Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
614/06.5TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: SILVA SALAZAR
Descritores: ADVOGADO
MANDATÁRIO
OBRIGAÇÕES DE MEIOS E DE RESULTADO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
OMISSÃO
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
PERDA DE CHANCE
Data do Acordão: 05/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / CUMPRIMENTO E NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES / FALTA DE CUMPRIMENTO IMPUTÁVEL AO DEVEDOR / CONTRATOS EM ESPECIAL / MANDATO.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - ESTATUTOS PROFISSIONAIS / ADVOGADOS.
Doutrina:
- Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal da Responsabilidade Extracontratual.
- Carneiro da Frada, Direito Civil, Responsabilidade Civil, Método do Caso.
- Júlio Gomes, in Direito e Justiça, Vol. XIX, 2002, II.
- Paulo Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual, I, 1103.
- Sinde Monteiro, Responsabilidade por Conselhos …, Almedina, 1989.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 483.º, N.º1, 798.º, 799.º, 1157.º.
ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS, APROVADO PELO DEC. – LEI N.º 84/84, DE 16 DE MARÇO, QUER O ACTUAL, APROVADO PELA LEI N.º 15/2005, DE 16 DE JANEIRO.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 29/04/2010; DE 26/10/2010; DE 01/07/2014; DE 30/09/2014.
Sumário :
I - Enquanto mandatário forense, compete ao advogado a defesa dos interesses legítimos dos seus clientes, o estudo zeloso do problema jurídico em vista à solução de que foi incumbido, utilizando todos os recursos da sua experiência, saber e atividade profissional, com a autonomia própria da respetiva natureza técnica e a imperativa observância dos rígidos deveres decorrentes do Estatuto da Ordem dos Advogados.

II - A sua obrigação é, porém, uma obrigação de meios: somente se obriga a desenvolver, no âmbito dos específicos conhecimentos que adquiriu, uma atividade ou conduta caracterizada por uma diligência mais rigorosa do que a que se exige a um cidadão médio, direcionada ao resultado final de satisfação do interesse do seu cliente, mas sem assegurar que o mesmo se produza, dada a falibilidade e imprevisibilidade da prova e até a frequente divergência de opiniões jurídicas.

III - A perda de chance deve ser considerada como um dano atual, autónomo, consubstanciado numa frustração irremediável (dano), por ato ou omissão de terceiro, de verificação de obtenção de uma vantagem que probabilisticamente era altamente razoável supor que fosse atingida, ou na verificação de uma desvantagem que razoavelmente seria de supor não ocorrer, não fosse essa omissão (nexo causal).

IV - Para haver indemnização, o dano da perda de oportunidade de ganhar uma ação não pode ser desligado de uma consistente e séria probabilidade de a vencer: não basta invocar a omissão da obrigação de instaurar ação de despejo, com base em fundamento conhecido há mais de um ano, que teve como consequência impedir a sua procedência, por caducidade; impõe-se, ainda, alegar e provar que, sem essa omissão, os factos fundamento resultariam provados, tendo ser muito elevada a probabilidade de vencer a ação omitida.
Decisão Texto Integral:

               Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

            

AA e mulher, BB, instauraram em 23/01/2006 ação com processo ordinário contra CC e “DD e Associados, Sociedade de Advogados, RL”, invocando, em resumo:

               Os AA. foram patrocinados pelo 1º R., Dr. CC, num processo de partilhas judiciais no âmbito do qual lhes foi adjudicado, em 2002, um prédio urbano sito na Rua … e Largo …, em Chaves.

            No rés-do-chão desse prédio existiam três lojas arrendadas para o comércio, sendo que quando visitaram o edifício, em Setembro de 2002, verificaram os AA., pela primeira vez, que os arrendatários das três lojas haviam cometido vários abusos e ilegalidades os quais configuravam fundamento para a resolução do contrato de arrendamento pelo senhorio e consequente despejo.

              Procuraram o Dr. CC para analisar os casos no sentido de serem movidas ações de despejo aos arrendatários, tendo o A. feito notar que apenas o despejo lhe interessava. 0 Dr. CC indicou-lhes vários elementos de que necessitava para avançar com os processos e esclareceu a existência do prazo de um ano para a entrada das ações em Tribunal a partir da data em que os AA. tinham tomado conhecimento das infrações cometidas.

              O Dr. CC comunicara-lhes anteriormente a sua integração na sociedade de advogados “DD e Associados, Sociedade de Advogados”.

               Em 25/11/2002, o A. entregou ao R. todos os elementos que este referira e em 30/12/2002 a 2ª R., através do 1º R. e na qualidade de mandatário dos AA., enviou uma carta a cada um dos três inquilinos.

               Em 24/01/2003, o Dr. CC comunicou por escrito aos AA. ir avançar com as ações de despejo.

               Passado mais de um ano sem notícias o A. insistiu por saber do estado daquelas ações de despejo, sendo que no início de Maio de 2004 vieram a saber que não haviam dado entrada no Tribunal, quando há muito havia sido ultrapassado o prazo de um ano para tal.

               Os AA. perderam a hipótese de invocar com êxito os factos fundamento de resolução dos contratos de arrendamento, tanto mais que o 1º R. enviara aos inquilinos previamente uma carta denunciando as situações.

              Devido à omissão dos RR., os AA. não podem almejar o despejo dos locados com a entrega do imóvel devoluto, como pretendiam, com o que o valor do imóvel seria muito superior.

              O prejuízo causado na esfera patrimonial dos AA. corresponde à diferença entre o valor do imóvel para ser transacionado como livre e disponível e o valor do imóvel para ser transacionado com os arrendamentos existentes e respetivas rendas antigas – ou seja, a diferença entre € 610.850,00 e € 365.000,00, o que corresponde a € 246.800,00.

              Por outro lado, a quebra de confiança, a frustração de expectativas, as preocupações e incómodos causados aos autores pelos réus, constituem um dano não patrimonial, reputando os AA. como adequado, equilibrado e proporcional uma compensação no valor de € 7.500,00 relativamente a cada um deles.

              Acresce que a omissão dos RR. causou aos AA. humilhação, uma vez que quando se deslocavam a Chaves os arrendatários riam-se e diziam piadas alusivas à situação, sentindo-se os AA. inibidos de visitar e passear em Chaves, reputando o valor de € 5.000,00 a favor de cada um deles como valor equilibrado à compensação de tais danos não patrimoniais.  

  Pediram os AA. a condenação dos RR. no pagamento de €246.800,00 e de € 26.000,00 respetivamente a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, e juros contados desde a citação ate integral pagamento.

  O R. CC, na contestação que apresentou, impugnou factualidade articulada pelos AA., apresentando outra versão dos factos, e salientou que, baseando-se os AA. na violação pelo R. do dever contido na alínea d) do art.º 83º do EOA, não invocaram todos os elementos integradores da responsabilidade civil extracontratual, além do que não alegaram que era previsível que obtivessem "ganho de causa".

  Esclareceu, designadamente, que em Janeiro de 2003 comunicou ao A. que iria dar início à preparação das minutas das petições iniciais, o que fez, mas, como veio a público a intenção do Governo de rever o regime do Arrendamento Urbano, aconselhou o A. a aguardar a publicação deste para intentar a ação num quadro mais favorável aos seus interesses, tudo isto tendo em conta que o risco de exigir o despejo com fundamento nas obras realizadas sempre existiria porque as mesmas tinham sido realizadas há vários anos, algumas com o consentimento do anterior senhorio, sendo que pelo menos desde 15-11-2001 o A, tinha perfeito conhecimento das obras realizadas - dos "abusos" e "ilegalidades" cometidos.

   O A. aceitou a sugestão do R. e não lhe deu instruções para intentar as acções de despejo. O R. sugeriu ao A. que as acções fossem intentadas por um advogado de Chaves e o A. concordou com tal sugestão.

   Os AA. não subscreveram procurações a favor do R. ou de qualquer outro advogado da sociedade R. em ordem à propositura das ações nem entregaram provisão para o efeito.

   Invocou o R. a litigância de má fé dos AA. e deduziu pedido reconvencional, sustentando que ao proporem a presente acção os AA. visam destruir a reputação do R. e obter um enriquecimento sem justa causa, sendo que os factos descritos na petição atingiram a honra e dignidade do R. e afectaram a sua atividade como advogado, tudo lhe causando profundo desgosto e revolta, concluindo pela sua absolvição do pedido e pela condenação dos AA. a pagarem-lhe uma indemnização não inferior a 50.000,00 €.

   Requereu, ainda, o R. a intervenção principal provocada da Companhia de Seguros EE (Europe) para intervir nos autos como sua associada, atento o contrato de seguro com ela celebrado e uma vez que na eventualidade da sua condenação o R. teria direito de regresso.

  A 2a R. apresentou também contestação, na qual invocou a excepção dilatória da sua ilegitimidade para os termos da presente causa e impugnou matéria de facto invocada pelos AA. Referiu, essencialmente, que o 1º R. não é nem nunca foi seu sócio, não tendo ela nem qualquer dos seus sócios sido alguma vez mandatada pelos AA., pelo que a nenhum título pode ser responsabilizada,

  Concluiu pela sua absolvição da instância e, se assim se não entender, pela sua absolvição do pedido.

