Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
219/13.4TYLSB.L2.S3
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: FONSECA RAMOS
Descritores: SOCIEDADE POR QUOTAS
DESTITUIÇÃO DE GERENTE
JUSTA CAUSA
DELIBERAÇÃO SOCIAL
NULIDADE
ACÇÃO JUDICIAL
AÇÃO JUDICIAL
Data do Acordão: 02/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DA SOCIEDADES – DELIBERAÇÕES DOS SÓCIOS / SOCIEDADES POR QUOTAS / GERÊNCIA E FISCALIZAÇÃO.
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGOCIO JURÍDICO / DECLARAÇÃO NEGOCIAL / INTERPRETAÇÃO.
Doutrina:
- Carolina Cunha, A Exclusão de Sócios (Em Particular nas Sociedades por Quotas), Problemas do Direito das Sociedades, IDET, 2002, p. 211 e 212 ; Código das Sociedades Comerciais em Comentário, n.° 3, p. 584 a 587;
- Jorge M. Coutinho de Abreu, Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Vol. IV, 2ª edição, Almedina, Junho, 2017, p. 128 ; 2013, Volume 1, p. 673 a 675;
- Luís Menezes Leitão, Pressupostos da Exclusão de Sócio nas Sociedades Comerciais, A.A.F.D.L., 1988, p. 41 e ss.;
- Menezes Cordeiro, Código das Sociedades Comerciais Anotado, 2009, p. 63, 236 e 675 ; Direito das Obrigações, I, 1994, p. 149;
- Paulo Mota Pinto, Declaração Tácita, 1995, p. 208;
- Paulo Olavo da Cunha, Direito das Sociedades Comerciais, 6ª edição, 2016, Almedina, p. 500;
- Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, p. 233 ; Código Civil Anotado, Vol. II, p. 321;
- Raul Ventura, Sociedades por Quotas, Vol. III, p. 117 e 118.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS (CSC): - ARTIGOS 62.º, N.º 2, 254.º, N.ºS 1 E 5 E 257.º, N.º 5.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 236.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 04-05-1999, PROCESSO N.º 99A333;
- DE 15-05-2005, PROCESSO N.º 04A4369;
- DE 30-09-2014, PROCESSO N.º 1195/08.0TYLSB.L1.SI, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

I. A justa causa destitutiva do gerente da sociedade, relaciona-se com os princípios da confiança e a boa fé que devem ser observados por quem detém tal função na sociedade, princípios relevantes nas relações com os credores sociais, sócios e terceiros, de modo a que a transparência dos comportamentos e o rigor ético das condutas, possam ser valorados objectivamente e subjectivamente. A justa causa é uma sanção excludente do “infractor”, que visa defender a sociedade, na sua inserção na vida comercial.

II. Ao caso aplica-se o nº5 do art. 257º do Código das Sociedades Comerciais, segundo o qual a destituição com fundamento em justa causa, tendo a sociedade apenas dois sócios, tem de ser decretada judicialmente: o teor da deliberação aprovada não consente dúvidas, a destituição de gerente baseou-se em alegada justa causa - “com base nos actos de pagamentos unilaterais efectuados pela gerente em seu favor, em prejuízo da sociedade e à sua revelia, fosse a mesma destituída de gerente com efeitos imediatos”.

III. O art. 254º, nºs, 1 e 5, do Código das Sociedades Comerciais, alude ao conceito de “justa causa” para a destituição de gerente: trata-se de um conceito indeterminado, dotado de plasticidade, adaptável casuisticamente, para aferir se, uma certa actuação se compagina com os direitos e deveres do gerente destituendo.

IV. Uma deliberação é passível de renovação, nos termos do art. 62º, nº2, do Código das Sociedades Comerciais, desde que “esta não enferme do vício da precedente”, ou seja, não replique o vício da deliberação que se pretende substituir.

V. Se a Ré, sem recorrer a juízo, pretende, através da renovação de uma deliberação, que não poderia tomar no contexto da assembleia geral, (por postular o recurso a juízo), decidir por outra deliberação tomada em assembleia geral, a sua renovação contém, em si, o germe da nulidade da deliberação ratificanda que, contaminando-a, a invalida, pelo que não existe renovação.

VI. A exclusão de sócio, que só pode ser decretada por via judicial, precedida de deliberação societária, depende de actuação do sócio que age de forma desleal ou adopta procedimentos que, perturbando gravemente o funcionamento da sociedade, tenham causado, ou possam vir a causar-lhe graves prejuízos.

VII. Na ponderação do critério acolhido no art. 236º, nº1, do Código Civil, que consagra a teoria da impressão do destinatário, não sendo essa interpretação dissociável do sentido que se visa com o comportamento declarativo, ainda que imperfeitamente expresso, sendo manifesta a intenção, primeiro de afastar a Autora da gerência, e, depois, de sócia, deliberando a sociedade mandatar um Advogado para intentar a competente acção judicial, pese embora alguma equivocidade, já que a ordem de trabalhos pode ser interpretada no sentido de uma deliberação que teria de ser executada ulteriormente, um declaratário normal concluiria que o fim primordial da deliberação, não foi o de exprimir uma intenção, foi, ao invés, afirmar uma decisão e essa decisão foi a de exclusão de sócia da Autora.

VIII. Se a deliberação para destituição de gerente, tendo a sociedade apenas dois sócios, só pode ser tomada em acção judicial adrede intentada, não faria sentido, sendo a disputa “sócio contra sócio”, que um dos sócios, apenas com o seu voto, pudesse excluir o outro de sócio sem recorrer a tribunal; se assim fosse, o sócio maioritário determinava sozinho a deliberação. 

 IX. Não constituindo a gerência um direito especial, sendo a função ou cargo transitório, o sócio destituído da gerência, permanece como sócio; todavia, a exclusão de sócio é bem mais gravosa para o excluído. Asssim, por maioria de razão, a exclusão de sócio só poderá, no caso de serem dois os sócios de uma sociedade por quotas, ser validamente decretada por sentença.

Decisão Texto Integral:

Proc. 219/13.4TYLSB.L2

                R-703[1]   

Revista

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

AA intentou, em 4.2.2013, no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Lisboa – Juízo Comércio – Juiz 5 - acção comum – anulação de deliberações sociais - contra:

 

BB, Lda.

 Pedindo:

A) Seja declarada nula a deliberação de “ratificação” constante do ponto 3 da ata da assembleia geral da ré de 4.1.2013 e, consequentemente, seja ordenado o cancelamento dos factos registados na Conservatória do Registo Comercial em sua execução.

 

b) Seja declarada nula a deliberação de “destituição” de sócia constante do ponto 2 da ata da assembleia geral da ré de 4.1.2013 e, consequentemente, seja ordenado o cancelamento dos factos registados na Conservatória do Registo Comercial em sua execução.

Alegou, em síntese, ser sócia da sociedade ré, titular de uma quota no valor nominal de € 6.000,00 e ter sido convocada para uma assembleia a realizar no dia 4.1.2013, tendo como ordem de trabalhos a deliberação sobre a sua “destituição” como sócia e a habilitação do gerente para intentar a respectiva acção e ainda a ratificação da deliberação tomada na assembleia realizada em 17.12.2012.

