Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
95/2000.L2.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: AZEVEDO RAMOS
Descritores: TERRAÇO DE COBERTURA
OBRAS
INOVAÇÕES
Data do Acordão: 06/01/2010
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: CJASTJ, ANO XVIII, TOMO III/2010, P.99
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Doutrina: - Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 2ª ed, págs. 139 e 143.
- Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2ª ed, pág. 434.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 566.º, N.º 1, IN FINE, E 829.º, N.º 2, 1420.º, N.º1, 1421.º, N.º1, AL. B), 1422.º, N.ºS 2, AL. A), E 3, 1425.º, Nº 1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 456.º, Nº 2, ALÍNEAS A) E B), 655.º, Nº 1, 722.º, N.º 2, 729.º .
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
- DE 17-3-94, BOL. 435-816;
- DE 4-10-95, BOL. 450-492;
- DE 25-5-00, COL. VIII, 2º, 80;
- DE 19-2-08, COL. AC. S.T.J., XVI, 1º, 114.
Sumário : I – O terraço de cobertura é parte comum do prédio, ainda que destinado ao uso exclusivo de qualquer fracção.
II – As inovações a que se refere o art. 1425, nº1, do C.C., respeitam às obras que são introduzidas nas partes comuns de um edifício em propriedade horizontal.
III – No conceito de inovação tanto cabem as alterações introduzidas na substância ou forma da coisa, como as modificações estabelecidas na sua afectação ou destino.
IV – As obras que alteram a linha arquitectónica e aumentam o volume da construção e a área de uma fracção autónoma de um edifício em regime de propriedade horizontal, realizadas no terraço desse prédio, não podem deixar de ser legalmente qualificadas como inovações.
V- A sanção correspondente à realização das referidas obras ilegais é a destruição delas .
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


Em 26-9-00, AA – Sociedade Imobiliária, L.da, instaurou a presente acção ordinária contra a ré BB, Sociedade de Gestão Imobiliária, SA, alegando, em resumo:
É dona da fracção designada pela letra “O” ( … andar esquerdo) de um prédio sito na Avenida …, nº …, em Lisboa, que se encontra em regime de propriedade horizontal desde 1970.
Por sua vez, a ré é dona da fracção designada pela letra “P” ( 7º andar recuado) do mesmo prédio.
Anexo à fracção da ré, existia um terraço que era de uso exclusivo desta, embora parte comum do prédio.
Em 1997, a ré procedeu a obras e fez avançar a fracção em toda a área do terraço, aumentando a área daquela.
As obras são ilegais, por não terem sido licenciadas pela Câmara Municipal e porque não foram respeitadas as regras da propriedade horizontal, já que a assembleia de condóminos não reuniu para dar autorização para as efectuar e sempre seria necessária a unanimidade nas deliberações que envolvam inovações nas partes comuns do edifício e prive os condóminos de as utilizar.
Com as obras, a ré alterou a linha arquitectónica do edifício e modificou-o estética e volumetricamente, tendo resultado da construção uma nova obra para efeitos do disposto no art. 1422, nº2, al. a) do C.C.
Conclui pedindo:
a) - seja a Ré condenada a ver declaradas ilegais as obras levadas a cabo no terraço do prédio sito na Avenida …, em Lisboa, em virtude de contrariarem as regras da propriedade horizontal e não terem sido licenciadas pela Câmara Municipal de Lisboa;
b) – se condene a ré a proceder à sua demolição, restituindo o prédio à sua situação anterior.

Citada, a Ré contestou, deduzindo a excepção da caducidade do direito de pedir a anulação da deliberação da assembleia de condóminos de 1990, por já terem decorrido os prazos para impugnar tal deliberação.
Além disso, refere que, quando adquiriu a sua fracção, em 7 de Fevereiro de 1997, já o terraço se encontrava fechado.
Em 1997, fez obras na sua fracção, mas solicitou autorização à assembleia e limitou-se a alterar a caixilharia que já existia no terraço, não havendo verdadeira alteração da sua estrutura.
Tal alteração ocorreu, efectivamente, em 1990, tendo, então, o anterior proprietário da mesma fracção solicitado, em assembleia de condóminos, que lhe fosse permitido fechar o terraço com alumínio e telhado, alteração que foi aprovada por unanimidade.
A autora sabia que o terraço já estava fechado e era utilizado pela ré.

