Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
28/06.7TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: FERNANDES DA SILVA
Descritores: BANCÁRIO
DEVER DE LEALDADE
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
CATEGORIA PROFISSIONAL
RECLASSIFICAÇÃO
Data do Acordão: 11/23/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário : I -  A noção de justa causa consignada no art. 396.º, n.º 1 do CT/2003, assenta numa conduta culposa do trabalhador, disciplinarmente censurável, traduzida na violação de deveres contratuais, cuja gravidade e consequências tornam imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, sendo que, a determinação dessa impossibilidade prática encerra o melindre operativo da sua despistagem, pois que de uma inexigibilidade jurídica se trata, alcançável mediante juízo de prognose ou probabilidade, resultante final da consideração dos factores e circunstâncias relevantes estabelecidas no n.º 2 do mesmo preceito.   

II -  A gravidade do comportamento afere-se em função do grau de culpa e de ilicitude, devendo surpreender-se um nexo de causalidade, de imediação lógica e cronológica, entre a conduta infraccional e a impossibilidade de subsistência do vínculo, sendo de convocar a eleição da sanção expulsiva sempre que, tudo ponderado, se conclua, na análise diferencial dos interesses em jogo, que, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato constitua uma imposição desmesurada e violenta, e por isso injusta, ferindo a sensibilidade e liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do real empregador.

III - Na actividade bancária, a exigência geral de boa fé na execução dos contratos assume um especial significado e reveste-se por isso de particular acuidade pois a relação juslaboral pressupõe a integridade, lealdade de cooperação e absoluta confiança da/na pessoa contratada.

IV - É de afirmar a justa causa do despedimento, atenta a quebra da relação de confiança, quando está demonstrado que o A., à revelia das regras que conhecia perfeitamente por força do exercício das suas funções, alterou, sucessivamente, os plafonds dos cartões de crédito que lhe estavam afectos, sem a devida autorização hierárquica, com movimentações cruzadas entre duas contas bancárias de que era titular, em inobservância das correspondentes normas procedimentais de controlo instituídas pela R., consubstanciando-se, assim, uma conduta fora da imperativa transparência exigível no comportamento do trabalhador bancário, não sendo de relevar, na concretização do juízo subsumível à noção de justa causa, os montantes dos valores monetários em causa, a reposição dos eventuais prejuízos, ou mesmo a sua inverificação real.

V - No ACTV para o Sector Bancário o “Gerente” tem por função a gestão comercial e administrativa de um estabelecimento e o “Subgerente” participa, em plano subordinado, na gestão comercial e/ou administrativa de um estabelecimento, cabendo-lhe substituir o gerente nas suas ausências e impedimentos; o “Chefe/1.º responsável” e o “Subchefe” de estabelecimento/sucursal têm um munus diverso: cabe ao primeiro programar, organizar, coordenar e responsabilizar-se pela execução das actividades de um serviço, divisão, secção, sector ou outra unidade de estrutura orgânica equivalente da instituição; é tarefa do segundo colaborar, de forma subordinada ao superior hierárquico, na chefia do respectivo departamento, cabendo-lhe substitui-lo nas suas faltas ou impedimentos, prevendo-se, assim, duas categorias profissionais próximas mas diferenciadas.

VI - No ACT do grupo BCP, que sucedeu ao referido ACTV para o Sector Bancário a partir de 2002, manteve-se nomenclatura paralela, com conteúdo funcional semelhante: “Gerente” e “Subgerente” de estabelecimento e “Chefe” e “Subchefe” de estabelecimento/operações, pelo que, tendo a R. classificado o A., em Março de 1991, como “Subchefe de Sucursal” e, mais tarde como “1.º Responsável de Sucursal” e não tendo o A. demonstrado que assumiu funções de gestão comercial e administrativa de um estabelecimento, não se mostra legitimada a reivindicada reclassificação na categoria de “Gerente” ou Subgerente”.

 

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                             I –

1.

AA, com os demais sinais dos Autos, intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra «BANCO BB», peticionando:

-  A declaração da ilicitude do seu despedimento;

-  A condenação do Réu a reintegrar o A. no R., na respectiva categoria profissional, sem perda de quaisquer direitos ou regalias, nomeadamente, carreira profissional e antiguidade e/ou a indemnizá-lo, conforme o A. vier a optar, nos termos previstos na cl.ª 111.ª do ACT para o Grupo B… em vigor, e, ainda:

-  A pagar ao A. todas as prestações normalmente vencidas e vincendas, desde o despedimento até à decisão final, incluindo, designadamente, o vencimento base, subsídios de almoço e todas as demais prestações contratualmente exigíveis;

-  A condenação do Réu a reconhecer ao A. as categorias de sub-gerente desde 1.3.1991, e de gerente desde 12.10.2000, tal como se encontram definidas na Convenção Colectiva de Trabalho aplicável, com as legais consequências, designadamente no que respeita aos pagamentos das correspondentes diferenças salariais normalmente vencidas e não pagas e, bem assim, as normalmente vincendas, a saber:

-  A título de diferenças salariais, emergentes das retribuições base das categorias profissionais, vencidas e não pagas até ao último mês anterior ao despedimento, isto é, até Março de 2005, € 54.283,40;

- E também as normalmente vincendas a tal título, actualmente à razão de € 489,00 mensalmente;

-  A pagar ao A., título de diferenças salariais resultantes da retribuição adicional por isenção de horário de trabalho, vencidas e não pagas até ao último mês anterior ao despedimento, isto é, até Março de 2005, € 25.589,20; e bem assim, as normalmente vincendas a tal título, actualmente à razão de € 230,51, mensalmente;

-  A pagar ao A. trabalho suplementar prestado e não pago para além do regime da isenção de trabalho extraordinário no valor de € 22.250,92;

-  A pagar ao A., a título de juros legais, vencidos e liquidados até 30 de Novembro de 2005, € 39.968,32 e ainda os normalmente vincendos até ao respectivo integral pagamento, a liquidar, se necessário, em execução de sentença;

Deve o Réu ser condenado, ainda, a pagar ao A., a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de € 25.000.

A ré contestou, concluindo pela sua absolvição.

Teve lugar o julgamento, tendo-se respondido à matéria de facto sem reclamação.

Proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e, em consequência, declarado ilícito o despedimento, sendo o réu condenado a reintegrar o A. no seu posto de trabalho como se não tivesse havido despedimento, sem perda de quaisquer direitos ou regalias, nomeadamente com a categoria e antiguidade que lhe competiria e nas retribuições que o mesmo deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito da decisão, com juros desde a data de vencimento de cada prestação, à taxa dos juros legais civis, até integral pagamento.

 No mais foi o réu absolvido.

2.

Inconformado com esta decisão dela recorreu o réu.

O autor respondeu a este recurso e recorreu também.

Pelo Acórdão prolatado a fls. 706-755, a Relação de Lisboa concedeu provimento ao recurso do R. e negou provimento ao recurso interposto pelo A., revogando, por isso, a sentença e absolvendo o R. do pedido.

3.

Irresignado, o A. interpôs recurso de Revista, cuja motivação fechou com a formulação deste quadro de síntese:

QUANTO AO DESPEDIMENTO DO RECORRENTE.

I. O elemento "Confiança", próprio do contrato de trabalho subordinado, deve ser observado na análise do caso concreto a decidir, sempre mediante observância rigorosa do comando contido no n.° 3 do artigo 351.° do Código do Trabalho, que impõe que "na apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes".

II. Não respeitar nem aplicar esta norma legal com o fundamento na tese segundo a qual o dever de lealdade é um dever absoluto e não admite gradações, é fazer tábua rasa de um comando legal essencial na aplicação da justiça e reduzir a letra morta e sem qualquer significado, alcance ou interesse, a aplicação de princípios legais essenciais, como os princípios da proporcionalidade e da equidade, sujeitando a aplicação da lei, e consequentemente da justiça, a critérios erráticos de oportunidade.

III. Para ser aplicada a última e mais grave sanção disciplinar – o despedimento com justa causa – torna-se necessário que, no caso a decidir, o comportamento do trabalhador seja de tal modo grave que, em termos definitivos, não haja possibilidade de manter a relação de trabalho e, para o avaliar devem ser usados apenas e tão-somente os básicos ensinamentos do entendimento próprio de um bom pai de família ou, melhor dizendo, de um empregador normal, para valorização da culpa e da gravidade da infracção com razoabilidade e objectividade, em ordem e sempre sob a égide do princípio da proporcionalidade.

IV. É necessário articular com detalhe o teor e alcance do conjugadamente disposto no n.° 3 do artigo 351.° e n.° 4 do artigo 357.°, ambos do Código do Trabalho, tal como faz a douta sentença recorrida que toma em devida conta os factos provados e o entendimento que sobre alguns deles têm as testemunhas ouvidas no julgamento, que traçaram do recorrido um perfil personalitário digno, escorreito e adequado ao exercício da profissão.

V. O comportamento imputável ao Recorrido, embora ilícito, não é culposo no sentido de doloso, como é exigido no conceito que se analisa.

VI. Não se verifica a impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação de trabalho.

VII. O comportamento verificado não assume, em si e nos seus efeitos, consequências que, minando irremediavelmente a confiança que deve existir entre as partes no cumprimento de um contrato de trabalho, torne inexigível ao empregador a manutenção da relação laboral.

VIII. Face ao comportamento verificado e às circunstâncias específicas do caso, a subsistência do vínculo não fere, de modo violento, a sensibilidade e liberdade psicológica de uma pessoa normal, quando colocada na posição real do empregador, no circunstancialismo apurado.

IX. Um juízo, referido ao futuro, revela a segura e firme possibilidade das relações contratuais, atenta a excelente relação laboral na cooperação e recíproca confiança entre o trabalhador e o empregador e o excelente clima de boa fé entre as partes.

X. Um juízo, referido ao futuro, revela a segura e firme possibilidade de se manter um bom clima de confiança na idoneidade futura da conduta do Recorrido que os factos verificados não destruíram nem abalaram, e muito menos de forma irreparável.

XI. O recurso à sanção expulsiva ou rescisória do contrato de trabalho, que o despedimento representa, no caso sob exame revela-se inadequado, havendo para o caso outras medidas conservatórias ou correctivas ajustadas.

XII. No circunstancialismo que se apura nos autos, mostra-se desproporcionada a sanção de despedimento aplicada ao ora Recorrido, sendo certo que outra medida punitiva, menos gravosa, tal como se acha preconizado na sentença recorrida, seria adequada, sem afectar os interesses do empregador ora Recorrente.

QUANTO À RECLASSIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO RECORRENTE.

XIII. Verifica-se manifesta contradição da decisão recorrida no facto de na mesma se não valorizar o comportamento do próprio R. quando este qualifica o A., ora Recorrente, ao longo do tempo (carreira profissional do A.) inicialmente Subchefe de Sucursal, e, depois, ora como 1.º Responsável, ora como Chefe de Sucursal, e, bem assim, do facto de estas não se conterem no elenco das sucessivas convenções colectivas de trabalho aplicáveis ao caso.

