Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
12198/14.6T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: TOMÉ GOMES
Descritores: PERDA DE CHANCE
ADVOGADO
CONTRATO DE MANDATO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
ÓNUS DA PROVA
MATÉRIA DE FACTO
JUÍZO DE PROBABILIDADE
DANO
INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
EXPROPRIAÇÃO
RECURSO DE REVISTA
OBJECTO DO RECURSO
OBJETO DO RECURSO
Data do Acordão: 11/30/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DOS DIREITOS / PROVAS – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÕES EM GERAL / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / ELABORAÇÃO DA SENTENÇA / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA.
DIREITO ADMINISTRATIVO – CONTEÚDO DA INDEMNIZAÇÃO.
Doutrina:
-Carlos Alberto Fernandes Cadilhe, Regime da responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, Anotado, Coimbra Editora, 2011, 98-99;
-Paulo Mota Pinto, Perda de chance processual, in RLJ Ano 145.º, Março-Abril de 2016, 174 e ss., 186 e ss. e 190.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.º E 566.º, N.º 3.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 609.º, N.º 2, 639.º, N.º 2 E 674.º, N.ºS 1, ALÍNEA A) E 3.
CÓDIGO DAS EXPROPRIAÇÕES (CEXP): - ARTIGOS 23.º, N.º 1, 25.º, N.º 2 E 26.º, N.ºS 4, 5, 6, 8 E 9.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 22-10-2009, PROCESSO N.º 409/09. 4YFLSB;
- DE 29-04-2010, PROCESSO N.º 2622/ 07.0TBPNF.P1.S1;
- DE 05-02-2013, PROCESSO N.º 488/09.4TBESP.P1.S1;
- DE 14-03-2013, PROCESSO N.º 78/09.5TVLSB.L1.S1;
- DE 30-09-2014, PROCESSO N.º 739/09.5TVLSB.L2-A.DS1;
- DE 09-07-2015, PROCESSO N.º 5105/12.2TBSXL.L1.S1, TODOS DISPONÍVEIS IN WWW.DGSI.PT.



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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:


- DE 14-05-2015, RELATOR MANUEL MARQUES.
Sumário :
I. No domínio da perda de chances processuais, como é aquele em que se inscreve o presente caso, a primeira questão está em saber se o hipotético sucesso do desfecho processual decorrente do recurso que o 1.º R. deixou de interpor assume um padrão de consistência e de seriedade que, face ao estado da doutrina e jurisprudência então existente, ou mesmo já em evolução, se revela suficientemente provável para o reconhecimento do dano. 

II. Para tanto, importa fazer o chamado “julgamento dentro do julgamento”, não propriamente no sentido da solução jurídica que pudesse ser adotada pelo tribunal da ação sobre a matéria da causa em que ocorreu a falta, mas sim pelo que possa ser considerado como altamente provável que o tribunal da ação em que a defesa ficou prejudicada viesse a decidir.

III. Tal apreciação versa enquanto tal, nuclearmente, uma questão de facto, que extravasa os fundamentos da revista, sem prejuízo de poder porventura envolver erros de direito sobre a apreciação da prova ou em sede do quadro normativo aplicável, estes sim passíveis de serem sindicáveis em sede de revista.

IV. O ónus de prova de tal probabilidade impende sobre o lesado, como facto constitutivo que é da obrigação de indemnizar (art.º 342.º, n.º 1, do CC).

V. Num caso em que a elevada improbabilidade do sucesso de um recurso deixado de interpor num processo de expropriação litigiosa foi ajuizada pelo Tribunal da Relação, em divergência com o decidido em 1.ª instância, com base na análise factual e na normalidade urbanística atinentes às características da parcela expropriada, sem que se divise erro de direito na apreciação das provas nem do quadro normativo aplicável, nos termos definidos nos artigos 639.º, n.º 2, e 674.º, n.º 1 e 3, do CPC, não cabe ao tribunal de revista sindicar tal apreciação.

Decisão Texto Integral:
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:



I – Relatório


1. AA (1.º A.) e BB (2.º A.) instauraram, em 04/12/2014, uma ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra CC (1.º R.), advogado, e DD - Seguros Gerais, S.A. (2.ª R.), a pedir a condenação a 2.ª R. a pagar-lhes a quantia de € 300.000,00, acrescida de juros desde a citação, e o 1.º R. no valor que, até aquele montante, exceda porventura o capital de seguro, a título de indemnização pela perda de chance dos A.A. pelo facto de o 1.º R., na qualidade de seu advogado, não ter interposto recurso para a Relação da sentença proferida em 1.ª instância no processo n.º 370/05. 0TBNIS. 

Alegaram para tanto, em resumo, que:

- O 1.º R., na qualidade de advogado, foi mandatado para representar os A.A. no processo de expropriação litigiosa que correu termos no tribunal de ... sob o n.º 307/05.0TBNIS, tendo por objeto uma parcela de terreno destacada de um prédio rústico, sito na freguesia de …, necessário à construção pelo Município de … do Complexo Termal da …, no âmbito do qual foi proferido acórdão arbitral a fixar a indemnização em € 79.678,26, considerando o terreno “solo para outros fins”;

- Interposto recurso para o tribunal da 1.ª instância com o fundamento de que a parcela expropriada devia ser considerada “solo apto para a construção”, tal entendimento foi acolhido pela sentença ali proferida, sendo fixada a indemnização em € 195.204,13;

- No entanto, os AA tinham fundada expetativa de receber a indemnização de € 1.973.503,59 com base num índice de construção superior ao tido em conta na sentença e, por isso, em reunião com o 1.º R., ficou assente que seria interposto recurso daquela decisão, no caso de o valor da indemnização ser inferior a um milhão de euros.

- Porém, o 1.º R. não cumpriu tal instrução, não interpondo recurso, como ficara acordado;

- O 1.º R. beneficiava de um contrato de seguro celebrado entre a 2.ª R. DD e a Ordem dos Advogados a coberto do qual se havia transferido para a seguradora a responsabilidade civil decorrente dos prejuízos causados a terceiros no âmbito da sua atividade profissional.

2. A 2.ª R. contestou a impugnar o fundamento da sua responsabilização, sustentando que o contrato de seguro foi celebrado e iniciou a sua vigência em 2012, portanto depois do alegado incumprimento do mandato ter ocorrido, não beneficiando, por isso, da cobertura contratada com o 1.º R., concluindo pela sua absolvição do pedido.

3. O 1.º R. também contestou a impugnar os factos alegados pelos A.A. e a sustentar que, embora, por lapso, tivesse deixado de interpor recurso da sentença, era manifesta a improbabilidade da procedência do recurso visado, concluindo pela sua absolvição do pedido.

4. Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 482-507, datada de 27/09/2016, a julgar a ação parcialmente procedente e a condenar:

a) - A 2.ª R. DD a pagar aos A.A. o valor correspondente ao aumento da indemnização fixada pelo Tribunal Judicial de … decorrente do aumento do índice de construção para 20%, até ao limite de € 150.000,00 e deduzida a franquia de € 5.000,00, a calcular em sede de liquidação;

b) – O 1.º R. CC a pagar aos A.A. a eventual diferença entre o aumento da indemnização e o limite da responsabilidade da 2.ª R. (€ 150.000,00), bem como da franquia de € 5.000,00;

c) – os R.R. a pagar, respetivamente, juros de mora sobre as quantias em que são condenados, calculados à taxa legal de 4% desde a data da citação e até integral e efetivo pagamento.

5. Inconformados com essa decisão, tanto os A.A. como a 2.ª R. apelaram dela para o Tribunal da Relação de …, tendo sido proferido o acórdão de fls. 661-687, datado de 21/03/2017, a julgar improcedente o recurso interposto pelos A.A. e procedente o recurso interposto pela 2.ª R., absolvendo os R.R. do pedido.

6. Desta feita, vêm os A.A. pedir revista, formulando as seguintes conclusões:

1.ª - O acórdão recorrido excedeu o objeto do recurso interposto pela R. DD, S.A., na medida em que decide sobre questões que esta R. não suscitou, nem no corpo das suas alegações, nem nas conclusões das mesmas;

2.ª - Tais questões, como sejam as de saber se a parcela expropriada tinha solo com natureza apta para construção ou apta por outros fins, estava processualmente arrumada e assente pelas partes litigantes, pelo que o acórdão em apreço violou as normas contidas no artigo 635.º do CPC;

3.ª - Verifique-se que a R. DD, S.A., confina a delimitação do objeto do seu recurso "à impugnação da matéria de facto" vertida nos números 24 a 16 da sentença do Tribunal “a quo” e à “omissão da matéria de facto dada como não provada”, relativamente ao envolvimento pessoal do A. AA no processo de expropriação (conclusão ii);

4.ª - Defende ainda esta R. que "se dê por provada a existência de um plano de urbanização e o ónus inerente à alteração do projeto do Complexo Termal …." (ii infini);

5.ª - Ainda quanto à matéria de facto, esta R. alega que o Tribunal a quo incorreu em erro ao dar como não provada a ausência de manifestação por parte dos AA., da não intenção destes de responsabilizarem o 1.º R. pelo erro profissional por este cometido (iv a xii);

6.ª - Quanto a estas questões, sobre as quais incida o objeto do recurso desta R., o acórdão não tece um único comentário, nem faz a menor referência;

7.ª - Assim como também não se pronuncia sobre as pretensões desta R., expressas no seu recurso (xix) de ver como provado que "segundo o Plano Diretor Municipal aprovado, do qual constava a afetação da parcela em causa nos autos, à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela era de 20%, sendo previsto, quer no plano de pormenor, quer no plano de urbanização um índice de construção de 8%";

8.ª - Verifica-se também total ausência de análise, por parte do acórdão recorrido quanto às questões interpretativas das cláusulas do contrato de seguro, que protegia o R. Advogado, no exercício da sua atividade profissional, levantadas pela R. DD, S.A., designadamente, os artigos 100.º, 101.º e 139.º daquele contrato, com base nas quais centra a razão de ser da alegada procedência do seu recurso;

9.ª – Assim, como também nada se diz no acórdão sobre a alegada “exceção perentória de pré-conhecimento, invocada pela Recorrente”, apesar de ser com base nesta e apenas nesta exceção perentória, não atendida pelo Tribunal a quo, que a decisão aí proferida deverá ser revogada, segundo alega e pretende esta R.