Houve réplica.

Realizado o julgamento e apurados os factos, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

Apelou a autora e a Relação de Lisboa, através do seu Acórdão de 12-11-09, concedendo provimento à apelação, revogou a sentença recorrida e decidiu:

- Julgar a acção procedente e, consequentemente, condenar a ré a demolir as obras inovatórias realizadas em 1997 (entendendo-se como tal aquelas que permitiram à fracção “ P ” ocupar a quase totalidade do terraço), devendo repor o mesmo terraço no estado em que estava antes da referida obra.
- Condenar a ré, como litigante de má fé, na multa de 30 unidades de conta e a pagar uma indemnização à autora, a liquidar nos termos do art. 457, nº2, do C.P.C., e que foi fixada no valor de 15.571,74 euros, por despacho de fls 789.

Agora, foi a ré que veio pedir revista, culminando as suas alegações em extensas e prolixas conclusões, que se podem resumir no seguinte:

1 – A recorrente discorda da alteração das respostas aos quesitos 1º, 2º, 6º e 10º.
2 – Com tal alteração, ficou a existir contradição entre os quesitos 1º e 2º e os quesitos 4º, 7º, 8º e 9º; quesito 6º e o quesito 5º e quesito 10º com os quesitos 4º, 5º e 9º.
3 – Desconhecendo-se se a ocupação do terraço foi efectuada pelo anterior proprietário, em 1990, ou pela ré, em 1997.
4 – Para além da contradição em que incorre a Relação, é manifesta a insuficiência da matéria de facto, pois a recorrente não consegue descortinar como o tribunal recorrido chegou à conclusão de que as obras efectuadas em 1997, pela recorrente, foram as que levaram à referida ampliação do terraço.
5 - Não se conhece a razão pela qual, no entendimento da Relação, as obras que (supostamente) foram efectuadas em 1990 não foram as que deram azo à ampliação da fracção.
6 – Não é demonstrado o raciocínio lógico-dedutivo que suportou a decisão de que ora se recorre, bem como não se indicaram os motivos pelos quais a versão da recorrente não convenceu.
7 – O Acórdão recorrido é nulo, por ser contraditório e por não dar a conhecer a razão porque optou por uma decisão contrária à defendida pela recorrente, nos termos do art. 668, nº1, al.c) e d) do C.P.C.
8 – A determinação de quem foi o infractor que procedeu à ampliação da fracção é imprescindível para o apuramento da responsabilidade na execução da obra.
9 – A Relação concluiu que, com a autorização dada em 1990, o anterior proprietário fez a obra, da qual resultou o terraço ficar fechado, com o aspecto de “marquise”.
10 – Concluindo também que, desde essa época, nunca mais houve obras.
11 – Violou a Relação o princípio do contraditório e o princípio da disponibilidade das partes, pois tais factos não são do conhecimento oficioso e têm que ser contraditados pelas partes, nos termos do art. 3º, nº3, do C.P.C.
12 – Não se provou que obras concretas foram feitas e por quem, nem em que data.
13 – Não se provando a natureza das obras, fica desde logo invalidada a sua natureza inovadora e a sua consequente demolição.
14 – Afastando-se a aplicação do disposto nos arts 1422, nº1, nº2, al. a), nº3 e nº4, e 1425, nº1, do C.C.
15 – Por fim, não logrou provar-se o dolo ou a negligência grave da recorrente, para que esta possa ser condenada como litigante de má fé.
16 – Ao impugnar a realização das obras que levaram à ampliação do terraço, a recorrente não violou o princípio da probidade, apenas se enquadrando no âmbito da discussão dos factos e do direito de defesa.
17 – Conclui pela declaração de nulidade do Acórdão e pela improcedência da acção.