  O incidente de intervenção principal provocada foi julgado procedente e a chamada EE (Europe) Ltd. foi citada para contestar, o que fez, concluindo pela sua absolvição e dos demais RR. do pedido.

  Os AA. replicaram, rebatendo matéria de exceção, pedindo a rejeição  da reconvenção, a improcedência do pedido de condenação por litigância de má fé contra eles deduzido, e a condenação da 2ª ré a pagar-lhes a quantia de € 2.000,00 a título de indemnização por litigância de má fé.

  Na audiência preliminar foi liminarmente indeferido o pedido reconvencional deduzido pelo 1º R. contra os AA. E, em despacho saneador, foi julgada improcedente a exceção da ilegitimidade passiva invocada pela R. “DD e Associados, Sociedade de Advogados, RL”, tendo também sido então enumerada a matéria de facto desde logo dada por assente e elaborada a base instrutória.

 O 1o R. apresentou articulado superveniente, alegando em resumo que chegara entretanto ao seu conhecimento que os AA., em Fevereiro de 2005, patrocinados pelo Dr. FF, apresentaram no Tribunal Judicial de Chaves ações contra GG, HH e mulher, e herdeiros de II, visando obter o despejo das lojas referidas na petição inicial; que tais ações terminaram, respectivamente, as duas primeiras por transação, tendo as rendas sido atualizadas, e a terceira por sentença que julgou a ação improcedente.

  Concluiu uma vez mais pela improcedência da ação, pedindo a condenação dos AA. como litigantes de má fé a indemnizá-lo em valor não interior a 50.000,00 €.

  Tendo falecido a A. em 6 de Fevereiro de 2011, teve lugar incidente de habilitação de herdeiros, sendo julgados habilitados para ocuparem nos autos a posição processual que inicialmente fora daquela o co-autor AA, JJ, KK, LL, e MM.

  Oportunamente teve lugar audiência de discussão e julgamento, tendo sido decidida a matéria de facto sujeita a instrução, após o que foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu os RR. dos pedidos contra eles formulados, julgando, ainda, não haver lugar à condenação de qualquer das partes como litigante de má fé.

  Apelou o A./habilitado JJ.

             Contra alegaram os réus CC e “DD & Associados”, afirmando aquele pretender a ampliação do âmbito do recurso, em resumo, nos seguintes termos:

              “B. Tendo o apelado decaído no pedido de condenação dos apelantes em litigância de má fé e havendo a sentença recorrida julgado incorretamente determinados pontos da matéria de facto constantes da Base Instrutória, requer o apelado, ao abrigo do disposto nos nºs. 1 e 2 do art.º 636º do CPC, a ampliação do âmbito do recurso, pretendendo que o Tribunal de recurso conheça do aludido pedido e da resposta dada pelo Tribunal a quo aos quesitos 47º, 79º e 80º.”

             Na Relação foi proferido em 30 de Outubro de 2014 acórdão que julgou a apelação improcedente, decidiu por isso não conhecer da pretensão subsidiária do apelado, e confirmou a sentença ali recorrida.

            Desse acórdão interpôs o apelante a presente revista, formulando, em alegações, as seguintes conclusões:

           I - Por causa da conduta dos RR., perderam os AA. a possibilidade de invocar com êxito os factos que fundamentavam a resolução dos contratos de arrendamento com vista ao despejo dos locados, ao abrigo das alíneas b) e d) do n.º 1 do Art.º 64° do R.A.U., por falta de exercício legal no prazo de um ano.

              Por causa da omissão do Réu, os AA. apenas podiam almejar à reposição do imóvel no estado inicial e não já ao despejo dos locados com a entrega do imóvel devoluto de pessoas e bens, como pretendiam.

              II.        Os factos constantes das cartas enviadas pelo 1º R. aos inquilinos dos AA,, integravam fundamento legal para a resolução dos contratos de arrendamento por parte do senhorio, pelo que a invocação atempada dos mesmos traduzia-se numa viabilidade razoável e séria de procedência da pretensão.

              Por conseguinte, a procedência das referidas ações ao serem instauradas após o prazo de um ano ficou irremediavelmente comprometida.

           E só assim não seria, se os arrendatários não tivessem contestado ou não tivessem alegado o decurso do prazo de um ano, após a tomada de conhecimento dos factos que fundamentavam o pedido, mas todos os inquilinos - RR. nas referidas ações - (cfr. certidão judiciai junta aos autos de fls. 833 a 910) - apresentaram contestação e todos invocaram a caducidade do direito à resolução do contrato por ter sido ultrapassado aquele prazo legal, contado, pelo menos, desde o envio da carta pelos Advogados dos AA., ora RR.

             Não fora o incumprimento contratual dos RR., os interesses dos AA. teriam elevada probabilidade de vencimento.

             III. A omissão do 1º Réu foi qualificada na sentença como grave violação do dever contratual que sobre si impendia e que era o de instaurar, em representação dos autores, na qualidade de mandatário judicial, as ações de despejo contra os inquilinos das lojas do r/c do identificado prédio de Chaves (pág. 35).

            Por conseguinte, verificaram-se os pressupostos da responsabilidade civil, nos termos do Art.º 83°, n.º 1, al. d), do EOA, conjugado com o disposto no Art.º 483° do CC; o facto voluntário e culposo do advogado com a violação dos deveres deontológicos, o dano e a ocorrência de nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano.

            Resultou provado que o 1º Réu é sócio contratado da Sociedade Ré, tendo esta cobrado e recebido honorários pelos serviços prestados por aquele aos AA.

            Devendo, por conseguinte, responder solidariamente pelos prejuízos decorrentes dos atos praticados ou omitidos pelo Advogado R., nos termos do n.º 2 do Art.º 20º do Decreto-Lei n.º 513-Q/79, de 26 de Dezembro.

               IV. Por causa do decurso daquele prazo, os AA. perderam a possibilidade de invocar com êxito os factos que fundamentavam a resolução do contrato, dando lugar ao consequente despejo das lojas. Ocorreu efetivamente a caducidade do direito dos AA. de acionar os inquilinos.

            Os AA., que pretendiam desde início o despejo dos locados, e não a mera reposição do locado no estado iniciai ou a atualização das rendas, não obtiveram o efeito pretendido por causa da omissão do R.

           Em termos de "causalidade adequada" tal como prevista no citado art.º 563°, pode ter-se como assente que, se o réu tivesse oportunamente instaurado as ações, era bastante provável que da sua apreciação peio tribunal teria resultado a procedência dos pedidos formulados.

             Verificando-se o nexo de casualidade adequada entre a omissão ilícita e culposa do réu e a não resolução dos contratos de arrendamento e a falta do consequente despejo.

           V. Citando o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 31-05-2011, no Proc. 851/04.7BBG.P1.SI, que pode ser consultado in www.dgsi.pt, pode afirmar-se o seguinte:

a) No âmbito da responsabilidade civil, a culpa - como nexo de imputação subjetiva do facto ao agente - traduz-se numa conduta deste que, quando não intencional (dolosa), é omissiva de um comportamento que integre uma atuação cuidada.

b) Há, em suma, um comportamento errado por incompetência, imperícia ou falta de observância de regras técnicas,

c) Mas o nexo de imputação deve ser apreciado em concreto (casuisticamente) tomando como referência/padrão a postura do "bonus pater famliae" se colocado perante o mesmo circunstancialismo fáctico.

d) O mesmo nexo psicológico é de presumir, "ex vi” do artigo 488º do Código Civil, não tendo o lesado de provar a voluntariedade do ato ou a imputabilidade do agente.

e) O dano é um requisito da responsabilidade civil conetado com o ilícito sendo o "genus" (dano em sentido lato) constituído pela "species" (prejuízos ou danos em sentido estrito) caracterizado pela deterioração ou perda de bens jurídicos (patrimoniais ou não) da esfera jurídica do lesado.

f) Os danos patrimoniais desdobram-se em positivos (ou emergentes) e frustrados (ou lucros cessantes).

g) O fim do dever de indemnizar, a cargo do lesante, é, no dano patrimonial, criar uma situação que se aproxime o mais possível da que o lesado provavelmente teria se não ocorresse o facto danoso.

h) No dano não patrimonial a dogmática é diferente, buscando-se não uma indemnização estribada na teoria da diferença mas uma compensação que permita ao lesado "esquecer" a ofensa sofrida através do aceno a atividades lúdicas ou de lazer.

i) A teoria da diferença que aponta para o conceito abstrato (objetivo) de dano considera que a reparação perfeita é em espécie ('in natura") ou de reintegração, tendo a indemnização em dinheiro carácter subsidiário, por haver conversão da obrigação de reparar em obrigação pecuniária.

j) Tal conversão só é permitida - na ausência de acordo das partes - quando a restauração natural é impossível (impossibilidade material, que não económica ou jurídica) ou excessivamente onerosa (o que seria atentatório da boa fé) para o lesante,

k) Neste caso, é o lesante que terá de alegar a excessiva onerosidade, sendo que a primeira situação deve ser alegada pelo lesado, pelo lesante, ou conhecida "ex officio" se o facto for patente.

