Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
053895
Nº Convencional: JSTJ00008190
Relator: ROBERTO MARTINS
Descritores: ARRENDAMENTO
USUFRUTO
COMPROPRIEDADE
RENDA
RECEBIMENTO INDEVIDO
COMPROPRIETARIO
CONSENTIMENTO
EFICACIA DO NEGOCIO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ195005170538951
Data do Acordão: 05/17/1950
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Referência de Publicação: DG IªS 30-05-1950;BMJ N19 ANO1950 PAG318
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO.
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 5/1950
Área Temática: DIR CIV - DIR CONTRAT.
Legislação Nacional: CCIV867 ARTIGO 643 ARTIGO 648 ARTIGO 651 ARTIGO 652 ARTIGO 1270 N4 ARTIGO 1318 ARTIGO 1598 ARTIGO 2085.
CPC39 ARTIGO 768 ARTIGO 1018.
D 5411 DE 1919/04/17 ARTIGO 5.
L 2030 DE 1948/06/22.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1947/02/25 IN BOL OF ANOVII N39 PAG97.
ACÓRDÃO STJ DE 1939/02/03 IN COL OF ANO38 PAG29.
ACÓRDÃO STJ DE 1934/03/20 IN COL OF ANO33 PAG85.
ASSENTO STJ DE 1950/05/10 IN BMJ N19 PAG305.
Sumário :
No dominio da legislação anterior a Lei n. 2030, findo o usufruto, o recebimento da renda de um predio arrendado pelo usufrutuario e a passagem de recibos de renda por um dos comproprietarios não obriga os demais comproprietarios, a não ser que se mostre, por qualquer forma, que estes deram o seu consentimento para tal, pois, neste caso, o arrendamento se considera renovado.
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferencia no Supremo Tribunal de Justiça, em secções reunidas:

A e o seu marido; B e sua mulher; C e mulher; D e mulher e E; autores nestes autos, recorreram para o Tribunal Pleno do acordão deste Supremo Tribunal de folhas 221 e seguintes em que se decidiu:

1 - Que a caducidade do arrendamento, extinto o usufruto, se não opera ipso jure;


2 - Desde que o proprietario consolidado continua a comportar-se como senhorio recebendo as rendas e passando o competente recibo, da-se a ratificação do antigo contrato, que continua a subsistir;


3 - Tendo um dos comproprietarios continuado a receber as rendas, não manifestando os outros qualquer discordãncia quanto ao recebimento das rendas, nem quanto a pessoa que as recebia, conclui-se que deram o seu assentimento , nos termos do artigo 648 do Codigo Civil.
Nestas condições se decidiu que quem recebia as rendas e passava os recibos era mandatario verbal, como admite o artigo 1318 do Codigo Civil; e que, assim, os autores ratificaram o antigo contrato feito pelo usufrutuario, sem necessidade de ser modificado ou renovado.
E recorreram, porque este acordão se encontra em oposição, sobre os mesmos pontos de direito, com os acordãos anteriores transitados em julgado, de 25 de Fevereiro de 1947 (Boletim Oficial, ano VII, n. 39, a paginas 97), de 3 de Fevereiro de 1939 (Colecção Oficial, ano 38, paginas 29 e 30), e de 20 de Março de 1934 (Colecção Oficial, ano 33, paginas 85), que sobre os tres pontos de direito referidos decidiram em sentido inteiramente oposto, isto e, que: a) A caducidade se opera ipso jure; b) Que o facto do consolidado proprietario por obito do usufrutuario, ter posteriormente recebido rendas e passado recibo ao inquilino não importa renovação do contrato nem impede a acção de despejo; c) Que o comproprietario do predio indiviso não pode da-lo de arrendamento, sem consentimento dos outros (artigo 5 do Decreto n. 5411), e que esse consentimento so por escrito tem valor, pois o consentimento da usufrutuaria e um elemento do contrato e, por isso, tem que manifestar-se pela forma que a lei prescreve e, assim, o consentimento dos comproprietarios tem de ser prestado pela forma exigida na lei para a validade do contrato.


A oposição sobre os mesmos pontos de direito e manifesta, como ja foi reconhecido no acordão que mandou seguir o recurso.


Os recorrentes pedem que se tire Assento, no sentido da doutrina sustentada nos acordãos referidos em oposição com o acordão recorrido.
Cumpre decidir:


Quanto aos dois primeiros pontos o caso acha-se resolvido pelo assento de 10 de Maio corrente.


Assim e que foi tirado o assento nos seguintes termos:
"No dominio da legislação anterior a Lei n. 2030 a caducidade do arrendamento feito pelo usufrutuario não se opera ipso jure com a extinção do usufruto.


E se, findo este, o proprietario recebeu a renda e passou o respectivo recibo, considera-se renovado o arrendamento".