XIV. Tal atitude do Réu, ora Recorrido, revela-se, no caso sub judice, de forma eloquente e determinante, como posição gravemente prevaricadora que se traduz em, através de subterfúgios e artifícios, o Recorrido contornar as regras de aplicação (ao caso) das categorias contratualmente estabelecidas e, assim, o conteúdo das cláusulas 6.ª, 9.ª, 18.ª e Anexos III e IV do ACTV para o Sector Bancário e as cláusulas 15.ª, 16.ª 22.ª e Anexos I e II do ACT do Grupo BCP e ainda, reflexamente quer o disposto no artigo 118.º do Código do Trabalho, quer o princípio da igualdade estabelecido no artigo 13.º/1 da Constituição da República e, também desta, o princípio constitucional estabelecido na alínea a) do n.° 1 do seu artigo 59.°, para trabalho igual salário igual.

XV. O mesmo comportamento do Réu, ora Recorrido, não pode deixar de ser apreciado pelo Tribunal como verdadeira confissão, da qual o Tribunal deve tirar as legais consequências para determinar a natureza das funções/tarefas efectivamente atribuídas e desempenhadas pelo Recorrente no Recorrido – como se alcança da matéria de facto provada e alinhada nos fundamentos da douta sentença ora em crise nesta parte: unidades orgânicas nas quais o A. foi colocado (facto U);as categorias atribuídas (facto V);a evolução na retribuição (facto Z); a partir de 01.03.1991, passou a participar na gestão comercial e administrativa, cabendo-lhe substituir o gerente nas ausências e impedimentos; o A. em conjunto com os respectivos chefes e gerentes das sucursais passou a integrar a comissão de crédito da sucursal, (facto 4.); As funções/tarefas próprias e desempenhadas pelos elementos da comissão de crédito da sucursal constam das normas internas que a próprio R., ora Recorrido, apresentou e juntou nos autos, a saber: A Ordem de Serviço OS.60.002, de 2002-06-11, designada por Regulamento de Concessão de Crédito - facto provado I; e Doc. n.° 4, junto com a Contestação; Ordem de Serviço OS.60.003, de 1999-12-16, designado por Regulamento de Concessão de Crédito para o segmento de particulares (Revog.) – ldentifica os órgãos ...e as respectivas competências.

XVI. Para fundamentar a sua decisão, o Tribunal a quo recorre ao enquadramento da categoria e funções do A. ora Recorrente no Anexo I - Área Técnica do ACT do GRUPO BCP, referindo que este "...na categoria do grupo B o A. exerce funções de controlo (mesmo no grau IV — que corresponde ao nível mínimo 8) (sic) Todavia,

XVII. Trata-se, como não pode deixar de ser sublinhado, de um erro de análise, pois as funções em apreço nos autos têm o seu enquadramento apenas para a Área Comercial estabelecida nesse Anexo I do mencionado ACT do Grupo B…. Com efeito, embora na escala hierárquica se estabeleçam normas de supervisão e coordenação, as funções a ter em conta são de natureza comercial, não são de controlo e chefia.

XVIII. As funções e tarefas discutidas no caso dos autos são as ajustadas à análise e concessão casuística de crédito, próprias das actividades comerciais estritamente directas junto dos clientes do Recorrido e inerentes à actividade essencial de um Banco no mercado financeiro (vender produtos e actuar no mercado dessa natureza), próprias da Área Comercial e não daquelas do âmbito da concepção, preparação, elaboração de estudos pareceres e análises e projectos que fundamentam decisões de políticas gerais estratégicas do Recorrido concernentes às específicas da Área Técnica.

XIX. Como decorre da simples leitura das Ordens de Serviço do Recorrido, observadas nos autos na parte que aqui interessa, as funções dos elementos que integram a Comissão de Crédito são de análise dos pedidos e propostas de crédito em toda a sua dimensão, alcance e responsabilidade de decisão justificada sobre os mesmos e não somente de mero controlo, como redutoramente se diz na sentença da primeira instância e confirmada pelo douto Acórdão recorrido.

XX. Decidindo como decidiu, a tese vertida na douta sentença não aplicou as normas convencionais relativas ao conteúdo das funções abrangidas e previstas na contratação colectiva aplicável para as figuras do Gerente Bancário e Subgerente – (estabelecidos no ACT do Grupo BCP).

XXI. A situação do A., ora Recorrente, à luz das normas contratuais e legais referidas, quer das normas internas (as observadas Ordens de Serviço) sobre as competências, atribuições e responsabilidades dos ditos elementos da Comissão de Crédito Local, constitui errada aplicação do princípio da igualdade estabelecido no artigo 13°/1 da Constituição da República e, também desta, o princípio estabelecido na alínea a) do n.°1 do seu artigo 59.°, para trabalho igual salário igual.

Termos em que e nos melhores que V. Ex.as não deixarão de suprir, deve ser deve ser considerado totalmente procedente o recurso interposto, revogando-se o douto Acórdão recorrido e substituindo-se por decisão que, julgando a presente acção procedente, declare ilícito o despedimento do Recorrente e condene o Recorrido a reintegrá-lo no seu posto de trabalho, como se não houvesse despedimento, sem perda de quaisquer direitos ou regalias, nomeadamente com a categoria e a antiguidade que lhe competiria e nas retribuições que o mesmo deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito da decisão, com juros desde a data de vencimento de cada prestação, à taxa dos juros legais, até integral pagamento e revogando o douto Acórdão recorrido o substitua por decisão em conformidade com a total procedência do pedido formulado na acção respeitante à condenação do Recorrido a reconhecer ao A. as categorias de Sub-Gerente, desde 1.3.1991, e de Gerente, desde 12.10.2000, tal como se encontram definidas na Convenção Colectiva de Trabalho aplicável, com as legais consequências, designadamente no que respeita aos pagamentos das correspondentes diferenças salariais normalmente vencidas e não pagas e, bem assim, as normalmente vincendas e os demais pedidos com este relacionados, incluindo os respectivos juros legais e tudo o mais que legal for, ainda em custas e todas as demais despesas e encargos processuais a cargo do Recorrido.

 4.

 O R. contra-alegou, formulando um conjunto significativo de asserções conclusivas no sentido da confirmação do julgado.

                                         __

Já neste Supremo Tribunal a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso relativamente à primeira questão e da parcial procedência da segunda, nos termos delineados.

O R. respondeu, defendendo, quanto ao segundo ponto, que as categorias de ‘Subchefe de Estabelecimento’ e de ‘Chefe de Estabelecimento’, em que o ora recorrente foi reclassificado, são distintas e irreconduzíveis às superiores e de nível mais elevado de retribuição, de ‘Subgerente’ e ‘Gerente’; Esta equiparação, feita no douto parecer, contraria frontalmente as cl.ªs das convenções colectivas aplicáveis ao caso, e os factos provados apontam irreversivelmente para a correcção da classificação categorial do ora recorrente feita pelo ora recorrido e para o rigor dos seus níveis de retribuição.

Deve por isso manter-se integralmente o Acórdão recorrido e julgados improcedentes os argumentos expressos no douto parecer.

Colheram-se os vistos.

Cumpre decidir.

    

                                       II –

A – O ‘thema decidendum’.

Ante as conclusões formuladas – por onde se afere e delimita o objecto da impugnação, por via de regra – são questões postas as seguintes:

- A (i)licitude do despedimento.

- A (re)classificação profissional do recorrente.

         

B – Dos Fundamentos.

B.1 – De Facto.

As Instâncias deram como provada a seguinte factualidade:

A)         O A. foi admitido ao serviço do R. para trabalhar sob a autoridade e direcção deste, mediante retribuição, desde 4 de Janeiro de 1988.

B) O autor é sócio do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, com o n.° ....

C) Às relações laborais entre A. e R. aplica-se o ACTV para o Sector Bancário, desde a admissão do A. no R., o qual foi sucessivamente publicado no B.T.E., I Série, n.° 31, de 22.8.90; n.° 30, de 15.8.1991; n.° 31, de 22.8.1992; n.° 32, de 29.8.1993; n.° 42, de 15.11.94, e suas alterações, designadamente as publicadas no B.T.E., I Série, n.° 2, de 15.01.96; n.° 15, de 22.04.97; n.° 21, de 08.06.98; n.° 24, de 29.06.98; n.° 24, de 29.06.99; n.° 25, de 08.07.00 e n.° 24, de 29.07.2001, sendo aplicável, à data do despedimento, o ACT do Grupo BCP, publicado no B.T.E. n.° 48, I Série, de 29 de Dezembro de 2001, alterado sucessivamente pelo publicado no B.T.E, Ia Série, n.° 16, de 29.04.2003 e n.° 4, de 29.01.2005.

D)         O A. exercia, no R., funções comerciais e administrativas próprias deste e específicas, classificando-o, ultimamente, no Grupo B do referido ACT e atribuindo-lhe a designação de" função interna – Técnico de Operações".

E) O A. encontrava-se colocado, ultimamente, no nível 9 (nove) de retribuição, do Anexo II do Acordo Colectivo de Trabalho, auferindo, mensalmente, as seguintes quantias:

Retribuição-base, € 1.127,50;

Diuturnidades, € 148,40;

Isenção de horário, € 593.29;

Complemento de Venc./dedicação exclusiva ..., € 226,15;

Subsídio de almoço, € 160,55;

Subsídio Familiar, € 10,25;

F) Em 5 de Novembro de 2004, o A. recebeu do R., por correio registado com aviso de recepção, a Nota de Culpa que está junta a fls. 73-81 do Processo Disciplinar, com declaração expressa de intenção de despedimento e suspensão preventiva da qual consta, entre o mais, que:

1.º

O colaborador arguido é o titular da DDA n.° …, que deixou de movimentar como conta-ordenado, em 4 de Março de 2002 (cfr. fls. 15, ex-vi fls. 43 a 55/PD), sendo também co-titular da DDA n.° 146320136, conta da qual o primeiro titular solidário é seu pai, Sr. CC (cfr. fls. 27 e 28, ex vi de fls. 34 a 42/PD).

2.º

O colaborador arguido sabe, tendo obrigação de não ignorar e não violar, a disposição normativa estabelecida pelo Réu em Ordem de Serviço n.° 20.004, no sentido de que, em relação a contas de depósitos à ordem, de que seja titular ou co-titular, e enquanto operador que esta Instituição habilitou a aceder ao seu sistema informático, lhe «é absolutamente vedado...todo e qualquer tipo de manutenção à respectiva conta, com excepção da requisição de livros de cheques, que deve ser por ele feita através da aplicação GGCC» e sem prejuízo do que lhe é lícito ordenar e processar através, mormente, do "site Cidade B…".

3.°

Por outro lado, o colaborador arguido também tem noção exacta de que as duas referidas contas configuram e merecem tratamento na óptica de um normal Cliente do Banco arguente, mormente no que tange à disponibilização e manutenção dos cartões de crédito que estão associados a cada uma delas, respectivamente, o AMEX n.° … e VISA n.°….