Ambos os pontos da ordem de trabalhos foram aprovados, mas as deliberações são inválidas uma vez que a ratificação de uma deliberação nula, é ela também nula e a deliberação de destituição da sócia é também inválida por incidir sobre matéria excluída de deliberação que apenas pode ser decidida em acção judicial.

A ré contestou, alegando a validade da deliberação de destituição de gerente, tomada na assembleia de 17.12.2012, nos termos do art.257º do Código das Sociedades Comerciais, e a validade da deliberação renovatória, que suprimiu o vício de falta de convocação.

Relativamente à deliberação de “destituição de sócia” sustentou que apenas foi deliberada a promoção dos actos necessários à instauração da acção de exclusão e não a exclusão propriamente dita.

***

Foi proferido despacho saneador que decidiu julgar parcialmente procedente a acção e, consequentemente, declarar a nulidade da deliberação de “ratificação”, constante do ponto 3 da ata da assembleia geral da Ré de 4.1.2013 e não declarar nula a deliberação de “destituição” de sócia constante do ponto 2 da acta da assembleia geral da ré de 4.1.2013.

***

Inconformada, a Autora interpôs recurso principal para o Tribunal da Relação de Lisboa, e a Ré interpôs recurso subordinado. Aquele Tribunal, por Acórdão de 24.5.2018 – fls. 277 a 285 –, decidiu:

 1. Julgar improcedente o recurso interposto pela Recorrente “BB, Ld.ª”, confirmando a decisão recorrida.

2. Julgar procedente o recurso subordinado interposto pela Recorrente AA, e, em consequência, declarou nula a deliberação de destituição de sócia constante do ponto 2 da acta da assembleia geral da ré de 4.1.2013.

***

Inconformada, a Ré interpôs recurso de revista excepcional para este Supremo Tribunal de Justiça, que foi admitido pelo Acórdão da Formação a que alude o art. 672º, nº3, do Código de Processo Civil, apenas no que concerne ao ponto 1. da decisão do acórdão recorrido – que se debruçou sobre a questão da destituição de gerente – invocando, para o efeito, o requisito da alínea a) do n°1 do artigo 672° do Código de Processo Civil, que se teve por verificado.

***

A Ré/recorrente, alegando, formulou as seguintes conclusões:

a) Em face dos critérios estabelecidos nos arts. 236º a 238° do Código Civil, e tendo presente o teor do aviso convocatório, notório se revela, em face do texto directo e do seu enquadramento no que toca à propositura de uma acção para exclusão de sócia da recorrida, que aquilo, e apenas aquilo, era pretendido pela ora recorrente, consciente que, tendo a sociedade apenas dois sócios, tinha de percorrer e recorrer à via judicial para consolidar e concretizar a pretendida exclusão;

b) A tal conclusão conduz a constituição de mandatário para intentar acção judicial, que, a recorrente, confirma ter sido efectivamente desencadeada, elemento determinante para a reconstituição da vontade do emissor da declaração;

c) Revelando-se, neste primeiro segmento, violado o art. 236°, n°1, do Código Civil e revelando o Acórdão recorrido erro de julgamento;

d) Quanto à segunda questão, a qual foi objecto de recurso, que se prende com a deliberação de destituição de gerente, entendendo-se que o mesmo não contém integração em sede de revista geral, mostram-se verificados os condicionalismos estabelecidos pelo art. 672°, n°1, al. a) do Código de Processo Civil, para à revista excepcional, pois que se trata de pronúncia inovadora, que se aconselha à definição da equação que se traduz em: se a circunstância de existirem factos passíveis de ser enquadrados como justa causa de destituição de gerente implicam, por si, a obrigação de a sociedade os invocar ou se a sociedade pode optar fazê-lo ou não, sendo que, a fazê-lo, tem de o indicar expressamente;

e) E que, estando na disponibilidade da sociedade a invocação ou não de justa causa na destituição da gerente, apenas se a mesma justa causa for expressa e directamente invocada como fundamento da deliberação se pode considerar estar-se perante uma situação enquadrada pelos n°s 4 e 5 do art. 257° do Código das Sociedades Comerciais, o que evidentemente não é o caso dos autos;

f) Tal resulta, desde logo, da convocatória, onde nenhuma alusão é feita à existência de motivação enquadrada em justa causa, da acta, que não pugna pela invocação de justa causa e, em sentido diametralmente oposto à deliberação de exoneração de sócia, ao silêncio sobre a constituição de mandatário para propor acção judicial, em termos reveladores de a sociedade se ter abstido de invocar justa causa de destituição, o que está na sua disponibilidade face, desde logo, ao n° 1º do art. 257º, do Código das Sociedades Comerciais;

g) Mostrando-se violado o mesmo art. 257°, n°1, do Código das Sociedades Comerciais nesta segunda parte do recurso.

A Autora contra-alegou, sustentando que da decisão não cabe recurso de revista excepcional.

***

Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que a Relação considerou provados os seguintes factos:

1) BB, Lda., pessoa colectiva n.º ..., com sede na ..., n.º …, …. Lisboa, encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

2) Tem por objecto social a prestação de serviços de consultoria, análise e programação informática.

3) Tem o capital social de € 15.000,00 repartido da seguinte forma:

- CC – uma quota no valor de € 9.000,00;

- AA – uma quota no valor de € 6.000,00.

4) Em 24.3.2010 mostra-se registada a designação de CC e AA como gerentes da sociedade ré.

5) Em 17.12.2012 mostra-se registada a cessação de funções de gerente por parte de AA com fundamento em destituição, com base em deliberação da mesma data.

6) A autora recebeu, por carta datada de 17.12.2012, uma convocatória para assembleia geral da sociedade ré, a realizar no dia 4.1.2013.

7) Com data de 17.12.2012 mostra-se elaborada “convocatória de assembleia geral” da sociedade ré, com o teor de fls. 25 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, a realizar no dia 4.1.2012, pelas 18 h, tendo além do mais, como pontos da ordem de trabalhos:

Ponto Dois – Deliberar sobre a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, em face da pratica de atos pela mesma lesivos dos interesses da sociedade, tendo a própria apresentado uma fatura em seu nome e procedido ao seu pagamento à revelia dos gerentes, bem sabendo que não estava autorizada a realizar tal pagamento em proveito próprio, ficando o gerente da sociedade CC autorizado a intentar a competente acção judicial, podendo constituir mandatário para a sociedade e reclamar a restituição da mesma verba;

Ponto Três – Deliberar sobre a ratificação da deliberação tomada pela assembleia geral em Dezembro de 2012.

8) A autora não compareceu na assembleia geral da sociedade ré convocada para o dia 4.1.2013.

9) No dia 17.12.2012 reuniu assembleia geral da sociedade ré, da qual foi lavrada a ata nº17, com o teor de fls. 30 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, com a seguinte ordem de trabalhos:

Ponto único – Deliberar sobre a destituição da gerente da sociedade AA.