10.ª - Constata-se no acórdão recorrido que este, sem qualquer referência às questões supra citadas, optou por analisar uma outra questão que qualifica de "importância decisiva” que é a questão de saber se na parcela expropriada existia “solo apto para construção” ou “solo apto para outros fins” e é o que faz entre as págs. 12 e 24 do aresto;

11.ª - Esta indagação, análise e conclusões vertidas entre as págs. 12 e 24 do acórdão, procuram resolver uma questão jurídica que já estava resolvida entre as partes litigantes, sem a menor divergência entre si, pelo que dela não podia ter-se conhecido em recurso;

12.ª - Na verdade, a recorrente DD, S.A., não só não levantou a questão de aquela parcela estar situada em “solo apto para construção”, como, pelo contrário, até pugnou para que seja dado por provado que segundo o Plano Diretor Municipal aprovado “constava a afetação da parcela em causa nos autos à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela expropriada era de 20%”;

13.ª - E no ponto xxxi das suas conclusões repete, de novo, a sua concordância, quer pela existência de um PDM, que abrange o prédio expropriado, quer para o índice de construção de 20%, previsto para o mesmo prédio;

14.ª - Aliás, esta aceitação do índice de construção de 20% (que pressupõe a aceitação de que o solo é apto para construção) já estava presente, quer na contestação da DD, S.A., que não se opôs ao alegado no artigo 10.º da p.i., quer do 1.º R., que especificadamente, aceitou o conteúdo deste artigo 10.º da petição inicial;

15.ª - Foi com base nesta aceitação dos R.R. que a sentença da 1.ª Instância não apreciou (nem podia apreciar essa matéria assente entre as partes), como definitiva, razão porque tal questão não foi objeto de decisão pelo Tribunal a quo;

16.ª - Tal assunto da aptidão construtiva do solo em causa, aliás, já tinha sido resolvida e transitado em julgado no Tribunal da Comarca de ..., com concordância entre os pontos de vista dos expropriados, da expropriante e do Tribunal Judicial de Nisa, no que se refere a tal parcela expropriada estar abrangida pelo PDM de Nisa;

17.ª - Dúvidas não podem restar de que tal questão, estando definitivamente decidida e arrumada, não podia dela tomar conhecimento o acórdão recorrido (veja-se jurisprudência e doutrina supra citadas em 17.º e 18.º);

18.ª - A perda de chance terá que ser especialmente avaliada ao nível da expropriação decidida no Tribunal Judicial de …, tendo como base de apreciação os factos em que os expropriados e a expropriante divergiam entre si, mas não os factos sobre os quais estas partes se mostravam concordantes, como era o caso de na parcela expropriada, à data da DUP, existia já aptidão construtiva;

19.ª - Em todo o caso, mesmo que fosse processualmente admissível indagar, concluir e decidir com base numa questão já assente e arrumada entre as partes e que estas não levantaram no seu recurso, chegar-se-ia igualmente à conclusão de que a área expropriada, em causa, estava efetivamente abrangida pelo PDM de …, publicado no Diário da República n.º 172, de 27/07/1994, bem como pela Carta de Ordenamento conexa ao mesmo (Doc. l, ora junto);

20.ª - Desta Carta de Ordenamento, sobre o local a expropriar e em causa nos autos, constam os símbolos gráficos T * * e as legendas “Equipamentos Existentes” e “Equipamento Propostos”, sendo que para a primeira legenda o símbolo "T" refere-se a "Termas da …" e para a segunda legenda, o símbolo **, diz respeito ao "Complexo Termal da …";

21.ª - Tendo em conta esta previsão edificativa futura, proposta no PDM de ..., para as Termas da …, a parcela expropriada cabe inteiramente na previsão contida na alínea c) do n.º 2 do art.º 25.º do CE, pois tal parcela, por efeito da construção para ali prevista (Complexo Termal da …) estava destinada, desde então, a adquirir as características descritas na alínea a) do mesmo artigo 25.º, pelo que mal concluiu o acórdão recorrido, ao ter decidido em sentido contrário;

22.ª - A parcela expropriada não se confina, assim a meros “espaços agrícolas e espaços florestais”, porque nela, à data da publicação do PDM, já existiam diversas construções urbanas, tal como se alcança dos docs. 2 e 3, ora juntos, não tendo o menor sentido equipará-la "a terrenos agrícolas na Ota ou em Alcochete para neles construir um novo aeroporto”;

23.ª - Por outro lado, a conclusão vertida no acórdão (a pág.22) de que a classificação como "espaço agrícola só por si afasta a possibilidade de qualificar a parcela como apta para construção" viola o previsto no n.º 4 do art.º 25.º e n.º 9 do art.º 27.º do PDM, que se referem à “edificabilidade nos espaços agrícolas”, e “espaços florestais”, remetendo tal edificabilidade para o capítulo IV, isto é, para o regime de edificação do “Povoamento disperso”;

24.ª - Atendendo a que a natureza do solo da parcela expropriada, está definida no PDM e assente como sendo apto para construção, o que mereceu a aceitação de todos os intervenientes processuais, desde os peritos que intervieram na expropriação até à sentença da 1.ª instância dos presentes autos, afigura-se que se a tese defendida no acórdão prevalecesse, isso equivaleria a uma alteração do PDM de …, o que traduziria uma violação direta da lei, pois tal competência não cabe aos Tribunais Cíveis;

25.ª - Quanto à improcedência do recurso dos AA., com a qual estes não se conformam, pois que “os únicos encargos que a lei (n.º 9 do art.º 26.º do CE) admite que possam ser deduzidos ao valor da indemnização que for devida aos expropriados são aqueles que incidem sobre infraestruturas existentes no local expropriado", como decorre da jurisprudência supra invocada;

26.ª - Assim, esta pretensão dos A.A., não era merecedora da qualificação que recebeu no acórdão recorrido, o qual, com dureza desnecessária, qualificou de “perfunctória”, “paradoxal” e “absurda” a opinião dos AA. sobre esta matéria;

27.ª - Como decorre de todo o alegado supra, a dedução de despesas ou encargos com reforço das infraestruturas existentes “pressupõe que a parcela dispõe de algumas das infraestruturas referenciadas no n.º 7 do art.º 26.º do CE, as quais serviram de valorização da parcela...”;

28.ª - Resultou provado em 1.ª instância que, quanto a infraestruturas existentes na parcela expropriada, “não existia lá nada”;

29.ª - Idêntica conclusão é retirada na vistoria “ad perpetuam rei memoriam”, cujo ponto VI do relatório prescreve “a parcela não se integra em nenhum aglomerado urbano, nem possui qualquer infraestrutura urbanística”;

30.ª - Face a esta realidade (inexistência de infraestruturas), os peritos, no cálculo do valor do terreno a que chegaram, não incluíram qualquer valor proveniente das percentagens previstas no n.º 7 do artigo 26.º CE, pela simples razão de que “a parcela não possuía qualquer infraestrutura urbanística” ou “não exista lá nada”;

31.ª - Nos termos da lei e conforme se conclui da jurisprudência, não tendo a parcela expropriada sido valorizada em consequência de infraestruturas existentes, não será legalmente possível deduzir qualquer encargo ou despesa ao valor do prédio, com fundamento no reforço de infraestruturas, pois isso equivaleria a “uma dupla penalização do expropriado”, o qual, por um lado, veria o seu prédio diminuir de valor, com fundamento no encargo com infraestruturas existentes (que afinal não existem);

32.ª- Este foi o erro em que os peritos incorreram, pois o valor que atribuíram à parcela expropriada não acrescentaram qualquer das percentagens previstas no artigo 26.ª, n.º 7, do CE, contudo, do valor atribuído à mesma parcela decidiram deduzir 60% desse valor, a título de encargos com infraestruturas;

33.ª - Verifique-se que o n.º 8 do art.º 26.º do CE estabelece que "se o custo da construção foi substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ou adicionado ao custo da edificação a considerar para o efeito da determinação do valor do terreno;

34.ª - Isto é, no valor a atribuir ao prédio, irão ser determinantes "as especiais condições do local", as quais serão ponderadas para efeito de calcular o custo da edificação;

35.ª - Se no local existirem infraestruturas dignas de serem valorados, essa valoração será efetuada com base nas percentagens prescritas no n.º 7 do artigo 26.º e deverá acrescer ao valor do terreno, porque isso implicará uma diminuição do custo da edificação futura;

36.ª - Só neste caso (existência de infraestruturas que tenham aumentado o valor do terreno) é que se poderá recorrer à previsão contida no n.º 9 do art.º 26.º e até ao limite da valoração atribuída;