4.º

 À revelia do conhecimento da sua hierarquia, e aproveitando-se do cargo ou função que o Banco arguente lhe cometera, bem como fazendo uso indevido dos meios ou utensílios de trabalho que esta Instituição lhe disponibilizara para o exercício regular das suas atribuições, o colaborador arguido inobservou a normalizada interdição descrita no precedente art. 4.º, a partir de 7 de Novembro de 2001, tal como, também e a partir de 22 de Setembro de 2003, o Autor passou a usurpar o exercício de competências creditícias, que bem sabia terem sido delegadas pelas sobreditas OS n.°s … e … à Comissão de Crédito da Sucursal, do modo que se passa a circunstanciar:

Datas – Cartões de Crédito – Descritivos de infracções – Fls…    

07/11/01

26/11/01            Amex nº              Alterou "MET PAGAM ANTERIOR".

14/12/01                     375562074988615         

22/09/03 - Aumentou o limite de crédito de € 1.300 para € 1.500.

29/09/03 - Visa n.º … - Aumentou o limite de crédito de € 1.500 para € 2.500.

30/9/03 - AMEX n. ° … - Aumentou o limite de crédito de € 1.500 para € 1.700; Aumentou depois o limite de crédito de € 1.700 para € 2.000.

20/10/03 - Aumentou o limite de crédito de € 2.500 para € 3.000.

31/10/03 - Visa n.º … - Aumentou o limite de crédito de € 3.000 para € 3.500.

03/11/03 - AMEX n.° …:Aumentou o limite de crédito de € 2.000 para € 2.500.

02/12/03 - Aumentou o limite de crédito de € 2.500 para € 3.000; 4552 2900 7857 6403 de € 3.500 para € 5.000.

05/03/04 - AMEX n.° …: Alterou "MET PAGAM ANTERIOR".

5.º

O colaborador arguido perpetrou estes sucessivos e irregulares aumentos de plafond dos sobreditos cartões de crédito para, e até à primeira semana de Setembro p.p., deles se servir na realização dos paradigmáticos pagamentos de despesas correntes e levantamentos a crédito ou "cash advance" que se passam a circunstanciar:

Datas - Cartões de Crédito - Transacções - Descritivos - Valores. Fls. /PD

(...)

Datas Cartões de Crédito - Transacções -  Descritivos - Valores.  Fls./PD.

(...)

Datas Cartões de Crédito - Transacções  - Descritivos- Valores. Fls./PD

(...)

Datas Cartões de Crédito - Transacções - Descritivos -  Valores  Fls.

(...)

Datas Cartões de Crédito - Transacções - Descritivos - Valores   Fls.

(...)

6.º

No sobredito contexto, e em crescendo, o Autor fruiu indevidamente dos plafonds de crédito, que irregularmente desbaratou para seu ilícito benefício, utilizando o cartão Amex até perfazer o saldo de € 2.911,40, que se apurou a 02/09/04, e o cartão Visa até atingir o saldo de € 4.998,00 (cfr. fls. 15 e 26/PD).

7.º

A coberto das suas sindicadas práticas irregulares, o Autor ordenou processar movimentações cruzadas entre ambas as sobreditas contas de depósitos à ordem e entre as quais se contam as paradigmáticas transferências que se passam a circunstanciar:

Conta debitada Conta creditada

Datas       Montantes        Saldo/Saldo.  Número        Antes Após

Número                                                                   Antes Após

Fls./PD.

(...)

Conta debitada Conta creditada/Datas/ Montantes /Saldo/Saldo, Número, Antes Após

Número, Antes Após, Fls./PD

(...)

8.º Pelas indiscriminadas transferências descritas no número anterior, o colaborador arguido propôs-se regularizar – valendo-se dos sindicados "Cash Advances" ou socorrendo-se de fundos provenientes da sua conta ordenado n.° … - saldos devedores numa e noutra das suas referidas contas ou criar disponibilidades contabilísticas indispensáveis a  cobrir os débitos relativos às ordens de pagamento de qualquer dos dois referidos cartões de crédito.

 9.º

Em 10 de Março de 2004, o colaborador arguido logrou obter do Banco arguente a concessão de um empréstimo no valor de € 20.000,00 (MLS n.° …), com o qual liquidou outros créditos que tinha em curso, alguns registando atrasos no pagamento das respectiva prestações, silenciando então o facto de andar a incorrer nas sindicadas irregularidades, que continuou a perpetrar depois disso, para assim poder continuar a extrair proveito pessoal ilegítimo (cfr. fls. 16, ex vi fls. 11 a 14).

10.°

Em 3 de Setembro de 2004, e no âmbito do inquérito instruído pela Direcção de Auditoria do Réu, o colaborador arguido prestou as declarações que aqui se dão por inteiramente reproduzidas (cfr. fls. 11 a 14/PD).     

11.°

Em 21 de Outubro de 2004, o colaborador arguido subscreveu a carta datada de 15/10/04 e dirigida ao Ex.mo Sr. Presidente do Conselho de Administração do Réu, que aqui se dá por inteiramente reproduzida (cfr. fls. 70 e 71/PD).

12.°

Presentemente, em função de depósitos que o colaborador arguido realizou em meados de Outubro p.p. a crédito das DDA’s n.°s … (€ 1.000,00) e … (€ 3.100,00), os saldos descritos no anterior art. 10.° são, respectivamente, dos montantes de € 1.901,53 e 1.526,96 (cfr. fls. 7, ex vi fls. 68).

13.°

Ao processar as supracitadas operativas irregulares, o colaborador arguido sempre teve a noção de que perpetrava reiterados abusos de confiança continuados (cfr. arts. 205.º e sgts. do Código Penal), não podendo e nem devendo ignorar que, por tais actos e com grave culpa sua, violava as normas internas acima referidas, tal como ofendia os preceitos legais e regras deontológicas estabelecidas nas normas internas acima referidas e ofendia, com grave culpa sua e entre outros, os preceitos legais e regras deontológicas estabelecidas no:

a). Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedade Financeiras, aprovado pelo Dec.-Lei n.° 298/92, de 31/12, que o proíbe de intervir na apreciação e decisão de operações em que seja, por si ou pela interposta pessoa de seu pai e como foi o caso, directamente interessado (cfr. art. 86.° e cominação das alíneas i) do art. 211° e c) do n.° 1 do art. 212° daquele diploma legal);

e,

b). Código de Conduta que o Réu editou nos termos da Ordem de Serviço n.° ..., na redacção actualizada em 28/04/03, que lhe impunha:

1. «No exercício das suas funções...pautar o seu desempenho pelos mais elevados padrões de integridade e honestidade pessoais, cumprindo todas as disposições legais e regulamentares em vigor, aplicáveis às actividades a que se encontram adstritos, bem como todas as normas de deontologia profissional previstas nos códigos de conduta que sujeitam as actividades bancária, financeira,...» (cfr. n.° 2 do art. 6.º);

2. «Comunicar prontamente à sua hierarquia quaisquer conflitos de interesses ou de deveres que possam comprometer a observância integral das normas de conduta aplicáveis» (cfr. al. a) do n.° 4 do art. 6.º);

3. Abster-se de «intervir na apreciação e decisão de operações em que sejam directa ou indirectamente interessados os próprios, seus cônjuges, parentes ou afins em 1° grau» (cfr. n.° 1 do art. 19°); e,

4. Não executar quaisquer «operações nas quais intervêm... como ordenantes, peticionários ou beneficiários», cometendo o seu processamento a «outros colaboradores que não os próprios interessados, com apoio nas ordens ou documentos escritos normalmente exigíveis, sendo sempre vedada a movimentação pelos colaboradores das suas próprias contas, qualquer que seja a titularidade das mesmas» (cfr. n.° 6 do art. 19°).

14.°

Ao assumir os supra citados comportamentos ilícitos, o colaborador arguido violou, por reiterados, tais actos ou omissões e com grave culpa sua, os seguintes deveres:

a). Legais, de «realizar o trabalho com zelo e diligência», de «cumprir as ordens e instruções do empregador em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho», bem como o de «guardar lealdade ao empregador» (cfr. als. c) a e) do n.° 1 do art. 121° do Código do Trabalho); e,

b). Convencionais, de exercer de forma idónea, diligente, leal e conscienciosa as suas funções, segundo as normas e instruções recebidas e com observância das regras legais, dos deveres previstos no Código de Conduta que vigora no B….. e das regras usuais da deontologia da profissão e das relações de trabalho (cfr. al. a) da Cl.ª 6.ª do ACT do Grupo BCP).

15.°

No retrocitado contexto infraccional, prefigura-se ser ajustado subsumir a conduta ilícita do colaborador arguido no conceito da justa causa de despedimento (cfr. n.°s 1 a 3 – als. a), d) e e) do art. 396.° do Código do Trabalho), já que a factualidade ilícita que se lhe imputa, nas sobreditas circunstâncias, sempre traduzirá a assunção de comportamentos culposos por parte desse técnico de operações do Banco arguente que, pela sua gravidade, e consequências , arruínam de todo a relação de confiança, lealdade, fidelidade e respeito que é indispensável à subsistência da relação de trabalho em crise , a qual se afigura , de imediato e na prática , ser impossível manter, mormente porque a sua sindicada actuação :

a). Importa reiterada desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores;

b). Representa desinteresse repetido pelo cumprimento, com a diligência devida, das obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho que lhe fora confiado; e,

c). Causa lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa.

G) À Nota de Culpa, o A. respondeu, em 25 de Novembro de 2004, nos termos do documento cuja cópia está junta a fls. 90 a 92 do Processo Disciplinar.

H) Após a instrução do processo disciplinar, o R. veio a proferir decisão final que consta a fls. 129 a 144 do Processo Disciplinar, comunicada por carta datada de 30 de Março de 2005 e recebida em 7 de Abril de 2005, na qual decidiu proceder ao despedimento do autor, alegando justa causa e de cujo teor consta, entre o mais que :

"...Em conclusão da acção disciplinar que lhe movemos em 30 de Setembro de 2004, na sequência do processo prévio de inquérito instruído desde 16/7 a 10/9/2004, (…) vimos comunicar-lhe que decidimos despedi-lo de imediato e pela motivação de justa causa que invocamos nos termos dos n.°s 1 a 3 – als. a), d) e e) do artigo 396.° do C.T. ...

II. Dos factos Provados :

A/ Extraídos da acusação…

1.

    O colaborador arguido é o titular da DDA n.° …, que deixou de movimentar como conta ordenado em 4 de Março de 2002 (cfr. fls. 15, ex-vi fls. 43 a 55/PD), sendo também co-titular da DDA n.° …, conta da qual o primeiro titular solidário é seu pai, Sr. CC (cfr. fls. 27 e 28, ex-vi fls. 34 a 42/PD).

2.