I) Se a “reconstitutio in integrum" oferecida pelo lesante ao lesado não cobre todos os prejuízos patrimoniais em que o dano se desdobra, ou o faz deficientemente, este pode recusar a reparação operando-se a conversão em obrigação pecuniária.

m) O instituto da "compensatio lucri cum damno" não está, clara e expressamente, consagrado no Código Civil, antes resultando do n.º 2 "in fine” do artigo 566º, como fundamento adjuvante para se dar por assente a aceitação da teoria da diferença, em sede de indemnização.

n) Tem como requisitos a unidade do dano e os prejuízos e a vantagem serem o resultado do mesmo evento.

o) Não representa um limite à indemnização mas um critério do cálculo informador desta.

          VI. Por outro lado, traduzindo-se o dano na perda de uma certa probabilidade de ganhar a ação, deve entender-se que tal perda é indemnizável, independentemente da dificuldade de quantificação dessa probabilidade e classificação do dano - emergente, lucro cessante, presente ou futuro -, sendo o respetivo montante indemnizatório determinado, na falta de outros elementos, segundo juízos de equidade (art.º 566°, n.º 3, do Código Civil).

          VII. No caso concreto mostrando-se violados deveres resultantes do contrato na exata medida em que, como resultou provado, é aplicável o instituto da responsabilidade contratual precisamente porque tal responsabilidade decorre, como vimos, da violação do dever jurídico referente ao contrato de mandato celebrado entre as partes, abrangendo essa responsabilidade o dano da perda de oportunidade ou de chance.

        Verificou-se inequivocamente a perda irreversível de obter o despejo.

           O que se alcançou com as ações judiciais instauradas contra os inquilinos, foi a mera consequência daquela impossibilidade.

          A probabilidade de ganho era séria e real, e frustrou-se pela omissão do Réu.

       Por causa da omissão do Réu, os AA. não tinham como defender-se da alegação de caducidade deduzida pelos arrendatários, que já estavam patrocinados por Advogado, quando responderam às cartas enviadas peio 1° Réu.

           E, ainda que o Advogado não tivesse essa obrigação de ganho e de resultado, tinha era o dever de zelar pelos interesses do representado, atuando com diligência e cuidado.

        A omissão do Advogado condicionou necessariamente e em definitivo as decisões e opções dos AA., quanto ao desfecho daquelas ações.

            O que deve ser indemnizado.

        VIII. Para apoio da posição do Recorrente, convoca-se o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 30-09-2014 no Proc. n.º 739/09.5TVLSB.L2-A.DS1, in www.dgsi.pt

            Assim, ao não ter justamente condenado os RR. a ressarcir os Autores, o douto Acórdão, violou os artigos 483°, 562°, 563°, 564°, nºs. 1 e 2, e 566°, nºs. 1 e 3, e bem assim do 798° do Cód. Civil.

            Em contra alegações separadas, ambos os réus pugnaram pela negação da revista.

            Colhidos os vistos legais, cabe decidir, tendo em conta que os factos dados por provados pelas instâncias são os seguintes: 

           1º - Os autores foram patrocinados pelo 1° réu num  processo de partilhas  judiciais, quando o mesmo tinha escritório na Avenida …, …, …°, …, Lisboa (A);

           2º - Em Janeiro de 2002, o Dr. CC fizera comunicar aos autores a sua integração na Sociedade de Advogados "DD & Associados, com escritório na Rua …, …, em Lisboa (B);

3º - A Sociedade de Advogados "DD &
Associados'", foi objeto de fusão com a Sociedade de Advogados "CC & Associados”, passando a adotar a denominação "DD & Associados" – (C);

4º - A Ordem dos Advogados celebrou com a interveniente EE o acordo de seguro titulado pela apólice …, com as condições particulares e gerais constantes de fls. 344 a 363 - (D);

            5º - A 2a ré celebrou com a seguradora NN, S.A., o acordo de seguro titulado pela apólice …, com as condições particulares e gerais constantes de fls. 402 e seguintes – (E);

           6º - a) Pela Ap. ..., foi inscrita na Conservatória do Registo Predial de Chaves a aquisição a favor de OO e da falecida autora BB, então casada com AA segundo o regime da comunhão geral de bens, em comum e sem determinação de parte ou direito, por sucessão hereditária de PP, do prédio urbano composto de cave, rés do chão, 1° e 2º andares, sito na Rua da …, em Chaves, descrito naquela Conservatória sob o n.º …, e inscrito na matriz predial respetiva sob o art.º ...º;

b) No processo de inventário que correu termos no 4º Juízo Cível do Tribunal de Cascais sob o n.º 320/1997, para partilha das heranças abertas na sequência dos óbitos de QQ e de PP, homologada por sentença de 18 de Junho de 2001, foi adjudicada à falecida autora BB a parte que pertencia a OO no "prédio";

c) No dia 21 de Março de 1985, entre OO, como primeiro outorgante, por si e na qualidade de procurador da falecida autora BB e marido, AA, e RR e HH, como segundos outorgantes, foi realizado o acordo escrito cuja cópia certificada se encontra a fls. 1194 a 1196 e do qual consta, além do mais, o seguinte:

«Pelo primeiro outorgante foi dito:

Que ele e os seus representados são comproprietários de um prédio composto de rés do chão, cave, primeiro e segundo andares, sito na Rua da …, em Chaves, que confina do norte com rua da ..., de sul e nascente com via pública e de poente com ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Chaves, sob o artigo novecentos e noventa e três.

Que, pela presente escritura, dá de arrendamento aos segundos outorgantes o rés do chão centro e cave do mencionado prédio, nos termos constantes dos artigos seguintes:

1° - O local arrendado destina-se ao exercício do comércio de salsicharia, podendo, no entanto, destinar-se a qualquer outra atividade comercial, permitida por lei.

(...)

4° - Os inquilinos poderão efetuar no local arrendado as obras necessárias para o exercício da sua atividade comercial, desde que tais obras não façam perigar a solidez do edifício»;

d) No dia 13 de Outubro de 1983, entre OO, como primeiro outorgante, por si e na qualidade de procurador da falecida autora BB e marido, AA, e II, como segundo outorgante, foi realizado o acordo escrito cuja cópia certificada se encontra a fls. 1718 a 1721 e do qual consta, além do mais, o seguinte;

«Pelos outorgantes e na qualidade em que outorgam foi dito:

Que, o primeiro e seus representados são comproprietários do prédio urbano, com rés do chão e cave, primeiro e segundo andares, sito no Bairro da ..., nesta cidade de Chaves, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, sob o artigo novecentos e noventa e três, que confronta do norte, nascente e sul com a Rua da ... e a poente com o ....

Que no rés do chão esquerdo e cave do mencionado prédio, se vem, de há muitos anos a esta parte, exercendo a atividade comercial, como é do conhecimento público e, sobretudo, por expressamente tal se declarar na Certidão da Repartição de Finanças do Concelho de Chaves (...).

Que quem atualmente, e de há anos a esta parte, em tal rés do chão e cave exerce a atividade comercial, é o segundo outorgante, pelo que entre este e o primeiro outorgante e seus representados foi acordado o seguinte:

1° - Formalizar, através do presente ato, a situação do arrendatário, com o implícito reconhecimento dos direitos e deveres que de tal qualidade resultam.

(…)

5o - O arrendamento destina-se ao exercício de todo e qualquer ramo da atividade comercial, tendo apenas como limite a oposição legal ou outra qualquer que possa concorrer para a degradação do prédio»;

e) O documento de fls. 1731 contém, além de outros, os seguintes dizeres:

«Participação nos termos do art.º 39º da Lei 2.030, de 22 de Junho de 1948, e § único do art.º 69º do Regulamento do Imposto de Selo:

Ex.º Sr. Chefe da Secção de Finanças do Concelho de Chaves

O abaixo assinado QQ (…) participa a V.ª Ex.ª, de conformidade com o disposto no art.º 39º da Lei n.º 2.030 e § único do art.º 69º do Regulamento do Imposto do Selo em vigor, que há mais de 5 anos deu de arrendamento por contrato verbal a SS, morador em Chaves (…), o R/chão direito do seu prédio situado na Rua ..., da freguesia de Chaves, o qual se encontra inscrito na matriz sob o art.º ...º”.

            f) Em Setembro de 2002, o autor AA deslocou-se ao “prédio”, altura em que pela primeira vez constatou pessoalmente que:

            1. no rés-do-chão centro e cave referidos em c), destinado a loja e onde era explorado um estabelecimento comercial denominado “...”, o inquilino tinha realizado as seguintes obras:

            1.1 - remoção do pavimento de madeira em soalho da loja e colocação de novo pavimento em betão;

            1.2 - abertura no pavimento da loja de um alçapão para acesso ao piso inferior, ou seja, à cave do edifício;

            1.3 - demolição de paredes interiores na cave do edifício;

            1.4 - construção de uma porta de acesso da parte da cave do edifício, situada sob a loja, ao hall da entrada traseira do “prédio”;

            2. no rés-do-chão direito referido em e), destinado a loja e onde era explorado um estabelecimento comercial denominado “N.”, o inquilino realizou as seguintes obras:

            2.1 - construção de uma cozinha equipada com frigorífico, lava - loiça, fogão e máquina de lavar;

            2.2 - construção de uma casa de banho com sanita, lavatório e poliban;

           2.3 - instalação de tubagens de água e gás no interior das paredes e no chão da loja;