Iniciada a discussão do ponto único da ordem de trabalhos, foi deliberado com o voto favorável do sócio CC que, com base nos actos de pagamentos unilaterais efectuados pela gerente em seu favor, em prejuízo da sociedade e à sua revelia, fosse a mesma destituída de gerente com efeitos imediatos.”

10) No dia 4.1.2013 reuniu assembleia geral da sociedade ré, da qual foi lavrada a ata nº 18, com o teor de fls. 27 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual resulta, além do mais:

“ (…) Estando presente o sócio CC, titular de uma quota no valor nominal de € 9.000,00, não estando presente a sócia AA, titular de uma quota no valor nominal de € 6.000,00, não obstante a mesma ter sido convocada por carta registada com aviso de recepção por si recebida:

(…)

2 – Delibera pelos fundamentos constantes da ordem de trabalhos a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, mandatando o referido Sr. Dr. DD, Advogado (…) para representar a sociedade nas acções judiciais referidas na ordem de trabalhos.

3 – Ratifica a deliberação tomada em assembleia geral da sociedade de 17 de Dezembro de 2012 e em consequência determina a notificação da gerente destituída para proceder à restituição imediata dos bens que mantém em sua posse pertença da sociedade concretamente veículo automóvel, telemóvel, computados e quaisquer documentos relativos à sociedade (…).”

Fundamentação:

Sendo pelo teor das conclusões das alegações do recorrente que, em regra, se delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso –, importa saber (tendo presente a admissão da revista excepcional), se deve ser revogada a decisão da assembleia geral (doravante AG) da Ré de 4.1.2013 – acta nº18 de fls. 27 – que ratificou a deliberação de destituição de gerente da Autora, tomada na assembleia geral da Ré de 17.12.2012 (acta nº17, de fls. 30) – [revista excepcional admitida pela Formação] e da deliberação da mesma data – 4.1.2013 – cujo objecto consiste em saber se, nessa assembleia geral, a Autora foi “destituída” de sócia (ponto dois da acta).

A recorrente é uma sociedade por quotas, com dois sócios, e com o capital social de € 15 000,00, tendo a Autora uma quota de € 6 000,00 e o sócio CC – uma quota no valor de € 9.000,00.

A Autora foi convocada para a Assembleia-geral da Ré de 4.1.2013[2], com a seguinte ordem de trabalhos.

Ponto Dois – deliberar sobre a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, em face da prática de actos pela mesma lesivos dos interesses da sociedade, tendo a própria apresentado uma factura em seu nome e procedido ao seu pagamento à revelia dos gerentes, bem sabendo que não estava autorizada a realizar tal pagamento em proveito próprio, ficando o gerente da sociedade EE autorizado a intentar a competente acção judicial. Podendo constituir mandatário para a sociedade e reclamar a restituição da mesma verba.”

No dia aprazado reuniu a assembleia geral, constando da acta nº18 – a fls. 27 – além do mais:

 “ (…) Estando presente o sócio CC, titular de uma quota no valor nominal de € 9.000,00, não estando presente a sócia AA, titular de uma quota no valor nominal de € 6.000,00, não obstante a mesma ter sido convocada por carta registada com aviso de receção por si recebida: (…)

 2 – Delibera pelos fundamentos constantes da ordem de trabalhos a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, mandatando o referido Sr. Dr. DD. Advogado (…) para representar a sociedade nas acções judiciais referidas na ordem de trabalhos.”

Como se disse, na assembleia geral da Ré, de 4.1.2013, foram tomadas duas deliberações: i) ratificação da decisão tomada na AG de 17.12.2012, referente à destituição de AA de gerente da Ré, reconhecendo a Ré que a sócia não fora convocada para a AG de 17.12; ii) saber se na referida AG de 4.1.2013 – ponto 2) da acta – a Autora foi excluída de sócia, ou apenas foi mandato advogado para intentar acção judicial visando esse desiderato.

Na sentença de fls. 226 a 238, foi declarada a nulidade da deliberação de “ratificação”, constante do ponto 3 da acta da assembleia geral de 4.1.2013, que se prendia com a destituição de gerente, e não foi declarada nula a deliberação de “destituição” de sócia constante do ponto 2 da acta da dessa assembleia geral de 4.1.2013.  

No Acórdão recorrido – fls. 277 a 285 – foi julgado improcedente o recurso da Ré (que versava sobre a parte que lhe foi desfavorável relativa à ratificação da deliberação que destituíra a Autora de gerente) e, porque a Autora havia interposto recurso subordinado, e este foi julgado procedente, foi declarada a nulidade da deliberação de destituição de sócia – ponto 2) da acta da AG de 4.1.2013.

Quanto à 1ª questão.

 A Formação a que alude o art. 672º, nº3, do Código de Processo Civil – fls. 366 a 368 – por Acórdão de 6.12.2018 –, admitiu a revista excepcional da Ré, e quanto à segunda questão, tendo a Ré/recorrente sucumbido nessa parte da decisão, cabe dela revista normal: em suma, as duas decisões serão apreciadas em sede de recurso de revista.

Vejamos, quanto à primeira deliberação, que se relaciona, como se disse, com a destituição de gerente, em consequência da ratificação da deliberação da AG de 27.12.2012.

Como consta provado, a sociedade Ré, uma sociedade por quotas com o capital social de € 15 000,00, tem dois sócios, a Autora, com uma quota de € 6 000,00 e o sócio EE com uma quota de € 9 000,00.

As questionadas deliberações foram votadas apenas pelo sócio maioritário. Na AG que tomou as deliberações - 4.1.2013 - a sócia AA, não esteve presente, não obstante ter sido convocada por carta registada com aviso de recepção por si recebida.

A montante da apreciação do conteúdo substancial da AG (destituição de gerente e ratificação da deliberação de destituição), importa saber se a sociedade, sendo dois os sócios, poderia ter deliberado a exclusão de gerente extrajudicialmente. Não está em causa que a sociedade pode destituir o gerente, mesmo sem justa causa, tendo, nesse caso, de o indemnizar. 

Como se acha provado nos pontos 9) e 10):

“No dia 17.12.2012 reuniu assembleia geral da sociedade ré, da qual foi lavrada a ata nº 17, com o teor de fls. 30 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, com a seguinte ordem de trabalhos:

Ponto único – Deliberar sobre a destituição da gerente da sociedade AA.

Iniciada a discussão do ponto único da ordem de trabalhos, foi deliberado com o voto favorável do sócio CC que, com base nos atos de pagamentos unilaterais efectuados pela gerente em seu favor, em prejuízo da sociedade e à sua revelia, fosse a mesma destituída de gerente com efeitos imediatos.” (ponto 9)

“ No dia 4.1.2013 reuniu assembleia geral da sociedade ré, da qual foi lavrada a ata nº 18, com o teor de fls. 27 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual resulta, além do mais:

“ (…) Estando presente o sócio CC, titular de uma quota no valor nominal de € 9.000,00, não estando presente a sócia AA, titular de uma quota no valor nominal de € 6.000,00, não obstante a mesma ter sido convocada por carta registada com aviso de receção por si recebida:

(…)

2 – Delibera pelos fundamentos constantes da ordem de trabalhos a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, mandatando o referido Sr. Dr. DD, Advogado (…) para representar a sociedade nas acções judiciais referidas na ordem de trabalhos.