O colaborador arguido sabe, tendo obrigação de não ignorar e não violar a disposição normativa estabelecida pelo Réu em Ordem de Serviço n.° 20.004 e no sentido de que, em relação a contas de depósitos à ordem de que seja titular ou co-titular e enquanto operador que esta Instituição habilitou a aceder ao seu sistema informático, lhe «é absolutamente vedado...todo e qualquer tipo de manutenção à respectiva conta, com excepção da requisição de livros de cheques, que deve ser por ele feita através da aplicação GGCC» e sem prejuízo do que lhe é lícito ordenar processar através, mormente, do "site Cidade B…".

3.

Por outro lado, o colaborador arguido também tem noção exacta de que as duas referidas contas configuram e merecem tratamento na óptica de um normal Cliente do Banco arguente, mormente no que tange à disponibilização e manutenção dos cartões de crédito que estão associados a cada uma delas, respectivamente, o AMEX n.° … e VISA n.° ….

4.

À revelia do conhecimento da sua hierarquia e aproveitando-se do cargo ou função que o Banco arguente lhe cometera, bem como fazendo uso indevido dos meios ou utensílios de trabalho que esta Instituição lhe disponibilizara para o exercício regular das suas atribuições, o colaborador arguido inobservou a normalizada interdição descrita no precedente art. 4.º a partir de 7 de Novembro de 2001, tal como, também e a partir de 22 de Setembro de 2003, o Autor passou a usurpar o exercício de competências creditícias que bem sabia terem sido delegadas pelas sobreditas OS n.° … e … à Comissão de Crédito da Sucursal, do modo que se passa a circunstanciar:

Datas Cartões de Crédito Descritivos de infracções Fls./PD

07/11/01

26/11/01

14/12/01

Alterou "MET PAGAM ANTERIOR"

22/09/03 AMEX n.º … Aumentou o limite de crédito de € 1.300 para € 1.500;

29/09/03 Visa n.° …: Aumentou o limite de crédito de € 1.500 para €2.500                                                              10;

30/09/03: Aumentou o limite de crédito de € 1.500 para € 1.700;

AMEX n.° … Aumentou o limite de crédito de € 1.700 para € 2.000;

20/10/03 Aumentou o limite de crédito de € 2.500 para € 3.000;

31/10/03 Visa n.° … Aumentou o limite de crédito de € 3.000 para € 3.500;

03/11/03 Aumentou o limite de crédito de € 2.000 para € 2.500     9;

02/12/03 AMEX n.º … Aumentou o limite de crédito de € 2.500 para € 3.000                                                             9/15;

19/01/04, Visa n.° …: Aumentou o limite de crédito, de € 3.500 para € 5.000;                                                                 

05/03/04 AMEX n.° … Alterou "MET PAGAM ANTERIOR"                                                                                    9.

5.

 O colaborador arguido perpetrou estes sucessivos e irregulares aumentos de plafond dos sobreditos cartões de crédito para, e até à primeira semana de Setembro p.p., deles se servir na realização dos paradigmáticos pagamentos de despesas correntes e levantamentos a crédito ou "cash advance" que se passam a circunstanciar:

Transacções

Datas Cartões de Crédito

Descritivos Valores

Fls./PD

(...)

Transacções

Datas Cartões de Crédito

Descritivos Valores

Fls.

(...)

Transacções

Datas Cartões de Crédito

Descritivos Valores

Fls.

(...)

6.

 No sobredito contexto, e em crescendo, o Autor fruiu indevidamente dos plafonds de crédito que irregularmente desbaratou para seu ilícito benefício, utilizando o cartão Amex até perfazer o saldo de € 2.911,40, que se apurou a 02/09/04, e o cartão Visa até atingir o saldo de € 4.998,00 (cfr. fls. 15 e 26).

7.

A coberto das suas sindicadas práticas irregulares, o Autor ordenou processar movimentações cruzadas entre ambas as sobreditas contas de depósitos à ordem e entre as quais se contam as paradigmáticas transferências que se passam a circunstanciar:

Conta debitada Conta creditada

Datas Montantes Saldo Saldo

Número

Antes Após

Número

Antes Após

Fls./PD

(...)

Conta debitada Conta creditada

Datas Montantes Saldo Saldo

Número

Antes Após

Número

Antes Após

Fls./PD

(...)

8.

Pelas indiscriminadas transferências descritas no número anterior, o colaborador arguido propôs-se regularizar – valendo-se dos sindicados "Cash Advances" ou socorrendo-se de fundos provenientes da sua conta ordenado n.° … – saldos devedores numa e noutra das suas referidas contas ou criar disponibilidades contabilísticas indispensáveis a cobrir os débitos relativos às ordens de pagamento de qualquer dos dois referidos cartões de crédito.

9.

Em 10 de Março de 2004, o colaborador arguido logrou obter do Banco arguente a concessão de um empréstimo no valor de € 20.000,00 (MLS n.° …), com o qual liquidou outros créditos que tinha em curso, alguns registando atrasos no pagamento das respectiva prestações, silenciando então o facto de andar a incorrer nas sindicadas irregularidades, que continuou a perpetrar depois disso, para assim poder continuar a extrair proveito pessoal ilegítimo (cfr. fls. 16, ex vi fls. 11 a 14).

10.

 Em 3 de Setembro de 2004, e no âmbito do inquérito instruído pela Direcção de Auditoria do Réu, o colaborador arguido prestou as declarações que aqui se dão por inteiramente reproduzidas (cfr. fls. 11 a 14/PD).

11.

Em 21 de Outubro de 2004, o colaborador arguido subscreveu a carta datada de 15/10/04 e dirigida ao Ex.mo Sr. Presidente do Conselho de Administração do Réu, que aqui se dá por inteiramente reproduzida (cfr. fls. 70 e 71/PD).

12.

 Em 2 de Novembro de 2004, em função de depósitos que o colaborador arguido realizou em meados de Outubro p.p. a crédito das DDA’s n.°s … (€ 1.000,00) e … (€ 3.100,00), os saldos descritos no anterior art. 10.° são, respectivamente, dos montantes de € 1.901,53 e 1.526,96 (cfr. fls. 7, ex-vi fls. 68).

B. Extraídos da defesa de fls. 90 e seguintes:

1. Em 25 de Novembro de 2004, os cartões de crédito Amex n.° … e Visa n.° …, de que o colaborador arguido era titular têm um valor utilizado de 1.281,53 € e 1.374,26 €, respectivamente (cfr. n.° 11 a fls. 91, ex vi fls. 93/PD).

2. O colaborador arguido foi admitido ao serviço do Banco arguente em 1988 (cfr. n.° 14 a fls. 91/PD).

3. Em relação à pessoa do arguido e sobre a factualidade sindicada nos autos, depuseram as seguintes testemunhas arroladas por aquele colaborador:

a. Sr. DD, Técnico do Centro de Contactos disse (...)

Quanto ao referido no n.° 3 da RNC (alteração do método de pagamento) considera que não há violação de qualquer norma, mormente por serem transacções que podem ser efectuadas por qualquer Cliente ou Colaborador no site do BCP» ...

... «As transferência entre contas podem ser efectuadas através da Internet, desde que exista saldo na conta a debitar e que a pessoa seja co-titular dessa mesma conta».

    «Na altura em que lhe foi notificada a nota de culpa, sabe que o Sr. AA regularizou as contas de forma a reduzir os créditos que se encontravam fora dos parâmetros normais»...

... «Sendo operações que qualquer Cliente pode executar através da Internet, considera que o Sr. AA nunca tentou enganar o Banco, e na altura em que foi notificado de que estava a ultrapassar os limites, este tratou de regularizar tudo quanto resultou das sindicadas operações»...

b. Sr. EE disse (...) "Qualquer Cliente/Colaborador poderá fazer alterações ao método de pagamento, valor a pagar, data de pagamento, pagamentos pontuais através dos canais postos à disposição pelo Banco, nomeadamente, antiga linha directa, B… 24, cidade B…».

«Em relação aos movimentos cruzados diz o depoente que as contas podem ser movimentadas de acordo com as condições gerais da abertura de conta, pois não faz sentido que sendo titular solidário de duas distintas contas não as possa livremente movimentar»;

c. Sr. FF, Gestor de Processo do Centro de Contactos referiu(...)

«Quanto à alteração da forma de pagamento de despesas realizadas por cartão de crédito, desconhece que haja alguma regra imposta aos Colaboradores e, portanto, estes têm o mesmo tipo de acesso que qualquer Cliente».

«Considera que o Sr. AA não prejudicou o Banco nem Clientes com a adopção das condutas por aquele perpetradas e não tem dúvidas que não houve qualquer intenção nesse sentido».

c. Sr. GG, Gerente reformado informou (...) que «Os pagamentos pontuais e alterações dos limites de pagamento podem ser executados por qualquer Cliente no site do B…, ou inclusive em ATM».

...«As transferências entre contas de que se é titular podem livremente ser movimentadas via Internet, mas desde que para tal haja saldo, pois, caso assim não seja, não é permitida essa movimentação».

-...«Considera que o Sr. AA não lesou o Banco em qualquer centavo, nem teve essa intenção».

«Tem conhecimento de que as contas foram todas regularizadas sem prejuízo financeiro para o Banco».

d. Sr. GG, Gerente reformado informou (...) que «Os pagamentos pontuais e alterações dos limites de pagamento podem ser executados por qualquer Cliente no site do B…, ou inclusive em ATM».

... «As transferências entre contas de que se é titular podem livremente ser movimentadas via Internet, mas desde que para tal haja saldo, pois, caso assim não seja, nem é permitido essa movimentação».

...«Considera que o Sr. AA não lesou o Banco em qualquer centavo, nem teve essa intenção».

III. Da ponderação dos factos e sua subsunção no Direito aplicável:

1. Analisando a factualidade descrita em II-A, verifica-se que os infraccionais comportamentos adoptados pelo colaborador arguido se traduzem em:

a. Abusos de confiança perpetrados pelos sucessivos e ilícitos expedientes de alterar, nas circunstâncias referidas em II-A/3 e 4, os plafonds dos dois cartões de crédito associados às duas contas de que é titular para, de seguida, extrair o benefício ilícito que tirou pelo uso abusivo desses cartões, ao utilizá-los em ATM's para sacar os sucessivos levantamentos em numerário de que se apossou através das operações de "cash advance" circunstanciadas elencadas em II-A/5, alterando, concomitantemente, os métodos de pagamento dos cartões Visa e Amex de acordo com o sumariado no ponto IIA/4, tudo isso, processado à revelia do conhecimento da sua hierarquia e sem obter a exigível autorização ou ratificação superior para o efeito; e

b. Violações repetidas das normas de conduta, abaixo descritas e desta feita, praticadas pela sucessão de movimentações que ele próprio ordenou processar, nas irregulares circunstâncias descritas em II-A/7, por forma a envolver a sua referida conta ordenado com aquela outra conta co-titulada por seu pai, em movimentações cruzadas.