            2.4 - revestimento em azulejos das paredes e do chão da casa de banho;

            3. no rés do chão direito referido em d), destinado a loja e onde era explorado um estabelecimento comercial denominado “B.”, o inquilino realizou as seguintes obras:

            3.1 - construção de paredes divisórias interiores;

            3.2 - construção de uma escadaria de acesso a parte da cave do edifício situada sob a loja;

            3.3 - instalação de tubagens e canalizações;

            3.4 - remoção do pavimento do soalho em madeira e colocação de novo pavimento em betão;

            3.5 - construção de paredes em tijolo na cave;

            3.6 - tapagem de uma porta de acesso da cave a outras zonas do edifício;

            3.7 - tapagem de uma janela na cave do edifício;

            3.8 - impermeabilização com cimento do piso de terra da cave referida em 3.2;

            3.9 - demolição de uma parede na cave e abertura de uma porta de acesso à parte restante do edifício;

            g) as demolições referidas em f) 1.3:

           1. fizeram ruir dois dos compartimentos do edifício situados ao nível intermédio deste e sobre o rés do chão onde se situa a loja identificada em f) 1.;

           2. determinaram a ruína de parte das escadas interiores do edifício;

           3. implicaram a remoção das paredes que serviam de único apoio aos ditos compartimentos e escadas do edifício;

            h) o inquilino da loja referida em f) 1.:

            1. depositou o entulho da obras referidas em f) 1.1 a 1.4. numa zona da cave do edifício pertença dos senhorios, tornando aí impraticável a circulação de pessoas ou a utilização da mesma pelos senhorios;

           2. e noutra zona da cave pertença dos senhorios e não arrendada, instalou um sistema de arrefecimento de câmara frigorífica - (1° a 11°);

           7 - Em Outubro de 2002, o autor AA contactou o 1º réu, na sequência do que ocorreu uma reunião entre ambos nas instalações da 2ª ré, na qual o primeiro descreveu a situação a que se reportam as als. f) a h) de 6. da fundamentação de facto, para que o segundo, na qualidade de advogado, a analisasse com vista à eventual instauração de ações de despejo contra os inquilinos das lojas identificadas em 1. a 3. da referida al. f) - (12° e 13°);

            8 - 0 1º réu, depois de analisar:

            a) a situação descrita em f) a h) de 6. da fundamentação de facto; e

            b) os documentos cujas cópias constam de fls. 154 a 184, os quais, mediante solicitação sua, o autor AA recolheu em Chaves e lhe entregou em Novembro de 2002, no decurso de uma outra reunião ocorrida entre ambos nas instalações da 2ª ré, predispôs-se a patrocinar os autores em ações de despejo a instaurar contra os inquilinos das lojas identificadas em f) 1. a 3. de 6. da fundamentação de facto, tendo, em 30 de Dezembro de 2002, com o timbre de “DD Associados Sociedade de Advogados, Rua …, … – …º - … (…)”  enviado:

             i) a HH, “...”, Rua …, …, a carta cuja cópia se encontra a fls. 47/48, da qual consta, além do mais, o seguinte:

             «Exmo. Senhor.

Foi-nos conferida procuração pelos nossos clientes Senhor Eng.º AA e mulher, proprietários da loja utilizada por V. Exa., no sentido de propor a competente ação de despejo.

Na verdade verifica-se que;

1º - Foram executadas diversas obras sem autorização dos senhorios e sem  licenciamento camarário.

2º - Tendo com estas obras causado graves danos na estrutura do edifício fazendo ruir 2 compartimentos de nível intermédio que serviam de arrecadações do proprietário e uma parte de umas escadas pela falta de apoio de paredes que toram demolidas total ou parcialmente. Um dos compartimentos, o inferior, ruiu totalmente com os objetos que lá se encontravam e o que se encontrava por cima deste quase a cair e ainda mantém lá algum mobiliário e outros objetos.

            3º - Com as destruições feitas, criou ainda acesso direto à parte habitacional do proprietário através de um hall de entrada nas traseiras, com acesso às escadas.

           4º - O arrendatário além de destruir o piso de madeira e o substituir por piso de betão, abriu um alçapão (neste tal piso a cota inferior), que fechou com uma portinhola de ferro, a qual, com uso de escadote, lhe permite o acesso à cave do proprietário, e bem assim à parte habitacional deste através de escadas que dão acesso a uma das portas de saída para a rua secundária.

Com o entulho do que foi destruído nas obras encheu parcialmente a cave até quase meia altura desta, tornando praticamente impossível a circulação de pessoas nesta e portanto o acesso a uma boa parte da cave, toda ela do proprietário.

Tais factos constituem fundamento para resolução do arrendamento pelo senhorio e consequente despejo, de acordo com o artigo 64º, n.º 1, alíneas b), d), do R.A.U.

Isto sem prejuízo da obrigação de demolir tudo quanto foi ilegalmente construído e de indemnizar os meus clientes pelos prejuízos causados, obrigação essa que, naturalmente, recai sobre V. Exa.

Como julgamos de boa norma, vimos por este meio solicitar a entrega voluntária da loja de que V. Exa. é arrendatário, no prazo máximo de 30 dias.

De contrário, ver-nos-emos forçados a instaurar a competente ação judicial.

Aguardando que nos informe do que entender por conveniente sobre o assunto, subscrevemo-nos,

Atentamente,

CC»;

ii) «Aos herdeiros de II - "B.", Rua …, …», a carta cuja cópia se encontra a fls., 49/50, da qual consta, além do mais, o seguinte:

Exmos. Senhores.

Foi-nos conferida procuração pelos nossos clientes Senhor Eng.º AA e mulher, proprietários da loja arrendada ao Sr. II, no sentido de propor a competente ação de despejo.

Na verdade, verifica-se que foram executadas diversas obras sem autorização dos senhorios e sem licença camarária.

Ora, tendo as referidas obras alterado a estrutura do edifício, designadamente pela substituição do pavimento em madeira por placa de betão, é mais que evidente que, nos termos da lei, as mesmas não poderiam ser executadas sem o acordo dos senhorios e sem licença da Câmara Municipal de Chaves.

Por outro lado, igualmente foram realizadas obras estruturais na cave do edifício, da mesma forma à revelia dos proprietários do mesmo e sem qualquer licença camarária. E destas obras resultou, para além do mais, a ampliação do espaço inicialmente arrendado e o inadmissível acesso à parte habitacional do edifício.

Tais factos, constituem fundamento para resolução do arrendamento pelo senhorio e consequente despejo, de acordo com o artigo 64°, n.º 1, alíneas d) do RAU.      

Isto sem prejuízo da obrigação de demolir tudo quanto foi construído e de indemnizar os meus clientes pelos prejuízos sofridos.

Acresce que o arrendatário primitivo faleceu no dia 3 de Setembro de 2002, sendo que a loja locada não está a ser explorada pelos sucessores, mas antes por dois genros, o que é fundamento de despejo nos termos da alínea f) do referido artigo.

Como julgamos de boa norma, vimos por este meio solicitar a entrega voluntária da loja em causa, no prazo máximo de 30 dias.

De contrário, ver-nos-emos forçados a instaurar a competente ação judicial.

Aguardando que nos informem do que entenderem por conveniente sobre o assunto, subscrevemo-nos,

Atentamente,

CC»;

iii) a «GG, "N.", Rua …, …», a carta cuja cópia se encontra a fls. 51/52, da qual consta, além do mais, o seguinte:

“Exmo. Senhor.

Foi-nos conferida procuração pelos nossos clientes Senhor Eng.º AA e mulher, proprietários da loja utilizada por V. Exa., no sentido de propor a competente ação de despejo.

Na verdade verifica-se que:

1. Foram executadas diversas obras sem autorização dos senhorios e sem licença camarária, situação tanto ou mais grave e ilegal quanto é certo que parte dessas obras corresponderam à instalação de redes de saneamento (esgotos) na cave do edifício, ou seja, numa zona que não está arrendada a V. Ex.ª, e na qual tão pouco deveria ter entrado sem o acordo dos meus clientes;

           2. A loja está a ser utilizada como armazém para depósito de materiais não relacionados com a atividade comercial a que o arrendamento se destina, bem corno para fins habitacionais, alheios ao mesmo arrendamento.

           Tais factos, constituem fundamento para resolução do contrato de arrendamento pelo senhorio e consequente despejo, de acordo com o artigo 64°, n.º 1, alíneas b), d) do RAU.

           Isto sem prejuízo da obrigação de demolir tudo quanto foi construído, obrigação essa que naturalmente recai sobre V. Exa.

           Como julgamos de boa norma, vimos por este meio solicitar a entrega voluntária da loja de que V. Exa. é arrendatário, no prazo máximo de 30 dias.

           De contrário, ver-nos-emos forçados a instaurar a competente ação judicial.

           Aguardando que nos informe do que entender por conveniente sobre o assunto, subscrevemo-nos,

           Atentamente,

           CC>> - (14° a 22°);

            9 - Com data de 24 de Janeiro de 2003 e com o timbre de DD Associados Sociedade de Advogados, o 1° réu remeteu ao autor AA a carta cuja cópia se encontra a fls. 53, da qual consta, além do mais, o seguinte:

            “Assunto: Ações de despejo.