3 – Ratifica a deliberação tomada em assembleia geral da sociedade de 17 de Dezembro de 2012 e em consequência determina a notificação da gerente destituída para proceder à restituição imediata dos bens que mantém em sua posse pertença da sociedade concretamente veículo automóvel, telemóvel, computados e quaisquer documentos relativos à sociedade (…).” (ponto 10) - (sublinhámos)

No art. 10º da contestação, a Ré reconheceu que a Autora não foi convocada para a AG de 17.12.2012, “por mero lapso”, que não obsta à ratificação do então deliberado através da deliberação objecto dos presentes autos, atento o disposto no art. 62° do Código das Sociedades Comerciais”.

Dispõe o artigo 257º do Código das Sociedades Comerciais, nos seus nºs 1, 4 e 5:

1. Os sócios podem deliberar a todo o tempo a destituição de gerentes.

4. Existindo justa causa, pode qualquer sócio requerer a suspensão e a destituição do gerente, em acção intentada contra a sociedade.

5. Se a sociedade tiver apenas dois sócios, a destituição da gerência com fundamento em justa causa só pelo tribunal pode ser decidida em acção intentada pelo outro.

Ao caso aplica-se o nº5 do art. 257º do citado Código, segundo o qual a destituição com fundamento em justa causa, tendo a sociedade apenas dois sócios, tem de ser decretada judicialmente. O teor da deliberação aprovada não consente dúvidas: a destituição de gerente baseou-se em alegada justa causacom base nos actos de pagamentos unilaterais efectuados pela gerente em seu favor, em prejuízo da sociedade e à sua revelia, fosse a mesma destituída de gerente com efeitos imediatos”.

Menezes Cordeiro in “Código das Sociedades Comerciais Anotado” – 2009 – pág. 675 – sobre o conceito de justa causa de destituição, ensina:

“Segundo o legislador, serão (a) a violação grave dos deveres do gerente (b) e a incapacidade para o exercício normal das funções. São noções orientadoras e meramente exemplificativas. Percebe-se, no entanto, que a justa causa tanto possa ser subjectiva como objectiva. Será justa causa subjectiva a que resulte da violação culposa dos deveres que, da lei ou do contrato de administração, decorrem para o gerente, em termos muito próximos da feição laboral em que se exige justa causa para o despedimento de trabalhadores. Será objectiva se respeitar à incapacidade para o exercício do cargo, sem qualquer culpa do gerente, como a incapacidade decorrente de uma situação de doença prolongada, ou qualquer outra circunstância em que, mantendo-se a prestação ainda possível, perturbe gravemente a relação de administração. Admite-se ainda que o conceito possa ter diferentes concretizações, sendo mais ou menos exigente, em diferentes hipóteses de destituição”.

 

 No “Código das Sociedades Comerciais em Comentário”, Jorge Coutinho de Abreu, Vol. IV, 2ª edição, Almedina, Junho, 2017, na pág. 128, lê-se:

 “Em tese geral, diremos que é justa causa a situação que, atendendo aos interesses da sociedade e do gerente, torna inexigível àquela manter a relação orgânica com este, designadamente porque o gerente violou gravemente os seus deveres, ou revelou incapacidade ou ficou incapacitado para o exercício normal das suas funções.

Os deveres, cuja violação grave (com dolo ou negligência forte) constitui justa causa de destituição, podem ser legais específicos (resultam imediata e especificadamente da lei), legais gerais (deveres de cuidado e deveres de lealdade; art.º 64º, 1), ou estatutários”.

A justa causa destitutiva do gerente da sociedade relaciona-se com os princípios da confiança e a boa fé que devem ser observados por quem detém essa função na sociedade, princípios muito relevantes nas relações com os credores sociais, sócios e terceiros, de modo a que a transparência dos comportamentos e o rigor ético das condutas, possam ser valorados objectivamente e subjectivamente. A justa causa é uma sanção excludente do “infractor”, que visa defender a sociedade, na sua inserção na vida comercial.

           O art. 64º do Código das Sociedades Comerciais, antes e depois da Reforma de 2006, impõe a observância de deveres de cuidado, verdadeiros poderes-deveres dos gerentes ou administradores baseados numa relação de confiança (fiducia) que se estabelece entre a sociedade e quem a gere, seja no círculo das suas relações internas, seja nas relações externas com terceiros, sejam eles credores, entidades administrativas, trabalhadores ou quaisquer outros interessados. O dever de cuidado – duty of care – está ínsito na actuação do “gestor criterioso e ordenado” e no grau de diligência que esse standard postula.

            O art. 254º, nºs, 1 e 5 do Código das Sociedades Comerciais, alude ao conceito de “justa causa” para a destituição de gerente: trata-se de um conceito indeterminado, dotado de plasticidade, adaptável casuisticamente, para aferir se, uma certa actuação se compagina com os direitos e deveres do gerente destituendo.

            No caso, esses deveres, como se implicita das imputações feitas à Autora, seriam os de cuidado, de diligência e de lealdade.

            No Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 30.9.2014 - Proc. 1195/08.0TYLSB.L1.SI – que relatámos – acessível em www.dgsi.pt  – pode ler-se:

           “Constitui justa causa de destituição de gerente, actuação sua que exprima violação grave dos deveres de gerente, mormente, dos deveres de cuidado, de diligência e de lealdade, que impliquem perda irreparável da confiança dos afectados por essa actuação, seja no contexto interno da sociedade, seja na sua relação com terceiros a justificar a impossibilidade da manutenção do vínculo que o une ao ente societário, por existir conflito de interesses gerador de danos efectivos ou potenciais, que devam ser consideradas razão inequívoca da inexigibilidade da manutenção daquele vínculo jurídico. A lei alemã alude a “grosseira violação dos deveres, incapacidade de condução regular dos negócios ou privação da confiança…”, ou seja, quando “a confiança por manifestos e improcedentes fundamentos foi destruída […]”.

 

Não existe dúvida que o fundamento da deliberação foi uma actuação da Autora, alegadamente, integradora de justa causa destitutiva de gerente da ré, e, como a sociedade apenas tem dois sócios, não poderia a destituição ocorrer no seio da sociedade por via de uma deliberação de um dos sócios.

Como ensina Raul Ventura, in “Sociedades por Quotas”, vol. III, págs. 117 e 118:

 “Se nestas sociedades, fosse seguido o regime normal, cada um dos sócios estaria à mercê do outro; como o sócio gerente contra o qual a justa causa é alegada não pode exercer o direito de voto, o outro sócio, só por si, convocaria a assembleia, proporia a destituição, consideraria provada a justa causa alegada e aprovaria a proposta […].