37.ª - Face ao que fica dito, o erro dos peritos que intervieram na expropriação é patente, pois aplicaram a dedução prevista no n.º 9 do art.º 26.º do CE, apesar de não terem aumentado o valor da parcela com qualquer das percentagens previstas no n.º 7, do mesmo artigo. Daí que os A.A. tivessem uma forte expetativa de que esta questão, apreciada por um coletivo de Juízes, mais experientes, fosse decidida como é de direito e, consequentemente, a favor dos A.A.; se o recurso falhado tivesse sido interposto para a Relação de …;

38.ª - Assim, pelas razões supra alegadas (índice de construção de 20%) a possibilidade da Relação de … vir a dar razão aos AA., era muito elevada;

39.ª - Pois tal índice de construção (20%) estava expresso no PDM, tinha o reconhecimento desse facto por parte de todos os intervenientes processuais e o facto de a expropriante, para o local, usar apenas um índice de 8%, isso não resultou de qualquer imposição, pelo que tal não desvaloriza a parcela expropriada, pois essa capacidade edificativa continuava lá, ao dispor da expropriante, pois não estava limitada pela existência de qualquer plano de pormenor porque este não existia (Doc.4);

40.ª - Tal convicção dos AA., quanto à possibilidade de vencimento do recurso não interposto no TR…, reforçou-se com a obtenção de uma sentença que lhe foi totalmente favorável nesta matéria;

41.ª - As fortes expetativas de sucesso do recurso não proposto pelo R. Advogado advinham também e com a mesma convicção, da razão que assiste aos AA., ora recorrentes, na indevida dedução que foi feita ao valor da parcela expropriada, por efeito da aplicação da previsão contida no n.º 9 do art.º 26.º do CE., diminuindo tal valor em 60%, isto é, em 2,5 vezes, o que traduz uma depreciação de € 292.806,17;

42.ª - Se tal dedução não tivesse sido efetuada, o valor da parcela expropriada seria de € 488.010,30;

43.ª - E por efeito do cálculo do valor da parcela ter sido efetuado apenas com base num índice de construção de 8%, quando o PDM de … previa 20%, verifica-se que também, neste cálculo, há uma desvalorização de 2,5 vezes no valor do prédio;

44.ª - Se tivesse sido aplicado o índice de 20%, o valor da parcela atingiria cerca de € 1.220.000,00;

45.ª - Pelo exposto, os A.A. tinham fundadas esperanças de serem ressarcidos pelo dano da chance perdida de verem judicialmente apreciada a sua pretensão, caso tivessem recorrido, pois tal como supra se alegou e concluiu na sentença de 1.ª instância “havia uma probabilidade séria e real do TR… conceder aos AA. uma indemnização de um milhão de euros”, não fora a conduta negligente do R. Advogado;

46.ª - O acórdão impugnado violou o artigo 635.º do CPC, os artigos 25.º e 26.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18/09 e do artigo 25.º, n.º 2 e 4, do PDM de …, publicado no Diário da República n.º 172 de 27/07/1994.

      Pedem os Recorrentes que o acórdão recorrido seja substituído por decisão que:

i) - Mantenha a decisão proferida em primeira instância, no que se refere ao aumento do valor da parcela expropriada, em função do índice de construção de 20%;

ii) - Dê razão aos A.A., quando estes pugnam pela ilegalidade da depreciação de 60%, efetuada no valor da parcela expropriada, a título de encargos e despesas com infraestruturas existentes;

iii) - Condene a R. DD, S.A., na medida da responsabilidade civil contratualmente assumida para com o R. Advogado;

iv) - Condene o R. Advogado, Dr. CC, no montante que lhe couber indemnizar, até ao pedido de € 300.000,00.

7. Não foram apresentadas contra-alegações.


Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

        

II – Delimitação do objeto do recurso


     Como é sabido, no que aqui releva, o objeto do recurso é definido em função das conclusões formuladas pelo recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do CPC.         

      Dentro desses parâmetros, o objeto deste recurso incide sobre as seguintes questões:

i) – Em primeiro lugar, saber se o acórdão recorrido se ocupou de questões não suscitadas pela ali apelante e ora Recorrida DD, com violação do disposto no artigo 635.º do CPC – conclusões 1.ª a 24.ª da Recorrente;

ii) – Em segundo lugar, ajuizar se a apreciação feita pelo acórdão recorrido sobre a improbabilidade de sucesso do recurso que o 1.º R. deixou de interpor em nome dos A.A., para efeitos de indemnização fundada na alegada perda de chance processual, padece de erro de direito por violação dos artigos 25.º e 26.º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18/09, e do artigo 25.º, n.º 2 e 4, do PDM de …, publicado no Diário da República n.º 172 de 27/07/ 1994 – conclusões 25.ª a 46.ª;  

iii) – Por fim, em caso de procedência dessa questão ii), se deve ser proferida decisão substitutiva com o teor pretendido pelos Recorrentes.


III – Fundamentação   

 

1. Factualidade dada como provada pela na 1.ª Instância


Vem dada como provada pela 1.ª Instância a seguinte factualidade: 

1.1. Por despacho de 10 de dezembro de 2004, do Secretário de Estado da Administração Local, foi declarada a utilidade pública da expropriação de parcelas de terreno destinadas ao Complexo Termal da …, e autorizada a tomada de posse administrativas das mesmas - art.º 1.º da petição (p.i.);

1.2. O referido despacho foi publicado no Diário da República II Série n.º 278, de 26.11.2004 e a respetiva Declaração n.º 328-A/2004 (II série) foi publicada no Diário da República II Série, n.º 305, de 31.12.2004 - art.º 2.º da p.i.;

1.3. Na sequência da referida “declaração de utilidade pública”, a Câmara Municipal de … procedeu à expropriação da parcela de terreno n.º 3, com a área de 155.590 m2, a desanexar do prédio rústico designado Lage da Prata, sito na freguesia de …, inscrito na matriz predial sob o art. n.º 1 - CC1 e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 00…2 - art.º 3.º da p.i;

1.4. A parcela de terreno supra referida era propriedade dos A.A.;

1.5. Em consequência da supra referida expropriação, os A.A. contratam com o 1.º Réu e emitiram a seu favor uma procuração com poderes forenses gerais, incluindo os de substabelecer - art.º 5.º da p.i.;

1.6. Não tendo havido acordo entre a entidade expropriante e os expropriados quanto à indemnização a atribuir, seguiu-se a fase da “Arbitragem”, a qual fixou o valor de € 79.678,26 a atribuir aos proprietários da supra referida parcela, aqui A.A. - art.º 6.º da p.i.;

1.7. Os A.A. interpuseram recurso da decisão de “arbitragem” para o Tribunal Judicial da Comarca de …, o qual correu os seus termos sob o n.º 307/05.0TBNIS, por considerarem, designadamente, que a parcela de terreno expropriada deveria ter sido classificada como “solo apto para construção” e não como “solo apto para outros fins”, como o havia sido - art.º 7.º da p.i.;  

1.8. A razão de ser da expropriação da parcela n.º 3 supra referida consistia na edificação futura, por parte da entidade expropriante do designado “Complexo Termal da …” - art.º 8.º da p.i.;  

1.9. No âmbito do recurso supra mencionado, os aqui A.A. formularam inicialmente um pedido indemnizatório no montante de € 1.353.685,00 que, posteriormente, ampliaram para € 1.973.503,59;

1.10. Numa reunião ocorrida entre o 1.º R. e os A.A. ficou decidido que perante uma sentença que fixasse uma indemnização inferior a um milhão de euros, os expropriados iriam apresentar recurso para o Tribunal da Relação - art.º 13.º da p.i.;

1.11. O 1.º R. acreditava na possibilidade de o Tribunal de 2.ª instância vir a dar razão aos A.A. e transmitiu essa convicção deles - art.º 12.º da p.i.;

1.12. A sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de … veio atribuir aos A.A. uma indemnização de € 195.204,13 atualizada desde a declaração de utilidade pública e até à decisão, com base nos índices dos preços ao consumidor, conforme documento n.º 1 anexo à PI e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - art.º 14.º da p.i;

1.13. Perante o valor da indemnização fixado pelo Tribunal Judicial da Comarca de …, o 1.º Réu sabia que era seu dever recorrer da sentença para o Tribunal da Relação de … - art.º 15.º da p.i.;

1.14. O Tribunal Judicial da Comarca de … qualificou a área expropriada como “apta para a construção” - art.º 28.º da contestação do 1.º R.;  

1.15. No relatório de avaliação foi atribuído ao solo da área expropriada um coeficiente de utilização de 0,08 em face ao projeto do Complexo Termal da …, valor que foi tido em consideração pelo Tribunal na fixação do montante da indemnização - art.º 16.º da p.i.;  

1.16. Segundo o Plano Diretor Municipal aprovado, do qual constava a afetação da parcela em causa nos autos, à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela expropriada era de 20% - art. 10.º da p.i.;

1.17. Os peritos do Tribunal e da entidade expropriante estimaram em 60% do valor do terreno os custos para a realização de infraestruturas e o perito dos A.A. fixou tais custos em 40% do valor do terreno;

1.18. A área expropriada foi paga ao preço de 1,026 € /m2 - art.º 19.º da p.i.;

1.19. Na fixação da indemnização não foi tida em conta a riqueza das águas da área expropriada - art.º 19.º da p.i.;  

1.20. No início do mês de janeiro de 2012, o A. AA telefonou ao 1.º R. para saber se havia algum desenvolvimento no processo em causa, tendo então ficado a saber, por intermédio do segundo, que a sentença já tinha sido proferida em novembro de 2011 e que nele se fixava uma indemnização de cerca de € 200.000,00;