2. Em sede de defesa, o colaborador arguido pretendeu justificar a sua sindicada actuação ilícita (...) em relação às sindicadas alterações da forma de pagamento dos referidos cartões de crédito (cfr. ii-A/4), «a utilização dessas alterações é normal, comum, totalmente regular e não viola qualquer norma interna ou contratual, nem atinge qualquer regra deontológica, sendo para tanto suficiente o recurso aos meios disponíveis na Internet» (cfr. n.° 3 a fls. 90).

Ora, a normalidade invocada no referido pagamento faria todo o sentido se as sindicadas alterações não fossem, como foram, efectuadas por próprio arguido no sistema informático do Banco arguente, por afectação directa e mediante interditada utilização da sua "password" , já que violou as normas que proíbem qualquer Colaborador de, por um lado, executar «operações não quais intervêm como ordenantes, peticionários ou beneficiários», que deverão ser processadas «por outros que não os próprios interessados» e, por outro lado, de intervir na apreciação e decisão de quaisquer operações de concessão crédito em que seja, por si ou pela interposta pessoa de seu pai e como foi o caso, directamente interessado (cfr. n.°s 1 e 6 do art. 19° da citada O.S. n.° ..., ex vi  do art. 86.° e cominação das als. i) do art. 211° e c) do n.° 1 do art. 212° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedade Financeiras aprovado pelo Dec.-Lei n.° 298/92, de 31/12).

Em relação à restante infracção consubstanciada nas sucessivas movimentações cruzadas que o colaborador arguido logrou processar nas duas sindicadas contas, também ocorre ofensa das regras descritas no parágrafo anterior quando aquele sustenta que «o que fez, em todos os casos, ... foi nem mais nem menos do que creditar a conta que apresentava saldo negativo com fundos licitamente transferidos da outra que apresentava saldo positivo, de molde a regularizar os respectivos montantes de forma equilibrada e com saldos positivos em ambas» (cfr. n.° 4 a fls. 90).

3. O Colaborador arguido não negou a autoria de nenhuma das práticas ilícitas que foi acusado (...) reafirmando o pedido de desculpas e propósito de emenda que antes declarara por carta dirigida ao Ex.mo Sr. Presidente do Conselho de Administração do Banco arguente (cfr. fls. 70 e 71, ex-vi fls. 90 a 92).

O Colaborador arguido também já assegurou a reparação da prejudicialidade material dos sindicados abusos de confiança, confinando a utilização dos plafonds de crédito associados a ambos os sindicados cartões ao montante superiormente autorizados.

4. Ao processar as supracitadas operativas irregulares, o colaborador arguido sempre teve a exacta noção de que perpetrava reiterados abusos de confiança continuado (cfr. arts. 205.º e sgts. do Código Penal), não podendo e nem devendo ignorar que, por tais actos e com grave culpa sua, violava as normas internas acima referidas, tal como ofendia os preceitos legais e regras deontológicas estabelecidas no:

a). Regime geral das instituições de crédito e sociedade financeiras aprovado pelo Dec.-Lei n.° 298/92, de 31/12, que o proíbe de intervir na apreciação e decisão de operações em que seja, por si ou pela interposta pessoa de seu pai e como foi o caso, directamente interessado (cfr. art. 86° e cominação das als. i) do art. 211° e c) do n.° 1 do art. 212.° daquele diploma legal); e

 b). Código de conduta que o Réu editou nos termos da Ordem de Serviço n.° ..., na redacção actualizada em 28/04/03, que lhe impunha:

1. «No exercício das suas funções...pautar o seu desempenho pelos mais elevados padrões de integridade e honestidade pessoais, cumprindo todas as disposições legais e regulamentares em vigor aplicáveis às actividades a que se encontram adstritos, bem como todas as normas de deontologia profissional previstas nos códigos de conduta que sujeitam as actividades bancária, financeira,...» (cfr. n.° 2 do art. 6.º);

2. «Comunicar prontamente à sua hierarquia quaisquer conflitos de interesses ou de deveres que possam comprometer a observância integral das normas de conduta aplicáveis» (cfr. al. a) do n.° 4 do art. 6.º);

3. Abster-se de «intervir na apreciação e decisão de operações em que sejam directa ou indirectamente interessados os próprios, seus cônjuges, parentes ou afins em 1.º grau» (cfr. n.° I do art. 19°); e

4. Não executar quaisquer «operações nas quais intervêm... como ordenantes, peticionários ou beneficiários», cometendo o seu processamento a «outros colaboradores que não os próprios interessados, com apoio nas ordens ou documentos escritos normalmente exigíveis, sendo sempre vedada a movimentação pelos colaboradores das suas próprias contas, qualquer que seja a titularidade das mesmas» (cfr. n.° 6 do art. 19.°).

Concomitantemente, e ao assumir os supracitados comportamentos ilícitos, o colaborador arguido violou, por reiterados tais actos ou omissões e com grave culpa sua, os seguintes deveres:

a). Legais, de «realizar o trabalho com zelo e diligência», de «cumprir as ordens e instruções do empregador em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho», bem como o de «guardar lealdade ao empregador» (cfr. als. c) a e) do n.° 1 do art. 121° do Código do Trabalho); e,

b). Convencionais, de exercer de forma idónea, diligente, leal e conscienciosa as suas funções, segundo as normas e instruções recebidas e com observância das regras legais, dos deveres previstos no código de conduta que vigora no B…. e das regras usuais da deontologia da profissão e das relações de trabalho (cfr. al. a) da Cl.ª 6.ª do ACT do Grupo B..).

I)

Na Ordem de Serviço identificada por …, com entrada em vigor em 11 de Junho de 2002, com o título "Regulamento de Concessão de Crédito " e que regulamenta as operações activas, consta, entre outras regras, que:

"...II. Princípios Orientadores.

«A concessão de crédito obedece ao princípio da prévia classificação do Cliente mediante a atribuição de um Grau de Risco, bem como à fixação de Linhas, Limites de Crédito ou Plafonds Triad».

V. Modelos de Apoio à Decisão.

Triad: modelo comportamental automático que calcula para cada Cliente um Grau de Risco e uma capacidade adicional de endividamento, por famílias de produtos (plafonds Triad)...

VI. Classificação de Clientes.

É o processo de atribuição de Grau de Risco.

1. ...A classificação é, em regra, feita de forma automática, de acordo com o modelo aplicacional Triad.

2. Para o segmento de Particulares...:

a) Aplica-se prioritariamente o modelo Triad.

VII. Limites de Crédito.

1. Linhas de Crédito são os montantes contratualizados para vigorarem durante um período certo e determinado.

Limites de Crédito são montantes fixados para vigorarem durante um determinado período mas que se destinam apenas á gestão dos órgãos internos do Grupo, podendo ou não serem do conhecimento do cliente.

Plafonds Triad montantes de envolvimento adicional à responsabilidade existente, válidos em certo momento para um cliente e determinados pelo modelo Triad. Não podem em quaisquer circunstâncias ser comunicados ao cliente.

2. Atribuição/revisão.

b) As Linhas, os Limites de Crédito e os Graus de Risco poderão ter validade máxima até 1 ano sobre a data da respectiva aprovação, para Clientes classificados entre A e C2, inclusive, e até 6 meses para outras classificações.

3. Renovação/Prorrogação.

a) A proposta de renovação das Linhas ou Limites de Crédito deverá ser obrigatoriamente apresentada com um mínimo de 30 dias de antecedência sobre a data da sua validade.

b) Nos casos de fundada impossibilidade de apresentação das propostas de renovação, dentro do prazo estabelecido, deve ser apresentada proposta devidamente justificada de prorrogação das Linhas ou Limites de Crédito...

XIII.    Níveis de Decisão.

A composição das Comissões de Crédito é a seguinte:

- Nível 4-...

- Nível 3-...

- Nível 2-...

- Nível 1 "...

- Nível Local - dois elementos, sendo que um deles deverá ser obrigatoriamente o responsável da unidade orgânica - no caso da Sucursal BB, onde se encontre domiciliada qualquer das contas de que o autor seja titular ou co-titular.

XV. Funcionamento dos níveis de Decisão.

A)         As decisões de (..) Nível Local cujas comissões de Crédito emitirão um despacho único, resultante da análise conjunta dos seus elementos.

B) As decisões de crédito só são válidas com a assinatura, ou respectiva autenticação informática, de dois elementos das Comissões de Crédito...

XIV.      Nível Local.

1. Está vedada ao Nível Local a classificação de clientes e a aprovação de Linhas e Limites de Crédito. Está igualmente vedada a apresentação de operações a níveis superiores desde que possam ser aprovadas, quando submetidas aos modelos de classificação e decisão automáticos.

2. Assim, o Nível Local pode decidir e formalizar operações, após análise casuística das mesmas, desde que enquadradas sequencialmente nas seguintes prioridades:

1.ª Prioridade: Dentro dos Plafonds Triad;

2.ª Prioridade: De acordo com a mensagem emitida pelo respectivo Scoring de Aceitação;

3.ª Prioridade: Dentro da competência definida na tabela constante do anexo A mediante classificação prévia em grau de risco pelo Scoring de Negócios...

4.ª Prioridade: Dentro dos limites aprovados pela Direcção de Crédito.

J) Na Ordem de Serviço identificada por NP 83/020, com entrada em vigor em 13 de Março de 2003, com o título "Manutenção e Gestão de Cartões", consta, entre outras regras, que as alterações ao limite de crédito de um cartão Amex ou Visa podem ser efectuadas a pedido do cliente, pela linha de atendimento ou mediante o preenchimento de impresso do modelo próprio, assinado pelo cliente, devendo qualquer alteração quanto ao método de pagamento ter o acordo, que deve ser formalizado.

L) O Banco réu faz publicidade junto dos seus clientes, no mercado bancário em geral, dirigindo-a também àqueles que também são seus trabalhadores, a propósito das mais diversas modalidades de concessão de crédito e nos mais diversos âmbitos e finalidades (habitação, compra de automóvel, férias, mercados de valores mobiliários - acções e outros -, escolar, consumo, etc.), criando, divulgando e disponibilizando as mais diversas facilidades de acesso a esses créditos, inovando, em relação à concorrência, as formas mais rápidas a tal acesso e estabelecendo facilidades de contacto com ele, réu, por parte dos respectivos utentes/clientes e estabelecendo para estes facilidades de pagamento de várias e novas formas.

M) De entre as modalidades de acesso e facilidades de utilização deste tipo de concessão de crédito do R. consta a dos cartões de crédito nas suas várias modalidades, espécies, designações e formas de apresentação (Prestige, Millennium, MasterCard, Visa, AMEX , etc.), com possibilidade de utilização por via electrónica, através da INTERNET ou por meio de posto público MULTIBANCO, e a modalidade de crédito designado por Cash advance que consiste em levantar dinheiro (numerário) por conta do limite do próprio crédito associado ao cartão de crédito, mediante a contrapartida de taxa de juro mais elevada.