Embora não o diga expressamente, o n.°5 pressupõe que se trata de destituir um gerente-sócio – como no § 69 do projecto alemão — e não um gerente estranho; a letra do preceito mostra com bastante clareza que se trata de litígio entre os dois sócios…A intenção do n.°5 é deslocar o litígio do campo sociedade-sócio para o campo sócio-sócio, pois nenhum deles deve ser considerado como sendo “a sociedade”.

A deliberação, ao proscrever o recurso a juízo está, pois, ferida de nulidade.

Vejamos se poderia ter sido objecto de renovação.

O art. 62º do Código das Sociedades Comerciais dispõe:

1. Uma deliberação nula por força das alíneas a) e b) do nº1 do artigo 56.º pode ser renovada por outra deliberação e a esta pode ser atribuída eficácia retroactiva, ressalvados os direitos de terceiros.

2. A anulabilidade cessa quando os sócios renovem a deliberação anulável mediante outra deliberação, desde que esta não enferme do vício da precedente. O sócio, porém, que nisso tiver um interesse atendível pode obter anulação da primeira deliberação, relativamente ao período anterior à deliberação renovatória.

3. O tribunal em que tenha sido impugnada uma deliberação pode conceder prazo à sociedade, a requerimento desta, para renovar a deliberação.

Porque as deliberações sociais, podem versar sobre o conteúdo ou, meramente, com regras procedimentais, o Código das Sociedades Comerciais (CSC) distingue as que são nulas – art. 56º - das que são anuláveis – art. 58º.

No Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 4.5.1999, Relator Torres Paulo, no Proc. 99A333, in www.dgsi.pt, pode ler-se:

“Para distinguir os vícios que determinam a nulidade ou a anulação de uma deliberação viciada, há que surpreender se eles dizem respeito ao conteúdo (alíneas c) e d) do n.º1 do artigo 56º do Código das Sociedades Comerciais), ou ao processo de formação (alíneas a) e b) do mesmo artigo) da deliberação.

 As “nulidades” resultantes dos vícios de formação (alíneas a) e b) do n.º1 do artigo 56º) são sanáveis nos termos do n.º3 do mesmo artigo, pelo que estamos perante uma invalidade mista.

Se a deliberação colidir com normas dispositivas ou do pacto social - na disponibilidade dos sócios -, ela será só anulável (artigo 59º).

A dicotomia normas imperativas e dispositivas só têm relevância quando o vício ataca o conteúdo da deliberação; se ele ataca o processo de formação de deliberação, a consequência é a sua anulabilidade.

 A alínea a) do n.º1 do artigo 58º do Código das Sociedades Comerciais é uma norma residual: residual por exclusão de partes, na medida em que abarca as hipóteses em que a deliberação continua a contrariar a lei em área não prevista no artigo 56º.

O n.º2 do artigo 62º do Código das Sociedades Comerciais acolheu a doutrina que se pronunciava pela admissibilidade da renovação de deliberação nula por vício de formação e nunca quando ela se circunscrevia ao cerne do conteúdo.”

Importa saber qual a natureza do vício de que enferma a deliberação social em apreciação. Com efeito, a doutrina e a jurisprudência, distinguindo entre vícios de procedimento e de conteúdo, consoante estejam em causa violações de carácter formal ou de substância das deliberações, assim considera ou não, a possibilidade de renovação ao abrigo do art. 62º do Código das Sociedades Comerciais.

No “Código das Sociedades Comerciais em Comentário”, coordenado por Jorge M. Coutinho de Abreu, Almedina, Reimpressão, 2013, Volume 1, págs. 673 a 675, pode ler-se:

 “ […] Importa sublinhar que nem todos os vícios de procedimento provocam a anulabilidade das respectivas deliberações. Apesar de o art.º 58º, 1, a) e c), não fazer distinções (todas as deliberações ilegais, quando não sejam nulas, seriam anuláveis), há que atender à teleologia das normas procedimentalmente ofendidas e às consequências das ofensas. Em concreto, há vícios relevantes e vícios irrelevantes para efeitos de anulação das deliberações. Sobre isto, porém, pouco tem ponderado a jurisprudência portuguesa. Em tese geral, diremos que são vícios de procedimento relevantes quer os que determinam um apuramento irregular ou inexacto do resultado da votação e, consequentemente, uma deliberação não correspondente à maioria dos votos exigida, quer os ocorridos antes ou no decurso da assembleia que ofendem de modo essencial o direito de participação livre e informada de sócios nas deliberações.”

Em anotação ao art. 62º, na obra citada, Coutinho de Abreu, depois de afirmar que a renovação de uma deliberação, “consiste, pois, na substituição desta por outra de conteúdo idêntico mas sem os vícios (de procedimento), reais ou supostos, que tomam aquela inválida ou de validade duvidosa”, considera: “É possível renovar deliberações nulas. Mas só quando a nulidade resulte de vícios de procedimento: não convocação de assembleia geral (art. 56º, 1, a), 2), não exercício do direito de votar por escrito por falta de convite para tal (art. 56º, 1, b)). As deliberações nulas por vícios de conteúdo não são renováveis. A renovação implica que a deliberação renovadora não enferme dos vícios da renovada mantendo (no essencial) o conteúdo desta. Ora, uma (pretensa) deliberação renovadora de uma nula por vício de conteúdo, para não repetir o vício, teria de apresentar conteúdo diverso, regulamentação diferente (seria uma deliberação substituta, mas não substituta-renovadora).”

Menezes Cordeiro, in “Código das Sociedades Comerciais Anotado”, 2009, em nota ao art. 62º, pág. 236:

 “Deliberações nulas. O 62.°/1 admite a renovação apenas das deliberações nulas por vícios de procedimento – os contemplados no 56.°/l, d) e 6): desde que removidos os vícios em causa. A contrario e pela natureza das coisas, não é possível a renovação de deliberações nulas por vícios de fundo – 56.°/1, c) e d): a remoção do vício implicaria já deliberações diferentes. É viável a renovação de uma deliberação declarada nula com trânsito em julgado: desde que sem o vício. Não é logicamente possível a renovação de deliberação inexistente (e isso para quem admita tal vício).

Deliberações anuláveis são sempre renováveis, desde que afastado o vício. Em rigor, se o vício for material, a nova deliberação já terá um conteúdo diferente, não sendo puramente renovatória.”

Uma deliberação é passível de renovação, nos termos do art. 62º, nº2, do Código das Sociedades Comerciais, desde que “esta não enferme do vício da precedente”, ou seja, não replique o vício da deliberação que se pretende substituir.

Se a Ré, sem recorrer a juízo, pretende, através da renovação de uma deliberação que não poderia tomar no contexto da AG, (por postular o recurso a juízo), decidir por outra deliberação em assembleia geral, a sua renovação contém, em si, o germe da nulidade da deliberação ratificanda que, contaminando-a, a invalida, pelo que não existe renovação.

A deliberação renovatória, proclamada na assembleia geral da Ré de 23.1.2013, de “ratificação” da deliberação de destituição de gerente é nula, nos termos do art.º 56º, nº1, al. d) do Código das Sociedades Comerciais, na medida em que contraria disposição legal de “carácter imperativo”.