1.21. Na conversa telefónica supra referida, o 1.º R. informou ainda que, em virtude de ter estado em …, não havia acompanhado o prazo para recorrer da sentença, e que o prazo para recurso já terminara - art.º 28.º da p.i.;  

1.22. Por carta datada de 09/08/2014, os A.A. convidaram o 1.º R. a apresentar uma proposta com vista a compensar os prejuízos resultantes da não apresentação de recurso;

1.23. Em resposta, o 1.º R. veio dizer que se escusava a tomar posição sobre o assunto, uma vez que parte da sua responsabilidade civil profissional estava transferida para a DD por via do seguro de grupo que a Ordem dos Advogados contratara;

1.24. Entre o telefonema de 2012 e a carta de agosto de 2014, os A.A. nunca manifestaram perante o 1.º R. qualquer intenção de lhe pedir qualquer quantia a título de indemnização ou de o acionar judicialmente com esse propósito;

1.25. A DD, Seguros Gerais, SA, e a Ordem dos Advogados de Portugal celebraram um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional, titulado pela apólice n.º 60…8, anexa à contestação da 2.ª Ré como documento n.º 1 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

1.26. A supra referida apólice entrou em vigor às 0,00 horas do dia 1 de janeiro de 2014 e vigorou até às 0,00 h de 1 de janeiro de 2015;

1.27. O limite indemnizatório máximo contratado foi de € 150.000,00;

1.28. À quantia supra referida é deduzida a correspondente franquia contratual que ascende a € 5.000,00 por sinistro;

1.29. Prescreve o art. 3.º al. a) das Condições Particulares da apólice supra referida que:

«Ficam expressamente excluídas da cobertura da presente apólice, as reclamações por qualquer facto ou circunstância conhecidos do segurado, à data do início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação.»


2. Do mérito do recurso


Antes de mais, convém reter que a presente ação tem por objeto uma pretensão indemnizatória, a título de danos patrimoniais, no valor de € 300.000,00, acrescida de juros desde a citação, emergente da perda de chance dos A.A. pelo facto de o 1.º R., na qualidade de seu advogado, não ter interposto recurso para a Relação da sentença proferida em 1.ª instância no processo de expropriação litigiosa n.º 370/05.0TBNIS.

Tal como se considerou em 1.ª instância, sem que seja questionado pelas partes, a pretensão indemnizatória deduzida pelos A.A. inscreve-se no âmbito do contrato de mandato forense celebrado entre eles e o 1.º R., no âmbito do referido processo de expropriação.  

Estamos, pois, perante um contrato de mandato atípico, denominado mandato forense, com poderes de representação, que se regia, à data da celebração desse contrato, em especial, pelo Estatuto da Ordem dos Advogados (EAO), aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, aplicando-se ainda, a título subsidiário, o regime do contrato de mandato civil constante dos artigos 1157.º a 1184.º do CC.

Além das obrigações gerais do mandatário enunciadas no artigo 1161.º do CC, importa ter em particular consideração as obrigações específicas constantes do EAO, mormente o dever de praticar os atos de execução do mandato com zelo e diligência, nos termos do respetivo artigo 95.º, alínea b).  

O incumprimento de tais deveres pode implicar responsabilidade civil contratual pelos danos daí decorrentes, sendo esta a base em que entronca a pretensão indemnizatória aqui em causa, em sede de obrigações de meios, fundada no facto de o 1.º R., como já se disse, não ter interposto recurso da sentença proferida em 1.ª instância no processo de expropriação litigiosa n.º 370/05.0TBNIS, frustrando a expetativa de os A.A. ali obterem uma indemnização de valor muito superior à que foi arbitrada.

      Nessa linha, a 1.ª instância considerou que se tratava de uma questão de perda de oportunidade (chance), traduzida num dano aferível pela probabilidade séria e real de o tribunal da 2.ª instância vir a conceder aos A.A. uma indemnização superior à que fora arbitrada.

      Tal entendimento encontra suporte doutrinário e jurisprudencial, mormente na jurisprudência deste Supremo Tribunal.

       Sobre a perda de chance na jurisprudência portuguesa, Paulo Mota Pinto[1], dando uma panorâmica da evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça desde 2009[2], refere que:

«A partir de 2012 e de 2013, o Supremo Tribunal de Justiça passou (…) a aceitar o ressarcimento da perda de chance processual, atribuindo ao lesado uma indemnização mesmo em casos em que não conseguiu determinar a probabilidade de vencimento, fazendo uma avaliação equitativo do dano.»

E conclui que:

«A orientação dominante na nossa jurisprudência em matéria de chance processual passou, pois, a ser hoje da de que o dano resultante da perda de chance processual pode relevar se se tratar de uma chance consistente, designadamente se se puder concluir, “com elevado grau de probabilidade ou verosimilhança” (na expressão do acórdão do STJ de 29 de Abril de 2010[3]), que o lesado obteria certo benefício não fora a chance processual perdida

Com efeito, não obstante as divergências quanto à caracterização ou não da perda de chance como dano autónomo, não vemos que exista obstáculo a que essa perda de chance ou de oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuízo, impossibilitada definitivamente por um ato ilícito, não possa ser qualificada como um dano em si, posto que sustentado num juízo de probabilidade tido por suficiente em função dos indícios factualmente provados[4].

       Assim, desde que se prove, desse modo indiciário, a consistência de tal vantagem ou prejuízo, ainda que de feição hipotética mas não puramente abstrata, terá de se reconhecer que ela constitui uma posição favorável na esfera jurídica do lesado, cuja perda definitiva se traduz num dano certo contemporâneo do próprio evento lesivo. 

       É certo que se poderá colocar a questão de saber se, em tais casos, estamos ainda em sede de identificação do dano ou já no plano do estabelecimento do seu nexo de causalidade, sabido como é que a definição da chance perdida terá de ser feita sempre na perspetiva do resultado final para que tende.

       Ora, uma coisa será, em primeira linha, identificar a própria perda de chance com consistência suficiente, em função do resultado final hipotético definitivamente perdido, para ser qualificada como dano emergente e certo, outra algo diferente será depois imputar essa perda à conduta lesiva, segundo as regras da causalidade adequada. Embora se reconheça que essa dicotomia seja discutível, se concentrarmos o juízo de probabilidade na aferição da consistência necessária à identificação do dano, já o estabelecimento do seu nexo de causalidade com a conduta ilícita se revela facilitado.    

      Nesse conspecto, o juízo de probabilidade sobre a consistência da perda de chance deve “ser encarado com grandes cautelas e apenas nas situações em que a privação da probabilidade de obtenção de uma vantagem se possa caracterizar, com mais evidência, como um dano autónomo”[5].

      Problemático será saber quais os índices de probabilidade para o reconhecimento da perda de chance como dano autónomo, ou seja, se a própria probabilidade de vantagem perdida pode ser reconhecida como juridicamente relevante, não obstante a impossibilidade de demonstração do respetivo resultado final.

       De qualquer modo, como se referiu no acórdão indicada na nota 1, afigura-se que, “traduzindo-se a perda de chance em situações ainda incipientes na nossa ordem jurídica, não perfeitamente sedimentadas na doutrina nem enraízadas na prática jurisprudencial, como o são as situações dos lucros cessantes e dos danos futuros, para mais de ocorrência multifacetada, um método de análise que parta de uma definição dogmática de dano para a ela depois subsumir o caso concreto, não será, porventura, o método mais seguro, podendo mesmo mostrar-se redutor. Ao invés, uma metodologia que procure seguir uma pista mais casuística de modo a aferir cada caso à luz das exigências legais sobre a probabilidade suficiente para o reconhecimento da ressarcibilidade do dano pode ser mais promissora.”

      Assim, no campo da responsabilidade civil contratual por perda de chances processuais, em vez de se partir do princípio de que o sucesso de cada ação é, à partida, indemonstrável, parece mais curial ponderar, perante cada hipótese concreta, qual o grau de probabilidade segura desse sucesso, pois pode muito bem acontecer que o sucesso de determinada ação, à luz de um desenvolvimento normal e típico, possa ser perspetivado como uma ocorrência altamente demonstrável, à face da doutrina e jurisprudência então existentes.

       Nessa base, será de aceitar que uma vantagem perdida por decorrência de um evento lesivo, desde que consistente e séria, ou seja com elevado índice de probabilidade, possa ser qualificada como um dano autónomo, não obstante a impossibilidade absoluta do resultado tido em vista.

De resto, mesmo a jurisprudência do STJ admite a relevância de situações muito pontuais, desde que a prova permita, com elevado grau de probabilidade, ou verosimilhança, concluir que o lesado obteria certo benefício não fora a chance perdida. Esta ressalva mais não parece do que admitir afinal o dano por perda de chance na base de um juízo de probabilidade elevado e que só poderá ser aferido em cada caso concreto. O que parece discutível é se deve ser feito de forma categorial ou se em função da espécie do caso, como propendemos a admitir.

Em suma, afigura-se razoável aceitar que a perda de chance se pode traduzir num dano autónomo existente à data da lesão e portanto qualificável como dano emergente, desde que ofereça consistência e seriedade, segundo um juízo de probabilidade suficiente, independente do resultado final frustrado.