N) Outra modalidade de crédito atribuída pelo R. a todos os clientes que o solicitem e a trabalhadores ao seu serviço é o adstrito à Conta de Depósitos à Ordem por Trabalhadores por conta de outrem, designada "conta ordenado", e que consiste na possibilidade de utilizar um montante equivalente à média das quantias lançadas a crédito nessa conta com origem em salários.

O) A operação de aumento do limite de crédito adstrito aos cartões de crédito referido na alínea M) é uma operação bancária vulgar, normal e comum, sendo objecto de rejeição casos de clientes devedores relapsos ou com histórico de cheques sem provisão ou com incidentes bancários ou manifesta incapacidade de cumprir o crédito solicitado.

P) O R., no exercício da sua actividade creditícia normal, equipara os seus trabalhadores aos demais clientes e atribui-lhes "tratamento na óptica de um normal Cliente do Banco", concedendo-lhes várias linhas de créditos em idênticas condições aos demais clientes, não restringindo, nem limitando, o acesso dos mesmos ao crédito, nas várias formas, nomeadamente os mencionados cartões de crédito, entre os quais os das modalidades designadas por AMEX e Visa.

Q) O Banco réu, relativamente aos trabalhadores ao seu serviço e do Grupo B…, cobra taxas de juros e pratica as demais condições de utilização desses créditos, incluindo os agravamentos/penalizações por pagamentos em atraso e/ou outros.

R) A conta DDA n.° …, co-titulada pelo pai do autor, sempre mereceu tratamento na óptica de um normal cliente, o que se verificou também com a conta DDA n.° …, a partir de 4 de Março de 2002, ou seja, data a partir da qual deixou de ser movimentada como conta ordenado.

S) O A. pagou os juros comerciais e demais encargos estabelecidos pelo réu relativos aos créditos atinentes às operações bancárias resultantes dos aumentos de limite de crédito adstrito aos cartões de crédito.

T) Depois da Direcção de Auditoria do Banco réu ter detectado as operações descritas na Nota de Culpa e advertido pela Inspecção do réu, o autor predispôs-se a repor tudo quanto fruíra através de tais operações, reembolsando o Banco réu relativamente aos sindicados movimentos e operações e confinando a utilização dos plafonds de crédito associados a ambos os sindicados cartões aos montantes superiormente autorizados.

U) Por ordem e no interesse do R., o A. foi sucessivamente colocado nas seguintes "Unidades Orgânicas" do R. com as funções a seguir indicadas:

DATA               FUNÇÃO       UNIDADE ORGÂNICA

04-01-1988, Administrativo Direcção de Operações.

05-09-1989, Administrativo … - Operações ….

20-10-1989, Polivalente.

29-06-1990, Polivalente …-S-SUCURSAL Guerra Junqueiro –….

31-07-1990, Procurador …-S-SUCURSAL Palmeiras – …. 28-12-1990, Polivalente …-S-SUCURSAL Oeiras – ….

01-03-1991, Subchefe Sucursal …-S-SUCURSAL Oeiras –….

12-01-1995, Subchefe Sucursal …-S-SUCURSAL Cacém de Cima – ….

 02-01-199, 1.º Responsável …-S-SUCURSAL Amadora Bosque – ….

 21-10-1997, Gestor de Reclamação ...-S-DGCNR Divisão Clientes ….

 12-01-1998, Gestor Comercial EP-EQUIPA PROJECTO "CONTA RECHEIO".

 30-06-1998, Gestor Comercial …-S-DGCNR Divisão Clientes ….

 13-07-1998, Força Vendas …-S-DIV Operações Especializadas …

 08-06-1999, Subchefe Sucursal …-S-SUCURSAL Massamá ….

 02-10-2000, Subchefe Sucursal …-S-SUCURSAL Brandoa …

 12-10-2000, 1.º Responsável …-S-SUCURSAL Brandoa ….

 04-12-2001, 1.º Responsável ...-S- Direcção Coordenação Sul    ....

 15-02-2002, DSR - Departamento Cartões.

 18-02-2002, DSR - Cartões PROCESSAMENTO CONTROLO.

 25-06-2002, DSR - Cartões Serviço Clientes.

 26-05-2003, DSB - DIRECÇÃO SELF BANKING.

 01-06-2003, Técnico de Operações.

 03-05-2004, DSB - Área Controlo Contabilístico ATM.

V) A partir de 1/3/1991, o R., por via do exercício das funções do autor nos períodos e locais referidos na alínea anterior, classificou-o como Subchefe de Sucursal e como 1.º (Primeiro) Responsável.

X) No ACTV publicado no BTE n°42, de 15/11/1994, para o sector bancário aplicável até 2002, às relações laborais entre autor e réu, a categoria profissional de Subgerente encontra-se definida como «trabalhador que, em plano subordinado, participa na gestão comercial e ou administrativa de um estabelecimento, cabendo-lhe substituir o gerente nas suas ausências e impedimentos» e a categoria de Gerente como o «trabalhador que, no exercício da competência hierárquica e funcional que lhe foi superiormente delegada, tem por função a gestão comercial e administrativa de um estabelecimento».

Z) Foi a seguinte a evolução da retribuição paga pelo R. ao A.:

Data          Grupo    Nível   Retribuição Base

04.01.1988     1        03           46.370S00

04-01-1989    1        04           56.430$00

01-03-1989    1        05           65.300S00

01-07-1989    1        06            81.310S00       |

01.03.1991     1        06            91.850$00

01.07.1991     1         06          104.200S00

01.07.1992     1        06           115.100S00

01-01-1993     1        07           121.900$00

01.07.1993     1        07          128.650$00

01.07.1994     1        07          133.800S00

01.11.1995      1        07          139.800$00

01-11-1996     1        08           151.100$00

01.01.1997      1        08           156.000$00

01.01.1998      1        08           160.700$00

01.01.1999      1        08           165.950S00

01-01.2000     1        08           171.350S00

01-04-2000    1        08           171.350S00

01-01-2001     I        08           177.950$00

01-01-2002    B        08               €935, 50

01-01-2003    B        08               €960, 00

01-01-2004    B        09               €1.100,00

01.01.2005     B        09               €1.127,50.

AA) Desde 1 de Março de 1991, o A. exerceu a sua actividade sob o regime de isenção completa de horário de trabalho, com retribuição adicional estabelecida na contratação colectiva correspondente a duas horas de trabalho suplementar por dia.

1. As operações e movimentos a que aludem os pontos 4, 5 e 6 da nota de culpa, efectuados pelo A., estão sujeitas às normas internas referidas nas alíneas I) e J) dos factos assentes, bem como às normas contidas na O.S. 20/004, de 02.03.1998, e à Norma de Procedimentos 20/008, de 07.12.2000, com o teor constante, respectivamente, de fls. 173-182 e de fls. 183-194, que se dá por inteiramente reproduzido; e que as alterações ao limite de crédito descritas na nota de culpa estão sujeitas a autorização prévia ou pelo menos à ratificação superior da hierarquia do A.

2. Para o autor pedir alterações ao limite de crédito de um cartão Amex ou Visa tinha que ser, sempre, pela linha de atendimento ou mediante o preenchimento de impresso do modelo próprio.

3. Na Ordem de Serviço identificada por NP 83/020, com entrada em vigor em 13 de Março de 2003, com o título "Manutenção e Gestão de Cartões", consta, entre outras regras, que as alterações ao limite de crédito de um cartão Amex ou Visa podem ser efectuadas a pedido do cliente, pela linha de atendimento ou mediante o preenchimento de impresso do modelo próprio, assinado pelo cliente, devendo qualquer alteração, quanto ao método de pagamento, ter o acordo que deve ser formalizado. As modificações ao método de pagamento podem ser feitas pelos clientes nos balcões, pelo telefone ou via internet mediante o respectivo código de acesso, sendo a sua concessão automática desde que respeitados os limites mínimos e máximos previamente fixados.

4. A alteração sucessiva e o crescendo dos limites de crédito dos cartões, pelo autor, nas circunstâncias descritas na Nota de Culpa, teve por fim atribuir a si próprio crédito para dele poder fruir, acima dos limites que o Banco réu se predispusera a atribuir aquando da emissão e disponibilização desse produtos Amex e Visa; mas era ideia do A. pedir a ratificação da hierarquia, posteriormente.

5. A movimentação da conta-ordenado está sujeita a supervisão e controlo permanente da área de recursos humanos do R., contrariamente ao que sucede com qualquer das contas que o autor utilizou para efectuar as sindicadas operações relativamente às quais qualquer irregularidade de manutenção só é detectável nas aleatórias e casuísticas análises efectuadas pela Auditoria do Banco, no domínio da movimentação das contas tituladas por colaboradores.

6. Os factos referidos são do conhecimento do autor.

7. O autor cuidou de praticar as operações descritas na Nota de Culpa sem afectar a sua conta-ordenado porque sabia que a movimentação desta está sujeita a supervisão e controlo permanente da área de recursos humanos do réu.

8. A R. atribuiu aos seus colaboradores passwords de níveis distintos em função das respectivas tarefas que lhes estão cometidas, limitando assim o acesso dos seus meios técnicos e informáticos.

9. A alteração sucessiva e o crescendo dos limites de crédito dos cartões, pelo autor, nas circunstâncias descritas na Nota de Culpa, teve por fim atribuir a si próprio crédito para dele poder fruir, acima dos limites que o Banco réu se predispusera a atribuir aquando da emissão e disponibilização desse produtos Amex e Visa e que para inserir no sistema informático da R. as alterações de plafond e de método de pagamento o A. utilizou a sua password atribuída pela R.

10. Todo e qualquer cliente tem sempre de solicitar ao Banco réu o aumento do plafond do cartão de crédito, pretensão que terá de ser deferida ou recusada pelo órgão de decisão a quem esteja delegada a correspondente competência para aprovar tal concessão.

11.         O autor sabe que não pode usar os meios técnicos e informáticos do réu para realizar qualquer transacção contrária às normas do Banco e do regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras, referidas nas alíneas I) e J).

12. Para o autor pedir alterações ao limite de crédito de um cartão Amex ou Visa tinha que ser, sempre, pela linha de atendimento ou mediante o preenchimento de impresso do modelo próprio e as modificações ao método de pagamento teria que ser por acordo formalizado e que, designadamente, é permitido ao cliente modificar a data de pagamento das prestações e a percentagem do valor de cada uma em relação à dívida dentro dos limites previamente estabelecidos.

13. A R. permite aos trabalhadores ao seu serviço e do Grupo B… a utilização do cash advance, desde que dentro do limite de crédito do cartão previamente autorizado, bem como a utilização do crédito da conta-ordenado dentro do respectivo limite de crédito previamente autorizado.

14. As modificações do método de pagamento pelos clientes estão igualmente sujeitas às regras referidas nas alíneas I) e J), e que de entre estas regras consta a que impõe que as alterações ao limite de crédito do cartão Amex ou Visa, não estando abrangidas pelo "Triad" referido na alínea I), tenham que ser sempre efectuadas pela linha de atendimento ou mediante o preenchimento de impresso do modelo próprio.