Vejamos a 2ª questão – se, na AG de 23.1.2013, a Autora foi “destituída” de sócia, em bom rigor, se foi excluída de sócia, (ponto 2 da acta) – art. 242º do Código das Sociedades Comerciais.

A questão passa pela interpretação do ponto 2 da ordem de trabalhos da AG.

Vejamos o seu teor: “Deliberar sobre a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, em face da prática de actos pela mesma lesivos dos interesses da sociedade, tendo a própria apresentado uma factura em seu nome e procedido ao seu pagamento à revelia dos gerentes, bem sabendo que não estava autorizada a realizar tal pagamento em proveito próprio, ficando o gerente da sociedade CC autorizado a intentar a competente acção judicial, podendo constituir mandatário para a sociedade e reclamar a restituição da mesma verba”.

Foi deliberado: “Pelos fundamentos constantes da ordem de trabalhos a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, mandatando o referido Sr. Dr. DD, Advogado (…) para representar a sociedade nas acções judiciais referidas na ordem de trabalhos.”

A Autora, face ao teor da ordem de trabalhos e da referida deliberação, entendeu que foi excluída de sócia.

Na sentença da 1ª Instância – fls. 237 a 238 – foi decidido, com apelo art. 236º, nº1, do Código Civil, atendendo à convocatória e ao teor da deliberação, que a Autora não foi “destituída de sócia”.

Tal decisão coloca a tónica interpretativa na parte executiva da deliberação: “ficando o gerente da sociedade CC autorizado a intentar a competente acção judicial, podendo constituir mandatário para a sociedade” e na deliberação pode ler-se “mandatando o referido Sr. Dr. DD, Advogado (…) para representar a sociedade nas acções judiciais referidas na ordem de trabalhos”.  

Escrevendo:

“Apelando aos princípios da interpretação das declarações – art. 236° do Código Civil – afigura-se-nos que o declaratário normal entenderia esta deliberação não como deliberação de exclusão da sócia, mas antes como deliberação preliminar, habilitando o gerente a constituir mandatário para propor a acção de exclusão e a acção prescrita no art.75° do Código das Sociedades Comerciais.

Parece-nos que apenas esta interpretação permite dar sentido útil ao texto da deliberação que alude “às acções judiciais referidas na ordem de trabalhos” e à constituição de um advogado. E, nesta interpretação, a deliberação não padece de qualquer vício, pois é legalmente admissível (e até prescrita).”

Concluindo, destarte, que tal deliberação é válida, não existindo vício de conteúdo.

Já o Acórdão recorrido, apelando ao mesmo critério hermenêutico – art. 236º, nº1, do Código Civil – considera que a deliberação foi de exclusão da Autora de sócia da Ré e não de “uma mera intenção de exclusão”.

De todo o modo considerou a deliberação nula, porquanto, sendo apenas dois os sócios da sociedade, a exclusão não podia ter sido deliberada em AG, antes mas teria que ser decretada judicialmente.

Como interpretar a declaração excludente?

Sobre a exclusão de sócio:

O art. 242.°, nº1, do Código das Sociedades Comerciais estatui: “Pode ser excluído por decisão judicial o sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade lhe tenha causado ou possa vir a causar-lhe prejuízos relevantes.”

A exclusão de sócio, que só pode ser decretada por via judicial, precedida de deliberação societária, depende de actuação do sócio que age de forma desleal ou adopta procedimentos que, perturbando gravemente o funcionamento da sociedade, tenham causado, ou possam vir a causar-lhe graves prejuízos.

Por um lado, importa analisar o comportamento subjectivo do sócio, nas suas relações com a sociedade e, por outro, sob o prisma da sociedade, importando que essa actuação se revista objectivamente de gravidade tal que perturbe o seu funcionamento ou lhe cause, ou possa causar, prejuízos sérios.

Tal como em relação aos gerentes, nas suas relações entre si e a sociedade, entre esta e os sócios, e entre ela e terceiros, a lei exige deveres de conduta – art. 64º, nº1, do Código das Sociedades Comerciais –,também em relação aos sócios, sob pena de exclusão, a lei societária impõe actuações pautadas pela lealdade, em prol dos interesses sociais, sancionando a violação desse dever, desde que tenha causado, ou possa causar, pela sua gravidade, “prejuízos relevantes”.

Como se pode ler no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 15.5.2005, Proc. 04A4369, in www.dgsi.pt:  

“O instituto da exclusão de sócio encontra fundamento na protecção do fim do contrato de sociedade, traduzido no interesse social, “enquanto elemento comum aos interesses dos sócios contratantes e meio contratual de satisfação dos seus interesses distintos”. Assim, a exclusão justifica-se quando o interesse social é posto em causa por um sócio que, por via da violação das suas obrigações, conduza a resultados ou efeitos que prejudiquem o fim social.

Daí que a sociedade só possa resolver o contrato em relação a determinado sócio, mediante a exclusão, quando este ponha em causa, não em função dos seus incumprimentos, mas dos seus efeitos, o interesse social (vide Luís Menezes Leitão, “Pressupostos da Exclusão de Sócio nas Sociedades Comerciais”, A.A.F.D.L., 1988, p. 41 e ss). O sócio está, pois, obrigado a não violar deveres de conduta que possam causar prejuízos à sociedade.

Entre estes deveres acessórios apontam-se os de esclarecimento, de colaboração e de lealdade, deveres que fazem parte do conteúdo das obrigações, como exigências gerais do sistema jurídico - cfr. Menezes Cordeiro, “Direito das Obrigações”, I, 1994, 149.”

 No caso em apreço, é imputada à Autora, enquanto sócia da Ré (a sociedade já a quis destituir de gerente), uma conduta lesiva da sociedade, sendo claro o propósito, por via das deliberações (inválidas) da assembleia geral, bani-la de gerente, primeiro, e depois, de sócia.

  No Estudo “A Exclusão de Sócios (Em Particular nas Sociedades por Quotas) ”, de Carolina Cunha, in “Problemas do Direito das Sociedades”, IDET, 2002, págs. 211-212, pode ler-se:

 “O art. 242º, n.°1, recorre a uma formulação abrangente para recortar o universo de eventos susceptíveis de conduzir à exclusão do sócio, em vez de proceder a uma tipificação baseada em múltiplas hipóteses normativas, como acontecia no art. 186°, n.°1.

Mas, se procedermos à análise da cláusula geral contida na norma, lograremos isolar as características-chave dos factos potencialmente relevantes.

Em primeiro lugar, deverá tratar-se de um comportamento do sócio, não atribuindo a lei qualquer eficácia constitutiva a factos que o atinjam na sua situação. 

Será, ainda, necessário que o comportamento adoptado pelo sócio apresente uma de duas características – que seja desleal ou que seja gravemente perturbador do funcionamento da sociedade. 

