

Perdeu a confiança no DD e mudou a fechadura da porta – al. Am).

A ré impediu o CC de prosseguir com as obras em Fevereiro de 2002.

Sendo certo que o DD não é parte no contrato, nem pelo mesmo tendo ficado vinculado ao que quer que seja já que nele, nem por si, nem por representante idóneo, ficou a intervir, e que a autora, afinal, deveria custar as obras – até àquele montante acordado - e não propriamente efectuá-las, pois, que tal função, por consenso de ambas as partes ficou atribuída ao referido terceiro, resta ver se a ré poderia ter rompido com o contrato, como claramente rompeu.

Cremos que não.

Sendo certo que o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação – cujo conteúdo resulta da vontade das partes - a que está obrigado – arts 398.º, nº 1, 405.º e 762.º, nº 1.
E que, como já dito, o contrato se extingue por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (citado art. 406º, nº 1).

Sendo o direito de resolução um direito potestativo extintivo, dependente de um fundamento.

Necessitando, assim, de se verificar um facto que crie esse direito.

Sendo tal facto ou fundamento o incumprimento do contrato.

Não tendo, porém, a resolução em princípio de ser objecto de declaração judicial, impondo-se, contudo, como declaração de vontade receptícia, que o seja por via de comunicação do credor ao devedor (arts 224º, nº 1 e 436º, nº 1).

Ora, como também é sabido, o não cumprimento da obrigação pode assumir diferentes modalidades: não cumprimento definitivo, mora e cumprimento defeituoso.

Sendo, ainda, certo, que a resolução do contrato, por via da lei – já que consenso das partes nele outorgantes a tal respeito se não verifica – só poderá ocorrer se estivermos perante uma impossibilidade culposa do cumprimento da prestação ou se houver um incumprimento definitivo – arts 808.º e 801.º, nº 2.

Pelo que, para que o credor possa resolver o contrato, desonerando-se da sua prestação, torna-se necessário, não a simples mora do devedor, mas que ela se tenha convertido num não cumprimento definitivo por banda deste.

Não podendo, assim, o credor resolver o contrato em consequência da eventual simples mora do devedor.

Já que esta, representando um simples retardamento da prestação por causa imputável ao devedor, só dá ao credor o direito de exigir o cumprimento da obrigação e a indemnização pelos danos causados – art. 804º (9)..

E, havendo mora no cumprimento, permite a lei que o credor fixe ao devedor um prazo razoável para cumprir, sob pena de se considerar impossível o cumprimento.

Tal prazo, destinado a conceder ao devedor uma derradeira possibilidade de manter o contrato, terá de ter uma dilação razoável em vista dessa finalidade. Tendo, ainda, de ser fixado em termos de claramente deixar transparecer a intenção do credor (12)..

Tratando-se, pois, de uma interpelação admonitória, uma intimação formal dirigida ao devedor moroso para que cumpra a sua obrigação dentro de certo prazo determinado, sob pena de se considerar o seu não cumprimento como definitivo (13)
.

Entendendo-se, assim, ser necessário o incumprimento definitivo do contrato para que resolução válida e eficaz possa haver, pode o mesmo, alem do mais, sobretudo resultar:
a) da ultrapassagem de prazo fixo, essencial e absoluto;
b) da recusa de cumprimento, declarada de forma categórica;
c) da conversão da mora em incumprimento definitivo por via dos mecanismos previstos no citado art. 808º, ou seja, da ultrapassagem do prazo suplementar razoável fixado na interpelação admonitória feita pelo credor da prestação em falta ou pela perda objectiva de interesse, por banda deste, na celebração do contrato, em consequência da mora do faltoso (14) Não bastando, porém, para a eficácia da perda do interesse que da mora resulte para o credor que este diga, mesmo que convictamente, que a prestação já não lhe interessa; haverá que se ver, em face das circunstâncias, se a perda do interesse corresponde à realidade das coisas.

Devendo, assim, a perda do interesse da prestação para o credor face ao atraso na prestação ser apreciada objectivamente – art. 808º, nº 2 (15)..

Facultando, pois, a mora, nestes casos – quando o credor tiver perdido o interesse na prestação em consequência do atraso do cumprimento por banda do devedor – a resolução do contrato por aplicação conjugada dos arts 808º, nº 1 e 802º, nº 2.