Demonstrada assim essa espécie de dano, questão diferente será já a avaliação do quantum indemnizatório devido, segundo o critério da teoria da diferença nos termos prescritos no artigo 566.º, n.º 2, do CC. Será também neste plano de avaliação que se poderá lançar mão, em última instância, do critério da equidade ao abrigo do n.º 3 do mesmo normativo, o qual não pode, pois ser utilizado em sede de determinação da própria consistência da perda de chance.

No caso de perda de chances processuais, como é a tratada nos presentes autos, a primeira questão está em saber se o hipotético sucesso do desfecho processual, decorrente do recurso que o 1.º R. deixou de interpor, assume um padrão de consistência e de seriedade que, face ao estado da doutrina e jurisprudência então existente, ou mesmo já em evolução, se revela suficientemente provável para o reconhecimento do dano.  

Para tanto, importa fazer o chamado “julgamento dentro do julgamento”, não propriamente no sentido da solução jurídica que pudesse ser adotada pelo tribunal da presente ação sobre a matéria da causa em que ocorreu a falta, mas sim pelo que possa ser considerado como altamente provável que o tribunal da ação em que a defesa ficou prejudicada viesse a decidir.

A determinação da perda de chance processual por via do julgamento dentro do julgamento encontra-se bem espelhada, por exemplo, nos acórdãos do STJ, de 05/02/2013, proferido no processo n.º 488/09.4TBESP.P1.S1, de 14/03/2013, proferido no processo n.º 78/09.5TVLSB.L1.S1 e de 30/09/2014, proferido no processo n.º 739/09.5TVLSB.L2-A.DS1[6].

Mas tal apreciação inscrever-se-á, enquanto tal, nuclearmente, numa questão de facto que extravasa os fundamentos do recurso de revista[7], embora se admita que possa, porventura, envolver erros de direito sobre a apreciação da prova ou em sede do quadro normativo aplicável, estes sim passíveis de serem sindicáveis em sede de revista.

O ónus de prova de tal probabilidade impende sobre o lesado, como facto constitutivo que é da obrigação de indemnizar (art.º 342.º, n.º 1, do CC).


Ora, a 1.ª instância procedeu à seguinte análise:

«Na sua Petição Inicial, os aqui Autores enumeram como “pontos de divergência” com a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de …, os seguintes aspectos:

a) - O índice de construção da parcela expropriada segundo o Plano Director Municipal então aprovado era de 20% e o Tribunal Judicial de … deu relevância apenas ao relatório de avaliação dos srs. peritos os quais atribuíram ao solo da área expropriada um coeficiente de construção de apenas 8%; (vd. art. 16.° da P1)

b) - Os srs. peritos, sem fundamentação, e sem que nada o justificasse, fizeram uma estimativa de custos de 60% para infra-estruturas, quando face ao "Complexo Termal" não haverá lugar a esse encargo; (art. 18.° da PI)

c) - Em consequência desta dupla penalização, a área expropriada em causa acabou por ser paga pelo preço de 1,026€/m2.

É, por conseguinte, sobre estes dois concretos pontos de dissídio que este Tribunal tem de aquilatar da probabilidade de sucesso da pretensão dos Autores junto do Tribunal de 2.ª instância, caso o recurso tivesse sido interposto pelo 1.° Réu.

Vejamos.

Relativamente ao “índice de construção”, ficou provado, no âmbito dos presentes autos, que no relatório de avaliação foi atribuído ao solo da área expropriada um coeficiente de utilização de 0,08 em face ao projecto do Complexo Termal da Fadagosa - valor que foi tido em consideração pelo Tribunal na fixação do montante da indemnização -, embora no Plano Director Municipal aprovado estivesse previsto que o índice de construção na parcela expropriada era de 20%. O que significa que até ao limite de 20%, a Câmara Municipal de Nisa podia, futuramente, vir a aprovar um aumento do índice de construção na parcela expropriada, no âmbito do "Complexo Termal da …" (facto que foi confirmado pela testemunha EE). Não foram alegadas - logo não foram provadas - pelos Réus eventuais limitações ao aumento do índice de construção na parcela expropriada, até ao limite supra referido (20%). E era sobre os Réus que incumbia tal ónus.

Prescreve o art. 23.º, n.º 1, do CE que “A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.”.

Conforme resulta do exposto, à data da declaração de utilidade pública existia já um PDM que para além de prever a construção das Termas da … designadamente na parcela que veio a ser expropriada, previa que a área de implantação de construções poderia ascender a 20%. Por conseguinte, sendo o destino da parcela a construção do complexo termal, cuja área de edificações poderia ir até 20% da área total da parcela, é razoável supor que, em caso de interposição de recurso para o Tribunal de 2.a instância, este viesse a considerar que o índice de construção na parcela expropriada que deveria ter sido considerado pelo Tribunal de 1.a instância era o de 20% (e não de 8% como o foi), o que equivale a 31.118 m2 de implantação de construção (155.590 m2 x 20%).

Relativamente à estimativa dos custos (fixados pelos peritos em 60%), prescreve o n.º 8 do art. 26.º do CE que «Se o custo da construção for substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ao adicionado ao custo da edificação a considerar para efeito da determinação do valor do terreno.» (sublinhado nosso).

Consta do relatório de avaliação subscrito pelos srs. peritos no âmbito do processo n." 30/05.0 (documento n.° 3 anexo à petição inicial) que « (...) são elevados os custas por infra-estrutura para desenvolver e implantar todas as infraestruturas necessárias, face à natureza rochosa dos terrenos e à sua situação geográfica. A concretização dessas infra-estruturas obriga a cuidados especiais sendo aconselhável o recurso ao desmonte de rocha por ripagem, materiais expansivos ou ultra sons, porquanto o emprego de explosivos poderia alterar o nível freático das águas termais existentes (por eventuais fissuras das camadas inferiores impermeáveis) devido às elevadas velocidades de propagação das ondas de choque por eles desenvolvidas. (...)» (sublinhado nosso).

No seu depoimento a testemunha EE declarou que não seria possível recorrer a engenharia de alta conceção porque o risco de desaparecimento das águas termais poderia pôr em causa todo o projecto; a testemunha FF (o qual integrou o colégio de peritos no âmbito do processo que correu termos no Tribunal Judicial de …) declarou que o solo da parcela tinha afloramentos rochosos e devia ser evitado o uso de explosivos porque os lençóis freáticos podiam ser alterados; a testemunha EE declarou também que no que se refere a infra-estruturas «tinha que ser tudo feito» que o que viu lá foi «um caminho de terra batida» que havia que fazer arruamentos, uma rede pública de águas, a ligação de esgotos pluviais e domésticos a uma central de tratamento...

Acresce que os Autores não lograram sequer provar, como lhes competia, que «face ao projecto do referido “Complexo Termal” não haveria lugar ao encargo de construção de infra-estruturas.».

Por conseguinte, não foi feita prova nos presentes autos que permita a este Tribunal considerar que existia uma probabilidade séria e razoável de o Tribunal de 2.ª instância - caso tivesse sido interposto recurso pelos Autores - tivesse alterado o valor da indemnização arbitrada pelo Tribunal Judicial de Nisa com fundamento no segundo dos argumentos aqui invocados pelos Autores e relacionado com o custo das infra-estruturas.

Prescreve o art. 23.º, n.º 1, do Código das Expropriações que “A justa indemnização não visa compensar o beneficio alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.”

O aumento do limite de construção de 8% para 20% reflectir-se-ia necessariamente no valor da indemnização, na medida em que a área de implantação de construção passaria para 31.118 m2. Logo, esse aumento da indemnização decorrente do aumento da área de implantação de construções que não foi considerado na sentença proferida em 1.a instância e que não pôde ser reapreciado pelo Tribunal de 2.a instância em virtude da falta de interposição de recurso, corresponde ao valor do dano sofrido pelos Autores.

Dada a indeterminabilidade do resultado de um recurso que não chegou a ser interposto pelo 1.º Réu (devendo tê-lo sido), o Tribunal tem que julgar equitativamente, dentro dos limites que tiver por provados, em conformidade com o disposto no art. 566.º, n.º 3, do Código Civil.

In caso, afigura-se-nos que era elevado o grau de probabilidade de os Autores verem reconhecido, na 2.ª instância (caso o recurso tivesse sido interposto pelo 1.º Réu), que o índice de construção que deveria ter sido tido em consideração pelo Tribunal de 1.ª instância era de 20%.

Por conseguinte, o dano indemnizável deverá coincidir com o valor decorrente daquele aumento da área de implantação de construção de 8% ara 20% a calcular em sede de liquidação, ao abrigo do disposto no art. 609.°, n.° 2, do Código de Processo Civil, com o limite de € 300.000,00, atento o princípio do pedido (vd. art. 609.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).»

     Nessa base, a ação foi julgada parcialmente procedente nos termos já acima indicados.         


      No seu recurso de apelação, a 2.ª R., no que aqui interessa, impugnou alguns pontos da decisão de facto (pontos 16, 24, 30 e 31), concluindo pela incorreta apreciação da prova produzida, na medida em que fora dada como provada matéria para a qual não foi produzida prova bastante e por não provada matéria relevante resultante da prova produzida.

       No que respeita ao ponto 16, aquela apelante pugnou por ser dado, de forma desdobrada, como provado que:

«16.1. Segundo o Plano Director Municipal aprovado, do qual constava a afectação da parcela em causa nos autos, à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela expropriada era de 20%, sendo previsto quer no plano de pormenor quer no plano de urbanização um índice de construção de 8%.