           Exmo. Senhor

           Junto remeto para conhecimento de V. Ex.ª cópia das cartas enviadas pelo advogado dos inquilinos das lojas de que é proprietário.

           Devido ao teor das mesmas vou avançar com as ações de despejo.

Com os melhores cumprimentos, CC» - (23º);

10 - Ao receber do 1o réu a carta transcrita em 9 da fundamentação de facto, o autor AA ficou convencido que aquele intentaria as ações de despejo dentro de um ano a contar da data referida em f) de 6. da fundamentação de facto – (24o);

11 - a) no dia 19 de Março de 2004, o autor AA enviou ao 1o réu o email cuja cópia se encontra a fls. 537, do qual consta, além do mais, o seguinte;

«Exmo. Sr. Doutor CC

Passado mais de um ano sobre a carta em que o Sr. Dr. me informou ir avançar com as ações de despejo dos 3 lojistas da minha casa da ..., em Chaves, muito agradecia que me informasse da situação atual.

Estou ao seu dispor caso entenda mais conveniente termos uma reunião no seu escritório.

Fico a aguardar as suas notícias.

(…);

b) no dia 13 de Abril de 2004,  o autor enviou ao 1º réu o e-mail cuja cópia se encontra a fls. 538, do qual consta, além do mais, o seguinte:

<<Exmo. Sr. Doutor CC (...)

Tenciono deslocar-me no próximo fim de semana a Chaves, pelo que venho manifestar-lhe de novo o meu interesse em conhecer a situação atual das Ações de Despejo das 3 lojas da casa da ..., em Chaves.

Há ainda um outro assunto de Chaves sobre o qual gostaria de o consultar.

           Aproveito a oportunidade para pedir que de futuro fosse utilizado o meu novo endereço de e-mail. (…)”;

           c) no dia 3 de Maio de 2004, o autor AA enviou ao 1º réu o e-mail cuja cópia se encontra a fls. 539, do qual consta, além do mais, o seguinte:

           «Exmo. Sr. Doutor CC

           Como lhe disse na nossa conversa telefónica de há uns dias, estive em Chaves e transmiti pessoalmente ao Sr. Dr. FF, advogado que me está a tratar de uma questão em Chaves, a nossa conversa, e ele imediatamente se pôs à sua disposição para colaborar no que o Sr. Dr. entender necessário neste caso do despejo das 3 lojas da casa da .... Aguardando os textos que o Sr. Dr. me informou ir-me enviar para qualquer eventual comentário, envio os melhores cumprimentos»;

           (...)» - (25°);

           12 - No dia 2 de Julho de 2004, o 1º réu enviou ao autor AA o e-mail cuja cópia se encontra a fls. 540, do qual consta, além do mais, o seguinte:

           «(...)

           Remeto em anexo as minutas das ações de despejo. Julgo que será de avançar com a propositura das ações uma vez que, na atual conjuntura política, não creio que haja condições para aprovação do novo Regime do Arrendamento Urbano (RAU) nos tempos mais próximos, pelo que não se justifica manter por mais tempo este assunto em suspenso. 0 novo RAU, conforme oportunamente lhe transmiti, iria simplificar grandemente as ações de despejo, em benefício dos proprietários, pelo que entendi que valeria a pena aguardar a sua entrada em vigor e, após esta, intentar os processos contra os inquilinos da Casa da .... Hoje, face aos recentes acontecimentos que determinaram a queda do atual Governo, penso de maneira diferente, conforme acima deixei dito.

           Gostaria, igualmente, de lhe transmitir o seguinte (penso já ter abordado com o Sr. Engenheiro esta questão, mas não estou certo que assim tenha acontecido): os factos que fundamentam o pedido de despejo ocorreram há vários anos, pelo que é de admitir que os inquilinos venham invocar que prescreveu o direito à resolução do contrato de arrendamento uma vez que a lei prevê que as ações devem ser postas no prazo de um ano a contar da data em que o senhorio teve conhecimento de tais factos, não relevando para este efeito as transmissões de propriedade que, entretanto, se tenham operado; se os inquilinos invocarem tal argumento haverá que alegar que se trata de factos continuados que perduram no tempo, já que a lei igualmente estabelece que, nestes casos, não se aplica o dito prazo de um ano;

 por outro lado algumas das obras realizadas terão sido autorizadas, pelo menos em parte, pelo cunhado do Sr. Engenheiro.

           De tudo isto resulta que as ações em causa comportam alguns riscos não se podendo afirmar que o seu êxito esteja assegurado. No entanto, tal corno lhe disse desde o início, julgo que vale a pena arriscar até porque na pendência do processo sempre será possível tentar um acordo que, a troco da desistência do pedido de despejo e do reconhecimento dos atuais inquilinos, obtenha urna atualização das rendas a favor dos senhorios.

           Gostaria, por último, de colocar à sua consideração o seguinte: Conforme tive oportunidade de transmitir ao Sr. Engenheiro, uma vez que as ações irão correr em Chaves, não poderei acompanhar diretamente estes processos e estar regularmente, como se costuma dizer, em cima da respetiva evolução, realizando todas as diligências necessárias. Assim, parecer-me-ia mais aconselhável que fosse um colega de Chaves a patrocinar diretamente estas ações e a elaborar a versão final das respetivas petições iniciais, sem prejuízo de, naturalmente, aproveitar as minutas que elaborei, caso o pretenda, e nelas introduzir as alterações que entenda convenientes após os comentários do Sr. Engenheiro.

          Tive urna longa conversa telefónica com o Dr. FF. Pareceu-me um colega sabedor e com bom senso. E está disponível para patrocinar as ações, caso o Sr. Engenheiro concorde.

          Assim, agradeço que me transmita as suas instruções urna vez que, caso esteja de acordo com esta sugestão, enviarei as referidas minutas para o Dr. FF bem como a demais documentação que tenho em meu poder (fotografias etc.). Obviamente que continuarei sempre disponível para qualquer apoio ou esclarecimento que seja necessário.

       

           Com estima e consideração, os meus cordiais cumprimentos.

           CC.

DD & Associados …» - (26° a 28°);

           13 - Na hipótese de os autores pretenderem vender o “prédio”, o preço que obteriam pela sua venda, no caso das lojas referidas em f) de 6. da fundamentação de facto se encontrarem desocupadas, seria superior ao que obteriam no caso de tais lojas estarem arrendadas - (29° e 30º);

          14 - 0 “prédio” tem vista para o ..., com o qual confina diretamente uma das suas paredes situada a poente, e está situado na zona histórica da cidade de Chaves:

           a) composta por edifícios de habitação com baixa cércea;

           b) densamente povoada;

           c) e com ruas estreitas - (31° a 33°);

          15 - 0 “prédio” apresenta a sua estrutura original com paredes resistentes em blocos de granito, soalhos com vigamento em madeira e reboco exterior em areia e cal - (35°);

           16 - Os 1º e 2° pisos do “prédio”, destinados a habitação, têm paredes interiores estucadas e pavimentos em soalho de madeira maciça - (36°);

           17 - Os pisos referidos em 16. têm, cada um deles, a área de 205 rn2 - (37°);

           18 - Em Novembro de 2001 ocorreu urna reunião entre o autor AA e o 1° réu, no escritório deste, então situado na Avenida …, em Lisboa - (46°);

           19 - Em resposta às cartas transcritas em 8., com datas de 23 de Janeiro de 2003, TT, advogado, enviou ao 1° réu:

           a) a carta cuja cópia se encontra a fls. 54, da qual consta, além do mais, o seguinte:

           “Assunto: Arrendamento S/s Clientes: Eng.º AA e esposa

Relativamente à carta que o Il. Colega enviou a GG "N.", venho dizer:

- A ligação ao saneamento, que era da responsabilidade do senhorio, foi autorizada por este já há alguns anos, e só resultou benefício para o prédio.

- Aliás, o estabelecimento encontra-se hoje como se encontrava em vida do anterior inquilino - pai do Sr. GG -.

- Tem aquecimento a gás já que o prédio se encontra em zona muito húmida junto ao ... -.

- Tem uma divisão que destina a sala de provas e onde seu pai descansava entre as 13H00 e as 15H00, quando já se encontrava muito doente no último ano da sua vida, o que era do conhecimento do então senhorio e que este sempre autorizou.

- Sempre utilizou o locado para o fim de comércio»;

b) a carta cuja cópia se encontra a fls. 55, da qual consta, além do mais, o seguinte:

«ASSUNTO: ARRENDAMENTO

S/s Clientes: Eng.º AA e esposa

Relativamente à carta que o Il. Colega enviou a II “B.”, em Chaves, venho dizer:

- Os locados são um baixo e cave.


- Tem declaração de autorização do senhorio de todas as obras que realizou, o que foi dito ao Sr. Eng.º JJ.

- Aliás, não podia ser de outra forma já que foram obras que tiveram de ser projetadas pois foram subsidiadas»;

 c) a carta cuja cópia se encontra a fls. 56, da qual consta, além do mais, o seguinte:

 «ASSUNTO: ARRENDAMENTO

S/s Clientes: Eng.º AA e esposa

Relativamente à carta que o Il. Colega enviou a HH "...", em Chaves, venho dizer:

- Não realizou as obras que o Colega refere.

- O estabelecimento já lhe foi cedido como se encontra.