15. A operação de aumento do limite de crédito, adstrito aos cartões de crédito, é rejeitado em casos, de entre outros, de devedores relapsos ou com histórico de cheques sem provisão ou com incidentes bancários ou com manifesta incapacidade de cumprir o crédito solicitado.

16. O A. nunca fora devedor relapso ou com histórico de cheques sem provisão ou com incidentes bancários ou incapacidade de cumprir o crédito solicitado.

17. A R. sabia que o empréstimo em causa era também para suprir dificuldades financeiras do A.

18. O A. efectuou as operações e os movimentos descritos nas tabelas dos arts. 5.º e 7.º da nota de culpa, bem como que algumas das transferências descritas neste último artigo apenas foram possíveis por força de alguns dos cash advance referidos no art. 5.º da nota de culpa.

19. O autor passava por um conturbado processo de divórcio.

20. E necessitava de prover à solução da sua actual habitação e respectivo recheio.

21. O A. pagou a prestação alimentar (€ 250,00) ao seu filho HH até aos 18 anos deste, e que o mesmo nasceu em 10.08.1995.

22. O A. sempre foi um trabalhador sério, honesto, diligente, esforçado e interessado no desenvolvimento do Banco réu.

23. O A. é apontado, pelo menos por alguns, como um trabalhador competente, atento à defesa dos interesses do Banco.

24. E desempenhou funções de responsabilidade, com dedicação, rigor e aprumo.

25. O A. é estimado, prestigiado e benquisto por alguns dos seus colegas/superiores hierárquicos e também fora do Banco por pessoas suas amigas.

26. O A. era uma pessoa alegre, interessada pela vida, motivada para a profissão de bancário, confiando nos seus colegas e superiores hierárquicos e voltado nos tempos livres para o crescimento e desenvolvimento do seu filho jovem.

27. Por reflexo do processo disciplinar que lhe foi instaurado pela R. e do descrito na nota de culpa o A. sentiu a sua imagem e bom nome denegridos, passando por essa razão e também devido ao processo de divórcio e às dificuldades financeiras que atravessava, a ser uma pessoa triste e com alterações de humor frequentes.

28. A partir de certa altura o A. teve dificuldades em dormir devido às suas dificuldades financeiras e que tal, bem como o referido na resposta ao artigo anterior, teve reflexos na sua relação com outras pessoas, nomeadamente com o seu filho, outros familiares e amigos.

29. Por ordem e interesse da R., a partir de 01.03.1991, nos estabelecimentos desta, designados pelo mesma de sucursais mencionados na alínea U) dos factos assentes, o A., pelo menos de Dezembro de 1990 a 1992 e de Janeiro de 1995 a Janeiro de 1997, como subchefe de sucursal, passou a participar na gestão comercial e administrativa desses estabelecimentos [1](1), juntamente com os respectivos Gerentes/Chefes de Sucursal, integrando a Comissão de Crédito da Sucursal.

30. Pelo menos de Dezembro de 1990 a 1994 e de Janeiro de 1995 a Janeiro de 1997, o A. chegava ao estabelecimento onde se encontrava colocado sempre por volta das 8h00m, sendo muitas vezes ele, no período de Dezembro de 1990 a 1994, quem abria a porta do estabelecimento, bem como que pelo menos nos períodos de Dezembro de 1990 a 1992 e de Janeiro de 1995 a Janeiro de 1997 o A. interrompia para almoço e descanso durante apenas 15m/30m, prosseguindo a jornada de trabalho ininterruptamente até às 19h30/20h00, acontecendo muitas vezes que se prolongava até às 20h30 ou 21h00.

31. Nos períodos de Dezembro de 1990 a 1992 e de Janeiro de 1995 a Janeiro de 1997 o A. foi por vezes trabalhar ao Sábado, sem qualquer retribuição ou pagamento por parte da R.

32. Nos períodos de Dezembro de 1990 a 1992 e de Janeiro de 1995 a Janeiro de 1997, quando os sinais de alarme instalados nos estabelecimentos eram accionados, o que não sucedia muitas vezes, o A. ou o gerente deslocavam-se aos mesmos em qualquer dia e hora.

33. Não foi efectuado qualquer pagamento pela R. ao A. pelo trabalho referido em 48.° que tivesse sido prestado fora do seu horário de trabalho.

                                         __

Os factos fixados não foram objecto de impugnação, pelas partes, não se prefigurando qualquer das situações a que alude o n.º 3 do art. 729.º do C.P.C., a justificar a intervenção deste Supremo Tribunal.

Será assim, com base neles, que vão resolver-se as questões que integram o objecto do presente recurso.

                                         __

B.2 – O Direito.

Conhecendo.

- Da justa causa do despedimento.

Na sequência do bem delineado enquadramento normativo de subsunção, que se ratifica, nos seus traços gerais – e que a pouco ou nada, de relevante, se justificará aditar – ajuizou-se, no Acórdão sub specie, que a sindicada actuação do A./recorrente colocou irremediavelmente em causa a manutenção da relação de trabalho, pelo que, não sendo exigível ao R. empregador a continuação do vínculo laboral, ocorreu justa causa de despedimento.

Na respectiva fundamentação jurídica considerou-se nomeadamente:

«No caso vertente, a conduta do autor assume particular gravidade.

Com efeito, o mesmo realizou operações bancárias que eram proscritas pelo réu e legislação aplicável à respectiva actividade.

Com a sua actuação, o autor acabou por beneficiar de crédito em montante superior ao que decorria do valor atribuído pelos cartões de crédito que o réu lhe havia concedido.

Fê-lo à revelia e sem o consentimento deste, tendo-se a conduta do autor espraiado no tempo e por inúmeras ocasiões, como resulta da factualidade apurada.

Na verdade, como se provou, as operações e movimentos em causa, efectuados pelo A., estavam sujeitas a autorização prévia, ou pelo menos à ratificação superior da hierarquia. Sendo que a alteração sucessiva (e o crescendo dos limites de crédito dos cartões) teve por fim atribuir ao A. crédito acima dos limites que o réu se predispusera a atribuir aquando da emissão e disponibilização dos cartões Amex e Visa.

Acresce que, como também apurado, todo e qualquer cliente tem sempre de solicitar ao réu o aumento do plafond do cartão de crédito, pretensão que terá de ser deferida ou recusada pelo órgão de decisão a quem esteja delegada a correspondente competência para aprovar tal concessão.

Importa ponderar ainda, salvo o devido respeito, que as dificuldades pessoais que o A. atravessava não permitem justificar o seu comportamento. Na realidade, não se demonstra que não tivesse podido obter algum apoio financeiro no seu meio familiar ou de amizades para equilibrar a sua situação, ou mesmo recorrer atempadamente a empréstimo junto do réu, como veio a fazer mais tarde, embora depois disso, (incompreensivelmente), ainda tenha continuado com a referida prática.

Outra atitude poderia e deveria ter sido assumida pelo autor para superar a fase difícil em que se encontrava, não sendo aceitável no âmbito da relação de trabalho a prática irregular, ilegítima e continuada por si seguida.

Deste modo, ao agir nos termos em que o fez, o A. violou os normativos bancários que proíbem esse tipo de operação (Ordem de Serviço n.º …, de 2.3.1998; Norma de Procedimentos 20/08, de 7.12.2000; Ordem de Serviço NP …, de 13.3.2003; Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras; Decreto-Lei n.º 298/92, de 31.12) e, embora tenha acabado por pagar ao réu os valores em causa, a sua conduta é reveladora de uma acentuada falta de lealdade perante este, o que origina se quebre a confiança do empregador no seu trabalhador.

Efectivamente, segundo o entendimento do nosso mais Alto Tribunal, a quebra da confiança, fundamento da relação laboral, especialmente na actividade bancária, permite demonstrar a imediata insubsistência da relação laboral pela cessação do seu elemento essencial, mesmo que, por ventura, não sejam causados prejuízos ao empregador – cfr., entre muitos outros, o Acórdão do S.T.J. de 18.7.2005, CJ/S.T.J., Tomo I, pg. 227.

Nesta linha, à semelhança do que vem sendo entendido em casos semelhantes, na relação contratual de trabalho não é exigível à entidade empregadora que, continuamente, esteja a controlar o trabalhador por nele não depositar fundadamente confiança, por já ter sido violado o dever de lealdade.

E este dever não é graduável em sede de sanção disciplinar, porque a entidade patronal, segundo as regras da experiência comum, estaria sempre suspeitosa, porque ‘quem faz um cesto faz um cento’ e ‘quem faz o menos, se as circunstâncias se proporcionarem, faz o mais».

Subscrevemos a solução eleita e, no essencial, as considerações críticas que constituem os fundamentos que a suportam.

A noção de justa causa, delineada no art. 396.º/1 do Código do Trabalho/2003 – provinda do art. 9.º/1 da LCCT – manteve-se, nos seus contornos gerais, no art. 351.º/1 do Código do Trabalho/2009.

Assenta numa conduta culposa do trabalhador, disciplinarmente censurável, traduzida na violação de deveres contratuais, cuja gravidade e consequências tornem imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

A determinação dessa impossibilidade prática encerra o melindre operativo da sua despistagem, pois que de uma inexigibilidade jurídica se trata, alcançável mediante um juízo de prognose ou probabilidade, resultante final da consideração dos factores e circunstâncias relevantes, como se preceitua no n.º 2 da norma constante do Código do Trabalho/2003 (n.º3 da previsão homóloga da actual Codificação).

 A gravidade do comportamento – com o implicitado balanço de proporcionalidade, necessariamente presente no momento da opção pela sanção consentânea – afere-se em função do grau de culpa e de ilicitude, como é próprio do direito sancionatório, devendo surpreender-se um nexo de causalidade, de imediação lógica e cronológica, entre a conduta infraccional e a impossibilidade de subsistência do vínculo.

Esta será a solução, convocando a eleição da sanção expulsiva, sempre que, tudo ponderado, se conclua, na análise diferencial[2] dos interesses em jogo, que, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato – com as relações patrimoniais e interpessoais que isso implica – constitua uma imposição desmesurada[3] e violenta, e por isso injusta, ferindo a sensibilidade e liberdade psicológica de uma pessoa normal, colocada na posição do real empregador.

 O A., com as acrescidas responsabilidades decorrentes da sua qualificação profissional e a correspondente confiança do R./empregador, afrontou manifestamente o dever geral de lealdade (art. 121.º/1 do Código do Trabalho), como ficou adequadamente caracterizado.

Como se consignou na decisão sob censura, citando Monteiro Fernandes, (no sentido corroborante do já acima adiantado), a inexigibilidade relevante determina-se mediante um balanço, em concreto, dos interesses em presença – o da urgência da desvinculação e o da conservação do vínculo – prevalecendo o primeiro sempre que se conclua, como aqui se conclui, que a continuidade da relação contratual, no contexto das circunstâncias do caso, constitui uma imposição excessiva e violenta, aferível pelo paradigma da sensibilidade e liberdade psicológica de uma pessoa média/normal colocada na posição do empregador.