Todavia, isto não basta para determinar a exclusão. É imprescindível que esse comportamento do sócio tenha causado ou possa vir a causar a sociedade prejuízos relevantes. Aqui reside, quanto a nós, o fulcro nevrálgico do instituto da exclusão de sócios na sociedade por quotas: a avaliação da prejudicialidade para o ente societário da superveniência de um facto relativo à pessoa do sócio. 

Na dinâmica da cláusula geral do art. 242°, n.°1, os factos relevantes restringem-se a certas condutas dos sócios – condutas em si mesmas já passíveis de um juízo de desvalor, quer por violarem princípios de lealdade, quer por entravarem o funcionamento da sociedade. Mas somos de opinião que a nota essencial, aquela que, no seio do tipo sociedade por quotas, confere sentido à opção legislativa pela prevalência do interesse da sociedade e que alicerça a concomitante inexigibilidade da permanência do sócio, reside no prejuízo, actual ou potencial, que tais condutas provocam. Na ausência de prejuízo, o desvalor contido nos comportamentos dos sócios não bastará para fundar a respectiva exclusão.”

Numa sociedade comercial por quotas, as características pessoais dos sócios, a comunhão de objectivos, a fidelidade, a solidariedade e coesão, em vista da prossecução do objectivo social, affectio societatis, ou bona fides societatis, são valores cívicos e jurídicos que exprimem lealdade, assumindo primordial relevância.

Um sócio de uma sociedade age com lealdade se não coloca acima do interesse da sociedade, o mero interesse egoísta. A lealdade é um valor inerente à indispensável coesão da sociedade, em ordem a prosseguir o seu fim lucrativo em benefício dos sócios que a constituem.

A actuação desleal do sócio, se se repercutir na sociedade, denegrindo-a aos olhos daqueles com quem se relaciona, ou se o comportamento censurável do sócio é idóneo a causar prejuízos, ou a possibilidade de prejuízos relevantes, ainda que não imediatamente, mesmo que esses prejuízos não sejam de cariz patrimonial, deve ser sancionada com a exclusão, nos termos do art. 242º, nº1, do Código das Sociedades Comerciais.

Como se pode ler no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 15.5.2005, Proc. 04A4369, in www.dgsi.pt:  

“O instituto da exclusão de sócio encontra fundamento na protecção do fim do contrato de sociedade, traduzido no interesse social, “enquanto elemento comum aos interesses dos sócios contratantes e meio contratual de satisfação dos seus interesses distintos”. Assim, a exclusão justifica-se quando o interesse social é posto em causa por um sócio que, por via da violação das suas obrigações, conduza a resultados ou efeitos que prejudiquem o fim social.

Daí que a sociedade só possa resolver o contrato em relação a determinado sócio, mediante a exclusão, quando este ponha em causa, não em função dos seus incumprimentos, mas dos seus efeitos, o interesse social (vide Luís Menezes Leitão, “Pressupostos da Exclusão de Sócio nas Sociedades Comerciais”, A.A.F.D.L., 1988, p. 41 e ss). O sócio está, pois, obrigado a não violar deveres de conduta que possam causar prejuízos à sociedade.

Entre estes deveres acessórios apontam-se os de esclarecimento, de colaboração e de lealdade, deveres que fazem parte do conteúdo das obrigações, como exigências gerais do sistema jurídico - cfr. Menezes Cordeiro, “Direito das Obrigações”, I, 1994, 149.”

 No caso em apreço, é claro o desvalor da conduta imputada à sócia recorrida, que a provar-se, evidenciaria deslealdade e um propósito alheio ao interesse social.

  No Estudo “A Exclusão de Sócios (Em Particular nas Sociedades por Quotas) ”, de Carolina Cunha, in “Problemas do Direito das Sociedades”, IDET, 2002, págs. 211-212, pode ler-se:

 “O art. 242º, n.°1, recorre a uma formulação abrangente para recortar o universo de eventos susceptíveis de conduzir à exclusão do sócio, em vez de proceder a uma tipificação baseada em múltiplas hipóteses normativas, como acontecia no art. 186°, n.°1.

Mas, se procedermos à análise da cláusula geral contida na norma, lograremos isolar as características-chave dos factos potencialmente relevantes.

Em primeiro lugar, deverá tratar-se de um comportamento do sócio, não atribuindo a lei qualquer eficácia constitutiva a factos que o atinjam na sua situação. 

Será, ainda, necessário que o comportamento adoptado pelo sócio apresente uma de duas características – que seja desleal ou que seja gravemente perturbador do funcionamento da sociedade. 

Todavia, isto não basta para determinar a exclusão. É imprescindível que esse comportamento do sócio tenha causado ou possa vir a causar a sociedade prejuízos relevantes. Aqui reside, quanto a nós, o fulcro nevrálgico do instituto da exclusão de sócios na sociedade por quotas: a avaliação da prejudicialidade para o ente societário da superveniência de um facto relativo à pessoa do sócio. 

Na dinâmica da cláusula geral do art. 242°, n.°1, os factos relevantes restringem-se a certas condutas dos sócios – condutas em si mesmas já passíveis de um juízo de desvalor, quer por violarem princípios de lealdade, quer por entravarem o funcionamento da sociedade. Mas somos de opinião que a nota essencial, aquela que, no seio do tipo sociedade por quotas, confere sentido à opção legislativa pela prevalência do interesse da sociedade e que alicerça a concomitante inexigibilidade da permanência do sócio, reside no prejuízo, actual ou potencial, que tais condutas provocam. Na ausência de prejuízo, o desvalor contido nos comportamentos dos sócios não bastará para fundar a respectiva exclusão.”


Ora, no “ambiente” de hostilidade que se entrevê, cumpre indagar qual o sentido comunicativo que colheria da falada deliberação, um declaratário normal colocado na posição do real declaratário – a Autora – conhecendo os factos que dela eram conhecidos e a actuação da sociedade.

 O Código Civil, no art. 236º, no que concerne à interpretação da declaração negocial, dispõe:

1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
                2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.

Os Professores Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. I, pág. 233, em nota ao art. 236º do Código Civil, ensinam:

“ […] A regra estabelecida no nº l, para o problema básico da interpretação das declarações de vontade, é esta: o sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um declaratário normal, ou seja, media­namente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante. Exceptuam-se apenas os casos de não poder ser imputado ao declarante, razoavelmente, aquele sentido (nº 1), ou o de o declaratário conhecer a vontade real do declarante (nº 2).

(...) O objectivo da solução aceite na lei é o de proteger o declaratário, conferindo à declaração o sentido que seria razoável presumir em face do comportamento do declarante, e não o sentido que este lhe quis efectiva­mente atribuir.

Consagra-se assim uma doutrina objectivista da interpretação, em que o objectivismo é, no entanto, temperado por uma salutar restrição de inspiração subjectivista.

(...) A normalidade do declaratário, que a lei toma como padrão, exprime-se não só na capacidade para entender o texto ou conteúdo da declaração, mas também na diligência para recolher todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante.”

O declaratário normal deve ser uma pessoa com “razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas fixando-a na posição do real destinatário, isto é, acrescentando as circunstâncias que este conheceu concretamente e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo”- Paulo Mota Pinto, in “Declaração Tácita”, 1995, 208.