- Já há alguns anos limitou-se a pintar o interior» - (63° e 64o):

 20           - Em 24 de Janeiro de 2003, com o timbre de DD Associados Sociedade de Advogados Rua … (,..}», o 1º réu enviou ao autor AA a carta cuja cópia se encontra a fls. 53, da qual consta, além do mais, o seguinte:

«Assunto: Ações de despejo

Exm.° Senhor,

junto remeto para conhecimento de V.ª Ex.ª cópia das cartas enviadas pelo advogado dos inquilinos das lojas de que é proprietário.

Devido ao teor das mesmas vou avançar com as ações de despejo.

(... )» - (65º).

21  - O 1° réu elaborou as minutas das petições iniciais de ações de despejo que se encontram a fls. 195 a 214 - (66º);

22 - Em resposta ao e-mail transcrito em 12. da fundamentação de facto, no dia 5 de Julho de 2004, o autor AA enviou ao 1° réu o e-mail cuja cópia se encontra a fls. 542, do qual consta, além do mais, o seguinte;

«Exm.º Sr. Dr. CC:

Refiro-me ao seu e-mail do passado dia 2 relativamente às ações de despejo de 3 lojas na casa da ... em Chaves. Recordo que o Sr. Dr. enviou cartas aos arrendatários em 30 de Dezembro de 2002 (pouco depois de eu ter tido conhecimento das situações após as partilhas judiciais, tendo eu tido a preocupação de obter rapidamente todos os elementos que me pediu por causa do prazo de um ano), recebeu as respostas do advogado do lado contrário em 31 de Dezembro de 2002 e, por carta de 24 de janeiro de 2003 (portanto há dezoito meses) informou-me que "Devido ao teor das mesmas vou avançar com as ações de despejo”. Fiquei ciente do que me diz no seu e-mail e estou de acordo em que o assunto passe a ser tratado pelo Sr. Dr. FF, aceitando a sua sugestão, e agradecendo-lhe envie toda a documentação com urgência» - (73°);

23 - Datada de 30 de Julho de 2004, e com o timbre de DD Associados Sociedade de Advogados Rua … Lisboa (...)», o 1° réu enviou ao Dr. FF, advogado, com escritório na Rua .., em Chaves, a carta cuja cópia se encontra a fls. 190, da qual consta, além do mais, que «na sequência dos nossos contactos remeto em anexo a documentação que me foi entregue pelo Sr. Eng.º MM, entre a qual se conta a caderneta predial do imóvel» e com ela remeteu àquele advogado os documentos referidos em b) da resposta aos quesitos 14° a 22° - (15o);

24             - Antes do envio da carta a que se alude em 23.:

a) o 1° réu estabeleceu um contacto telefónico com o seu colega Dr. FF, no âmbito do qual lhe disse que "as ações podiam ser propostas por estarem em causa factos continuados”, ao que este respondeu que não concordava com essa opinião e que seria ele a adotar a estratégia que se lhe afigurasse adequada;

b) no dia 29 de Julho de 2004, o 1o réu enviou ao Dr. FF o e-mail cuja cópia se encontra a fls. 193, do qual consta, além do mais, o seguinte:

«Caro Colega

Após ter contactado o Eng.º MM - e dele obtido o necessário acordo para que as ações em causa sejam postas e patrocinadas pelo colega - remeto, conforme o combinado, um primeiro draft das minutas das respetivas petições, como base de trabalho às alterações que o colega entenda por bem efetuar.

Os demais documentos seguem hoje por correio.

Aproveito para lhe dar conta uma questão que falámos ao telefone.

O cliente está consciente dos riscos que estas ações implicam, nomeadamente por via de uma eventual alegação de prescrição, atendendo a que os factos ocorreram há vários anos e não obstante se poder contra-alegar que se trata de factos continuados.

O meu entendimento - que transmiti ao cliente e com o qual ele concordou - vai no sentido de que vale a pena correr estes riscos. Se nada se fizer a situação manter-se-á inalterada com evidentes prejuízos para os clientes. E será sempre possível tentar um acordo, na pendência do processo, que se traduza em benefícios ambas as partes: aumento de renda para o senhorio; legalização das situações e dos contratos para os inquilinos. Por outro lado, sendo baixo o valor das rendas, baixo é o valor das ações e, consequentemente, não serão elevadas as custas a cargo do cliente, na hipótese de total insucesso. (...)

CC

 DD & Associados

Rua …(…) – 76º;

25 - 0 1° réu remeteu ao seu colega. Dr. FF, e ao autor AA, as minutas referidas em 21° da fundamentação de facto – (77º);

26 - a) nas cartas que em 30 de Dezembro de 2002 enviou a «HH, "...”, Rua …, …», aos «herdeiros de II - "B.", Rua …, …» e «GG, "N.”, transcritas em i) a iii) de 8., o 1º réu fez constar que “foi-nos conferida procuração pelos nossos clientes Senhor Eng.º AA e mulher, proprietários da loja utilizada por V. Ex.ª, no sentido de propor a competente ação de despejo”; 

            b) no dia 17 de Janeiro de 2004, a sociedade de advogados DD & Associados emitiu e enviou ao autor AA a fatura …, cuja cópia consta de fls. 543, da qual consta, além do mais, o seguinte:

             Descrição     

            Honorários pelos serviços de assessoria jurídica prestados respeitantes a:

             - Conferência com cliente;

             - Análise de contratos de arrendamento e demais documentos fornecidos pelo cliente;

             - Elaboração de cartas para inquilinos;

             Líquido: € 690,00;

             IVA – 19% - € 131,10;

             Total – € 821,10.

- (79° a 81°, 93°, 95° e 96°);

            27 - 0 advogado, Dr. FF, nunca contactou o 1º réu para lhe transmitir a sua opinião acerca das ações de despejo a instaurar por AA e mulher, contra os inquilinos das lojas do rés do chão do “prédio” ou discutir com o 1º réu os fundamentos de facto e de direito dessas ações - (84°);

            28 - 0 1° réu não é, nem nunca foi, sócio de capital ou de indústria da 2ª ré - (88°);

            29 - a) o n° 2 do artigo 4° do pacto social da 2ª ré tem a seguinte redação:

            «2. Pode haver advogados contratados pela sociedade, com estatuto interno equiparado a sócio, que não quinhoam nas perdas e lucros da sociedade, aos quais é atribuído o qualificativo de sócio contratado (“salary partner”), sendo estes, na data do presente pacto, os seguintes: UU, CC, VV»;

             b) o 1º réu sempre teve na 2ª ré o estatuto referido em a) - (89° a 91°);

 

            30 - A circunstância de o 1º réu exercer a sua atividade de advogado integrado na 2ª ré conforme descrito em 29., não teve influência na decisão do autor AA o contactar, nos termos referidos em 7. (92°);

            31 - Em 5 de Abril de 2006, no sítio da internet da 2ª ré, acessível através do endereço http://www.....pt, constavam como seus sócios: XX, ZZ, AAA, BBB, UU, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH, III, CC - (94°);

             32 - A inserção do nome do 1° réu no referido sítio da internet da 2ª ré, como sócio desta, destinou-se a promover o estatuto daquele enquanto advogado - (97°);

             33 - Em data não apurada posterior a 5 de Abril de 2006, o 1º réu passou a constar no referido sítio da internet da 2ª ré, como seu “sócio contratado” - (98°);

             34 - 0 autor AA contactou o 1º réu nos termos referidos em 7. da fundamentação de facto, por ter ficado agradado com os serviços que este anteriormente lhe havia prestado no âmbito do processo de inventário referido em b) de 6. da fundamentação de facto - (99°);

            35 - 0 1° réu só em 12 de Junho de 2009 é que tomou conhecimento das ações que, em 24 de Fevereiro de 2005, os autores, patrocinados pelo Dr. FF, apresentaram no Tribunal Judicial de Chaves e que se encontram documentadas nos termos das certidões de fls. 833 a 910 dos autos - (100°);

             36 - 0 Dr. FF instaurou tais ações aproveitando a estratégia que fora estudada pelo 1° réu – (101°);

             37 - (...) tendo utilizado grande parte dos factos constantes das minutas que o 1° réu lhe enviou - (102°).

            ***                                        ***                                        ***

             A questão a apreciar, face ao teor das conclusões das alegações do recorrente, consiste em saber se o 1º réu deve ser condenado a indemnizar o recorrente pelo facto de, como mandatário forense constituído pelos autores, não ter proposto as ações de despejo em causa no prazo de um ano a contar do conhecimento, por estes, dos factos fundamentadores da resolução dos respetivos contratos de arrendamento, assim originando a probabilidade de invocação vitoriosa de caducidade do direito de resolução pelos inquilinos e a consequente provável improcedência daquelas ações, com prejuízos consistentes no menor valor do prédio, enquanto arrendado, em relação à situação de devoluto em que ficaria se as ações de despejo tivessem êxito.

