Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
052257
Nº Convencional: JSTJ00008700
Relator: MIGUEL CRESPO
Descritores: ARRENDAMENTO URBANO
DESPEJO
RESIDENCIA PERMANENTE
FALTA
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ194506220522571
Data do Acordão: 06/22/1945
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG IªS 13-07-1945; BOMJ 5,231; RLJ ANO78 PAG142
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO.
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 3/1945
Área Temática: DIR CIV - DIR CONTRAT.
Legislação Nacional: L 1662 DE 1924/09/04 ARTIGO 5 PAR9 ARTIGO 7.
D 22661 DE 1933/06/13 ARTIGO 5.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1938/10/18 IN COL OF ANO37 PAG375.
Sumário :
A falta de residencia permanente no predio arrendado não e, de per si, motivo de despejo, mas condição que investe o senhorio na plenitude do exercicio dos direitos contratuais.
Decisão Texto Integral: Acordão do Supremo Tribunal de Justiça, em secções reunidas:

A, em Outubro de 1941, intentou na 4 vara da comarca do Porto contra B hoje falecida e representada pelos filhos D. Ilda ... e C uma acção especial de despejo do predio urbano da Rua ..., 111, dessa cidade, que habitava desde Janeiro de 1911.


Fundamenta a acção alegando:


Que, tendo arrematado o predio, em hasta publica, no Tribunal das Execuções Fiscais em 28 de Julho de 1941, em Agosto imediato teve conhecimento de que a re tinha sublocado o predio sem para isso ter consentimento do anterior senhorio;


Que, "nos termos do artigo 7 da lei n. 1662, a sublocação não consentida e motivo legal para despejo, acrescendo que, nos termos do artigo 5 do decreto n. 22661, nos arrendamentos destinados a habitação, as disposições que restringem a liberdade contratual so podem ser invocadas pelos inquilinos relativamente a habitação em que tiverem a sua residencia permanente " ( artigo 10 da petição ).


Na impugnação a re negou a existencia de sublocação e alegou que a falta de residencia permanente não constitue directamente fundamento de despejo.
Na resposta a impugnação voltou o autor a dizer que deve julgar-se provada a sublocação e decretado o despejo imediato do respectivo predio e de quem o estiver ocupando; e no caso, que so em hipotese se põe, de tal sublocação não ser provada, deve julgar-se que a re não tem naquele predio a sua residencia permanente, e assim decretado o despejo para o fim do prazo contratual.


A acção foi julgada procedente por falta de residencia permanente no predio arrendado, decisão esta que a Relação confirmou.
No acordão deste Tribunal de folha 234 revogou-se tal decisão, por a falta de residencia permanente não ser por si fundamento de despejo, mas apenas condição que investe o senhorio na plenitude do exercicio dos direitos contratuais.


E no acordão de folha 255, proferido em aclaração do anterior, por se haver afirmado que a alegação de que ao senhorio não convinha a continuação do arrendamento esta não so implicita mas expressa no artigo 10 da petição inicial acima reproduzida, decidiu-se que em tal artigo não esta expressa semelhante alegação, como da sua simples leitura se ve, e tambem o não esta implicitamente, e que a propria alegação de o inquilino não ter no predio arrendado a sua residencia permanente surge na petição presa a questão da sublocação e como dando a entender que, por esse facto, restabelecido o rigor pleno das clausulas contratuais, a sublocação se tornou causa de despejo, sem que o inquilino pudesse invocar as restrições postas pela lei n. 1662.


E acrescentou-se que ao autor corre o dever de enumerar com clareza os fundamentos da acção, não sendo licito ao Tribunal, nesta materia, suprir-lhe as omissões.


Ficou, no entanto, decidido nesses acordãos que a falta de residencia permanente no predio arrendado não e, de per si, fundamento de despejo, mas condição que investe o senhorio na plenitude dos seus direitos contratuais.
Por o assim decidido estar em oposição com a doutrina do acordão deste Tribunal de 18 de Outubro de 1938, publicado na Colecção Oficial, ano 37, a pagina 375, que considerou o facto de o reu não residir na casa arrendada fundamento de despejo e o ordenou com esse fundamento, recorreu o vencido A para o tribunal pleno, a fim de solucionar-se o conflito de jurisprudencia.


Alegaram as partes, pugnando o recorrente pela revogação dos acordãos em recurso e a recorrida pela sua manutenção.


O douto representante do Ministerio Publico junto do Tribunal tem por insustentavel a doutrina do acordão de 18 de Outubro de 1938 e pronuncia-se pela manutenção da doutrina dos acordãos recorridos.
Cumpre decidir.


O artigo 5 do decreto n. 22661, que regula a hipotese sub judice, e clarissimo e não admite duvidas.


Nele se diz expressamente que as disposições que restringem a liberdade contratual, incluindo as relativas a elevação de rendas e ao despejo por não convir a continuação do arrendamento, so podem ser invocadas pelos inquilinos relativamente a habitação em que tiverem a residencia permanente.
A falta de residencia constitue portanto motivo determinante da não aplicação das disposições legais que restringem a liberdade contratual.
Nada mais se contem nesse preceito legal.


Restituidos os contraentes a liberdade contratual pela falta de residencia do inquilino no predio arrendado, o senhorio, para obter o despejo, tem de invocar fundamento que nesse regime o permita, como o termo do contrato ou o não querer o inquilino sujeitar-se a elevação da renda.
A falta de residencia, que não e de confundir com o facto de o inquilino conservar mais de um ano consecutivamente desabitado o predio destinado a habitação - motivo de despejo previsto no paragrafo
9 do artigo 5 da lei n. 1662 -, não foi elevada a categoria de fundamento de despejo pelo artigo 5 do decreto n. 22661, como da sua simples leitura se apreende.
Nos termos expostos se nega provimento ao recurso e se fixa o seguinte assento:
A falta de residencia permanente no predio arrendado não e, de per si, motivo de despejo, mas apenas condição que investe o senhorio na plenitude do exercicio dos direitos contratuais.


Custas pelo recorrente.


Lisboa, 13 de Julho de 1946

Miguel Crespo - Baptista da Silva - Oliveira Pires -
- Rocha Ferreira - Teixeira Direito - Baptista Rodrigues - F. Mendonça - Jose Coimbra - Magalhais Barros - Heitor Martins - Luiz Osorio - Pereira e Sousa.