16.2. Caso se encontrasse prevista no PDM a possibilidade de alteração do plano de urbanização, tal alteração comportaria para a entidade requerente um custo entre 40 a 60 euros por metro quadrado.»

     Além disso, aquela R. questionou a apreciação da 1.ª instância relativamente à séria probabilidade de procedência do recurso que o 1.º R. deixara de interpor no sobredito processo expropriativo, mormente quanto aos índices de construção, atento o disposto no artigo 23.º, n.º 1, do CE.


      Por sua vez, o Tribunal da Relação, partindo da matéria dada como provada na 1.ª instância, começou por, à luz do quadro normativo aplicável, pôr em crise a qualificação de solo apto para construção acolhida pela 1.ª instância, concluindo que, no caso vertente, «a área expropriada distribui-se por zonas definidas como espaços agrícolas e espaços florestais”, caracterização que só por si afastaria a possibilidade de qualificar parcela como solo apto para a construção.»

      Seguidamente, debruçando-se sobre acórdão arbitral, a Relação considerou que:

«É incontornável o acerto do acórdão arbitral, tirado por unanimidade, quando procede à qualificação da parcela, dizendo:

Tendo em conta a qualificação atribuída à zona onde se enquadra a parcela pelo PDM de …, “Zona Imediata” e parte na “Zona Intermédia” do perímetro de proteção do Complexo Termal da … e o facto de a parcela não se integrar em nenhum aglomerado urbano, nem reunir nenhuma das condições previstas no artigo 25.º, n.º 2 da Lei n.º 168/99, de 18/9, o solo da parcela, para efeitos de cálculo da avaliação, classifica-se em “solo para outros fins”.

Mas, sem embargo do que fica dito, tal “julgamento” foi sufragado por sentença da qual o Município não recorreu, consolidando-se assim o valor arbitrado pelos peritos.»

Não obstante tal apreciação crítica, o Tribunal da Relação acabou por circunscrever a análise pertinente à questão dos índices de construção, ao referir que:

«Por isso, o que agora nos ocupa é aquilatar da responsabilidade do mandatário dos expropriados, por ter deixado de recorrer da sentença como os mandantes lhe haviam solicitado, porquanto o índice de construção naquela parcela expropriada, segundo o PDM então aprovado, supostamente seria de 20%.»

            E, nesta sede, pondera o seguinte:

«Repare-se que o tribunal recorrido considerou que “segundo o PDM aprovado constava a afectação da parcela em causa à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela expropriada era de 20%”

E para chegar a tal conclusão bastou-se o tribunal a quo com o testemunho de EE cujo conhecimento dos factos resulta da circunstância de ter sido nomeado perito no âmbito do processo de expropriação”.

Como é intuitivo o PDM é um regulamento, disponível no Diário da República, cujo teor não pode - nem deve - ser submetido a demonstração, pois é ao juiz e não aos engenheiros que compete conhecer o Direito!

Assinala-se, no entanto, que no laudo pericial, subscrito pela referida testemunha não consta qualquer alusão a tal índice de construção, tendo antes sido adotado o índice de 8% apurado nos termos acima enunciados.

Aliás, no laudo ficou consignado apenas que “na Carta de Ordenamento (desenho n.º 15-a) estão assinaladas as Termas da … como “equipamento existente”, o que está de acordo com a alegação dos recorrentes, feita ao abrigo do disposto no artigo 64.º (cfr fls 299 dos autos).

Ou seja, a alusão às termas consta da Carta de Ordenamento do PDM de …, sendo nela mencionadas como “equipamento proposto”

E de facto da consulta da Net fica a saber-se que “as primeiras notícias que temos desta … remonta a 1810, quando o Desembargador José Casal Ribeiro, sendo provedor de Portalegre, mandou fazer aquela casa de banhos e cobrir a fonte de telha; usou-se então por algumas pessoas em banho; mas ou porque os efeitos não corresponderam às esperanças (pode ser que por menos administração) ou por qualquer outra razão, não é hoje seguido esse uso, e a casa assaz arruinada serve de asilo a pastores em ocasiões de tempestade”.

Fadagosa de Nisa, também denominada de Arez ou Gafete, as duas povoações mais próximas, ou ainda da Seiceira, por se encontrar na serra com esta toponímia, aparece referenciada em vários artigos ao longo do séc. XIX.

Em 1985 efectuaram-se os primeiros estudos do aquífero, seguiram-se o “Estudo médico hidrológico”, pelo hidrologista Ramiro Valentim (1989). Os estudos geológicos e a captação por furo artesiano em profundidade, em 1990. Finalmente em 1991 a Câmara Municipal de Nisa celebrou um contrato de exploração com o IGM. Em 2000 foi criada a Empresa Municipal … –EM, que toma a seu cargo a exploração das termas. Ainda nesse ano foi adjudicada a uma empresa de arquitectos a elaboração de um novo balneário, cuja primeira pedra foi lançada em 2005.

O novo complexo termal integrara além do balneário a construir numa primeira fase, um centro de internamento, recintos desportivos, centros de conferências, uma unidade hoteleira, transformando o velho edifício termal em museu.”

Mas é exato que no artigo 16.º do Regulamento do PDM, vigente à data da DUP, se estabeleciam “condicionamentos” para o designado “povoamento disperso” na área rural, estabelecendo tal normativo a proibição de loteamentos urbanos, mas prevendo a possibilidade de construção de unidades hoteleiras e equipamentos coletivos, desde que a área da propriedade fosse superior a 5.000 m2 (alínea b).

Por outro lado, “admite-se em solos não protegidos para a instalação de unidades não habitacionais de indiscutível interesse económico e cultural, o índice de 0,2” (alínea e)

Mas o que é que tais condicionamentos têm a ver com a situação dos autos?

Rigorosamente nada!

Com efeito, o próprio artigo 15.º caracteriza o âmbito de aplicação de tais condicionamentos, dizendo que “o povoamento disperso a que são aplicáveis, “traduz uma ocupação edificacional baseada numa estrutura de pequena propriedade

Sabe-se que tais instrumentos de gestão territorial são decalcados uns dos outros, sendo-lhes introduzidas alterações pontuais em função das especificidades de cada município, mas seja qual for a zona a que respeitem será difícil qualificar de “pequena propriedade” o prédio de que foi destacada a parcela, pois possuía mais de 332 hectares (a parcela expropriada representa 4,7% do prédio de que foi destacada).

Veja-se o absurdo: a acolher-se a tese dos recorrentes o PDM vedaria no local (Serra de Seiceira) qualquer operação de loteamento, mas seria possível construir um hotel a ocupar 66,4 hectares!!!

Com efeito e ao contrário do que sugerem os cálculos dos expropriados, o índice de construção está reportado à área da propriedade e não à área de qualquer parcela dela destacada, pois se assim fosse o condicionamento não teria o mínimo sentido.

Ou seja, o que o PDM prevê é que em zona rural de propriedade de pequena dimensão desde que com mais de 5 mil metros quadrados, possa ser autorizada a construção de um hotel ou equipamento de indiscutível interesse económico e cultural, desde que o índice de construção não exceda 0,2.

Numa palavra, o artigo invocado não tem aplicação ao caso dos autos.



***


  Uma nota mais, posto que desnecessária, para breve análise do recurso dos AA que, tendo pedido a condenação dos RR no pagamento da quantia de € 300.000,00 de que, segundo os próprios, teriam obtido ganho de causa relativamente a € 292.800,00, ainda assim vêm pugnar pela condenação dos demandados nos precisos termos peticionados.

  Prende-se a divergência dos AA com o facto de no laudo pericial se ter operado uma dedução de 60% como estimativa de custos para infraestruturas, quando, face ao projeto do referido “Complexo Termal” não haverá lugar a esse encargo (art.º 18 da petição).

   Submetido tal facto a demonstração, respondeu o tribunal a quo que “não se provou, face ao projecto do Complexo termal que não haveria lugar à realização de infraestruturas”.

   Pretendem agora os recorrentes que, em face do depoimento do perito EE, a resposta devia ter sido afirmativa, porquanto o mesmo disse que “não existia lá nada”

   E depois concluem que dúvidas não restam de que no local não existiam, nem foram valoradas pelos senhores peritos, quaisquer infraestruturas” e “considerando que nos termos da lei (n.º 9 do artigo 26.º do CE) apenas “as despesas necessárias ao reforço das infraestruturas existentes poderão ser deduzidas no cálculo do valor da área expropriada, pelo que “forçoso será de concluir que não havendo no local infraestruturas, também não poderão existir encargos/despesas relacionadas com as mesmas”.

   A alegação é verdadeiramente paradoxal e, com o devido respeito, evidencia que os expropriados não compreenderam o sentido da dedução operada pelos Peritos, nem alcançaram o sentido da norma que invocam.

   Na verdade, o cálculo do valor do solo apto para a construção é feito em função dos vários parâmetros e majorações estabelecidos nos nºs 4 a 6 do artigo 26º que assentam em critérios de normalidade urbanística.

   Assim, pode suceder que uma parcela expropriada por um Município para edificar um Centro de Saúde ou um campo de jogos, disponha já de infraestruturas (rede elétrica, de abastecimento de água, esgotos, etc) com capacidade e dimensão para servir esses novos equipamentos coletivos.