             Estamos no âmbito da responsabilidade civil de advogado, uma vez que o primeiro réu, nessa qualidade, havia sido contratado como mandatário forense pelos autores para efeito de instauração das aludidas três ações de despejo contra os inquilinos de um prédio àqueles pertencente, pelo que, nomeadamente à luz do disposto no art.º 1157º do Cód. Civil, regulador do mandato em geral, lhe competia, com autonomia própria da natureza técnica dessa atividade mas com observância dos rígidos deveres impostos pelo Estatuto da Ordem dos Advogados, quer o vigente à data dos factos aqui em causa, aprovado pelo Dec. – Lei n.º 84/84, de 16 de Março, quer o atual, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 16 de Janeiro, a defesa dos interesses legítimos dos seus clientes, estudando e tratando com zelo o problema jurídico de cuja solução estes o tinham incumbido com a sua aceitação, utilizando para o efeito todos os recursos da sua experiência, saber e atividade profissional. Não resulta daqui que a obrigação do mandatário forense seja uma obrigação de resultado, ou de garantia, pois não lhe é imposta a produção de um determinado resultado final satisfatório para o seu cliente mesmo sendo este o resultado por este pretendido: a obrigação do advogado enquanto mandatário forense é apenas uma obrigação de meios, pois somente se obriga a desenvolver, no âmbito dos específicos conhecimentos que adquiriu para poder dedicar-se ao exercício de tão meritória profissão, uma atividade ou conduta caraterizada por uma diligência mais rigorosa do que a que se exige em qualquer atividade a um cidadão médio, direcionada ao resultado final de satisfação do interesse do seu cliente, mas sem assegurar que o mesmo se produza, dada a falibilidade e imprevisibilidade da prova e até a frequente divergência de opiniões jurídicas quanto à subsunção legal de determinados factos.    

            Por outro lado, embora se entenda que, mesmo para com o cliente, possam coexistir ambos os tipos de responsabilidade civil (contratual e aquiliana), na dependência do facto ilícito imputado, que se pode traduzir no incumprimento de alguma cláusula do mandato forense ou em violação de algum outro dever ou normativo legal não integrado no contrato de mandato, na situação dos autos o que está em causa é precisamente saber se o 1º réu, como mandatário forense dos autores, não atuou com o zelo que se lhe impunha no cumprimento da obrigação que perante aqueles assumira por força do contrato com eles celebrado no sentido de instaurar as ações de despejo em condições de estas poderem ser decididas a seu favor, daí lhes resultando danos, pelo que se entende encontrarmo-nos no âmbito da responsabilidade civil contratual, havendo assim que verificar se concorrem os respetivos pressupostos.

             Encontramo-nos precisamente, a existir incumprimento culposo, pelo 1º réu, do contrato de mandato forense celebrado entre ele e os autores, numa hipótese de responsabilidade contratual regulada no art.º 798º do Cód. Civil, na qual, assim como na responsabilidade extracontratual, são cinco os pressupostos da obrigação de indemnização: o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano (art.º 483º, n.º 1), sendo que na responsabilidade contratual a culpa se presume (art.º 799º).

            O ilícito contratual invocado é constituído, neste caso, pela omissão do dever de zelo exigível ao réu, como mandatário forense dos autores, por não ter instaurado as ações destinadas à obtenção dos despejos dentro do prazo de um ano a contar da data do conhecimento, pelos autores, dos factos que referem como fundamento da resolução dos contratos de arrendamento então em causa. E dos factos provados resultam precisamente a prática, pelo 1º réu, do facto (omissão de propositura das ações de despejo), a ilicitude (falta de observância das obrigações que lhe eram impostas pelo contrato de mandato forense), e a culpa (que, como se disse, se presume, não tendo o réu conseguido afastar a respetiva presunção).

            Em causa estão, portanto, apenas o dano e o nexo de causalidade entre ele, se existir, e o facto.       

           A sentença da 1ª instância considerou não ser aplicável, na hipótese dos autos, a doutrina da perda de chance, dizendo expressamente que “a presente ação, tal como a petição inicial se encontra estruturada e considerando os pedidos nela formulados, nomeadamente aquele a que agora nos reportamos, em que se invoca e pede o prejuízo final, não é uma ação de indemnização com fundamento em perda de chance”.

            O acórdão recorrido, por sua vez, entendeu que a questão se coloca precisamente no âmbito da perda de chance, uma vez que os autores também querem fazer valer a indemnização referente à oportunidade perdida, pois, se é certo que o pedido por eles formulado é o de condenação dos réus no pagamento de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, apelam para a viabilidade razoável e séria de procedência da pretensão dos vários despejos com a obtenção para si da vantagem de o prédio ficar devoluto e portanto com maior valor, e um comportamento ilícito e culposo do 1º réu, que afastou a oportunidade de o pretendido resultado se vir a produzir. Com efeito, invocam os autores que, por causa da conduta dos réus, perderam a possibilidade de invocar com êxito os factos que, a seu ver, fundamentavam a resolução dos contratos de arrendamento com vista ao despejo dos locados, por falta de exercício legal no prazo de um ano, pelo que ocorreu caducidade, quando, se instauradas as ações em tempo, era bastante provável a sua procedência, o que nos remete precisamente para a doutrina da perda de chance. E, nas conclusões da presente revista, consideram que o dano se traduziu precisamente na perda de uma certa probabilidade de ganhar a ação.  

             Como aponta o acórdão deste Supremo de 30/09/2014 (relator o Exmo. Conselheiro Mário Mendes), há já uma parte significativa da nossa jurisprudência e doutrina recentes que admite a possibilidade legal de a indemnização por responsabilidade civil contratual ou extracontratual abranger o dano traduzido na perda de probabilidade (perda de chance) de obtenção de uma futura vantagem, resultante da interposição de uma conduta omissiva de um terceiro que dessa forma a afastou, considerando essa mesma perda um dano autónomo. Para alguma jurisprudência deste Supremo Tribunal, a probabilidade atual, e não meramente futura, da obtenção dessa vantagem, e a frustração da mesma determinada por ato ou omissão de terceiro, pode constituir só por si um bem digno de proteção jurídica.

            Exemplo dessa jurisprudência, - que aliás nos parece a mais correta, tanto mais que, como naquele acórdão se diz, “a flexibilização do conceito de dano que vem sendo desenvolvida de forma a permitir uma maior aproximação da aplicação do direito às realidades atuais conduz ou deve conduzir a que a chance ou oportunidade perdida seja merecedora da tutela do direito, sendo que na responsabilidade contratual não se poderá pôr em causa a relevância jurídica da violação das chances que constituem objeto da prestação debitória, sobretudo quando tal violação elimine de forma definitiva a produção do resultado querido e fortemente expetável” -, é o acórdão de 01/07/2014, relatado pelo Exmo. Conselheiro Fonseca Ramos, que refere que a figura da perda de chance se relaciona com a circunstância de alguém ser afetado num seu direito de conseguir uma vantagem futura ou de impedir um dano por ato de terceiro, nele se concluindo que não devem assimilar-se os planos do dano e da causalidade com implicação na perspetiva de excluir como dano autónomo a perda de chance, visando-se dessa forma indemnizar não a perda do resultado querido mas antes a da oportunidade perdida como um direito em si mesmo violado por uma conduta que pode ser omissiva ou comissiva. Igualmente o acórdão de 29/04/2010, relatado pelo Exmo. Conselheiro Sebastião Póvoas, admitia a relevância da perda de chance como dano autónomo indemnizável, referindo que a perda de chance se não confunde com a perda de expectativa, uma vez que aqui há uma esperança de um direito, por se ter percorrido um caminho que a ele conduziria com forte probabilidade.

            Sinde Monteiro, por sua vez, sustentava in “Responsabilidade por Conselhos …”, Almedina, 1989, que nada no nosso sistema parecia opor-se ao caráter indemnizável da perda de chance. E, embora Júlio Gomes (Direito e Justiça, Vol. XIX, 2002, II), e Paulo Mota Pinto (Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual, I, 1103), entendam que, entre nós, a perda de uma chance não terá, em geral, virtualidades para fundamentar uma pretensão indemnizatória por falta de base jurídico-positiva para a apoiar, já Armando Braga (A Reparação do Dano Corporal da Responsabilidade Extracontratual) e Carneiro da Frada (Direito Civil, Responsabilidade Civil, Método do Caso), citados, como aqueles, no acórdão deste Supremo de 26/10/2010, relatado pelo Exmo. Conselheiro Azevedo Ramos, sustentam que o dano da perda de chance tem sido classificado como dano presente, como realidade atual e não futura embora consistindo na perda de probabilidade de obter uma futura vantagem, admitindo ou sugerindo que se trata, em si, de um bem jurídico digno de tutela, devendo o respetivo quantum indemnizatório ser calculado em atenção ao valor da oportunidade perdida, ou seja, das probabilidades de o lesado obter o benefício que poderia resultar do aproveitamento da chance, e não do benefício esperado, se bem que, perante a dificuldade, ou mesmo impossibilidade, de determinar o valor exato dos danos, haja que recorrer a critérios de equidade, sempre na base do grau de probabilidade de obtenção da vantagem pretendida.     

          Entende-se, assim, com o dito acórdão de 30/09/2014, que a perda de chance deve ser considerada como um dano atual, autónomo, consubstanciado numa frustração irremediável, por ato ou omissão de terceiro, de verificação de obtenção de uma vantagem que probabilisticamente era altamente razoável supor que fosse atingida, ou na verificação de uma desvantagem que razoavelmente seria de supor não ocorrer não fosse essa omissão; pelo que as regras gerais da responsabilidade civil (especialmente quanto à existência de dano e respetivo nexo causal) estarão absolutamente preenchidas quando e a partir do momento em que se entenda a frustração irreparável da chance como um verdadeiro e autónomo dano certo consequente a um ato ou omissão de terceiro. Ponto é que se mostre demonstrada, como matéria de facto da exclusiva competência das instâncias, a causalidade, no aspeto naturalístico, entre a conduta, no caso omissiva, e a perda de chance de altamente provável vencimento.