Na ponderação do critério acolhido no art. 236º do Código Civil, que consagra a teoria da impressão do destinatário, não sendo essa interpretação dissociável do sentido que se visa com o comportamento declarativo, ainda que imperfeitamente expresso, sendo manifesta a intenção, primeiro de afastar a Autora da gerência, e, depois, de sócia, deliberando a sociedade mandatar um Advogado para intentar a competente acção judicial, pese embora alguma equivocidade, já que a ordem de trabalhos pode ser interpretada no sentido de uma deliberação que teria de ser executada ulteriormente, um declaratário real concluiria que o fim primordial, não foi o de exprimir uma intenção, foi, ao invés, afirmar uma decisão e essa decisão foi a de exclusão de sócia da Autora.

O texto não consente dúvidas: “Deliberar sobre a destituição de sócia da sociedade da sócia AA, em face da prática de actos pela mesma lesivos dos interesses da sociedade, tendo a própria apresentado um factura em seu nome e procedido ao pagamento à revelia dos gerentes, bem sabendo que não estava autorizada a realizar tal pagamento em proveito próprio, ficando o gerente da sociedade CC autorizado a intentar a competente acção judicial, podendo constituir mandatário para a sociedade e reclamar a restituição da mesma verba”.

 O trecho inicial até “proveito próprio”, evidencia a pronúncia e a deliberação de exclusão, fundada motivos que enuncia, já a 2ª parte, tem um cariz executivo da decisão que antes foi tomada.

No Acórdão recorrido afirmou-se que a deliberação de exclusão da sócia, tendo a sociedade ré dois sócios, apenas pode ser decidida através de acção proposta em juízo.

Se a deliberação para destituição de gerente, tendo a sociedade apenas dois sócios, só pode ser tomada em acção judicial adrede intentada, não faria sentido, sendo a disputa “sócio contra sócio”,             que um dos sócios, apenas como o seu voto possa excluir o outro de sócio sem recorrer a tribunal;  o sócio maioritário determinava sozinho a deliberação. 

 Não constituindo a gerência um direito especial, sendo a função ou cargo transitório, o sócio destituído da gerência, permanece como sócio; todavia, a exclusão de sócio é bem mais gravosa para o excluído. Por maioria de razão, a exclusão de sócio só poderá, no caso de serem dois os sócios, ser validamente decretada por sentença.

É esse o entendimento de Paulo Olavo da Cunha, in “Direito das Sociedades Comerciais”, 6ª edição- 2016, Almedina, pág. 500 (citado na decisão recorrida)

 “O afastamento compulsivo do sócio pode ocorrer por determinação judicial, independentemente de previsão contratual, quando a conduta do sócio compromete a sua manutenção na sociedade (cf. art.º 242º), ou sempre que uma sociedade tem apenas dois sócios e se verifica uma situação que, nos termos do contrato de sociedade, conduziria à exclusão por deliberação. Com efeito, nas sociedades que apenas têm dois sócios, a exclusão, ainda que alicerçada na verificação de previsão contratual, tem de ser judicialmente decidida, uma vez que o sócio a excluir está impedido de exercer o seu direito de voto (cf. art.º 251º, nº 1, alínea d).

Admitir a exclusão por deliberação equivaleria e entregar a decisão ao sócio proponente da exclusão, o que se afigura inadequado. Embora o artigo 242º seja omisso sobre esta questão, a razão de ser é a mesma da destituição do sócio-gerente por justa causa (cf. arts. 257º, nº5 e 251º, nº 1, alínea f)) ”.

Dissonante, mas com dúvidas, parece ser a perspectiva de Carolina Cunha, in “Código das Sociedades Comerciais em Comentário”, n.°3, págs. 584 a 587.

Mutatis mutandis são aqui convocáveis os argumentos, antes citados, de Raúl Ventura a propósito do art. 257º, nº5º do Código das Sociedades Comerciais.

Ademais, por força do art. 2º[3] do Código das Sociedades Comerciais, direito subsidiário, é aplicável a norma do art. 1005º, nº3, do Código Civil.

Menezes Cordeiro, obra citada, em comentário ao art. 2º, pág. 63:

“Sistema de fontes. O 2.° fixa um sistema complexo de fontes para as sociedades comerciais: deve ser ordenado, complementando-se com os estatutos sociais e, a montante, com o esquema próprio do Código Civil. Feitas as competentes operações, temos o seguinte quadro:

 

I – Direito imperativo: (a) regras específicas sobre o tipo considerado; (b) regras da parte geral, (c) regras do Código aplicáveis aos casos análogos (2.°, 1.ª parte); princípios informadores do tipo adoptado (2.°, 3.” Parte); princípios gerais do Código (idem); regras do Código Civil sobre o contrato de sociedade (2.°, 2.ª parte); analogia geral (10.°/1, do Código Civil); espírito do sistema (10.°/3, do mesmo Código);

II – Contrato de sociedade, em matéria não regulada na lei ou tratado em meras normas supletivas;

III — Deliberações dos sócios, perante questões não reguladas nem pela lei, nem pelo contrato de sociedade e, ainda, quando estando em causa normas supletivas, o contrato de sociedade admita a sua derrogação por deliberações, nos termos do 9.°/3;

 IV — Direito supletivo, de acordo com a sequência indicada para o Direito imperativo, na falta de norma contratual aplicável.”

O art. 1005º, nº3, do Código Civil consigna: “Se a sociedade tiver apenas dois sócios, a exclusão de qualquer deles só pode ser pronunciada pelo tribunal.”

No “Código Civil Anotado”, vol. II, de Pires de Lima e Antunes Varela, pág. 321, pode ler-se:

“No caso previsto no n.º3, não há deliberação a comunicar, porque a sociedade (o outro sócio) não pode deliberar. O tribunal é que o vai fazer, e, por conseguinte, o prazo conta-se a partir da notificação da sentença.”

Pelo quanto dissemos o Acórdão recorrido não merece censura.

Sumário – art. 663º, nº7, do Código de Processo Civil

Decisão:

Nega-se a revista.

Custas pela Ré/recorrente.

                       

Supremo Tribunal de Justiça, 26 de fevereiro 2019

Fonseca Ramos (Relator)

Ana Paula Boularot

Pinto de Almeida

___________________
[1] Relator – Fonseca Ramos
Ex.mos Adjuntos:
Conselheira Ana Paula Boularot
Conselheiro Pinto de Almeida
[2] Há patente lapso de escrita no ponto 7) da matéria de facto quanto à data da Assembleia-geral, que foi convocada para 4.1.2013 e não 4.1.2012, como decorre do documento de fls. 27 e, ainda do ponto 8) da matéria de facto, estando aí correctamente indicada.
[3] “Os casos que a presente lei não preveja são regulados segundo a norma desta lei aplicável aos casos análogos e, na sua falta, segundo as normas do Código Civil sobre o contrato de sociedade no que não seja contrário nem aos princípios gerais da presente lei nem aos princípios informadores do tipo adoptado.”