   Todavia, se em vez de tais equipamentos o município expropriar uma parcela similar para construir um bairro social ou um empreendimento habitacional com relevante dimensão, será natural que as infraestruturas existentes junto à parcela se revelem insuficientes, seja porque não têm potência para servir as novas habitações, seja porque não têm caudal que assegure o abastecimento de água ou o saneamento capaz dos novos aglomerados.

   É nesse contexto que o n.º 9 do artigo 26.º dispõe que, verificando-se a insuficiência das infraestruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deve ser sopesada tal limitação, pois a parcela expropriada não tem o mesmo valor de mercado da que não padece de tais limitações.

   Claro que se os próprios expropriantes afirmam que a parcela não dispunha nem de acesso rodoviário, nem de abastecimento de água, energia elétrica (com posto de transformador junto à parcela), ou saneamento, só mesmo por absurdo se pode compreender que pretendam que no cálculo não seja incluída a pertinente depreciação.

   Isso significaria que uma qualquer parcela, dotada de todas as referidas infraestruturas mas que, face à utilização mais intensa decorrente da ampliação da construção existente, obrigasse ao seu reforço para servir os novos utilizadores, seria menos valiosa do que um qualquer terreno desprovido de qualquer daquelas funcionalidades.

   A tese, repete-se, só mesmo por perfunctória leitura do regime legal por parte dos expropriados terá visto a luz do dia!

   Claro que em face do que ficou dito é absolutamente ocioso conferir se a execução de todas as infraestruturas representa uma desvalorização de 60%, pois o PDM vigente à data da DUP não destinava a parcela expropriada à construção, nem ela, reconhecidamente, possuía estrada asfaltada, rede de abastecimento de água ou esgotos e tanto basta para que devesse ser considerada solo para outros fins, como o tribunal arbitral decidira.

   Como se disse a parcela está localizada fora do perímetro urbano, em zona rural e de acordo com o PDM está inserida em zonas definidas como “espaços agrícolas” e “espaços florestais”, não havendo, como é intuitivo, qualquer manipulação urbanística subjacente a tal inserção, pois ela deriva da “vinculação situacional” do prédio-mãe.

   Recuperando o que acima se disse, a circunstância de no espaço rural ser levada a efeito a construção de um qualquer equipamento público não transforma tal espaço em solo apto para a construção, em face da enunciação taxativa constante do n.º 2 do artigo 25º.

   Claro que não nos cumpre sindicar o decidido pelo tribunal de Nisa, mas tão somente avaliar sobre a probabilidade de, a ter sido interposto o recurso intencionado pelos expropriados, haver uma expectativa razoável de que “na Relação de … seria atribuída uma indemnização não inferior a um milhão de euros” (art.º 38 da p.i).

  Como se escreve no acórdão desta Relação de 14/5/2015 (Manuel Marques) “a ressarcibilidade do dano de perda de chance está dependente da formulação de um juízo hipotético”, porquanto “essa perda só poderá ser valorada se traduzir uma probabilidade consistente, uma possibilidade real de êxito que se frustrou”.

  Do que acabámos de expor resulta óbvio que nem sequer ousamos configurar a hipótese de em sede de recurso vir a ser sufragado o entendimento dos Senhores peritos, replicado pelo tribunal de …, sobre a aptidão construtiva da parcela expropriada.

  Claro que, tendo-se a entidade expropriante conformado com a sentença e caso tal postura fosse mantida, a tal tribunal não restasse outra solução que não acolher o valor fixado, ainda que seja patente o desacerto que tem subjacente.

   Será mesmo legítimo pensar que a ter sido interposto recurso pelos expropriados, também o Município pusesse em crise a decisão para o que, como flui do que fica dito, não lhe faltavam consistentes razões.

   Neste contexto, representar como verosímil a hipótese de a Relação de Évora, para além de sufragar a qualificação da parcela, aplicar ainda o índice de construção previsto na alínea e) do artigo 16.º do Regulamento do PDM e, adicionalmente, considerar como mais-valia a não existência de qualquer infraestrutura, envolve a suposição de que aquele tribunal poderia violar ostensiva e diretamente a lei.

  Numa palavra, admitir que em hipotético recurso os expropriados viessem a obter ganho de causa, equivalia a descrer de tudo quanto acabámos de dizer!»


Ora, os Recorrentes sustentam que o acórdão recorrido se ocupou de questões não suscitadas pela ali apelante e ora Recorrida DD, em especial quanto à classificação da parcela expropriada como “solo apto para a construção” ou “solo apto para outros fins”, questão que ficara arrumada no sentença proferida no processo n.º 370/05.0TBNIS. 

É certo que o acórdão recorrido se ocupou, de forma desenvolvida, daquela vertente, concluindo pela correção do acórdão arbitral e dissentindo da qualificação acolhida naquela sentença.

Não obstante isso, acabou por reconhecer que essa matéria constituía questão assente, circunscrevendo a análise pertinente às questões do índice de construção e à dedução de 60% como estimativa de custos para infraestruturas, conforme o acima transcrito, quando ali se refere, em algumas das suas passagens, que:

«Por isso, o que agora nos ocupa é aquilatar da responsabilidade do mandatário dos expropriados, por ter deixado de recorrer da sentença como os mandantes lhe haviam solicitado, porquanto o índice de construção naquela parcela expropriada, segundo o PDM então aprovado, supostamente seria de 20%.»

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«Claro que não nos cumpre sindicar o decidido pelo tribunal de …, mas tão somente avaliar sobre a probabilidade de, a ter sido interposto o recurso intencionado pelos expropriados, haver uma expectativa razoável de que “na Relação de … seria atribuída uma indemnização não inferior a um milhão de euros” (art.º 38 da p.i).

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   «Do que acabámos de expor resulta óbvio que nem sequer ousamos configurar a hipótese de em sede de recurso vir a ser sufragado o entendimento dos Senhores peritos, replicado pelo tribunal de Nisa, sobre a aptidão construtiva da parcela expropriada.

   Claro que, tendo-se a entidade expropriante conformado com a sentença e caso tal postura fosse mantida, a tal tribunal não restasse outra solução que não acolher o valor fixado, ainda que seja patente o desacerto que tem subjacente.»

Nestas circunstâncias, para os fins em vista, torna-se irrelevante qualquer pronunciamento sobre a qualificação da parcela expropriada.

Restará agora saber se o juízo de improbabilidade do sucesso do recurso que deixou de ser interposto pelo 1.º R., em nome dos ora A.A., baseado quer no índice de construção quer na dedução de 60% a título de estimativa de custos para infraestruturas, padece de erro de direito, mormente no domínio da apreciação das provas e do quadro normativo aplicável, que caiba a este tribunal de revista sindicar, nos termos do artigo 674.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, do CPC.


Do confronto entre a sentença da 1.ª instância e o acórdão recorrido, o que se constata é que a divergência no plano da ponderação dos dados de facto em presença com vista a identificar a existência da probabilidade de dano por “perda de chance processual”, no que respeita aos presumíveis índices de construção, se reconduz a uma apreciação em sede de facto.

       Com efeito, no que respeita ao índice de construção aplicável à parcela expropriada, o acórdão recorrido, centrando a sua análise na prova produzida sobre tal índice, diversamente do considerado pela 1.ª instância, considerou não se poder concluir, nem do PDM nem do laudo pericial, por um hipotético índice de construção de 20% para aquela parcela.

         Nesse particular, no acórdão recorrido, observa-se que:

«[…] o tribunal recorrido considerou que “segundo o PDM aprovado constava a afectação da parcela em causa à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela expropriada era de 20%”

E para chegar a tal conclusão bastou-se o tribunal “a quo” com o testemunho de EE cujo conhecimento dos factos resulta da circunstância de ter sido nomeado perito no âmbito do processo de expropriação”.

Como é intuitivo o PDM é um regulamento, disponível no Diário da República, cujo teor não pode - nem deve - ser submetido a demonstração, pois é ao juiz e não aos engenheiros que compete conhecer o Direito!

Assinala-se, no entanto, que no laudo pericial, subscrito pela referida testemunha não consta qualquer alusão a tal índice de construção, tendo antes sido adotado o índice de 8% apurado nos termos acima enunciados.

Aliás, no laudo ficou consignado apenas que “na Carta de Ordenamento (desenho n.º 15-a) estão assinaladas as Termas da … como “equipamento existente”, o que está de acordo com a alegação dos recorrentes, feita ao abrigo do disposto no artigo 64.º (cfr fls 299 dos autos).

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«Com efeito e ao contrário do que sugerem os cálculos dos expropriados, o índice de construção está reportado à área da propriedade e não à área de qualquer parcela dela destacada, pois se assim fosse o condicionamento não teria o mínimo sentido.

Ou seja, o que o PDM prevê é que em zona rural de propriedade de pequena dimensão desde que com mais de 5 mil metros quadrados, possa ser autorizada a construção de um hotel ou equipamento de indiscutível interesse económico e cultural, desde que o índice de construção não exceda 0,2.»

Assim, independentemente da qualificação dada à parcela expropriada como solo apto para construção, mesmo atendendo ao Regulamento do PDM do Município de Nisa, publicado no Diário da República de 27/07/ 1994, em vigor à data declaração de utilidade pública, em 26/11/2004, no acórdão recorrido considerou-se que não se poderia concluir, minimamente, pelo índice de construção de 20% para aquela parcela.

Para tanto, começou por desmerecer o depoimento da testemunha de EE, em que se fundara a sentença recorrida relativamente ao facto constante do ponto 16, impugnado pela apelante 2.ª R., face ao que, nesse particular, resulta do mencionado Regulamento do PDM, contra o que, dada a sua força legal, não é admissível prova testemunhal nem acordo das partes.