Fazendo-se aplicação deste assento, quanto a estes dois pontos e de manter-se o acordão recorrido, que sobre estes pontos sustentou a doutrina ora fixada pelo assento referido de 10 de Maio corrente.
Como assim, ha que tirar Assento, apenas, sobre o terceiro ponto de direito.
Vejamos.
Dispoe-se no artigo 5 do Decreto n. 5411 que o comproprietario de predio indiviso não pode da-lo de arrendamento sem consentimento dos outros comproprietarios, disposição identica a que se achava no Codigo Civil, no artigo 1598.


Assim, sendo varios comproprietarios e um so deles não podendo dar de arrendamento o predio indiviso, logico e concluir-se que não pode passar os recibos das rendas, findo o usufruto, sem consentimento dos demais comproprietarios.
Fazendo-o sem esse consentimento, tal não pode obrigar os outros comproprietarios.
Mas, se os comproprietarios agem por forma que revele que dão o seu assentimento ao recebimento das rendas vencidas, desde que no assento de 10 de Maio corrente se estabeleceu que o recebimento da renda e a passagem do recibo implica o considerar-se renovado o arrendamento, forçoso e concluir da mesma forma, no caso vertente, isto e, que o arrendamento continua a ter existencia legal para todos os comproprietarios.
Ora, vem dado como provado, pelas instancias que, no caso dos autos os autores aceitaram o pagamento da renda durante mais de oito anos, primeiro por intermedio do pai, embora com recibo feito por uma das autoras e, depois, por morte daquele, com recibos passados pela mesma e cobrados pelos outros irmãos, o que, dizem as instancias rever por forma clara o acordo tacito, dos autores, de manterem como mantiveram durante oito anos o contrato de arrendamento do predio de que passaram a ter propriedade plena desde o falecimento da usufrutuaria.


Com efeito, de tais factos licitos e concluir-se, visto o disposto no artigo 648 do Codigo Civil, o consentimento dos comproprietarios, quanto ao recebimento da renda e passagem dos recibos e, portanto, na continuação do arrendamento.


Como assim, acordam negar provimento ao recurso, confirmando o acordão recorrido com custas pelos recorrentes.


E, em obediencia a Lei, tiram o seguinte Assento:
No dominio da legislação anterior a Lei n. 2030, findo o usufruto, o recebimento da renda de um predio arrendado pelo usufrutuario e a passagem de recibos de renda por um dos comproprietarios não obriga os demais comproprietarios a não ser que se mostre por qualquer forma que estes deram o seu consentimento para tal, pois neste caso o arrendamento se considera renovado.



Lisboa, 17 de Maio de 1950

Roberto Martins (Relator) - Alvaro Ponces - Mario de Vasconcelos - Antonio de Magalhães Barros - Pedro de Albuquerque - Rocha Ferreira - Jose de Abreu Coutinho - Artur A. Ribeiro - Campelo de Andrade -
- Bordalo e Sa - A. Bartolo - A. Cruz Alvura - Lencastre da Veiga - Raul Duque (Vencido: Embora discordando da doutrina do assento de 10 de Maio corrente, tenho de lhe dar acatamento, quanto aos dois primeiros pontos, por força do estatuido no 3 periodo do artigo
768 do Codigo de Processo Civil. Quanto a orientação do presente Assento em relação ao 3 ponto, e unico por este discutido, divirjo ainda.
Claro que nos termos do artigo 5 do Decreto n. 5411 e 1598 e n. 4 do artigo 1270 do Codigo Civil, a passagem dos recibos de renda por um dos comproprietarios do predio indiviso, não pode obrigar os outros comproprietarios. Mas traduzindo ele, no espirito do Assento, a prorrogação ou a existencia de um arrendamento, que e um contrato para cuja validade e necessaria a coexistencia dos 3 requisitos referidos no artigo 643 do Codigo Civil, não pode aquele conjunto de circunstancias surgir da simples passagem de recibos de renda feito por um so comproprietario quando se ignore se todos os comproprietarios são capazes e, sendo-o, se prestaram para tanto o seu consentimento, pois muitas vezes sucede que ate os ausentes em parte certa ficam surpreendidos ao tomarem conhecimento de que se encontra arrendada (?) a sua quota parte no predio comum indiviso.


Compreende-se a existencia de um arrendamento precario, por exemplo, o feito pela cabeça de casal ate se ultimarem as partilhas, artigos 2085 do Codigo Civil, e 1018 do Codigo de Processo Civil, porque isto representa um acto de mera administração, mas não se compreende que deixem de obsrvar-se os preceitos dos artigos 651 e 652 do Codigo Civil, mantendo-se durante anos uma situação de facto que pode ser altamente prejudicial para os incapazes ou para os que, ignorando a existencia de uma tal situação, se vejam, no entanto, sujeitos a uma obrigação que não criaram, mas que parece ser protegida pelo Assento, sempre que por qualquer forma se mostre o seu consentimento.


De resto, se ha arrendamentos que podem ser verbais, outros ha para os quais a lei exige ate a escritura publica, e certamente que a intenção do Assento não pode envolver o desejo de violação daquelas normas).