Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
051837
Nº Convencional: JSTJ00008403
Relator: ADOLFO COUTINHO
Descritores: REGISTO COMERCIAL
REGIME DE BENS NO CASAMENTO
CONVENÇÃO ANTENUPCIAL
EFEITOS
ASSENTO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ194212180518371
Data do Acordão: 12/18/1942
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG IªS 02-01-1943; BOMJ ANO2,355
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO.
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 2/1942
Área Temática: DIR COM - REGISTOS.
Legislação Nacional: CCOM888 ARTIGO 49 N2 PARUNICO ARTIGO 57 PAR2.
CCIV867 ARTIGO 951 ARTIGO 955.
CPC39 ARTIGO 676.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1937/03/12.
ACÓRDÃO STJ DE 1939/06/18.
ACÓRDÃO RL DE 1931/06/17 IN GRL ANO44 PAG32.
ACÓRDÃO STJ DE 1937/05/25.
Sumário :
A escritura antenupcial em que apenas um dos cônjuges é comerciante só produz efeito para com terceiros desde a data do seu registo comercial.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, em sessão plena:

A (Tojal), na falencia de seu marido, B, reclamou a verificação do seu direito a separar da massa falida o direito e acção a 1/8 da herança de seu pai, o Visconde do Tojal, que para a referida massa fora arrolado, fundamentando o pedido em que o seu casamento foi precedido do estabelecimento do regime de completa e absoluta separação de bens presentes e futuros, conforme consta da respectiva escritura de 24 de Maio de 1919, não tendo, demais, qualquer responsabilidade nas dividas do marido, porque por elas se não obrigou, não foram contraidas em beneficio do casal comum nem é comerciante.


Alega ainda que, embora a escritura so tenha sido registada em 30 de Junho de 1939, tal circunstancia não obsta ao deferimento do seu pedido, visto que tal registo e facultativo por efeito do disposto nos artigos
49, paragrafo unico, e 57, paragrafo 2, do Codigo Comercial.
Pelo acordão deste Tribunal de folhas..., de conformidade com o despacho da 1 instancia, mas revogatorio do respectivo acordão da Relação, decidiu-se porem que a reclamação não procedia porque, sendo obrigatorio o registo comercial para que a escritura produzisse os seus efeitos para com terceiros, a sua omissão, na devida oportunidade, o não consentia.
Deste acordão, visto estar em oposição sobre o mesmo ponto de direito com os tambem deste Tribunal de 12 de Março de 1937 e de 18 de Junho de 1939, transitados em julgado, interpos-se recurso para tribunal pleno, que foi mandado seguir e do qual cumpre conhecer.
E assim:


Como no acordão recorrido se pondera, o registo comercial, da mesma forma que o predial, tem por fim dar a conveniente publicidade aos actos e contratos a ele sujeitos para que produzam efeitos em relação a terceiros, garantindo deste modo, como formalidade conservatoria que e, os direitos destes e das proprias partes neles intervenientes.


Ora sabido e que do regime matrimonial de bens estabelecido diferentes são as consequencias pelo que respeita a incidencia sobre eles da responsabilidade no passivo do casal ou dos conjuges. E, como na falta de convenção a lei presume que o regime e o de comunhão de bens, so em tal emergencia o cumprimento das formalidades que a lei prescreve pode obstar a que tal cominação se efective, evitando-se assim as consequencias que de tal presunção possam derivar.


Para que se respeitem e garantam os direitos, quer dos conjuges quer dos credores, ha que cumprir as formalidades especiais que a lei impõe, entre as quais se encontra a de que a escritura antenupcial entre comerciantes seja registada no registo comercial, abrangendo tal preceito não so o proprio comerciante como a esposa quando o não seja.
As razões justificativas de tal medida assim o aconselham e as disposições expressas da lei o ordenam.


Na verdade o artigo 49, n. 2, do Codigo Comercial dispõe que ficam sujeitas ao registo comercial as escrituras antenupciais dos comerciantes e o paragrafo unico acrescenta que "pode tambem ter lugar o registo de escrituras antenupciais de qualquer esposo ou conjuge, embora não comerciante". E, desde que o acto e sujeito a registo, determina o artigo 57 que o seu efeito para com terceiro se se produz desde a data do registo e na ordem por que se ache feito.


A circunstancia de o paragrafo unico do artigo 49 empregar a frase "pode tambem" significa apenas que o conjuge a quem se refere, se fizer o registo, se põe ao abrigo do preceito do artigo 57, porque tal faculdade não destroi a consequencia que dimana da falta do registo.
A lei e bem clara e terminante: o acto e sujeito a registo, mas, não sendo registado, não produz efeito em relação a terceiros.


Se assim não fora, de nada serviriam as disposições dos referidos artigos 49 e 57.


Dizer-se que tais preceitos não são de aplicar porque o registo e facultativo e uma afirmação sem base juridica e contrariada pelos principios em que o registo entre nos, na parte relativa a obrigatoriedade, se funda.
Nenhuma das nossas leis declara obrigatorio o registo, mas impõe a obrigatoriedade indirectamente, preceituando que certos actos estão a ele sujeitos e que, não sendo registados, não pruduzem efeitos em relação a terceiros, embora possam valer entre as proprias partes, como se ve dos artigos 951 e 955 do Codigo Civil.


Não pode, pois, afirmar-se que o sistema vigente e o do registo facultativo, a não ser em relação a factos que podem ser invocados ou que produzem efeitos contra terceiros sem registo (Cunha Gonçalves, Tratado V, pagina 564).
O principio que a lei estabelece e que os actos sujeitos a registo so produzem efeito para com terceiro desde a data do registo e pela ordem por que se ache feito, principio consignado no artigo 57 do Codigo Comercial como regra, e por isso com mais propriedade do que o equivalente do artigo 951 do Codigo Civil, que vem estabelecido como excepção.
A orientação da obrigatoriedade indirecta do registo, que tem sido a norma do nosso direito, ainda agora foi mantida no artigo 676 do Codigo de Processo Civil, em que se permite o registo da hipoteca proveniente da condenação do reu no pagamento de uma prestação determinada em dinheiro ou em generos "para (textual) produzir efeitos em relação a terceiros".
E ainda de atender a que a duvida que o acordão da Relação de Lisboa de 17 de Junho de 1931, revogando uma sentença da 1 vara do Tribunal do Comercio, fez surgir não tinha antecedentes judiciarios, talvez porque os tribunais e os comercialistas considerassem indiscutivel a aplicação dos artigos 49 e 57 do Codigo Comercial (Gazeta da Relação de Lisboa, 44 e 51, respectivamente a paginas32 e 347).


E, se e certo que os dois acordãos de confronto tenham julgado a sua não aplicabilidade, certo e tambem que a doutrina neles seguida não foi adoptada no acordão de 25 de Maio de 1937, firmado por cinco ilustres juizes deste Supremo Tribunal.


Nos termos expostos, negam provimento ao recurso, condenando a recorrente nas custas, e firmam o seguinte assento:


A escritura antenupcial em que apenas um dos conjuges e comerciante so produz efeito para com terceiros desde a data do seu registo comercial.


Lisboa, 18 de Dezembro de 1942

Adolfo Coutinho (Relator) - Heitor Martins - Luiz Osorio -
- Magalhães Barros - Pereira e Sousa - Teixeira Direito -
- Sampaio e Melo - Miguel Crespo - Miranda Monteiro - F.
Mendonça - Bernardo Polonio - Avelino Leite - Americo de Sousa.