E quanto a este regulamento, convocando o disposto nos respetivos artigos 15.º e 16.º, para que remetem os artigos 25.º, n.º 4, e 27.º, n.º 9, considerou, em síntese, que o que aquele PDM prevê é que em zona rural de propriedade de pequena dimensão desde que com mais de 5 mil metros quadrados, possa ser autorizada a construção de um hotel ou equipamento de indiscutível interesse económico e cultural, desde que o índice de construção não exceda 0,2.


Na verdade, o indicado artigo 15.º prescreve que:

O povoamento disperso traduz uma ocupação edificacional baseada numa estrutura de pequena propriedade.  

E no artigo 16.º, prevê-se o seguinte:

Para o povoamento disperso na área rural são estabelecidos os seguintes condicionamentos:

b) – Autorizada a construção de instalações hoteleiras, equipamentos colecti-vos, instalações industriais, agrícolas, agro-pecuárias e ainda habitação, desde que a área da propriedade seja superior 5000 m2;

e) – Admite-se em solos não protegidos para a instalação de unidades não habitacionais de indiscutível interesse económico e cultural o índice de utilização de 0,2. 

    

        Foi com base neste quadro normativo que no acórdão recorrido se considerou mais precisamente que:

«[…], o próprio artigo 15.º caracteriza o âmbito de aplicação de tais condicionamentos, dizendo que “o povoamento disperso a que são aplicáveis, “traduz uma ocupação edificacional baseada numa estrutura de pequena propriedade

Sabe-se que tais instrumentos de gestão territorial são decalcados uns dos outros, sendo-lhes introduzidas alterações pontuais em função das especificidades de cada município, mas seja qual for a zona a que respeitem será difícil qualificar de “pequena propriedade” o prédio de que foi destacada a parcela, pois possuía mais de 332 hectares (a parcela expropriada representa 4,7% do prédio de que foi destacada).

Veja-se o absurdo: a acolher-se a tese dos recorrentes o PDM vedaria no local (Serra de Seiceira) qualquer operação de loteamento, mas seria possível construir um hotel a ocupar 66,4 hectares!!!

Com efeito e ao contrário do que sugerem os cálculos dos expropriados, o índice de construção está reportado à área da propriedade e não à área de qualquer parcela dela destacada, pois se assim fosse o condicionamento não teria o mínimo sentido.

Ou seja, o que o PDM prevê é que em zona rural de propriedade de pequena dimensão desde que com mais de 5 mil metros quadrados, possa ser autorizada a construção de um hotel ou equipamento de indiscutível interesse económico e cultural, desde que o índice de construção não exceda 0,2.

Numa palavra, o artigo invocado não tem aplicação ao caso dos autos.»


     Sustentam, no entanto, os Recorrentes que a parcela expropriada não se confina a meros “espaços agrícolas e espaços florestais”, porque nela, à data da publicação do PDM, já existiam diversas construções urbanas, tal como se alcança dos documentos ora juntos, não tendo o menor sentido equipará-la “a terrenos agrícolas na Ota ou em Alcochete para neles construir um novo aeroporto.

       Só que este circunstancialismo não consta da matéria dada como provada nem é admissível tal prova nesta fase recursória.

        Por outro lado, não obstante a qualificação da parcela como solo apto para construção, daí não decorre necessariamente qual o índice de construção previsível em concreto para a parcela em causa.

E, salvo o devido respeito, neste particular, os factos dados como provados não permitem, de todo, concluir, nem à luz dos citados preceitos do Regulamento do PDM do Município de Nisa nem de qualquer outra disposição legal, designadamente dos artigos 23.º, n.º 1, e 26.º do CE, que para aquela parcela seja, sem mais, presumível o índice de construção pretendido pelos A.A. ou qualquer outro superior ao que foi atribuído na sentença proferida no processo de expropriação n.º 370/05.0TBNIS.    

Trata-se, de resto, de uma ponderação estribada, nuclearmente, em análise factual e em critérios de normalidade urbanística atinentes à parcela expropriada, em relação ao que não se divisa a ocorrência de erro de direito na apreciação das provas, nos termos e para os efeitos do artigo 674.º, n.º 3, do CPC, nem sequer de interpretação do quadro normativo convocado pelos Recorrentes.     

                 

       E quanto à dedução dos 60% como estimativa de custos para as infraestruturas, no mesmo acórdão se considera, além do mais, que:

   «[…] se os próprios expropriantes afirmam que a parcela não dispunha nem de acesso rodoviário, nem de abastecimento de água, energia elétrica (com posto de transformador junto à parcela), ou saneamento, só mesmo por absurdo se pode compreender que pretendam que no cálculo não seja incluída a pertinente depreciação.

   Isso significaria que uma qualquer parcela, dotada de todas as referidas infra-estruturas mas que, face à utilização mais intensa decorrente da ampliação da construção existente, obrigasse ao seu reforço para servir os novos utilizadores, seria menos valiosa do que um qualquer terreno desprovido de qualquer daquelas funcionalidades.

   A tese, repete-se, só mesmo por perfunctória leitura do regime legal por parte dos expropriados terá visto a luz do dia!

   Claro que em face do que ficou dito é absolutamente ocioso conferir se a execução de todas as infraestruturas representa uma desvalorização de 60%, pois o PDM vigente à data da DUP não destinava a parcela expropriada à construção, nem ela, reconhecidamente, possuía estrada asfaltada, rede de abastecimento de água ou esgotos e tanto basta para que devesse ser considerada solo para outros fins, como o tribunal arbitral decidira.»

         E, por fim, concluiu-se que:

   «Neste contexto, representar como verosímil a hipótese de a Relação de Évora, para além de sufragar a qualificação da parcela, aplicar ainda o índice de construção previsto na alínea e) do artigo 16.º do Regulamento do PDM e, adicionalmente, considerar como mais-valia a não existência de qualquer infraestrutura, envolve a suposição de que aquele tribunal poderia violar ostensiva e diretamente a lei.»


De notar que na sentença da 1.ª instância foi considerado que:

   «[…] não foi feita prova nos presentes autos que permita a este Tribunal considerar que existia uma probabilidade séria e razoável de o Tribunal de 2.ª instância - caso tivesse sido interposto recurso pelos Autores - tivesse alterado o valor da indemnização arbitrada pelo Tribunal Judicial de Nisa com fundamento no segundo dos argumentos aqui invocados pelos Autores e relacionado com o custo das infra-estruturas.»

Neste ponto, não existe sequer divergência relevante entre o decidido em 1.ª instância e o acórdão recorrido.

        

     Também aqui a ponderação da improbabilidade do sucesso do recurso que o 1.º R. deixou de interpor feita pelo Tribunal da Relação se centrou na análise factual e da normalidade urbanística atinentes à parcela expropriada, não se divisando nessa análise erro de direito do quadro normativo que lhe seria aplicável, nomeadamente das normas convocadas pelos Recorrentes.        

        

Nesta conformidade, além de os A.A. não terem logrado provar a suficiente probabilidade do sucesso do recurso deixado de interpor pelo 1.º R., em seu nome, a própria improbabilidade de tal sucesso ajuizada pela Relação, fundada como está na sobredita análise factual e normalidade urbanística atinentes às características da parcela expropriada, sem que se evidencie, minimamente, erro de direito na apreciação das provas ou na interpretação e aplicação do quadro normativo convocado, não se mostra sindicável por este tribunal de revista, confinado como está ao conhecimento de violação de lei substantiva ou processual, nos termos definidos nos artigos 639.º, n.º 2, e 674.º, n.º 1 e 3, do CPC.

       Termos em que improcedem as razões dos Recorrentes.      


IV - Decisão


Pelo exposto, nega-se a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

As custas do recurso ficam a cargo dos Recorrentes.

Lisboa, 30 de Novembro de 2017

Manuel Tomé Soares Gomes (Relator)

Maria da Graça Trigo

Maria Rosa Tching

___________


[1] Artigo doutrinário intitulado Perda de chance processual, in RLJ Ano 145.º, Março-Abril de 2016, pp. 174 e segs. (186 e segs.).
[2] Acórdão do STJ, de 22/10/2009, relatado pelo Juiz Cons. João Bernardo, no processo n.º 409/09. 4YFLSB, acessível na Internet - http://www.dgsi.pt/jstj.
[3] Acórdão do STJ, de 29/04/2010, relatado pelo Juiz Cons. Sebastião Póvoas, no processo n.º 2622/ 07.0TBPNF.P1.S1, acessível na Internet - http://www.dgsi.pt/jstj.
[4] Vide a este propósito, o acórdão do STJ, de 09/07/2015, relatado pelo aqui relator, no processo n.º 5105/12.2TBSXL.L1.S1, acessível na Internet - http://www.dgsi.pt/jstj.
[5] A este propósito, vide comentário do Juiz Conselheiro Carlos Alberto Fernandes Cadilhe, in Regime da responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, Anotado, Coimbra Editora, 2011, pag. 98-99, citado no acórdão indicado na nota precedente.
 
[6] Todos estes arestos estão citados no artigo doutrinário acima referido de Paulo Mota Pinto, tendo sido relatados, respetivamente, pelos Juízes Conselheiros Hélder Roque, Maria dos Prazeres Beleza e Mário Mendes, acessíveis na Internet - http://www.dgsi.pt/jstj. .
[7] Neste sentido, vide Paulo Mota Pinto, artigo citado p. 190