Atentas as especiais funções e responsabilidade profissionalmente cometidas ao A., assentes no indefectível elemento fiduciário, não se prefigura que uma qualquer medida conservatória do vínculo fosse adequada à sanação da crise de confiança fatalmente comprometida com a sua reiterada conduta.

O desvalor axiológico do comportamento factualizado torna patente a inexigibilidade da manutenção do vínculo juslaboral.

Como é pacificamente entendido, desde sempre, neste Supremo Tribunal, a exigência geral da boa fé na execução dos contratos assume, neste sector de actividade, um especial significado e reveste-se por isso de particular acuidade.

Por óbvias razões: a relação juslaboral pressupõe a integridade, lealdade de cooperação e absoluta confiança da/na pessoa contratada.

É objectivamente certo que a alteração dos plafonds dos cartões de crédito, sem a devida autorização hierárquica, com as processadas movimentações cruzadas entre ambas as contas de D.O., e a correspondente inobservância das normas procedimentais de controlo, instituídas no/pelo R., tornam a actuação do A. numa conduta fora da imperativa transparência exigível no comportamento do trabalhador bancário.

Postos tais valores/deveres em crise, da forma reiterada como os factos retidos patenteiam, não se vê como possa razoavelmente impor-se a ultrapassagem da legítima dúvida instalada no espírito do empregador acerca da idoneidade futura da conduta do trabalhador.

E não releva, na concretização do juízo subsumível à noção de justa causa, o montante dos valores monetários em causa, a reposição dos eventuais prejuízos, ou mesmo a sua inverificação real.

A quebra da relação de confiança consubstanciou-se, no caso, na gestão abusiva e reiterada das suas contas, alterando sucessivamente os plafonds dos cartões de crédito que lhes estavam afectos – à revelia das regras que conhecia perfeitamente, por força do exercício das suas funções – o que determina a insustentabilidade do suporte psicológico mínimo, enquanto étimo essencial ao desenvolvimento da relação juslaboral, maxime na específica actividade bancária.

Assim, acertadamente se concluiu que a conduta do A. colocou irremediavelmente em causa a manutenção da relação de trabalho sujeita, não sendo exigível ao empregador/R. a manutenção do vínculo juslaboral.

 O que a propósito contrapõe o recorrente não abala minimamente o bem fundado do juízo eleito.

A solução proclamada não postergou os convocados princípios da proporcionalidade e da equidade, como se deixou sobejamente dilucidado.

Antes operou, em rectas contas, um acertada valoração dos factos e uma adequada qualificação jurídica dos mesmos, à luz do quadro normativo de significação.

                                         __

2 – Da reclamada reclassificação profissional do A.

Pretendeu o A. a condenação do R. no reconhecimento de que lhe é devida a categoria profissional de Sub-gerente, desde 1.3.1991, e de Gerente, desde 12.10.2000, com o consequente pagamento das diferenças retributivas, que liquidou.

Alegou basicamente, para o efeito, que foi colocado pelo R. nas unidades orgânicas que discrimina, passando a participar, desde a primeira data referida, na gestão comercial e administrativa, cabendo-lhe inclusivamente substituir o gerente nas suas ausências e impedimentos, o que corresponde à categoria de Subgerente.

Todavia o R. qualificou-o, nesse período, como Subchefe de sucursal.

E a partir de 12.10.2000 passou a participar na gestão comercial e administrativa, em funções que correspondem às de Gerente, classificação categorial que reivindica.   

Esta sua pretensão não obteve acolhimento nas Instâncias.

O Acórdão revidendo, versando a questão, considerou nomeadamente (transcrevemos):

‘…[O] A. não logrou demonstrar, como lhe competia (art. 342.º/1 do Cód. Civil), que exercesse as funções correspondentes (ou o núcleo essencial delas) às categorias que reclama, pois não basta ter-se provado que passou a integrar a comissão de crédito da sucursal para se poder concluir nesse sentido.

Na verdade, não resulta da documentação junta aos Autos a esse propósito (fls. 195 a 230), que os elementos integrantes das Comissões de Crédito, cuja estrutura é hierarquizada, assumam a qualidade de subgerentes ou de gerentes bancários.

Tão pouco releva a circunstância de o R. ter indicado o A. como sub-chefe de sucursal, e depois como 1.º responsável e chefe de sucursal, já que, como se viu, o que importava apurar era se as concretas funções desempenhadas pelo A. correspondiam às das categorias cuja atribuição reclama.

 O que o mesmo não logrou fazer.

Igualmente não demonstrou o A. ocorrer violação dos arts. 13.º e 59.º da C.R.P., não tendo o mesmo sequer invocado o trabalhador ou trabalhadores em relação aos quais se considera discriminado’.

O recorrente contrapõe, de novo, que foi o próprio R. quem qualificou como tal o A., ao longo do tempo, primeiro como Subchefe de Sucursal e, depois, quer como 1.º Responsável, quer como Chefe de Sucursal …figuras que embora nem existam no elenco das sucessivas Convenções Colectivas de Trabalho aplicáveis ao caso, assentam no exercício efectivo de funções de enquadramento e gestão dos respectivos estabelecimentos do Banco.

E, assim, contornou o R. as regras contratualmente estabelecidas e constantes, primeiro, do ACTV para o Sector Bancário e, depois, do ACT do Grupo B…, e, consequentemente o disposto no art. 118.º do Código do Trabalho e, por via disso, os arts. 13.º/1 e 59.º, n.º1, a), da C.R.P.

Tudo visto e ponderado, somos a concluir, ainda aqui, que o recorrente não tem razão.

Com efeito:

Como se estabeleceu em sede de facto – alíneas U) e V) do respectivo elenco, a que nos reportamos – o A. foi sucessivamente colocado, por ordem e no interesse do R., nas ‘Unidades Orgânicas’, nos períodos e com as funções aí constantes. 

Assim, a partir de 1.3.1991 o R. classificou o A. como ‘Subchefe de Sucursal’ e, depois, a partir de 2.10.2000, como ‘1.º Responsável’.

No ACTV para o Sector Bancário, (in BTE n.º 31/1990, de 22/8, com posteriores revisões, maxime a constante do BTE n.º 42/1994, de 15/11), aplicável à actividade desenvolvida pelo A. até finais de Dezembro de 2001, previam-se, no Anexo III, relativo às categorias de funções específicas ou de enquadramento, dentre outras, duas categorias profissionais próximas, mas diferenciadas, as de ‘Chefe’ e ‘Subchefe’ de serviço…administrativo de estabelecimento e sector, e as de ‘Gerente’ e de ‘Subgerente’, com diverso conteúdo funcional.

Como do respectivo descritivo resulta, só o ‘Gerente’ tem por função a gestão comercial e administrativa de um estabelecimento.

O ‘Subgerente’ participa, em plano subordinado, na gestão comercial e/ou administrativa de um estabelecimento, cabendo-lhe substituir o gerente nas suas ausências e impedimentos.

O ‘Chefe’/(1.º responsável) e o ‘Subchefe’ de estabelecimento/sucursal têm um munus diverso: cabe ao primeiro programar, organizar, coordenar e responsabilizar-se pela execução das actividades de um serviço, divisão, secção, sector ou outra unidade de estrutura orgânica equivalente da instituição; é tarefa do segundo colaborar, de forma subordinada ao superior hierárquico, na chefia do respectivo departamento, cabendo-lhe substitui-lo nas suas faltas ou impedimentos.

Com o ACT do Grupo B…, que sucedeu ao ACTV para o Sector Bancário, a partir de 2002, o seu Anexo I, sob a epígrafe ‘Categorias Profissionais do Grupo B – Área comercial’, mantém nomenclatura paralela, com conteúdo funcional semelhante: ‘Gerente e Subgerente de estabelecimento’ e ‘Chefe e Subchefe de estabelecimento/operações’.

A estas diferentes categorias profissionais correspondem naturalmente diferentes níveis retributivos. 

Embora o A. não tenha logrado demonstrar as funções concretamente exercidas, em tais períodos – para além da única circunstância de facto de integrar a ‘Comissão de Crédito’ da Sucursal, o que, só por si, não é, manifestamente, quanto baste[4] para o pretendido efeito – vemos que o R. o classificou, em Março de 1991, como ‘Subchefe de Sucursal’ e, mais tarde, como ‘1.º responsável de Sucursal’, o que corresponderá, mais rigorosamente, a ‘Chefe’ de estabelecimento, na nomenclatura categorial do falado Anexo III.

Ante o sobredito – e porque em momento factual algum se esboça sequer que o A. tenha assumido funções de gestão comercial e administrativa de um estabelecimento (agência ou sucursal), únicas que legitimariam a reivindicada categoria de ‘Gerente’ ou ‘Subgerente’ – não decorre que o R. devesse fazê-lo de outra forma, e, menos, nos termos pretendidos.

Não foram, pois, afrontadas as identificadas cláusulas do ACTV para o Sector Bancário e, sucessivamente, do ACT do Grupo B…, nem, por via reflexa, o art. 118.º do Código do Trabalho.

E, menos, por isso, os simplesmente invocados princípios Constitucionais programáticos da ‘igualdade’ e do ‘para trabalho igual, salário igual’ – arts. 13.º/1 e 59.º, n.º 1, a) da C.R.P.

Improcedem as asserções conclusivas do recurso, sendo de manter o Acórdão impugnado.

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                                      III –  

                                  DECISÃO

Em conformidade com os fundamentos expostos, delibera-se negar a Revista, confirmando o Acórdão recorrido.

Custas a cargo do recorrente.

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Lisboa, 23 de Novembro de 2011

Fernandes da Silva (Relator)

Gonçalves Rocha

Sampaio Gomes

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[1]  - Por conter matéria conclusiva, dá-se por não escrita a parte do texto destacada em itálico (art. 646.º, n.º4).
[2] - Assim, in Acórdão deste S.T.J. de 13.1.2010, www.dgsi.pt.
[3] - Vide, v.g., A. Monteiro Fernandes, ‘Direito do Trabalho’, 13.ª edição, pg. 560/ss.
[4] - Como decorre dos documentos n.º 3 e 4, a fls. 195 e seguintes, (regulamento onde, além do mais, se define a composição, funcionamento e atribuições dos Órgãos de Concessão de Crédito do Grupo B...), a integração da Comissão não significa a necessária qualificação categorial dos seus elementos e, menos, que devessem ser apenas Gerentes ou Subgerentes. A partir de 16.12.99, 'ut' fls. 221-223, os Órgãos de concessão de crédito do segmento de Particulares, Nível Local, podiam ser integradas pelo director ou chefe de Sucursal ou responsável de Loja e gerente de conta ou gestor de cliente, subchefe de Sucursal ou subgerente de Loja Private Bankers.