Tendo, porem, como já dito, a perda do interesse de ser justificada segundo o critério da razoabilidade, próprio do comum das pessoas.

Tendo de haver uma perda do interesse na prestação e não uma simples diminuição ou redução de tal interesse (16)

Sendo, assim, a perda do interesse do credor apreciada objectivamente, tal significando que o valor da prestação deve ser aferido pelo Tribunal em função das utilidades que a prestação teria para o credor (17).

Devendo entender-se, quando tal não ocorra, que o contrato continua a ter interesse para as partes, mantendo-se o interesse do credor apesar da mora, só podendo, então, esta converter-se em incumprimento definitivo se a prestação não vier a ser realizada em prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, sob a cominação estabelecida (18)

. Pois bem.

Temos até como certo, no âmbito do contrato em apreço, não ter ficado demonstrado sequer a mora da autora, já que, em bom rigor não ficou a mesma de realizar as obras, mas sim de as custar até ao montante acordado.

Quem ficou incumbido de as realizar, por consenso de ambas as partes clausulado no contrato, foi o DD.

Cabendo à ré, dona da fracção, em conjunto com a autora – e não ficou provado que esta alguma vez tal negasse – diligenciar junto do DD pela conclusão das obras e pela sua efectivação perfeita, sem vícios.

Mas, mesmo que de mora se tratasse – e demonstrado também não ficou que a ré tivesse perdido o interesse que tinha na prestação – também a ré não interpelou a autora, como deveria, em tal caso, para concluir a obra, sem vício, em prazo que razoavelmente para o efeito lhe facultasse.

A ré não poderia, pois, sem mais, resolver o contrato.

Assim se podendo ter tornado responsável – pelo seu incumprimento contratual, tendo continuado as obras a seu belo prazer – pelos prejuízos que, face a tal inadimplemento poderá ter causado á autora.

Procuremos, então, lobrigar os danos que a autora poderá, pela conduta da ré, ter sofrido, sabido que não há indemnização sem dano.

Ora, a respeito, ficou provado:

O DD recebeu o pagamento total da obra, por parte da A. – als F) e I).

A A. despendeu dinheiro no arresto do imóvel, no montante de € 153,25 – als Aa) e Ab)..

Sentiu-se enganada pela Ré e imputa à mesma a causa de uma depressão nervosa causada pela frustração do negócio – al. Ad).

Ficou enervada e sente-se desorientada, enganada e frustrada nas expectativas do negócio – al. Ac).

Tem sentido angústia e preocupação – al. At).

Ora, o facto de a autora ter entregue a totalidade do preço que havia ficado obrigada a pagar pela realização das obras ao DD, que, aliás, era seu marido, não lhe dá o direito de, sem mais o reaver da ré.

Pois as obras não foram concluídas e, pelo menos parte delas, foram efectuadas de forma deficiente.

Determinava o senso comum e as regras da experiência que o pagamento não fosse efectuado antes da conclusão das obras ou que, pelo menos, e que, com o acordo da ré, já que a incumbência dada ao DD adveio de ambas as partes, o fosse de forma faseada.

E também não ficaram apurados quaisquer danos pela frustração do negócio.

O qual poderia até não se realizar.

Ou poderia realizar-se sem qualquer lucro.

Ou até com prejuízo.

Não bastando a autora imaginar que o negócio iria ser proveitoso, na medida do planeado.

O mesmo se dizendo quanto aos prejuízos que alega ter sofrido pelas despesas documentais feitas no arresto, da sua inteira responsabilidade e que, como iremos ver, face ao desfecho da acção, era desnecessário, por inútil.

Quantos aos danos não patrimoniais também pela autora arrogados, apenas se dirá que os mesmos, tal como apurados ficaram, não são indemnizáveis, pois, e salvo o devido respeito, pela sua falta de gravidade, não merecem a tutela do direito – art. 496.º, nº 1.

Pois, e desde logo, não se provou que a ré, apesar de não ter agido em conformidade com o direito, a tenha enganado, por forma a transtornar emocionalmente a autora.

Depois, provado não ficou que a mesma tivesse, face à conduta da ré, sofrido de qualquer depressão.

Pois que apenas provado ficou que imputa à Ré tal arrogada depressão nervosa.

E os nervos, a desorientação e a frustração sentida, só por si, sem mais qualificativos, não são, como dissemos, merecedores da tutela jurídica.