A recorrida contra-alegou em defesa do julgado.

Corridos os vistos, cumpre decidir.

A Relação considerou provados os factos seguintes, após a alteração a que procedeu nas respostas aos quesitos 1º, 2º, 6º e 10º da base instrutória.

1. A A. é dona e possuidora da fracção autónoma designada pela letra "O", correspondente ao 6.° andar esquerdo do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Av. …, n.° ..,, em Lisboa, freguesia de S. Sebastião da Pedreira, descrito na 8.ª C.R. Predial de Lisboa sob a ficha ….

2. A R. é dona e possuidora da fracção autónoma designada pela letra "P", correspondente ao 7.° andar, recuado, do mesmo prédio.

3. A fracção da Ré é composta por oito assoalhadas, três casas de banho, cozinha, despensa, hall, arrecadação e um parque de estacionamento privativo na cave.

4. Anexo à fracção “P” existia um terraço com a área de cerca de 103 m2, constituído por uma placa, que servia de cobertura ao edifício.

5. O terraço é parte comum do prédio e de uso exclusivo da fracção “P ”.

6. Em 1997, a R. efectuou obras na sua fracção e no terraço.

7. Por carta de 24-4-97, os condóminos do prédio foram convocados para comparecerem em Assembleia Geral em 11-6-97, com a seguinte ordem de trabalhos:
“1- Apreciação, discussão e aprovação das contas de exercício de 1996.
2- Apresentação, discussão e eventual aprovação de orçamentos para a reparação da cobertura e empena.
3- Outros assuntos de interesse geral.
4-Recondução ou nomeação de administração.
5- Apreciação, discussão e aprovação do orçamento para 1997 ”.

8. Da acta dessa assembleia, conforme fls. 36 e segs., consta que o condómino do 7.° andar ( fracção “P”) solicitou à assembleia as alterações cujo projecto está anexo a esta acta, cuja autorização foi dada por todos os condóminos presentes.

9. O projecto de alterações não foi anexo à acta.

10. O anterior proprietário da fracção "O" enviou uma carta à administração, datada de 7-7-97, de que se mostra junta cópia de fls. 40 a 42, em que, designadamente, solicita o envio de cópia do projecto de alterações.

11. Em resposta, a administração do prédio enviou ao anterior proprietário da fracção "O" a carta de fls. 45, anexando cópia do projecto apresentado pela R..

12. O anterior proprietário da fracção "O" enviou uma carta à administração, datada de 23-7-97, de que se mostra junta cópia a fls. 48 e 49, em que, designadamente, alerta a administração do prédio para a circunstância de a R. se estar a apropriar, indevidamente, do terraço da cobertura do prédio.

13. A A. pediu a inclusão na ordem de trabalhos da assembleia geral extraordinária de 18-6-98, por carta de 28-5-98, de que se mostra junta cópia a fls. 54 e 55, de aprovação de medidas concretas relativamente às obras realizadas pela R.

14. O assunto foi discutido na assembleia de condóminos, tendo-se decidido levar a cabo uma vistoria e que a administração providenciasse a obtenção de orçamentos junto do gabinete de engenharia civil, no sentido de se efectuar uma peritagem ao edifício, de forma a avaliar a origem dos diversos danos e fissuras existentes no mesmo e interpelar a R. a colocar a cobertura do prédio no estado em que se encontrava antes das obras realizadas (acta de que se mostra junta cópia de fls. 59 a 61).

15. O LNEC apresentou o orçamento de fls. 62 e 63.

16. Na assembleia geral de condóminos de 7-6-99, apenas a A. votou a favor da adjudicação do estudo do LNEC, tendo expressado a seguinte declaração de voto:
- uma vez que o condomínio não demonstrou interesse em saber com profundidade a origem das fissuras, reserva-se ao condomínio do 6. ° andar esq.°, recorrer às vias judiciais para a resolução dessa situação (doc. de que se mostra junta cópia de fls. 64 a 67).