              Importa, assim, na hipótese dos autos, determinar se os autores dispunham, pela tempestiva interposição das ações de despejo com base nos factos que invocam como fundamento das mesmas, uma forte probabilidade de procedência de tais ações, forte probabilidade essa de que tenham ficado irremediavelmente privados por força da omissão do réu e sendo esse o dano indemnizável, que os autores computam por referência à vantagem futura que terão ficado impedidos de alcançar.

              É de crer como seguro que, decorrido mais de um ano sobre o conhecimento dos factos que, no entender dos autores, eram fundamento de resolução dos contratos de arrendamento, o ou os advogados dos arrendatários, se as correspondentes ações fossem instauradas, invocassem a caducidade do direito de pedir a respetiva resolução, pelo que a omissão do aqui réu teve indubitavelmente como consequência impedir a procedência daquelas ações com base em tais factos. Mas tal não basta para que se possa afirmar a existência da probabilidade séria do vencimento dessas ações se não fosse aquela omissão, pois necessário se torna que, sem essa omissão, os aludidos factos fundamento das mesmas resultassem provados como ilicitamente praticados pelos arrendatários, e tivessem a consequência legal de pôr termo aos contratos por vontade do senhorio. Isto porque o dano da perda de oportunidade de ganhar uma ação não pode ser desligado de uma consistente probabilidade de a vencer, isto é, para haver indemnização a probabilidade de vencer a ação omitida teria de ser muito elevada.

             Ora, as ações de despejo em causa viriam mais tarde a ser propostas por advogado distinto do 1º réu, o Dr. FF (em 24/02/2005), que para o efeito as instaurou aproveitando a estratégia que fora estudada por aquele, tendo utilizado grande parte dos factos constantes das minutas que o mesmo 1o R. lhe enviou, sendo por isso previsível que a defesa que nessas ações foi apresentada seria idêntica se tivessem sido propostas pelo réu.

Acresce, ainda, que de acordo com as certidões referidas no ponto 35º dos Factos Provados;

- Na ação intentada pelos AA. contra JJJ e outros
(referente ao estabelecimento comercial «B.) fundamentaram-se os AA. em obras não autorizadas pelo senhorio, que alteraram substancialmente a estrutura do edifício e a disposição interna das suas divisões, causando deteriorações consideráveis, e na utilização do locado por terceiros, também sem autorização.

Os RR, contestaram afirmando, por um lado, que as obras haviam sido devidamente autorizadas pelo antecessor dos autores, - verificando-se assim um facto impeditivo do efeito jurídico pretendido pelos autores -, e que, de qualquer modo, os AA., que adquiriram a totalidade do prédio em Julho de 2002, tiveram delas conhecimento em finais de 2002, pelo que o direito à resolução sempre teria caducado; por outro, que as pessoas referidas na p.i. trabalham no estabelecimento na qualidade de «caixa de balcão», e não como subarrendatários, cessionários ou comodatários.

Na sentença, datada de 3 de janeiro de 2007, considerou-se que aquelas pessoas trabalhavam no estabelecimento na qualidade de «caixa de balcão, que os RR. foram autorizados pelo senhorio a proceder à realização das obras, facto impeditivo do direito invocado pelos AA., e que, mesmo que assim não tosse, os AA. tomaram conhecimento das obras em finais de 2002, pelo que seria de ter em conta a exceção da caducidade.

Deste modo, a ação que veio, efetivamente, a ser intentada, improcedeu, desde logo porque ali se provou que as obras haviam sido autorizadas, só como argumento secundário – “ainda que assim não fosse" - sendo apreciada a caducidade.

Nesta parte, pois, não se pode dizer que, se não tivesse sido cometida pelo réu a apontada omissão, a sentença viesse a ser a da procedência da ação, pois, existindo autorização do senhorio anterior para a realização das obras, estas não poderiam ser fundamento de resolução do contrato. Por isso, inexiste a elevada e séria probabilidade de vencimento da ação integrante de dano indemnizável de perda de chance.

- Na ação que os AA. intentaram contra HH e III (referente ao estabelecimento comercial ...), os AA. fundamentaram-se na realização, pelos RR., de obras não autorizadas pelo senhorio, que alteraram substancialmente a estrutura do edifício e a disposição interna das suas divisões, causando deteriorações consideráveis, colocando em risco a solidez do edifício e potenciando a sua ruína.

Os RR. contestaram afirmando, em primeiro lugar, que as obras não tinham sido por eles realizadas, nunca depois da celebração do contrato de arrendamento se havendo procedido a tais obras; que os AA. têm conhecimento delas pelo menos desde que lhes enviaram uma carta em 20-12-2002, verificando-se a exceção perentória da caducidade; e acrescentam que, de todo o modo, os arrendatários poderiam proceder a obras no locado, uma vez que o contrato de arrendamento respetivo lhes permitia efetuar no locado as obras necessárias para o exercício da sua atividade comercial desde que tais obras não fizessem perigar a solidez do edifício, sendo ainda que a ruína de compartimentos e de parte de escadas se teria devido a cheias e à própria antiguidade do mesmo.

Em 09-03-2006 foi celebrada transação sobre o objeto da causa, homologada por sentença, obviamente sem que tenha sido apreciada a exceção de caducidade.

Ora, nestas condições, impossível é considerar altamente provável o vencimento da ação pelos autores, se tivesse sido oportunamente proposta pelo 1º réu, pois aqueles sempre teriam de provar terem sido os ali réus os autores das obras em causa, - pois era isso o que haviam invocado na respetiva petição inicial como causa de pedir -, e que tais obras eram de molde a fazer perigar a segurança do edifício, cuja ruína parcial teriam provocado não tendo ela resultado das aludidas cheias, não permitindo os elementos existentes nos presentes autos afirmar com a segurança necessária que os autores o conseguissem provar em tal ação para se poder concluir pela existência de dano de perda de chance indemnizável.

- Na ação que os AA. intentaram contra GG (referente ao estabelecimento comercial «N.”) os AA. fundamentaram-se na utilização pelo R. de parte do locado para fim habitacional - fim diverso daquele a que se destina -, bem como na realização, designadamente para aquele efeito, de obras não autorizadas pelo senhorio, causando deteriorações consideráveis,

O R. contestou afirmando: não foi o R. quem realizou obras mas o seu pai, anterior arrendatário, o que foi dito aos AA. pelo R. em Dezembro de 2002, tendo eles conhecimento desde então, pelo que o seu direito teria caducado; tal foi feito com o consentimento do anterior senhorio, que até se deslocava ao local e dava opinião sobre as obras, concordando com as mesmas depois de concluídas, bem como a circunstância de o pai do R. comer e por vezes descansar, devido ao seu débil estado de saúde, no arrendado, estando o ali réu convicto da existência de documento a autorizar as obras e o uso de parte do arrendado por seu pai para descansar e almoçar; o R., depois da morte do pai, em Abril de 1996, não utilizou o arrendado para fim diverso do comercial, pois vivia, quer em vida do pai quer depois da sua morte, em casa de sua mãe, e desde Fevereiro de 2004, tem outra residência com sua esposa.

Em 17-01-2006 foi celebrada transação sobre o objeto da causa, homologada por sentença, também sem ter sido apreciada a exceção de caducidade.

E, perante o conjunto de factos articulados na petição inicial e na contestação, maioritariamente sujeitos a produção de prova, igualmente subsistem fortes dúvidas sobre qual seria o resultado da ação se não tivesse sido celebrada transação, ou seja, ignora-se nomeadamente se se concluiria ter sido o ali réu a proceder a obras no locado, se o teria utilizado em parte como habitação, e se, com base em prova ali admitida, teria havido autorização para as obras, com valor que eventualmente poderia ter sido pelo menos base de aplicação oficiosa da figura de abuso de direito. Pelo que também nesta parte não se pode considerar verificada a elevada probabilidade de vencimento determinante da existência de dano de chance indemnizável.

Do exposto resulta que não se possa fundadamente afirmar que a conduta omissiva do 1° R. tenha acarretado irremediavelmente a perda do direito de acionar de forma vitoriosa os inquilinos com vista ao despejo, pelo que, para além de não se poder considerar demonstrada a verificação do denominado prejuízo final, - do que resultaria, por falta de prova do requisito “dano”, a improcedência da presente ação mesmo que não considerada na vertente de ação de indemnização por perda de chance -, também não se pode entender verificado o dano consistente na própria perda de chance autonomamente considerada, o que exclui o direito dos autores a indemnização e conduz à negação da revista, naturalmente sem haver lugar à apreciação da pretensão subsidiária deduzida pelo 1º réu.

***                                        ***                                        ***

Pelo exposto, acorda-se em negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.

***                                        ***                                        ***

                       Lisboa,  5  de Maio de 2015

Silva Salazar (Relator)

Nuno Cameira

Salreta Pereira