Por estas razões, bem diferentes das ajuizadas na Relação, improcederá o pedido indemnizatório da autora.


Agora, a segunda questão: a da não alteração anormal das circunstâncias que legitimem a resolução do contrato por banda da ré.

A decisão atrás proferida prejudica, por desinteressante, o conhecimento desta matéria.

Só devendo o Tribunal resolver as questões que possam influir na decisão da causa.

Apenas se dizendo, por razão de rigor, que a Relação também se alicerçou em factos que não resultam do elenco dado como provado, nem devendo, por isso, os memos terem sido tidos em conta no acórdão recorrido, pois não se incluem nos também atendíveis na decisão, face ao disposto no art. 659.º, nº 2 do CPC.

Estamos a falar, designadamente, no facto de o arquitecto João Diogo Gonçalves, testemunha, ter ido fiscalizar a obra e alertado que a mesma não podia avançar por carecer de projecto e autorização camarários.

De haver que repor o que existia em termos arquitectónicos.

De não haver condições para o DD retomar a obra (pelo que disse uma testemunha).

Que o DD tivesse convencido a A. e ré que a obra não necessitava de licenciamento.

Nenhum destes factos que a Relação, salvo o devido respeito sem o dever fazer, repescou da prova testemunhal que terá também ouvido, será, sem mais, atendível na decisão de direito.

Face a todo o exposto, acorda-se neste Supremo Tribunal de Justiça em se negar a revista, mantendo-se, embora por diferentes razões, o decidido na Relação.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 29 de Outubro de 2009

Serra Baptista (Relator)
Álvaro Rodrigues
Santos Bernardino
________________________________

(1) Certamente por mero lapso não foi usada, na sequência, a letra R).
(2) Certamente por mero lapso a alínea AP) surge mencionada por duas vezes, uma, em seguida a An), outra, no lugar sequencial próprio.
(3) Este quesito tem a seguinte redacção: “Durante a execução das obras o sr. CC, contratado pelo DD, cumpriu todas as ordens e instruções que lhe foram dadas quer por este, quer pela Ré?”
(4) E, nesta parte, o direito aplicável já foi decidido pelo STJ em tal aresto.
(5) Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, p. 197, entende que o STJ não decreta a anulação, mandando apenas julgar de novo na 2ª instância.
(6) Lebre de Freitas, CPC Anotado, vol. 3º, p. 137 e Amâncio Ferreira, ob. e p. cit.
(7) Sendo deste diploma legal todas as disposições a seguir citadas sem referência expressa.
(8) P. Lima e A. Varela, CCAnotado, vol. I., p. 373.

(9) Ana Prata, Dicionário Jurídico, p. 287 e Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, p. 192.
(10) O conteúdo do contrato será o resultado jurídico do acordo das partes, isto é a estrutura correspondente ao resultado global de tal consenso, tal como determinado de harmonia com os cânones da interpretação e eventualmente aditado ou corrigido pelas implicações jurídicas decorrentes da integração de lacunas – Carlos Ferreira de Almeida, Contratos II, p. 14.

(11) Cfr., também, Ac. do STJ de 2/11/89, Bol. 391, p. 538.
(12) A. Varela, “Das Obrigações em Geral”, II vol., p. 119.
(13) Baptista Machado, Pressuposto da Resolução por Incumprimento, p. 42.
(14) Neste sentido, entre muitos outros, Acs do STJ de 10/7/08 (A. Sobrinho), Pº 08B1849), de 27/5/08 (Salvador da Costa), Pº 08B1085, de 29/4/08 (A. Ramos), Pº 07A4246 e de 1/4/08 (Nuno Cameira), Pº 07A4775.
(15) Cfr, ainda, Galvão Telles, Direito das Obrigações, p. 311.
(16) A. Varela, RLJ Ano 118º, p. 54 e ss, com alusão aos trabalhos preparatórios do Código Civil e evolução dos textos que deram lugar ao mencionado art. 808º, com registo de uma notória viragem ao encontro da doutrina do Código Alemão, que exige uma perda absoluta, completa do interesse na prestação, traduzida por via de regra no desaparecimento da necessidade que a prestação visava satisfazer.

(17) Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, p. 20, nota 3.
(18) A. Varela, Das Obrigações em Geral, I, p. 532 e ss.