17. O anterior proprietário emitiu e enviou à CC, Lda, carta datada de 21-4-1998, junta por cópia a fls. 51 e 52, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido.

18. As obras efectuadas pela ré no terraço traduziram-se na sua ocupação quase integral ( resp. ao quesito 1º).

19 . A fracção em causa avançou e ocupou quase toda a área do terraço ( resp. ao quesito 2º) .

20. As obras efectuadas no terraço não foram licenciadas pela Câmara Municipal de Lisboa ( resp. ao quesito 3º).

21. A ré procedeu a uma construção em cimento e tijolo ( resp. ao quesito 6º).

22. O anterior proprietário da fracção "P" solicitou, em assembleia de condóminos de 26-6-90, em que estiveram presentes todos os condóminos, que lhe fosse permitido fechar o terraço com alumínio e telhado ( resp. ao quesito 7º).

22. Essa permissão foi-lhe dada por unanimidade, conforme doc. de fls. 81 e 82 ( resp. ao quesito 8º).

23 – A linha arquitectónica do edifício foi alterada e também foi alterado o volume da construção com o aumento da área da fracção em causa ( resp. ao quesito 10º).

23. Por escritura de 28-1-98 (e documento a ela complementar), que constituiu a sociedade, ora A., DD, na qualidade de sócio, transmitiu para a A., o direito de propriedade sobre a fracção referida em 1).

24. Pela Ap.20.2.1997, foi registada na 9.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, a aquisição a favor da R., por compra, da fracção mencionada em 2).

Vejamos, agora, o mérito do recurso.

A recorrente começa por afirmar que existe contradição entre os quesitos 1º e 2º e os quesitos 4º, 7º, 8º e 9º, quesito 6º e o quesito 5º e quesito 10ª com os quesitos 4º, 5º e 9º.
Ora, o processo pode ter de baixar à 2ª instância, sempre que ocorram contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica do pleito - art. 729, nº3, do C.P.C.
Vejamos, pois, se ocorrem tais contradições.
Quanto à invocada contradição entre os quesitos 1º e 2º e os quesitos 4º 7º, 8º e 9º:
Antes de mais cumpre salientar que o quesito 9º, onde se perguntava se o terraço foi fechado em 1990, na sequência da deliberação de 26-6-90, não foi considerado provado, tendo apenas sido apurado o que consta dos quesitos 7º e 8º, ou seja, que o anterior proprietário da fracção “P” solicitou, em assembleia de 26-6-90, em que estiveram presentes todos os condóminos, que lhe fosse permitido fechar o terraço com alumínio e telhado, tendo-lhe essa permissão sido dada por unanimidade.
Todavia, analisando a acta da respectiva assembleia de condóminos de fls 81 e 82, constata-se que se tratou de uma proposta, em que o condómino da referida fracção (7º andar, recuado), propunha essa obra mediante o pagamento pelo condomínio do valor de 186.000$00, sendo a diferença suportada pelo condómino daquela fracção.
Por outro lado, o quesito 4º, onde se indagava se o terraço já se encontrava fechado em 7-2-97, também obteve resposta de “ não provado”.
Como é sabido, a resposta negativa a um quesito apenas significa não se ter provado o facto quesitado e não que se tenha demonstrado o facto contrário, tudo se passando como se aquele facto não tivesse sido articulado.
A resposta negativa a um quesito, precisamente porque afirma que nada da sua matéria se provou, não pode enfermar de qualquer vício.
Como não resultou provado que o terraço tivesse sido fechado em 1990, nem que já se encontrasse fechado em 1997, são compatíveis as respostas aos quesitos 1º e 2º, por um lado, e 7º e 8º por outro lado.
Pela mesma razão, as respostas aos quesitos 5º e 6º também se conciliam entre si, na medida em que só a resposta ao quesito 6º foi positiva (onde se perguntava se a ré procedeu a uma construção em cimento e tijolo), tendo o quesito 5º merecido resposta de “não provado”(onde se indagava se as obras efectuadas pela ré, em 1997, consistiram na colocação de nova caixilharia, de cor branca, sendo a anterior de cor cinzenta).
Finalmente, também não existe qualquer contradição entre a resposta ao quesito 10º (donde resulta provado que a linha arquitectónica do edifício foi alterada e também foi alterado o volume da construção com o aumento da área da fracção em causa), face à resposta positiva ao quesito 6º, por um lado, e às respostas negativas aos quesitos 4º, 5º, e 9º, por outro.

A recorrente também discorda da alteração das respostas aos quesitos 1º, 2º, 6º e 10º da base instrutória, a que a Relação procedeu, insurgindo-se contra o julgamento da respectiva matéria de facto efectuado pela Relação.
No entanto, neste domínio e como decorre do art. 722, nº2, do C.P.C., cabe referir que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não podem ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, casos que aqui não ocorrem.
Porque se não trata de qualquer situação de prova vinculada, a apreciação das provas é livre, segundo a prudente convicção formada sobre cada facto- art. 655, nº1, do C.P.C.
A Relação procedeu à análise crítica da prova produzida sobre a matéria de facto impugnada e, na sua prudente convicção formada, decidiu alterar as respostas aos quesitos 1º, 2º, 6º e 10º.
O Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, limita-se em princípio, a aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido – art. 729, nº1, do C.P.C.
Não pode exercer censura sobre o julgamento da matéria de facto, quando a prova é de livre apreciação, como é o caso – art. 729, nº2.

O Acórdão recorrido não padece de qualquer das nulidades que lhe são apontadas, pois encontra-se suficientemente fundamentado e não há contradição entre os fundamentos e a decisão.
Ao contrário do que a recorrente afirma nas conclusões da revista, não é verdade que a Relação tivesse concluído que foi o anterior proprietário da fracção “P” quem procedeu às obras e fechou o terraço, com o aspecto de “marquise”, ao abrigo da autorização dada pela assembleia de condóminos, realizada em 26-6-90.
Nem tão pouco que nunca mais houve outras obras no terraço, desde esse ano de1990.
Com efeito, o que se provou foi antes que foi a ré quem procedeu às obras em questão no dito terraço, no ano de 1997, e que tais obras consistiram numa construção em cimento e tijolo, traduzindo-se na ocupação quase integral do terraço, de tal modo que a fracção em causa avançou e ocupou quase toda a área do mesmo terraço, tendo a linha arquitectónica do edifício ficado alterada e sendo também alterado o volume da construção com o aumento da área da ajuizada fracção “P”.
Tal matéria foi objecto de discussão entre as partes, desde os articulados e ao longo de todo o processo.
Não se mostra violado o princípio do contraditório (art. 3, nº3, do C.P.C.), nem o princípio da disponibilidade das partes, pois os factos invocados pela autora, na petição inicial, puderam ser contraditados com toda a largueza.

Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício – art. 1420, nº1, do C.C.
O terraço de cobertura é parte comum do prédio, ainda que destinado ao uso exclusivo de qualquer fracção, como acontece no caso presente – art. 1421, nº1, al. b) do C.C.
É especialmente vedado aos condóminos prejudicar, com obras novas, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício – art. 1422, nº2, al. a).
As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético podem ser realizadas se para tal se obtiver autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio - art. 1422, nº3.
Por sua vez, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria de condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio – art. 1425, nº1.
As inovações a que este preceito se refere respeitam às que são introduzidas nas partes comuns de um edifício em propriedade horizontal, não sendo aplicável às inovações introduzidas nas fracções pertença exclusiva dos condóminos.
Ora, as obras em questão, que nem sequer foram licenciadas pela Câmara Municipal de Lisboa, devem ser qualificadas como inovações, que prejudicam a linha arquitectónica do prédio, tal como foi julgado pela Relação.
As inovações em partes comuns dirigem-se ao melhoramento ou ao uso mais cómodo ou ao melhor rendimento da coisa comum ( Ac. S.T.J. de 4-10-95, Bol. 450-492),
No conceito de inovação, que corresponde ao pensamento do citado art. 1425 do C.C., tanto cabem as alterações introduzidas na substância ou forma da coisa, como as modificações estabelecidas na sua afectação ou destino ( Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2ª ed, pág. 434; Aragão Seia, Propriedade Horizontal, 2ª ed, pág. 139) .
Atenta a natureza das obras acima descrita, já vimos que tais obras não podem deixar de ser legalmente qualificadas como inovações, que alteram a linha arquitectónica e aumentam o volume da construção e a área da fracção autónoma “P”.
Como se vê pela leitura da acta de 11 de Junho de 1997 (fls 36 a 39), estiveram presentes na assembleia de condóminos que autorizou as obras a realizar pela ré, os representantes das fracções do 1º Dtº, 2º Esq, 3º Dtº, 4ºEsq, 5ºEsq e 7º andar, representando uma percentagem que é muito inferior aos 2/3 do valor total do prédio exigido pelos preceitos atrás citados.
A sanção correspondente à realização das referidas obras ilegais é a destruição delas, isto é, a reconstituição natural que não pode ser substituída por indemnização em dinheiro, ao abrigo do princípio da equidade estabelecido no art. 566, nº1, in fine,, e 829, nº2, ambos do C.C., porque este princípio só vale para o não cumprimento das obrigações em geral e não para a violação do estatuto real do condomínio, em que estão em jogo regras de interesse e ordem pública atinentes à organização da propriedade, que bolem com os interesses de todos os condóminos do prédio ( Aragão Seia, Obra citada, pág. 143; Ac. S.T.J. de 19-2-08, Col. Ac. S.T.J., XVI, 1º, 114; Ac. S.T. de 25-5-00, Col. VIII, 2º, 80; Ac. S.T.J. de 4-10-95, Bol. 450-492; Ac. S.T.J. de 17-3-94, Bol. 435-816).

A recorrente também se insurge contra a condenação por litigância de , pugnando pelo afastamento dos pressupostos da aplicação do art. 456 do C.P.C.,
Todavia, não pede a redução dos valores que foram fixados para a multa e para a indemnização estabelecidas, nem suscita qualquer questão sobre a responsabilidade pelo seu pagamento, pelo que destas matérias não cumpre aqui conhecer.
Ora, a Relação condenou a ré como litigante de má fé, por considerar que esta deduziu oposição cuja falta de fundamento não poderia ignorar, por ter alterado a verdade dos factos e ter feito do processo um uso manifestamente reprovável, visando um objectivo ilegal.
Nos termos do art. 456, nº2, do C.P.C., diz-se litigante de má fé, para além do mais, quem, com dolo ou negligência grave:
a) – tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar ;
b) – tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa.
A ré vem defendendo, desde os articulados que as obras do terraço foram feitas em 1990, tendo sido o anterior proprietário que o fechou, em alumínio, com o aspecto de “marquise”, e que ela apenas procedeu à substituição da caixilharia em alumínio, que era de cor cinzenta e passou a ser branca.
Tal versão não se provou, tendo antes resultado provado que foi a ré quem procedeu a obras no dito terraço, no ano de 1997, e que tais obras consistiram numa construção em cimento e tijolo, traduzindo-se na ocupação quase integral do terraço, de tal modo que a fracção em causa avançou e ocupou a quase totalidade do mesmo terraço, tendo a linha arquitectónica do edifício ficado alterada e sendo também alterado o volume da construção com o aumento da área da questionada fracção “P”.
Porque se trata de facto praticado pela ré, em 1997, é patente, face aos factos provados, que deduziu oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar e que alterou conscientemente a verdade dos factos.
Justifica-se, pois, a condenação por litigância de má fé, nos termos dos art. 456, nº2, al. a) e b) do C.P.C.

Termos em que negam a revista.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 1 de Junho de 2010

Azevedo Ramos (Relator)
Silva Salazar
Nuno Cameira